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Psicologia ·
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M251 Manual de cuidados paliativos Academia Nacional de Cuidados Paliativos Rio de Janeiro Diagraphic 2009 320p Inclui bibliografia ISBN 9788589718271 1 Tratamento paliativo I Academia Nacional de Cuidados Paliativos 094985 CDD 616029 CDU 616085 180909 230909 015273 CIPBRASIL CATALOGAÇÃONAFONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS RJ Diagraphic Rio de Janeiro 2009 Diretor Newton Marins Gerente Editorial Verônica Cobas Coordenadora editorial Jane Castelo Revisora chefe Claudia Gouvêa Revisão Danielle Ribeiro e Marcela Lima Programação visual Katia Bonfadini Toda correspondência deve ser dirigida a Av Paulo de Frontin 707 CEP 20261241 Rio de JaneiroRJ telefax 21 25027405 email editoradiagraphiccombr site wwwdiagraphiccombr AS MATÉRIAS ASSINADAS BEM COMO SUAS RESPECTIVAS FOTOS DE CONTEÚDO CIENTÍFICO SÃO DE RESPONSABILIDADE DOS AUTORES NÃO REFLETINDO NECESSARIAMENTE A POSIÇÃO DA EDITORA DISTRIBUIÇÃO EXCLUSIVA À CLASSE MÉDICA Reprodução e distribuição proibidas Título Manual de Cuidados Paliativos 1ª edição DIA GRA PHIC E D I T O R A Edição e produção Agradecimentos A Academia Nacional de Cuidados Paliativos ANCP representada por sua diretoria orgulhase e agradece a todos os colegas paliativistas do Brasil que sem medir esforços contribuíram direta ou indiretamente para a rea lização de mais este trabalho O esforço coletivo é e sempre será a nossa mais profunda marca Entretanto alguém dedicou muitas horas a mais a este trabalho nosso editor Ricardo Tavares de Carvalho secretáriogeral da ANCP Ele realizou a leitura criteriosa de todos os textos cobrou pontualidade estimulou colegas sugeriu formas de tornar os trabalhos mais bem compreendidos e tentou dar ao Manual a seriedade e o rigor científico que me rece um texto assinado pela nossa entidade Nosso agradecimento e respeito ao colega Carla D Bartz assessora de comunicação da ANCP também foi fundamental para a realização deste trabalho fazendoo com os mesmos zelo e presteza com que cuida dos assuntos da Academia O Sr Jackson Morishita da Farmacêutica Wyeth e a Diagraphic Editora mostraramse bons e fiéis parceiros em todos os momentos A todos os nossos mais profundos respeito e gratidão 6 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP O Manual de Cuidados Paliativos ANCP é uma publicação da Academia Nacional de Cuidados Paliativos Editor e secretário nacional da ANCP Dr Ricardo Tavares de Carvalho Editora assistente e coordenadora de comunicação da ANCP Carla Dórea Bartz Diretoria da ANCP Gestão 20092010 Presidente Dra Sílvia Maria de Macedo Barbosa SP Vicepresidente Dr Roberto Bettega PR Secretário nacional Dr Ricardo Tavares de Carvalho SP Tesoureira Dr Dalva Yukie Matsumoto SP Coordenação científica Dra Maria Goretti Sales Maciel SP Conselho Consultivo Dra Claudia Burlá RJ Dra Maria Goretti Sales Maciel SP Capítulo Gaúcho da ANCP Dra Julieta Fripp RS Capítulo Paranaense da ANCP Dr Luís Fernando Rodrigues PR Comissão de Psicologia Debora Genezini SP Comissão de Terapia Ocupacional Marília Othero SP Mais informações Site wwwpaliativoorgbr Blog wwwcuidadospaliativoswordpresscom Twitter wwwtwittercomancpaliativos Orkut ANCP Cuidados Paliativos TV ANCP wwwyoutubecomtvancp email contatopaliativoorgbr Endereço Alameda dos Jurupis 410 Conj 184 Moema CEP 04088001 São PauloSP 7 Prefácio O Cuidado Paliativo sem dúvida é o exercício da arte do cuidar aliado ao conhecimento científico em que a associação da ciência à arte propor ciona o alívio do sofrimento relacionado com a doença Por ser parte fun damental da prática clínica pode ocorrer de forma paralela às terapias destinadas à cura e ao prolongamento da vida A evolução do conhecimento na área do Cuidado Paliativo é exponencial Não há dúvida de que ocorreu um grande progresso na ciência médica como um todo e como consequência temse uma sobrevida de pacientes com doenças crônicas e limitantes de vida cada vez maior Devemos ter em mente que nem sempre a sobrevivência implica qualidade de vida Por outro lado 50 dos pacientes diagnosticados com câncer no mun do desenvolvido morrerão da progressão da doença sendo essa trajetória normalmente acompanhada de grandes sofrimentos físico psíquico espiritual e social Devido à natureza complexa multidimensional e dinâmica da doença o Cuidado Pa liativo avança como um modelo terapêutico que endereça olhar e proposta terapêutica aos diversos sintomas responsáveis pelos sofrimentos físico psíquico espiritual e social responsáveis por diminuir a qualidade de vida do paciente Tratase de uma área em crescimento e cujo progresso compreende estratégias diversas que englobam bioética comunicação e natureza do sofrimento A necessidade desse cuidado independe da faixa etária pois é um tipo de cuidado universal que se amplia para o paciente e sua família Os Cuidados Paliativos devem focar a adequada avaliação e o manuseio dos sintomas físicos psíquicos sociais e espirituais do paciente e da sua família e estar presentes em todas as fases da trajetória da doença Neles há maior entendimento dos mecanismos das doenças e dos sintomas além das diversas opções terapêuticas para os sintomas físicos e psíquicos Neste manual tentamos fornecer atualização em alguns temas importantes no Cuida do Paliativo Vários assuntos são abordados como sintomas físicos psíquicos questões de comunicação o luto o papel da equipe a construção de um serviço entre tantos outros Somos afortunados pois os autores deste manual são pessoas que atuam na área e têm grande comprometimento com o tema e sua disseminação Esperamos que este manual alcance a meta de melhorar a qualidade de vida dos pa cientes e de suas famílias e ajude a encontrar o nível essencial do controle da doença a prevenção e o tratamento do sofrimento Boa leitura Sílvia Maria de Macedo Barbosa Presidente da Academia Nacional de Cuidados Paliativos 8 Índice Parte I Cuidados Paliativos conceito fundamentos e princípios 14 Indicações de Cuidados Paliativos 20 Avaliação do paciente em Cuidados Paliativos 37 Comunicação em Cuidados Paliativos 49 Modalidades de atuação e modelos de assistência em Cuidados Paliativos 58 Cuidado Paliativo em pediatria 63 Organização de serviços de Cuidados Paliativos 72 Parte II Controle da dor 86 Dispneia tosse e hipersecreção de vias aéreas 104 Náusea e vômito 117 Obstipação e diarreia 124 Fadiga sudorese e prurido 132 Controle de sintomas delirium 139 Ansiedade e depressão em Cuidados Paliativos como tratar 144 Parte III Caquexia e anorexia 154 Cuidados Paliativos nas demências 162 Obstrução intestinal maligna 168 Cuidados Paliativos em pacientes com HIVAIDS 174 Síndrome da veia cava superior 181 Síndrome de compressão medular 184 Parte IV Hipodermóclise um método alternativo para a administração de fluidos e medicamentos por via subcutânea 186 9 Procedimentos sustentadores de vida em Cuidados Paliativos uma questão técnica e bioética 195 Sedação paliativa 202 Parte V Papel do médico na equipe de Cuidados Paliativos 214 Papel do enfermeiro na equipe de Cuidados Paliativos 216 Papel do psicólogo na equipe de Cuidados Paliativos 218 Papel do assistente social na equipe de Cuidados Paliativos 221 Papel do farmacêutico clínico na equipe de Cuidados Paliativos 224 Papel da nutricionista na equipe de Cuidados Paliativos 227 Papel do fisioterapeuta na equipe de Cuidados Paliativos 230 Papel do fonoaudiólogo na equipe de Cuidados Paliativos 234 Papel do terapeuta ocupacional na equipe de Cuidados Paliativos 237 Papel do assistente espiritual na equipe de Cuidados Paliativos 239 Papel do dentista na equipe de Cuidados Paliativos 241 Parte VI Ação prática do profissional de Cuidados Paliativos no domicílio 245 Cuidados com feridas e curativos 258 Cuidado com ostomias 269 Higiene e conforto 274 Providências práticas para toda a família 283 Parte VII As últimas 48 horas de vida 290 Suporte a paciente e família na fase final da doença 299 Aspectos particulares e ritos de passagem nas diferentes religiões 309 Assistência ao luto 321 Parte VIII Controle de outros sintomas que não dor 331 10 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Autores AdriAnA ColombAni Pinto Fonoaudióloga coordenadora do Serviço de Fonoaudiologia do Hospital Santa Helena Alini mAriA orAthes Ponte silvA Médica de família e comunidade pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo membro do ambulatório de Geriatria e Gerontologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo HCFMUSP AnA CláudiA de limA QuintAnA ArAntes Geriatra presidente da Associação Casa do Cuidar coordenadora do Serviço de Cuidados Pa liativos do Hospital Israelita Albert Einstein HIAE AnAliCe de Assis CunhA Enfermeira atuando no Serviço de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo HSPESP e do Premier Residence Hospital AndréA Gislene do nAsCimento Nutricionista do Grupo de Dor e Cuidados Paliativos supervisora da Área de Educação Conti nuada da Divisão de Nutrição do Instituto da Criança ICR do HCFMUSP Ariel de FreitAs Quintão AmériCo Anestesiologista coordenadora da Clínica de Dor e Cuidados Paliativos dos hospitais Lifecenter e Mater Dei biAnCA Azoubel de AndrAde Fisioterapeuta do Instituto da Criança do HCFMUSP CéliA mAriA KirA Médica do Programa de Assistência Domiciliária do Hospital Universitário HU da USP CelisA tiemi nAKAGAwA serA Fisioterapeuta doutora em Neurociências e Comportamento pelo Instituto de Psicologia da USP docente do Departamento de Fisioterapia Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da FMUSP ClAudiA burlá Geriatra membro da Câmara Técnica sobre a Terminalidade da Vida e Cuidados Paliativos do Conselho Federal de Medicina CFM diretora de Defesa Profissional da Sociedade Brasi leira de Geriatria e Gerontologia SBGG secretária geral e vicepresidente da International Association of Gerontology and Geriatrics IAGG CristhiAne s Pinto Médica especialista em Cuidados Paliativos pelo Instutito Nacional de Câncer INCA atual chefe do ambulatório interdisciplinar do Hospital do Câncer IV do INCA HC IV 11 dAlvA YuKie mAtsumoto Oncologista coordenadora da Hospedaria de Cuidados Paliativos do HSPMSP diretora do Hospital Premier do Instituto Paliar e da ANCP dAniel limA Azevedo Geriatra do Hospital de Aeronáutica dos Afonsos HAAF especialista pela SBGG deborA Genezini Coordenadora do Serviço de Psicologia do Hospital Premier especialista em Psicologia Hospita lar mestranda em Gerontologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP elenY vAssão de PAulA AitKen Capelã titular membro da equipe multidisciplinar de Cuidados Paliativos do Hospital Emílio Ribas e do HSPESP eliete FAriAs Azevedo Enfermeira oncologista da Unidade de Cuidados Paliativos do INCAHC IV elisA mirAndA Aires Infectologista especialista em dor e Cuidados Paliativos pela Santa Casa de São Paulo cola boradora da equipe de Cuidados Paliativos do Hospital Emílio Ribas FláviA Firmino Enfermeira oncologista especializada em Cuidados Paliativos pelo INCA docente da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade do Rio de Janeiro EEAPUNIRIO membro da Asso ciação LatinoAmericana de Cuidados Paliativos ALCP membro da International Association for Hospice and Palliative Care IAHPC henriQue A PArsons Médico fellow dos Departamentos de Cuidados Paliativos e Medicina de Reabilitação e Terapêutica de Investigação do Câncer do MD Anderson Cancer Center da Universidade do Texas ivAnYse PereirA Enfermeira do HUUSP especializada em atendimento domiciliar pela USP ivone biAnChini de oliveirA Assistente social do Núcleo de Assistência Domiciliar Interdisciplinar NADI do HCFMUSP José tAdeu tesseroli de siQueirA Cirurgiãodentista supervisor da Equipe de Dor Orofacial da Divisão de Odontologia do HCFMUSP JulietA CArriConde FriPP Médica coordenadora do Programa de Internação Domiciliar Interdisciplinar PIDI para pa cientes oncológicos da Universidade Federal de Pelotas UFPeL leonArdo de oliveirA Cosolin Médico coordenador do Serviço de Cuidados Paliativos do Hospital do Câncer de Barretos 12 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP letíCiA AndrAde Doutora em Serviço Social atuando na Divisão de Serviço Social no Ambulatório de Cuida dos Paliativos e no NADI do HCFMUSP luAnA visCArdi nunes Psicóloga da equipe de Cuidados Paliativos do HSPESP especializada em Psicanálise pelo Instituto Sedes Sapientiae luCiAnA reGinA bertini CAbrAl Geriatra membro do Programa de Cuidados Paliativos do Serviço de Clínica Médica do Insti tuto do Câncer do Estado de São Paulo ICESP luis Alberto sAPoretti Geriatra do Serviço de Geriatria do HCFMUSP coordenador do Programa de Cuidados Paliati vos em Geriatria do Serviço de Geriatria do HCFMUSP luís FernAndo rodriGues Médico coordenador da equipe de Cuidados Paliativos do Hospital do Câncer de Londrina e do Sistema de Internação Domiciliar da Secretaria Municipal da Saúde de Londrina mAriA Goretti sAles mACiel Médica coordenadora do Serviço de Cuidados Paliativos do HSPESP diretora da ANCP do Hospital Premier e do Instituto Paliar membro da Câmara Técnica sobre Terminalidade da Vida e Cuidados Paliativos do CFM mAriA FernAndA bArbosA Farmacêutica da Unidade de Cuidados Paliativos do INCAHC IV especialista em Farmácia Hospitalar em Oncologia pelo INCA mAriA JúliA PAes dA silvA Professora titular da Escola de Enfermagem EE da USP diretora do Departamento de Enfer magem do HUUSP líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Comunicação Interpessoal do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPQ mAriliA bense othero Terapeuta ocupacional coordenadora do setor de Terapia Ocupacional TO do Hospital Pre mier e da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia ABRALE especialista em Saúde Co letiva pela FMUSP mirlAne GuimArães de melo CArdoso Anestesiologista professora da Universidade Federal de Alagoas UFA responsável pelo Serviço de Terapia de Dor e Cuidados Paliativos da Fundação Centro de Oncologia do Amazonas FCECON môniCA CeCíliA boChetti mAnnA Médica da equipe de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Prof Edmundo Vasconcelos e da Hospedaria de Cuidados Paliativos do HSPMSP 13 môniCA mArtins trovo de ArAúJo Enfermeira doutoranda pela EEUSP membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Comunica ção Interpessoal do CNPQ renAto rodriGues CAmArão Enfermeiro da Unidade de Cuidados Paliativos do Hospital de Apoio de Brasília membro do Programa Cuidar Sempre do Distrito Federal riCArdo tAvAres de CArvAlho Cardiologista coordenador do Grupo de Cuidados Paliativos do HCFMUSP diretor do Hospital Premier do Instituto Paliar e da ANCP ritA de CássiA dewAY GuimArães Médica diretora do Núcleo Assistencial para Pessoas com Câncer paliativista da assistência multidisciplinar em Oncologia roberto t C betteGA Médico vicepresidente da ANCP coordenador do Serviço de Cuidados Paliativos e Alívio da Dor do Núcleo de Estudos Oncológicos do Paraná sAmirA AlenCAr YAsuKAwA Fisioterapeuta do ICR do HCFMUSP especializada em Cuidados Paliativos pelo Instituto Pallium silviA mAriA de mACedo bArbosA Médica presidente da ANCP coordenadora do Serviço de Cuidados Paliativos do Instituto da Criança da FMUSP solAnGe A Petilo de CArvAlho briColA Farmacêutica clínica do Serviço de Clínica Geral do NADI e do Ambulatório de Cuidados Pa liativos do HCFMUSP sumAtrA melo dA CostA PereirA JAles Cirurgiãdentista pósgraduada em Odontologia Hospitalar pelo HCFMUSP toshio ChibA Geriatra membro do Programa de Cuidados Paliativos do Serviço de Clínica Médica do ICESP verusKA meneGAtti AnAstáCio hAtAnAKA Médica assistente do Serviço de Clínica Médica do ICESP 14 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Cuidados Paliativos conceito fundamentos e princípios dAlvA YuKie mAtsumoto Introdução Nas últimas décadas assistimos ao envelhecimento progressivo da população assim como ao aumento da prevalência de câncer e outras doenças crônicas5 Em contraparti da o avanço tecnológico alcançado principalmente a partir da segunda metade do século XX associado ao desenvolvimento da terapêutica fez com que muitas doenças mortais se transformassem em crônicas levando à longevidade de seus portadores No entanto apesar dos esforços dos pesquisadores e do conhecimento acumulado a morte continua sendo uma certeza e ameaça o ideal de cura e preservação da vida para o qual nós pro fissionais da saúde somos treinados Os pacientes fora de possibilidade de cura acumulamse nos hospitais recebendo in variavelmente assistência inadequada quase sempre focada na tentativa de recuperação utilizando métodos invasivos e alta tecnologia Essas abordagens ora insuficientes ora exageradas e desnecessárias quase sempre ignoram o sofrimento e são incapazes por falta de conhecimento adequado de tratar os sintomas mais prevalentes sendo a dor o principal e mais dramático Não se trata de cultivar uma postura contrária à medicina tecnológica mas questionar a tecnolatria6 e refletir sobre a nossa conduta diante da mortalidade humana tentando o equilíbrio necessário entre conhecimento científico e humanismo para resgatar a dignidade da vida e a possibilidade de se morrer em paz Cada vez mais encontramos em nossos serviços pacientes idosos portadores de sín dromes demenciais de variadas etiologias ou com graves sequelas neurológicas Devemos enfrentar o desafio de nos conscientizar do estado de abandono a que esses pacientes estão expostos inverter o atual panorama dos cuidados oferecidos e tentar implantar me didas concretas como criação de recursos específicos melhoria dos cuidados oferecidos nos recursos já existentes formação de grupos de profissionais e educação da sociedade em geral3 Os Cuidados Paliativos despontam como alternativa para preencher essa lacu na nos cuidados ativos aos pacientes Breve história dos Cuidados Paliativos O Cuidado Paliativo se confunde historicamente com o termo hospice que definia abrigos hospedarias destinados a receber e cuidar de peregrinos e viajantes O relato mais antigo remonta ao século V quando Fabíola discípula de São Jerônimo cuidava de viajantes vindos da Ásia da África e dos países do leste no Hospício do Porto de Roma1 Várias instituições de caridade surgiram na Europa no século XVII abrigando pobres órfãos e doentes Essa prática se propagou com organizações religiosas católicas e pro testantes que no século XIX passaram a ter características de hospitais 15 O Movimento Hospice Moderno foi introduzido pela inglesa Cicely Saunders com formação humanista e médica que em 1967 fundou o St Christophers Hospice cuja estrutura não só permitiu a assistência aos doentes mas o desenvolvimento de ensino e pesquisa recebendo bolsistas de vários países7 Na década de 1970 o encontro de Cicely Saunders com Elisabeth KlüberRoss nos Estados Unidos fez com que o Movimento Hospice também crescesse naquele país Em 1982 o Comitê de Câncer da Organização Mundial da Saúde OMS criou um grupo de trabalho responsável por definir políticas para o alívio da dor e cuidados do tipo hospice que fossem recomendados em todos os países para pacientes com câncer O termo Cuidados Paliativos já utilizado no Canadá passou a ser adotado pela OMS devido à dificuldade de tradução adequada do termo hospice em alguns idiomas4 A OMS publicou sua primeira definição de Cuidados Paliativos em 1990 cuidado ativo e total para pacientes cuja doença não é responsiva a tratamento de cura O controle da dor de outros sintomas e de problemas psicossociais e espirituais é pri mordial O objetivo do Cuidado Paliativo é proporcionar a melhor qualidade de vida possível para pacientes e familiares Essa definição foi revisada em 2002 e substi tuída pela atual Filosofia e fundamentos éticos dos Cuidados Paliativos Halina Bortnowska filósofa e escritora polonesa voluntária num hospice discorreu sobre as éticas da cura e da atenção Descreveu ética como uma constelação de va lores sustentados pela pessoa Dizia que na ética da cura as virtudes militares eram predominantes não se dar por vencido perseverar ser duro Já na ética da atenção o valor central é a dignidade humana enfatizando a solidariedade entre o paciente e o profissional da saúde em atitude que resulta numa compaixão afetiva Na ética da cura o médico é o general na da atenção o paciente é o soberano Dr Robert Twycross fala sobre a dificuldade do médico em dizer a verdade ao pa ciente quando essa verdade desnuda a terminalidade da vida e a ausência de perspec tiva de cura Colocamse em jogo o seu próprio medo da morte e as pressões culturais a ela associadas Fica a ideia de que com a verdade dolorosa podemos destruir a es perança e levar o paciente irreversivelmente ao desespero e à depressão Conclui que a mentira e a evasão são o que realmente isolam o paciente atrás de um muro de palavras ou no silêncio que impede a adesão terapêutica e a possibilidade de compartilhar seus medos angústias e preocupações Enfatiza que devemos ter o compromisso da abertura e da honestidade e que o primeiro desafio ético do médico seria equipar a si mesmo de boas habilidades de comunicação e sensibilidade10 Segundo Siqueira9 a ética médica tradicional concebida no modelo hipocrático tem um forte acento paternalista Somente na década de 1960 os códigos de ética profissional passaram a reconhecer o enfermo como agente autônomo Com base no princípio bioético da autonomia do paciente por meio do consen timento informado possibilitando que ele tome suas próprias decisões no princípio da beneficência e da nãomaleficência os Cuidados Paliativos desenvolvem o cuida do ao paciente visando à qualidade de vida e à manutenção da dignidade humana no decorrer da doença na terminalidade da vida na morte e no período de luto 16 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Conceito de Cuidado Paliativo Segundo a definição da OMS revista em 2002 Cuidado Paliativo é uma abordagem que promove a qualidade de vida de pacientes e seus familiares que enfrentam doenças que ameacem a continuidade da vida por meio da prevenção e do alívio do sofrimento Requer identificação precoce avaliação e tratamento da dor e outros problemas de natu reza física psicossocial e espiritual O Cuidado Paliativo não se baseia em protocolos mas em princípios Não se fala mais em terminalidade mas em doença que ameaça a vida Indicase o cuidado desde o diag nóstico expandindo nosso campo de atuação Não falaremos também em impossibilidade de cura mas na possibilidade ou não de tratamento modificador da doença afastando dessa forma a ideia de não ter mais nada a fazer Pela primeira vez uma abordagem inclui a espiritualidade entre as dimensões do ser humano A família é lembrada portanto assistida também após a morte do paciente no período de luto Princípios dos Cuidados Paliativos Os Cuidados Paliativos baseiamse em conhecimentos inerentes às diversas especia lidades possibilidades de intervenções clínica e terapêutica nas diversas áreas de conhe cimento da ciência médica4 e de conhecimentos específicos A OMS publicou em 1986 princípios que regem a atuação da equipe multiprofissional de Cuidados Paliativos Esses princípios foram reafirmados na sua revisão em 2002 e estão listados adiante Promover o alívio da dor e de outros sintomas desagradáveis Dessa forma é necessário conhecimento específico para a prescrição de medicamen tos adoção de medidas nãofarmacológicas e abordagem dos aspectos psicossociais e es pirituais que caracterizam o sintoma total plagiando o conceito de dor total criado por Dame Cicely Saunders em que todos esses fatores podem contribuir para a exacerbação ou atenuação dos sintomas devendo ser levados em consideração na abordagem Afirmar a vida e considerar a morte um processo normal da vida Bernard Lown em seu livro A arte perdida de curar afirma As escolas de medicina e o estágio nos hospitais os preparam os futuros médicos para tornaremse oficiais maiores da Ciência e gerentes de biotecnologias complexas Muito pouco se ensina sobre a arte de ser médico Os médicos aprendem pouquíssimo a lidar com moribundos A realidade mais fundamental é que houve uma revolução biotecnológica que possibilita o prolongamento interminável do morrer9 O Cuidado Paliativo resgata a possibilidade da morte como um evento natural e esperado na presença de doença ameaçadora da vida colocando ênfase na vida que ainda pode ser vivida Não acelerar nem adiar a morte Enfatizase dessa forma que Cuidado Paliativo nada tem a ver com eutanásia como muitos ainda querem entender Essa relação ainda causa decisões equivocadas quanto à realização de intervenções desnecessárias e enorme dificuldade em prognosticar paciente portador de doença progressiva e incurável e definir a linha tênue e delicada do fazer e do 17 nãofazer Um diagnóstico objetivo e bem embasado o conhecimento da história natural da doença um acompanhamento ativo acolhedor e respeitoso e uma relação empática com o paciente e seus familiares nos ajudarão nas decisões Dessa forma erraremos me nos e nos sentiremos mais seguros Integrar os aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao paciente A doença principalmente aquela que ameaça a continuidade da vida costuma tra zer uma série de perdas com as quais paciente e família são obrigados a conviver quase sempre sem estarem preparados As perdas de autonomia autoimagem segu rança capacidade física respeito sem falar das perdas concretas materiais como de emprego de poder aquisitivo e consequentemente de status social podem trazer an gústia depressão e desesperança interferindo objetivamente na evolução da doença na intensidade e na frequência dos sintomas que podem apresentar maior dificuldade de controle A abordagem desses aspectos sob a ótica da psicologia se faz fundamental A novidade é a possibilidade de abordálos também sob o ponto de vista da espiritua lidade que se confunde e se sobrepõe invariavelmente à questão religiosa Noventa e cinco por cento dos americanos creem numa força superior e 93 gostariam que seus médicos abordassem essas questões se ficassem gravemente enfermos8 Segundo Sa poretti8 espírito do latim spiritus significa sopro e se refere a algo que dá ao corpo sua dimensão imaterial oculta divina ou sobrenatural que anima a matéria O espírito conecta o ser humano à sua dimensão divina ou transcendente É mais esse aspecto o da transcendência do significado da vida aliado ou não à religião que devemos estar preparados para abordar sempre lembrando que o sujeito é o paciente sua crença e seus princípios Oferecer um sistema de suporte que possibilite ao paciente viver tão ativamente quanto possível até o momento da sua morte Não devemos nos esquecer de que qualidade de vida e bemestar implicam obser vância de vários aspectos da vida Problemas sociais dificuldades de acesso a serviços medicamentos e outros recursos podem ser também motivos de sofrimento e devem ser incluídos entre os aspectos a serem abordados pela equipe multiprofissional Viver ativa mente e não simplesmente viver remetenos à questão da sobrevida a qualquer custo que esperamos combater É nosso dever e nossa responsabilidade sermos facilitadores para a resolução dos problemas do nosso paciente Oferecer sistema de suporte para auxiliar os familiares durante a doença do paciente e o luto Nunca estamos completamente sós O ser humano é por natureza um ser gregário Todo o núcleo familiar e social do paciente também adoece Segundo a Dra Maria Helena Pereira Franco2 a unidade de cuidados pacientefamília se coloca como una e específica ao mesmo tempo A célula de identidade do ser humano é a família res peitadas todas as condições que fazem dela um universo cultural próprio muitas vezes distante ou até mesmo alheio ao universo cultural dos profissionais da saúde A famí lia tanto a biológica como a adquirida amigos parceiros etc pode e deve ser nossa parceira e colaboradora Essas pessoas conhecem melhor do que nós o paciente suas 18 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP necessidades suas peculiaridades seus desejos e suas angústias muitas vezes nãover balizados pelo próprio paciente Da mesma forma essas pessoas também sofrem e seu sofrimento deve ser acolhido e paliado Oferecer abordagem multiprofissional para focar as necessidades dos pacientes e seus familiares incluindo acompanhamento no luto Na prática do cuidado ao paciente frequentemente iremos nos deparar com inúmeros fatores que atuarão concomitantemente na modificação da resposta te rapêutica medicamentosa na evolução da própria doença e na relação com o pa ciente e a família A integração sugerida pelo Cuidado Paliativo é uma forma de observarmos o paciente sob todas as suas dimensões e a importância de todos esses aspectos na composição do seu perfil para elaborarmos uma proposta de aborda gem Ignorar qualquer dessas dimensões significará uma avaliação incompleta e consequentemente uma abordagem menos efetiva e eficaz dos sintomas O sujeito da ação é sempre o paciente respeitado na sua autonomia Incluir a família no processo do cuidar compreende estender o cuidado no luto que pode e deve ser realizado por toda a equipe e não somente pelo psicólogo A equipe multiprofis sional com seus múltiplos olhares e sua percepção individual pode realizar esse trabalho de forma abragente Melhorar a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso da doença Com uma abordagem holística observando o paciente como um ser biográfico mais que um ser simplesmente biológico poderemos respeitando seus desejos e suas necessidades melhorar o curso da doença e segundo a experiência de vários serviços de Cuidados Palia tivos também prolongar sua sobrevida Vivendo com qualidade ou seja sendo respeitado tendo seus sintomas impecavelmente controlados seus desejos e suas necessidades aten didas podendo conviver com seus familiares e resgatando pendências com certeza nossos pacientes também viverão mais Iniciar o mais precocemente possível o Cuidado Paliativo juntamente com outras medidas de prolongamento da vida como quimioterapia e radioterapia e incluir todas as investigações necessárias para melhor compreender e controlar situações clínicas estressantes Pela própria definição de Cuidados Paliativos da OMS esses devem ser iniciados desde o diagnóstico da doença potencialmente mortal Dessa forma iremos cuidar do paciente em diferentes momentos da evolução da sua doença portanto não devemos priválo dos recursos diagnósticos e terapêuticos que o conhecimento médico pode oferecer Devemos utilizálos de forma hierarquizada levando em consideração os benefícios que podem trazer e os malefícios que devem ser evitados4 Uma abordagem precoce também permite a prevenção dos sintomas e de compli cações inerentes à doença de base além de propiciar diagnóstico e tratamento ade quados de enfermidades que possam cursar paralelamente à doença principal Uma boa avaliação embasada nos exames necessários além da definição da performance do paciente é indispensável para a elaboração de um plano integral de cuidados adequado a cada caso e adaptado a cada momento da evolução da doença 19 O Cuidado Paliativo no Brasil O Cuidado Paliativo no Brasil teve seu início na década de 1980 e conheceu um crescimento significativo a partir do ano 2000 com a consolidação dos serviços já exis tentes e pioneiros e a criação de outros não menos importantes Hoje já somos mais de 40 iniciativas em todo o Brasil Ainda é pouco levandose em consideração a extensão geográfica e as necessidades do nosso país Assim será maior a nossa responsabilidade em firmarmos um compromisso para unidos num único propósito ajudarmos a construir um futuro promissor para os Cuidados Paliativos a fim de que um dia não muito distante todo cidadão brasileiro possa se beneficiar dessa boa prática Referências 1 CORTES C C Historia y desarrollo de los cuidados paliativos In Marcos G S ed Cuidados paliativos e intervención psicossocial em enfermos com cáncer Las palmas ICEPS 1988 2 FRANCO M H P Multidisciplinaridade e interdisciplinaridade psicologia Cuidado paliativo CREMESP 1III p 746 2008 3 GALRIÇA NETO I Pequeno manual básico de cuidados paliativos Região de Saúde de Lisboa 4 MACIEL M G S Definições e princípios Cuidado paliativo CREMESP 1I p 1821 2008 5 MONTEIRO M G F Transição demográfica e seus efeitos sobre a saúde da população In BARATA R B et al Eqüidade e saúde contribuições da epidemiologia Rio de Janeiro FIOCRUZABRASCO 1997 6 PESSINI L Cuidados paliativos alguns aspectos conceituais biográficos e éticos Prática hospitalar n 41 p 10712 2005 7 PESSINI L Distanásia até quando investir sem agredir Bioética v 4 p 3143 1996 8 SAPORETTI L A Espiritualidade em cuidados paliativos Cuidado paliativo CREMESP 4I p 5223 2008 9 SIQUEIRA J E Doente terminal Cadernos de Bioética do CREMESP v 1 2005 10 TWYCROSS R Medicina paliativa filosofia e considerações éticas Acta Bioética n 1 2000 20 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Indicações de Cuidados Paliativos AnA ClAudiA de limA QuintAnA ArAntes Introdução Pela definição da Organização Mundial da Saúde OMS para Cuidados Paliativos todos os pacientes portadores de doenças graves progressivas e incuráveis que ameacem a continui dade da vida deveriam receber a abordagem dos Cuidados Paliativos desde o seu diagnóstico Entretanto sabemos que se essa referência tivesse de ser cumprida a maioria dos pacientes permaneceria sem nenhuma assistência paliativa pois não temos ainda disponibilidade de profissionais e serviços que possam dar conta do atendimento dessa população No Brasil segundo dados do Departamento de Informação e Informática do Sistema Único de Saúde DATASUS13 em 2006 faleceram 1031691 brasileiros Se avaliarmos apenas os óbitos decorrentes de doenças de evolução crônica ou degenerativa e neo plasias teremos um montante de mais de 725 mil pessoas que morreram no Brasil com grande possibilidade de sofrimento intenso Tabela 1 Mais de 690 mil pessoas faleceram em hospitais e 224 mil em casa Tabela 2 Por conta dessa dificuldade de avaliar e cuidar do sofrimento estabelecemos alguns critérios de recomendação para Cuidados Paliativos considerando a possibilidade de in dicação para aqueles pacientes que esgotaram todas as possibilidades de tratamento de manutenção ou prolongamento da vida que apresentam sofrimento moderado a intenso e que optam por manutenção de conforto e dignidade da vida Um dos critérios mais discutidos é o que se refere ao prognóstico de tempo de vida do paciente O limite designado em seis meses de expectativa de vida poderia ser utilizado para indicação de Cuidados Paliativos exclusivos uma vez que esse critério foi importado do Medicare americano19 que estabelece o tempo de sobrevida esperado como um dos critérios de indicação para assistência de hospice São critérios do Medicare a expectativa de vida avaliada é menor ou igual a seis meses o paciente deve fazer a opção por Cuidados Paliativos exclusivos e abrir mão dos trata mentos de prolongamento da vida o paciente deve ser beneficiário do Medicare Avaliação de prognóstico Nas raízes da prática da medicina encontramos certa harmonia entre a ciência e o sacerdócio místico que envolvia os poderes do médico em avaliar e curar doenças Apesar disso a arte de prever o futuro ainda não se tornou suficientemente científica a pon to de especializar o médico no exercício de prognosticar Essa avaliação busca reforços constantes em escalas sinais e sintomas que podem identificar o processo de morte em fases precoces mas ainda envolve julgamentos fisiológicos e sociais bastante complexos Mesmo que a morte seja um fenômeno biológico claramente identificado as percepções de significado tempo e circunstâncias em que o processo de morrer e a morte se sucedem ainda permanecem num conhecimento pouco estabelecido e ensinado 21 Tabela 1 Mortalidade no Brasil 2006 Óbitos para residência por capítulo CID10 e região Capítulo CID10 Norte Nordeste Sudeste Sul C Oeste Total I Algumas doenças infecciosas e parasitárias 3271 12735 21171 6158 3173 46508 II Neoplasias tumores 6439 31803 77260 31238 9056 155796 III Doenças sangue órgãos hemat e transt imunit 390 1665 2517 624 300 5496 IV Doenças endócrinas nutricionais e metabólicas 2659 17923 26790 8374 3158 58904 V Transtornos mentais e comportamentais 270 3040 4802 1444 700 10256 VI Doenças do sistema nervoso 686 3620 10262 3448 1150 19166 VII Doenças do olho e anexos 4 12 7 3 2 28 VIII Doenças do ouvido e da apófise mastoide 9 43 67 18 8 145 IX Doenças do aparelho circulatório 11795 75711 147933 49073 18305 302817 X Doenças do aparelho respiratório 4627 20166 53983 18215 5875 102866 XI Doenças do aparelho digestivo 2389 12473 25830 8073 3159 51924 XII Doenças da pele e do tecido subcutâneo 104 629 1401 217 115 2466 XIII Doenças do sistema osteomuscular e tecido conjuntivo 199 716 1851 579 252 3597 XIV Doenças do aparelho geniturinário 774 3715 9468 2497 967 17421 22 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Tabela 1 Mortalidade no Brasil 2006 Óbitos para residência por capítulo CID10 e região Capítulo CID10 Norte Nordeste Sudeste Sul C Oeste Total XV Gravidez parto e puerpério 178 567 521 237 134 1637 XIV Doenças do aparelho geniturinário 774 3715 9468 2497 967 17421 XVI Algumas afecções originadas no período perinatal 3414 10212 9838 2932 1940 28336 XVII Malformações congênitas deformidades e anomalias cromossômicas 966 2950 4069 1543 869 10397 XVIII Sintomas sinais e achados anormais em exames clínicos e laboratoriais 8391 24275 40372 9424 3081 85543 XX Causas externas de morbidade e mortalidade 9307 33884 55708 19291 10198 128388 Total 55872 256139 493850 163388 62442 1031691 Tabela 2 Mortalidade no Brasil 2006 Local ocorrência Hospital Domicílio Região Norte 33658 14222 Região Nordeste 144946 82682 Região Sudeste 358906 78740 Região Sul 110765 35648 Região CentroOeste 42581 12147 Total 690856 223439 CID10 décima revisão da Classificação Internacional de Doenças continuação 23 O maior perigo desse exercício de avaliar tempo de sobrevida de uma pessoa é deter minar a morte social antes da morte física propriamente dita Uma vez que se estabele ce que um paciente tem uma expectativa de vida pequena em dias ou semanas corremos o risco de subestimar suas necessidades e negligenciar a possibilidade de conforto real dentro da avaliação do paciente e de sua família Em geral a avaliação prognóstica de pacientes em fases avançadas de doenças graves ainda apresenta erro otimista considerável principalmente quando avaliamos pacientes com doenças nãoneoplásicas Um estudo em 2000 de Christakis et al9 demonstrou que a acurácia de prognóstico geralmente apresenta erro para o lado do otimismo Apenas 20 dos médicos têm acurácia de prognóstico de 33 dos pacientes dentro do período atual de sobrevida sendo que 63 são muito otimistas e 17 subestimam o tempo de sobrevida Uma conclusão interessante foi a de que à medida que aumenta o tempo de relação médicopaciente a acurácia de prognóstico diminui demonstrando que o vínculo que se estabelece entre o médico e seu paciente determina um desejo do médico de prever uma condição que implica menor capacidade de avaliar a realidade Esse resultado nos permitiria iniciar uma discussão pertinente de o quanto os desejos e as expectativas do próprio médico não poderiam interferir na avaliação do prognóstico de seu paciente Uma das ferramentas que temos disponíveis na avaliação de prognóstico diz respeito à capacidade funcional do paciente Entretanto sabemos que a capacidade funcional pode estar diretamente relacionada com uma condição de sofrimento intensa nãoavaliada ou nãotratada adequadamente e que deforma a avaliação de prognóstico Por exemplo um paciente com câncer de próstata pode estar comprometido em sua funcionalidade por causa de uma dor óssea intensa nãotratada e não por deterioração sistêmica causada por sua doença de base Nesse caso a deterioração sistêmica se deve ao sofrimento e não ao avanço da doença para órgãos vitais Quanto à avaliação de capacidade para as atividades da vida diária temos as recomendações de Cuidados Paliativos para pacientes dependentes em determinadas atividades como incapacidade para se locomover alimen tarse e incontinências Quadro 1 Quadro 1 Principais dependências funcionais ABVD Incontinências urinária e fecal Alimentação por tubos enterais ou incapacidade de alimentarsehidratarse sem auxílio Imobilização permanente em leito ou poltrona ABVD atividades básicas de vida diária Como medir os declínios funcional e clínico A escala de performance status de Karnofsky Tabela 3 foi desenvolvida para pa cientes com câncer como um meio objetivo de documentar o declínio clínico do pacien te avaliando sua capacidade de realizar determinadas atividades básicas A maioria dos pacientes com escala Karnofsky inferior a 70 tem indicação precoce de assistência de Cuidados Paliativos Performance de 50 nessa escala indica terminalidade reafirmando que esses são pacientes elegíveis para Cuidados Paliativos a menos que exista um ganho 24 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP previsivelmente benéfico em sustentar terapia para a doença de base que seja simulta neamente disponível e possa ser tolerado Outro instrumento útil para medir a condição clínica do paciente é a Escala de Performance Paliativa PPS Tabela 4 que foi desen volvida em 1996 em Victoria British Columbia e revista em 2001 Para contornar a dificuldade de avaliação prognóstica foram estabelecidos alguns critérios clínicos para cada doença ou para cada condição clínica que auxiliam na decisão de encaminhar o paciente aos Cuidados Paliativos Alguns desses critérios dizem respeito a condições mórbidas específicas como insuficiência cardíaca congestiva ICC doença pulmonar obstrutiva crônica DPOC câncer esclerose lateral amiotrófica ELA demência e outras doenças degenerativas progressivas Indicadores nãoespecíficos como perda ponderal progressiva declínio de proteínas plasmáticas e perda funcional também são utilizados Doença cardíaca Nos Estados Unidos 58 das mortes foram causadas primária ou secundariamente pelas doenças cardiovasculares DCV17 No Brasil em 2005 mais de 302 mil pessoas fa leceram por causa de uma DCV 29 que é a principal causa de morte em todos os anos do século XX exceto 1918 Embora as DCVs sejam mais comuns com a idade avançada principalmente a insuficiência cardíaca IC elas não se restringem aos idosos Mais de 152 mil americanos com idade inferior a 65 anos morrem de DCV por ano3 A morte de causa cardiovascular mais característica é a morte súbita Pacientes com IC representam um desafio adicional na arte do prognóstico pois cerca de 60 deles classe funcional II da National NYHA morrem subitamente Se incluirmos os pacientes com classe funcional IV esse número representa 25 dos pacientes levan do à média de 35 Os critérios para previsão de morte súbita nesses pacientes ainda permanecem controversos11 31 Os estudos mais recentes sobre esses fatores prognósti cos incluem peptídeo natriurético do tipo B BNP fração de ejeção diâmetro diastólico Tabela 3 Escala de performance de Karnofsky 100 Sem sinais ou queixas sem evidência de doença 90 Mínimos sinais e sintomas capaz de realizar suas atividades com esforço 80 Sinais e sintomas maiores realiza suas atividades com esforço 70 Cuida de si mesmo não é capaz de trabalhar 60 Necessita de assistência ocasional capaz de trabalhar 50 Necessita de assistência considerável e cuidados médicos frequentes 40 Necessita de cuidados médicos especiais 30 Extremamente incapacitado necessita de hospitalização mas sem iminência de morte 20 Muito doente necessita de suporte 10 Moribundo morte iminente 25 Tabela 4 Escala de performance paliativa Deambulação Atividade e evidência de doença Autocuidado Ingestão Nível de consciência 100 Completa Normal sem evidência de doença Completo Normal Completo 90 Completa Normal alguma evidência de doença Completo Normal Completo 80 Completa Com esforço alguma evidência de doença Completo Normal Completo 70 Reduzida Incapaz para o trabalho alguma evidência de doença Completo Normal ou reduzida Completo 60 Reduzida Incapaz de realizar hobbies doença significativa Assistência ocasional Normal ou reduzida Completo ou com períodos de confusão 50 Sentado ou deitado Incapacitado para qualquer trabalho doença extensa Assistência considerável Normal ou reduzida Completo ou com períodos de confusão 40 Acamado Idem Assistência quase completa Normal ou reduzida Completo ou com períodos de confusão 30 Acamado Idem Dependência completa Reduzida Completo ou com períodos de confusão 20 Acamado Idem Idem Ingestão limitada a colheradas Completo ou com períodos de confusão 10 Acamado Idem Idem Cuidados com a boca Confuso ou em coma 0 Morte final presença de taquicardia ventricular nãosustentada e diabetes mellitus DM 6 50 A presença de fenômenos tromboembólicos parada cardiorrespiratória PCR prévia e diagnóstico de AIDS e outras arritmias ventriculares complexas também contribuem para a avaliação de prognóstico reservado A avaliação precisa da incidência de morte súbita tem sido mais complexa por causa do aumento da prevalência de uso do cardioversor desfibrilador interno automático5 14 26 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Vale ressaltar que todos os pacientes com indicação de transplante de órgãos sólidos inclusive transplante cardíaco são candidatos formais para Cuidados Paliativos pois têm doença avançada e podem ter alcançado sintomas de grande intensidade e desconforto A persistência da incerteza sobre o prognóstico torna a discussão com o paciente sobre as suas preferências de cuidados um momento muito difícil na melhor das hipóteses Um trabalho realizado com pacientes que têm câncer sugere que mesmo com 10 de probabilidade de não sobreviver aos próximos seis meses eles ponderam sobre diferen tes opções de tratamento51 Em parte por causa desses prognósticos de incerteza os pacientes que morrem de IC têm sido considerados os que têm a menor compreensão de sua condição e o menor envolvimento no processo de tomada de decisões relativas aos seus cuidados33 Um estudo de 274 óbitos 26 por DCV concluiu que alguns tratamentos foram suspensos ou retirados em 84 dos pacientes No entanto apenas 35 desses pacientes foram capazes de participar do processo de tomada de decisão18 Os doentes que morrem de IC não repentinamente apresentam um processo gradual de deterioração Esse proces so pode ser interrompido por episódios agudos que frequentemente aumentam o risco de morte súbita o que torna a previsão de riscos ainda mais difícil No entanto as condições crônicas cardiovasculares determinam grande sofrimento aos pacientes A morte em geral ocorre no hospital e embora essa tendência possa cor responder às preferências do paciente e de sua família aqueles com DCV estão entre os que menos recebem assistência domiciliar e Cuidados Paliativos Em 2000 os pacientes com DCV foram responsáveis por cerca de 20 de todos os encaminhamentos para Cuidados Paliativos exclusivos enquanto os com câncer consti tuem mais de 70 dos usuários de hospices americanos7 Estimase que apenas 4 dos pacientes com IC recebem Cuidados Paliativos5 A incerteza quanto ao prognóstico e à trajetória da fase final da vida de pacientes com IC pode induzir ao que foi denominado paralisia prognóstica Isso atrasa o início da discussão sobre os Cuidados Paliativos e a real efetividade dos tratamentos propostos até então47 Um dos autores deste artigo sugeriu que os pacientes que têm IC sejam considerados candidatos para os Cuidados Paliativos caso algum médico responda não à pergunta Você se surpreenderia se esse paciente morresse nos próximos 12 meses33 Na verdade para qualquer condição clínica de gravidade essa pergunta se aplica e poderia ser considerada o melhor critério de indicação para Cuidados Paliativos O período de 12 meses é bastante restrito se pensarmos em tempo de vida mas insuportavelmente longo se corresponder a tempo de sofrimento Outro algoritmo sugerido daria início aos Cuidados Paliativos durante ou logo após a recuperação de uma exacerbação aguda da IC21 O que parece claro a partir da experiên cia de muitos serviços é que os Cuidados Paliativos precisam ser considerados muito mais cedo no decurso do processo da DCV Doença pulmonar Assim como a maior parte das doenças crônicas determinar o prognóstico ou ainda a esperança de vida em pacientes que tenham DPOC é um campo cheio de incertezas Em todos os grupos idade tabagismo perda da função pulmonar e baixo índice de massa corporal IMC são importantes preditores de mortalidade4 8 25 27 42 27 Em pacientes idosos os preditores de mortalidade em DPOC incluem volume ex piratório forçado no primeiro segundo VEF1 gravidade da debilidade física idade avançada e uso de oxigênio por longo prazo Tabagismo depressão qualidade de vida e presença de comorbidades bem como frequência das internações por qualquer outra causa parecem não predizer mortalidade52 Se analisarmos as internações decorren tes de aumento da frequência de exacerbações da DPOC observamos que se correla ciona com o aumento da mortalidade sendo então um preditor independente de mau prognóstico46 Em pacientes com 65 anos ou mais a mortalidade após uma internação em unidade de terapia intensiva UTI por exacerbação de DPOC pode ser elevada che gando a 30 em cerca de 30 dias após a alta hospitalar Cinquenta e nove por cento falecem em um ano45 O mesmo estudo mostrou que a mortalidade hospitalar e a de longo prazo estiveram fortemente relacionadas com o comprometimento de outros órgãos e o aumento da gra vidade da doença pulmonar mas não com a necessidade de ventilação mecânica45 Na evolução de uma internação por exacerbação da DPOC em idosos comorbi dades depressão maior estado civil e índice de qualidade de vida demonstraram ser fortes preditores de mortalidade2 Mesmo assim pode ser difícil identificar quando um paciente de DPOC está entrando na fase final da evolução da sua doença Além disso grande parte do tratamento habitual de DPOC é de baixo risco e relacionado com os sintomas Esses fatores limitam a utilidade de uma distinção nítida entre os tratamen tos ativo e paliativo da doença principalmente em pacientes que apresentam períodos de relativa estabilidade Cerca de 20 a 25 dos pacientes que apresentam DPOC grave experimentam dor depressão ansiedade e dispneia intensa no fim da vida10 16 30 A intervenção de Cuidados Paliativos pode oferecer a oportunidade de discussão de escolhas nesse momento como renunciar à intubação e à ventilação mecânica limitar a duração dessas intervenções ou até mesmo recusar internação hospitalar Porém como são pouco referidas para Cuidados Paliativos essas discussões são infrequentes Doença renal Sabese que quase 20 dos pacientes com insuficiência renal sob tratamento dia lítico param a diálise antes da morte Provavelmente quase todos os nefrologistas es tão envolvidos nos cuidados de fim de vida desses pacientes com doença renal terminal DRT23 No entanto os médicos são mal treinados em Cuidados Paliativos e muitas vezes sentemse desconfortáveis com o cuidado de pacientes que morrem15 22 Em um estudo com médicos americanos e canadenses por exemplo apenas cerca de 40 dos 360 nefrologistas entrevistados afirmaram que se sentiam muito bem preparados para discutir decisões de fim de vida com seus pacientes15 No Brasil essa tendência ainda é pior pois ainda estamos longe das condições ideais de formação adequada na área de Cuidados Paliativos Com a progressão da doença renal os Cuidados Paliativos assumem grande importân cia levando a um gerenciamento mais adequado do controle de sintomas e à discussão sobre as diretrizes avançadas considerando a possibilidade de interrupção do tratamento dialítico por escolha do paciente e de sua família Os principais critérios de terminalidade para insuficiência renal são descritos no Quadro 2 28 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 2 Indicações de Cuidados Paliativos segundo as condições do paciente Paciente não é candidato à terapia curativa Paciente tem doença grave e prefere não ser submetido a tratamento de prolongamento da vida Nível inaceitável de dor por mais de 24 horas Sintomas nãocontrolados náusea dispneia vômitos etc Sofrimento psicossocial eou espiritual nãocontrolado Visitas frequentes ao atendimento de emergência mais de uma vez no mês pelo mesmo diagnóstico Mais do que uma admissão hospitalar pelo mesmo diagnóstico nos últimos 30 dias Internação prolongada sem evidência de melhora Internação prolongada em UTI Prognóstico reservado documentado pela equipe médica UTI unidade de terapia intensiva Doença hepática Nos Estados Unidos a doença hepática crônica DHC determina mais de um milhão de visitas médicas e mais de 300 mil internações por ano28 A progressão da doença hepática leva os pacientes a experimentarem complicações clínicas como encefalopatia desnutrição perda muscular ascite hemorragia de varizes esofagogástricas peritonite bacteriana espontânea fadiga e depressão O transplante de fígado uma opção válida de tratamento aumenta o tempo de vida e reduz muitos sintomas mas com a atual escassez de órgãos 10 a 15 desses pacientes morrem Muitos também não são candidatos a transplante devido à presença de comor bidades Além disso alguns pacientes transplantados sucumbem diante das complicações do transplante em si e enfrentam com suas famílias o dilema de uma doença potencial mente tratável mas ainda frequentemente fatal28 A atuação dos Cuidados Paliativos se propõe a oferecer ao paciente o controle dos sinto mas tanto na espera do transplante como nos cuidados após o procedimento Os critérios de indicação para Cuidados Paliativos são os mesmos da indicação do transplante mas direcio nada para os pacientes que não podem realizar a cirurgia A interface mais intensa se apre senta na condição de falha do transplante ou detecção de condições mórbidas que agravem o quadro do paciente como por exemplo o câncer hepático Observase o compromisso de maximizar a qualidade e se possível o tempo de vida Indicações de Cuidados Paliativos em UTI As UTIs fornecem tratamentos sofisticados a doentes graves Os pacientes portadores de doenças crônicas que apresentam exacerbações ao longo da evolução da doença estão vivendo mais tempo por causa dos avanços oferecidos em seus tratamentos e em geral vivem mais mas com piores condições de vida 29 Infelizmente ainda existem muitas barreiras para prestar Cuidados Paliativos eficazes nessa área da saúde Porém graças à boa prática médica à medicina com base em evi dências e ao bom senso a ciência está ao lado dos Cuidados Paliativos12 Em 2006 a revista Critical Care Medicine publicou um suplemento inteiro dedicado ao tema Cuidados Paliativos na UTI contemplando diversos dilemas vividos nesse setor Além da formação insuficiente do médico e de sua dificuldade em perceber que não pode mais atuar em direção à cura temos ainda a dificuldade de encarar a própria finitude e a impotência diante da inevitabilidade da morte Os problemas éticolegais que permeiam essas decisões também influenciam a vivência desses dilemas Entre os dilemas de comunicação temos38 39 comunicação insuficiente sobre as decisões de fim de vida incapacidade de pacientes de participar nas discussões sobre seu tratamento expectativas nãorealistas por parte dos pacientes e de seus familiares sobre o prognós tico ou a eficácia do tratamento na UTI falta de oportunidades para discussão sobre a forma como eles desejam receber os cuidados no final da vida Podemos considerar algumas situações encontradas em UTI que nos auxiliam a identificar pacientes que teriam benefício em receber atenção de Cuidados Paliativos Quadro 339 Quadro 3 Critérios de indicação para Cuidados Paliativos em UTI39 Admissão proveniente de instituição de longa permanência portador de uma ou mais condições crônicas limitantes por exemplo demência Duas ou mais estadias na UTI na mesma internação Tempo prolongado de ventilação mecânica ou falha na tentativa de desmame Falência de múltiplos órgãos Paciente candidato à retirada de suporte ventilatório com possibilidade de óbito Câncer metastático Encefalopatia anóxica Sofrimento familiar que comprometa a tomada de decisões UTI unidade de terapia intensiva HIVAIDS Apesar dos avanços no tratamento do HIVAIDS ainda não existe cura conhecida Ao contrário de outras doenças terminais como o câncer não é fácil prever quando a morte é iminente Um paciente com AIDS pode morrer em consequência de sua pri meira manifestação do HIV ou em constante risco de adquirir novas doenças capazes de abreviar sua vida A maioria dos pacientes no entanto vive com frequentes problemas de saúde até a fase de imunossupressão grave ao longo de vários anos À medida que a doença progride a necessidade de alívio sintomático tornase mais importante do que o tratamento curativo 30 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Os pacientes com AIDS estarão na fase terminal da sua doença se19 CD4 25 célulasmcl carga viral persistente 100 mil cópiasml houver associação a qualquer uma das situações abaixo linfoma de sistema nervoso central SNC perda de 33 de massa corporal magra bacteremia por Mycobacterium avium nãotratada que não responde ao tratamento ou o recusa leucoencefalopatia multifocal progressiva linfoma sistêmico com doença avançada pelo HIV e resposta parcial à quimioterapia sarcoma de Kaposi visceral nãoresponsivo à terapia insuficiência renal nãoelegível ou que não deseja diálise infeccção por Cryptosporidium toxoplasmose que não responde à terapêutica baixa performance status Karnofsky menor que 50 Paciente com AIDS sem critérios de terminalidade como os descritos anteriormente devem receber recomendação para Cuidados Paliativos quando houver19 diarreia persistente por um ano albumina sérica menor que 25 uso persistente de drogas ilícitas idade 50 anos ausência de terapia retroviral quimioterapia e outras medicações relacionadas com a profilaxia da doença por HIV demência avançada por AIDS toxoplasmose e ICC sintomática ao repouso Doença neurológica de longa duração Cuidar de pacientes graves com doenças irreversíveis e progressivas já se configura um desafio diário na prática dos Cuidados Paliativos Por outro lado cuidar de pacientes com doenças graves incuráveis com condições de dependência irreversíveis mas que apresentam progressão lenta e imprevisível ainda é o maior desafio de qualquer profis sional da área da saúde Os pacientes portadores de doenças neurológicas de instalação precoce ou adquirida na fase mais tardia da vida apresentam sofrimentos de menor ou maior intensidade físi cos emocionais familiares sociais e espirituais e que frequentemente não são detectados por seus médicos cuidadores ou familiares O lugar dos Cuidados Paliativos nãooncológicos está sendo progressivamente reco nhecido1 35 40 44 especialmente em condições neurológicas rapidamente fatais como a doença do neurônio motor DNM29 41 Muitos guidelines agora recomendam a indicação precoce de Cuidados Paliativos para esses casos36 37 Pacientes com essas doenças possuem necessidades diferentes dos portadores de câncer36 40 49 e podem ser caracterizados como portadores de sintomas de desconforto relacionados com sua condição neurológica com duração e intensidade muito variáveis Devido ao comprometimento cognitivo muitas vezes os sintomas são avaliados indireta mente por meio da percepção de familiares e cuidadores 31 Isso traz algumas dificuldades para a equipe de Cuidados Paliativos com relação ao manejo adequado de sintomas em geral as condições neurológicas apresentam curso de evolução longo e raramente conseguimos identificar claramente quando se inicia a fase final da doença os sintomas são variados e muitos pacientes apresentam disfunção cognitiva compor tamental ou de comunicação além de déficits físicos Nessa realidade fica muito difícil avaliar a diferença entre disfasia e déficit cognitivo levando a equipe de Cuidados Paliativos a procurar por constantes atualização e treina mento para o manejo desses pacientes É comum a crença de que a reabilitação é uma intervenção de curta duração e rela cionada com um evento pontual Entretanto o manejo da condição crônica de disfun cionalidade é um fator central no sucesso dos cuidados dispensados a esses pacientes determinando a qualidade de assistência oferecida no final de vida24 32 Na doença neu rológica de longa duração a interface entre o neurologista o fisiatra e o Cuidado Paliati vo encontra uma rara clareza de papéis que pode ser transportada para outras condições clínicas facilitando até a discussão entre os serviços provedores dos cuidados convênios seguros e serviço público O Royal College of Physicians renomada instituição inglesa publicou um excelente guideline de cuidados aos pacientes com doenças neurológicas da longa duração48 Um dos propósitos do trabalho foi explorar a interação entre essas especialidades médicas e definir o papel de cada uma delas nos cuidados dos pacientes nessas condições A pesquisa mostrou um alinhamento sobre as contribuições oferecidas por cada especiali dade embora não tenha foco na atuação multiprofissional que se desencadeia a partir da atuação médica O neurologista se envolve na avaliação no diagnóstico e no manejo da doença neurológica o fisiatra coordena a terapia o equipamento e as ações de suporte social e psicológico durante a fase entre o diagnóstico e a morte sem o intuito de realizar o trabalho dos profissionais específicos Os médicos de Cuidados Paliativos são os respon sáveis pelas recomendações dos cuidados terminais e pelo manejo do processo de morte e luto que é realizado por ele e por todos os profissionais da equipe Deficiência mental As pessoas com doenças mentais morrem prematuramente em comparação com a população em geral Apesar disso existem poucos relatórios ou estudos de investigação sobre planejamento dos cuidados no fim de vida desses pacientes Informações básicas sobre as circunstâncias da morte preferências dos cuidados de saúde ou disponibilidade de hospice e serviços de Cuidados Paliativos nunca foram avaliadas para essa população mesmo em países desenvolvidos Essa informação é importante para o planejamento sen sato de práticas procedimentos e orientações a fim de proporcionar qualidade de vida para pessoas com doença mental Acidente vascular encefálico Os principais critérios para indicação de Cuidados Paliativos para pacientes que so freram um acidente vascular encefálico AVE contemplam avaliação nutricional e capa cidade funcional 32 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP escala de performance paliativa PPS vide capítulo sobre avaliação do paciente menor ou igual a 40 como descrito adiante nos próximos itens grau de deambulação permanece principalmente na cama atividadeextensão da doença incapaz de trabalhar incapacidade para autocuidado ingestas alimentar e hídrica diminuídas estado de consciência sonolentoconfuso perda de peso 10 durante os seis meses anteriores perda de peso 75 nos últimos três meses albumina sérica 25 gdl história atual de aspiração pulmonar sem resposta efetiva das intervenções fonoau diológicas Demência Para a doença de Alzheimer DA e outras enfermidades relacionadas a identifica ção de determinadas alterações estruturais e comprometimentos funcionais além das frequentes comorbidades deve servir como base para intervenções e planejamento dos Cuidados Paliativos Em última instância na fase terminal de doença os efeitos combina dos da DA Functional Assessment Staging FAST estádio 743 e qualquer outro estado de comorbidade ou condição secundária delirium úlceras de pressão pneumonia aspirativa devem ser tais que caracterizem um prognóstico de seis meses ou menos19 Esclerose lateral amiotrófica A esclerose lateral amiotrófica ELA é um distúrbio neurodegenerativo de origem des conhecida progressivo e associado à morte do paciente em um tempo médio entre três e quatro anos Sua incidência estimada é de um a 25 indivíduos portadores para cada 100 mil habitantesano com prevalência de 25 a 85 por 100 mil habitantes A ELA tende a progredir de forma linear ao longo do tempo de modo que a taxa global de redução funcional em cada paciente é bastante constante e previsível Embora geral mente se apresente em uma área anatomicamente localizada a identificação do local de apresentação inicial não tem relação com o tempo de sobrevida Em sua fase final de ELA dois fatores são cruciais para determinar o prognóstico a capacidade de respirar e em menor medida a capacidade de deglutição19 No Quadro 4 encontramos as indicações de Cuidados Paliativos para ELA Considera se que um paciente está em fase terminal de ELA quando apresenta uma das situações que se seguem dentro dos últimos 12 meses Considerações especiais Alguns pacientes idosos apresentam condições de fragilidade intensa sem diagnóstico específico mas que parecem estar em declínio progressivo de vitalidade e aparentemente desenvolvendo trajetória previsível em direção à morte dentro dos próximos meses Para esses pacientes a indicação de Cuidados Paliativos é importante com o objetivo de atingir a condição de bemestar global Indicações nãoconvencionais para Cuidados 33 Quadro 4 Indicações de Cuidados Paliativos para pacientes com ELA Capacidade respiratória diminuída conforme critérios Capacidade vital inferior a 30 do normal Significativa dispneia em repouso Necessidade de oxigênio suplementar em repouso Paciente recusa ventilação artificial Outros critérios para indicação de Cuidados Paliativos Progressão para deambulação dependente de cadeira de rodas Dificuldade para falar discurso pouco inteligível ou ininteligível Progressão da dieta normal para pastosa Progressão de dependência na maioria ou em todas as principais AVDs ou necessidade de assistência para todas as AVDs Comprometimento nutricional crítico Ingestão de nutrientes e fluidos insuficientes para sustentar a vida Perda de peso continuada Desidratação ou hipovolemia Ausência de métodos de alimentação artificial Complicações com risco de vida Pneumonia aspirativa recorrente Infecção do trato urinário superior Sepse Febre recorrente após a terapia antibiótica ELA esclerose lateral amiotrófica AVDs atividades da vida diária Paliativos como a síndrome da fragilidade incluem indivíduos idosos com comprometi mento funcional progressivo perda de peso progressiva e que podem ter várias doenças crônicas simultâneas por exemplo hipertensão arterial doença coronariana diabetes mas sem condição fatal iminente Eles podem ter tido uma aceleração recente dos declínios cognitivo e funcional ou ter tomado decisão de não prosseguir com o tratamento agressivo devido a idade avançada má saúde geral estado cognitivo ou custos excessivos Em pacientes idosos uns dos mais sensíveis nessas condições da síndrome da fragili dade a perda de peso inexplicável de 10 ao longo de um período de seis meses ou um IMC 22 kgm2 indica Cuidados Paliativos A combinação de perda de peso progressiva e dificuldades com as atividades da vida diária AVDs é importante preditor de mortalidade em seis meses geralmente mais re levante do que diagnóstico estado mental ou admissão em UTI19 Se essas condições estiverem presentes a comunicação adequada com esses pacientes e suas famílias pode facilitar o planejamento das diretrizes avançadas Isso reduz muito o estresse causado pelas condições de agudização e intercorrências clínicas nesses indivíduos O Quadro 5 resume as indicações de Cuidados Paliativos 34 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Referências 1 ADDINGTONHALL J FAKHOURY W MCCARTHY M Specialist palliative care in nonmalignant disease Palliat Med v 12 p 41727 1998 2 ALMAGRO P et al Mortality after hospitalization for COPD Chest v 121 n 5 p 14418 2002 3 AMERICAN HEART ASSOCIATION Heart and Stroke Statistics 2006 Update Dallas American Heart Association 2005 Disponível em httpwwwamericanheartorg 4 ANTHONISEN N R WRIGHT E C HODGKIN J E Prognosisin chronic obstructive pulmonary disease Am Rev Respir Dis v 133 n 1 p 1420 1986 Quadro 5 Considerar a consulta sobre Cuidados Paliativos para pacientes com critérios de terminalidade de suas doenças de base26 Câncer Qualquer paciente com câncer metastático ou inoperável Doenças cardíacas Sintomas de ICC durante o repouso FE 20 Uma nova disritmia Ataque cardíaco síncope ou AVC Idas frequentes ao PS devido aos sintomas Doenças pulmonares Dispneia durante o repouso Sinais ou sintomas de insuficiência cardíaca direita Saturação de O2 88 pCO2 50 Perda de peso nãointencional Demência Incapacidade para andar Incontinência Menos de seis palavras inteligíveis Albumina 25 ou menor ingestão por via oral Idas frequentes ao PS Doenças hepáticas TP 5 s Albumina 25 Ascite refratária Peritonite bacteriana espontânea Icterícia Desnutrição ou perda de massa muscular Doenças renais Não candidato à diálise Depuração da creatinina 15 mlmin Creatinina sérica 6 Síndrome da fragilidade Idas frequentes ao PS Albumina 25 Perda de peso nãointencional Úlceras de decúbito Confinamento ao leitodomicílio ICC insuficiência cardíaca congestiva FE fração ou ejecção AVC acidente vascular cerebral PS prontosocorro pCO2 pressão parcial de CO2 TP tempo de protrombina 35 5 BARDY G H et al Amiodarone or an implantable cardioverterdefibrillator for congestive heart failure N Engl J Med v 352 p 22537 2005 6 BERGER R et al Btype natriuretic peptide predicts sudden death in patients with chronic heart failure Circulation v 105 p 23927 2002 7 BOUVY M L et al Predicting mortality in patients with heart failure a pragmatic approach Heart v 89 p 6059 2003 8 BURROWS B EARLE R H Prediction of survival in patients with chronic airway obstruction Am Rev Respir Dis v 99 n 6 p 86571 1969 9 CHRISTAKIS N A LAMONT E B Extent and determinants of error in doctors prognoses in terminally ill patients prospective cohort study BMJ v 320 p 46972 2000 10 CLAESSENS M T et al Dying with lung cancer or chronic obstructive pulmonary disease insights from SUPPORT Study to Understand Prognoses and Preferences for Outcomes and Risks of Treatments J Am Geriatr Soc v 48 suppl 5 p S14653 2000 11 COHN J N et al Acomparison of enalapril with hydralazineisosorbide dinitrate in the treatment of chronic congestive heart failure N Engl J Med v 325 p 30310 1991 12 BYOCK I Improving palliative care in intensive care units identifying strategies and interventions that work Crit Care Med v 34 suppl 11 S3025 2006 13 DADOS DE MORTALIDADE BRASIL Disponível em httpw3datasusgovbrdatasusdatasus 14 DAUBERT J P et al Predictive value of ventricular arrhythmia inducibility for subsequent ventricular tachycardia or ventricular fibrillation in multicenter automatic defibrillator implantation trial MADIT II patients J Am Coll Cardiol v 47 p 98107 2006 15 DAVISON S N et al Nephrologistsreported preparedness for endoflife decisionmaking Clin J Am Soc Nephrol v 1 p 1256 2006 16 ELKINGTON H et al Thelast year of life of COPD a qualitative study of symptoms and services Respir Med v 98 n 5 p 43945 2004 17 EMANUEL L L BONOW R O Libby Braunwalds heart disease a textbook of cardiovascular medicine 8 ed Chapter 30 Care of Patients with EndStage Heart Disease 18 FABERLANGENDOEN K A multiinstitutional study of care given to patients dying in hospitals ethical and practice implications Arc Intern Med v 156 p 21306 996 19 FINE P Hospice referral and care practical guidance for clinicians Disponível em httpcme medscapecomviewarticle487401 20 GUNDA S THOMAS M SMITH S National survey of palliative care in endstage renal disease in the UK Nephrol Dial Transplant v 20 p 392 2005 21 HAUPTMAN P J HAVRANEK E P Integrating palliative care into heart failure care Arch Intern Med v 165 p 3748 2005 22 HOLLEY J L et al The need for endoflife care training in nephrology National survey results of nephrology fellows Am J Kidney Dis v 42 p 813 2003 23 HOLLEY J L Up to date Palliative care in endstage renal disease Disponível em httpwww uptodatecompatientscontenttopicdo 24 JOHNSON J SMITH P GOLDSTONE L Executive summary Evaluation of MS specialist nurses a review and development of the role London and Letchworth South Bank University and MS Research Trust 2001 25 KANNER R E et al Predictors of survival in subjects with chronic air flow limitation Am J Med v 74 n 2 p 24955 1983 26 KINZBRUNNER B M Predicting Prognosis how to decide when endoflife care is needed In KINZBRUNNER B M WEINREB N J POLICZER J 20 Common Problems in EndofLife Care New York McGraw Hill 2001 27 LANDBO C et al Prognostic value of nutritional status in chronic obstructive pulmonary disease Am J Respir Crit Care Med v 160 n 6 p 185661 1999 28 LARSON A M CURTIS J R Integrating palliative care for liver transplant candidates Too Well for Transplant Too Sick for Life JAMA v 295 n 18 p 216876 2006 doi101001jama295182168 29 LEIGH P N et al The management of motor neurone disease J Neurol Neurosurg Psychiatry v 74 suppl 4 p 3247 2003 30 LYNN J et al Living and dying with chronic obstructive pulmonary disease J Am Geriatr Soc v 48 5 suppl p S91S100 2000 31 MAISEL A Btype natriuretic peptide levels diagnostic and prognostic in congestive heart failure 36 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Circulation v 105 p 232831 2002 32 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primary and secondary care London Royal College of Physicians 2003 38 NELSON J E DANIS M Endoflife care in the intensive care unit where are we now Crit Care Med v 29 suppl 2 p N29 2001 Review 39 NELSON J E MEIER D E Palliative care in the intensive care unit Part I Journal of Intensive Care Medicine v 14 n 3 p 1309 1999 40 OBRIEN T Neurodegenerative disease In ADDINGTONHALL U M HIGGONSON I J eds Palliative care for noncancerpatients Oxford Oxford University Press p 4453 2001 41 OBRIEN T KELLY M SAUNDERS C Motor neurone disease a hospice perspective BMJ v 304 p 4713 1992 42 POSTMA D S et al Assessment of ventilatory variables in survival prediction of patients with chronic airflow obstruction the importance of reversibility Eur J Respir Dis v 67 n 5 p 36081 1985 43 REISBERG B Functional assessment staging FAST Psychopharmacol Bull v 24 p 65359 1998 44 Royal College of Physicians Palliative care services meeting the needs of patients Report of a working party London RCP 2007 45 SENEFF M 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v 8 p 23742 2006 51 WEEKS J C et al Relationship between cancer patients predictions of prognosis and their treatment preferences JAMA v 279 p 170914 1998 52 YOHANNES A M BALDWIN R C CONNOLLY M Mortality predictors in disabling chronic obstructive pulmonary disease in old age Age Ageing v 31 n 2 p 13740 2002 37 Avaliação do paciente sob Cuidados Paliativos mAriA Goretti sAles mACiel Introdução Um dos paradigmas da medicina paliativa no contexto atual é afirmar que a morte é parte da vida e fenômeno fisiológico que quando inicia seu processo cursa de forma irreversível O desafio é a boa avaliação do doente além da identificação de parâmetros que apoiem de formas científica e clínica o diagnóstico desse processo Cuidados Paliativos e medicina paliativa requerem conhecimento técnico refinado aliado à percepção do ser humano como agente de sua história de vida e determinante do seu próprio curso de adoecer e morrer Valorizamse as histórias natural da doença pessoal de vida e as reações fisiológicas emocionais e culturais diante do adoecer Pro movemse uma atenção dirigida para o controle de sintomas e o bemestar do doente e de seu entorno Os familiares precisam compreender a evolução da doença e da cadeia de acontecimentos que levará ao evento final É por essa questão que há necessidade de uma prática altamente individualizada Medicina paliativa não é medicina de protocolos clínicos mas de princípios e como tal deve partir da prerrogativa de que a melhor ferramenta para a boa paliação de sintomas é a avaliação do paciente Independentemente da modalidade de atendimento em regime de internação ou am bulatorial a avaliação do paciente deve conter elementos fundamentais que possibilitem a compreender quem é a pessoa doente o que facilita identificar preferências e dificul dades qual a cronologia da evolução de sua doença e os tratamentos já realizados as necessidades atuais e os sintomas o exame físico os medicamentos propostos as demais decisões clínicas e a impressão a respeito da evolução do prognóstico e das expectativas em relação ao tratamento proposto As evoluções subsequentes devem registrar o impacto do tratamento proposto a ava liação dos sintomas o exame físico os resultados de eventuais exames e as novas propos tas assim como as informações trocadas com o paciente e seus familiares A conclusão do caso clínico deve resumir os principais fatos da internação e quando for o caso estabelecer um plano de cuidados que contemple as necessidades do doente nas próximas semanas até a próxima vista ou consulta No caso de óbito deve constar o relato sucinto das últimas horas de vida Os principais elementos da avaliação clínica do doente estão relacionados a seguir Dados biográficos Devem conter nome e forma como gosta de ser chamado sexo e idade estado marital filhos e netos se os tiver trabalho que realizou por mais tempo ou com o qual mais se identificou 38 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP local de nascimento e região de moradia com quem mora e por quem é cuidado a maior parte do tempo religião e crenças o que gosta de fazer o que sabe sobre sua doença e o quanto quer saber Esses dados podem ser colhidos com o doente em conversa aparentemente informal para que se possa estimulálo a descreverse e para que permita a percepção de quem é Se algo na conversa chamar a atenção do profissional deve ser descrito Exemplo Maria de Fátima 56 anos casada por 25 anos e divorciada há cinco Três filhas 29 25 e 20 anos e duas netas 5 e 3 anos Professora do ensino fundamental aposentada há dois anos gosta de cozinhar e cuidar das netas Nasceu em Minas mora na Aclimação com as duas filhas mais novas é católica praticante e muito religiosa Sabe de sua doença e da gravidade mas tem fé na possibilidade de cura Cronologia da doença atual e tratamentos realizados Tratase do registro da doença de base com a época mês e ano do diagnóstico e o tratamento realizado no mesmo período Em seguida a sequência de diagnósticos secundários à doença de base com época e tratamentos Registrar também outras complicações relacionadas com o quadro principal e os diagnósticos nãorelacionados com a doença em questão ou preexistentes Exemplo Câncer de mama outubro1998 mastectomia radioterapia quimioterapia metástase óssea maio2007 radioterapia metástases pulmonar e pleural setembro2008 quimioterapia pleurodese metástase para o sistema nervoso central SNC atual neurocirurgia radioterapia finalizada há uma semana trombose venosa profunda de membro inferior direito MID janeiro2009 anticoagulantes outros hipertensão leve controlada De forma sucinta a cadeia de eventos está clara e indica a evolução da doença os recursos terapêuticos usados e os outros diagnósticos que precisam ser observados Avaliação funcional A avaliação funcional em Cuidados Paliativos é fundamental para a vigilância da curva evolutiva da doença e se constitui em elemento valioso na tomada de decisões na previsão de prognóstico e no diagnóstico da terminalidade Existem algumas escalas de avaliação funcional que podem ser usadas em Cuidados Paliati vos Os serviços de oncologia costumam usar a escala de Karnofsky elaborada nos anos 1940 A escala de Karnosfsky ainda é muito usada em oncologia para a tomada de decisões9 10 Em 1996 o Victoria Hospice no Canadá desenvolveu um instrumento de avaliação de performance com base no Karnosfky e adaptado aos Cuidados Paliativos Tratase da Palliative Performance Scale PPS Em 2002 aperfeiçou a escala agregando texto de instruções e definições1 11 39 A escala possui 11 níveis de performance da 0 a 100 divididos em intervalos de 10 ou seja não existem valores intermediários A PPS deve ser utilizada todos os dias para pacientes internados em todas as consul tas ambulatoriais e visitas domiciliares A tradução oficial para o português está sendo desenvolvida por profissionais da Aca demia Nacional de Cuidados Paliativos ANCP em São Paulo O Quadro 1 mostra a tradução preliminar brasileira Quadro 1 Palliative Performance Scale PPS Deambulação Atividade e evidência de doença Autocuidado Ingesta Nível da consciência 100 Completa Atividade normal e trabalho sem evidência de doença Completo Normal Completo 90 Completa Atividade normal e trabalho alguma evidência de doença Completo Normal Completo 80 Completa Atividade normal com esforço alguma evidência de doença Completo Normal ou reduzida Completo 70 Reduzida Incapaz para o trabalho doença significativa Completo Normal ou reduzida Completo 60 Reduzida Incapaz para hobbies trabalho doméstico doença significativa Assistência ocasional Normal ou reduzida Completo ou períodos de confusão 50 Maior parte do tempo sentado ou deitado Incapacitado para qualquer trabalho doença extensa Assistência considerável Normal ou reduzida Completo ou períodos de confusão 40 Maior parte do tempo acamado Incapaz para a maioria das atividades doença extensa Assistência quase completa Normal ou reduzida Completo ou sonolência confusão 30 Totalmente acamado Incapaz para qualquer atividade doença extensa Dependência completa Normal ou reduzida Completo ou sonolência confusão 20 Totalmente acamado Incapaz para qualquer atividade doença extensa Dependência completa Mínima a pequenos goles Completo ou sonolência confusão 10 Totalmente acamado Incapaz para qualquer atividade doença extensa Dependência completa Cuidados com a boca Sonolência ou coma confusão 0 Morte Fonte Victoria Hospice Society J Pall Care v 9 n 4 p 2632 Tradução livre de Maria Goretti Maciel Ricardo Tavares de Carvalho 40 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A PPS tem sido usada na tomada de decisões em Cuidados Paliativos e parece ter algum valor prognóstico quando associada a outros sintomas como edema delirium dispneia e baixa ingesta alimentar68 12 A construção de um gráfico diário a partir dos registros da PPS tem ajudado na compre ensão da evolução da doença em pacientes internados na enfermaria de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual HSPE desde o início de janeiro de 2009 Exemplo O sr A S 89 anos com diagnóstico de carcinoma espinocelular de esôfago era acompanhado no domicílio e o último registro de PPS era de 60 em 4 de janeiro uma semana antes da internação hospitalar que durou 19 dias No prontosocorro em 12 de janeiro a queixa inicial era de confusão e sonolência e PPS de 40 atribuídos inicial mente à infecção do trato urinário No primeiro dia na enfermaria fez quadro de delirium agitado seguido de torpor caindo a PPS para 10 O diagnóstico definitivo foi de hiper calcemia Iniciado o tratamento houve resposta razoável elevando a PPS para 30 Após sete dias de tratamento e ajustes terapêuticos começou a recuperar desempenho funcio nal e retornou a 50 patamar ideal para alta hospitalar em 29 de janeiro Figura 70 Domicílio PS Internação 15jan 16jan 17jan 18jan 19jan 20jan 21jan 22jan 23jan 24jan 25jan 26jan 27jan 28jan Alta 60 50 40 30 20 10 0 PPS Figura PPS diária paciente A S 89 anos CEC de esôfago Fonte Registros diários enfermaria de Cuidados Paliativos HSPE 2009 PS prontosocorro PPS Palliative Performance Scale Avaliação de sintomas Objetivo e tarefa dos Cuidados Paliativos a avaliação de sintomas deve ser realizada de forma sistemática na admissão nas evoluções diárias consultas ambulatoriais e visitas domiciliares A Edmonton Symptom Assessment Scale ESAS desenvolvida no Canadá é um ins trumento valioso nessa tarefa Consiste num pequeno questionário com nove sintomas determinados e um décimo de livre escolha do paciente que passará a ser registrado dia riamente A cada sintoma solicitase ao paciente que atribua uma nota de 0 a 10 sendo 41 0 a ausência do sintoma e 10 a sua maior intensidade O profissional deve se manter im parcial e permitir que o paciente expresse a sua própria avaliação A ESAS inclui sintomas objetivos e subjetivos Na impossibilidade de o paciente estabelecer uma comunicação coerente dementados por exemplo a ESAS pode ser preenchida por seu cuidador com base na observação cuidadosa do seu comportamento e nesse caso os sintomas subjeti vos cansaço depressão ansiedade e malestar devem ser deixados em branco24 5 A tradução para o português que apresentamos foi realizada pela Dra Isabel Galriça Neto de Portugal e sua validação no Brasil está em andamento A ESAS deve ser avaliada criteriosamente todos os dias e usada como plataforma para as ações necessárias para o alívio de sintomas usandose todos os recursos necessários para esse fim Quadro 2 Por princípio nenhum questionamento deve ser feito ao paciente se não for utilizado em seu benefício Por isso é que os interrogatórios devem ser breves objetivos e práticos também para a equipe Em Cuidados Paliativos escalas longas e cansativas devem ser evitadas Além da ESAS deve ser realizado o registro livre do motivo principal da consulta ou internação das necessidades do doente e das suas preocupações subjetivas Novas obser vações e elaborações acerca de sua evolução e percepção da doença devem ser sempre registradas Quadro 2 Escala de Avaliação de Sintomas de Edmonton ESAS Avaliação de sintomas Paciente Registro Preenchido por Data Por favor circule o nº que melhor descreve a intensidade dos seguintes sintomas neste momento também se pode perguntar a média durante as últimas 24 horas Sem dor 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior dor possível Sem cansaço 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior cansaço possível Sem náusea 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior náusea possível Sem depressão 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior depressão possível Sem ansiedade 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior ansiedade possível Sem sonolência 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior sonolência possível Muito bom apetite 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior apetite possível Sem falta de ar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior falta de ar possível Melhor sensação de bemestar possível 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior sensação de bemestar possível Outro problema 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Fonte Regional Palliative Care Program Capital Health Edmonton Alberta 2003 Traduzido e adaptado ao português por Neto IG 2006 42 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Exames físico e complementares e avaliações de especialistas Os procedimentos clínicos em Medicina Paliativa são os mesmos da prática clínica Porém por princípio o Cuidado Paliativo objetiva o bemestar e o conforto do doente Isso significa que nenhum exame clínico nenhuma coleta de exames ou outra forma de investigação devem ser realizados se não tiverem por objetivo a compreensão necessá ria ao alívio de um sintoma ou ao controle de situação potencialmente reversível Especialmente na fase final da vida nada justifica por exemplo aplicar ao doente um es tímulo doloroso para investigar seu nível de consciência colher exames ou realizar exames de imagem apenas para documentação do caso utilizar placebos ou suspender analgésicos e outros medicamentos agora essenciais para testar nível de consciência no doente Avaliações e procedi mentos especializados que não tragam benefício para o doente não devem ser solicitados Decisões terapêuticas Um prontuário em Cuidados Paliativos deve conter todas as decisões terapêuticas tomadas a partir de uma avaliação clínica medicamentos e doses início ou suspensão de medidas solicitações de exames e avaliações necessidades de intervenções psíquicas necessidades sociais intervenções realizadas ou solicitadas com a família necessidades espirituais efeito esperado das ações Impressão e prognóstico Componentes fundamentais da avaliação em Cuidados Paliativos a impressão acerca do estado em que se encontra o doente a expectativa acerca do tratamento proposto e a impressão prognóstica devem constar na admissão e todas as vezes em que forem modificadas ao longo do tempo Uma forma simplificada de fazer o registro e comunicar o prognóstico é estabelecer prazos horas a dias pacientes com perfil de últimas 48 horas dias a semanas perfil de últimas semanas de vida semanas a meses habitualmente até seis meses de expectativa meses a anos para expectativas superiores a seis meses Plano de cuidados Considerando a possibilidade de trabalho em rede assistencial é fundamental que cada consulta visita ou internação resulte em um plano de cuidados ao paciente e à família Qual quer que seja a fase da doença é fundamental ter clareza do problema das necessidades da evolução em que se encontra e da possibilidade de antever e prevenir novas crises O plano de cuidados deve ser claro o bastante para que o tratamento proposto possa ser continuado por toda a rede assistencial inclusive em unidades de emergência e hos 43 pitais gerais onde o paciente poderá ser atendido por outras equipes O Quadro 3 propõe um modelo de plano de cuidados de preenchimento simples e objeti vo Nele priorizase o registro da identificação do doente do cuidador e do médico responsá vel dos principais diagnósticos da PPS em caso de internações inicial e final da última ESAS das medicações em uso e por fim das recomendações para as próximas semanas Quadro 3 Plano de cuidados Serviço de Cuidados Paliativos Plano de cuidados Nome Cuidador Médico CRM Idade Sexo Prontuário Data Diagnósticos PPS inicial PPS atual 1 2 3 4 5 6 Escala de avaliação de sintomas de Edmonton Medicamentos Dor 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 1 Fadiga 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 2 Náusea 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 3 Depressão 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 4 Ansiedade 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 5 Sonolência 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 6 Falta de apetite 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 7 Falta de ar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 8 Malestar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 9 Outro sintoma 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 10 Recomendações Retorno Profissional PPS Palliative Performance Scale 44 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Exemplo manter curativos das feridas com metronidazol tópico vigiar capacidade de deglutição vigiar sintomas de hipercalcemia ter atenção à filha mais nova e às netas providenciar isenção de transporte para a filha cuidadora Sugestão de impressos Os impressos usados em unidades de Cuidados Palaitivos devem ser simples de fáceis visualização e preenchimento sem omitir informações fundamentais No Anexo 1 há uma ficha de encaminhamento para ser usada por outros serviços ou especialidades para referir pacientes à unidade de Cuidados Paliativos No verso a equipe preenche dados sobre o cuidador e endereços determina a PPS circulando os itens compatíveis e com base na performance determina a forma de atendimen to Pacientes com PPS igual ou superior a 50 podem ser atendidos em unidade am bulatorial Aqueles com PPS entre 30 e 40 devem ser atendidos no domicílio e os com PPS de 20 ou 10 devem ser referidos para atendimento imediato em unida de de internação quando forem portadores de doença rapidamente progressiva O Anexo 2 é composto por uma ficha médica ambulatorial para ser usada na primeira consulta em frente e verso O Anexo 3 é uma sugestão de ficha de prontuário domiciliar com base no plano de cuidados que deve ser renovado a cada visita O verso da ficha é usado para texto livre caso o profissional julgue necessário As fichas estão acessíveis para download no site da ANCP wwwpaliativoorgbr Referências 1 ANDERSON F et al Palliative Performance Scale PPS a new tool J Palliat Care v 12 n 1 p 5 e 11 1996 2 BRUERA E et al The Edmonton Symptom Assessment System ESAS a simple method of the assessment of palliative care patients Journal of Palliative Care v 7 p 69 1991 3 BRUERA E MACDONALD S Audit methods the Edmonton Symptom Assessment In HIGGINSON I ed Clinical audit in palliative care Oxford Radcliffe Medical Press p 6177 1993 4 CAPITAL HEALTH Guidelines for using Edmonton Symptom Assessment System ESAS Capital Health PDF 2001 5 CHANG V T HWANG S S FEUERRMAN M Validation of the Edmonton Symptom Assessment Scale Cancer v 88 n 9 p 216471 2000 6 HEAD B RITCHIE C S SMOOT T N Prognostication in hospice care can the palliative performance scale help Journal of Palliative Medicine v 8 n 3 p 492502 2005 7 LAU F et al Using the Palliative Performance Scale to provide meaningful survival estimates Journal of Pain and Symptom Manegement in press 2009 8 MORITA T et al Validity of the Palliative Performance Scale from a performance scale from a survival perspective J Pain Symptom Manage v 18 n 1 p 23 1999 letter 9 OTOOLE D M GOLDEN A M Evaluating cancer patients for rehabilitation potential West J Med v 155 p 3847 1991 10 SCHAG C C HEINRICH R L GANZ P A Karnofsky performance status revisited reliability validity and guidelines J Clin Oncology v 2 p 18793 1984 45 11 VICTORIA HOSPICE SOCIETY Palliative Performance Scale PPS 2004 12 VIRIK K GLARE P Validation of the Palliative Performance Scale for inpatients admitted to a palliative care unit in Sydney Australia J Pain Symptom Manage v 23 n 6 p 4557 2002 46 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Anexo 1 FICHA DE ENCAMINHAMENTO CUIDADOS PALIATIVOS NOME Idade Sexo Nº prontuário Serviço Médico CRM Diagnóstico principal época Diagnósticos secundários 1 2 3 4 5 6 Tratamentos realizados Necessidades sintomas e cuidados especiais Medicamentos em uso Encaminhar o familiar com esta ficha ao 12º andar Ala Par Cuidados Paliativos 47 Anexo 2 SERVIÇO DE CUIDADOS PALIATIVOS FICHA DE ATENDIMENTO AMBULATORIAL NOME Idade Karnofsky Encaminhamento Acompanhante Data Diagnóstico principal Data Diagnósticos secundários Outros diagnósticos Motivo da consulta Tratamento realizado 48 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Anexo 3 SERVIÇO DE CUIDADOS PALIATIVOS VISITA MÉDICA DOMICILIAR DATA NOME Cuidador Diagnósticos PPS 1 2 3 4 5 6 Avaliação ESAS Escala de Avaliação de Sintomas de Edmonton Medicamentos Sem dor 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 1 Sem cansaço 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 2 Sem náusea 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 3 Sem depressão 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 4 Sem ansiedade 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 5 Sem sonolência 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 6 Muito bom apetite 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 7 Sem falta de ar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 8 Melhor sensação 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 de bemestar possível 9 Recomendações Retorno Médico PPS Palliative Performance Scale 49 Comunicação em Cuidados Paliativos mAriA JúliA PAes dA silvA moniCA mArtins trovo de ArAúJo Sentido da comunicação em Cuidados Paliativos Uma vez que se relacionar é estar com o outro fazendo uso de habilidades de comu nicações verbal e nãoverbal para emitir e receber mensagens12 a comunicação é um elemento fundamental na relação humana e um componente essencial do cuidado O emprego adequado de técnicas e estratégias de comunicação interpessoal pelos profis sionais da saúde é medida terapêutica comprovadamente eficaz permitindo ao paciente compartilhar medos dúvidas e sofrimento contribuindo para a diminuição do estresse psicológico e garantindo a manifestação de sua autonomia2 7 Para os pacientes sob Cuidados Paliativos a comunicação interpessoal e o relaciona mento humano são ressignificados representando a essência do cuidado que sustenta fé e esperança nos momentos mais difíceis que são enfrentados1 O paciente sob Cuidados Paliativos deseja ser compreendido como um ser humano que sofre porque além da dor física possui conflitos existenciais e necessidades que os fármacos ou os aparelhos de alta tecnologia não podem suprir Assim ademais de com partilhar seus medos e anseios relacionandose com seus pares ele necessita sentirse cuidado amparado confortado e compreendido pelos profissionais da saúde responsáveis por ele Expressões de compaixão e afeto na relação com o paciente trazem a certeza de que ele é parte importante de um conjunto o que ocasiona sensação de proteção e consolo além de paz interior6 Para que essas necessidades sejam atendidas e o cuidado ao fim da vida seja bem sucedido é necessário que os profissionais da saúde resgatem a relação interpessoal em pática e compassiva como base para suas ações e condutas Mais do que habilidades técnicas para diagnosticar e tratar além de informações sobre doença e tratamento os pacientes que vivenciam a terminalidade esperam que a relação com os profissionais da saúde seja alicerçada por compaixão humildade respeito e empatia Na prática a imple mentação e a sustentação desses conceitos subjetivos é possível com o uso adequado de habilidades de comunicação O Quadro 1 evidencia o sentido da comunicação interpessoal no cuidado ao final da vida O que precisamos entender sobre comunicação Independente da área de formação básica ou da categoria profissional os profissio nais da saúde têm como base de seu trabalho as relações humanas e por isso precisam aprimorar suas habilidades de comunicação Médicos enfermeiros fisioterapeutas psicó logos e outros especialistas que trabalham com seres humanos em situação de doença e sofrimento principalmente com aqueles que vivenciam a terminalidade necessitam saber não apenas o que mas quando e como falar Precisam até mesmo saber o momento de calar substituindo a frase por um toque afetivo ou potencializar o efeito de um ansiolí 50 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP tico com um bom par de ouvidos estando mais próximo e acessível às reais necessidades dos pacientes Comunicação interpessoal não se resume à troca de mensagens entre duas ou mais pessoas tampouco à mera transmissão de informações Tratase de um processo comple xo que envolve percepção compreensão e transmissão de mensagens por parte de cada sujeito envolvido na interação considerandose contexto cultura valores individuais experiências interesses e expectativas de cada um10 Todo processo de comunicação é constituído por duas dimensões verbal e nãoverbal A verbal é aquela que ocorre por meio de palavras com o objetivo de expressar um pen samento clarificar um fato ou validar a compreensão de algo12 Porém ela é insuficiente para caracterizar a complexa interação que ocorre no relacionamento humano É necessário qualificála oferecerlhe emoções sentimentos e adjetivos para que seja possível perceber e compreender não só o que significam as palavras mas também os sentimentos implícitos na mensagem e é a dimensão nãoverbal do processo de comunicação que permite demonstra ção e compreensão dos sentimentos nos relacionamentos interpessoais A linguagem verbal é qualificada pelo jeito e tom de voz com que as palavras são ditas por gestos que acompanham o discurso olhares e expressões faciais postura corporal distância física que as pessoas man têm umas das outras e até mesmo por roupas acessórios e características físicas Para facilitar o estudo da comunicação nãoverbal propõese classificála12 em paralinguagem cinésica proxêmica características físicas fatores do meio ambiente e tacêsica A paralinguagem referese a qualquer som produzido pelo aparelho fonador e utili zado no processo de comunicação ou seja o modo como falamos Representamna os ruídos a entonação da voz o ritmo do discurso a velocidade com que as palavras são ditas o suspiro o pigarrear o riso e o choro É também chamada paraverbal e confere emoção às informações transmitidas verbalmente Quadro 1 Metas para a comunicação ao final da vida Ao final da vida esperase que uma comunicação adequada permita Conhecer problemas anseios temores e expectativas do paciente Facilitar o alívio de sintomas de modo eficaz e melhorar sua autoestima Oferecer informações verdadeiras de modo delicado e progressivo de acordo com as necessidades do paciente Identificar o que pode aumentar seu bemestar Conhecer seus valores culturais espirituais e oferecer medidas de apoio Respeitarreforçar a autonomia Tornar mais direta e interativa a relação entre profissional da saúde e paciente Melhorar as relações com os entes queridos Detectar necessidades da família Dar tempo e oferecer oportunidades para a resolução de assuntos pendentes despedidas agradecimentos reconciliações Fazer com que o paciente se sinta cuidado e acompanhado até o fim Diminuir incertezas Auxiliar o paciente no bom enfrentamento e na vivência do processo de morte 51 O termo cinésica criado por Ray Birdwhistell precursor no estudo da fala e dos sinais emitidos pelo corpo durante as interações diz respeito à linguagem corporal É ca racterizado por gestos expressões faciais olhar características físicas e postura corporal Conhecer a linguagem do corpo é importante não apenas por trazer informações sobre o outro mas também para o autoconhecimento A proxêmica aborda as teorias que dizem respeito ao uso que o homem faz do espa ço físico dentro do processo de comunicação O neologismo proxêmica foi criado por Edward Hall ao identificar os fatores envolvidos na distância que o indivíduo mantém do outro na interação O toque e todas as características envolvidas são estudados pela cinésica O contato físico é capaz de provocar por meio de seus elementos sensoriais alterações neuro musculares glandulares e mentais Não apenas em caráter técnico e instrumental mas também como forma de oferecer apoio e demonstrar afeto o toque é um instrumento terapêutico valioso na área da saúde12 A comunicação nãoverbal é fundamental para o estabelecimento do vínculo que embasa o relacionamento interpessoal imprescindível na relação entre profissionais da saúde e pacientes1 4 11 13 Com frequência mesmo antes que a interação direta com o paciente aconteça existe um julgamento prévio a respeito do profissional com base na análise de seu comportamento e características nãoverbais expressos nos corredores do hospital ou na interação com os outros colegas E pode ser até nesse momento que o paciente decida se o profissional é ou não digno de sua confiança e se quer ou não ser cuidado por ele sem que palavra alguma seja trocada entre ambos É principalmente por meio da emissão dos sinais nãoverbais do profissional da saúde que o paciente desenvolve confiança e permite que se estabeleça uma relação terapêutica efetiva Assim tanto o comportamento verbal quanto o nãoverbal do profissional devem demonstrar empatia e transmitir segurança conforme evidencia o Quadro 2 Ao cuidar do paciente em processo de morte uma das principais habilidades de co municação necessárias ao profissional é a escuta Ela atenta e reflexiva é um dos mais importantes instrumentos do profissional da saúde que atua em Cuidados Paliativos visto que permite identificar as reais demandas dos pacientes Sentarse ao lado do paciente mostrandose interessado por sua história e disponível para ouvilo e compreendêlo é uma maneira comprovadamente eficaz de assistilo emocional e espiritualmente Ser ouvido é uma importante demanda de quem vivencia a terminalidade4 Quadro 2 Elementos essenciais do comportamento empático Comportamento empático envolve Manter contato com os olhos durante aproximadamente 50 do tempo da interação Ouvir atentamente Permanecer em silêncio enquanto o outro fala utilizando eventualmente meneios positivos Sorrir Manter tom de voz suave Voltar o corpo na direção de quem fala e manter os membros descruzados Utilizar eventualmente toques afetivos em braços mãos ou ombros 52 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quando se utiliza adequadamente a comunicação interpessoal no contexto dos Cui dados Paliativos frequentemente é possível decifrar informações essenciais e dessa for ma diminuir a ansiedade e a aflição de quem está próximo da morte proporcionando mais qualidade ao nosso cuidar e conquistando mais satisfação pessoal O Quadro 3 identifica estratégias de comunicações verbal e nãoverbal que devem ser utilizadas na atenção a pacientes sob Cuidados Paliativos As notícias difíceis como falar a respeito de perdas terminalidade e morte Em um contexto de desenvolvimentos técnico e científico ímpares na história das ciências da saúde em que a percepção de que quase todos os problemas podem ser resol vidos com o uso de aparatos tecnológicos a terminalidade e a morte permanecem como limites ao ser humano Desse modo pacientes familiares e até mesmo os profissionais da saúde evitam falar sobre o tema Criase assim uma situação conhecida como cerca ou conspiração de silêncio9 Essa condição se manifesta com a transmissão de mensagens ambivalentes nas quais o discurso verbal otimista e focado em assuntos diversos e superficiais é contradito pela linguagem nãoverbal que expressa claramente o agravamento da situação Profissionais e familiares por acharem que poderão aumentar o sofrimento e a de pressão evitam falar sobre terminalidade e morte para poupar o paciente que por sua vez visando proteger suas pessoas queridas também evita abordar o assunto Criase as sim uma espécie de isolamento emocional de um lado o paciente e do outro a família todos com sentimentos dúvidas e anseios semelhantes porém não compartilhados Receber boas informações honestas claras e compassivas é um desejo universal dos pacientes em estado avançado da doença conforme evidencia a literatura3 5 14 16 Em estudo realizado no Brasil com 363 pacientes identificouse que mais de 90 dos entrevistados desejam ser informados sobre suas condições de saúde incluindo eventuais diagnósticos de doenças graves5 Outro estudo europeu16 realizado com 128 indivíduos que tiveram o diagnóstico de câncer incurável revelou que grande parte desses doentes gostaria de ser informada sobre opções de tratamento efeitos colaterais sintomas físicos e como e onde encontrar ajuda e aconselhamento a respeito de dietoterapia cuidados psicossociais e complementares Embora muitos pacientes queiram saber sobre sua condição de saúde eles também têm o direito de não querer receber informações a esse respeito Nesse caso seu desejo precisa ser respeitado e tornase necessário identificar um familiar ou alguém próximo que possa receber as informações e ser o interlocutor A comunicação de notícias difíceis ou más é uma das mais penosas tarefas do pro fissional da saúde Isso porque eles aprendem nos bancos da academia a salvar vidas e buscar a saúde e não a lidar com situações de perdas de saúde vitalidade esperança e morte Assim uma das dimensões em que esse profissional mais almeja desenvolver habilidades é na comunicação de notícias difíceis como informar o diagnóstico de uma doença sem possibilidades de cura a piora irreversível do quadro ou mesmo comunicar a morte para os familiares Uma questão muito frequente é sobre contar ou não ao paciente E à medida que res postas não são encontradas para este questionamento utilizase a mentira piedosa ou o silêncio cheio de significados dúbios Contudo há alternativas para esse tipo de situação 53 Quadro 3 Estratégias para a adequada comunicação ao final da vida Verbais Nãoverbais Repetir a informação pausadamente sempre que for necessário Ouvir reflexivamente Validar a compreensão do que foi falado estimulando comparações Utilizar toque afetivo mãos braços ou ombros Utilizar clareza e sinceridade no que for dito Sorrir Disponibilizar tempo e verbalizar a disponibilidade para interação Utilizar o silêncio Estabelecer opções e apontar diferentes pontos de vista Estar junto com mais frequência presença Oferecer feedback ao que o outro manifesta Manter proximidade física preferencialmente sentandose próximo ao outro Utilizar linguagem coloquial com vocabulário adequado à compreensão do outro Atentar para as próprias expressões faciais Verbalizar disponibilidade para o cuidado e nãoabandono compreensão e aceitação Identificar emoções e sentimentos nas expressões faciais do outro Evitar a conspiração de silêncio não evitar falar sobre o assunto doença terminalidade Manter contato visual Repetir as últimas palavras ditas pela pessoa para estimulála a aprofundar o assunto Atentar para a postura corporal membros descruzados e relaxados orientação do tórax na direção do outro cuidado com gestos excessivos ou que denotam ansiedade Estimular verbalização de medos e angústias Utilizar tom de voz adequado Oferecer reforços positivos elogie as conquistas do outro Atentar para as reações que você provoca no outro Utilizar perguntas abertas para estimular a expressão de sentimentos e valorizar os sentimentos identificados Promover ambiente reservado e tranquilo para uma conversa Estabelecer junto com o paciente metas e planos de ação para atingilas Atentar para sua própria aparência física vestuário adequado asseio Valorizar todas as informações dadas pelo paciente ou seu familiar Evitar ruídos que dispersem a atenção campainha de telefone celular por exemplo 54 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP o uso de habilidades de comunicação pode auxiliar o profissional a modificar o foco da questão de contar ou não para como informar Ao invés da mentira piedosa podese utilizar a sinceridade prudente e progressiva transmitindo ao paciente as informações de acordo com suas condições emocionais de modo gradual e suportável E nesse contexto são essenciais adequadas percepção e in terpretação dos sinais nãoverbais do paciente que permitirão a identificação do estado emocional do doente e mostrarão ao profissional até onde ir naquele momento Ao comunicar notícias difíceis é importante que o profissional mostre atenção empa tia e carinho em seu comportamento e sinais nãoverbais A expressão facial o contato visual a distância adequada e o toque em mãos braços ou ombros ajudam conforme já referido a demonstrar empatia e oferecer apoio e conforto O paciente precisa sentir que por pior que seja sua situação ali se encontra alguém que não o abandonará em quem poderá confiar e que poderá cuidar dele O Quadro 4 traz estratégias para a comunicação progressiva de notícias difíceis Quadro 4 Estratégias para a comunicação progressiva de notícias difíceis Etapas Estratégias Preparese para comunicar Escolha o local de preferência onde haja acomodações para sentar Cuide da privacidade Reserve tempo para a conversa Descubra o quanto o paciente sabe o quanto quer ou aguenta saber Utilize perguntas abertas o que você sabe sobre sua doença O que você teme sobre sua condição Atente aos sinais nãoverbais do paciente durante as respostas Identifique sinais de ansiedade extrema ou sofrimento exacerbado avaliando as condições emocionais do paciente Compartilhe a informação Informe com tom de voz suave porém firme utilizando vocabulário adequado à compreensão do outro Seja claro e faça pausas para que o paciente tenha oportunidade de falar Valide a compreensão fazendo perguntas curtas Utilize o toque afetivo e a proximidade física Verbalize compaixão e solidariedade ao sofrimento do outro Acolha os sentimentos Permaneça junto do paciente Permita e estimule a expressão de sentimentos de modo verbal eou nãoverbal Verbalize disponibilidade para ouvilo Planeje o seguimento Fale concisamente sobre sintomas possibilidades de tratamento e prognósticos Estabeleça junto com o paciente metas a curto e médio prazos e ações para atingilas Verbalize a disponibilidade para o cuidado e o nãoabandono Deixe claro como e onde encontrálo se necessário 55 A comunicação como instrumento terapêutico na identificação das necessidades emocionais e espirituais Independente de idade etnia ou sexo alguns pensamentos e sentimentos são fre quentes a quem vivencia a terminalidade como a preocupação com os familiares que ficam o medo do desconhecido perante a morte o sofrimento intenso no momento da morte e estar sozinho quando tudo isso acontecer que são comuns e geram intenso sofrimento psíquico para o doente Reflexões sobre o processo de revisão de sua vida também são frequentemente realizados e podem trazer angústias para o paciente que tem assuntos inacabados ou conflitos a serem resolvidos Se o paciente ainda é capaz de verbalizar pode haver o desejo de compartilhar com alguém da equipe de saúde ou com familiares os seus sentimentos e anseios E mesmo quando já não é mais possível falar sobre seus anseios o paciente que vivencia a terminalidade demonstra de maneiras nãoverbal e fisiológica seu sofrimento Nesse contexto as palavras mostramse secundárias e a comunicação nãoverbal assume o papel de instrumento do cuidado nessa fase final Os Quadros 5 e 6 evidenciam necessidades espirituais e emocionais ao final da vida e apontam estratégias úteis de comunicação para abordar tais necessidades Quadro 5 Necessidades espirituais expressas de modo verbal eou nãoverbal e estratégias de comunicação úteis para o cuidado ao fim da vida Aspectos espirituais identificados Necessidades relacionadas Estratégias de comunicação Reflexões ou questionamentos sobre o significado da vida Construir um sentido para vida e a própria existência Ouvir atentamente estimular reflexão e expressão de sentimentos perguntas abertas Preocupações com o legado resgate dos relacionamentos Agradecer e demonstrar amor a quem lhe é importante perdoar e ser perdoado despedirse Estimular permitir e promover reencontros conversar com familiares flexibilizando horários de visita promover ambiente agradável para essas interações familiares disponibilizar cadeiras ambiente privativo Questionamentos acerca da morte ou o que vem depois dela ressignificação de dor e sofrimento Estreitar relação com o Ser Supremo reafirmar crenças Ouvir atentamente utilizar toque afetivo para demonstração de compreensão e apoio respeitar momentos de silêncio do outro Ações comunicativas eficazes para a família na terminalidade É praticamente impossível cuidar do indivíduo de forma completa sem considerar contexto dinâmica e relacionamento familiar As informações contínuas e acessíveis aos 56 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 7 Ações comunicativas no apoio ao familiar na terminalidade Ações comunicativas eficazes Presença mais frequente Verbalização de disponibilidade compaixão e pesar pela perda Perguntar o que ela precisa ou o que você pode fazer para ajudálo naquele momento Respeitar crenças rituais e expressão de sentimentos e se puder participar junto Utilizar o toque afetivo Quadro 6 Necessidades emocionais expressas de modo verbal eou nãoverbal e estratégias possíveis de comunicação úteis para o cuidado ao fim da vida Aspectos emocionais identificados Necessidades relacionadas Estratégias possíveis de comunicação Sentimentos de tristeza Autoimagem e autoestima alteradas Medo de incapacidade e deterioração física Medo de ter dor Medo de estar sozinho no momento da morte Luto pelas perdas antecipadas vida relacionamentos etc Ser ouvido Ser aceito Ser confortado Ser valorizado Sentirse seguro Exercer sua autonomia Estar sempre acompanhado Ter valores e crenças respeitados Ouvir Utilizar toque afetivo Estar mais presente junto ao paciente Verbalizar nãoabandono Verbalizar disponibilidade e interesse Estimular visitas e permanência de cuidador acompanhante familiares são os elementos essenciais que permitirão uma vivência mais serena e tran quila do processo de morte do doente sem gerar expectativas que não podem ser atendi das Os familiares têm a necessidade de se manter informados sobre o que acontece e o que esperar do processo de morte de seus entes Desse modo uma das necessidades mais proeminentes da família é o estabelecimento de uma comunicação clara honesta e mais frequente com os membros da equipe que cuidam do paciente8 A metanálise de vários estudos sobre as necessidades de um familiar do paciente gra vemente enfermo em iminência de morte aponta que ele deseja sentirse útil no cuidado de seu ente entender o que está sendo feito por ele e o porquê ser informado acerca de mudanças nas condições clínicas e proximidade de morte ser assegurado do conforto do doente poder expressar suas emoções ter seus sentimentos compreendidos e ser confor tado encontrando algum significado na perda da pessoa amada15 Assim informações e orientações simples e claras nesse momento são extremamente benéficas aos membros da família como o estímulo para a verbalização de sentimentos e a escuta Quadro 7 57 Considerações finais Relacionarse com o outro é essencial para a vida porque confirma a existência do homem e fundamenta sua experiência humana Por meio dos relacionamentos os seres humanos compartilham experiências comuns fortalecendo seus elos e revelando simi laridades anseios e necessidades Na terminalidade permitem que não antecipemos a morte de alguém à medida que continuamos ouvindo e respeitando suas necessidades e desejos Para o profissional atento a comunicação em Cuidados Paliativos o questiona sobre a própria vida e lhe permite redirecionála quando necessário Referências 1 ARAÚJO M M T Quando uma palavra de carinho conforta mais que um medicamento necessidades e expectativas de pacientes sob cuidados paliativos Dissertação Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo São Paulo 2006 2 ARAÚJO M M T SILVA M J P Comunicandose com o paciente terminal Rev Soc Bras Cancer v 6 n 23 p 1620 2003 3 ASPINAL F et al What is important to measure in the last months and weeks of life a modified nominal group study International Journal of Nursing Studies v 43 n 4 p 393403 2006 4 CARVALHO M V B O cuidar no processo de morrer na percepção das mulheres com câncer uma atitude fenomenológica Tese Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo São Paulo 2003 5 GULINELLI A et al Desejo de informação e participação nas decisões terapêuticas em caso de doenças graves em pacientes atendidos em um hospital universitário Rev Assoc Med Bras v 50 n 1 p 417 2004 6 HAWTHORNE D L YURKOVICH N J Human relationship the forgotten dynamic in palliative care Palliative Support Care v 1 n 3 p 2612650 2003 7 HIGGINSON I CONSTANTINI M Communication in endoflife cancer care a comparison of team assessment in three European countries Journal of Clinical Oncology v 17 n 20 p 367482 2002 8 KIRCHHOFF K T SONG M K KEHL K Caring for the family of the critically ill patient Critical Care Clinics v 20 45366 2004 9 KÓVACS M J Comunicação nos programas de cuidados paliativos In PESSINI L BERTACHINI L Humanização e cuidados paliativos São Paulo Loyola 2004 10 LITTLEJOHN S W Fundamentos teóricos da comunicação humana Rio de Janeiro Guanabara Koogan 1988 11 SILVA M J P Comunicação com pacientes fora de possibilidades terapêuticas reflexões Mundo Saúde v 27 n 1 p 6470 2003 12 SILVA M J P Comunicação tem remédio a comunicação nas relações interpessoais em saúde São Paulo Gente 1996 13 STEINHAUSER K E et al Factors considered important at the end of life by patients family physicians and other care providers JAMA v 284 n 19 p 247682 2000a 14 STEINHAUSER K E et al In search of a good death observations of patients families and providers Annals of Internal Medicine v 132 n 10 p 82532 2000b 15 TROUG RD et al Recommendations for endoflife care in the intensive care unit The Ethics Committee of the Society of Critical Care Medicine Critical Care Medicine v 29 n 12 p 233248 2001 16 VOOGT E et al Information needs of patients with incurable cancer Support Care Cancer v 13 n 11 p 9438 2005 58 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Modalidades de atuação e modelos de assistência em Cuidados Paliativos luís FernAndo rodriGues Introdução Nos últimos 10 anos os Cuidados Paliativos têm se disseminado fortemente em todo o mundo e no nosso país não tem sido diferente O contraste que observamos no entanto diz respeito justamente aos modelos de assistência empregados nos diversos países para atender à necessidade dos cuidados em fim de vida Na Europa a referência aos hospices como locais de cuidado intensivo na terminalidade entendendo intensivo como presença intensa junto ao paciente visando execução de reavaliações e ajustes constantes de me didas para alívio de sofrimento e não emprego de maquinário com tecnologia avançada evidencia o quão diferente a organização dos serviços pode ser Desde o cuidado de nível 1 executado por equipes de saúde da família para necessida des mais básicas até o de nível 3 com equipes capacitadas para resolução de problemas complexos os cenários de atuação são diversificados4 O objetivo deste texto é explorar vantagens e dificuldades para a execução de cuidados em cada um desses cenários Modelos de assistência Hospital Historicamente quando falamos de cuidado de saúde e principalmente quando fa lamos em cuidados em etapa terminal de enfermidade imediatamente nossa mente nos remete ao cuidado hospitalar já que quem está muito doente em nossa cultura deve procurar um hospital E é nesse ambiente que temos visto se desenvolver alguns dos principais serviços de Cuidados Paliativos no Brasil Hospital Emílio Ribas de São Paulo Instituto Nacional do Câncer INCA no Rio de Janeiro Hospital do Servidor Público Es tadual de São Paulo HSPESP Grupo Interdisciplinar de Suporte Terapêutico Oncológico GISTO do Hospital Erasto Gaertner em Curitiba Centro de Estudos e Pesquisas Oncoló gicas CEPON de Florianópolis Hospital do Câncer de Barretos Hospital Costa Cavalcanti de Foz do Iguaçu Hospital do Câncer de Londrina entre tantos outros serviços que se multiplicam Existe também esse serviço no Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo HSPMSP Ele atua em espaço físico fora do hospital sendo algo mais próximo do modelo de hospice existente na Europa O ambiente hospitalar com suas peculiaridades faz com que seja buscado prioritariamente como um ambiente de cuidados em fim de vida No Quadro 1 estão as vantagens e desvantagens desse ambiente Uma das maiores desvantagens do ambiente hospitalar é o fato de o paciente estabe lecer associação com procedimentos invasivos e por vezes dolorosos como punções ve nosas ou arteriais sondagens urinárias nasogástricas etc drenagens e intubação num momento da vida em que importantes são o conforto e o alívio dos sintomas A existência 59 de uma unidade de Cuidados Paliativos em um hospital pode dar a impressão aos outros pacientes e familiares que é uma unidade para moribundos o que não corresponde à rea lidade pois o cuidado de fim de vida é apenas um dos aspectos dos Cuidados Paliativos podendo fazer com que desta forma o nível de ansiedade do paciente possa aumentar significando piora do controle dos sintomas psíquicos Quadro 1 Vantagens e desvantagens do cuidado hospitalar2 VANTAGENS Profissionais disponíveis 24 horas Arsenal medicamentoso disponível Logística adaptada ao ambiente DESVANTAGENS Horários para visitas restritos Número de acompanhantes restrito Pacientes sob Cuidados Paliativos entre pacientes com outros diagnósticos hospital geral Pacientes sob Cuidados Paliativos entre pacientes em outras etapas de doença Unidade exclusiva para Cuidados Paliativos pode dar a má impressão de que é unidade para moribundos Proporção pacientesfuncionário alta diminuindo o tempo disponível para pacientes Domicílio Quando os profissionais conseguem conduzir seu mister de tratar os pacientes fora de possibilidade terapêutica de cura e dentro da ótica dos Cuidados Paliativos de maneira ótima abordando de forma franca honesta e verdadeira as questões relativas a diagnós tico prognóstico e planejamento de cuidados por vezes o paciente solicita os cuidados em sua própria residência Isso lhe confere mais conforto e serenidade além de poder garantir sua autonomia Embora possa parecer tendencioso defender o domicílio como local preferencial de cui dados por enfatizarmos os aspectos mais subjetivos do tratamento nesse ambiente deve mos avaliálo de maneira crítica e observar seus prós e contras Quadro 21 Uma das grandes vantagens observadas é o fato de permitir ao indivíduo ter as suas necessidades atendidas na medida de suas preferências sem a necessidade de seguir a ri gidez de regras e horários do hospital6 Simbolicamente o domicílio representa o retorno ao ventre materno local de aconchego calor e proteção situações que são procuradas pelas pessoas portadoras de doença ameaçadora da vida e que se encontram vulneráveis Como disse Rubem Alves a morte é o parto ao contrário e para se fazer o caminho inverso é necessário retornar ao útero Como isso é fisicamente impossível a simbologia do lar visto como um ambiente protetor se encaixa perfeitamente nessa observação No entanto para atingirmos o sucesso no atendimento domiciliar com o enfoque paliativo é necessário reunir uma série de condições que propiciará um cuidado eficaz como podemos verificar no Quadro 3 É importante destacar que para essa modalidade 60 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 3 Critérios para inclusão no atendimento domiciliar6 Ter diagnóstico definido Ter um plano terapêutico definido e registrado Residir em domicílio que ofereça as condições mínimas para higiene luz e água encanada Ter cuidador responsável e capaz de compreender as orientações dadas pela equipe Desejo eou permissão expressa para permanecer no domicílio dados pelo paciente ou familiar no impedimento desse Quadro 2 Vantagens e desvantagens do cuidado domiciliar VANTAGENS Atender as necessidades conforme a preferência do paciente Maior sensação de conforto e proteção Disponibilidade dos cuidadores direcionada totalmente ao paciente DESVANTAGENS Dependendo da forma como o serviço está estruturado a disponibilização de drogas pode não ser imediata Residir o paciente longe de recursos de saúde Dificuldade na obtenção da declaração de óbito para pacientes que optam por morrer em casa de atenção a anuência do paciente eou da família é extremamente importante e que apesar de ser possível que o óbito aconteça em casa é necessário checar se paciente e família conseguirão desenvolver a capacidade de lidar com tal situação durante a evolu ção do período de cuidado Modalidades de assistência3 Câncer A história dos Cuidados Paliativos se iniciou com o câncer quando Cicely Saunders cuidou de seu amigo David Tasma e acompanhou a trajetória de dor e sofrimento pelo qual ele passou antes de morrer Daí surgiu a sua ideia de agregar os conhecimentos nas várias áreas do saber científico e empregálos no auxílio daqueles que sofriam até morrer O grande dilema ético nessa situação é em que momento interromper os tratamentos dirigidos ao tumor e começar a redirecionálos para o sofrimento em seu sentido mais amplo5 Então a medicina logo percebeu que essa filosofia de cuidados poderia se esten der a outros grupos de doenças 61 Doença pulmonar obstrutiva crônica DPOC Em recente levantamento não publicado o Sistema de Internação Domiciliar SID da Secretaria Municipal de Saúde de Londrina evidenciou em 384 pacientes acompanhados no ano de 2008 aproximadamente 14 de portadores de DPOC segundo grupo de doen ças depois das neoplasias número semelhante a outros levantamentos Dispneia tosse e ansiedade são sintomas frequentes nesse grupo que devem ser abordados de forma eficaz por equipe devidamente capacitada Insuficiência cardíaca congestiva ICC É outro grupo frequente muito associado em nosso país a doença de Chagas hiper tensão arterial HA nãocontrolada e diabetes As internações hospitalares pela des compensação dessa condição contribuem para as altas taxas de ocupação hospitalar de maneira repetitiva Esse grupo também pode ser alvo dos Cuidados Paliativos Insuficiência renal crônica IRC Também uma consequência da HA e do diabetes mal controlados encontra na terapia renal substitutiva um modo de prolongar a vida dos pacientes portadores dessa condição No entanto assim como o câncer apresenta uma etapa terminal principalmente aquele paciente que não consegue o transplante e evolui para uma situação de fim de vida Existem trabalhos europeus que exploram as questões relativas à suspensão da diálise e à condução do paciente de forma paliativa Doenças neurológicas degenerativas Com o envelhecimento da população aumentou a incidência das patologias degene rativas mormente Alzheimer e Parkinson são doenças que não têm evolução tão ace lerada como o câncer mas que também têm sua etapa terminal O controle da dor da obstipação da insônia e das crises de agitação psicomotora é o maior desafio no grupo de pessoas acometidas por essas doenças Cuidado Paliativo na unidade de terapia intensiva UTI Parece contraditória essa abordagem pois os pacientes com doença avançada e pró ximos da morte não devem ser encaminhados e manejados em uma UTI mas todos aque les que precisarem de UTI terão o direito de receber Cuidados Paliativos As condições crônicas não devem a priori ser cuidadas em ambiente de terapia intensiva embora os cuidados que eles requeiram sejam intensivos no sentido de proximidade intensa do profissional e não em intensidade de verificação de sinais e medidas para sustentação da vida Já os pacientes que tiverem critérios para terapia intensiva podem evoluir para uma situação de nãoreversibilidade e devem ter suas dores aliviadas A família deverá ser abordada e auxiliada na elaboração do luto Cuidado Paliativo em pediatria Situação das mais desafiadoras e difíceis exige do pediatra experiente que cuida de crianças com critérios para Cuidados Paliativos toda sua habilidade para lidar com a disrupção do binômio mãefilho A morte da criança é difícil de ser aceita não apenas por 62 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP mãe e familiares mas também pela equipe de profissionais que deve ser cuidadosamente preparada para trabalhar nesse cenário especial Referências 1 DOYLE D et al The Oxford Textbook of Palliative Medicine Oxford University Press 3rd ed 2006 2 DUNLOP R HOCKLEY G M Hospital based palliative care teams Oxford University Press 1st ed 1998 3 EMANNUEL L LIBRACH L Palliative care core skills and clinical competences Saunders Elsevier 2007 4 MACIEL M G S et al Critérios de qualidade para os cuidados paliativos no Brasil Academia Nacional de Cuidados Paliativos 2007 5 PALMER E HOWARTH J Palliative care for the primary care team quay books 2005 6 RDC 11 de 26 de Janeiro de 2006 ANVISA Publicada no DOU de 30012006 63 Cuidado Paliativo em pediatria sílviA mAriA de mACedo bArbosA Epidemiologia da morte em pediatria A morte em pediatria é um evento nãonatural e normalmente nãoesperado em bora seja uma realidade inquestionável Com os avanços tecnológicos associados ao progresso da ciência médica cada vez mais crianças vivem com condições clínicas complexas Nos Estados Unidos aproximadamente 55 mil crianças e adolescentes en tre 019 anos morrem anualmente em decorrência dessas condições6 Um terço das mortes ocorre no período neonatal metade no primeiro ano de vida e um quarto entre 15 e 19 anos Na cidade de São Paulo segundo dados levantados no Programa de Apri moramento das Informações de Mortalidade no Município de São Paulo PROAIM as causas de morte por condições clínicas complexas de 0 a 19 anos têm a seguinte apre sentação por ordem de incidência doenças cardiovasculares DCV neurodegenerativas e oncológicas9 O Cuidado Paliativo em pediatria deve ser considerado para uma gama de doenças que evoluem com condições complexas crônicas as quais crônicas são definidas como uma condição médica que apresenta ao menos 12 meses de sobrevivida e envolve o aco metimento de um ou mais sistemas de órgãos que necessitam do atendimento pediátrico especializado4 Várias são as condições em pediatria que podem se beneficiar do Cuidado Paliativo como doenças congênitas incompatíveis com a vida desordens cromossômicas e meta bólicas condições cardíacas complexas e doenças neuromusculares Doenças oncológicas e AIDS podem se beneficiar de intervenções paliativas precoces Devemos porém lembrar que as mortes relacionadas com o câncer têm incidência menor do que as mortes por outras condições nãomalignas4 Quatro são as condições de progressão de doença para a qual os Cuidados Paliativos estão indicados5 6 condições nas quais o tratamento potencialmente curativo falhou doenças oncológicas e cardíacas congênitas graves ou doenças cardíacas adquiridas graves condições nas quais o tratamento intensivo a longo prazo pode se prolongar mas a morte prematura é esperada fibrose cística infecção por HIV desordens gástricas graves ou malformações como gastroquise epidermólise bolhosa grave insuficiência renal em que a diálise e o transplante não são possíveis ou não são indicados imunodeficiências graves e distrofia muscular condições progressivas nas quais o tratamento é quase exclusivamente paliativo mas pode se estender por muitos anos doenças neurodegenerativas doenças metabólicas progressivas anormalidades cromossômicas como as trissomias do 13 ou do 18 e formas graves de osteogênese imperfeita condições neurológicas nãoprogressivas que resultam em alta suscetibilidade às com plicações e morte prematura prematuridade extrema sequelas neurológicas importantes ou de doenças infecciosas lesões cerebrais hipóxicas 64 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A definição da Organização Mundial da Saúde OMS enfatiza o conceito do cui dado total ativo dos pacientes e tem como meta a melhor qualidade de vida possível para eles e suas famílias consistente com os seus valores independentemente da localização do paciente1 7 De uma forma ideal o Cuidado Paliativo é uma interven ção precoce que deve ser instituída no tempo do diagnóstico por meio do curso da terapia curativa Quando o processo de doença não responde mais às intervenções curativas o foco do cuidado passa a ser a maximização da qualidade de tempo que a criança e seus familiares passam juntos enquanto se minimizam o sofrimento e a dor A intervenção paliativa precoce deve ser considerada para todos os pacientes que apresentam condições que colocam a vida em risco Devese sublinhar que a relação entre os Cuidados Paliativos e os cuidados curativos não é de exclusão mú tua Os Cuidados Paliativos não são a filosofia do cuidado que substitui os esforços curativos ou que estendam o tempo de vida Ao contrário a terapia curativa e a que maximiza o conforto e a qualidade de vida devem se sobrepor como componentes do cuidado3 Os mesmos princípios que norteiam os Cuidados Paliativos da população adulta o fazem com os Cuidados Paliativos pediátricos ocorrendo algumas adaptações inerentes à faixa etária O modelo de cuidado integral para oferecer o Cuidado Paliativo a crianças que estejam com a vida em risco ou em condições terminais é o proposto pela Academia Americana de Pediatria AAP2 e com base em cinco princípios respeito à dignidade dos pacientes e suas famílias acesso a serviços competentes e sensíveis suporte para os cuidadores melhora dos suportes profissional e social para os Cuidados Paliativos pediátricos progresso contínuo dos Cuidados Paliativos pediátricos por meio da pesquisa e da educação As intervenções oferecidas pelos Cuidados Paliativos pediátricos englobam três níveis preocupações com o físico como os sintomas dor fadiga agitação náusea vômitos e prurido preocupações psicossociais identificação dos medos e das preocupações da família e da criança com suporte necessário preservação de uma comunicação de qualidade identificação das expectativas e das vivências anteriores e necessidade de suportes com portamental e espiritual preocupações espirituais O adequado manuseio da dor e dos outros sintomas deve ser a pedra fundamental no manejo da criança sob Cuidados Paliativos O suporte e a educação para a família também devem estar presentes na trajetória da doença Os profissionais da saúde responsáveis pelo cuidado devem ser capazes de discutir a possibilidade da morte o potencial de des gastes físico e emocional e as estratégias para essa prevenção A importância do adequado manuseio da dor e dos outros sintomas implica a familia ridade com o uso de estratégias terapêuticas farmacológicas e nãofarmacológicas para o tratamento da dor da dispneia da náusea dos vômitos da sialorreia e das convulsões A consulta à equipe de Cuidados Paliativos pediátricos ou especialistas em dor não deve ser descartada A comunidade pediátrica sofre de uma carência de experiência em lidar com a morte Há nas formações pediátricas geral e específica falta de educação formal em Cuidados Paliativos 65 Quadro 1 Elementos essenciais na abordagem do Cuidado Paliativo pediátrico6 Esfera física Áreas de avaliação Plano Preocupação física Identificação da dor e dos outros sintomas Crie e dissemine os tratamentos farmacológico e nãofarmacológico Medicação de emergência em casa Consulta com a equipe de Cuidados Paliativos se necessário Preocupação psicossocial Identificação dos medos e das preocupações da criança e da família Identificação da forma de reação da criança e dos estilos de comunicação Discussão de experiências prévias sobre a morte e sobre o morrer e outros eventos traumáticos Avaliação de recursos para o suporte do luto Converse de forma honesta Assegure a família e a criança de que não serão abandonados Converse sobre as preocupações sobre os irmãos e o resto da família Ajuste o cuidado às possibilidades de resposta da família e da criança e aos estilos de comunicação Comuniquese com a criança segundo o grau de desenvolvimento Modifique os planos de cuidados e as escolhas com base nas experiências anteriores da criança Encaminhe se necessário a criança e seus familiares para profissionais de saúde mental Planeje o seguimento da família após a morte da criança Garanta à família que não será abandonada Preocupações espirituais Fazer uma avaliação das questões espirituais rever os sonhos da criança esperança valores da vida credos e fé Encaminhe paciente e sua família para o atendimento espiritual adequado Ofereçase se a família quiser para explicar a doença para o responsável pelo atendimento religioso Permita que haja tempo para que a criança e sua família reflitam sobre os significados da vida e os seus propósitos Institucionalmente as barreiras para se oferecer um ótimo Cuidado Paliativo podem ser superadas pelo desenvolvimento e pela implementação de protocolos clínicos e insti tucionais e procedimentos para os Cuidados Paliativos final da vida e cuidados no luto Idealmente esse cuidado deve ser oferecido por uma equipe interdisciplinar na qual se incluem médicos enfermeiros assistentes sociais psicólogos e capelania Essa equipe deve promover a coordenação e a continuidade do cuidado A importância do tratamento da dor e dos outros sintomas no fim da vida deriva da alta prevalência dos sintomas e do sofrimento No último mês de vida 89 das crianças com câncer relatam experiências de uma grande porção de sofrimento de pelo menos 66 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 1 continuação Cuidado avançado Identificação dos responsáveis Discussão da trajetória da doença Identificar as metas do cuidado Itens dos cuidados e das preocupações próximas ao fim da vida Quem toma as decisões Comunique a toda equipe de saúde responsável pelos cuidados o nome do responsável pelas decisões Forneça informações necessárias para o entendimento Estabeleça consenso sobre o que se espera da trajetória da doença Identifique os efeitos da doença na capacidade funcional da criança e na sua qualidade de vida Identifique o tempo provável até a morte Estabeleça se as medidas são curativas incertas ou de conforto primário Comunique as metas para a equipe de saúde Crie ou dissemine os planos do cuidado refletindo as escolhas para intervenções específicas relacionadas com as mudanças no status de saúde Forneça informações antecipadas sobre as mudanças físicas que ocorrem próximo à morte a quem chamar e quem manejará os sintomas da criança Preocupações práticas Estabelecer comunicação e coordenação com a equipe médica Preferências de local de cuidado para a criança e sua família Conhecer domicílio e ambiente escolar da criança Avaliação do status corrente presente e futuro Identifique o coordenador do cuidado e mostre que o contato é sempre possível Insira novos profissionais se necessário para alcançar as metas do cuidado equipe de Cuidados Paliativos Plano de cuidado disponível para toda a equipe Garanta à criança e aos familiares que as metas do cuidado serão alcançadas independentemente do local do cuidado Converse sobre os planos sobre o local da morte contatos na hora da morte Plano de cuidados que leva o ambiente em consideração Tente visitar locais como a escola para promover educação e suporte se possível em parceria com comunidades locais Solicite equipamento hospitalar como cama hospitalar cadeira de rodas e aspirador antecipandose às necessidades da criança 67 um sintoma e 51 das crianças sofrem de três ou mais sintomas10 O manejo intensi vo dos sintomas é prioridade do cuidado e requer avaliação dos sintomas intervenções agressivas reavaliações frequentes e flexibilidade para combinar as diversas modalidades terapêuticas Uma abordagem dos sintomas e do sofrimento no Cuidado Paliativo pediátrico torna se com sentido e efetivo se associada ao processo de reintegração em que as metas de cuidado são constantemente reavaliadas A associação das diversas modalidades terapêu ticas e intervenções tem como objetivo tornar a criança o centro das atenções e não um ser isolado com sintomas A construção de uma abordagem holística em que as diversas dimensões do ser humano física psicológica psicossocial e espiritual são integradas com o objetivo de aliviar o sofrimento e com isso preservar a dignidade Esse é o signifi cado maior de valorizar a vida até o último momento Quadro 2 Medicações utilizadas para controle da dor Droga Dose Intervalo Observações Dor Paracetamol VO 1015 mgkg dose máxima 26 g 66 horas Necrose hepática dosedependente Deficiência de G6PD Dipirona VO ou EV 66 horas Agranulocitose fatal púrpura trombocitopenia anemia aplásica anemia hemolítica rash edemas tremores náuseas vômitos hemorragia gastrointestinal anúria reações alérgicas Hipersensibilidade e discrasia sanguínea Lactentes 10 mgkg 1 g Préescolares 15 mgkg 1 g Escolares 25 mgkg 2 g Adolescentes adultos 2530 mgkg 3 g Ibuprofeno 6 meses 510 mgkg 40 mgkg 66 88 h Irritação gástrica alteração da função plaquetária náuseas vômitos diarreia azia constipação Diástese hemorrágica pós operatório Adultos 200600 mg 66 88 h Naproxeno 2 anos 5 a 7 mgkg 88 h a 1212 h Irritação gastrointestinal plaquetopenia cefaleia tontura vertigem zumbido Diástese hemorrágica pósoperatório com risco de sangramento 68 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 2 continuação Cetoprofeno 1 ano VO 66 h a 88 h Irritação gastrointestinal broncoespasmo plaquetopenia cefaleia tontura diástese hemorrágica pósoperatório com risco de sangramento doentes renais úlceras de estômago ou duodeno 1 a 7 anos 1 mgkg 7 a 11 anos 25 mg 11 anos 50 mg Cetorolaco 2 anos Irritação gastrointestinal Diástese hemorrágica pósoperatório com risco de sangramento lactentes doentes renais úlceras de estômago ou duodeno IV 05 a 08 mgkg 66 h a 88 h IM 1 mgkg Opioide Dose inicial Intervalo entre doses Codeína oral 05 a 1 mgkg 44 h a 66 h 120 mgdose dose máxima Tramadol oral parenteral 07 a 1 mgkg Dose máxima 100 mg dose 400 mgdia 44 h a 66 h Morfina oral ação rápida 02 a 05 mgkg 44 h Morfina parenteral 01 mgkg 44 h Oxicodona oral de liberação lenta 1212 h Metadona oral 01 a 02 mgkg 66 h a 1212 h Metadona parenteral 01 mgkg 66 h a 1212 h Fentanil parenteral 1 mcgkg 1 mcgkgh 11 h ou EV contínuo Fentanil transdérmico 4848 h a 7272 h VO via oral EV endovenosa G6PD glicose6fosfato desidrogenase IV intravenosa IM intramuscular 69 Quadro 3 Medicamentos adjuvantes9 Coanalgésicos Medicamento Dose Comentários Antidepressivos Amitriptilina Dor neuropática contínua com insônia 02 a 05 mgkg 1xd Aumentar 025 mgkg a cada 5 a 7 dias se necessário Analgesia pelo bloqueio da recaptação de serotonina e norepinefrina retarda transmissão do impulso doloroso Auxilia na dor associada à depressão utilize nortriptilina se o paciente estiver sedado Efeitos analgésicos percebidos antes que os antidepressivos Efeitos colaterais boca seca constipação retenção urinária AnticonvulsivAntes Gabapentina Dor neuropática 5 mgkg à noite Aumentar para 2xd no D2 e 3xd no D3 Dose máx 3600 mgd Mecanismo de ação desconhecido Efeitos colaterais sedação ataxia nistagmo tontura Carbamazepina Dor neuropática lancinante Neuropatias periféricas Dor do membro fantasma 6 anos 25 a 5 mgkg 2xd Aumentar 20 mgkgd divididos 2xd a cada semana máx 100 mgd 2xd 6 a 12 anos 5 mgkg 2xd Aumentar 10 mgkgd divididos 2xd a cada semana máx 100 mgdose 2xd 12 anos 200 mg 2xd Aumentar 200 mgd divididos 2xd a cada semana máx 16 a 24 gd Efeito analgésico semelhante ao da amitriptilina Monitorizar níveis séricos para toxicidade Efeitos colaterais pancitopenia ataxia irritação gastrointestinal Ansiolíticos Lorazepam Espasticidade muscular ou ansiedade 003 a 01 mgkg 44 h a 66 h Dose máx 2 mgdose Pode aumentar a sedação se associado a opioides Pode causar depressão com uso prolongado Diazepam 01 a 03 mgkg 44 h a 66 h Dose máx 10 mgdose Hidrato de cloral Agitação 25 a 100 mgkg 66 h Dose máx 1 gdose ou 2 gdia Sem efeito analgésico não causa depressão respiratória Efeito cumulativo Efeitos colaterais irritação gástrica potencialização de anticoagulantes Evitar em neonatos disfunções renal e hepática sedação prolongada 70 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 4 Controle de vômitos e constipação9 Sintoma Medicamento Técnicas nãofarmacológicas Constipação Óleo mineral 1 a 2 colheres de chá por dia Aumentar ingesta hídrica Leite de magnésia 2 anos 05 mlkgdose 1xdia 2 a 5 anos 5 a 15 ml por dia 6 a 12 anos 15 a 30 ml 1xdia 12 anos 30 a 60 ml 1xdia Suco de ameixa farelo de trigo aveia vegetais Lactulose 75 mldia após o café da manhã adulto 15 a 30 ml por dia PEG 1 envelope 548 g diluído em 1 litro de água conservar em geladeira por até 3 dias iniciar com 50 a 100 ml 1 ou 2 vezes ao dia e titular dose até efeito desejado pode ser administrado na sopa ou papa Vômitos Metoclopramida oral IM retal 6 anos 01 mgkgdose 88 h 6 anos 015 mgkgdose 88 h até 10 mg 88 h Relaxamento Respiração profunda e lenta Dimenidrato oral IM IV 125 mgkgdose 66 h 2 a 6 anos máx 75 mgdia 6 a 12 anos máx 150 mgdia 12 anos máx 300 mgdia Ondansetrona oral IV indicado para vômitos por quimioterapia ou radioterapia relatos episódicos de uso para vômitos por outras causas 01 a 015 mgkgdose de 88 h ou 1212 h até 44 h Dose máxima 8 mgdose PEG polietilenoglicol IM intramuscular IV intravenosa Referências 1 AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS COMMITTEE ON BIOETHICS AND COMMITTEE ON HOSPITAL CARE Palliative care for children Pediatrics v 106 Pt 1 p 3517 2000 2 AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS COMMITTEE ON BIOETHICS AND COMMITTEE ON HOSPITAL CARE Palliative care for children Pediatrics v 106 Pt 1 p 35172000 71 3 ANGHELESCU D L OAKES L HINDS P S Palliative care and Pediatrics Anesthesiology Clin N Am v 24 p 14561 2006 4 FEUDTNER C et al Deaths attributed to pediatric complex chronic conditions national trends and implications for supportive care services Pediatrics v 107 n 6 p E99103 2001 5 GOLDMAN A ABC of palliative care special problems of children BMJ v 316 n 7124 p 4952 1998 6 HIMELSTEIN B P et al Pediatric palliative care N Engl J Med v 350 n 17 p 175262 2004 7 LEVETOWN M Compendium of pediatric palliative care Childrens International Project on Palliative Hospice Services ChIPPS Alexandria VA7 National Hospice and Palliative Care Organization 2000 8 OLIVEIRA R A Grupo de trabalhos em cuidados paliativos CREMESP C Cadernos Cremesp Cuidado Paliativo 2008 9 PROAIM Prefeitura de São Paulo 10 WOLFE J et al Symptoms and suffering at the end of life in children with cancer N Engl J Med v 342 n 5 p 32633 2000 72 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Organização de serviços de Cuidados Paliativos mAriA Goretti sAles mACiel Introdução Cuidado Paliativo significa valerse de conhecimento apropriado com objetivos bem determinados e foco na vida até seu último momento É reconhecer a morte como algo inexorável e parte de um processo a ser monitorado e aliviado mas não como um objetivo final O termo hospice que por muito tempo designou a prática dos Cuidados Paliativos no mundo tem origem nas hospedarias medievais que abrigavam peregrinos doentes órfãos e pobres com necessidade de cuidados realizados de forma empírica e caridosa Nos séculos XVIII e XIX instituições religiosas assumiram o papel do cuidado aos en fermos pobres e portadores de doenças incuráveis como o câncer e a tuberculose1 Em meados do século XX a então enfermeira Cicely Saunders trabalhando numa instituições dessas em Londres percebeu que os doentes precisavam de atenção es pecífica de conhecimentos médicos para o alívio da dor e de atenção às necessidades espirituais Decidiu formarse em medicina para desenvolver este conhecimento1 Em 1968 a Dra Cicely Saunders fundou em Londres a primeira instituição voltada para o conceito moderno do cuidado ao doente no final da vida e com isso deu início ao Movimento Moderno de Hospice Em 1975 o Canadá adotou o termo Cuidado Palia tivo para designar a prática clínica associada ao hospice e desde então esse cuidado tem passado por várias discussões e aperfeiçoamento1 Atualmente o termo hospice tem sido mais frequentemente utilizado para designar uma instituição de média complexidade como um hospital especializado na prática dos Cuidados Paliativos e que possui como característica principal a excelência da prática clínica associada ao trabalho muito bem articulado de uma equipe multipro fissional com espaços apropriados para tal fim O objetivo é compreender e assistir as necessidades de doentes portadores de doenças terminais No Brasil a prática dos Cuidados Paliativos é relativamente recente A maioria dos grupos atuais iniciou suas atividades por volta de 2000 com acentuado progresso nos últimos quatro anos4 No entanto a prática ainda carece de regulamentação definições e inserção nas políticas assistenciais tanto no setor público como no privado A medicina paliati va ainda não é reconhecida como especialidade no Brasil o que impede a formação adequada de profissionais Da mesma forma a prática de enfermagem e de todas as demais profissões também não é reconhecida A maioria das equipes trabalha sem educação formal e o conhecimento se baseia nas iniciativas autodidáticas de profis sionais dedicados e nos cursos de curta duração muitas vezes sem adequação à nossa realidade Da mesma forma as referências internacionais sobre modelos de atenção em Cui dados Paliativos ainda são escassas e cada país tem buscado se adaptar à prática de tais cuidados com recursos preexistentes 73 Esta é de fato a grande recomendação para os Cuidados Paliativos da Organização Mundial da Saúde OMS uma assistência pautada em conceitos e princípios e adap tada à realidade de cada país ou região Neste capítulo analisaremos as diferentes modalidades de assistência em Cuidados Paliativos existentes no Brasil e o que deve ser comum a todas comentando vanta gens desvantagens e necessidades básicas de cada modelo numa tentativa de homo geneizar as ações desenvolvidas no país O documento de recomendações denominado Getting Started Guidelines and Suggestions for Those Starting a HospicePalliative Care Services elaborado pelo Dr Derek Doyle que atua em Cuidados Paliativos na Escócia há mais de 30 anos serve como ponto de partida para análise e considerações a seguir Esse documento foi pu blicado e é divulgado pela da Associação Internacional de Hospice e Cuidado Paliativo IAHPC3 Princípios da atuação Qualquer que seja o modelo de prestação de serviços as equipes de Cuidados Pa liativos possuem em comum3 reconhecimento e alívio da dor e de outros sintomas quaisquer que sejam sua causa e natureza reconhecimento e alívio do sofrimento psicossocial incluindo o cuidado apropriado para familiares ou círculo de pessoas próximas ao doente reconhecimento e alívio do sofrimento espiritualexistencial comunicação sensível e empática entre profissionais pacientes parentes e colegas respeito à verdade e à honestidade em todas as questões que envolvem pacientes familiares e profissionais atuação sempre em equipe multiprofissional em caráter interdisciplinar Equipes de Cuidados Paliativos habituamse a considerar sempre que há muito sofrimento envolvido nos processos de adoecimento e morte e que o ensino da medi cina não capacita o profissional de forma adequada para compreensão e alívio desse sentimento nos últimos anos e meses de vida O sofrimento físico inclui dor severa dispneia fadiga perda do apetite náusea e vômito obstipação insônia feridas delirium convulsões e outros sintomas de varia das naturezas que devem ser investigados e prontamente aliviados preferencialmente pelo controle de causas reversíveis3 O sofrimento psíquico inclui ansiedade medo depressão perda da dignidade so lidão medo de se tornar um estorvo e causar sofrimento aos entes queridos medo de que seus sentimentos não sejam valorizados e também de ser abandonado3 O sofrimento existencial inclui questões de cunho religioso os significados da vida da morte e do sofrimento culpas necessidade de perdão entre outros temas muito particulares3 Toda essa problemática junto com as de natureza social é determinante de um difícil e doloroso processo de morrer com muitas implicações para a rede de saúde em geral pelo alto custo da assistência voltada apenas para o modelo médicointerven cionista pelo estresse ocasionado às equipes de saúde e pelas consequências de um luto complicado para os familiares 74 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Que serviço se pretende construir Na estruturação de um serviço de Cuidados Paliativos as questões fundamentais a serem respondidas nesse período inicial de planejamento são as seguintes3 Quais os objetivos do serviço O serviço de Cuidados Paliativos pode ter por objetivo3 a resolução ágil de uma intercorrência no curso de uma doença avançada o cuidado pertinente à fase final da vida o cuidado prolongado a doentes incapacitados a reabilitação de pacientes gravemente incapacitados após acidente vascular ou trau mático recente em fase póscrítica mas de grande vulnerabilidade o cuidado a doentes com falência funcional avançada com períodos de instabilidade clínica e necessidade de intervenções proporcionais Qual a demanda de necessidades de Cuidados Paliativos É fundamental conhecer diagnósticos mais frequentes principais necessidades de doentes e familiares possibilidade de inserção do serviço de Cuidados Paliativos na cadeia da assistência existente Essa pergunta responde à primeira com base na necessidade local definese o obje tivo do serviço Que recursos materiais e humanos já existem Qual o modelo que mais se enquadra no objetivo proposto Qual o investimento proposto para este projeto Quais os obstáculos e resistências que envolvem as equipes profissionais Qual a necessidade de treinamento das equipes locais Depois da análise das necessidades demanda e intenção de investimento na ope racionalização do modelo de Cuidados Paliativos a ser implantado o passo seguinte é estudar cada estrutura e escolher a que melhor se adapta3 O Cuidado Paliativo nunca pode estar isolado da cadeia de serviços de saúde que caracterizam a atenção global ao paciente O fluxo de pacientes para internação numa unidade de Cuidados Paliativos as necessidades de investigação diagnóstica e o segui mento do doente durante sua estadia no domicílio devem ser parte de uma rede integrada e muito bem articulada de modo a oferecer segurança ao doente e a sua família em todas as etapas do adoecimento e no respeito às decisões previamente acordadas para o final da vida A Figura mostra um exemplo de rede de atenção em Cuidados Paliativos 75 Unidades de internação em Cuidados Paliativos Enfermaria de Cuidados Paliativos Consiste numa ala de um hospital geral secundário ou terciário que opera em leitos próprios e com equipe especializada em Cuidados Paliativos A equipe deve ser composta por médicos enfermeiras e técnicos de enfermagem psicólogo assistente social e capelão de caráter ecumênico Pode contar também com fisioterapeutas farmacêuticos clínicos e voluntários além da ação intermitente de outros profissionais e clínicas do hospital3 Funciona como uma clínica de especialidade no hospital com equipe constante e bem treinada maior flexibilidade com relação a visitas de familiares alimentação e regras do hospital A família deve ficar bem acomodada e receber atenção da equipe Preferencialmente a acomodação deve ser em quarto individual para a preservação da intimidade e das par ticularidades do doente com sua família No Brasil um exemplo de enfermaria de Cuidados Paliativos é a do Hospital do Ser vidor Público Estadual de São Paulo HSPESP com uma ala de 10 quartos individuais para o paciente e sua família O hospital tem complexidade terciária e possui 700 leitos ativos A enfermaria trabalha em consonância com o ambulatório de Cuidados Paliativos e atendimento domiciliar5 vAntAGens Integração dos Cuidados Paliativos com todas as especialidades do hospital facilitação do acesso de pacientes à internação nas 24 horas facilidade de acesso aos profissionais das equipes que até então o acompanhavam menos sensação de abandono respostas rápidas ao doente e maior segurança à família Hospedaria Figura Modelo de rede integrada em Cuidados Paliativos Assistência domiciliar Ambulatório Unidade de internação 76 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP facilidade para o ensino de Cuidados Paliativos disseminação de uma cultura de Cuidados Paliativos de forma científica e controlada dentro de um grande hospital contribuindo para a desmistificação de conceitos inade quados sobre a questão desvAntAGens O ambiente hospitalar é um fator limitante e as internações devem sempre ser curtas por dificuldades como acesso do paciente a áreas verdes e jardins e facilidade de reabilitação ambiente hospitalar como fator de agravo ao humor em especial para pacientes ido sos em hospitais pequenos o custo de uma unidade com menos de 10 leitos pode ser dema siadamente elevado pela necessidade de equipe treinada em período integral neCessidAdes Além de área física leitos e acomodações para pelo menos um familiar acompanhan te há a necessidade de se estabelecer fluxo de internações para pacientes externos prontosocorro e transferências de outras clínicas do hospital impressos apropriados ou templates específicos de internação e evolução diária quando houver prontuário eletrônico fluxo de encaminhamento para pacientes no período pósalta pois todos devem con tinuar inseridos no atendimento em Cuidados Paliativos seja ambulatorial ou domiciliar de acordo com o desempenho do doente política de padronização dos medicamentos necessários à boa paliação bem como fa cilidades de dispensação na alta hospitalar espaço físico e horas semanais destinadas à discussão de casos por equipe multipro fissional bem como espaço e ações que ajudem a equipe a elaborar o próprio luto de corrente dos óbitos e as situações de estresse pela convivência estreita com situações de sofrimento humano Grupo consultor em Cuidados Paliativos Consiste na criação de uma equipe profissional muito bem treinada que se coloca à disposição de todas as equipes de diferentes especialidades no hospital para a elaboração de um plano de cuidados dirigido ao paciente e a sua família Nesse caso a equipe não assume o doente de forma integral3 As equipes de interconsulta podem estar vinculadas e ser originadas nas enfermarias de Cuidados Paliativos quando existentes ou trabalhar de forma exclusiva em pequenos hospitais onde não comportem leitos próprios A maioria das equipes de Cuidados Paliativos para pacientes internados no Brasil funciona nessa modalidade neCessidAdes Nesse modelo assistencial a maior necessidade é a formação de uma equipe mínima de Cuidados Paliativos muito bem treinada e disponível no hospital A equipe deve contar com 77 um médico em período parcial de trabalho uma enfermeira treinada e que atue em consonância com a enfermeira da clínica de origem uma psicóloga muito bem treinada na prática de Cuidados Paliativos uma assistente social de acordo com a demanda local outros profissionais nãovinculados diretamente à equipe mas que atuem em con sonância com os princípios dos Cuidados Paliativos e que possam prestar assistência ocasional em situações selecionadas pelo grupo nutricionista fisioterapeuta terapeuta ocupacional farmacêutico etc uma sala para guardar o material da equipe e realizar reuniões regulares do grupo para a discussão dos casos visitados treinamento da equipe e educação continuada pois todos precisam ter muita segurança nos conhecimentos inerentes à prática proposta vAntAGens Baixo custo e rapidez de implantação do serviço pela necessidade de poucos profissionais possibilidade de interação de profissionais com alto conhecimento em Cuidados Palia tivos com diversas equipes do hospital desvAntAGens Dificuldade de aceitação pelas equipes especializadas dos novos paradigmas clínicos dos Cuidados Paliativos receio do profissional médico de ser invadido em suas decisões e condutas pessoais3 baixa adesão ao tratamento proposto especialmente no tocante a uso de opioides pro posição de novas vias de administração de medicamentos e suspensão de procedimentos e terapêuticas considerados fúteis Para minimizar esses problemas o grupo precisa retornar diariamente ao leito checar prescrições e interagir constantemente com a equipe local necessidade de equipe muito bem treinada e com perfil de educadores para o enfren tamento dessas dificuldades Unidade hospitalar especializada em Cuidados Paliativos Este é o termo equivalente ao inglês hospice Consiste numa unidade de saúde com complexidade mediana apta a dar respostas rápidas às necessidades mais complexas dos doentes Diferenciase do hospital geral pelo espaço destinado a atividades diversas e convivência inclusive para familiares flexibilidade e atuação contínua de equipes multi profissionais além de programação distinta e de caráter holístico3 A unidade hospitalar especializada em Cuidados Paliativos pode atender também a diferentes necessidades desde pacientes em fase final da vida e em crise de necessidades com perfil de internação curto média de 14 dias ou abrigar doentes com necessidades de internação prolongada média de dois a três meses em perfil de recuperação neuro lógica enfermidade crônica avançada como doenças pulmonar cardíaca ou renal com descompensações de repetição em curto período e fase avançada das demências com alto grau de incapacidade Precisa ser equipada para atender ocorrências clínicas e para isso necessita de pre sença médica durante 24 horas exames laboratoriais e radiologia contando com referên 78 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP cia para exames mais complexos como ressonância magnética RM e procedimentos pa liativos como inserção de cateteres urinários stents radioterapia paliativa entre outros Pode localizarse na área de um hospital de referência em um prédio isolado ou quando distante contar com rápidos sistemas de referência e transporte quando houver necessidade de intervenção mais complexa do que a oferecida na unidade3 No Brasil existem poucas unidades nessa modalidade sendo exemplos o Hospital do Câncer IV do Instituto Nacional de Câncer INCA no Rio de Janeiro a Unidade de Cui dados Paliativos do Hospital do Câncer de Barretos e o Hospital Local de Sapopemba em São Paulo que atende à clientela do Sistema Único de Saúde SUS e o Hospital Premier que atende convênios de saúde vAntAGens A unidade hospitalar de Cuidados Paliativos permite a prática especializada dos cui dados em toda sua plenitude com abordagem impecável aos sintomas físicos psicosso ciais e espirituais como uma série de atividades que permitem ao doente viver mesmo na fase final da doença com mais liberdade e funcionalidade facilidade para o trabalho com voluntários apesar de a assistência permitir a mesma complexidade do hospital a sensação de estar internado é atenuada na Unidade de Cuidados Paliativos permite maior convivência entre pacientes e familiares desvAntAGens A maior desvantagem da Unidade de Cuidados Paliativos é a necessidade de transfe rência do doente para uma unidade distinta a distância do hospital de referência pode elevar os custos com transporte e serviços de apoio quando necessários as visitas dos profissionais que previamente participavam ativamente do seu tratamen to são raras risco de o paciente sentirse abandonado ou relegado a segundo plano na rede assis tencial tendência equivocada de outros especialistas de verem como unidade de doentes crônicos ou apenas destinada ao final da vida o que distorce o conceito dos Cuidados Paliativos neCessidAdes A organização de uma unidade hospitalar em Cuidados Paliativos exige a construção ou a adaptação de um prédio apropriado e agradável que conte com jardins áreas de lazer e salas especiais para as atividades coletivas As acomodações devem ser preferencialmente individuais com espaço para instala ção de um familiar ou acompanhante com mobiliário leve e agradável Idealmente deve ter espaço para atividades de terapia ocupacional e de reabilitação exames laboratoriais ultrassonografia US endoscopia e radiologia assim como sala para pequenos procedimentos paliativos como gastrostomia por via endoscópica A unidade deve contar com equipe multiprofissional completa com formação em Cui dados Paliativos que inclui médicos enfermeiras psicólogos assistentes sociais fisio 79 terapeutas terapeutas ocupacionais musicoterapeutas fonoaudiólogos nutricionistas farmacêuticos odontólogos assistentes espirituais e voluntários O corpo clínico deve ser organizado segundo as exigências regionais com regimen to adequado comissões de ética médica e de óbitos comissão de controle de infecção hospitalar núcleo de reabilitação além de consultores nas áreas de geriatria oncologia cirurgia geral e outras de acordo com necessidade e objetivo do trabalho O parâmetro médico sugerido pela IAHPC é de 10 a 15 leitos por médico em período integral inclusive nos feriados e finais de semana Os plantões noturnos devem ser diários e há necessidade de profissional igualmente treinado em Cuidados Paliativos3 As unidades hospitalares de Cuidados Paliativos no Brasil têm em média 50 a 60 leitos disponíveis Podem abrigar uma unidadedia atividade ambulatorial integrada e núcleo de atendimento domiciliar A atividade de ensino deve contar com centro dotado de biblioteca sala de estudos aulas e reunião clínica Os profissionais devem ser estimulados a manter ao menos 3 ho ras semanais de estudos e atualização em Cuidados Paliativos segundo sugestão do Dr Doyle do IAHPC3 Por fim o fluxo de pacientes em sistema de referência e contrarreferência deve ser claro e objetivo quem encaminha quais os critérios de admissão qual o propósito da internação e para onde será encaminhado o paciente após a alta hospitalar atendimento domiciliar ambulatório ou hospedaria de Cuidados Paliativos Unidades de atendimento a pacientes externos Ambulatório de Cuidados Paliativos Definido como unidade ambulatorial baseada no modelo de consultas com um espe cialista destinase ao atendimento de pacientes portadores de doença avançada pro gressiva ameaçadora da vida e com poucas chances de cura O objetivo da assistência ambulatorial em Cuidados Paliativos é proporcionar ao doente o excelente controle de sintomas de sua doença a comunicação adequada de informações sobre a evolução da enfermidade suas perspectivas de tratamento e a opor tunidade de elaborar as dificuldades pessoais de ser portador de doença ameaçadora da vida em que a possibilidade de morte é tão ameaçadora quanto o curso da doença O principal benefício do ambulatório de Cuidados Paliativos é poder acompanhar os pacientes mais precocemente numa fase em que a doença apesar de significativa tem pouco impacto sobre o perfil funcional do doente Nessa fase o controle ideal de sintomas e a abordagem emocional podem contribuir para a melhoria da qualidade de vida com possibilidade de ter impacto também sobre a sobrevida do doente O acompanhamento ambulatorial deve sempre vislumbrar a possibilidade de agir na prevenção de crises de necessidades Atendendo ao princípio da atenção multiprofissional ao doente o ambulatório de Cuidados Paliativos deve ser organizado para garantir o tratamento por equipe multiprofissional de Cuidados Paliativos a ser definido como equipe mínima médi co enfermeiro psicólogo com ou sem assistente social ou equipe nuclear completa médico enfermeiro psicólogo fisioterapeuta terapeuta ocupacional nutricionista e assistente social com possibilidade de acessar outros profissionais quando ne cessário 80 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Há a possibilidade de conciliar no mesmo espaço físico o atendimento ambulatorial com uma unidade de atendimentodia em Cuidados Paliativos que será descrita a seguir o que facilita a integração de uma equipe multiprofissional completa ao ambulatório neCessidAdes Para o funcionamento de um unidade ambulatorial básica é necessário equipe composta por um médico em período parcial um enfermeiro assistencial e um psicólogo todos com formação específica na área um assistente social pode participar em um ou mais períodossemana como referência recepção e sala de espera com recepcionistasecretária um técnico de enfermagem para a organização de material e auxílio em procedimentos curativos e coleta de exames consultórios uma sala adequada para a realização de reunião familiar aproveitada também para reuniões de equipe uma sala para realização de procedimentos simples como paracenteses curativos com plexos enteroclismas etc salas de limpeza e preparo de material para esterilização em local conveniente Todas as instalações devem contar com espaços amplos portas largas e todas as facilida des ao acesso de pacientes em cadeira de rodas e eventualmente em macas O mesmo espaço pode ser compartilhado por equipes de geriatria clínica médica e oncologia possibilitando ao doente o vínculo com o espaço e a integração com o trabalho dos Cuidados Paliativos em todas as fases da doença O parâmetro estabelecido pela Câmara Técnica de Cuidados Paliativos do Ministério da Saúde do Brasil é de seis consultasprofissional em período de 4 horas Esse número permite uma consulta com duração média de 40 minutos o mínimo para uma atenção detalhada com pacientes com necessidades de Cuidados Paliativos Unidadedia de Cuidados Paliativos Tratase de uma modalidade de assistência destinada a pacientes que permanecem no domicílio cujo foco da atenção é prover a atenção em determinadas necessidades no curso de uma doença grave3 A unidadedia inclui fisioterapia terapia ocupacional musicoterapia arteterapia cuidados com a aparência nutrição e encontro com outros doentes e familiares possibi litando a troca de experiências de forma dirigida por profissionais muito bem qualificados para a tarefa Se houver a intenção de conciliar o espaço da unidadedia de Cuidados Paliativos com o atendimento ambulatorial o que tende a ser uma otimização de espaço físico e uma oferta de conforto para doentes e familiares haverá necessidade de agregar no espaço físico do ambulatório acomodações para atividade de terapia ocupacional pequeno núcleo de reabilitação refeição supervisionada descanso de pacientes em poltronas confortáveis amenidades leitura música cuidados com a aparência 81 área verde e de jardinagem com possibilidade de utilizarse de animais treinados petterapia Os benefícios da unidadedia não se estendem apenas aos doentes que passam a ter oportunidades e acesso a diversas terapêuticas complementares A permanência do doen te no local também beneficia o cuidador domiciliar que pode usar o tempo desobrigado do doente em qualquer outra atividade segundo sua necessidade A folga do cuidador domiciliar por um ou mais dias da semana propicia melhor adesão ao tratamento sentindose estimulado ao acompanhamento do doente em sua residência por mais tempo De modo geral as unidadesdia de Cuidados Paliativos funcionam de 5 a 6 horas du rante o dia Permanências mais longas só se justificam por necessidade clínica A equipe precisa de tempo antes e depois para se organizar e permanências longas podem ser cansativas para o doente3 Atendimento domiciliar em Cuidados Paliativos A modalidade de atendimento a pacientes em Cuidados Paliativos no domicílio ca racterizase por atividade destinada a portadores de doença avançada em progressão e com necessidade contínua de monitoramento de sintomas e aplicação de um plano de cuidados previamente estabelecido3 As visitas podem ser realizadas por médico ou enfermeiro treinados para esse fim e atento às especificidades dos Cuidados Paliativos Porém o paciente deve ser referenciado para ambulatório ou unidade especializada que elabora o seu plano de cuidados que consiste numa série de ações determinadas de forma individualizada Idealmente deve ser realizada pela equipe de atenção primária mais próxima de sua resi dência em consonância e em contínua troca de informações com a equipe especializada No Brasil a equipe do Programa de Internação Domiciliar Interdisciplinar de Pelotas RS é exemplo de gestão dessa modalidade de serviço no âmbito do SUS vAntAGens A permanência do doente em sua residência e ao lado de sua família é sem dúvida a condição ideal que lhe assegura a melhor qualidade de vida seja como for a casa do doente é seu local de maior identidade e onde as suas relações de vida se mostram mais presentes o acompanhamento do doente pela equipe primária de saúde ajuda a desmistificar a complexidade de sua doença os medos com relação aos medicamentos sobretudo os opioides e o faz sentirse inserido em sua história de vida e adoecimento o controle de medicamentos e insumos tende a ser mais eficiente assim como a adesão aos tratamentos propostos O maior envolvimento da comunidade ajuda no apoio ao doente e à família no caso de o paciente optar pela morte no domicílio aumenta a segurança quanto aos trâmites legais a serem seguidos quando se tem uma equipe presente e atuante pró xima da residência desvAntAGens Há necessidade de cuidador familiar atento e bem preparado para acionar a rede 82 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP de apoio em caso de surgimento de novas necessidades sintomas malcontrolados e mudanças no quadro clínico as visitas a pacientes em Cuidados Paliativos tendem a ser demoradas com duração mí nima de 45 a 50 minutos e exigem atenção a detalhes e tempo com repetidas orientações o treinamento das equipes de atenção primária precisa ter ótima qualidade e ainda assim várias ocorrências podem passar despercebidas e ser negligenciadas Normalmente as equipes da atenção comunitária atendem a demandas diversas de saúde e não se sen tem preparadas para a complexidade dos Cuidados Paliativos A estrutura ideal inclui uma equipe específica só para as visitas a pacientes em Cuidados Paliativos neCessidAdes Para um bom programa de atendimento domiciliar a primeira necessidade é o treina mento da equipe visitadora vinculada à atenção primária Enfermagem muito bem treinada pode monitorar as necessidades do doente e de sua família e alertar para possíveis mudanças nas prescrições novas orientações ou outras necessidades de assistência É necessária a compreensão de gestores de saúde no sentido de prover uma equipe exclusiva para os Cuidados Paliativos no domicílio o que muito facilita o trabalho e pos sibilita de fato a boa paliação no nível da atenção primária Há que se garantir uma política de medicamentos que devem ser dispensados de forma regular com controle pela equipe local As equipes necessitam de um núcleo ou base e de um sistema de comunicação 24 ho rasdia e sete dias por semana para o atendimento imediato de situações de emergência Nessas situações deve ser garantido o transporte do doente para o hospital de referência em Cuidados Paliativos Uma equipe exclusiva de Cuidados Paliativos tem capacidade de atender até 30 doen tes por vez na modalidade de assistência com visitas intermitentes e 10 na modalidade internação domiciliar com visitas diárias É o que acontece em alguns serviços do Brasil como os Programas de Internação Domiciliar PIDs de Pelotas e Londrina e em serviços de assistência como o do HSPE A referência do PID criado pela Portaria Ministerial no 2529 de 19 de outubro de 2006 é de 30 pacientesmês por equipe e permanência máxima de 30 dias de internação Deve haver uma equipe para cada 100 mil habitantes No entanto mes mo prevendo a internação em Cuidados Paliativos a portaria necessita de revisão no tocante aos Cuidados Paliativos pois em média os doentes têm sobrevida de dois a três meses podendo prolongarse E o perfil de necessidades é diferenciado A questão dos Cuidados Paliativos está contemplada na portaria que cria as Diretrizes Nacionais de Cuidados Paliativos elaborada pela Câmara Técnica de Dor e Cuidados Paliativos do Ministério de Saúde criada pela Portaria GMMS no 3150 de 12 de dezembro de 2006 e que aguarda aprovação Hospedarias de Cuidados Paliativos Concebidas com base no que os americanos chamam de nursing homes são unidades destinadas a pacientes relativamente estáveis com grau variado de dependência funcio nal e sintomas bem controlados ou de intensidade leve a moderada3 83 As hospedarias abrigam pacientes que poderiam permanecer em seus domicílios mas não conseguem por fatores distintos como falta de cuidador habilitado distância do cen tro de tratamento em situação de necessidade de intervenções paliativas e dificuldades relativas a alta dependência Um exemplo pioneiro de hospedaria no Brasil é a Hospedaria de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo HSPMSP Tratase de uma casa adaptada para receber até 10 pacientes com um acompanhante cada que funciona de forma independente mas muito próxima ao hospital de referência Na hospedaria uma equipe multiprofissional composta por médicos enfermeiros técnicos de enfermagem assistente social psicólogo e assistente espiritual todos com treinamento em Cuidados Paliativos assiste os doentes por um período variável com permanência média na casa em torno de seis meses6 Recebem visitas médicas periódicas duas a três vezes por semana e atendimento nas intercorrências Dois médicos permanecem disponíveis a distância 24 horas durante sete dias O hospital fornece todos os medicamentos e insumos para o provimento das necessidades do serviço6 Considerações gerais Seja qual for a necessidade e o objetivo em se montar um serviço de Cuidados Pa liativos alguns parâmetros devem ser respeitados na hora de se conceber o modelo de escolha O Quadro sugere os parâmetros a serem considerados e os diferentes modelos su geridos anteriormente Ela foi originalmente construída pelo Dr Derek Doyle porém foi necessário adaptar algumas situações à realidade nacional além de transformar as indi cações de leve moderada e severa em ou respectivamente Não existe no Brasil parâmetros oficiais para o cálculo das necessidades de Cuidados Paliativos Segundo a OMS a necessidade de Cuidados Paliativos pode ser baseada no perfil de mortalidade de uma população Considerase que entre as mortes ocorridas por causa natural 50 a 80 são passíveis de necessidades de Cuidados Paliativos considerando se todos os diagnósticos No caso do câncer e do HIVSIDA a porcentagem de pessoas com necessidade de Cuidados Paliativos por ano é de 80 acrescidos de seus cuidadores8 A Associação Europeia de Cuidados Paliativos EAPC por meio de documento elabo rado para a União Europeia classifica como ideal a proporção de leitos hoje existente no Reino Unido onde existe cerca de 50 leitos de Cuidados Paliativos para cada um milhão de habitantes7 A necessidade de leito hospitalar depende no entanto de características epidemioló gicas da região qualidades da assistência no hospital e oferta de serviços de apoio como ambulatório e atendimento domiciliar Nas diretrizes elaboradas pela Câmara Técnica de Cuidados Paliativos do Ministério da Saúde ficam estabelecidos quatro níveis de atenção em Cuidados Paliativos com base em documento elaborado pela Academia Nacional de Cuidados Paliativos ANCP2 ação paliativa cuidado dispensado em nível comunitário por equipe vinculada ao Programa de Saúde da Família PSF treinada para tal finalidade Cuidado Paliativos de grau I cuidado dispensado por equipe especializada em Cuida 84 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP dos Paliativos em nível hospitalar ambulatorial ou domiciliar porém sem leito próprio Exemplo de equipe consultora em Cuidados Paliativos Cuidado Paliativo de grau II cuidado dispensado por equipe especializada em Cuidados Paliativos em nível hospitalar ambulatorial ou domiciliar que atua com leitos próprios de internação Equivale tanto às enfermarias em hospitais gerais quanto às unidade hospi talares independentes Cuidado Paliativo de grau III mesma característica do cuidado de grau II acrescida de capacidade para a formação de profissionais em Cuidados Paliativos As portarias que regulamentam as diretrizes para os Cuidados Paliativos no SUS aguar dam a sua assinatura desde 13 de junho de 2008 Referências 1 CORTES C C Historia y desarrollo de los cuidados paliativos In MARCOS G S ed Cuidados paliativos e intervención psicosocial en enfermos de cáncer Las Palmas ICEPS 1988 2 CRITÉRIOS DE QUALIDADE PARA OS CUIDADOS PALIATIVOS NO BRASIL Documento elaborado pela Academia Nacional de Cuidados Paliativos Brasil 2007 3 DOYLE D Getting started guidelines and suggestions for those starting a hospicepalliative care services 2 ed Houston IAHPC Press 2009 Quadro Parâmetros de inserção de pacientes em diferentes modelos Parâmetro do Cuidado Paliativo Enfermaria em hospital geral Equipe consultora Hospitalar Unidade hospitalar especializada Ambulatório e unidadedia Serviço domiciliar Hospe daria Sintomas Instabilidade psicossocial Instabilidade clínica Dependência funcional Necessidade de atendimento médico contínuo Necessidade de estrutura social a a a Necessidade de cuidados de enfermagem Fonte DOYLE D Getting Started 2008 Adaptado por MACIEL M G 2009 85 4 MACIEL M G S A terminalidade da vida e os cuidados paliativos no Brasil considerações e perspectivas Prática Hospitalar v 47 p 469 2006 5 MACIEL M G S Modelos de assistência em cuidados paliativos enfermaria em cuidado paliativo São Paulo Cadernos CREMESP 2008 6 MATSUMOTO D Y Modelos de assistência em cuidados paliativos hospedaria em cuidado paliativo São Paulo Cadernos CREMESP 2008 7 MORENO J M M et al Palliative care in the European Union Document requested by European Parliaments Committee on the Environment Public Health and Food Safety Ref IPAENVIIC2007 123 2008 Disponível em httpwwweuroparleuropaeuactivitiescommitteesstudiesdownload dofile21421 Acesso em 13 jun 2009 8 WORLD HEALTH ORGANIZATION Guides for efective programs palliative care Geneve WHO 2007 Leitura recomendada DOYLE D The provision of palliative care In Oxford textbook of Palliative Medicine 2 ed Oxford University Press 1998 DOYLE D JEFFREY D Palliative care in the home Oxford University Press 2000 WHITE K R Non clinical outcomes of hospitalbased palliative care Journal of Health Care Manegement v 51 n 4 p 26073 2006 WORLD HEALTH ORGANIZATION Better palliative care for older people Geneve WHO 2004 86 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Controle da dor mirlAne GuimArães de melo CArdoso Introdução Doenças avançadas frequentemente estão relacionadas com sintomas associados ao sofrimento destacandose nesse contexto a dor que é conceituada pela Associação In ternacional para o Estudo da Dor IASP como uma experiência sensitiva e emocional de sagradável associada a dano real ou potencial dos tecidos ou descrita em termos de tais lesões14 Significa portanto que a dor é uma experiência única e individual modificada pelo conhecimento prévio de um dano que pode ser existente ou presumido ou seja em qualquer situação a dor é o que o paciente refere e descreve Muitas pesquisas nessa área relacionamse com pacientes com câncer já que neles a dor aparece como o sintoma que significativamente afeta a qualidade de vida na ter minalidade constituindo um fator importante do sofrimento relacionado com a doença mesmo quando comparado à expectativa de morte Estudos multicêntricos de controle da dor em pacientes com câncer revelam consistentemente que cerca de metade dos pacien tes recebe analgesia insuficiente chegando a 51 na França 42 nos Estados Unidos e 59 na China Da mesma forma ocorrendo com milhões de portadores de HIVSIDA em que 60 a 100 irão sentir dor em alguma fase da sua doença4 Revisões em outras populações têm sido realizadas incluindo pacientes com doen ça associada a insuficiência respiratória grave e distúrbios musculoesqueléticos nos quais foi observado que a prevalência dos sintomas na evolução dessas diferentes doenças crônicas é variável Porém o interessante é identificar nesses levantamentos que os sintomas são comuns tanto no câncer como nas doenças nãooncológicas inclusive a dor Tabela Tabela Prevalência de sintomas relatados retrospectivamente por cuidadores no último ano de vida dos pacientes1 Sintoma Câncer da população Nãocâncer da população Dor 71 72 Dispneia 63 64 Tosse persistente 50 42 Xerostomia 43 34 Anorexia 33 21 Náuseas e vômitos 55 50 Constipação 65 69 Confusão mental 42 44 Insônia 44 45 Mau humor 67 73 87 Esses dados estatísticos qualificam a dor crônica como um problema de saúde pública importante que requer atenção independente da origem da doença que a ocasionou Dezenas de milhões de americanos sofrem de algum tipo de dor crônica transitória ou persistente sem qualquer relação com neoplasias malignas neuralgias diabetes com neuropatias distúrbios cervicais e lombares artrites fibromialgias cefaleias distúrbios dolorosos faciais dores torácica e pélvica No Michigan Pain Study 70 dos entre vistados ainda tinham dores crônicas após o tratamento e 22 acreditavam que esse havia agravado a dor A sequência de tratamentos falhos agrava ainda mais o processo de condicionamento patológico mesmo quando são escolhidas as terapêuticas corretas Esse cenário sugere que fatores interrelacionados e alheios à medicina como problemas conceituais administrativolegais e educacionais na transferência de tecnologia na área de dor mantêm essa condição desfavorável6 Base neural da dor Uma das importantes funções do sistema nervoso é fornecer informações sobre lesões corporais em potencial que são expressas pela dor A percepção corporal da dor é deno minada nocicepção Quanto aos mecanismos neurofisiológicos a dor pode ser classificada em nociceptiva quando as vias nociceptivas se encontram preservadas sendo ativadas pelos nociceptores de tecidos cutâneos dor somática ou profundos dor visceral nãonociceptiva ou neuropática quando as vias nociceptivas apresentam alterações na estrutura eou função resultante de lesão seletiva do trato neoespinotalâmico dor central ou de lesões no sistema nervoso periférico dor periférica psicogênica que se origina de distúrbios psíquicos A dor oncológica é considerada frequentemente mista Considerando a dor um sistema complexo didaticamente ela pode ser dividida nos seguintes componentes nociceptores tratos nociceptivos ascendentes centros mais ele vados do sistema nervoso central SNC e sistemas inibitórios descendentes da dor O termo nociceptor é empregado para descrever terminações livres de fibras aferentes primárias que respondem a estímulos de uma ampla variedade de tecidos como vísceras polpa dentária músculos articulações além da pele As fibras aferentes nociceptivas primárias normalmente fibras Adelta Aδ e C transmitem sinais químicos mecânicos e térmicos por meio do trato de Lissauer fazendo sinapse com neurônios do corno dorsal da medula espinal Numerosos neurotransmissores e mediadores bioquímicos excitatórios glutamato substância P fatores de crescimento e inibitórios opioides ácido gama aminobutírico GABA e glicina são liberados no corno dorsal provenientes de três fontes principais fibra aferente primária interneurônios e sistema de fibras descendente As células do corno dorsal possuem receptores específicos para essas substâncias Portanto essa sinapse no corno dorsal seria o ponto no qual as informações dolorosas são conduzi das pelos tratos espinotalâmico e espinohipotalâmico aos centros superiores ou inibidas por ativação do sistema analgésico descendente composto por três componentes princi pais interrelacionados funcionalmente opioide noradrenérgico e serotoninérgico Os centros mais elevados do SNC estão envolvidos na discriminação da dor incluindo componente afetivo da dor componentes relacionados com memória e controle motor associado à resposta imediata aversiva aos estímulos dolorosos2 88 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Estratégia para o controle da dor O controle da dor deve se basear em avaliação cuidadosa com elucidação de suas pos síveis causas e seus efeitos na vida do paciente investigando fatores desencadeantes e atenuantes além dos psicossociais que possam influenciar o seu impacto Nesse sentido as equipes multiprofissionais dedicadas aos Cuidados Paliativos devem estabelecer preco cemente vias de comunicação claras para assistência O familiar é um pilar fundamental para incentivar a adesão ao tratamento já que uma analgesia insuficiente se traduz em sobrecargas física e psicológica para o paciente e sua família São diversas as barreiras existentes para manejo e controle adequados da dor com a nãoadesão ao tratamento por parte dos doentes a relutância na prescrição de opioides por parte dos médicos e a crença de que a dor é inevitável observada rotineiramente na prática no ambiente hospitalar Adicionalmente destacamos um aspecto fundamental que antecede até mesmo a própria sintomatologia álgica do paciente que é a formação acadêmica relacionada com a área de dor A estratégia de base científica para o controle adequado da dor e de outros sintomas se resume segundo Twycross21 na sigla EEMMA evolução da dor explicação da causa manejo terapêutico monitorização do tratamento atenção aos detalhes Evolução da dor A doença terminal é progressiva com grande variabilidade individual associada a múltiplos sintomas intensos e oscilantes Cada indivíduo tem suas próprias vivências as quais induzem a uma subjetividade de resposta diante da expressão de dor envolvendo respostas afetivas e cognitivas Portanto é necessário reconhecer o termo dor total introduzido por Cicely Saunders e explicado por meio de um esquema por Twycross2 Figura 1 Esse conceito mostra a importância de todas as dimensões dos sofrimentos humanos físico mental social e espiritual Portanto o alívio adequado da dor não é alcançado sem darse atenção a essas dimensões indissociáveis Estrategicamente devemse identificar quatro aspectos básicos na evolução a causa da dor o mecanismo da dor Quadro 1 os fatores nãofísicos envolvidos com a expressão de dor a discriminação detalhada da dor localização duração irradiação fatores temporais de agravamento e alívio impactos no sono e na capacidade funcional e intensidade 010 Com base no que o próprio paciente refere para avaliação da intensidade da dor su geremse as escalas uni e multidimensionais como instrumento de avaliação Destacase a escala visual analógica EVA por ser considerada sensível simples reproduzível e universal podendo ser compreendida em distintas situações em que há diferenças culturais intelectu ais ou mesmo de linguagem do avaliador É um método de autoavaliação representado por uma linha reta de 10 cm onde em um dos extremos se descrimina a ausência de dor e no outro a dor insuportável como representado na Figura 220 89 Falta de amigos Demora no diagnóstico Médicos inacessíveis Fracasso terapêutico Perda da posição social Perda do trabalho Perda da família Fadiga crônica e insônia DEPRESSÃO IRA Medo do hospital Medo da dor Medo da morte Preocupação com a família Angústia e culpa ANSIEDADE D O R T O T A L 1 Sintomas de debilidade 2 Efeitos colaterais da terapia 3 Patologia nãooncológica 4 Câncer FONTE SOMÁTICA Figura 1 Esquema de TWYCROSS21 Quadro 1 Tipos subtipos e características da dor Tipo Subtipos Características Exemplos Nociceptiva Somática Constante e bem localizada que se exacerba com movimentos e alivia com o repouso Osteoartrose metástase óssea infiltração de tecidos moles Visceral Constante aperto mal localizada associada a reações autonômicas náuseas sudorese Neoplasia eou metástases intraabdominais Cólicas Obstrução intestinal cólica renal Neuropática Disestésica1 Ardência constante hiperalgesia2 ou alodínea3 Radiculopatia por protrusão discal neuropatia pós quimioterapiaradioterapia Lancinante Episódica paroxismo tipo choque Invasão de plexo braquial ou do trigêmeo Adaptado de Pereira J L17 1 Sensação anormal e desagradável espontânea ou provocada 2 resposta mais intensa a um estímulo que normalmente é doloroso 3 quando um estímulo nãonocivo é percebido como dor 90 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Sobre essa linha o paciente deve marcar a posição mais aproximada da inten sidade da sua dor e podemos utilizar a escala numérica para qualificála A dor é considerada leve quando a intensidade varia de 1 a 3 na EVA a intensidade de 4 a 7 é considerada dor moderada e de 8 a 10 dor severa O registro da intensidade deve incluir não somente o momento da dor mas também quando a mesma é aliviada ou exacerbada Por essa razão o médico deve ensinar pacientes e familiares a utilizar as escalas de avaliação da dor Na prática clínica a falta de sistematização na avaliação da dor frequentemente leva a um subtratamento apesar dos avanços terapêuticos Portanto na investiga ção da dor a possibilidade de o paciente discorrer sobre ela mediante um autorre lato é o ponto de partida para diagnóstico implementação terapêutica e posterior avaliação de sua eficácia Explicação da causa As explicações de causa mecanismo da dor e fatores que podem modificar a sua intensidade como o resgate do padrão de sono a diminuição do cansaço e a melhora do humor por meio de uma linguagem simples para o paciente e sua família habi tualmente contribuem para confiança e adesão ao tratamento O envolvimento direto pelo tumor é a causa mais frequente de dor nos pacientes oncológicos 70 porém em 17 a dor está relacionada com o tratamento anti tumoral Quadro 23 23 O uso do antineoplásico paclitaxel Taxol no tratamento de tumores refratários à quimioterapia convencional está relacionado com o apare cimento de artralgias mialgias e neuropatias periféricas incapacitantes e limitantes do tratamento7 SEM DOR PIOR DOR POSSÍVEL ESCALA VISUAL ANALÓGICA SEM DOR PIOR DOR POSSÍVEL ESCALA NUMÉRICA 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Figura 2 Escalas visual analógica e de categoria numérica 91 Quadro 2 Síndromes dolorosas relacionadas com o câncer e seu tratamento3 Dor por infiltração direta Dor relacionada com o tratamento Dor nãorelacionada com a doença Infiltração óssea Pósoperatória Neuropatia diabética 1 Dor da base do crânio 2 Dor do corpo vertebral 3 Síndrome do sacro 4 Lesão de ossos longos 1 Dor póstoracotomia 2 Dor em membro fantasma Infiltração visceral Pósquimioterapia Artrites gota e artrose 1 Pleural 2 Hepática 3 Peritoneal 4 Pancreática 1 Neuropatia 2 Mucosite 3 Cistite hemorrágica 4 Neuralgia pósherpética 5 Artralgias e mialgias Infiltração de vasos Pósradioterapia Lombalgias 1 Arterial 2 Venoso 3 Linfático 1 Mucosites 2 Esofagites 3 Proctites 4 Queimaduras 1 Enfermidade degenerativa discal Infiltração de nervos 1 Plexo braquial 2 Plexo lombar 3 Plexo sacral 4 Epidural 5 Meníngea Manejo da dor Implica a consideração de três aspectos que podem estar combinados identificar e tratar a causa da dor quando possível3 Quadro 2 medidas nãofarmacológicas12 Quadro 3 medidas farmacológicas Quadro 3 Exemplos de abordagens de tratamento nãofarmacológico12 Técnicas de relaxamento distração e imaginação dirigida Terapia física por aplicação de calor em casos de espasmos musculares e artralgias Terapia física por aplicação de frio em casos de dor musculoesquelética contusão e torção Acupuntura em casos de dor devida a espasmos musculares disestesias e nevralgias Massoterapia nos casos em que se desejam relaxamento muscular e sensação de conforto Neuroestimulação elétrica transcutânea TENS em casos de dor por compressões tumoral nervosa óssea e em região de cabeça e pescoço 92 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Tratamentos paliativos modificadores de doença podem ser indicados para controle da dor Por exemplo em pacientes com dor localizada por fratura patológica a fixação cirúrgica dessa fratura controla satisfatoriamente os sintomas dolorosos Na paliação de doenças nãooncológicas esses princípios são igualmente aplicados Já a terapia medicamentosa referese à arte e à ciência no uso combinado de três grupos farmacológicos analgésicos nãoopioides analgésicos opioides sendo a morfina a droga de eleição e drogas adjuvantes ou coanalgésicos Nesse sentido a Organização Mundial da Saúde OMS publicou em 1986 um modelo clínico eficaz para o tratamento da dor oncológica que serve até os dias atuais validado e aceito mundialmente com base em seis princípios básicos23 pela boca usar a via oral sempre que possível pelo relógio horário regular e não apenas em doses se necessário para o indivíduo de acordo com as necessidades específicas do doente uso de coanalgésicos ou adjuvantes atenção aos detalhes pela escada analgésica Segundo esse algoritmo a dor deve ser tratada de acordo com uma escala ascenden te de potência medicamentosa relacionada com sua intensidade As drogas analgésicas aumentam sua potência começando com os analgésicos nãoopioides englobando os analgésicos antipiréticos dipirona paracetamol os antiinflamatórios nãohormonais AINHs e coxibes na dor leve passando pelos opioides fracos na dor moderada e opioides fortes como a morfina nas dores severas Todos esses medicamentos podem estar acom panhados de drogas adjuvantes que concedem o alívio da dor neuropática e controlam os efeitos adversos dos opioides favorecendo assim uma terapêutica com menor risco de toxicidade Adicionalmente a prescrição de fármacos profiláticos para sintomas per sistentes deve ser observada A eficácia desse modelo de escada analgésica foi avaliada em trabalho recente com pacientes terminais o qual evidenciou maior alívio da dor quando se utilizaram opioides potentes em dores com escores inferiores a 6 na EVA O resultado sugere que esses opioides como a morfina podem ser iniciados nas dores leves e moderados em baixas doses em substituição aos opioides fracos13 Já outros autores sugerem que deve ser acrescido um quarto degrau à escada analgésica da OMS15 Em 2003 com base em uma revisão Cochrane22 e nas recomendações da Associação Europeia de Cuidados Paliativos EAPC9 sobre os analgésicos opioides e seus efeitos indesejá veis foram associados ao escalonamento opiáceo os procedimentos anestésicos neurolíticos e neuroaxiais representados no quarto degrau da escada analgésica da OMS Figura 3 Entre os analgésicos nãoopioides os AINHs Quadro 4 são os agentes terapêuti cos mais utilizados sendo prescritos para o controle da dor e do edema nas artropatias crônicas osteoartrite e artrite reumatoide e nas anormalidades musculoesqueléticas traumatismo fraturas e lesões de partes moles além de proporcionarem alívio das do res pósoperatória dental bem como de cefaleias e dismenorreia Geralmente são bem tolerados em curto prazo mas preferencialmente devese escolher um analgésico com mecanismos adicionais sinérgicos como o caso da dipirona que ativa a via Larginina óxido nítrico NOmonofosfato de guanosina cíclico GMPccanal de potássio sensível ao trifosfato de adenosina KATP e ao mesmo tempo interage com o sistema glutama térgico resultando numa analgesia inquestionável19 93 ESCADA ANALGÉSICA DA OMS 1986 Modificada 3º degrau DOR SEVERA Opioides fortes morfina oxicodona metadora fentanil Drogas adjuntes ATENÇÃO FAMILIAR SUPORTE EMOCIONAL E COMUNICAÇÃO 1º degrau DOR LEVE Analgésicos nãoopiodes Drogas adjuvantes e técnicas anestésicas e neurocirúrgicas 4º degrau OPIOIDES por outras vias EV SC espinal intratecal 2º degrau DOR MODERADA Opioides fracos codeína tramadol propoxifeno Drogas adjuvantes Figura 3 Escada analgésica da OMS modificada9 22 OMS Organização Mundial da Saúde EV via endovenosa SC via subcutânea Quadro 4 Doses recomendadas de analgésicos nãoopioides disponíveis no Brasil18 Droga Doses recomendadas para crianças e adultos 50 kg DMD Dipirona 500 a 1000 mg 66 h 6 g Paracetamol 500 a 1000 mg 46 h 6 g Diclofenaco 50 a 100 mg 68 h Retard 612 h 200 mg Tenoxicam 20 a 40 mg 24 h 40 mg Cetoprofeno 50 a 100 mg 8 h 400 mg Piroxicam 20 a 40 mg 24 h Nimesulida 50 a 100 mg 12 h Meloxicam 75 a 15 mg 1224 h Eterocoxib 60 a 90 mg 24 h DMD dose máxima diária Esse fato somado ao perfil físicoquímico e às diferentes formas farmacêuticas dis poníveis torna seu uso mais tolerável do que o dos AINHs ácidos no que diz respeito à toxicidade gástrica com uso prolongado 94 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Na escolha de um AINH clássico ou um coxibe AINHs altamente seletivos para ciclo oxigenase 2 COX2 deve ser priorizada a história clínica dos pacientes e os seus efeitos colaterais criteriosamente monitorados Monitorização do tratamento É necessário o seguimento não só para avaliação da eficácia terapêutica mediante escalas mas também para identificar progressão da doença tipo e padrão temporal de dor desenvolvimento de tolerância medicamentosa aparecimento de efeitos adversos intratáveis e necessidade de rodízio dos opioides As respostas aos fármacos que o paciente recebeu previamente são avaliadas procu randose ajustar a posologia doses intervalos agregandose fármacos adjuvantes quan do necessário modificandose os fármacos prescritos ou adaptandose a via de admi nistração dos medicamentos já que mais da metade dos doentes com câncer avançado necessita de duas ou mais vias de administração de analgésicos antes do óbito Atenção aos detalhes O controle da dor tem uma base científica mas existem também aspectos de ordem prática como a adoção de uma postura detalhista para evoluir e não presumir associada a uma boa dose de atitude humanitária o que contribui para a eficácia da terapêutica analgésica As recomendações médicas assistenciais por exemplo devem ser escritas e exausti vamente orientadas verbalmente A melhor prescrição para controlar uma dor severa pode falhar porque as receitas foram escritas com letras ilegíveis ou porque o paciente não recebeu a adequada orientação Quanto mais fácil for o regimento terapêutico maior a possibilidade de seu cumprimento Alguns fármacos são de diferentes cores o que ajuda comunicação e orientação diárias com alguns pacientes Diversificar a forma de apre sentação de diferentes medicamentos comprimidos pastilhas cápsulas soluções gotas pode fazer com que o doente tenha a impressão de que não ingeriu tantos medicamentos assim Podemos ainda adicionar essência de laranja ou menta à solução de morfina e carbamazepina sabidamente amargos para que resulte em um sabor mais agradável Dentro do possível limitase a prescrição em quatro a cinco medicamentos preferen cialmente de ação prolongada garantindo assim maior adesão Infelizmente isso nem sempre é possível devido à evolução flutuante da dor da maioria dos doentes Evitar o retardo no tratamento da dor utilizar dosesresgate durante a titulação dos opioides não usar placebos e manter constante comunicação com o paciente e sua famí lia são outros cuidados do tratamento sintomático que devem ser lembrados10 Farmacoterapia básica com opioides princípios gerais Estudos demonstram que a farmacoterapia adequada com opioides pode aliviar a dor e o sofrimento dos pacientes oncológicos em 75 a 90 quando os consensos reco mendados pela OMS mundialmente aceitos são sistematicamente aplicados Porém as estatísticas indicam outra realidade mais de 25 morrem sem controle da dor O alívio da dor no câncer tem sido considerado pela OMS um problema que fere os direitos hu 95 manos porque seu manejo inadequado é reputado um grave problema de saúde pública em todo o mundo4 O termo opioide se refere a toda substância natural ou sintética que exerça sua ação mediante interação com receptores específicos distribuídos no SNC induzindo uma analgesia por ativação dos sistemas inibitórios opioidesdependentes na forma ção reticular do tronco cerebral da medula espinal e do sistema límbico Os opioides compreendem as drogas semelhantes à morfina que são antagonizadas pela naloxo na um antagonista opioide Essas drogas modificam o componente afetivomotiva cional da dor reduzindo sofrimento ansiedade e produzindo sedação e aumento da tolerância à dor A inclusão dos opioides no regime analgésico demonstra boa resposta à dor de caráter no ciceptivo e resposta variável às dores neuropáticas com favorável relação de riscobenefício Selecionar e titular individualmente as doses de opioides A escolha do opioide mais adequado deve basearse a princípio na intensidade da dor Em geral nas dores de pequena intensidade essa classe de analgésicos segundo a escada analgésica da OMS não está indicada devendose dar preferência aos analgésicos antiinflamatórios enquanto nas de maior intensidade EVA 5 preferemse os opioides de baixa potência codeína e tramadol associados a antiinflamatórios ou opioides de alta potência morfina metadona oxicodona e fentanil conforme proposto pela OMS Figura 3 Entre os opioides disponíveis destacase a morfina como o padrãoouro no tratamen to da dor moderada e severa Seu consumo medido em miligrama per capita é conside rado um indicador de qualidade no tratamento da dor Ela está disponível no Brasil sob a forma de solução oral e de comprimidos de liberação imediata contendo respectiva mente 10 mgml 10 mg e 30 mg para prescrição inicial a cada 46 horas Há cápsulas de liberação lenta para uso a cada 12 horas com 30 mg 6 0mg e 100 mg As ampolas contêm 2 mgml e 10 mgml e devem ser usadas preferencialmente por via subcutânea SC em bolo ou infusão contínua em pacientes sob Cuidados Paliativos Recomendase iniciar a terapêutica com morfina de liberação imediata até o controle da dor lembrando que os opioides não apresentam efeitoteto o que permite que doses crescentes sejam empregadas progressivamente sendo limitada apenas pela tolerância aos efeitos colaterais individuais A dose inicial depende da história de uso de analgésicos do paciente Se o paciente já estava em uso de opioide fraco codeína 60 mg ou tramadol 100 mg a titulação pode ser iniciada a partir de 10 mg de morfina oral de ação rápida Quadro 5 Devese repetir a dose de 5 mg de hora em hora até se obter a analgesia satisfatória Em seguida a dose total diária definida de morfina é prescrita como regular em intervalos de 4 a 6 horas Após controle do quadro doloroso a mudança para morfina de liberação controlada associada à doseresgate SOS para o controle da dor episódica é recomendada principalmente para os doentes com dificuldade de adesão ao tratamento A prescrição da doseresgate é feita com a morfina de liberação imediata e calculada como um sexto da dose total diária consumida Quadro 6 Essa dose extra pode ser repetida de hora em hora até o alívio da dor11 Na nossa experiência a dose máxima de morfina mais comumente empregada pela via oral tem sido 30 mg a cada 4 horas o que significa 180 mg ao dia próximo ao verificado 96 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 5 Fatores de conversão de opioides eou via de administração17 Droga Droga Regra De Para Codeína oral Morfina oral Dividir por 10 Tramadol oral Morfina oral Dividir por 5 Tramadol parenteral Morfina parenteral Dividir por 10 Morfina oral Morfina subcutânea Dividir por 2 Morfina oral Morfina endovenosa Dividir por 3 Morfina oral Fentanil transdérmico Dividir por 3 Quadro 6 Etapas para o rodízio dos opioides3 Calcular a dose diária total do opioide nas 24 horas incluindo doseresgate Utilizar as tabelas de equivalência analgésica para calcular a dose do novo opioide Considerar que a tolerância cruzada nem sempre é completa Ao trocar de um opioide para o outro diminuir a dose do novo opioide em 20 a 30 Estabelecer a dose de manutenção Dividir a dose diária total do novo opioide pelo número de doses que serão administradas em um dia Prescrição de dosesresgate Acompanhar diariamente os pacientes durante o período de troca utilizando menos de três dosesresgate nas 24 horas desde que não ocorram efeitos adversos até se estabelecer o controle do quadro álgico Exemplo prático trocar a morfina de liberação imediata pela de liberação controlada 1 Calcular a dose diária total da morfina de liberação imediata Morfina 10 mg de 44 horas por via oral é igual a 60 mg24 horas 2 Calcular a quantidade de cada dose individual Dividir a dose diária total pela frequência das doses necessárias nas 24 horas Morfina 60 mg2 morfina de liberação controlada 30 mg de 1212 horas por via oral 3 Prescrever doseresgate 16 da dose diária total 606 10 mg de morfina de ação imediata por via oral a cada hora de acordo com a necessidade para o controle da dor por Zech et al24 cuja dose máxima diária raramente ultrapassou 240 mgdia considera da baixa Acreditase que o uso da morfina associada aos AINHs e coanalgésicos explica seu emprego em baixas doses o que é verificado no nosso meio e em outros países A utilização simultânea de dois opioides não se traduz em analgesia adicional portanto deve ser evitada exceto em alguma situação excepcional Por exemplo morfina de ação ime diata como doseresgate de tratamentos com fentanil transdérmico Da mesma forma não se recomenda a combinação de fármacos do segundo e terceiro degraus da escada analgésica Figura 3 No segundo e terceiro degraus se podem associar os analgésicos do primeiro já que atuam por mecanismos diferentes AINHs Se for necessário alterar o opioide ou sua via de 97 administração poderão ser utilizados os fatores de conversão Quadro 5 devendo sempre ser ajustada a dose individualmente Surgindo intolerância aos efeitos colaterais reduzir a dose em 50 a cada dois dias ou utilizar outro opioide em dose equivalente Em caso de suspensão da morfina ou de outro opioide por exemplo nos casos de dor controlada pósradioterapia reduzir inicialmente para um quarto da dose em seguida diminuir 50 até atingir a dose equivalente a 10 a 15 mgdia suspendendo ao fim de dois dias17 A escolha de um opioide potente nem sempre pode aplicarse à dor crônica central ou neuropática caso em que a primeira opção é muitas vezes um anticonvulsivante ou um antidepressivo tricíclico Nesse caso o tramadol e a metadona são os opioides de escolha nas agudizações desse tipo de dor O tramadol é um opioide fraco que tem baixa afinidade por receptores opioides sendo parcialmente antagonizado pela naloxona Adicionalmente inibe a captação de noradre nalina e serotonina ativando assim o sistema inibitório descendente da dor As apresen tações farmacêuticas podem ser em soluções de 50 ou 100 mgml 25 gotas comprimi dos de liberação imediata de 50 e 100 mg administrados em intervalos de 4 a 6 horas comprimidos de liberação lenta 12 h ou ainda comprimidos de 375 mg associados ao paracetamol A dose diária não deve exceder 400 mg Também pode ser usado pela via SC de forma intermitente ou contínua Não apresenta ação antitussígena como a codeína e é menos constipante e mais nauseante A metadona é considerada um opioide excelente para as dores resistentes à morfina e principalmente para o controle da dor neuropática Compartilha com os outros opioides as mesmas propriedades porém tem algumas peculiaridades que a diferenciam Além de ser agonista de receptores opioides é antagonista de receptores nmetilDaspartato NMDA o que pode justificar sua maior eficácia no controle da dor neuropática e seu menor desenvolvimento de tolerância em comparação com a morfina Apresenta meia vida longa e imprevisível 10 a 75 horas o que dificulta sua avaliação Ao contrário do que se faz com a morfina durante a titulação individual as doses de metadona se suce dem de acordo com a dor do paciente só havendo horários fixos como recomendado pela OMS depois da primeira semana de titulação11 No Brasil a oxicodona é comercializada em comprimidos especiais de 10 20 e 40 mg administrados de1212 horas que não podem ser mastigados ou triturados Com a in disponibilidade de comprimidos de ação imediata e formulação injetável é necessário utilizar a morfina de liberação imediata nas dosesresgate Considerada um opioide sem o estigma da morfina é frequentemente usada no tratamento de dores crônica não oncológicas e com a vantagem adicional de uma absorção bifásica pelo organismo sendo o primeiro pico plasmático com menos de uma hora e o segundo aproximadamente com seis horas Apesar de ser um opioide uma vez e meia a duas vezes mais potente que a mor fina parece ter menor incidência de tolerância e efeitos adversos o que leva essa droga a em alguns centros ser utilizada no segundo degrau da escada analgésica como ocorre na nossa prática à frente do Serviço de Terapia da Dor e Cuidados Paliativos da Fundação Centro de Controle de Oncologia do Amazonas FCECON Rodízio entre os opioides Rotineiramente somente 10 a 30 dos pacientes demonstram resposta pobre aos opioides durante uma administração de rotina e esse é um fenômeno complexo que pode 98 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP estar relacionado com um ou mais grupos de fatores diversos e ainda pouco compreen didos Os pacientes que desenvolvem efeitos adversos intoleráveis mesmo antes de al cançar a analgesia adequada já que o incremento da dose é impraticável devem receber tratamento efetivo para prevenir ou tratar os efeitos adversos e somente quando essa intervenção falhar devese considerar o rodízio de opioides Quadro 6 Alucinações falha cognitiva mioclonias e náuseas são outras indicações para o ro dízio de opioides além da dor nãocontrolada e a mudança de via de administração No rodízio de opioides o objetivo é alcançar uma ótima analgesia com o mínimo de efeitos tóxicos relacionados com a sobredose ou com o inadequado controle da dor com uso de subdose Uso preferencial da via oral sem esquecer as vias alternativas Os opioides podem ser empregados pelas vias oral VO retal VR sublingual SL intramuscular IM intraventricular IV subcutânea SC transdérmica TD epidural in tratecal intraarticular e nos troncos nervosos Em Cuidados Paliativos o objetivo de conforto prevalece também na escolha da via de administração dos fármacos Recomendase simplificar a prescrição e evitar vias endoveno sas que agregam desconforto dependência riscos e custos geralmente desnecessários À exceção de alguns tumores de vias digestivas altas e de situações clínicas como vômitos disfagia intolerância obstrução intestinal caquexia e necessidade de sedar o paciente que justificam uma via alternativa a VO além de ser a recomendada pela OMS aparece como a preferida em mais de 75 dos pacientes podendo ser mantida até os últimos dias de vida No entanto essa via exerce influência sobre a incidência de meta bólitos tóxicos da morfina no SNC morfina3glicurônioM3G e morfina6glicurônio M6G quando em comparação com a administração endovenosa Os pacientes que re cebem morfina VO apresentam prevalência três vezes maior de mioclonias em compra ração àqueles que tomam a droga por via parenteral A diminuição da dose de morfina em 25 a 30 a troca de via de administração e a hidratação podem reverter o quadro de neurotoxicidade caracterizado por sintomas neuropsiquiátricos confusão déficit de atenção perda de memória delírios e alucinações5 Quando a VO não é possível a mais utilizada é a SC hipodermóclise por sua efetivi dade e facilidade de uso Proporciona o mínimo de desconforto para o paciente eliminan do a necessidade de injeções frequentes sendo confortável e segura para uso domiciliar As regiões peitoral deltoide mesogástrica e coxofemoral são as zonas de punção mais utilizadas podendo permanecer somente por dois a três dias mesmo que não se identifi quem complicações da técnica inflamação hematomas e infecção Midazolam morfina haloperidol tramadol metroclopramida e dexametasona são alguns dos medicamentos mais frequentemente infundidos por esta via pois não são irritantes Essa administração pode ser em bolo ou infusão contínua diluída preferencialmente em solução salina ou soro glicosado a 5 combinados ou não com o cuidado de não exceder o volume limite de 10 mlh diminuindo assim a possibilidade de irritação local e má absorção A equi valência da dose de morfina oralsubcutânea é de 21 ou seja a dose oral de morfina é reduzida em 50 para ser administrada por via SC A infusão exclusiva de morfina permite a manutenção do mesmo local de punção por até duas semanas podendo ser interrompida a qualquer hora sem risco de trombose 99 A VR pode ser uma alternativa à VO porém se associa a menor adesão de doentes e a irregularidade na absorção As doses empregadas VO e VR são bem semelhantes As formas de apresentação transdérmica em que o fármaco é incorporado a um patch para produzir uma taxa constante de suprimento e evitar o metabolismo présistêmico e a consequente diminuição da biodisponibilidade inerente à VO só são apropriadas para fár macos altamente lipossolúveis como o fentanil que na pele proporciona biodisponibilidade em torno de 92 mantendo uma concentração sistêmica estável por 72 horas Os adesi vos possuem superfície coberta com microporos de tamanhos diferentes que controlam a frequência de liberação do fentanil em aproximadamente 25 50 75 e 100 µgh que pro movem crescentes concentrações plasmáticas da droga É importante lembrar que a derme funciona como um reservatório secundário de forma que depois da remoção do adesivo pode haver manutenção da concentração plasmática da droga com efeitos colaterais tardios 8 a 12 horas A adoção dessa via deve ser precedida da administração de morfina oral ou parenteral a fim de aferir eficácia e tolerância aos opioides bem como para determinação da dose apropriada utilizando a ajuda de uma tabela de conversão Quadro 6 Portanto ela não está indicada a doentes que necessitam de titulação rápida já que seu início de ação é de aproximadamente 12 a 24 horas para atingir concentrações de equilíbrio e controle da dor Caso isso não ocorra nas 48 horas devese reajustar a dose utilizando um patch adicional de 25 µgh e tendo como base a doseresgate necessária nesse período Os adesivos devem ser fixados sobre a pele limpa em superfícies planas regiões lombar e dorsal e braços sem pelos evitando as áreas irritadas e irradiadas da pele A via IV é a de escolha quando a VO não é possível e há necessidade de uma titulação mais acelerada da dose analgésica Entretanto associase a maior desconforto do doente custos e riscos de infecções locais e sistêmicas A via IM é pouco indicada por ser dolorosa e desconfortável Quando um fármaco não é eficaz por via sistêmica ou instalase a tolerância as vias peri dural subaracnóidea ou intraventricular podem ser utilizadas desde que sejam realizadas por profissionais capacitados para tal procedimento motivo pelo qual são de rara ocorrência Por essas vias a analgesia é mais prolongada do que a sistêmica em doses inferiores Doses sistemáticas Ao se prescreverem analgésicos devese conhecer a sua faixa terapêutica analgésica que representa os níveis nos quais sua concentração se mantém constante para permane cer na zona de analgesia pois a dor crônica requer tratamento preventivo portanto eles devem ser prescritos em intervalos regulares Ao se administrarem doses subterapêuticas as concentrações analgésicas se mantêm baixas e consequentemente o paciente perma nece com dor Se forem administradas doses supraterapêuticas conseguese a analgesia em curto período de tempo obtendose rapidamente os efeitos colaterais Portanto o tra tamento deve ser iniciado com doses baixas de opioides administrados em intervalos fi xos para se manterem os níveis plasmáticos e consequentemente a faixa terapêutica24 Usar drogas adjuvantes Os medicamentos adjuvantes são usados com o objetivo de aumentar a eficácia analgé sica dos opioides prevenir e tratar sintomas concomitantes que exacerbam a dor e colaborar 100 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP com o manejo da dor neuropática Podem ser usados em todos os degraus da escada analgé sica da OMS Entre os coanalgésicos temos corticoides dexametasona anticonvulsivantes car bamazepina gabapentina topiramato pregabalina antipsicóticos clorpromazina e haloperidol antidepressivos tricíclicos amitriptilina e imipramida antihistamínicos prometazina ketamina anestésicos locais e bifosfonatos Esses agentes são sinérgicos aos opioides ou seja podem ser associados em doses mais baixas do que as prescritas isoladamente o que pode reduzir o potencial tóxico de cada um Os antidepressivos tri cíclicos e anticonvulsivantes Quadro 7 são amplamente prescritos e amiúde fornecem benefícios reais Quadro 7 Anticonvulsivantes e antidepressivos tricíclicos disponíveis no Brasil17 Princípio ativo Dose Carbamazepina Iniciar 100 mg de 1212 h aumentar 200 mg a cada semana Dose de manutenção 400 a 600 mg de 1212 h Reduzir em idosos ou casos de insuficiência renal Monitorizar leucograma e função hepática Gabapentina Iniciar 300 mgdia ao deitar 300 mg de 1212 h Aumentar 300 mg a cada 3 dias até a dose de 1800 mgdia Reduzir em idosos ou casos de insuficiência renal Pregabalina Iniciar 75 mg de 1212 h aumentar após 3 dias para 150 mg de 1212 h Aumentar após 7 dias para 300 mg de 1212 h Dose máxima de 300 mgdia Reduzir em idosos ou casos de insuficiência renal Amitriptilina Iniciar 10 a 25 mg ao deitar Titular a cada semana Dose máxima de 50 a 75 mgdia em duas doses diárias ou em uma tomada ao deitar Nortriptilina Iniciar 25 mg ao deitar Titular a cada semana Dose máxima de 100 mgdia de 88 h Minimizar os efeitos indesejáveis Na hora de prescrever um fármaco temos de avaliar vantagens e desvantagens além dos inconvenientes efeitos secundários já que são a causa mais frequente de abandono do tratamento Aproximadamente 22 dos pacientes com dores nãooncológicas des continuam o uso de opioide em função dos seus efeitos adversos Os efeitos colaterais dos opioides Quadro 8 são fatores limitantes tanto para seu uso prolongado como para o acréscimo de doses na busca da concentração analgésica desejada 101 Quadro 8 Efeitos colaterais dos opioides9 Cognitivos Sonolência sedação desorientação confusão mental euforia disforia miose borramento visual inconsciência e coma Digestivos Xerostomia aumento do tono da musculatura lisa depressão da motilidade gastrointestinal prolongamento do esvaziamento gástrico reduções do ácido clorídrico e da secreção pancreática constipação intestinal espasmo no trato biliar náuseas e vômitos Neurovegetativos Rubor facial diaforese e piloereção Inibição simpática hipotensão postural e ativação vagal bradicardia Depressão respiratória tolerância ao CO2 Urológicos Urgência miccional retenção urinária espasmo do esfíncter uretral e diminuição da libido Tolerância Necessidade de ajuste periódico das doses Dependência e vício Dependência física caracterizada pela síndrome de abstinência lacrimejamento espirros bocejos agitação dores no corpo diarreia psicoses e alucinações É comum mas não constitui obstáculo para o uso dos opioides Dependência psíquica comportamento obsessivocompulssivo de busca pelo uso do opioide para fins recreacionais Raro 2 a 18 nos doentes que utilizam para alívio da dor A constipação intestinal é o efeito adverso mais comum no uso dos opioides É dose dependente e não desenvolve tolerância portanto deve ser energicamente prevenida e tratada Juntamente com um opioide se prescreve um laxante em dose única diária ma tinal sulfato de magnésio ou supositório de glicerina ou noturna bisacodil hidróxido de magnésio sene lactulose ou sorbitol Se o paciente ficar alguns dias sem evacuar devese prescrever óleo mineral duas a quatro colheres de sopa à noite e na manhã seguinte aplicar o enema As náuseas e os vômitos têm grande variação individual e desenvolvem tolerância com três a quatro dias Frequentemente são causados pela constipação porém devemse excluir outras causas comuns como hipertensão intracraniana insuficiências hepática e renal compressão mecânica de alças intestinais hipercalemia e hipernatremia além do uso de drogas A associação entre um antagonista dopaminérgico haloperidol 10 a 20 gotasdia e um prócinético bromoprida é bastante eficaz Alternativamente os anta gonistas serotoninérgicos como ondrasetrona metroclopramida e difenidramina podem ser empregados Assim como as náuseas a sedação a confusão mental e a retenção urinária são efei tos transitórios desaparecendo em três a quatro dias Particularmente a sedação pode ser o primeiro sinal de sobredose da medicação e nesse caso devese considerar a redução da dose e excluir outras causas como as metabólicas infecciosas e hidroeletrolíticas 102 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A retenção urinária é tratada com redução da dose manobras de esvaziamento vesical e sondagem vesical A tolerância por ser considerada um fenômeno natural é compensada com a eleva ção gradual da dose da frequência de administração além do uso de medidas adjuvantes AINHs e outras modalidades de analgésicos Não há consenso na literatura quanto ao uso de antagonistas opioides no tratamento desses efeitos adversos porém existe a concordância entre os profissionais dos Cuidados Paliativos de que o importante é informar ao paciente e à família sobre esses efeitos cada vez que se inicia a terapia com opioide esclarecendo assim a prescrição de medicamen tos nãoanalgésicos Dor na atenção domiciliar Na presença de um paciente com diagnóstico de doença terminal associada à dor to tal a equipe de saúde presencia dois tipos de conduta A princípio ocorrem o abandono e o cessar da atenção ao paciente transferindose essa responsabilidade para a família que passa a utilizar os serviços de emergência devido a quadros de dor que no melhor dos casos são estabilizados em centros assistenciais e transferidos para outro ocasionando gasto institucional e maior incerteza para o paciente e sua família É nesse momento que a atenção domiciliar tem espaço O outro tipo de conduta é o encarceramento terapêuti co sendo os pacientes vítimas de quadros dolorosos associados a tratamentos curativos agressivos cujos efeitos secundários e cuja escassa ou nula melhoria implicam custos físico e econômico para paciente sua família e o sistema público de saúde A analgesia domiciliar segue os mesmos princípios já discutidos anteriormente que são efetivos para a analgesia sem riscos notáveis de efeitos adversos Entretanto os bons resultados vão requerer maior compromisso das famílias É vital portanto avaliar a dis ponibilidade da família em conduzir as recomendações médicas Devemse avaliar o grau de conflitos interpessoais a dinâmica familiar o tipo de família a religião e os valores com relação à morte ao tipo de atenção domiciliar e à farmacoterapia proposta para o alívio da dor O provedor dos cuidados pode ser um familiar motivado por um componente emocio nal cuidador informal ou uma pessoa contratada cuidador formal Frequentemente na maioria das famílias o cuidado do paciente crônico é assumido por um único membro da família chamado de cuidador principal podendo ocorrer voluntariamente ou por acordo familiar O cuidador deve exercer diferentes tipos de habilidades para as quais não foi trei nado além de cumprir com o resto de suas responsabilidades particulares o que repercute na qualidade da atenção delegada ao paciente e no estresse emocional do cuidador pela situação vivida Por tudo isso é recomendável que o médico desde o princípio aborde o grupo familiar e identifique aquele que tem propensão para cumprir as tarefas de cuida dor principal buscando acordo e colaboração de todo o grupo Na atenção domiciliar é disponibilizada uma equipe multiprofissional integrada por médico psicólogos assistentes sociais e enfermeiros que informam ao grupo familiar sobre a doença de seu parente a evolução o prognóstico e sobre como os cuidados além de oferecerem apoio moral aju dam psicologicamente A equipe também contará com apoio dado por um guia espiritual Os Cuidados Paliativos domiciliares englobam valores científicos e éticos que não devem ser considerados um luxo restrito a uma elite que pode adquirir esse tipo de cuida 103 do de forma privada mas sim devem ser vistos como uma forma solidária de assistência integrada no sistema de saúde pública8 Referências 1 ADDINGTONHALL J FAKHOURY W McCARTHY M Specialist palliative care in nonmalignant disease Pall Med v 12 p 41727 1998 2 BALLANTYNE J FISHMAN S M ABDI S The Massachusetts 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Organization Guidelines for cancer pain relief a 10year prospective study Pain v 63 p 6576 1995 104 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Dispneia tosse e hipersecreção de vias aéreas riCArdo tAvAres de CArvAlho A abordagem dos sintomas respiratórios em Cuidados Paliativos é complexa e engloba não apenas o controle dos sintomas envolvidos principalmente dispneia tosse e hiperse creção brônquica broncorreia mas também uma gama de doenças doença pulmonar obstrutiva crônica DPOC insuficiência cardíaca congestiva ICC câncer etc além de aspectos emocionais que envolvem além do paciente e familiares toda a equipe de saú de A abordagem do assunto exige conhecimento clínico para compreensão da fisiopa tologia das bases farmacológicas para o uso de medicação opioide e benzodiazepínicos além do racional para o uso apropriado de oxigênio e terapêuticas nãofarmacológicas que podem auxiliar o controle dos sintomas Dispneia Entre os sintomas presentes nesse contexto sem dúvida o mais comum é a dispneia Tratase de uma sensação eminentemente subjetiva caracterizada pela percepção des confortável da respiração receio de não conseguir respirar ou ainda uma sensação de avidez por ar É um sintoma muito frequente acometendo cerca de 21 a 90 dos pacientes com câncer com ou sem envolvimento pulmonar12 É importante ter em mente que 24 dos pacientes que apresentam dispneia não possuem patologia cardiopulmonar Isso se explica pela complexidade do sintoma e pelas diversas possibilidades de etiologias além do componente emocional que deve ser cuidadosamente avaliado Como princípio na abordagem de qualquer sintoma em Cuidados Paliativos a primei ra preocupação do profissional de saúde deve ser a minuciosa avaliação da situação Nesse contexto a avaliação da dispneia apresenta uma particularidade não existe uma forma ainda padronizada de se abordar esse sintoma em todos os seus aspectos físico emocional comportamental e circunstancial Dessa forma a avaliação apropriada e a conduta a ser tomada dependem de uma percepção muito acurada de toda equipe e principalmente do médico que acompanha o paciente Existem 33 escalas diferentes para avaliação de dispneia mas nenhuma delas é ade quada para uso isolado porque elas avaliam características unidimensionais do sinto ma3 ou somente a intensidade física ou apenas o componente emocional etc Aspectos diferentes e importantes a serem avaliados são o impacto na funcionalidade de vida e a resposta à terapêutica Quando se faz uma avaliação dos sintomas respiratórios é fundamental que se ava liem não só a intensidade pequena média ou grande mas também as suas característi cas como desencadeantes ritmo de evolução fatores de melhora e piora além da doença que leva ao sintoma Figura 1 Quando se quer explicar e essa é a próxima etapa da abordagem desses pacientes em Cuidados Paliativos é necessário que o paciente entenda o que ocorre de forma que ele seja parceiro do médico e da equipe no controle dos sintomas pois é ele quem nos sinaliza se o sintoma está sendo adequadamente abordado ou não 105 É fundamental que entendamos que dispneia e síndromes respiratórias não são algo a se temer ou muito difícil de abordar e que sempre teremos de fazer as mesmas coisas para todos os tipos de pacientes Tornouse comum julgar que há tão pouco a fazer Um conjunto de sintomas comuns a várias doenças não deve ser sempre abordado de forma padronizada A fisiopatologia da dispneia se caracteriza por uma interação bastante complexa entre receptores sensíveis a estímulos químicos como as pressões parciais de gás carbônico e oxigênio no sangue e mecanoreceptores sensíveis ao grau de expansão da caixa torácica Os impulsos aferentes a partir desses receptores integramse no sistema nervoso central SNC sofrem influência de estruturas pontinas e geram resposta eferente que se traduz em expansibilidade torácica e aumento da frequência respiratória Realizada a insuflação pulmonar existe o reflexo Hering Breuer que faz um feedback negativo com o centro respiratório enviando sinais para que se interrompam os estí mulos à musculatura respiratória Isso tem também influência direta do córtex cerebral demonstrando que as questões emocionais são importantes componentes dessa sintoma tologia7 Figura 2 Outra forma de entender a ocorrência da dispneia é didaticamente dividir suas cau sas de acordo com o estímulo que leva à ativação do centro respiratório e gera o drive ventilatório aumentado e a sensação desconfortável ao respirar Figura 3 A próxima etapa do processo depois de tentar avaliálo e explicálo de forma apro priada e conhecer a fisiopatologia é tentar abordar o que é passível de ser corrigido Havendo causas corrigíveis é possível controlar a dispneia de forma mais fácil e rá pida Quando há derrame pleural por exemplo punção drenagem e eventualmente pleu rodese em caso de derrame pleural de repetição podem ser condutas extremamente úteis Além disso podese lançar mão de anticoagulação no caso de tromboembolismo pulmonar radioterapia laser stents de vias aéreas no caso de obstrução mecânica não Figura 1 Avaliação da dispneia ICC insuficiência cardíaca congestiva DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica 106 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Figura 2 Fisiopatologia da dispneia Figura 3 Mecanismos de gênese da dispneia removível corticosteroides no caso de linfangite carcinomatosa diuréticos em caso de edema pulmonar etc Figura 4 O último princípio na abordagem aos sintomas em Cuidados Paliativos deve ser a atenção aos detalhes 107 Figura 4 Algumas causas corrigíveis e possíveis condutas VNI ventilação nãoinvasiva TEP tromboembolismo pulmonar Os detalhes são sempre o diferencial que evidencia na prática quem é a equipe e quem é principalmente o médico que está cuidando do paciente Nesse sentido é impor tante também como princípio em Cuidados Paliativos a lembrança de que cada paciente é único Além disso devese atentar para qual etapa da doença o paciente se encontra tentar entender o que podemos e devemos fazer para que nossa atitude seja pertinente com diagnóstico e prognóstico e sempre observar necessidades individuais Nesse senti do é importante perceber que a história natural de diferentes doenças é variável como o câncer por exemplo que apresenta uma evolução bastante previsível com a fase final mais bem marcada Para quem se destina a fazer esse tipo de assistência são muito mais difíceis os pacientes com doenças crônicas que evoluem com descompensações repetidas como cardiopatas e pneumopatas Nesses casos nunca se sabe se a agudização atual culminará com a morte ou se irá ocorrer recuperação Além disso existe a possibilidade de morte súbita posteriormente o que é um evento relativamente frequente nessa população De qualquer forma é importante que se tenha em mente por exemplo que se a dispneia ou insuficiência respiratória ocorre após esforço físico isso provavelmente denota uma fase mais inicial na qual é possível corrigir uma série de distúrbios lançando mão de tratamentos farmacológicos com diuréticos broncodilatadores e medicações que tendam a reverter a causa de base da insuficiência respiratória Assim nessa fase em que isso é factível não devemos nos prender apenas aos aspectos meramente relacionados com o controle de sin tomas mas também pensar na intervenção para tentar conter a evolução da doença À medida que os sintomas passam a surgir em repouso o tratamento sintomático toma um papel mais importante ficando muito mais evidente na fase final13 Figura 5 108 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Figura 5 Abordagem diferenciada da dispneia de acordo com a evolução temporal da doença do início dos sintomas até a fase final adaptado de Wilcock A Nottingan University13 Assim a American College of Chest Physicians redefiniu em 20076 diretrizes para o tratamento da dispneia sob o ponto de vista paliativo envolvendo o uso de opioides ansiolíticos oxigênio e também tratamento nãofarmacológico As questões relativas à ventilação nãoinvasiva são controversas e relacionamse com o balanço entre benefício real e desconforto ocasionado pelo dispositivo Isso sem dúvida alguma é um detalhe importante que precisa ser lembrado Opioides O mecanismo de ação dos opioides no controle da dispneia é relativamente desco nhecido Sabese que existem receptores opioides no SNC em toda árvore respiratória e principalmente nos alvéolos Existe um potencial efeito de depressão respiratória advinda dos opioides fazendo com que seu uso seja temido Entretanto esse efeito é infrequente apresenta desenvolvimento rápido de tolerância quando a droga é usada de forma apropria da e tende a ocorrer somente em pacientes que não são usuários crônicos de opioides De qualquer maneira acreditase que isso ocorra por uma alteração da sensibilidade dos receptores centrais a hipercapnia e hipóxia além de alteração da sensibilidade do mecanoceptores da caixa torácica Um contraponto importante nesse contexto é que frequentemente pacientes que apresentam dispneia principalmente em fase avançada da doença apresentam conjuntamente o sintoma de dor que se beneficia também do uso do opioide A dor é um estímulo excitatório contribuindo para minimizar a eventual depressão respiratória Assim o que se recomenda para tratamento da dispneia em casos leves e em pa cientes virgens de tratamento é o uso de codeína na dose de 30 mg via oral VO a cada 109 4 horas Frequentemente a dose pode ser menor mas devese sempre respeitar a poso logia do horário para que o paciente não fique períodos sem a ação do medicamento A prescrição em intervalo posológico diferente é inadequada Para pacientes com dispneia grave e virgens de tratamento as doses eficazes são extremamente individuais Sugerese sulfato de morfina 5 mg VO de 44 h ou outros opioides12 Apesar de recomendada na literatura internacional para uso a cada 4 horas a oxicodona em nosso meio existe sob a forma de liberação lenta e pode ser usada a cada 12 horas A ressalva é que ela é uma medicação cara e acaba por não ser vantajosa prin cipalmente em serviços públicos Vale lembrar que podem ser dadas doses de resgate nos intervalos entre as tomadas programadas e devemse titular as doses totais diárias cuidadosamente com aumen tos de 50 a cada 24 horas Lembrar que pacientes com DPOC e cardiopatas são mais sensíveis e devem ter o início do seu tratamento com metade da dose usual12 também é importante Em pacientes tolerantes ao opioide o manuseio das doses pode ser mais liberal sempre lembrando dos resgates Esses ajustes de dose para cada tipo de paciente é um detalhe relevante Figura 6 Do acordo com as evidências na literatura os opioides por VO ou parenteral são medicações de uso reconhecidamente aprovado em controle de sintomas respiratórios O uso de opioides por via inalatória é controverso na literatura bem como seu uso para dispneia de esforço Com relação aos efeitos adversos há a tendência de serem iguais àqueles observados no tratamento de dor mas não existe uma evidência forte muito pelo contrário de que o uso de opioides possa trazer algum tipo de alteração na saturação de oxigênio por conta do potencial efeito de depressão respiratória Isso demonstra que os opioides não são Figura 6 Uso de opioides na dispneia VO via oral DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica Fonte Thomas R The Lancet Oncology 2002 3 2238 110 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP portanto uma medicação perigosa para o controle de dispneia mesmo em pacientes em fase avançada de doença2 A crítica que se faz sempre aos estudos relativos aos opioides é a de que são extrema mente heterogêneos quanto às populações estudadas aos diferentes tipos de doenças em fases de evolução diferentes além de ao uso de doses e às vias de administração variadas Tudo isso torna a comparação entre os estudos extremamente problemática Benzodiazepínicos O uso desse tipo de medicações é justificado pela presença de componente emocional importante nos sintomas de natureza respiratória Nesse contexto o uso de benzodiaze píniocos tem papel definido A droga mais estudada para esse fim nesse contexto é o midazolan e as doses utilizadas são baixas em torno de 5 a 10 mg em 24 horas É frequente o uso em associação ao opioide tanto por VO intravenosa IV ou subcutânea SC Apesar de alguns estudos mostrarem que o efeito da associação no controle da dispneia é se melhante ao uso do opioide isolado a experiência mostra que quando o componente emocionalafetivo é marcante existe melhora adicional expressiva Além do uso do midazolam descrevese também o uso de lorazepan em doses de até 05 a 1 mg VO por hora e diazepam A manutenção se faz com doses tituladas ministradas a cada 6 ou 8 horas9 Oxigênio O uso de oxigênio como medida paliativa vem sendo estudado de forma sistemática apenas mais recentemente Entretanto na prática é um recurso bastante comum Nesse sentido existe uma preocupação em se identificar um ponto de equilíbrio para a indicação de um artefato que por um lado nem sempre é benéfico e por outro possui custo bastante elevado Em revisão bibliográfica sobre o uso de oxigênio em Cuidados Paliativos1 1996 a 2006 classificando somente artigos envolvendo população adulta de língua inglesa e estudos randomizados e placebo controlados identificamos 29 artigos Em cinco artigos relacionados com câncer o número de pacientes estudado foi pe queno 14 a 51 e o que se observa é que em quatro estudos houve melhora na dispneia tanto com oxigênio como com ar comprimido Isso pode ser explicado pela existência de receptores de estímulos mecânicos na região da face que respondem ao fluxo aéreo Assim não é necessário que muitas vezes se coloque oxigênio nasal Abrir uma janela deixar o doente em lugar arejado e fresco ou mesmo o uso de um ventilador frequentemente têm efeito positivo que pode ser explicado por serem esses receptores responsivos ao contato mecânico do ar com o rosto diminuindo a sensação subjetiva de dispneia De qualquer maneira alguns estudos também mostram que ocorre melhora só com oxigênio e que isso ocorreu de forma mais consistente somente nos pacientes com saturação de oxigênio menor que 90 Em pacientes com DPOC que representam a maior parte da população analisada 21 artigos existem estudos em situações diferentes repouso e durante atividade física e com resultados controversos Excetuandose aqueles que já apresentem indicação clara 111 Figura 7 Uso de oxigênio para paliação da dispneia para oxigenioterapia contínua o uso de oxigênio acaba sendo preconizado para as agu dizações nãoresponsivas a outros tratamentos e nas quais a saturação de oxigênio fica abaixo de 90 Na insuficiência cardíaca existem apenas três estudos em pacientes em classe fun cional CF I II New York Heart Association NYHA um deles com uso em repouso e dois com uso em exercício A grande dúvida é se esses resultados são extrapoláveis para os pacientes com ICC CF IV Os resultados são inconclusivos Portanto não há estudos que demonstrem que o uso de oxigênio para paliação da dispneia seja inequivocamente indicado para pacientes com ICC Assim do ponto de vista geral existe ainda pouca evidência do benefício concreto do uso indiscriminado de oxigênio em Cuidados Paliativos A indicação é precisa em subgru pos e situações especiais Figura 7 Ventilação nãoinvasiva e medidas nãofarmacológicas A grande polêmica da utilização da ventilação nãoinvasiva no contexto paliativo está no fato de que esse foi que um aparato terapêutico criado para tratamento de insuficiência res piratória aguda e com benefício comprovado em alguns subgrupos de pacientes com reversão do quadro agudo O uso em Cuidados Paliativos sempre foi muito questionado pela necessidade de se esta belecer um equilíbrio entre alívio de sintomas e eventualmente prolongamento desconfor tável de sofrimento e processo de morte É importante que se tenha em mente exatamente o que se deseja com esse procedimento já que podemos estar levando pacientes em agonia final à condição de privação de um contato mais próximo com a família e de alguma forma de expressão por causa da máscara de pressão positiva que é colocada no rosto podendo piorar ainda mais os sintomas 112 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Dois interessantes estudos em pacientes de unidade de terapia intensiva UTI que possuíam documentação de ordens de nãointubação podem trazer uma visão um pouco diferente do assunto811 Nesse tipo de paciente surgiu a dúvida sobre se seria efetivo e até mesmo ético incluir a ventilação nãoinvasiva como opção para controle de uma eventual agudização Existia uma tendência a se achar que isso poderia ser útil para subgrupos de pacientes com DPOC e ICC a exemplo do que já acontece em situações que não caracterizam terminalidade A conclusão geral é de que tais pacientes que apresentam condições clínicas gerais melhores mais cons cientes menos desnutridos com escores de prognóstico melhores que entendem e aceitam o procedimento etc têm uma mortalidade relacionada com o evento agudo tratado com ven tilação nãoinvasiva modalidade ventilação com pressão positiva contínua bifásica BIPAP bem menor que outros pacientes com insuficiência respiratória hipoxêmica como no caso do câncer por exemplo A taxa de complicações descrita foi relativamente pequena 5 A escolha do paciente a ser submetido ao procedimento deve ser muito criteriosa e definitivamente não é fácil devendo ser compartilhada sempre com paciente e família Além disso uma série de medidas nãofarmacológicas pode ser instituída para pro porcionar conforto e bemestar ao paciente e à família Nesse sentido o trabalho do fisioterapeuta pode ser de grande valor por meio de técnicas e posicionamento que aju dem na manutenção da via aérea pérvia e no relaxamento da musculatura acessória diminuindo o trabalho respiratório além de exercícios para combater o imobilismo e o uso de técnicas de contenção de energia A aspiração de vias aéreas é um procedimento doloroso e deve ser empregado com critério sempre com uso de analgesia de resgate anteriormente O uso de acupuntura e pressoacupuntura foi descrito como positivo na melhora da dispneia em pacientes com DPOC avançada com impacto na melhora da qualidade de vida10 Figura 8 Figura 8 Tratamento nãofarmacológico da dispneia VNI ventilação nãoinvasiva 113 Outro aspecto importante a ser lembrado é que quando tomamos todas as medidas possíveis e pertinentes em cada situação temos os elementos necessários para nos tran quilizarmos e para que possamos dar apoio mais de perto à família Uma das coisas mais conflitantes para a família é notar que a equipe não está coesa ou se encontra tão ou mais ansiosa no controle da situação A equipe e fundamentalmente o médico devem estar seguros para transmitir isso para a família e acolhêla Tosse A tosse afeta cerca de 37 do pacientes com câncer avançado principalmente de pul mão 38 desses com sintomas moderados ou intensos Ocorre mais de 10 vezes por dia em cerca de dois terços dos pacientes interferindo na respiração no sono e às vezes dificultando a fala5 Chega a ser prevalente em 29 a 83 dos pacientes em Cuidados Paliativos Além do câncer em si das suas complicações e até mesmo do seu tratamento o uso concomitante de outras drogas pode participar na gênese do sintoma5 Figuras 9 e 10 O tratamento se baseia em drogas que atuem nos receptores de tosse espalhados por via aérea superior árvore brônquica diafragma membrana timpânica seios paranasais vasos pulmonares pleuras etc que iniciam a condução do estímulo até o centro da tosse no tronco cerebral Havendo uma doença cardíaca ou pulmonar o uso de medicações específicas para esse fim deve ser tentado inicialmente Caso contrário não se espera que o uso dessas medicações tenha grande impacto na tosse presente por exemplo nas doenças neoplásicas Os opioides são as drogas que apresentam melhor efeito antitussígeno no câncer Porém devido aos potenciais efeitos colaterais outras medicações têm sido aventadas como de pri Figura 9 Causas de tosse relacionadas ao câncer e a outras doenças DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica TEP tromboembolismo pulmonar ICC insuficiência cardíaca congestiva 114 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Figura 11 Tratamento da tosse Fluxograma Fonte Am J Hospice and Pall Care v 24 n 2 p 14451 2007 ICC insuficiência cardíaca congestiva DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica meira linha para o tratamento4 Figuras 11 12 e 13 Entretanto por não estarem disponí veis em sua maioria no Brasil os opioides acabam ocupando papel de destaque no controle desse sintoma Anestésicos locais podem também ser usados de forma inalatória Figura 10 Drogas que podem causar tosse 115 Figura 12 Opioides e nãoopioides no tratamento da tosse NMDA receptores nmetilDaspartato Figura 13 Anestésicos locais no tratamento da tosse Hipersecreção de vias aéreas É importante lembrar que sempre há uma forma de trazer algum conforto Do ponto de vista nãofarmacológico é possível um trabalho integrado com o fisiotera peuta utilizando técnicas para adequar o posicionamento da cabeça e da via aérea de modo a facilitar a drenagem de secreções evitando acúmulo e consequente piora do desconforto além 116 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP de respiração ruidosa sororoca muito angustiante para os familiares O controle apropriado de secreções é importante pesando sempre se o uso de aspiração de vias aéreas é apropriado já que se trata de procedimento doloroso e que traz em geral um desconforto muito grande Podese conseguir redução da quantidade de secreções com o uso de corticosteroides cuja ação é melhor nos pacientes com asma do que com câncer antibióticos macrolídeos como eritromicina diminuição de secreção mediada por macrófagos anticolinéticos como hioscina na dose de 10 mg a cada 4 ou 6 horas VO IV ou SC ou mesmo colírio de atropina na própria cavidade oral na dose de duas gotas a cada 6 ou até 12 horas conforme resposta Em última instância podese lançar mão de sedação paliativa Esse recurso é reserva do como a última opção quando as outras alternativas se mostraram ineficazes Como perspectiva no controle de sintomas respiratórios em Cuidados Paliativos é necessá rio que se façam mais estudos em pacientes nãoportadores de câncer para os quais os estudos são mais escassos A identificação do paciente que possa se beneficiar com cada um desses procedimentos e o momento correto para utilizálos constituemse grandes desafios do médico na paliação de sintomas respiratórios Referências 1 BOOTH S et al Expert Working Group of the Scientific Committee of the Association of Palliative Medicine The use of oxygen in the palliation of breathlessness A report of the expert working group of the Scientific Committee of the Association of Palliative Medicine Respir Med v 98 n 1 p 6677 2004 Review Erratum in Respir Med v 98 n 5 p 476 2004 2 CLEMENS K E KLASCHIK E Symptomatic therapy of dyspnea with strong opioids and its effect on ventilation in palliative care patients J Pain Symptom Manage v 33 n 4 p 47381 2007 3 DORMAN S BYRNE A EDWARDS A Which measurement scales should we use to measure breathlessness in palliative care A systematic review Palliat Med v 21 n 3 p 17791 2007 4 HAAS A R Recent advances in the palliative management of respiratory symptoms in advancedstage oncology patients Am J Hosp Palliat Care n 24 v 2 p 14451 2007 5 HOMSI J WALSH D NELSON K A Important drugs for cough in advanced cancer Support Care Cancer v 9 p 56574 2001 6 KVALE P A SELECK P A PRAKASH U B S Palliative care in lung cancer ACCP evidencebased clinical practice guidelines 2 ed Chest v 132 p 368S 403S 2007 7 LE GRAND S B Opioids respiratory function and dyspnea Am J Hospice Pallliat Care v 20 n 1 p 5761 2003 8 LEVY M et al Outcomes of patients with donotintubate orders treated with noninvasive ventilation Crit Care Med v 32 p 20027 2004 9 NAVIGANTE A H et al Midazolam as adjunct therapy to morphine in the alleviation of severe dyspnea perception in patients with advanced cancer J Pain Symptom Manage v 31 n 1 p 3847 2006 10 PAN C X et al Complementary and alternative medicine in the management of pain dyspnea and nausea and vomiting near the end of life a systematic review J Pain Symp Manag v 20 n 5 p 37487 2000 11 SCHETTINO G ALTOBELLI N KACMAREK R M Noninvasive positive pressure ventilation reverses acute respiratory failure in select donotintubatepatients Crit Care Med v 33 p 197682 2005 12 THOMAS J R VON GUNTEN C F Clinical management of dyspnoea Lancet Oncol v 3 n 4 p 2238 2002 13 WILCOCK A Respiratory Symptoms In Twycross R Wilcock A StarkToller C Symptom Management in Advanced Cancer 4th Edition 2009 Editors Palliativedrugscom Ltd Nottingham UK 117 Náusea e vômito mAriA Goretti sAles mACiel roberto betteGA Introdução Náuseas e vômitos são sintomas de alta prevalência em Cuidados Paliativos e bastan te estressantes para o paciente e seus familiares Contribuem para o desenvolvimento da síndrome da anorexiacaquexia provocam desequilíbrios eletrolíticos e novos sintomas associados e comprometem a qualidade de vida Episódios de vômitos são degradantes São particularmente frequentes em pacientes com câncer em especial nos tumores gástricos ginecológicos e intestinais Um terço dos pacientes com câncer avançado tem vômitos e até 60 deles náuseas3 mas nem sempre estão associados O paciente com náusea crônica habitualmente queixase pouco Quando apresenta vômitos é notado e mais eficientemente tratado Descrevese a náusea como sensação subjetiva e desagradável em epigástrio e oro faringe associada à urgente necessidade de vomitar O vômito consiste no esvaziamento forçado do conteúdo gástrico pela boca ocasionado pela contração espasmódica do dia fragma da parede gástrica da musculatura respiratória e da parede torácica3 Fisiopatologia Para que o vômito ocorra um complexo mecanismo precisa ser acionado e nem todas as etapas desse mecanismo estão esclarecidas As ações incluem desde a salivação que precede a expulsão do conteúdo gástrico até o fechamento da epiglote para proteger as vias respiratórias e abertura da glote sem a qual o aumento da pressão em esôfago pode levar ao sangramento da mucosa gastroesofágica síndrome de MalloryWeiss ou à rotura da parede esofágica2 3 5 O centro controlador desse mecanismo localizase em área primitiva do encéfalo próximo dos centros de controle da respiração e de outras funções vitais o que faz crer na náusea e no vômito como proteção da vida em situações como envenenamentos por exemplo3 Importância deve ser dada também à náusea e ao vômito desencadeados por fatores ligados à emoção Vomitar não deixa de ser uma forma de tentar eliminar emoções e sen timentos desagradáveis muitas vezes associados à presença da doença em si ao contato com a possibilidade da própria morte e a outros sentimentos angustiantes O comportamento também pode ser aprendido e a náusea ser desencadeada pela recordação de uma sensação desagradável relacionada com terapia uso de determinado medicamento ou tratamento A quimioterapia é um tratamento comumente associado à presença de vômitos e ao medo ou a outro significado que possa ter Submeterse ao tratamento pode ser um fator determinante de difícil controle desse sintoma Para compreender o mecanismo de náuseavômito e melhor aplicar os recursos te rapêuticos existentes é necessário entender quais as principais áreas envolvidas quais 118 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP os mediadores identificados em cada mecanismo e como agem os principais recursos terapêuticos A Figura ilustra o conteúdo CÓRTEX CEREBRAL Sistema vestibular VÔMITO ZONAS QUIMIORRECEPTORAS ÁREA POSTREMA NÚCLEO DO TRATO SOLITÁRIO Centro do vômito Tronco encefálico Influência psicológica Benzodiazepínicos Ondansetrona Granisetrona Drogas toxinas Trato gastrointestinal Via vago NCL Trato solitário Haloperidol Metoclopramida Fenotiazídicos Corticosteroides Drogas Quimioterapia Radioterapia Ondansetrona Granisetrona Dimenidrinato Prometazina Metoclopramida Dompreridona Cisaprida Eritromicina Modalidade do trato gastrointestinal Dimenidrinato Dopamina Serotonina Hioscina Hidbatropina ACTHm Histamina Histamina ACTHm 5ht3ACTHmDHNMDA Figura Fonte adaptado de Fallon M Welsh J2 5TH serotonina ACTHm acetilcolina muscarínica D dopamina H histamina NMDA receptor nmetilDaspartato 119 Centro do vômito Localizado no mesencéfalo na formação reticular lateral também conhecida como área medular o centro de vômito recebe estímulos de distintas áreas por meio de diferen tes neurotransmissores e controla as ações complexas envolvidas com o vômito Os principais mediadores envolvidos no centro do vômito são acetilcolina muscarínica ACTHm e histamina H1 Drogas que bloqueiem esses mediadores como hioscina hidrobromida atropina e anti histamínicos podem prevenir náuseas e vômitos mediados pelo centro do vômito3 5 Zonas quimiorreceptoras A mais importante zona quimiorreceptora está localizada na área postrema no as soalho do quarto ventrículo fora da barreira hematoencefálica Estruturas especializadas em detectar substâncias químicas potencialmente perigosas na circulação sanguínea e no líquido cerebroespinhal são acionadas na presença das mesmas e se comunicam com o centro do vômito acionandoo Os principais mediadores químicos na área postrema são dopamina D2 e serotonina 5HT3 Os estímulos químicos podem ser desencadeados por medicamentos opioides antidepressivos tricíclicos e inibidores seletivos da recaptação da serotonina ISRS antiinflamatórios quimioterápicos toxinas infecções insuficiências hepática e renal fatores tumorais metabólicos hipercalcemia hiponatremia Os medicamentos com ação antidopaminérgica como a metoclopramida e o halope ridol e os fenotiazínicos de modo geral levemopromazina e clorpromazina são portanto excelentes antieméticos de ação na zona quimiorreceptora Na falência desses podese lançar mão de antisserotoninérgicos que são medicamentos mais recentes e de custo muito mais elevado Sua melhor indicação ainda reside no vômito induzido por quimioterapia e pósradioterapia e pela presença de mediadores 5HT3 no trato gastrointestinal TGI Anta gonistas da serotonina podem agir em sinergia com o haloperidol em alguns casos2 3 5 Sistema vestibular Está relacionado com o vômito por discinesia e outras alterações vestibulares propria mente ditas como compressão tumoral e hipertensão craniana Os principais mediadores no sistema vestibular são a H1 e a ACTHm Nesse caso o dimenidrinato é a medicação com melhor indicação em especial na prevenção do vômito relacionado com discinesia3 120 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Córtex cerebral e sistema límbico Fortemente influenciado por ansiedade medo e outros sentimentos o sintoma de náuseavômito induzido pelo córtex cerebral e modulado pelo sistema límbico parece ser influenciado pelo sistema ácido gamaaminobutírico GABA agonista É o vômito aprendido após associação negativa desencadeado por odor e presença de alimentos Responde a psicoterapia técnicas de relaxamento e benzodiazepínicos3 Trato gastrointestinal Vários mecanismos envolvem o TGI no desencadeamento de náuseavômito quimiorreceptores em parede do TGI serotonina e neurocininas sensíveis particu larmente aos quimioterápicos estímulo vagal mediado por neurotransmissores ao núcleo do trato solitário NTS envolve serotonina dopamina histamina acetilcolina muscarínica e possivelmente o sistema Nmetildietilaspartato NMDA O estímulo pode ser desencadeado na orofa ringe na obstrução intestinal no estímulo mecânico na obstrução intestinal e na carci nomatose peritoneal motilidade do TGI esvaziamento gástrico lentificado e motilidade intestinal prejudi cada por tumores compressão extrínseca distúrbio metabólico drogas como opioides e anticolinérgicos distúrbio autonômico gastrites úlceras pépticas e ascite Envolve como mediadores principalmente a dopamina e a serotonina13 5 Manejo dos sintomas Os princípios do controle de sintomas devem sempre ser aplicados4 investigação criteriosa explicação do sintoma tratamento de causas reversíveis terapia medicamentosa criteriosa e individualizada revaliação contínua dos resultados Investigação Inclui conhecer o doente e a trajetória de sua doença os tratamentos realizados e os medicamentos atualmente em uso bem como a concomitância de outros sintomas Performances anteriores ao quadro e atual são fundamentais para as decisões terapêuticas Cabe também avaliar início intensidade do sintoma em escala de 0 a 10 prefe rencialmente usando a Edmonton Symptom Assessment Scale ESAS fatores desen cadeantes características do vômito fecaloide biliar alimentar líquido de estase presença ou não de sintomas prodrômicos O vômito desencadeado por hipertensão intracraniama e meningismo por exemplo aparece sem pródromos e tem característica de jato Vale verificar exame físico em busca de sinais como desidratação distensão abdomi nal presença de massas de topografia abdominal ou ascite exame de boca e orofaringe sinais de localização neurológica e meningismo 121 Avaliação complementar inicial deve constar de hemograma urinálise e raios X RX de tórax para afastar foco infeccioso avaliação bioquímica das funções hepática e renal e eletrólitos como cálcio sódio e potássio Na suspeita de obstrução de TGI os RX simples de abdome em pé e decúbito horizontal são exames importantes e acessíveis Sinais de falência renal devem ser investigados com ultrassonografia US de vias urinárias especialmente nos portadores de tumores pélvicos Explicação O profissional de Cuidados Paliativos tem por obrigação explicar muito bem ao paciente e seu familiar após primeiras investigações clínicas usando linguagem acessível o que acontece qual ou quais as causas mais prováveis e quais as condutas possíveis neste mo mento Compartilhar decisões sempre que possível é fundamental A equipe também deve entender o que se passa quais as medidas tomadas e a expec tativa com relação ao tratamento para que todos possam reavaliar o impacto das medidas e propor novas intervenções cada qual em sua área de conhecimento Tratamento de causas reversíveis Inclui qualquer medida que busque o controle da causa do vômito como ajuste ou suspensão de medicamentos uso de antimicrobianos para tratar uma causa infecciosa hidratação para correção de distúrbio eletrolítico uso de bifosfonatos na hipercalcemia e cirurgias quando viáveis nos quadros obstrutivos Intervenções por procedimentos requerem sempre compartilhamento de decisões en tre o cirurgião e o profissional de Cuidados Paliativos e entre esse e o pacientea família Manejo medicamentoso A instituição de terapia com antieméticos no controle de náuseavômito deve ser bastante criteriosa e sempre pautada no mecanismo fisiopatológico mais provavelmente envolvido Náuseavômito quimicamente induzidao Metoclopramida por ação antidopaminérgica e gastrocinética quando não houver quadro obs trutivo 30 a 80 mgdia em até quatro tomadas por via subcutânea SC ou infusão contínua haloperidol na impossibilidade do uso de gastrocinética 1 a 2 mg SC em duas a três doses diárias ondansetrona na falência de ambos Tem ação mais específica no vômito desencadeado por quimioterapia e radioterapia Usar 4 a 8 mg SC a cada 8 horas outras opções como a levemopromazina e a clorpromazina têm indicação secundária pela potencial sonolência e frequente hipotensão postural especialmente com a primeira Estase gástrica Considerar sondagem nasogástrica de alívio se distenção abdominal e sintoma muito intenso Retirar a sonda após melhora identificável 122 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP usar inibidores de bomba de próton ou antagonista H2 preferir gastrocinéticos metoclopramida bromoprida domperidona e eritromicina nos casos nãoresponsivos Hipertensão intracraniana e meningismo Corticosteroides em dose elevada 16 a 20 mgdia Podem ser usados por via endove nosa EV ou SC considerar dimenidrinato se alteração vestibulardiscinesia se apresentar como sintoma associado Irritação peritoneal Metoclopramida ou haloperidol como antidopaminérgicos antisserotoninérgicos como a ondansetrona como segunda escolha antihistamínicos como o dimenidrinato via SC a cada 6 a 8 horas e considerar a pro metazina na dose de 125 mg SC a cada 6 a 8 horas ou em infusão contínua Evitase a prometazina pela alta sonolência que provoca Obstrução intestinal Usar haloperidol como primeira escolha em dose de até 15 mg24 horas ondansetrona e dimenidrinato podem ser úteis como segunda opção restringir volume de hidratação usar antissecretores como hioscina butilbromida ou octeotrida usar sonda nasogástrica SNG até melhora da distensão e redução do volume de dre nagem Retirar se o paciente concordar com o jejum corticosteroides podem diminuir edema de alça e de massa tumoral reduzindo o fator de compressão além de fatores inflamatórios locais Náusea associada a ansiedadeemoções Abordagem psicoterápica correta tratar com benzodiazepínicos os casos refratários Reavaliação do sintoma e planejamento do cuidado A abordagem ideal de náuseavômito inclui reavaliação periódica do sintoma por meio da atribuição do valor de 0 a 10 desse sintoma e de outros associados como pirose boca seca dor perda do apetite fadiga etc A princípio além das medidas de controle da causa dos sintomas apenas um antie mético deve ser usado Dose de resgate com outro medicamento pode ser mantida na prescrição no caso de falência da primeira Nesse caso na avaliação subsequente o ideal é substituir o primeiro medicamento pelo segundo antiemético e assim sucessivamente desde que se tenham utilizado dose otimizada e outras medidas de controle 123 A associação de medicamentos é possível desde que o mecanismo fisiopatológico sugira mais de um fator causal ou nos casos de difícil controle Devese evitar associar medicamentos a mecanismo de ação semelhante como a metoclopramida e o haloperidol Em qualquer caso obtido o controle do sintoma e corrigido o fator desencadeante o objetivo é retornar progressivamente à dieta usual voltar à prescrição prévia por via oral e avaliar a necessidade de manutenção do antiemético ou sua gradual suspensão Lembrar sempre que nenhum medicamento é isento de efeito adverso e que pres crições racionais devem conter apenas o que de fato é necessário ao doente Reavaliar prescrições é tarefa de todas as consultas Referências 1 ELSAYEM A DRIVER L BRUERA E The MD Anderson Symptom Control and Palliative Care Handbook MD Anderson Cancer Center 2 Ed Houston 2003 2 FALLON M WELSH J Management of gastrointestinal symptoms In FAULL C CARTER Y WOOF R Handbook of palliative care London Blakweel Science 1998 3 PACE V Nausea and vomiting In SYKES N EDMOND P Management of advanced disease 4 ed London Arnold 2004 4 TWYCROSS R Cuidados paliativos 2 Ed Lisboa Climepsi Editores 2003 5 WATSON M et al Oxford Handbook of Palliative Care 2 ed Oxford Oxford University Press 2009 124 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Obstipação e diarreia verusKA meneGAtti AnAstáCio hAtAnAKA Alterações do hábito intestinal são queixas comuns entre pacientes sob Cuidados Pa liativos sejam determinadas pela patologia de base eou pelo tratamento a ela direciona do paliativo ou não Cerca de 50 dos pacientes admitidos em hospices são obstipados O problema porém é ainda maior ao se considerar que muitos já se encontram em terapia laxativa Menos comum a diarreia é queixa premente em 7 a 10 dos pacientes com câncer à admissão em hospices e em 27 daqueles positivos para o vírus da imunodefi ciência adquirida HIV A atenção a esses sintomas orientase em conformidade com os preceitos delineados a seguir Obstipação Caracterizada por episódios de evacuações difíceis ou dolorosas associados à dimi nuição da frequência dessas eou presença de fezes endurecidas a obstipação assume natureza multifatorial em pacientes sob Cuidados Paliativos Quadro 16 8 podendo determinar complicações como as listadas no Quadro 29 Opioides interferem direta mente na motilidade do trato gastrointestinal por meio da redução das atividades neu ral e propulsora determinando retardo do trânsito do conteúdo intestinal e aumento da capacidade absortiva de fluidos O manuseio efetivo da obstipação em Cuidados Paliativos exige procedimento atento anteciparse a esse problema comum questionar o paciente sobre sua função intestinal habitual iniciar laxantes profiláticos em concomitância ao início do uso de opioides dar preferência a laxantes orais aos retais combinar laxantes se necessário titular o tratamento visando atingir evacuações confortáveis considerar sempre que possível medidas nãofarmacológicas como aumento da inges tão de líquidos e fibras na dieta atividade física e respeito à privacidade do paciente no uso do toalete evitando por exemplo o uso de fraldas A terapêutica farmacológica baseiase em drogas com efeitos laxantes ou seja capazes de determinar aumento do número de deposições de matéria fecal com di minuição de sua consistência O efeito purgante ou catártico se apresenta quando as fezes se tornam líquidas A diferença entre tais efeitos quase sempre se restringe à titulação da dose Os laxantes podem ser classificados em grupos como podemos observar no Quadro 3 A escolha do laxante deverá ser pautada em alguns princípios diversas combinações poderão ser igualmente efetivas a preferência do paciente poderá ditar a escolha combinações fixas de laxantes reduzem o número de comprimidos necessários ao dia laxantes administrados separadamente permitem melhor titulação de seus componentes comparativamente ao dantron o sene traduzse em maior tendência a causar cólica 125 Quadro 1 Causas de obstipação em Cuidados Paliativos Neoplasia Diretamente devidas ao tumor Obstrução intestinal Dano à medula espinal cauda equina Hipercalcemia Devidas aos efeitos secundários da doença Diminuição do apetite Dieta pobre em fibras Desidratação Fraqueza Inatividade Confusão mental Depressão Alterações dos hábitos de toalete Drogas Opioides Drogas com efeitos anticolinérgicos Antiácidos contendo cálcio e alumínio Diuréticos Anticonvulsivantes Ferro Agentes antihipertensivos Vincristina Doenças concomitantes Diabetes Hipotireoidismo Hipocalemia Hérnia Doença diverticular Retocele Fissura ou estenose anal Prolapso mucoso anterior Hemorroidas Colite Modificado de Sykes et al8 126 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 2 Possíveis complicações da obstipação Dor em cólica ou contínua Obstrução intestinal Retenção urinária Diarreia por transbordamento Incontinência fecal Confusão mental Quadro 3 Tipos de laxante Laxantes que aumentam o volume das fezes Nãoosmóticos formadores de bolo carboximetilcelulose metilcelulose e psyllium Osmóticos sorbitol glicerina lactulona e laxantes salinos hidróxido de magnésio sulfato de sódio Laxantes que facilitam o deslizamento das fezes Lubrificantes parafina líquida Surfactantes docusato de sódio Laxantes estimulantes da mucosa colônica Sene dantron e bisacodil Laxantes que aumentam o volume das fezes Os laxantes formadores de bolo fecal atuam como as fibras aumentando a motilidade colônica em decorrência do aumento do volume fecal Sua efetividade somente se verifica quando a ingestão de líquido se mantém normal Caso contrário pode resultar em obs trução intestinal pela impactação de matéria fecal no cólon motivo pelo qual raramente estão indicados para pacientes sob Cuidados Paliativos Laxantes osmóticos atuam gerando um meio hiperosmótico que atrai água aumen tando o volume das fezes e diminuindo sua consistência Assim a lactulose por exemplo na dose de 15 ml é capaz de drenar para o lúmen intestinal 500 a 600 ml de água Isso por si só pode desencadear desidratação e distúrbios hidroeletrolíticos em pacientes de bilitados Seu uso em Cuidados Paliativos mostrase inapropriado visto a necessidade de adequada ingestão hídrica evolução com presença de distensão abdominal flatulência e cólicas além de aderência prejudicada pelo gosto adocicado de alguns agentes Na cons tipação de difícil controle e impactação fecal no entanto o polietilenoglicol pode exercer papel efetivo2 Diluído em água o volume pode ser um problema para alguns pacientes pode inclusive ser administrado em dose única noturna sem que efeitos colaterais sejam observados como distúrbios hidroeletrolíticos incontinência cólica ou diarreia7 127 Laxantes que facilitam o deslizamento das fezes De natureza lipídica e nãodigerível os laxantes lubrificantes favorecem o desliza mento da matéria fecal ao lubrificála Déficit dos reflexos de deglutição torna seu uso proibitivo devido ao risco de aspiração com subsequente pneumonia lipídica Laxantes surfactantes como docusato diminuem a consistência das fezes ao permitir a penetração de água pela diminuição da tensão superficial das fezes A efetividade des sas drogas é maior quando em associação a laxantes estimulantes Laxantes estimulantes da mucosa colônica Agem estimulando diretamente o plexo mioentérico induzindo peristaltismo e re dução da absorção de água e eletrólitos no cólon daí sua efetividade para obstipação decorrente de opioides constituindose nesses casos em droga de escolha Laxantes retais Estão indicados para situações específicas para tratamento da impactação fecal como tratamento adicional em pacientes cuja constipação não responde adequadamente aos laxantes orais como alternativa para aqueles que não toleram laxantes orais e para o esvaziamento retal em pacientes com compressão da medula espinal A Figura 1 sugere o tratamento para pacientes com impactação fecal10 e a Figura 2 a sequência terapêutica para aqueles com constipação induzida por opioides Embora o bloqueio do receptor opioide com antagonistas específicos constituase em uma in tervenção racional as experiências iniciais com antagonistas opioides tradicionais não corresponderam às expectativas Novas terapias abordam o uso de antagonistas opioides Impactação fecal Fezes amolecidas Fezes endurecidas Figura 1 Tratamento da impactação fecal Supositório de bisacodil 10 a 20 mg seguido após 2 horas por enema salino Enema oleoso de retenção noturno seguido por supositó rio de bisacodil 10 a 20 mg e enema salino na manhã seguinte Figura 1 Tratamento da impactação fecal 128 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP com absorção sistêmica limitada naloxona e antagonistas do receptor μ de ação restrita à periferia metilnaltrexona e alvimopam Naloxona pode reverter a constipação induzida por opioides porém predispõe a reversão da analgesia e presença de sintomas de absti nência mesmo em doses insuficientes para promover evacuação3 Metilnaltrexona por sua vez não atravessa a barreira hematoencefálica portanto não antagoniza os efeitos centrais da morfina ou precipita síndrome de abstinência Sua administração por via subcutânea SC rapidamente induz evacuação em pacientes com doença avançada e constipação induzida por opioides na dose de 015 mgkg4 Alvimopam é um antagonista seletivo do receptor opioide μ que não sofre absorção gastrointestinal ou cruza a barreira hematoencefálica Seu uso está aprovado especifica mente para acelerar a recuperação gastrointestinal após ressecção intestinal Sua dispo nibilidade é restrita devido a aumento da incidência de infartos do miocárdio em estudo de longo prazo envolvendo pacientes em terapia crônica com opioides1 O Quadro 4 especifica o tempo para início da ação de alguns laxantes Laxante estimulante Sem resposta Manter laxante em uso regular Boa resposta Boa resposta Sem resposta Sem resposta Boa resposta Constipação induzida por opioides ex sene 15 mg a cada 1224 h Aumentar a dose ex sene até 225 mg a cada 412 horas Adicionar laxante osmótico ex lactulose 33 g5 ml 15 a 30 ml a cada 1224 horas Adicionar supositório de bisacodil 10 a 20 mg seguido após 2 horas por enema salino Repetir em até três dias se necessário Manter laxante em uso regular Manter laxante em uso regular Figura 2 Tratamento da constipação induzida por opioides 129 Quadro 4 Início de ação de alguns laxantes Bisacodil comprimido 10 a 12 horas Bisacodil supositório 20 a 60 minutos Dantron 6 a 12 horas Docusato 24 a 48 horas Glicerina supositório 1 a 6 horas Lactulose 48 horas Sene 8 a 12 horas O tratamento da obstipação em Cuidados Paliativos baseiase ainda em inadequada evi dência com poucos estudos controlados e randomizados disponíveis incluindo estudos que permitam comparações diretas entre classes distintas de laxantes Persistem portanto dúvi das acerca do melhor manuseio terapêutico da constipação nesse grupo de pacientes5 Diarreia Definese pela passagem de três ou mais fezes não formadas em um período de 24 horas O Quadro 5 delineia causas de diarreia em pacientes em Cuidados Paliativos9 Quadro 5 Causas mais frequentes de diarreia em Cuidados Paliativos Desequilíbrio da terapia laxativa Drogas antibióticos antiácidos AINH ou preparados contendo ferro Impactação fecal com diarreia por transbordamento Radioterapia abdominal ou pélvica Má absorção carcinoma da cabeça do pâncreas gastrectomia ressecção ileal colectomia Tumores colônicos ou retais Tumores endócrinos raros ex tumor carcinoide Doenças concorrentes ex infecção do trato gastrointestinal Hábitos alimentares prévios AINH antiinflamatório nãohormonal O tratamento da diarreia deverá focarse inicialmente na busca de causa específica que justifique o quadro permitindose assim direcionálo de maneira mais apropriada No caso de diarreia persistente agentes nãoespecíficos incluindo agentes absorventes adsorventes inibidores da prostaglandina e opioides poderão ser iniciados 130 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Agentes absorventes Incluindo substâncias formadoras de bolo metilcelulose e pectina atuam absorvendo água constituindo massa coloidal ou gelatinosa que fornece às fezes maior consistência Agentes adsorventes Caracterizamse pela capacidade de acumular moléculas em sua superfície sendo tal capacidade tanto maior quanto a superfície disponível para adsorção Encontramse disponíveis para uso em combinação com outros agentes antidiarreicos recomendando se as doses de caolin 2 a 6 g a cada 4 horas e atapulgita 12 g inicial seguida por 12 g a cada nova evacuação até a dose máxima de 84 gdia Inibidores de prostaglandinas Sua ação reside na redução da secreção de água e eletrólitos pela mucosa O subsa licilato de bismuto apresenta ação adicional antibacteriana e está indicado para trata mento de diarreia nãoespecífica 525 mg a cada 30 minutos até 5 mgdia enquanto a mesalazina 12 a 24 gdia e a aspirina 300 mg a cada 4 horas respectivamente estão indicadas para tratamento da diarreia decorrente de colite ulcerativa e radiação Há de se pesar sempre a relação riscobenefício do uso de doses altas de aspirina com relação aos efeitos colaterais potenciais Agentes opioides Drogas de escolha para o tratamento da diarreia em Cuidados Paliativos os agentes opioides aumentam as contrações tônicas e diminuem as peristálticas com redução sub sequente de água e eletrólitos nas fezes Desses a loperamida é a droga antidiarreica de eleição sendo seu uso recomendado em doses de 4 a 8 mgdia iniciar com 4 mg seguidos por 2 mg a cada evacuação não ultrapassando a dose de 16 mgdia Considerações finais Alterações do hábito intestinal imprimem mudanças significativas no cotidiano de pacientes sob Cuidados Paliativos motivando intervenções frequentes em unidades de prontoatendimento com prejuízo e desvio da atenção concernente a questionamentos psíquicos e emocionais que permeiam essa fase da vida A continência dessas queixas exige abordagem correta e premente permitindo ao paciente seguir seu trajeto sem obs táculos adicionais Referências 1 CADA D LEVIEN T L BAKER D E Alvimopan Hospital Pharmacy v 43 n 10 p 81929 2008 2 CULBERT P GILLETT H FERGUSON A Highly effective new oral therapy for faecal impaction British J of General Practice v 48 p 1599600 1998 3 CULPEPPERMORGAN J A et al Treatment of opioidinduced constipation with oral naloxone a pilot study Clin Pharmacol Ther v 52 p 905 1992 4 KEVIN C et al Methylnaltrexone for opioidinduced constipation in advanced illness NEJM v 358 n 22 p 233243 2008 131 5 MILES C L et al Laxatives for the management of constipation in palliative care patients Cochrane Database of Systematic Reviews 2006 Issue 4 Art n CD003448 DOI 10100214651858 CD003448pub2 6 REDDY S K RAJAGOPAL A GOVIDRAJ N Pain Practice v 2 n 1 p 5664 2002 7 SIEGEL J D DI PALMA J A Medical treatment of constipation Clinics in Colon and Rectal Surgery v 18 n 2 p 7680 2005 8 SKYPES N P Constipation and diarrhea In DOYLE D HANKS G W MAC DONALD N eds Oxford Textbook of Palliative Medicine 2 ed Oxford University Press 2001 p 51326 9 WATSON M et al Oxford Handbook of Palliative Care Oxford University Press 2005 p 2547 10 WHO Symptom Relief in Terminal Illness Geneve 1998 132 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Fadiga sudorese e prurido toshio ChibA luCiAnA reGinA bertini CAbrAl Os sintomas fadiga sudorese e prurido têm em comum o fato de serem pouco reco nhecidos valorizados ou tratados pelos médicos De fato sintomas como dor náuseas e vômitos ou dispneia quando não controlados em geral são mais dramáticos e necessitam ser paliados prioritariamente Mas após o controle inicial desses sintomas as queixas de fadiga sudorese ou prurido muitas vezes assumem grande proporção do sofrimento sentido pelos pacientes sob Cuidados Paliativos por isso devem receber a mesma atenção por parte dos médicos e de toda a equipe multidisciplinar ainda que as opções terapêu ticas sejam mais escassas ou menos efetivas A maioria das publicações sobre o assunto é relativa a pacientes oncológicos São necessários mais estudos para definir se existem condutas específicas e diferentes dessas para pacientes com outras doenças Fadiga Fadiga relacionada com o câncer é definida como perturbadora sensação subjetiva e persistente de cansaço e exaustão física emocional eou cognitiva desproporcional ao nível de atividade física que interfere no status funcional do paciente9 Diferenciase da fadiga do diaadia que é temporária e aliviada com o repouso É um dos sintomas mais prevalentes e desgastantes para o paciente com câncer com impacto negativo na quali dade de vida4 19 Sua prevalência pode chegar a 95 sendo que há grande variabilidade nos estudos a depender do critério diagnóstico utilizado Apesar da alta prevalência e do alto impacto para o paciente dados da literatura mostram que a fadiga é pouco diagnos ticada e tratada pelos médicos17 A fisiopatologia da fadiga relacionada com o câncer é pouco compreendida mas vá rias causas podem sobreporse e contribuir para o seu agravamento As principais causas de fadiga estão relacionadas no Quadro 1 A avaliação da queixa de fadiga deve ser feita de forma ativa por parte do médico que deverá questionar especificamente sobre presençaausência desse sintoma e buscar quantificálo de forma objetiva O mais recomendado é utilizar a escala numérica de 0 a 10 por ser de fácil aplicação e boa para seguimento Na presença de fadiga moderada a intensa 4 a 10 devese proceder a anamnese e exame físico detalhados na busca de causas contribuintes potencialmente tratáveis O tratamento dessas causas para a fadiga constituise na principal opção terapêutica visto que as medidas de tratamento pura mente sintomático são escassas O uso de corticoides dexametasona 1 a 4 mgdia ou prednisona 5 a 20 mgdia pode ser recomendado com base na experiência clínica de melhora sintomática em alguns pacientes entretanto não há evidências científicas para tal uso Além disso devese con siderar que a corticoterapia prolongada acelera a perda de massa muscular Os psicoesti mulantes podem ser indicados para o tratamento da fadiga com base em alguns estudos clínicos Numa recente metanálise com 264 pacientes o metilfenidato 5 a 20 mgdia 133 Quadro 1 Causas relacionadas com a fadiga Anemia Neuromusculares Perda de massa muscular relacionada com caquexia ou imobilidade prolongada Polineuropatia Metabólicas Distúrbios hidroeletrolíticos Hipóxia Insuficiência renalhepática Infecção Endócrinas Insuficiência adrenal Hipotireoidismo Diabetes descompensado Hipogonadismo Nutricionais Deficiênciassíndromes carenciais Anorexianáuseas e vômitos Má absorção Comorbidades Insuficiência cardíacacoronariana DPOCpneumopatias intersticiais Insuficiência renalhepática Psiquiátricas Depressãoansiedade Distúrbios do sono Medicamentos Opioides Ansiolíticoshipnóticosantidepressivos Antihistamínicos diuréticos antihipertensivos hipoglicemiantes etc DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica via oral VO mostrouse superior ao placebo no tratamento da fadiga relacionada com o câncer8 entretanto ainda são necessários dados de maior valor científico O modafinil também tem sido pesquisado com bons resultados em pequenos estudos entretanto esses dados também são escassos e carecem de maior comprovação científica2 Proges tógenos acetato de megestrol e antidepressivos paroxetina não se mostraram efetivos no tratamento sintomático da fadiga8 As medidas nãofarmacológicas com intervenções de toda a equipe interdisciplinar também são muito importantes na abordagem dos pacientes com fadiga principalmente levandose em consideração as poucas opções de tratamento medicamentoso Programas de exercícios físicos podem trazer benefícios na funcionalidade e nos índices de qualidade de vida mesmo em pacientes com doença oncológica avançada11 Além disso terapias psicossociais atividades de lazer orientações quanto a adaptação do ambiente e ativida des cotidianas medidas para higiene do sono e suportes psicológico familiar e nutricional são úteis no atendimento global desses pacientes 134 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Sudorese Sudorese excessiva pode ser um sintoma muito desgastante e de difícil controle para o paciente sob Cuidados Paliativos A prevalência foi de 16 num estudo entre os pacien tes de um hospice14 mas dados de literatura revelam prevalência de até 2812 Muitas vezes a sudorese é pior à noite ou limitada ao período noturno levando a distúrbios do sono Ela pode ser um sintoma típico de alguns tipos de neoplasia como linfoma feo cromocitoma e tumores carcinoides mas qualquer neoplasia avançada pode ser a causa primária desse sintoma As principais causas de sudorese em pacientes com câncer estão listadas no Quadro 2 Quadro 2 Causas de sudorese em pacientes com câncer Infecção associada ou não a febre Paraneoplasica associada ou não a febre linfoma tumores carcinoides feocromocitoma mesotelioma metástases ósseas câncer avançado nãoespecificado Alterações hormonais em decorrência do próprio câncer ou de seu tratamento Medicamentos quimioterápicos opioides antidepressivos tricíclicos inibidores hormonais O tratamento mais adequado deverá ser escolhido conforme a causa da sudorese levandose em conta que muitas vezes a etiologia é múltipla e a causa nem sempre reversível Para os casos de sudorese relacionados com quadro infeccioso o tratamento adequado com antibióticos deverá resolver o sintoma A sudorese associada a tumores neuroendócrinos pode ser controlada com análogo da somatostatina octreotida por via subcutânea SC na dose de 50 a 500 mcg três vezes ao dia Os casos de sudorese as sociada a fogachos em pacientes menopausadas ou naqueles com câncer de próstata submetidos à castração cirúrgica ou farmacológica podem ser tratados com terapia de reposição hormonal acetato de megestrol 20 mg VO duas vezes ao dia ou acetato de medroxiprogesterona 500 mg intramuscular IM quinzenal1 15 mas as contraindica ções relativas e absolutas frequentemente limitam o seu uso em pacientes sob Cuidados Paliativos Homens com câncer de próstata castrados também podem usar estrógenos ou o antiandrogênico acetato de ciproterona 50 mg VO duas vezes ao dia15 Quando a sudorese é associada ao uso de opioide podese tentar fazer rotação para outro opiáceo embora os dados da literatura sugiram que a rotação é pouco eficaz nesses casos20 Os principais fármacos utilizados para o controle sintomático da sudorese são antiinflamatórios nãohormonais AINHs particularmente indicados para os casos de febre paraneoplásica mas também podem ser utilizados para controle da sudorese sem febre naproxeno 250375 mg VO duas vezes ao dia neurolépticos olanzapina 5 mg VO uma a duas vezes ao dia é descrita como alternati 135 va para tratamento da sudorese20 A tioridazina em doses baixas 1025 mgdia também é descrita3 mas o risco de alargamento do intervalo QT e de arritmias fatais praticamen te contraindica seu uso antidepressivos venlafaxina 75 mgdia liberação prolongada tem se mostrado efe tiva no controle da sudorese associada a fogachos em pacientes menopausadas e nos com câncer de próstata submetidos a castração6 13 15 Outros antidepressivos inibidores seletivos da recaptação da serotonina ISRS paroxetina fluoxetina também podem ser empregados7 16 gabapentina na dose de 900 mgdia mostrouse efetiva na redução de sudorese e foga chos em pacientes sob os efeitos de menopausa ou castração e pode ser efetiva também nos casos de sudorese sem causa estabelecida10 12 15 Outras medicações como cimetidina 400800 mg duas vezes ao dia talidomida 100 mg à noite clonidina e hioscina são citadas na literatura como alternativas para controle sintomático da sudorese mas seu uso é limitado pelo alto risco de efeitos cola terais ou pela eficácia questionável Algumas medidas gerais que devem ser recomendadas aos pacientes com queixa de sudorese são listadas no Quadro 3 Quadro 3 Recomendações gerais no manejo da sudorese em Cuidados Paliativos Medidas dietéticas evitar álcool cafeína e alimentos picantes Diminuir a temperatura do ambiente Manter o ambiente mais ventilado Preferir roupas de algodão que absorvem melhor o suor Dormir sobre uma tolha para manter os lençóis secos em caso de sudorese noturna Prurido Prurido representa sensação distinta provinda de camada superficial de pele mucosa incluindo trato respiratório alto ou conjuntiva5 O manejo mais adequado possível de um caso clínico resulta de uso racional de uma medicação por meio de entendimento de fisiopatogenia e compreensão dos mediadores que provocam o prurido em cada situação Quadro 4 Doença sistêmica Prurido na ausência de erupções cutâneas pode ser devido a icterícia insuficiência renal uso de opioide anemia deficiência de ferro tireoidopatia mieloma linfoma poli citemia vera e diabetes Quadro 5 Prurido por problema local Frequentemente pele seca ou escoriada causa coceira por ciclo vicioso de prurido coçadura Eventualmente o simples uso de hidratante ou emoliente pode resolver 136 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 4 Mediadores químicos potenciais que atuam no prurido Aminas histamina serotonina dopamina adrenalina noradrenalina melatonina Proteases triptases quimases carboxipeptidases papaína kallikreina Neuropeptídeos substância P CGRP bradicinina endotelina neurocininas A e B somatostatina CRF VIP CCK alfa e betaMSH neurotensina bombesina Opioides metencefalina leuencefalina betaendorfina morfina Eicosanoides PGE2 PGH2 outros PGs LTB4 outros LTs Fatores de crescimento Citocinas IL1 a IL11 TNFa e TNFb produto eosinofílico Traduzido e adaptado de Krajnik 20015 Quadro 5 Causas mais comuns de prurido em Cuidados Paliativos Prurido senil Colestase Dermatoses infecções fúngicas Doenças linfoproliferativas Medicações opioide sistêmica ou espinal Outras medicações como furosemida Uremia Câncer síndrome paraneoplásica Psicogênico Traduzido e adaptado de Krajnik 20015 Prurido por causa nãocutânea A seguir um roteiro com opções de manejo Roteiro e opções de manejo de prurido de causa nãocutânea conforme etiologia5 acompanhar pelo Quadro 6 medidas gerais corte de unhas hidratante após banho exclusão de dermatoses especialmente escabiose tratamento de causa removível como drenagem biliar e rotação de opioide clorfeniramina 4 mg VO 88 h inefetivo em insuficiência renal crônica IRC e colestase loção de calamine ou mentol localmente pururido associado à colestase colestiramina 4 a 8 g VO ao dia rifampicina 150 mg VO 1212 h ondansetrona para prurido induzido por opioide e uremia 4 a 8 mg endovenosos EV inicialmente depois 4 mg VO 1212 h18 137 paroxetina 20 mg 1 comprimido VO ao dia nos casos de prurido relacionado com a neoplasia Efeito esperado após quatro a sete dias18 cimetidina 200 mg 66 h em doença lifoproliferativa policitemia vera e uremia18 capsaicina creme de 0025 a 0075 88 h Prurido urêmico localizado18 hidroxizina 25 a 100 mg VO até 88 h caso insônia caracterize consequência impor tante no prurido18 Quadro 6 Manejo de prurido em doenças nãocutâneas Condição Etapa 1 Etapa 2 Etapa 3 Medidas gerais B Corrigir o corrigível Creme emoliente Sedativo como benzodiazepínico e clorfenamima 4 mg 88 h Uremia Fototerapia UVB A ou se localizado creme de capsaicina 0025 a 0075 12xdia A Naltrexona 50 mg 1xdia A Talidomida 100 mg A Colestase Naltrexona 125 a 250 mg 1xdia A Rifmpicina 75 a 300 mg 1xdia A ou paroxetina 5 a 20 mg 1xdia A Metiltestosterona 25 mg SL 1xdia ou alternativa como danazol 200 mg 1 a 3xdia U Linfoma de Hodgkin Predinisolona 10 a 20 mg 3xdia Cimetidina 800 mg24h B Mirtazapina 15 a 30 mg VO Induzido por opioide espinal Bupivacaína intratecal A AINH diclofenaco 100 mg A ou tenoxicam 20 mg EV A Ondansetrona 8 mg EV A Induzido por opioide sistêmico Sedativos como benzodiazepínicos Ondansetrona 8 mg VO 2xdia Rotação de opioide Prurido paraneoplásico Paroxetina 5 a 20 mg VO 1xdia A Mirtazapina 15 a 30 mg VO U Talidomida 100 mg U Outras causas eou desconhecidas Paroxetina 5 a 20 mg VO 1xdia A Mirtazapina 15 a 30 mg VO U Talidomida 100 mg U A pelo menos um estudo controlado randomizado B estudo nãorandomizado C baseado em opinião de especialista ou consenso U nãoclassificado relato de um caso ou série pequena de caso Traduzido e adaptado de Twycross 200318 UVB ultravioleta B SL sublingual VO via oral EV via endovenosa AINH antiinflamatório nãohormonal 138 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Referências 1 BERTELLI G et al Intramuscular depot medroxyprogesterone versus oral megestrol for the control of postmenopausal hot flashes in breast cancer patients a randomized study Ann Oncol v 13 n 6 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capacitada para reconhecêlo De acordo com os critérios do texto revisado da quarta revisão do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSMIVTR delirium consiste em uma alteração do nível de consciência de instalação aguda horas ou dias e curso flutuante acompanhada de déficit de atenção e alteração da cognição como déficit de memória ou desorientação Deve existir evidência na história nos exames físico e laboratoriais de que a alteração é causada por uma condição orgânica subjacente ou é consequência direta de uma condi ção médica geral ou de seu tratamento A apresentação do delirium pode assumir duas formas hiperativa ou hipoativa Na forma hiperativa que é a mais diagnosticada ocorrem agitação hipervigilância e alu cinações O paciente encontrase inquieto com discurso incoerente e até agressividade física o que leva os familiares ou a enfermagem a solicitar de imediato uma avaliação médica Por outro lado na forma hipoativa o paciente parece confuso e sedado com retardo no funcionamento motor olhar fixo e apatia4 O delirium hipoativo ocorre em até 85 dos pacientes idosos internados em unidades de terapia intensiva UTI10 e geral mente passa despercebido possuindo prognóstico pior A abordagem do paciente não é diferente daquela usada para o delirium hiperativo Os pacientes podem alternar as duas formas caracterizando um delirium misto Para o diagnóstico costumase empregar o Confusion Assessment Method CAM que é uma ferramenta simples e validada em língua portuguesa5 8 cuja versão curta pode ser aplicada em poucos minutos Quadro 1 O delirium traz desconforto para o paciente e interfere na avaliação de seus sintomas provocando ansiedade em familia res e cuidadores Assim para pacientes com risco aumentado de desenvolver delirium devem ser adotadas medidas preventivas com o intuito de reduzir sua ocorrência Além disso a aplicação periódica do CAM durante uma internação contribui para identificar precocemente a instalação do quadro permitindo a pronta adoção de medidas de tratamento Fatores de risco Um dos objetivos dos cuidados deve ser a prevenção do delirium Para isso o profis sional precisa ficar atento aos principais fatores de risco Quadro 2 e procurar limitálos Uma revisão sistemática da prescrição é vital para reduzir a incidência de iatrogenias me dicamentosas evitandose o uso regular de benzodiazepínicos ou anticolinérgicos sempre que possível A identificação dos fatores de risco e medidas preventivas voltadas para os mesmos resultam na redução de 40 do delirium em idosos hospitalizados7 140 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 1 Versão em português do CAM Presença dos três itens do primeiro bloco um ou dois itens do segundo sugere delirium Início agudo e curso flutuante Há evidência de mudança aguda do estado mental de base do paciente Este comportamento anormal variou durante o dia isto é tendeu a surgir e desaparecer ou aumentar e diminuir de gravidade Distúrbio de atenção O paciente teve dificuldade em focalizar sua atenção isto é distraiuse facilmente ou teve dificuldade em acompanhar o que estava sendo dito Pensamento desorganizado O pensamento do paciente era desorganizado ou incoerente com a conversação dispersiva ou irrelevante fluxo de ideias pouco claro ou ilógico ou com mudança imprevisível de assunto Alteração do nível de consciência O paciente encontrase hiperalerta hipersensível a estímulos ambientais assustando se facilmente letárgico em estupor ou coma CAM Confusion Assessment Method Quadro 2 Fatores de risco para delirium Déficit cognitivo Uso de psicofármacos Imobilidade Desidratação Desnutrição Idade avançada Déficit auditivo ou visual Causas O delirium é uma alteração classicamente multifatorial em que um paciente já vul nerável portador de fatores de risco desenvolve o quadro após exposição a uma série de fatores precipitantes As principais causas de delirium encontramse no Quadro 3 A lista de drogas que podem induzir delirium é longa com destaque para antidepressivos anticolinérgicos benzodiazepínicos bloqueadores H2 e antihistamínicos Processos in fecciosos de qualquer sítio podem ser responsáveis pelo delirium e a equipe precisa estar apta a reconhecer manifestações atípicas em idosos que não apresentam leucocitose ou 141 Quadro 3 Principais causas de delirium Medicações Dor Infecção Mudança de ambiente Imobilidade Uso de cateteres venosos ou urinários Contenção física Distúrbios metabólicos Desidratação Hipóxia IAM Privação sensorial Procedimentos cirúrgicos Privação de sono IAM infarto agudo do miocárdio resposta febril Na situação de uma idosa que habitualmente consegue comer sem ajuda e caminhar com auxílio de andador e que em poucos dias desenvolve dificuldade para se alimentar e leve confusão mental seguida de uma queda da própria altura é obrigatório investigar em caráter de emergência as hipóteses de infecção urinária ou pneumonia mesmo que a anamnese não evidencie disúria dor lombar tosse ou dispneia Constipação intestinal secundária a imobilidade ou uso de opioides é outra causa comum assim como o são dor e distúrbios hidroeletrolíticos A simples mudança de um ambiente com o qual o paciente encontrase familiarizado como o de sua casa para um novo onde ele é assistido por pessoas desconhecidas como um quarto de hospital pode ser suficiente para desencadear delirium Tratamento A abordagem de um paciente em delirium começa necessariamente pela identificação das causas prováveis que costumam ser múltiplas O tratamento envolve a correção des sas causas quando possível e o controle dos sintomas6 Toda avaliação de um quadro de delirium iniciase por uma revisão criteriosa da pres crição atual buscando identificar se existe algum fármaco que possa ser responsável pelo quadro agudo de desorientação Quando possível os fármacos potencialmente indutores de delirium devem ser suspensos ou trocados por outros que não apresentem esse risco Ao mesmo tempo o ambiente em que o paciente se encontra precisa ser analisado de forma crítica existe algum fator que possa estar contribuindo para causar desconforto ou agitação no momento da avaliação Muitas vezes a mudança de pequenos detalhes do ambiente será suficiente para o sucesso no controle do delirium As medidas mais importantes são as nãofarmacológicas Quadro 4 que buscam otimizar a orientação do paciente A presença constante de um familiar ou cuidador contribui para melhorar a comunicação que deve ser feita com instruções pausadas e claras É importante estimular o uso de relógios calendários e crachás dos profissionais com nomes bem visíveis Com frequência pacientes idosos em delirium são amarrados no leito principalmente em terapia intensiva uma conduta inaceitável e que representa um atestado de insuficiência de pessoal de enfermagem ou má prática a qual tende a fazer com que a agitação se agrave A imobilização deve ser evitada retirando contenções e sondas vesicais e encorajando o paciente a manter a independência e caminhar preco 142 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP cemente A privação de sono pode ser tratada com estratégias para redução de ruídos ambientais e por meio da adoção de horários de medicação que não interrompam o des canso noturno do paciente A correção de déficits sensoriais é crucial para o tratamento do delirium Portanto portadores de déficit visual ou auditivo devem permanecer em uso de óculos ou de prótese auditiva para manter a orientação em relação ao ambiente cuja iluminação precisa ser adequada Por último a desidratação deve ser reconhecida para imediata reposição de volume que pode ser feita com segurança por hipodermóclise11 mesmo em indivíduos muito idosos Quadro 4 Tratamento nãofarmacológico do delirium Suspensão de medicamentos potencialmente causadores Reorientação para o ambiente Permanência de pessoas conhecidas com o paciente Remoção de causas de incômodo sondas acessos venosos Preservação do sono noturno Retirada de contenções físicas Estímulo a caminhadas Hidratação adequada O tratamento farmacológico do delirium serve para o controle dos sintomas enquanto as causas básicas ainda não foram revertidas e deve ser instituído sempre que as medidas não farmacológicas não forem suficientes A droga mais estudada para o tratamento do delirium é o haloperidol feito por via oral VO ou subcutânea SC em dose inicial de 05 a 1 mg que pode ser repetida a cada 30 minutos até que seja alcançada a sedação do paciente1 Em geral a dose necessária fica entre 3 a 5 mg Nos dias subsequentes a prescrição deve incluir 50 dessa dose de maneira regular com redução progressiva após resolução dos sintomas A prática de prescrever 5 mg de haloperidol intravenoso IV ou intramuscular IM como dose inicial para tratamento não somente não está descrita em referências clássicas sobre o tema mas também costuma induzir sedação excessiva com risco de broncoaspiração e em curto prazo tende inclusive a ter efeito contrário ao desejado criando novas situações que aumentam o risco de cronificação do delirium devendo portanto ser evitada O tratamento com outros medicamentos como benzodiazepínicos e antipsicóticos atípicos encontra respaldo limitado na literatura3 não sendo recomendado rotineira mente pela carência de evidências de sua eficácia9 Em casos de delirium refratário com agitação incontrolável causadora de grande desconforto para pacientes e familiares pode ser indicada a sedação paliativa Conclusão Um número expressivo de pacientes sob Cuidados Paliativos cerca de 25 a 75 desenvolve algum tipo de delirium ao longo da evolução da doença2 O quadro é geral mente multifatorial e prejudica a comunicação do paciente podendo ser impactante para 143 a família Os profissionais da saúde precisam identificar os fatores de risco procurando adotar medidas preventivas sempre que possível Em caso de delirium já instalado é im portante reavaliar a prescrição e enfatizar a adoção de medidas nãofarmacológicas que possam contribuir para sua reversão Quando isso não é suficiente o haloperidol deve ser titulado da forma correta até o controle dos sintomas Referências 1 AGOSTINI J V INOUYE S K Delirium In HAZZARD W R et al eds Principles of geriatric medicine and gerontology 5 ed New York McGrawHill 2003 p 150315 2 BYOCK I R HEFFNER J E Palliative and endoflife pearls 1 ed Philadelphia Hanley Belfus 2002 3 CARACENI A MARTINI C SIMONETTI F Neurological problems in advanced cancer In DOYLE Det al eds Oxford Textbook of Palliative Medicine 3 ed Oxford Oxford University Press 2005 p 70812 4 CUNHA U G V GIACOMIN K C Delirium no idoso In FORLENZA O V CARAMELLI P eds Neuropsiquiatria geriátrica São Paulo Atheneu 2001 p 64158 5 FABBRI R M A et al Validação e confiabilidade da versão em língua portuguesa do confusion assessment method CAM para detecção de delirium no idoso Arq NeuroPsiquiatr v 59 n 2A p 1759 2001 6 FABBRI R M A Delirium In FREITAS E V et al eds Tratado de geriatria e gerontologia 2 ed Rio de Janeiro Guanabara Koogan p 32532 2006 7 INOUYE S K et al A clinical trial of a multicomponent intervention to prevent delirium in hospitalized older patients N Engl J Med v 340 p 669 1999 8 INOUYE S K et al Clarifying confusion The confusion assessment method A new method for detection of delirium Ann Intern Med v 113 p 941 1990 9 JACKSON K C LIPMAN A G Drug therapy for delirium in terminally ill patients Cochrane Database of Systematic Reviews 2004 Issue 2 Art No CD004770 DOI 10100214651858CD004770 10 OUIMET S et al Incidence risk factos and consequences of ICU delirium Intensive Care Med v 33 p 6673 2007 11 REMINGTON R HULTMAN T Hypodermoclysis to treat dehydration a review of the evidence JAGS v 55 p 20515 2007 144 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Ansiedade e depressão em Cuidados Paliativos como tratar ritA dewAY GuimArães Introdução Ansiedade e depressão podem ser caracterizadas como enfermidades médicas com sinais e sintomas específicos frequentes na prática clínica mas nem sempre reconhecidas e tratadas de forma correta Atualmente a depressão é considerada problema de saúde pública Os custos da assistência médica o tempo de trabalho perdido e a diminuição da qualidade de vida geram prejuízos sociais e funcionais importantes Os transtornos de ansiedade precisam ser diferenciados da ansiedade fisiológica necessária para a realização das atividades do diaadia A ansiedade patológica se manifesta como uma reação exagerada a diversos estímulos levando a sintomas físicos incapacitantes e tal qual a depressão gerando encargos para toda a socie dade Nesse contexto há um grupo de indivíduos que merece atenção e tratamento especial pacientes sob Cuidados Paliativos A medicina paliativa nasceu da necessi dade de melhorar a qualidade de vida dos pacientes para os quais a cura não é mais possível e a qualidade de vida está ou estará em breve deteriorada Nesses indivídu os o fator desencadeante do seu transtorno ansiedade ou depressão e é justamente ser colocado no limite da sua existência na incerteza de quanto tempo permanecerá vivo o quanto terá que lutar para aumentar a sobrevida passando por perdas reais sejam elas emocionais sociais financeiras e afetivas Neste capítulo tentaremos definir a melhor estratégia terapêutica para os pa cientes sob Cuidados Paliativos que desenvolvem depressão e transtornos de ansie dade visando minimizar o sofrimento e desenvolver condições pessoais de enfren tamento Depressão As doenças crônicas são sabidamente associadas a maior risco de ocorrência de quadros depressivos Os pacientes portadores de doenças crônicodegenerativas costumam criar estratégias de enfrentamento de situações que os levarão à ter minalidade sem necessariamente cursar com depressão No entanto a queda na qualidade de vida com comprometimentos social e afetivo dita o grau de impacto na vida de cada um Apesar de não ser o objetivo deste capítulo sabemos que os principais sinais e sintomas que levam a um correto diagnóstico de depressão são a persistência por um período maior ou igual a duas semanas de distúrbios alimentares como ina 145 petência ou compulsão levando a perda ou ganho de peso excessivo distúrbios do sono disfunção sexual com perda acentuada da libido perda da criatividade e do prazer recorrência de ideias negativas e catastróficas tendência à ociosidade ao isolamento e até quando mais grave à ideação suicida Uma vez diagnosticada e corretamente classificada a depressão devemse iniciar o tratamento e o acompa nhamento desse indivíduo Tratamento A primeira etapa é estabelecer junto a uma equipe multidisciplinar a fase evo lutiva da doença respeitando o princípio da beneficência e da proporcionalidade terapêutica É importante manter o princípio da veracidade e do nãoabandono A equipe deve manter seu acompanhamento regular sabendo passar as informações de ma neira que sejam respeitados seus limites e suas condições de receptividade Devese cuidar do ambiente doméstico manter boa iluminação tentar estimular o apetite e a crença espiritual O controle de sintomas principalmente a dor que é um fator de piora do quadro depressivo ou amplificação do mesmo é essencial A psicoterapia é fundamental para que o paciente consiga expor dúvidas medos e vivências complicadas O psicólogo julgará cada caso e definirá a técnica a ser adotada objetivando a compreensão do processo A acupuntura é uma especialidade reconhecida pelos reais benefícios empre gando técnicas bem estabelecidas para redução dos sintomas de ansiedade com blo queio de pontos específicos além de atuar como coadjuvante nos sintomas físicos especialmente de trato digestivo e álgicos Massoterapia musicoterapia e técnicas de relaxamento são válidas A terapia ocupacional TO representa importante apoio ao paciente resgatando habilidades e melhorando a autoestima A terapia farmacológica fundamentase no uso de antidepressivos podendo ou não estar associada a ansiolíticos A ação terapêutica das drogas antidepressivas tem lugar no sistema límbico o principal centro das emoções Esse efeito terapêutico é consequência de um aumento funcional dos neurotransmissores na fenda sináptica principalmente noradrenalina serotonina e dopamina bem como alteração no número e na sensibilidade dos neurorreceptores Antidepressivos tricíclicos e tetracíclicos Os antidepressivos tricíclicos ADTs aumentam a noradrenalina e a serotonina na fenda sináptica por meio da inibição na recaptação dessas aminas pelos recepto res présinápticos Parece haver também com o uso prolongado dos ADTs diminui ção do número de receptores présinápticos do tipo alfa2 que inibem a liberação da norepinefrina NE 146 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Inibidores seletivos da recaptação de serotonina Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina ISRSs atuam no neurônio pré sináptico inibindo especificamente a recaptação desse neurotransmissor tendo como vantagem a ausência de efeitos anticolinérgicos Neste grupo a fluoxetina a paroxetina e a fluvoxamina são potentes inibidores do sistema enzimático do citocromo P450 CYP mais especificamente CYP2D6 e CYP3A34 É importante que ao escolher esquema de tratamento do paciente sob Cuidados Paliativos tenhase especial atenção para checar drogas que sejam meta bolizadas por esse sistema enzimático bupropriona teofilina amiodarona verapamil diltiazen fluconazol cetoconazol ritonavir itraconazol eritromicina claritromicina opioides anticonvulsivantes cimetidina alprazolam etc pelo risco de elevação do nível sérico da droga eleita e pelas interações farmacológicas indesejáveis As demais drogas desse grupo têm ação inibitória desse sistema enzimático porém significativa mente menos expressiva portanto com menor ocorrência de interações farmacológi cas sendo recomendados como primeira linha de escolha desse grupo o citalopram ou escitalopram e em sequência a sertralina Quadro 1 Droga Dose inicial Dose máxima Amitriptilina Tryptanol Amytril 25 a 50 mg 100 a 300 mg Clomipramina Anafranil 25 mg 100 a 250 mg Mianserina Tolvon 30 mg 30 a 90 mg Doxepin Sinequan 25 a 50 mg 100 a 300 mg Imipramina Tofranil 25 a 50 mg 100 a 300 mg Maprotilina Ludiomil 50 mg 100 a 225 mg Nortriptilina Pamelor 25 mg 50 a 200 mg Mirtazapina Remeron 15 mg 15 a 45 mg Quadro 2 Droga Dose inicial Dose máxima Citalopram Cipramil Procimax 10 a 20 mg 20 a 60 mg Escitalopram Lexapro 10 mg 10 a 20 mg Fluoxetina Daforin Fluxene Prozac Eufor 10 a 20 mg 20 a 60 mg Fluvoxamine Luvox 50 mg 50 a 300 mg Paroxetina Paxil Aropax Pondera Cebrilim 10 a 20 mg 20 a 60 mg Paroxetina CR 125 a 25 mg 25 a 75 mg Sertralina Tolrest Zoloft Novativ Sertrax 50 mg 50 a 200 mg 147 Inibidor de recaptação de serotoninanoradrenalina Os inibidores potentes da recaptação neuronal de serotonina e noradrenalina IRNSs têm fraca ação inibitória do CYP2D6 com baixa incidência de interações medicamento sas exceto quando o paciente está em uso de inibidores da monoamina oxidase IMAOs Em caso de modificação de antidepressivos como fluoxetina e paroxetina por IRNS aten ção para ajuste das doses e controle rigoroso na detecção de efeitos indesejáveis justifi cado pela intensa ação inibitória da fluoxetina e da paroxetina em CYP2D6 e CYP3A34 Quadro 3 Droga Dose inicial Dose máxima Venlafaxina Efexor Alenthus Venlift 375 mg 75 a 300 mg Venlafaxina XR Efexor XR 375 mg 75 a 300 mg Desvenlafaxina Pristiq 50 mg 50 mg Duloxetina Cymbalta 30 mg 60 a 120 mg Quadro 4 Droga Dose inicial Dose máxima Bupropriona Wellbutrin Bup 75 a 150 mg 300 a 450 mg Bupropriona WellbutrinSR Zyban 100 a 150 mg 300 a 400 mg Inibidor de recaptação de dopaminanoradrenalina A bupropiona é um inibidor de recaptação de dopaminanoradrenalina IRDN rela tivamente seletivo com mínimo efeito na recaptação de indolaminas serotonina e não inibindo a monoamina oxidase Quadro 5 Droga Dose inicial Dose máxima Tanilcipromina Parnate Stelapar 10 mg 10 a 60 mg Selegilina Elepril Jumexil 10 mg 5 a 10 mg Moclobemida Aurorix 150 mg 150 a 600 mg Inibidores da monoamina oxidase A monoamina oxidase é uma enzima envolvida no metabolismo da serotonina e das catecolaminas Os IMAOs promovem aumento da concentração desses neurotransmisso res nos locais de armazenamento no sistema nervoso central SNC e no sistema nervoso simpático SNS Tem ação inibitória no sistema enzimático do citocromo P450 e é incom patível com betabloqueadores e outras drogas que sejam metabolizadas principalmente por CYP2D6 e CYP3A34 já citados 148 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Antagonista serotoninérgicoinibidor de recaptação de serotonina Quadro 6 Droga Dose inicial Dose máxima Nefazodona Serzone 50 mg 300 a 600 mg Trazodona Donaren 50 mg 150 a 400 mg Fases do tratamento Fase aguda a resposta inicial do tratamento antidepressivo ocorre entre duas a quatro semanas após o início da medicação e a fase aguda contempla os primeiros três meses O objetivo dessa fase é a diminuição ou remissão completa dos sintomas com obtenção da dose ideal de tratamento fase de continuidade até seis meses O objetivo dessa fase é a completa remissão dos sintomas fase de manutenção até o primeiro ano exceto se já houver relato de três ou mais epi sódios prévios de depressão o que eleva o tratamento para cinco anos O objetivo dessa fase é a descontinuação progressiva da droga ao longo de quatro semanas Se houver sinais de recorrência deverseá retornar ao uso na dose anteriormente utilizada Escolha do medicamento antidepressivo O American College of Physicians ACP após extensa revisão de estudos comparando os grupos antidepressivos suas variáveis clínicas e efeitos colaterais custos aderência tratamento correto e ocorrência de recidivas recomenda o uso de um entre 12 fármacos da segunda geração ISRS IRNS IRND citalopram bupropriona duloxetina escitalopran fluoxetina fluvoxamina mirtazapina nefazodona paroxetina sertralina trazodona ou venlafaxina e ADT 51315 porém o grupo mais bem tolerado com melhor perfil para menor índice de efeitos colaterais e menor complicação em casos de doses muito eleva das foi o ISRS ficando como recomendação de primeira escolha para iniciar o tratamen to com destaque para citalopram escitalopram e sertralina O ACP enfatiza entretanto que os demais grupos têm eficácia comprovada a maioria com respostas equivalentes e que a escolha deverá ser individualizada de acordo com o grau de comprometimento de funções sistêmicas efeitos colaterais e limitações que cada antidepressivo apresente para a patologia de base e comorbidades associadas9 10 O paciente sob Cuidados Paliativos geralmente faz uso de várias medicações portanto se faz necessário checar medicações de uso regular e avaliar os riscos de interações medicamentosas que contraindiquem determinado antidepressivo iniciar tratamento com doses baixas mínimas preconizadas ter cuidado especial com doses de antidepressivo no idoso A desvenlafaxina mostra um perfil ideal nessa faixa etária não necessitando de ajuste de dose e não sendo necessária titulação Os demais grupos exceto os que tenham contraindicação ou restrições por co 149 morbidades devem ter sua dose ajustada para a metade da dose mínima preconizada Pacientes com dor de difícil controle e depressão se beneficiam com o uso de du loxetina e venlafaxina Caso a característica da dor seja neuropática o antidepressivo tricíclico tem resposta excelente para ambas as condições Resposta ao tratamento Se não houver melhora dos sintomas depressivos nas seis primeiras semanas do tra tamento preconizase aumento da dose gradativamente até se obterem sinais de respos ta podendose também associar ansiolíticos7 A mudança do fármaco está indicada se ocorrerem efeitos colaterais indesejáveis graves ou intoleráveis ou ausência de resposta terapêutica após as modificações Contraindicações para grupos especiais IMAO portadores de asma hipertensos usuários de anticonvulsivantes ADT portadores de cardiopatias com distúrbios de condução epilepsia hipertensão glaucoma de ângulo fechado e prostatismo Contraindicação relativa para uso em idosos ISRS evitar dose elevada em pacientes com alterações plaquetárias exceção para o citalopram Duloxetina e nefazodona evitar em portadores de doença hepática Transtornos de ansiedade A ansiedade é definida como um estado de humor desconfortável vivenciado como sentimento difuso de medo e apreensão Nos pacientes sob Cuidados Paliativos o estímu lo desencadeador costuma ser o diagnóstico de uma doença grave sem proposta curativa ou mesmo a percepção de que sua doença evolui de forma refratária Diante de um estí mulo tão intenso o paciente tende a evoluir com ansiedade que comumente evolui para um estado patológico Essa ansiedade patológica deve ser reconhecida precocemente para que se possa iniciar a terapia adequada Após um correto diagnóstico os transtornos de ansiedade devem ser ainda classifica dos em transtorno de ansiedade generalizada transtornos de pânico e fobia social que merecem abordagens diferenciadas Transtorno de ansiedade generalizada Os sintomas característicos do transtorno de ansiedade generalizada TAG podem ser agrupados em três categorias tensão motora hipervigilância e hiperatividade auto nômica trAtAmento A terapia cognitiva comportamental TCC tem eficácia comprovada no tratamento do TAG particularmente em pacientes na fase intermediária de Cuidados Paliativos A atividade física deve ser indicada para pacientes com condições físicas adequadas 150 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quando o paciente está restrito ao leito recomendase fisioterapia de conforto A acupuntura possui técnicas bem estabelecidas para redução dos sintomas de ansie dade com bloqueio de pontos específicos Massoterapia cromoterapia e outras técnicas de relaxamento também são indicadas terAPiA FArmAColóGiCA Benzodiazepínicos É o grupo de escolha para o tratamento do TAG Os benzodiazepínicos BZDs pos suem boa absorção oral e atingem concentração plasmática máxima em 1 hora com forte ligação proteica e alta solubilidade lipídica Os seus efeitos principais são exercidos no SNC com redução da ansiedade sedação e indução de sono Os seus principais efeitos colaterais são sonolência confusão amnésia e déficit de coordenação motora acentua dos nos idosos Preconizase que o seu uso deva ser iniciado com a menor dose que promova alívio da ansiedade e uso de doses fracionadas diminuem a ocorrência de efeitos colaterais O diazepam por possuir meiavida mais longa é considerado uma droga mais fácil de ser retirada Quadro 7 BZD Equivalência com 5 mg de diazepam Dose média ansiedade Dose geriátrica Alprazolam 05 12 02505 Clordiazepóxido 10 1575 530 Clonazepam 025 0515 0251 Clorazepato 75 15675 1560 Cloxazolam 1 28 28 Lorazepam 1 26 0515 Oxazepam 15 3060 1030 BZD benzodiazepínico Buspirona É um composto ansiolítico do grupo das azapironas diferindo dos BZDs por não apre sentar efeitos miorrelaxantes anticonvulsivantes ou hipnóticos É agonista parcial de receptores serotoninérgicos Possui boa absorção oral sendo metabolizado pelo fígado Uma característica interessante dessa classe é que não provoca sintomas de abstinência na retirada e não possui efeitos colaterais graves podendose usar por longo prazo Os efeitos adversos mais comuns são cefaleia fadiga náuseas insônia e tontura A dose ini cial é de 15 mg divididos em três doses com dose máxima de 30 a 40 mgdia A buspirona é indicada quando não se consegue efeito desejado com os BZDs especialmente quando há necessidade de uso por longo tempo 151 Antidepressivos Os fármacos antidepressivos podem ser usados para controle do TAG principal mente quando os BZDs são necessários por longo prazo eou não apresentam resposta satisfatória7 O grupo de escolha é o dos ISRSs podem ser usadas em segunda escolha venlafaxina ou imipramina ver doses em IRNS IRDN e ISRS É importante ressaltar que o efeito terapêutico somente se inicia a partir do 10º dia com ação plena após quatro semanas Transtorno de pânico O transtorno de pânico TP caracterizase pela ocorrência de repetidos ataques de ansiedade conhecidos como crises de pânico Se o paciente encontrase sob Cuidados Paliativos a morte representa o alvo fixo e nessas crises experimentase a sensação de morte iminente sendo em geral uma vivência bastante traumática trAtAmento A psicoterapia está inserida na esfera da TCC A acupuntura possui técnicas bem estabelecidas para redução dos sintomas de ansiedade com bloqueio de pontos es pecíficos Tratamento farmacológico Antidepressivos Os ISRSs são os fármacos de primeira escolha no tratamento do TP Preconizase iniciar com dose mínima e fazer aumento gradual após a primeira semana de tratamento ver doses em IRNS Os ADTs são drogas de segunda linha e têm seu uso limitado em idosos contraindicação relativa e contraindicação para pacientes portadores de doença cardiovascular DCV Benzodiazepínicos Os BZDs mais recomendados no tratamento do TP são alprazolam dose inicial de 025 a 05 mg três vezes ao dia com dose máxima de 6 mgdia e clonazepam dose inicial de 025 a 05 mg duas vezes ao dia com dose máxima de 6 mgdia Fobia social A fobia social se caracteriza pelo desenvolvimento de ansiedade exagerada em situações com exposição pessoal Geralmente o paciente sob Cuidados Paliativos tem importante alteração da imagem corporal decorrente de acentuada perda ponderal alo pecia limitação de movimentos e alterações de pele Essas mudanças físicas causam redução da autoestima deixando o paciente vulnerável e extremamente ansioso pela exposição e análise alheia trAtAmento A psicoterapia é importante instrumento para o tratamento Em geral é recomendada TCC porém a definição fica a critério da psicóloga responsável A acupuntura possui técnicas bem estabelecidas para redução dos sintomas de ansie dade com bloqueio de pontos específicos 152 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Tratamento farmacológico Betabloqueadores propranolol com dose de 20 a 80 mgdia ou atenolol com 50 a 100 mgdia antidepressivos a indicação de primeira linha são os ISRS com destaque para citalo pram 20 a 80 mgdia fluoxetina 5 a 80 mgdia paroxetina 20 a 80 mgdia sertralina 50 a 150 mgdia O tratamento de manutenção deve ser mantido entre seis a 12 meses após melhora dos sintomas mas em casos de evolução para terminalidade e piora da imagem corporal e das atividades gerais a descontinuação pode não se fazer necessária Em fase interme diária havendo resposta a descontinuação deve ser gradativa em quatro semanas para evitar efeitos colaterais e recidivas A psicoterapia deverá ser mantida Referências 1 BABYAK M J et al Exercise treatment for major depression maintenance of therapeutic benefit at 10 months Psychosom Med v 62 n 5 p 6338 2000 2 BERTON O NESTLER E J New approaches to antidepressant drug discovery beyond monoamines Nat Rev Neurosci v 7 n 2 p 13751 2006 3 BULL S A et al Discontinuation of use and switching of antidepressants influence of patient physician communication Jama v 288 n 11 p 14039 2002 4 CIPRIANI A et al Comparative efficacy and acceptability of 12 newgeneration antidepressants a multipletreatments metaanalysis Lancet v 373 n 9665 p 74658 2009 5 DOBSCHA S K et al 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diagnóstico de caquexia Critério maior Perda de 5 do peso em um ano ou em período mais curto ou IMC 20 kgm2 excluindose edema Critérios menores ao menos três devem estar presentes Anorexia Astenia Baixa força muscular Baixa massa magra Alterações bioquímicas ao menos uma Elevação de marcadores inflamatórios PCR IL6 Anemia Hipoalbuminemia IMC índice de massa corporal PCR proteína C reativa IL6 interleucina 6 Epidemiologia Estimase que a caquexia esteja presente em cerca de 2 da população geral62 Em pacientes com câncer sua prevalência é de aproximadamente 80 aparecendo mais frequentemente nos estágios avançados da doença39 Cerca de 30 dos pacientes com AIDS apresentam caquexia47 embora esta frequência seja bem maior naqueles sem aces so à terapia antirretroviral chegando a níveis semelhantes aos dos com câncer avan çado9 Cerca de 30 dos indivíduos com doença pulmonar obstrutiva crônica DPOC 155 Quadro 2 Fatores agravantes da caquexia Caquexia secundária Má nutrição Redução da ingesta oral estomatites alterações do paladar xerostomia que pode ser resultado de desidratação obstipação intestinal importante obstrução intestinal disfunção autonômica vômitos frequentes sintomas de elevada intensidade como dor dispneia depressão delirium e restrições financeiras Diminuição da capacidade de absorção intestinal síndrome disabsortiva insuficiência pancreática ou diarreia grave Perda ou sequestro proteico ascitederrame pleural com repetidas drenagens síndrome nefrótica Perda de massa muscular por outras causas Inatividade prolongada deficiência de GH hipogonadismo ou mesmo sarcopenia típica do envelhecimento Outros estados hipercatabólicos infecções hipertireoidismo insuficiência hepáticacirrose diabetes mellitus com mau controle ICC ou insuficiência renal GH hormônio do crescimento ICC insuficiência cardíaca congestiva apresentam caquexia sendo ainda maior tal porcentagem naqueles com apresentações mais graves da doença34 52 Pacientes portadores de insuficiência renal crônica também estão sujeitos à ocorrência de caquexia aproximadamente 5040 Insuficiência cardíaca crônica também é causa de caquexia embora sua prevalência ainda seja incerta estima se algo em torno de 15 a 301 2 A síndrome da caquexia é considerada fator de mau prognóstico em todas as doenças descritas1 2 22 29 52 e é associada a pior qualidade de vida23 26 28 30 32 Mecanismo e classificação A caquexia pode ser classificada quanto a sua etiologia em primária ou secundária A caquexia primária é aquela que ocorre como resultado da descompensação metabólica causada pela doença de base Seus mecanismos vêm sendo continuadamente pesquisa dos e o estudo das suas minúcias não faz parte do escopo desta obra Em linhas gerais estão envolvidos na gênese da caquexia primária aumento da atividade inflamatória e da resistência insulínica anorexia hipogonadismo e anemia20 A secundária engloba os fatores agravantes da caquexia primária como má nutrição seja por redução da ingesta oral da capacidade de absorção intestinal ou por perda sequestro proteico perda de massa muscular por outras causas ou outros estados hi percatabólicos Quadro 2 As causas de caquexia secundária podem estar relacionadas com os tratamentos das doenças de base como antineoplásicos antirretrovirais e anti bióticos60 156 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Diagnóstico Clínico Valores de peso tanto o prémórbido quanto outros anteriores à consulta devem ser obtidos pois serão fundamentais na determinação da proporção de peso perdido Deve se dar preferência aos dados de prontuário mas é aceitável utilizar os reportados pelo paciente eou cuidador bem informado quando da inexistência de dados registrados Mediante detalhada história clínica aspectos nutricionais como preferências e hábitos alimentares devem ser explorados Mudanças de hábitos alimentares devem ser identificadas desde o início da doença e quando possível diários alimentares devem ser obtidos de alguns dias ou apenas do dia anterior ao da consulta O ob jetivo desses métodos é estimar a ingesta calórica e com isso determinar se existe déficit energético A anorexia é parte frequentemente integrante mas não obrigatória da síndrome da caquexia De fato na maioria das vezes a caquexia predata o surgimento de alterações do apetite14 Este fato não reduz a importância do correto diagnóstico das alterações de apetite que deve ser realizado de forma sistemática por meio de escalas numéricas ou visuais como o Edmonton Symptom Assessment System pelo qual se solicita ao paciente que gradue o seu apetite em uma escala de 0 a 10 onde 0 está ancorado a o melhor ape tite e 10 a o pior apetite possível5 11 A impressão do paciente sobre a evolução do seu apetite se pior desde o início da doença ou desde o último contato com a equipe ou desde o início de uma terapia por exemplo também fornece dados aceitáveis sobre problemas nesta área37 38 Sintomas do trato digestório como náuseas e vômitos e complicações orais devem ser explorados durante a anamnese É necessário questionar ativamente sobre a saciedade precoce que é causa comum de anorexia e fator associado à gênese da caquexia As alterações do paladar são frequentes e devem ser também investigadas O exame físico da cavidade oral deve ser completo em busca de mucosites estomatites infecções lesões ou quaisquer outras alterações que possam dificultar a alimentação A astenia que pode ser definida como uma redução na capacidade de realizar ativida des físicas ou psicológicas55 pode fazer parte da síndrome da caquexia e seu diagnóstico é clínico por excelência A anamnese orientada para o diagnóstico da astenia deve obriga toriamente explorar a presença de uma sensação generalizada de fraqueza que resulte na inabilidade de iniciar atividades cansaço precoce associado a dificuldade de manter efi cazmente certas atividades e fadiga mental que pode incluir dificuldade de concentração perda de memória e labilidade emocional10 51 Como a astenia cada vez mais as alterações de força muscular vêm sendo descritas como partes integrantes da síndrome da caquexia59 Sua avaliação portanto fazse ne cessária e pode ser realizada por medidas padronizadas como a dinamometria ou pela avaliação subjetiva da força muscular ao exame físico Alimentação apetite e aparência física são extremamente relacionados com emo ções A avaliação psicossocial do paciente sob risco de caquexia é fundamental Diversos problemas familiares costumam aparecer em conjunto com a caquexia geralmente com base na associação quase automática entre o aspecto físico caquético e a proximidade da morte ou em questões relacionadas com a alimentação Portanto uma avaliação abran gente do estado psicológico do paciente bem como dos familiares e cuidadores quando possível pode ser útil para o manejo do caso 157 Antropométrico Evidentemente peso e altura devem ser determinados em todos os encontros com o paciente Recomendase também registrar dados sobre a presença de edema membros inferiores ou ascite por exemplo no mesmo formulário onde será registrado o peso Para o diagnóstico e o acompanhamento da evolução da caquexia devese utilizar a proporção de peso perdido e não medidas individuais de peso que são pouco informativas A determinação da massa magra é significativamente importante no diagnóstico da caquexia Esse dado pode ser facilmente obtido subtraindose do peso total a massa adiposa determinada com o uso de medidas de pregas cutâneas36 Entretanto como a maioria das tabelas de conversão disponíveis é baseada em indivíduos saudáveis o uso das pregas cutâ neas pode não ser o ideal em pacientes severamente doentes Idealmente a massa magra deve ser determinada quando possível por bioimpedância ou métodos de imagem13 54 Laboratorial Ao menos hemoglobina albumina sérica e proteína C reativa PCR devem ser avalia das em pacientes sob risco de caquexia pois podem auxiliar na determinação do plano terapêutico Outras avaliações laboratoriais podem ser necessárias em casos específicos especialmente relacionados com as causas secundárias de caquexia como a dosagem do zinco sérico em pacientes com alterações de paladar da testosterona naqueles com suspeita de hipogonadismo e do hormônio tireoestimulante TSH nos com suspeição de alterações tireoidianas entre outras Conduta Não existe até o momento tratamento comprovadamente capaz de reverter a ca quexia primária Diferentes combinações terapêuticas tendo como alvo os diversos me canismos concomitantes causadores da síndrome vêm sendo estudadas visto que já foi identificada a necessidade de tratamentos abrangentes17 21 58 O primeiro passo para o adequado manejo da síndrome da caquexia é a boa comuni cação com o paciente e seus familiares É comum a interpretação da caquexia como um sinal de morte iminente por falta de alimentação causa de grande sofrimento psicológico em todos os envolvidos41 A comunicação franca combinada com o suporte psicossocial deve permitir que paciente e família realizem a transição do conceito comum de morte por fome para o entendimento do real quadro de desequilíbrio metabólico geralmente irreversível envolvido na caquexia O ato de alimentarse é uma atividade social per se portanto nos casos em que o paciente consegue alimentarse mesmo tendo pouco apeti te ou saciedade precoce o aconselhamento é importante para manter essa atividade du rante o maior tempo possível Orientações gerais como evitar odores durante a elaboração das comidas uso de condimentos de acordo com a preferência do paciente redução do tamanho das porções e realização de refeições mais frequentes podem melhorar o aporte nutricional mas infelizmente não parecem influenciar os sintomas ou a sobrevida49 O tratamento deve ser orientado para as causas secundárias de caquexia que são em sua grande maioria reversíveis ou controláveis Sintomas gastrointestinais e da cavidade oral devem ser tratados de maneira sistemática e intensiva Alterações do paladar se relacionadas com deficiência comprovada de zinco podem ser tratadas com a reposição deste mineral64 25 mg via oral VO três vezes ao dia durante as refeições por cerca 158 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP de três a quatro semanas Xerostomia na ausência de desidratação pode ser prevenida evitandose cítricos álcool e cafeína e tratada com preparações de saliva artificial como carboximetilcelulose ou carmelose A saciedade precoce pode ser tratada com o uso de procinéticos cerca de 30 minutos antes das refeições metoclopramida 10 mg VO três a quatro vezes ao dia Outros sintomas associados como depressão ou delirium devem ser tratados adequadamente Agentes estimulantes do apetite têm seu uso sustentado por sólidas evidências cien tíficas O uso de progestógenos acetato de megestrol VO iniciando com 160 mgdia e progredindo de acordo com a resposta clínica até doses ao redor de 480800 mgdia ou medroxiprogesterona iniciando com 1 gdia até cerca de 5 gdia também de acordo com a progressão da resposta clínica é recomendado pois permite rápida melhora do apetite da fadiga e do bemestar geral4 37 56 Os efeitos colaterais do uso de progestógenos são hipertensão hiperglicemia retenção hídrica hipogonadismo e trombose Seu uso está for malmente contraindicado a pacientes com histórico de trombose venosa profunda ou trom boembolismo pulmonar devendose realizar o monitoramento dos níveis de testosterona Corticosteroides também podem ser utilizados pelo seu efeito estimulador do apetite7 43 18 66 mas seu uso é restrito a poucas semanas devido aos riscos associados a sua utilização prolongada dexametasona 4 mg VO uma vez ao dia pela manhã por exemplo O suporte nutricional está indicado a pacientes com caquexia causada por obstruções do trato digestório ou por impedimentos à alimentação como graves sequelas neuroló gicas grandes tumores de cabeça e pescoço ou mucosites graves por exemplo O uso de nutrição enteral ou parenteral em pacientes com caquexia por outras causas é contro verso e geralmente contraindicado Em pacientes com câncer e caquexia seu uso não é associado a resposta clínica relevante33 42 A administração de talidomida em baixas doses 100 mgdia VO gerou melhoras significativas no apetite nas náuseas e na sensação de bemestar geral depois de 10 dias de uso em pacientes com câncer avançado e caquexia6 Um estudo posterior utilizando 200 mgdia por seis meses comprovou a tolerabilidade da droga e a sua eficácia como estabilizadora do peso e da massa magra entretanto as melhoras sintomáticas não foram reproduzidas25 Pacientes com AIDS e caquexia também foram estudados para o trata mento com talidomida com resultados semelhantes31 O uso de testosterona ou derivados oxandrolona nandrolona parece ser eficaz para o aumento de massa magra em pacientes com AIDS e DPOC que apresentam caquexia e sua utilização pode ser recomendada a essas populações44 48 53 67 O uso do hormônio de crescimento GH recombinante para o tratamento de caque xia já se mostrou eficaz em pacientes com AIDS e caquexia24 61 entretanto seu custo é geralmente proibitivo O ácido eicosapentaenoico EPA óleo de peixe apresentou resultados preliminares promissores que não foram completamente comprovados em estudos posteriores em pa cientes com câncer avançado8 19 27 65 Entretanto efeitos positivos sobre a qualidade de vida e o apetite estão comprovados nesses pacientes12 Alguns psicotrópicos podem ter efeito indireto sobre a caquexia seja no tratamento de quadros depressivos que podem levar à anorexia seja pelo efeito orexígeno direto antidepressivos tricíclicos ou ainda pelo efeito sobre outros sintomas como as náuseas mirtazapina e olanzapina15 159 Potenciais futuros tratamentos A melatonina vem sendo estudada como um agente anticaquexia porém nos estudos realizados até hoje apenas um efeito estabilizador do peso foi notado35 50 Novos estudos com desenho aprimorado estão em andamento O hormônio liberador do hormônio de crescimento GHRH o peptídeo grelina vem sendo testado em pacientes com caquexia associada a insuficiência cardíaca ou DPOC45 46 Em pacientes com câncer um estudo recente comprovou sua segurança e tolerabilidade gerando expectativas quanto ao potencial surgimento de uma nova modalidade terapêu tica para a caquexia57 Anticorpos monoclonais contra interleucina6 IL6 vêm sendo estudados para o tra tamento de câncer e apresentaram efeito anticaquexia Teoricamente a inibição desse importante fator da cascata inflamatória tem potencial para ser o primeiro tratamento eficaz para a caquexia primária63 68 Referências 1 ANKER S D et al Prognostic importance of weight loss in chronic heart failure and the effect of treatment with angiotensinconvertingenzyme inhibitors an observational study Lancet v 361 n 9363 p 107783 2003 2 ANKER S D et al Wasting as independent risk factor for mortality in chronic heart failure Lancet v 349 n 9058 p 10503 1997 3 BILLINGSLEY K ALEXANDER H The pathophysiology of cachexia in advanced cancer and AIDS In BRUERA E HIGGINSON I eds Cachexiaanorexia in cancer patients New York Oxford 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150719 2004 30 KALANTARZADEH K et al Associations of body fat and its changes over time with quality of life and prospective mortality in hemodialysis patients Am J Clin Nutr v 83 n 2 p 20210 2006 31 KAPLAN G et al Thalidomide for the treatment of AIDSassociated wasting AIDS Res Hum Retroviruses v 16 n 14 p 134555 2000 32 KATSURA H YAMADA K KIDA K Both generic and disease specific healthrelated quality of life are deteriorated in patients with underweight COPD Respir Med v 99 n 5 p 62430 2005 33 KLEIN S KORETZ R L Nutrition support in patients with cancer what do the data really show Nutr Clin Pract v 9 n 3 p 91100 1994 34 KOEHLER F et al Anorexia in chronic obstructive pulmonary disease association to cachexia and hormonal derangement Int J Cardiol v 119 n 1 p 839 2007 35 LISSONI P Is there a role for melatonin in supportive care Support Care Cancer v 10 n 2 p 1106 2002 36 LOHMAN T G Skinfolds and body density and their relation to body fatness a review Hum Biol v 53 n 2 p 181225 1981 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preterminal gastrointestinal cancer Cancer v 33 n 6 p 16079 1974 44 MULLIGAN K SCHAMBELAN M Anabolic treatment with GH IGFI or anabolic steroids in patients with HIVassociated wasting Int J Cardiol v 85 n 1 p 1519 2002 161 45 NAGAYA N et al Treatment of cachexia with ghrelin in patients with COPD Chest v 128 n 3 p 1187 93 2005 46 NAGAYA N KOJIMA M KANGAWA K Ghrelin a novel growth hormonereleasing peptide in the treatment of cardiopulmonaryassociated cachexia Intern Med v 45 n 3 p 12734 2006 47 NAHLEN B L et al HIV wasting syndrome in the United States AIDS v 7 n 2 p 1838 1993 48 ORR R FIATARONE SINGH M The anabolic androgenic steroid oxandrolone in the treatment of wasting and catabolic disorders review of efficacy and safety Drugs v 64 n 7 p 72550 2004 49 OVESEN L et al Effect of dietary counseling on food intake body weight response rate survival and quality of life in cancer patients undergoing chemotherapy a prospective randomized study J Clin Oncol 11 n 10 p 20439 1993 50 PERSSON 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68 ZAKI M H NEMETH J A TRIKHA M CNTO 328 a monoclonal antibody to IL6 inhibits human tumor induced cachexia in nude mice Int J Cancer v 111 n 4 p 5925 2004 162 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Cuidados Paliativos nas demências ClAudiA burlá dAniel limA Azevedo Conceito Demência é um prejuízo adquirido e permanente da capacidade intelectual que afeta pelo menos três das cinco áreas da cognição memória linguagem capacidade visuoespacial emoção e personalidade As principais causas de demência são a doença de Alzheimer 60 a 70 dos casos e as demências vascular por corpos de Lewy e frontotemporal O risco de uma pessoa ser portadora de demência dobra a cada cinco anos a partir dos 60 anos de idade de modo que estimase aproximadamente 50 das pessoas com 85 anos apresentem algum tipo de demên cia Esse percentual alarmante aliado ao atual envelhecimento populacional torna premente a discussão dos Cuidados Paliativos nas demências uma vez que o número de pessoas dementadas crescerá exponencialmente nas próximas décadas5 Este capítulo toma como base a doença de Alzheimer para discutir a abordagem paliativa nas demências Diagnóstico clínico Conforme o texto revisado da quarta revisão do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSMIVTR a doença de Alzheimer é definida por múltiplos déficits cognitivos Para o diagnóstico da doença de Alzheimer além da memória que obrigatoria mente tem que estar comprometida deve estar presente pelo menos uma das seguintes alte rações afasia distúrbio da linguagem apraxia distúrbio da execução agnosia incapacidade para identificar objetos e disfunção executiva incapacidade de planejamento e pensamento abstrato As alterações são graves e causam prejuízo do funcionamento ocupacional e social de uma pessoa que anteriormente era capaz de desempenhar adequadamente suas funções O diagnóstico depende da anamnese e as informações prestadas por cuidadores ou familiares do paciente são vitais uma vez que este geralmente já apresenta dificuldade para reconhecer suas próprias limitações Após anamnese exame físico e avaliação cognitiva exames labora toriais ajudam a descartar causas potencialmente reversíveis de demência como hipotireoi dismo e hipovitaminose B12 e métodos de imagem cerebral contribuem para a exclusão de outras causas como hematoma subdural tumor ou hidrocefalia A doença de Alzheimer é progressiva e incurável Seu curso previsível assim como o de outras doenças crônicas faz com que ela seja um modelo ideal para a aplicação de Cuidados Paliativos Afinal ao longo de sua evolução o profissional tem a oportunidade de conhecer bem a pessoa portadora da doença estreitar os laços com a família e discutir antecipadamente os cuidados que serão adotados Fases evolutivas da demência pela doença de Alzheimer A evolução da doença de Alzheimer pode ser dividida em fases ao longo das quais aumenta a dependência do paciente 163 A fase inicial que dura de dois a quatro anos caracterizase por dificuldade de adap tação a novas situações e confusão espacial Durante a fase intermediária que pode durar de dois a 10 anos costumam surgir agitação insônia prejuízos mais graves de lingua gem incontinência e dificuldades de alimentação A capacidade funcional do paciente encontrase francamente prejudicada e ele passa a depender cada vez mais do auxílio dos cuidadores para executar até mesmo as tarefas mais simples como tomar banho e comer Já a fase final que dura de um a três anos caracterizase por mutismo disfagia desnutrição e imobilidade Podem surgir ulcerações na pele em decorrência da pressão prolongada do corpo sobre uma superfície É comum o paciente aspirar comida ou saliva para as vias respiratórias e desenvolver pneumonia A morte acontece na maioria dos casos por infecção respiratória Na fase avançada da demência a comunicação verbal é precária há dependência funcional para as atividades da vida diária a alimentação pela via oral está comprometida há perda de peso existe risco de broncoaspiração há infecções incontinências urinária e fecal estão presentes Uma dificuldade na prática clínica diária é definir o prognóstico de uma demência o que tem relação com a clássica pergunta dos familiares quanto tempo de vida ainda resta ao paciente É possível estimar que a expectativa de vida seja inferior a seis meses quando um paciente preenche todos os critérios de demência avançada pela Escala de Avaliação Funcional FAST e apresenta pelo menos uma complicação clínica conforme o Quadro baseado nas diretrizes da National Hospice and Palliative Care Organization NHPCO6 8 Quadro Critérios de elegibilidade para Cuidados Paliativos na demência FAST Incapaz de caminhar vestirse e tomar banho sem ajuda Incontinência urinária ou fecal intermitente ou constante Ausência de comunicação verbal significativa capacidade de fala limitada Presença de complicações clínicas Pneumonia por aspiração Pielonefrite ou outras infecções do trato urinário superior Sepse Múltiplas úlceras por pressão Febre recorrente após antibioticoterapia Incapacidade de manter ingesta líquida e calórica suficiente Perda de 10 do peso nos seis meses anteriores Nível de albumina sérica inferior a 25 gdl 164 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Modalidades de intervenção Uma equipe interdisciplinar é essencial nos cuidados a um paciente portador de doença de Alzheimer Médico enfermeiro fisioterapeuta fonoaudiólogo nutricionista psicólogo terapeuta ocupacional assistente social e odontólogo precisam trabalhar em conjunto e falar a mesma linguagem para atingir os objetivos do cuidado identificar e tratar as intercorrências clínicas reconhecer os distúrbios de comportamento otimizar a utilização de fármacos conservar o estado nutricional e a mobilidade oferecer apoio psicológico ao paciente e à família e maximizar e manter o funcionamento do paciente Controle dos sintomas As intercorrências clínicas devem ser avaliadas de maneira minuciosa uma vez que assumem manifestações atípicas em pacientes idosos com demência O que costuma ocorrer no caso de uma pneumonia aguda é taquipneia com piora da confusão mental e da capacidade funcional ao invés do quadro clássico de febre com tosse produtiva e dispneia Da mesma forma o delirium tem que ser avaliado com rapidez pois é um quadro de urgência multifatorial podendo ter como causas infecção dor constipação distúrbio eletrolítico e efeito colateral de medicação entre outras Quedas também são um sinal de alerta cujas causas que vão desde calçados inadequados e privação sensorial até infecções e hipotensão ortostática induzida por fármacos precisam ser pesquisadas à exaustão O trabalho do profissional que lida com demência lembra o de um detetive pois ele muitas vezes já não conta com informações claras prestadas pelo paciente e precisa se basear em pistas da história e do exame físico rigoroso para elucidar o diagnóstico Talvez o maior desafio nessa situação seja o diagnóstico da causa de dor em paciente com demência com grave prejuízo da linguagem quando é fundamental observar o que provoca a fácies de dor para tentar solucionar o problema Transtorno do humor e distúrbio do comportamento são frequentes ao longo da evo lução de uma demência e costumam causar sobrecarga para o cuidador quando não adequadamente tratados Os transtornos mais frequentes são apatia depressão agitação agressividade e delírios Apresentam curso flutuante com períodos de franca exacerba ção O tratamento deve sempre começar pelas medidas nãofarmacológicas A adoção de rotinas e de um programa de exercícios contribui para reduzir a inquietude e a peram bulação O paciente com demência deve ser integrado às atividades da casa evitandose o isolamento e a privação de estímulos Além disso devese procurar reorientálo para a realidade por meio de relógios calendários e fotos Quando se identifica uma causa de agitação a mesma precisa ser evitada Nos casos em que essas medidas não são suficientes para tratar o distúrbio é neces sário empregar fármacos de maneira cuidadosa começando com a menor dose possível e aumentandoa gradativamente Os anticolinesterásicos representam uma categoria inte ressante de medicamentos cujo maior benefício parece ser justamente sobre os transtor nos de comportamento Além disso podem induzir também pequenos ganhos cognitivos ou funcionais quando utilizados na fase inicial ou moderada da doença de Alzheimer Para uso enteral estão disponíveis donepezil galantamina e rivastigmina os quais podem in duzir efeitos gastrointestinais indesejáveis náusea vômitos diarreia que geralmente são transitórios mas que em alguns casos ocorrem de forma persistente ou intensa obrigan 165 do a suspensão do tratamento A rivastigmina também pode ser usada por via transdér mica uma alternativa interessante que reduz a incidência dos efeitos colaterais Quanto aos antipsicóticos devese dar preferência aos atípicos como risperidona quetiapina e olanzapina que induzem menos efeitos colaterais São fármacos com risco de aumento da mortalidade por eventos cerebrovasculares4 e portanto devem ser empregados por períodos curtos com reavaliação frequente de sua indicação A dose inicial recomendada é sempre a menor possível por exemplo 025 mgdia de risperidona com aumento pro gressivo a cada cinco ou sete dias Já os antidepressivos como citalopram ou trazodona costumam ser úteis no tratamento de transtornos de humor agitação ou insônia3 Em suma o que se observa é que existe uma ampla gama de alternativas farmacológicas para abordagem desses transtornos O médico deve tomar o cuidado de conhecer a fundo a farmacologia os efeitos colaterais e as interações medicamentosas de cada um desses medicamentos antes de incorporálos ao seu arsenal terapêutico É fundamental manter a função intestinal uma vez que constipação pode ser causa de grande desconforto e agitação Para tanto podem ser usados laxativos por via oral ou retal Um ponto que não pode ser negligenciado é o cuidado com a integridade da pele Úlceras por pressão e lesões por umidade são causas evitáveis de intenso desconforto Deve ser usado colchão viscoelástico ou de pressão alternante associado a loção de áci dos graxos essenciais Fraldas descartáveis precisam ser trocadas sempre que estiverem úmidas e o lençol do colchão deve estar esticado ao máximo para evitar cisalhamento Existe uma tendência natural dos cuidadores a auxiliar o paciente na execução de tarefas seja por receio de que ele não consiga concluílas ou para acelerar a prestação de cuidados Por exemplo um paciente pode ter dificuldade em vestir uma roupa ou se levantar e o cuidador instintivamente toma a iniciativa e passa a vestilo ou a estender os braços para apoiálo no momento de sair de uma cadeira para caminhar Essa postura de desamparo induzido deve ser evitada pois leva a dependência precoce7 Um dos papéis do cuidador é estimular a independência do paciente dementado Para isso ele deve gentilmente insistir para que o paciente execute as tarefas sozinho oferecendo auxílio somente quando solicitado ou em situação de real necessidade A iluminação dos ambientes deve ser adequada com especial cuidado para a noturna a fim de reduzir a incidência de quedas Barras de segurança em corredores e no banheiro ajudam a manter a independência A morte na maioria das vezes acontece em decorrência de infecções pneumonia infecção urinária ou originada em úlcera por pressão ou por incapacidade de manter ingesta hídrica ou calórica compatível com a vida Os profissionais precisam concentrar esforços para tornar o ambiente mais acolhedor o que pode ser feito com música e inter venção religiosa se conveniente Alimentação na fase final A manutenção do estado nutricional constitui grande desafio uma vez que vários fatores interferem na aceitação da dieta e o paciente dementado em sua fase final tor nase intensamente catabólico Devese ter cuidado ao prescrever fármacos anorexígenos como fluoxetina contraindicada para pacientes idosos e portanto não devendo ser uti lizada e digoxina ou anticolinérgicos amitriptilina por exemplo que são contraindi cados a idosos dementados Próteses dentárias bem adaptadas favorecem a alimentação 166 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP adequada A consistência e o teor dos alimentos variam conforme a aceitação do paciente e a presença de dificuldade de mastigação ou deglutição É indicada a introdução precoce do acompanhamento fonoaudiológico para controle de disfagia e redução do risco de broncoaspiração Já o acompanhamento fisioterápico contribui para retardar a instalação de imobilidade e preservar a independência além de assumir especial relevância na fase avançada de doença quando evita anquiloses e otimiza a dinâmica respiratória preve nindo atelectasias O que fazer diante da recusa alimentar da fase final de demência A decisão de iniciar alimentação artificial é uma das mais difíceis para familiares e profissionais Disfagia anorexia progressiva e a consequente sarcopenia fazem parte da evolução habitual da doença e não devem ser encaradas como intercorrências que precisam ser revertidas Parar de comer é uma das mais tranquilas e confortáveis formas de morrer1 A família precisa estar devidamente orientada sobre isso Embora a confecção de gastrostomia por via endoscópica tenha se tornado comum em função da relativa facilidade técnica do procedimento existem evidências recentes de que a gastrostomia não aumenta a sobre vida não melhora as condições de nutrição nem a imunidade e não previne broncoaspi ração de secreção bucal2 Além disso a gastrostomia pode ser fonte de desconforto e de infecções cutâneas Por essa razão é razoável respeitar a recusa alimentar do paciente com demência avançada que deve ditar a quantidade e o horário do alimento que deseja receber Não existe restrição dietética permitese que ele consuma seus alimentos prefe ridos e à vontade A mucosa oral tende a se ressecar pela recusa de líquidos ou por efeito colateral de medicações e devese cuidar para que ela fique constantemente hidratada usandose gaze embebida em água ou gelo picado COMO ORIENTAR agenda diária rotina do paciente avaliação e intervenção ambiental evitar isolamento e falta de estimulação terapia de orientação para a realidade exercícios para diminuir a inquietude estímulo à formação de grupos serviços de apoio à família O QUE FAZER identificar e tratar intercorrências clínicas estimular o uso da via oral para alimentação reconhecer a caquexia da demência avançada otimizar a utilização de fármacos trabalhar em equipe interdisciplinar reconhecer os distúrbios do comportamento maximizar e manter o funcionamento 167 Comentários finais Todo caso de demência representa uma história de perdas com profundas reper cussões sobre a família que acompanha o declínio cognitivo social e motor de um ente querido Na fase final da doença a família lida com um paciente emagrecido restrito ao leito incapaz de se comunicar e com máxima dependência Sugerese a introdução ao longo do cuidado de suporte psicológico para permitir que a família trabalhe sua relação emocional e afetiva com o paciente que mantém sua iden tidade até o momento da morte Grupos de apoio voluntários ou vinculados a instituições costumam oferecer uma boa oportunidade para reunir e instruir familiares A fase final da doença é caracterizada por fragilidade declínio funcional e falência orgânica Nessa situação o paciente encontrase em situação irreversível ante qualquer terapêutica aplicada Diante do comprometimento de sua autonomia ou seja sua inca pacidade de tomar decisões a família e a equipe enfrentam dilemas éticos e precisam fixar bem o objetivo do tratamento O foco deve ser o cuidado da pessoa e não de um determinado órgão ou sistema que já se encontra em condição de falência evidente Nas palavras de Cicely Saunders lembrese de que uma pessoa é um ser integral física e espiritualmente e a atitude para com essa pessoa deve ser de respeito Cuidar de quem está morrendo é acima de tudo agir com respeito a essa pessoa Nesse momento exi gemse do profissional o máximo de competência técnica no controle dos sintomas e sensibilidade para uma comunicação efetiva com os familiares acolhendo suas dúvidas e os tranquilizando Acima de tudo diante da fragilidade máxima em que os pacientes se encontram o profissional tem o papel de protegêlos de iatrogenias Bons Cuidados Paliativos representam uma questão de saúde pública A demência pode ser uma doença previsível mas seu ritmo evolutivo não Com a expectativa de au mento da prevalência das demências ao longo das próximas décadas os profissionais da saúde devem estar preparados para lidar com os aspectos particulares da evolução dessas doenças reconhecendo a finitude e proporcionando aos pacientes um fechamento digno para suas histórias de vida Referências 1 BYOCK I Dying well peace and possibilities at the end of life Riverhead Books 1997 2 CERVO F A BRYAN L FARBER S Feeding tubes in patients with advanced dementia the decision making process Geriatrics v 61 p 305 2006 3 KALAPATAPU R K NEUGROSCHL J A Update on neuropsychiatric symptoms of dementia evaluation and management Geriatrics v 64 n 4 p 206 2009 4 KALAPATAPU R K SCHIMMING C Update on neuropsychiatric symptoms of dementia Antipsychotic use Geriatrics v 64 n 5 p 108 2009 5 OLSON E Dementia and neurodegenerative diseases In MORRISON R S MEIER D E eds Geriatric palliative care Oxford Oxford University Press 2003 p 16072 6 SCHONWETTER et al Predictors of sixmonth survival among patients with dementia an evaluation of hospice guidelines Am J Hosp Palliat Care v 20 p 10513 2003 7 SHERMAN F T Learned helplessness in the elderly Geriatrics v 64 n 2 p 67 2009 8 STUART B et al Hospice care a physicians guide Arlington National Hospice and Palliative Care Organization 1998 168 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Obstrução intestinal maligna môniCA CeCíliA boChetti mAnnA Introdução A obstrução intestinal maligna é uma complicação comum e aflitiva em pacientes com cânceres abdominal e pélvico Embora possa desenvolverse em qualquer momento da doença ocorre mais frequentemente em estágios avançados com a maior incidência variando de 55 a 42 no carcinoma de ovário e de 44 a 42 no câncer de colo retal Também é relatado em outros pacientes com outros cânceres avançados variando de 3 a 15 dos casos18 A obstrução intestinal pode estar presente como característica de malignidade intra abdominal ou de doença concomitante com a história da malignidade A etiologia pode ser em 10 a 48 dos casos de operações causada por aderências ou enterite actínica ou malignidade com sítio único múltiplo ou doença difusa18 Câncer primário recidiva após cirurgia quimioterapia e radioterapia doenças asso ciadas e carcinomatose difusa podem causar obstrução intestinal com diferentes meca nismos Tais fenômenos são frequentemente concomitantes18 O crescimento do tumor primário ou recorrências de massas abdominais fibroses ou aderências pode produzir oclusão extrínseca ou estreitamento do lúmen Lesões po lipoides ou estreitamentos devidos à disseminação podem causar oclusão intraluminal Infiltração da musculatura intestinal ou inflamações repetidas podem produzir oclusão intramural do lúmen Distúrbios da motilidade devidos à perturbação extrínseca neural de controle da víscera podem produzir retardo no trânsito intestinal resultando num quadro clínico semelhante à obstrução intestinal chamado de pseudoobstrução Doenças con comitantes como diabetes síndromes paraneoplásicas e cirurgia gástrica prévia podem contribuir para alterações da motilidade provocando tal quadro Um fator contribuinte para o quadro é a constipação por causa da doença eou de drogas como anticolinérgicos e opioides Dor devida à constipação induzida por opioide erroneamente tratada com aumento da dose do mesmo pode resultar em impactação fecal produzindo sinais de obstrução intestinal17 Fisiopatologia Uma oclusão do lúmen impede ou retarda a propulsão do conteúdo intestinal O acúmulo de secreções nãoabsorvíveis produz distensão e atividade cólica para superar o obstáculo em fases precoces correspondendo a uma fase subobstrutiva possivelmente ainda reversível Em bora exista pequeno ou nenhum movimento do conteúdo intestinal através do lúmen o intesti no continua a se contrair com aumento nãocoordenado da atividade peristáltica Como conse quência o intestino se torna distendido estimulando a secreção de fluidos intestinais criando assim um ciclo vicioso de distensãosecreção estirando mais a parede intestinal Figura Além disso na obstrução intestinal o anormal aumento da flora bacteriana pode também produzir gases no intestino delgado contribuindo para a distensão6 169 Esta fase dita hipertensiva produzirá danos no lúmen com consequente resposta in flamatória A resposta inflamatória envolve ativação das ciclooxigenases e liberação das prostaglandinas potentes secretagogos por efeito direto no enterócito ou por reflexo nervoso entérico6 Polipeptídeos intestinais vasoativos podem ser liberados na circula ção portal ou na periférica e mediarem as alterações fisiopatológicas locais e sistêmicas como hiperemia edema da parede intestinal e acúmulo de fluidos no lúmen graças a esses efeitos estimulantes13 14 Hipóxia causada pela redução da drenagem venosa desde o segmento obstruído é o estímulo primário para liberação dos polipeptídeos vasoativos intestinais assim como o aumento do crescimento bacteriano intraluminal Altos níveis portais de polipeptídeos vasoativos intestinais são conhecidos como causadores de hipersecreção e vasodilatação esplâncnica3 Estudos experimentais demonstraram que taxas maiores de polipeptídeos vasoativos intestinais estão presentes no conteúdo duodenal o que pode explicar achados de redistri buição do fluxo sanguíneo entre o segmento obstruído e o segmento distal à obstrução Alterações de autorregulação local e mecanismos de controle neurohumoral do flu xo esplâncnico são a base para o aparecimento da falência de múltiplos órgãos causada ou piorada pela hipotensão sistêmica comumente observada na fase final da obstrução intestinal15 Fluidos e eletrólitos são sequestrados na parede intestinal e em seu lúmen terceiro espaço na presença de vasodilatação contribuindo para hipotensão e sepse levando à falência de múltiplos órgãos causa da morte em pacientes com obstrução intestinal A fase de hipovolemia pode induzir a insuficiência renal devido ao decréscimo do fluxo renal e como consequência da filtração glomerular Oligúria azotemia e hemoconcentração podem acompanhar a desidratação Distúr bios metabólicos na obstrução intestinal dependem do sítio e da duração da obstrução e são causados por desidratação perdas de eletrólitos e distúrbios do equilíbrio ácido básico4 Alcalose metabólica hipocloremia e hipocalemia serão características de uma obstrução alta devido à perda prevalente de secreção gástrica Numa obstrução baixa ha verá deficiência de cloretos sódio potássio e bicarbonatos por causa da estase intestinal de secreções biliares pancreáticas intestinais e gástricas11 além de acidose devida às lesões isquêmicas ou complicações sépticas8 O aumento da distensão abdominal reduz o retorno venoso e pode prejudicar a ventilação pulmonar resultante da elevação do diafragma Sepse ocorrerá numa fase mais tardia da obstrução intestinal provavelmente como resultado da ação bacteriana Isso consiste na passagem de toxinas do conteúdo in testinal passando através da parede do intestino dentro dos linfáticos e da circulação sistêmica Esse fenômeno resulta em aumento da pressão endoluminal estase e isquemia intestinal junto com gangrena intestinal e perfuração comumente observados em fases tardias de uma obstrução intestinal persistente O tempo de curso desses eventos é variá vel ocorrendo ao longo de vários dias na obstrução intestinal maligna8 11 Causas O próprio tumor tratamentos anteriores como aderências e fibrose isquêmica pósradioterapia 170 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Obstrução intestinal parcial ou completa Redução ou parada de movimentos do conteúdo intestinal Aumento da contratilidade intestinal para superar o obstáculo Aumento da dor em cólica Aumento da distensão intestinal Aumento do conteúdo luminal Amento da área de superfície epitelial Aumento da secreção intestinal de H2O Na Cl Náuseas eou vômitos Danos ao epitélio intestinal Dor contínua Distensão Resposta inflamatória com edema hiperemia e produção de prostaglandinas e polipeptídeos intestinal vasoativo Figura Causas e sintomas na obstrução intestinal maligna modificado de Ripamonte e Mercadante17 medicamentos como por exemplo opioides antimuscarínicos debilidade associada por exemplo a obstipação um estado benigno não relacionado por exemplo hérnia estrangulada17 Características clínicas da obstrução intestinal Na obstrução intestinal aguda existe habitualmente uma lesão isolada enquanto na crônica persistente ou remitente pode haver diversos locais de obstrução parcial tanto no intestino delgado como no grosso A doença retroperitoneal pode originar neuropatia visceral e obstrução funcional Em consequência os quatro sintomas e sinais que apontam para o diagnóstico de obstrução intestinal aguda distensão abdominal dor vômitos e obstipação podem não ser tão óbvios na obstrução crônica no câncer avançado Por exemplo a distensão pode ser mínima devido a múltiplas aderências intraabdominais malignas Os sons intesti nais podem variar entre a ausência e serem hiperativos com borborigmos Os sons de tinitus nos intestinos são raros Alguns doentes sofrem mais de diarreia do que de obstipação17 18 Tratamento cirúrgico A intervenção cirúrgica é paliativa e estará contraindicada nas seguintes circunstâncias laparotomias anteriores afastam as possibilidades de êxito da intervenção carcinomatose intraabdominal difusa evidenciada por tumores intraabdominais di fusos palpáveis 171 ascite que volta a se acumular rapidamente após realização de paracentese Além disso perda de peso superior a 9 kg está associada a maus resultados pósopera tórios Devese considerar a intervenção cirúrgica se todos os seguintes critérios forem preen chidos existência de provável obstrução orgânica isolada e discreta como aderências pósope ratórias ou neoplasia isolada estado geral do paciente bom isto é se a doença não estiver muito disseminada se ele for independente e ativo e se a perda de peso for inferior a 9 kg desejo do doente de ser submetido à cirurgia12 16 O tratamento cirúrgico visa paliar os sintomas e dependerá do sítio e do tipo de obstrução podendo incluir desde um bypass como a enteroenteroanastomose ente roanastomose ou a criação de uma estomia para descompressão Não podemos esquecer que o tratamento cirúrgico pode causar complicações como infecção e deiscência de ferida operatória fístulas enterocutâneas abscessos peritoneais deiscência de anasto moses intestinais sangramentos gastrointestinais embolia pulmonar e trombose venosa profunda1 Tratamento clínico No caso de doentes aos quais a intervenção cirúrgica for contraindicada geralmente é possível aliviar os sintomas de maneira adequada com o uso de medicamentos A sonda nasogástrica e a hidratação intravenosa IV raramente são necessárias O tratamento se dirige primariamente ao alívio dos sintomas principalmente das náuseas e dos vômitos Para os pacientes sem cólicas e que ainda eliminam gases intes tinais um fármaco prócinético constitui a primeira escolha sendo a metoclopramida na dose de 60 a 240 mgdia por via subcutânea SC a primeira opção Aos pacientes que apresentam cólicas intensas indicando piora da obstrução que pode não ser mais parcial os medicamentos prócinéticos são contraindicados sendo recomendado o uso de substância antissecretória e antiespasmódica como o brometo de nbutilescopolami na na dose de 40 a 120 mgdia SC ou IV O glicopirrolato outro anticolinérgico muito utilizado em outros países não é habitualmente usado no Brasil Os laxantes expansores de volume osmóticos e estimulantes também devem ser suspensos e pode ser necessá rio proceder a uma série de mudanças de medicamentos durante vários dias até que se obtenha um resultado satisfatório Para a dor constante do câncer subjacente devese administrar regularmente um opiáceo Se o paciente estiver recebendo metoclopramida ou metilescopolamina por via parenteral o opiáceo também poderá ser dado por infusão SC contínua9 Podese dar um enema de fosfato se a obstipação for um fator causal provável e após prescrever um amolecedor das fezes como comprimidos de docusato de sódio 100 a 200 mg duas vezes ao dia Os corticosteroides podem ser úteis em pacientes com obstrução intestinal inoperá vel pela possível ação redutora do edema peritumoral promovendo o alívio dos sintomas A dose utilizada varia em torno de 8 a 20 mgdia SC4 Existe a possibilidade de administrar octreotide análogo sintético da somatostatina que possui efeito antissecretório em todo o trato alimentar porém é de alto custo e não 172 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP muito utilizado no Brasil Essa substância também pode ser dada por infusão SC contínua na dose de 02 a 09 mg24 h aumentando ocasionalmente A diminuição do conteúdo do estômago reduz a distensão e por isso a probabilidade de cólicas e vômitos5 10 Dado que o aumento da pressão intraluminal provoca a liberação de serotonina 5HT a partir das células enterocromafins da parede dos intestinos alguns doentes têm melhora com um antagonista dos receptores 5HT3 como ondasentrona tropisetrona e ganisetrona7 A gastrostomia raramente é necessária na obstrução crônica no câncer avançado Na verdade os pacientes tratados farmacologicamente devem ser aconselhados a ingerir os seus alimentos sólidos e líquidos preferidos em pequenas quantidades Alguns pacientes têm mais facilidade em se alimentar pela manhã Os fármacos antimuscarínicos e a dimi nuição da ingestão de líquidos provocam boca seca e sede Esses efeitos são geralmente aliviados por uma rigorosa higiene bucal Alguns mililitros de líquido de 30 em 30 minutos podem ser administrados sob a forma de cubos de gelo e muitas vezes bastam para resol ver a questão A hidratação IV raramente é necessária2 Considerações finais A presença da obstrução intestinal maligna de maneira geral costuma ser um sinal de doença progressiva É importante que sua fisiopatologia seja bem conhecida e compreendi da para que o tratamento cirúrgico ou clínico possa promover conforto para o paciente Referências 1 AABO K et al Surgical treatment of intestinal obstruction in the late course of malignant disease Acta Chirurgica Scandinavica v 150 p 1736 1984 2 ASHBY M et al Percutaneous gastrostomy as a venting procedure in palliative care Palliat Med v 5 p 3743 1991 3 BASSON M D Does vasoactive intestinal polypeptide mediate the pathophysiology of small bowell obstruction American Journal of Surgery v 157 p 10915 1989 4 CHAN A WOODDRUFF R K Intestinal obstruction in patients with widespread intraabdominal malignancy Journal of Pain and Symptom Management v 7 n 339 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therapy HAART houve grande mudança na história natural da doença nos países onde a terapia tem sido amplamente utilizada caracterizada principalmente por diminuição da letalidade em média 70 e da morbidade por doenças oportunistas6 28 e aumento das mortes nãorelacionadas com a doença oportunista acidose lática anafilaxia eutanásia sepse acidentes suicídio doença cardiovascular cânceres não oportunistas falência hepática 21 O curso clínico é bastante variável dependendo principalmente do uso ou não da HAART Naqueles que não a utilizam a doença cursa em geral um período de incubação médio de oito a 10 anos desde o momento de infecção até a doença clínica e apresenta sobrevida aproximada de seis a 18 meses Porém quando a utilização da terapia é correta a doença pode evoluir as sintomática durante longos anos com algumas intercorrências infecciosas potencialmente tratá veis até que haja uma doença grave ou falência à HAART podendo desencadear a morte AIDS e Cuidados Paliativos Mesmo com este panorama favorável alguns pontos necessitam ser considerados Sabe se que para uma eficácia plena da HAART é necessária a adesão de 95 em termos de dose e horário A maioria dos estudos demonstra que 40 a 60 dos pacientes aderem menos de 902 Ainda assim os que a utilizam corretamente podem desenvolver resistência ao longo do tempo ou padecer de vários efeitos colaterais da medicação como dor abdominal náu seas vômitos além de aumento da incidência de diabetes e dislipidemias com suas danosas consequências Isso os torna candidatos a Cuidados Paliativos Os Cuidados Paliativos em pacientes com HIVAIDS seguem a mesma filosofia que em qualquer doente ou seja abor dam os pacientes como um todo com todos os seus sofrimentos físicos psíquicos sociais e espirituais cuidam do cuidador e abordam os familiares enlutados Há porém algumas particularidades a serem consideradas em pacientes com AIDS e que podem ser responsáveis pelo aumento do seu sofrimento os pacientes em geral são mais jovens que os portadores de câncer a doença é multissistêmica com muitos diagnósticos simultâneos há necessidade de uso de vários medicamentos o paciente com AIDS em cuidados do miciliares faz uso em média de 33 comprimidos por dia20 175 ocorrem repentinas e dramáticas mudanças na condição clínica gerando dificuldade em identificar a fase terminal há grandes e dinâmicas mudanças nos padrões de tratamento exigindo atualização constante da equipe de saúde o paciente geralmente tem plena consciência a respeito da doença e do seu prognóstico há maior índice de sofrimento psíquico quando em comparação com pacientes com câncer22 há grande isolamento estigma e falta de compaixão da sociedade pelo paciente e sua família é comum a falta de estrutura e de suportes familiar e social pode haver múltiplas mor tes na família alto índice de luto complicado falta de experiência dos médicos em Cuidados Paliativos com esses pacientes Com tudo isso fazse necessário treinamento específico para lidar com Cuidados Paliativos nessa população Prognosticar pacientes com HIVAIDS na era HAART fatores de mau prognóstico Uma das grandes dificuldades dos médicos que cuidam desses doentes é prognosticá los corretamente decidir com segurança o momento de oferecerlhes Cuidados Paliativos exclusivos e discutir por exemplo a suspensão da HAART O que se verifica muitas vezes é que os doentes sofrem um processo longo de distanásia e grande parte morre em uso de HAART mesmo com falência documentada da mesma Essa dificuldade se dá principalmente por alguns motivos13 a AIDS é uma doença infecciosa potencialmente tratável tem períodos de melhora e piora muito rápidos com mudanças rápidas padrões de tratamento e consequentemente prognóstico existem poucos trabalhos científicos que subsidiem as decisões a população em geral é jovem o que pode favorecer a distanásia problemas sociais e psíquicos dificultam algumas decisões terapêuticas Uma das consequências disso é que os médicos que cuidam de pacientes com HIV AIDS são mais relutantes em encaminhálos aos Cuidados Paliativos17 Apesar dos avanços dos conhecimentos e terapia da doença e das dificuldades apon tadas anteriormente algumas situaçõesdoenças ainda são consideradas de mau prognós tico como podemos verificar no Quadro 17 Quadro 1 Situaçõesdoenças consideradas de mau prognóstico LEMP Sarcoma de Kaposi disseminado ou visceral grave Linfoma primário do SNC Demência avançada pelo HIV Doenças oportunistas refratárias ao tratamento disponível Outras doenças crônicas avançadas e progressivas nãorelacionadas com a AIDS como câncer doença de Alzheimer e ELA Falência de órgãos vitais LEMP leucoencefalopatia multifocal progressiva SNC sistema nervoso central HIV vírus da imunodeficiência humana ELA esclerose lateral amiotrófica 176 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Há ainda alguns cofatores que tornam o prognóstico sombrio identificados no Quadro 2 Em pacientes já em fase muito avançada de doença os principais fatores de mau prognóstico são dosagem baixa de albumina sérica perda acentuada de peso comorbida des graves e índice de Karnofsky inferior a 404 Quadro 2 Cofatores que tornam o prognóstico sombrio Falência múltipla aos antirretrovirais Caquexia Dosagem de linfócitos CD4 50 célsmm3 Índice de Karnofsky 40 Sequela neurológica grave Dispneia progressiva e refratária Pelo menos três dos seguintes critérios simultaneamente anorexia fadiga tristeza sonolência úlcera de pressão e diarreia Predição médica subjetiva de sobrevida 6 meses Como em qualquer doença após avaliação clínica de mau prognóstico o médico antes de tomar uma decisão unilateral quanto aos procedimentos de suspensão ou não introdução de terapia deverá discutir o fato com o paciente eou familiares e respeitar a autonomia dos mesmos Principais sofrimentos e abordagens dos pacientes com HIVAIDS em Cuidados Paliativos Os sofrimentos devem ser avaliados e abordados em equipe multiprofissional res peitandose a experiência de cada profissional com uma filosofia de trabalho que se complemente e apresente ajuda mútua Por motivos didáticos dividiremos os sofrimentos nas diferentes esferas Físicos Pacientes com AIDS em fase avançada da doença têm em média 109 a 127 sinto mas concomitantes grande parte negligenciada por eles próprios e seus médicos11 Os sofrimentos físicos em doentes em fase avançada variam em diferentes trabalhos sendo principalmente dor 84 asteniacaquexia 61 anorexia 41 confusão men taldemência 29 náuseavômito 21 e depressão 2014 24 A dor está presente em cerca de 80 dos pacientes em fase avançada da doença e eles têm em média 29 dores concomitantes8 Um trabalho realizado no Brasil aponta prevalência de dor em 54 dos pacientes hospitalizados em diferentes fases de doen ça1 sendo maior quanto mais grave for o estágio clínico Os principais tipos de dores apresentadas pelos pacientes com HIVAIDS são1 25 cefaleia por neurocriptococose neurotoxoplasmose neurotuberculose linfoma cere bral etc 177 neuropatias por HIV citomegalovírus CMV terapia antirretroviral herpeszóster etc ulcerações genitais orais e esofágicas por cândida CMV herpes vírus HIV dor abdominal por infecções intestinais pancreáticas hepáticas linfadenopatia aci dose lática neoplasias dores osteomusculares mialgia artralgia etc A dor tem sido bastante negligenciada nesses doentes quando em comparação com portadores com câncer com subtratamento médio de 83 a 855 12 A abordagem da dor na AIDS segue tradicionalmente a mesma que a da dor oncoló gica ou seja utilizase como base a escada da Organização Mundial da Saúde OMS30 que considera a intensidade da dor e os tipos de analgésicos e adjuvantes proporcionais à mesma Porém há algumas particularidades a serem consideradas no manejo desses pacientes menor experiência dos profissionais nesse campo menor número de estudos científicos grande incidência de hepatopatias nefropatias ulcerações gastrointestinais também dificultando o manejo uso de várias medicações com dificuldade na adesão à analgesia interações medicamentosas entre antirretrovirais e analgésicos e alto índice de abuso de drogas ilícitas o que leva ao temor do médico em prescrever opioides Psíquicos e sociais Os pacientes com HIVAIDS têm grandes sofrimentos psíquicos e sociais ao longo de todo o curso de sua doença culminando no diagnóstico de terminalidade As principais causas de sofrimentos psíquicos e sociais em pacientes com a doença avançada são29 incerteza da expectativa de vida desfiguração perda da capacidade física doença de longa duração com exaustão psicológica interferência direta na sexualidade com risco de contaminação de outras pessoas idade jovem alto índice de uso de drogas ilícitas estigma social problemas financeiros múltiplas mortes na família alto índice de desestruturação familiar Os principais problemas psiquiátricos apresentados por pacientes HIVpositivos são19 principalmente distúrbios de humor depressão e doença bipolar A depressão é bastan te frequente em pacientes com HIV em estágio avançado da doença duas vezes mais frequente que em pessoas HIVnegativas É necessário estar atento ao risco de suicídio Outros problemas também frequentes são distúrbios de ansiedade generalizada pânico distúrbio obsessivocompulsivo estresse póstraumático distúrbio de comportamento problemas de atenção uso de drogas comportamento antissocial entre outros O problema do uso de drogas ilícitas é muito frequente em pacientes com HIV e muitas vezes responsável pela nãoadesão ao tratamento e maior frequência de doença terminal Alguns aspectos importantes e peculiares no manejo psiquiátrico são conhecimento das interações frequentes entre drogas antirretrovirais e psiquiátricas sendo necessário consulta a manuais e tabelas específicas dependência de drogas ilícitas bastante comum nesta população e alto índice de hepatopatias com ajuste de doses quando indicado 178 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Espirituais18 Os principais sofrimentos nessa esfera são medos de condenação moralreligiosa aban dono desamparo da família morte entre outros sentimentos de perda da autoestima do controle da vida e das atividades do sentido da vida da esperança da fé em si no outros e em Deus da dignidade vivência de culpa desespero desejo de morrer e vontade de viver O cuidador de pacientes com HIVAIDS Grande número de pacientes não tem cuidador e frequentemente quando se tornam dependentes são encaminhados a casas de apoio Quando os pacientes possuem cuida dor há inúmeros problemas vivenciados por eles principalmente16 cuidadores com idade jovem e inexperientes como medo de contaminação revolta pela contaminação com HIV negligência com seu autocuidado principalmente as mães de crianças com HIVAIDS po dendo favorecer doenças e morte mais precoce problemas financeiros falta de suporte social alto índice de discriminação por parte da sociedade organizações familiares caóti cas drogadição alcoolismo pobreza extrema etc Isso contribui para dificultar os cuida dos aos doentes fazendoos merecer mais atenção da equipe de Cuidados Paliativos O luto na AIDS Os familiares ou cuidadores de pacientes com AIDS têm vários fatores de risco para luto complicado que devem ser abordados profilaticamente durante o curso da doença Os principais são9 múltiplas mortes na família alto índice de desagregação familiar cuida dores idosos principalmente avós cuidando de crianças doentes ou cuidadores contami nados preconceito e falta de apoio da sociedade com relação aos sobreviventes alto ín dice de enlutados também usuários de drogas ilícitas e com comorbidades psiquiátricas e falta de recursos financeiros Isso gera elevado índice de sintomas depressivos ansiedade e estresse póstraumático23 Nas mulheres tem se verificado maior índice de ansiedade pensamentos e atos suicidas26 Crianças e AIDS As crianças com AIDS em geral têm sobrevivido cada vez mais graças aos progressos terapêuticos e conhecimentos médicos Com isso a morte tem ocorrido mais frequente mente na adolescência ou no início da idade adulta rodeada de grande sofrimento As principais particularidades dos Cuidados Paliativos em crianças com relação aos adultos são10 doença multissistêmica de curso imprevisível e em geral mais lento que em adulto mudanças constantes nos desenvolvimentos físico e psíquico aspectos cog nitivos muito variáveis de acordo com faixa etária e com o grau de acometimento do cérebro pelo HIV demência grande índice de orfandade falta de cuidador e limitações de sexualidade A equipe de Cuidados Paliativos tem enfrentado grande dificuldade na abordagem eficaz dessa população Cuidados Paliativos em AIDS na prática clinica diária Considerando a diferença de evolução entre os pacientes que aderem e os que não aderem à HAART a atuação dos Cuidados Paliativos é variável As principais atuações são 179 o controle de sintomas pontuais sendo a dor o principal deles a abordagem multiprofis sional a todos os sofrimentos a ajuda na avaliação prognóstica com orientações quanto a medidas terapêuticas a melhora na comunicação com paciente família e equipe de saúde o melhor planejamento de ações paliativas ou paliativocurativas a ajuda na so lução de questões éticas de final de vida a abordagem mais planejada na fase final de vida a avaliação dos riscos dos familiares para luto complicado e abordagem profilática e a abordagem ao familiarcuidador após a morte principalmente àqueles que evoluem para luto complicado Conclusão A AIDS tem se tornado uma doença crônica com múltiplos sofrimentos físicos psí quicos sociais e espirituais e aumento de incidência de comorbidades nãooportunistas antes pouco observadas pela curta sobrevida Isso tem corroborado a grande importância da abordagem multiprofissional dos Cuidados Paliativos em qualquer fase de doença Consequência nociva dos inúmeros progressos terapêuticos foi a grande dificuldade em prognosticar esses doentes e o risco frequente de distanásia Os Cuidados Paliativos também têm ajudado muito nesse setor O grande número de particularidades dos doentes e as dificuldades dos especialistas em Cuidados Paliativos em lidar com elas têm incentivado infectologistas a se preo cuparem mais com a melhora dos cuidados desses pacientes em fase avançada O alto índice de falta de cuidador e de luto complicado também tem sido alvo dos Cuidados Paliativos Referências 1 AIRES EM BAMMANN R H Pain in hospitalized HIV positive patients clinical and therapeutical issues Braz J Infect Dis n 9 p 20182005 2 BARTLETT J A Adressing the challenges of adherence Acquir Immune Defic Syndr v suppl 1 p 52 2002 3 BRASIL Ministério da Saúde Programa Nacional de Controle de DSTAIDS Boletim Epidemiológico AIDS Brasília Ministério da Saúde 2008 4 BRECHTL J R et al Palliat support care v 3 n4 p 26572 2005 5 BREITBART W et al The undertreatment of pain in ambulatory AIDS patients Pain v 65 p 2439 1996 6 EASTERBROOK P MEADWAY J The changing epidemiology of HIV infection new challenges for HIV palliative care J R Soc Med v 94 p 442 2001 7 EGGER M et al 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da veia cava superior dAlvA YuKie mAtsumoto môniCA CeCíliA b mAnnA Introdução A síndrome da veia cava superior SVCS é caracterizada por um conjunto de sinais e sintomas dilatação das veias do pescoço pletora facial edema de membros superiores e cianose Os sintomas de cefaleia dispneia tosse edema de membro superior ortopneia e disfagia entre outros são decorrentes da obstrução do fluxo sanguíneo através da veia cava superior em direção ao átrio direito Essa obstrução pode ser causada por compressão extrínseca do vaso invasão tumoral trombose ou dificuldade do retorno venoso ao coração secundária a doenças intraatriais ou intraluminais Aproximadamente 73 a 97 dos casos de SVCS ocorrem durante a evolução de neoplasias malignas intratorácicas que comprimem ou invadem a veia cava superior Esse processo pode ser causado pelo próprio tumor ou por linfonodos mediasti nais acometidos4 6 A neoplasia maligna que mais frequentemente causa a SVCS é o carcinoma bronco gênico 75 dos casos e 3 a 5 dos pacientes portadores de neoplasias malignas de pulmão desenvolvem a SVCS durante a evolução da doença4 5 Os linfomas constituem a segunda maior causa neoplásica da síndrome 15 dos casos e 17 dos linfomas com envolvimento mediastinal causam a SVCS As neoplasias metastáticas correspondem a 7 dos casos7 Fisiopatologia A veia cava superior é susceptível à obstrução devido a algumas características como sua localização estratégica no compartimento visceral do mediastino cercada por estruturas rígidas como o esterno a traqueia o brônquio fonte direito a aorta a artéria pulmonar direi ta sua parede fina facilmente compressível o transporte de sangue em baixas pressões e a presença de linfonodos mediastinais que a circundam completamente10 Quando a veia cava e as suas principais tributárias venosas sofrem obstrução um grande número de vasos colaterais é solicitado por meio de redes venosas extracavitárias principalmente na pele e na musculatura da parede torácica A alta pressão venosa acima da obstrução provoca o aparecimento de shunts em veias e plexos adjacentes de baixa pressão No decorrer do tempo esse aumento mantido de pressão determina distensão e dilatação progressiva das vias colaterais que podem tornarse calibrosas e com alto fluxo sanguíneo Tratamento O tratamento depende da gravidade dos sintomas da causa da obstrução do tipo histológico e do estádio do tumor que a produz Algumas medidas podem ser utilizadas 182 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP até que o diagnóstico seja feito e o tratamento definitivo seja indicado como elevação da cabeça repouso controle do volume hídrico administrado e suplementação de oxigênio Na SVCS associada a neoplasias a escolha do tratamento dependerá do tipo de tumor Por exemplo linfomas e carcinomas pulmonares de células pequenas podem responder rapidamente à quimioterapia isolada enquanto outras neoplasias provavelmente exigirão radioterapia A utilização da radioterapia nos pacientes com SVCS antes da obtenção do diagnóstico histológico é considerada inapropriada por muitos autores8 11 Em geral com a SVCS associada a neoplasias 75 dos pacientes apresentarão me lhora em três a quatro dias e 90 terão grande melhora uma semana depois de instituído o tratamento Os pacientes que não melhorarem na primeira semana podem ter desenvol vido trombose venosa central necessitando de terapia fibrinolítica ou antitrombótica Devido à friabilidade de alguns tumores e à pressão venosa central elevada é ne cessário cautela ao instituir o uso de anticoagulantes Portanto não deve ser usual a anticoagulação profilática O uso de corticosteroides pode aliviar os sintomas no caso da SVCS causada por lin foma e reduzir o edema peritumoral enquanto o paciente recebe radioterapia Seu bene fício é também observado quando há comprometimento respiratório grave Os diuréticos podem oferecer alívio sintomático inicial mas é necessária cautela quanto à hidratação do paciente8 A SVCS refratária ou recorrente principalmente nos pacientes já submetidos à irra diação pode exigir a colocação de stents intravasculares para que se restabeleça o fluxo sanguíneo9 O tratamento cirúrgico raramente é necessário nas SVCS diante dos bons resultados obtidos com radioterapia e quimioterapia As desvantagens da cirurgia incluem morbi dade e mortalidade associadas ao procedimento principalmente nos casos de neoplasias malignas3 As possíveis indicações para o tratamento cirúrgico seriam neoplasias re fratárias radioterapia quimioterapia presença de trombos na veia cava superior ou em suas maiores tributárias e oclusão aguda da veia cava superior com sintomas graves1 Basicamente são utilizados dois procedimentos ressecção e bypass2 Considerações finais A presença das emergências oncológicas de maneira geral costuma ser um sinal de doença progressiva É fundamental se estabelecer o estadiamento correto da neoplasia maligna e o momento da evolução da doença em que o paciente se encontra para que se possa escolher a conduta mais adequada de forma individualizada Para isso a atitude do médico deve ser cuidadosa e solidária levandose em conta a escolha do paciente seu conforto e bemestar Referências 1 ANDERSON R P LI W I Segmental replacement of superior vena cava with spiral vein graft Ann Thorac Surg v 36 n 1 p 858 1983 2 DOTY J R FLORES J H DOTY D B Superior vena cava obstruction bypass using spiral vein graft Ann Thorac Surg v 67 n 4 p 11116 1999 3 EFFENEY D J WINDSOR H M SHANAHAN M X Superior vena cava obstruction resection and bypass for malignant lesions Aust N Z J Surg v 42 n 3 p 2317 1973 183 4 LOCHRIDGE S K KNIBBE W P DOTY D B Obstruction of the superior vena cava Surgery v 85 n 1 p 1424 1979 5 NOGEIRE C MINCER F BOTSTEIN C Long survival in patients with bronchogenic carcinoma complicated by superior vena cava obstruction Chest v 75 n 3 p 3259 1979 6 PARISH J M et al Etiologic considerations in superior vena cava syndrome Mayo Clin Proc v 56 n 7 p 40713 1981 7 PEREZSOLER R et al Clinical features and results of management of superior vena cava syndrome secondary to lymphoma J Clin Oncol v 2 n 4 p 2606 1984 8 POLLOCK R E et al eds Manual de Oncologia Clínica da UICC 8 ed São Paulo A John WileySons Inc Publicação e Fundação Oncocentro de São Paulo 2006 p 75760 9 PUTNAM J S et al Superior vena cava syndrome associated with massive thrombosis treatment with expandable wire stents Radiology v 167 n 3 p 7278 1988 10 ROSWIT B KAPLAN G JACOBSEN H G The superior vena cava obstruction syndrome in bronchogenic carcinoma pathologic physiologic and therapeutic management Radiology v 61 n 5 p 72237 1953 11 YAHALOM J Superior vena cava syndrome In DE VITTA V T HELLMAN S ROSENBERG A S eds Cancer principles and practice of oncology 4 ed Philadelphia JB Lippincott 1993 p 21118 184 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Síndrome de compressão medular dAlvA YuKie mAtsumoto môniCA CeCíliA b mAnnA Introdução A compressão medular ocorre em 3 a 5 dos doentes com neoplasia maligna avan çada sendo uma causa de morbidade muito importante nesses pacientes O diagnóstico precoce é a arma mais importante para garantir a efetividade terapêutica Os cânceres de mama dos brônquios e da próstata são responsáveis por mais de 60 dos casos1 O sítio de maior incidência é o tórax existindo compressão em mais de um nível em mais de 20 dos casos Abaixo do nível da segunda vértebra lombar L2 a compressão se dá na cauda equina ou seja nos nervos periféricos e não no cordão medular A compressão medular maligna ocorre por invasão direta do tumor primário ou por suas metástases A velocidade de instalação da clínica indica a gravidade dos danos A probabilidade de reverter um quadro clínico de paresia está inversamente relacionada com o tempo de ma nutenção do mesmo assim uma paresia instalada há 8 horas tem grande chance de ser revertida de 24 horas a 48 horas pode ainda ser revertida mas após sete dias já se torna irreversível2 A paralisia e a disfunção dos esfíncteres são os estádios clínicos finais dessa urgência oncológica e estão diretamente associados ao menor tempo de sobrevida2 Fisiopatologia A invasão pelo tumor altera a relação entre o plexo venoso epidural corpo vertebral e o canal medular provocando estase venosa e edema medular o que leva à diminuição do fluxo capilar e à liberação de PGE citocinas neurotransmissores e mediadores da inflamação que são responsáveis pelas alterações associadas a hipóxia isquemia e dano tissular neurológico Características clínicas A dor é o sintoma mais frequente e está presente em mais de 90 dos casos antece dendo a disfunção neurológica É progressiva localizada no nível da lesão medular e tem característica mecânica piorando com a manobra de Valsalva e com o movimento A fraqueza é o segundo sintoma frequente em aproximadamente 75 dos casos Pode aparecer gradualmente ou de forma aguda quando ocorre falência vascular grave o chamado choque medular Inicialmente a musculatura proximal é mais afetada e com a evolução a musculatura distal também é comprometida A deambulação fica muito prejudicada e a flacidez e a arreflexia inicial são substituídas pela plegia em flexão As alterações sensoriais podem ocorrer em seguida em torno de 50 dos casos ma nifestandose como parestesias ou hipoestesias que se iniciam nos pés e podem subir até chegar ao nível afetado As disfunções autonômicas e as paralisias são os sinais da última etapa da síndrome 185 Diagnóstico O diagnóstico se baseia na história e nos achados clínicos e neurológicos presentes que indicam o nível medular afetado A ressonância magnética RM de toda a coluna e estruturas adjacentes é a forma de investigação de escolha sendo imprescindível para planejar o tratamento É necessária a utilização de contraste intravenoso para complementar o estudo nos casos de presença de massas tumorais paravertebrais e metástases intramedulares A radiografia simples de coluna pode mostrar alterações ósseas como colapsos ver tebrais lesões blásticas ou líticas e destruição do pedículo vertebral em torno de 70 dos casos Tratamento Embora a compressão medular seja frequentemente de instalação insidiosa deve ser tratada como uma emergência A droga de escolha é a dexametasona na dose inicial de 1020 mg por via intravenosa IV em bolo Durante as próximas 48 horas manter a dose de 4 a 8 mg a cada 6 horas e posteriormente a mesma dose é usada por via oral VO Devese permanecer com essa dose durante o tratamento radioterápico reduzindoa progressivamente após o seu término Reco mendase associação com medicamento inibidor da bomba de prótons assim como o controle dos níveis de glicemia da pressão arterial PA e dos eletrólitos no sangue2 A radioterapia possui papel central no tratamento da compressão medular maligna Realizada junto com a administração da dexametasona apresenta os seguintes resulta dos descomprime o tecido nervoso por citorredução tumoral diminui o déficit neuroló gico em 45 a 60 dos casos reverte a paresia em 11 a 20 controla a dor em 70 dos casos e estabiliza a progressão local da neoplasia O tratamento cirúrgico descompressivo estará indicado quando o diagnóstico for du vidoso sem confirmação histológica houver progressão da lesão com o tratamento radio terápico para pacientes previamente irradiados e quando existir instabilidade mecânica Considerações finais O diagnóstico precoce antes da instalação do dano neurológico grave e a instauração imediata do tratamento são fatores essenciais para evitar a paralisia O prognóstico e a expectativa de vida devem ser levados em conta para a tomada de decisão Devemos sempre nos lembrar de incluir o paciente e seus familiares no processo de escolha do tratamento a ser implementado com base no preceito ético da autonomia Referências 1 LOBLAW D LAPERRIERE N Emergency treatment of malignant extradural spinal cord compression na evidencebased guideline Journal of Clinical Oncology v 16 p 161324 1998 2 ROMERO P et al Compresión medular An Sist Sanit Navar v 24 p 15662 2004 186 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Hipodermóclise um método alternativo para a administração de fluidos e medicamentos pela via subcutânea eliete FAriAs Azevedo mAriA FernAndA bArbosA Hipodermóclise Pacientes em Cuidados Paliativos frequentemente apresentam condições que impos sibilitam a administração de medicamentos e a manutenção adequada de níveis de hidra tação e nutrição necessitando portanto de vias alternativas para suporte clínico Nesse contexto a via subcutânea SC deve ser a primeira escolha e pode ser imple mentada tanto no ambiente hospitalar quanto na assistência domiciliar5 10 Bases para o uso da via subcutânea A pele membrana que reveste toda a superfície corporal é responsável por manter a integridade do corpo proteger contra agressões externas absorver e excretar líqui dos regular a temperatura absorver a radiação ultravioleta e metabolizar vitaminas a vitamina D por exemplo Nela estão contidas epiderme derme e hipoderme ou tecido subcutâneo Figura 115 A hipoderme ou tecido subcutâneo é composta de densas conexões e tecido adiposo abrigando os principais vasos sanguíneos linfáticos as glândulas e os nervos Sua principal função é o depósito nutritivo de reserva energética que funciona como isolante térmico e protetor mecânico do organismo às pressões e aos traumatismos externos Seu efeito de enchimento facilita a mobilidade da pele sobre as estruturas subjacentes A distribuição do tecido subcutâneo depende dos fatores idade hereditariedade e sexo8 15 Por ser dotado de capilares sanguíneos o tecido subcutâneo tornase uma via favo rável à administração de fluidos eou medicamentos uma vez que esses serão absorvidos e transportados à macrocirculação10 21 A vascularização do tecido subcutâneo abriga cerca de 6 do débito cardíaco e per mite uma taxa de absorção muito similar à da administração intramuscular dos medica mentos atingindo concentrações séricas menores mas com tempo de ação prolongado Figura 24 Como outros métodos parenterais evita o clearance présistêmico pelo fígado pos sibilita uma concentração sérica estável do medicamento e evita picos plasmáticos que determinam o possível aparecimento de efeitos colaterais indesejáveis12 Se usada a infu são contínua evitase também que a concentração plasmática caia a níveis insuficientes para o ressurgimento dos sintomas2 12 187 Indicações para o uso da hipodermóclise As principais indicações para o uso da hipodermóclise são prevenção ou tratamento da desidratação moderada pacientes com intolerância ou dificuldade para ingestão de líquidos por via oral VO náuseas e vômitos incoercíveis diarreia obstrução do trato gastrointestinal por neoplasia embotamento cognitivo sonolência e confusão mental10 13 21 impossibilidade de acesso venoso pacientes com difícil acesso venoso veias finas e frágeis e que tenham o seu so frimento aumentado pelas constantes tentativas de punção situações em que o acesso venoso representa impossibilidade ou limitação para a administração de medicamentos e fluidos decorrentes de flebites trombose venosa e sinais flogísticos10 13 21 Figura 1 Anatomia da pele Poro sudoríparo Corpúsculo de Meissner Epiderme Derme Glândula sebácea Pelo Camada córnea queratinizada Terminação nervosa livre Glândula sudorípara Músculo eretor do pelo Tecido subcutâneo adiposo Folículo piloso Artéria Veia Figura 2 Variação da concentração do medicamento na corrente sanguínea conforme o tempo e a via de administração Intravenosa Intramuscular Subcutânea Oral Tempo Concentração do medicamento no sangue 188 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Contraindicações para uso da hipodermóclise As principais contraindicações estão relacionadas com os distúrbios de coagulação edema e anasarca Nas situações de emergência como falência circulatória desequilíbrio hidroeletrolítico severo e desidratação severa por exemplo essa prática é desaconse lhável pois os resultados esperados são insatisfatórios Quando houver risco severo de congestão pulmonar p ex insuficiência cardíaca congestiva e síndrome de veia cava superior devese avaliar criteriosamente cada caso5 10 13 21 Vantagens Via segura com pouco risco de complicação de fáceis manipulação e manutenção mínimo desconforto ou risco de complicação local a utilização da via SC provoca des conforto doloroso ínfimo em alguns pacientes e impõe mínima limitação pelas opções diferenciadas dos sítios de punção comumente distante de articulações Dispensa assim a imobilização de qualquer membro Além disso a infusão pode ser interrompida a qual quer momento sem o risco de complicações como por exemplo formação de coágulos ou trombose de vaso1 10 13 Tal prática apresenta ainda baixa incidência de infecção8 risco mínimo de complicações sistêmicas o risco de complicações sistêmicas como a hiperhidratação e a sobrecarga cardíaca é mínimo e pode ser monitorado ao longo da infusão10 13 baixo custo quando utilizada em situações apropriadas tem menor custo que a tradi cional terapia intravenosa já que os materiais necessários para a instalação da hipoder móclise são relativamente pouco onerosos em comparação com os utilizados em outros tipos de punção conferindo baixo custo ao procedimento Ademais pode ser mantida por semanas embora haja recomendação de troca a cada 96 horas ou antes se forem evidenciados sinais flogísticos e exige menos horas de supervisão técnica da equipe de saúde1 10 21 possibilidade de alta hospitalar precoce e permanência do paciente em domicílio por ser um método seguro sem graves complicações e de manuseio simples possibilita a alta precoce do paciente já que o dispositivo pode ser manejado em domicílio pelo cuidadorfamiliar eou pelo próprio paciente após treinamento pela equipe de enfermagem Pode ainda ser aplicado em domicílio sem a necessidade de internação do paciente hipoidratado e desidratado5 8 10 Desvantagens A hipodermóclise apresenta limitações nas situações em que se desejam velocidade de infusão rápida e reposição com alto volume de fluidos O volume diário recomendado varia entre 2000 e 3000 ml em 24 horas dividindose em dois sítios Assim não é reco mendável sua utilização em casos emergenciais como reversão de choque hipovolêmico e desidratação severa situações em que se faz necessária a infusão de grandes volumes de líquidos1 57 10 13 21 A velocidade de absorção de um medicamento depende da via de administração do mesmo Conforme pode ser observado na Figura 2 medicamentos administrados por via SC têm maior velocidade de absorção do que pela VO porém menor velocidade que pelas vias intravenosa IV e intramuscular IM Essa característica faz com que a via SC 189 não seja a ideal quando se necessita de ajuste rápido de dose apesar de seu perfil de segurança12 Considerações Durante a utilização da terapia subcutânea é importante considerar que os fluidos são absorvidos por difusão capilar por isso a absorção fica reduzida quando há comprometimento da irrigação no sítio de infusão por exemplo em presença de ede mas e hematomas1 10 os opioides são geralmente bem tolerados Pacientes em controle álgico beneficiamse da via SC para os medicamentos de resgate4 10 18 os níveis séricos de opioides por via SC aproximamse daqueles obtidos depois da admi nistração IM o que proporciona segurança e eficácia na administração desses medica mentos11 Soluções de hidratação recomendadas Soluções soros fisiológico SF a 09 e glicosados SG a 5 utilizados para adminis tração por via IV podem ser infundidos também por via SC1 5 7 8 13 20 eletrólitos cloretos de potássio KCl e de sódio NaCl devem ser administrados apenas após a diluição no SF a 09 e SG a 5 em volumes nãoinferiores a 100 ml seguindo a velocidade de infusão recomendada no intervalo de 60 a 125 mlh1 5 13 21 volume o volume não deve ultrapassar 3000 ml em 24 horas É recomendável a prática da infusão em dois sítios separados e simultâneos dividindose 1500 ml por sítio de infusão Alguns pacientes com tecido subcutâneo diminuído devem ter o volume limitado a 2000 ml em 24 horas5 10 13 21 gotejamento recomendase regular o gotejamento da infusão por meio de equipo com dosa dor mlh microgotas ou bomba de infusão conforme a necessidade Devese manter o fluxo em torno de 60 a 125 mlh considerando as condições clínicas e a necessidade do paciente5 10 21 Medicamentos tradicionalmente utilizados Soluções isotônicas e com pH próximo à neutralidade são mais bem toleradas pela via SC Entre os medicamentos tradicionalmente utilizados estão clonidona clorpromazina dexameta sona fenobarbital fentanil furosemida haloperidol hioscina hidrocortisona ketamina metado na metilprednisona metoclopramida midazolam morfina naxolona octreotide ondansetrona oxicodona prometazina ranitidina tramadol entre outros24 710 1618 Com os avanços científicos nessa área de conhecimento outros medicamentos têm sido estudados a fim de ter seu uso padronizado por via SC amicacina ampicilina atropi na cefepima ceftriaxona omeprazol pamidronato tobramicina entre outros6 7 16 Medicamentos nãorecomendados Os medicamentos que têm baixa solubilidade em água e por isso são veiculados em soluções de características oleosas como o propilenoglicol não apresentam bom perfil de 190 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP segurança para utilização por via SC em função do dano que tais soluções podem causar a esse tecido Medicamentos como diazepam diclofenaco e fenitoína apresentam tal par ticularidade Soluções com extremos de pH 2 ou 11 apresentam risco aumentado de precipitação ou irritação local sendo incompatíveis com a via SC Assim contraindicase a utilização de diazepam diclofenaco fenitoína e eletrólitos nãodiluídos10 14 19 Compatibilidade entre os medicamentos A absorção a eficácia e a segurança no uso da via SC foram comprovadas por estudos científicos e devem seguir recomendações principalmente quanto à compatibilidade en tre os medicamentos Figura 33 10 Como utilizar os medicamentos Diluição todos os medicamentos administrados por via SC devem estar na forma líquida e ser diluídos em água para injeção exceto ketamina octreotide e ondansetrona os quais devem ser diluídos em SF a 09 A diluição recomendada é de 1 ml de medicamento em 1 ml de diluente Ex octreotida 01 mcgml ampola de 1 ml diluir em 1 ml de SF3 9 formas de administração os medicamentos podem ser administrados em bolo ou em in fusão contínua conforme a necessidade clínica do paciente seguindo as recomendações de misturas entre medicamentos apresentadas na Figura 32 10 21 Escolha do sítio de punção1 2 4 5 7 10 21 Região deltóidea região anterior do tórax Figura 3 Compatibilidade entre dois medicamentos para administração por via subcutânea CLORPROMAZINA DEXAMETAZONA FENOBARBITAL FUROSEMIDA HALOPERIDOL HIOSCINA INSULINA KETAMINA METADONA METOCLOPRAMIDA MIDAZOLAM MORFINA OCTREOTIDA ONDANSETRONA RANITIDINA TRAMADOL CLORPROMAZINA DEXAMETAZONA FENOBARBITAL FUROSEMIDA HALOPERIDOL HIOSCINA INSULINA KETAMINA METADONA METOCLOPRAMIDA MIDAZOLAM MORFINA OCTREOTIDA ONDANSETRONA RANITIDINA TRAMADOL COMPATÍVEL INCOMPATÍVEL NÃO TESTADO 191 região abdominal faces anterior e lateral da coxa região escapular face lateral da coxa A tolerância de cada região para a infusão varia conforme as condições gerais de cada paciente e o volume a ser infundido Dispositivos recomendados O dispositivo mais utilizado para o procedimento é o escalpe tipo butterfly nos calibres 25 e 27 que pode permanecer até cinco dias No entanto outros dispositivos como o cateter de teflon podem ser utilizados com maior tempo de duração em média 11 dias2 4 5 7 10 14 21 Execução da técnica Materiais necessários8 10 solução preparada para ser instalada soro medicamento equipo com dosador mlhora ou bomba de infusão solução antisséptica gaze e luva de procedimento Figura 4 Locais adequados para punção subcutânea Anterior Posterior 1 1 2 2 3 4 4 5 5 6 6 1 1 192 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP dispositivo escalpe ou cateter de teflon filme transparente para fixar esparadrapo para datar Instalação da punção1 2 8 10 21 Lavar as mãos explicar ao pacientefamília sobre o procedimento escolher o local para a punção tendo em vista maior conforto para o paciente preencher o circuito intermediário do escalpe com SF a 09 cerca de 05 ml fazer antissepsia e a prega na pele introduzir o escalpe num ângulo de 30o a 45o abaixo da pele levantada a agulha deve ficar solta no espaço subcutâneo fixar o escalpe com filme transparente aspirar cuidadosamente de forma a garantir que nenhum vaso seja atingido aplicar o medicamento ou conectar o escalpe ao equipo da solução proceder à identificação da punção com data horário calibre do dispositivo nome do medicamento administrado e nome do profissional que realizou o procedimento Obs o escalpe deve permanecer salinizado no paciente para a administração poste rior de medicamentos regulares e de resgate5 Complicações que devem ser monitoradas47 21 Locais Sinais de irritação local podem aparecer nas primeiras 4 horas Se persistirem por tempo superior ao esperado trocar o sítio de punção Recomendase reavaliação e troca do sítio de punção quando houver sinais flogísticos edema calor eritema persistente e dor no local da infusão endurecimento hematoma necrose do tecido complicação tardia sinais de infecção presença de febre calafrio e dor suspender a infusão cefaleia e ansiedade Sistêmicas Os sinais de sobrecarga cardíaca taquicardia turgência jugular hipertensão arterial tosse dispneia são indicativos para a suspensão do uso5 Recomendações Fazer rodízio do sítio de punção respeitandose a distância mínima de 5 cm do local da punção anterior Atentar para condições clínicas do paciente características ambien tais e do dispositivo6 10 Depois da administração de medicamentos injetar 1 ml de SF a 09 para garantir que todo o conteúdo do dispositivo seja introduzido no sítio de punção21 Se for observado edema local persistente recomendase diminuir o gotejamento ou suspender a infusão10 193 Figura 5 Passo a passo A materiais para antissepsia da pele B materiais para a punção subcutânea C aspiração do SF 09 D preenchimento do circuito com o SF 09 E antissepsia da pele F prega subcutânea G punção subcutânea H aspiração para garantir a ausência de comprometimento de vasos sanguíneos I fixação com filme transparente Fonte Arquivos da autora SF soro fisiológico A B E F G H I C D 194 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Referências 1 BROWN M K Hypodermoclysis another way to replace fluids Nursing v 30 n 5 p 589 2000 2 CARRETERA Y Posibilidades actuales de la enfermería paliativa In AUSTUDILLO W et al Avances recientes en cuidados paliativos 1 ed San Sebastián Sociedad Vasca de Cuidados Paliativos 2002 p 12738 3 CONSULTANT PHYSICIAN IN PALLIATIVE MEDICINE Pall care info Disponível em httppallcareinfo Acesso em 9 maio 2009 4 DA POIAN S H CARACENI A Administração subcutânea de opióides Revista Brasileira de Anestesiologia v 41 p 26771 1991 5 DALAL S BRUERA E Dehydratation in cancer patients to treat or not to treat Journal Supportive Oncology v 2 n 6 p 46787 2004 6 DARDAINEGIRAUD V LAMANDÉ M CONSTANS T Lhypodermoclyse intérêts et indications en gériatrie La Revue de Médicine Interne v 26 p 64350 2005 7 FONZOCHRISTE C et al Subcutaneous administration of drugs in the elderly survey of practice and systematic literature review Palliative Medicine v 19 p 20919 2005 8 GIRONDI J B WATERKEMPER R A utilização da via subcutânea como alternativa para o tratamento medicamentoso e hidratação do paciente com câncer Revista Mineira de Enfermagem v 9 n 4 p 348 54 2005 9 HERNDON C M FIKE D S Continuous subcutaneous infusion practices of United State hospices Journal of Pain and Symptom Management v 22 n 6 p 102734 2001 10 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER Brasil Hipodermóclise ou terapia subcutânea In INCA Ações de enfermagem para o controle do câncer uma proposta de integração ensinoserviço 3 ed Rio de Janeiro INCA 2008 p 53856 11 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER Brasil Normas e recomendações do INCAMS Controle de sintomas do câncer avançado em adultos Revista Brasileira de Cancerologia v 46 n 3 p 24356 2000 12 LÜLLMANN H MOHR K Farmacologia texto e atlas 4 ed Porto Alegre Editora Artmed 2004 p 467 13 LYBARGER E H Hypodermoclysis in the home and longterm care settings Journal of Infusion Nursing v 32 n 1 2009 14 MACMILLAN K et al A prospective comparison study between a butterfly needle and a teflon cannula for subcutaneous narcotic administration Journal of Pain Symptom Management v 9 n 2 p 824 1994 15 MAKLEBUST J SIEGGREEN M Skin anatomy and physiology In MAKLEBUST J SIEGGREEN M Pressure ulcers guidelines for prevention and nursing management 3 ed Pennsylvania EUA 2000 p 112 16 MARQUES C et al Terapêutica subcutânea em cuidados paliativos Revista Portuguesa de Clínica Geral v 21 p 5638 2005 17 NEGRO S et al Physical compatibility and in vivo evaluation of drug mixtures of subcutaneous infusion to cancer patient in palliative care Supportive Care Cancer v 10 p 6570 2002 18 NEGRO S et al Morphine haloperidol and nbutyl bromide combined in SC infusion solutions compatibility and stability evaluation in terminal oncology patients International Journal of Pharmaceutics v 307 p 27884 2006 19 SWEETMAN S Martindale the complete drug reference 35 Ed Pharmaceutical Press p 438 447 889 2007 20 TURNER T CASSANO A M Subcutaneous dextrose for rehydratation of elderly patients evidence based review BMC Geriatrics v 4 n 2 2004 Disponível em httpwwwbiomedcentralcom1471231842 Acesso em 22 abr 2009 21 WALSH G Hypodermoclysis an alternative method for rehydration in longterm care Journal of Infusion Nursing v 28 n 2 p 1239 2005 195 Procedimentos sustentadores de vida em Cuidados Paliativos uma questão técnica e bioética CristhiAne dA silvA Pinto Os Cuidados Paliativos podem ser definidos segundo a World Health Organization WHO como assistência multiprofissional ativa e integral aos pacientes cuja doença não responde mais ao tratamento curativo com o objetivo principal de garantir ao doente e a seus familiares melhor qualidade de vida Nesse contexto devemos avaliar em que momento esses procedimentos invasivos e agressivos se encaixam ou melhor se eles realmente têm alguma utilidade quando falamos em Cuidados Paliativos ou se podemos considerálos futilidade terapêutica Com a evolução técnicocientífica atingida nos últimos 50 anos a expectativa de vida praticamente dobrou modificando todo o panorama as pessoas deixaram de morrer por doenças infectocontagiosas e passaram a ser vitimadas por doenças crônicodegene rativas Nesse momento começaram a surgir questões não somente relacionadas com a cura das doenças mas também com o controle e principalmente a qualidade de vida dos pacientes com doenças crônicas21 Quanto mais a medicina evoluiu em suas técnicas com o surgimento de novos tra tamentos e aparelhos para a manutenção da vida orgânica mais nos deparamos com questões éticas relacionadas com aqueles que mesmo com todas as técnicas disponíveis não poderão obter a cura ou mesmo um prolongamento de vida com qualidade21 O profissional que começa seu trabalho na seara dos Cuidados Paliativos deparase inicialmente com uma importante mudança no foco da atenção Ele que foi inicialmente treinado para lidar com o conceito de saúde passa a trabalhar com o conceito de doen ça em progressão e a tão perseguida cura começa a dar lugar à busca pela qualidade de vida Mas o que é qualidade de vida É um conceito pessoal e intransferível e ninguém tem condições de definir o que realmente é melhor para o outro Nesse sentido o Cuidado Paliativo se cruza com um dos princípios da bioética que será descrito posteriormente autonomia21 A seguir encontrase analogia dos conceitos utilizados em Cuidados Paliativos pela ótica da dos princípios bioética Princípio da beneficência A moralidade requer não apenas que tratemos as pessoas como autônomas e que nos abstenhamos de prejudicálas mas também que contribuamos para o seu bemestar O princípio da beneficência é uma obrigação moral de agir em benefício de outros1 Quando falamos em agir em benefício de outros em Cuidados Paliativos estamos nos referindo principalmente a dois pontos cruciais controle de sintomas e qualidade de vida 196 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A doença em progressão é capaz de infligir extremo sofrimento àqueles que dela pade cem Por isso precisamos conhecer profundamente a história natural da doença para que possamos antecipar as complicações que dela surgirão e com isso controlar os sintomas da doença incurável Procuramos manter a maior qualidade de vida possível em cada caso sempre respeitando os desejos do paciente Princípio da nãomaleficência Tal princípio determina a obrigação de não infligir dano intencionalmente Na ética médica ele está intimamente ligado com a máxima primum non nocere acima de tudo ou antes de tudo não causar dano1 Dentro dos Cuidados Paliativos a prática da distanásia prolongamento da morte com sofrimento é evitada na medida em que procedimentos invasivos e agressivos que não trarão benefício aos pacientes não são instituídos Princípio da autonomia Autonomia derivada do grego autos próprio e nomos regra governo ou lei era inicialmente utilizada como referência à autogestão das cidadesestados independentes gregas Posteriormente passou a referirse ao indivíduo com direitos de liberdade priva cidade escolha individual liberdade da vontade e pertencimento a si mesmo1 Em Cuidados Paliativos a preservação da autonomia dos pacientes é considerada um dos princípios mais importantes no processo de tomada de decisão pois evita os abusos potenciais de um julgamento unilateral22 É nesse momento que se resgata a relação médicopaciente perdida ao longo do avançar técnicocientífico Como lidamos com qualidade de vida subjetiva e individual é imprescindível ouvir o outro com todas as suas dúvidas e experiências No momento em que trabalhamos com o desejo do paciente e não com a vontade do médico abandonamos o antiquado paternalismo médico É nessa perspectiva que se insere o cuidado no fim da vida algo que é pensado e realizado em cada caso concreto e de forma compartilhada entre seres autônomos que se respeitam e constroem um processo de morte no qual os profissionais por meio de conhecimento técnico podem contribuir para que esse caminho final seja vivido digna mente com o mínimo de sofrimento para o doente e seus cuidadores20 Princípio da justiça Nos tratamentos médicos a probabilidade de sucesso é critério relevante pois um recurso médico finito só deve ser distribuído entre os pacientes que tenham chance razoável de se beneficiar Ignorar esse fator é injusto pois resulta em desperdício de recursos1 A futilidade terapêutica é difícil de ser definida e aceita em muitos casos pois o profissional da área de saúde principalmente os médicos é treinado para sempre fazer todo possível para salvar a vida do indivíduo Isso ocorre porque aprendemos desde tenra idade que a vida é sagrada princípio da sacralidade da vida Porém quando trabalhamos com pacientes com doença avançada e em progressão percebemos que a obstinação te 197 rapêutica não tem lugar em Cuidados Paliativos O que queremos é que nossos pacientes tenham uma morte digna e sem sofrimento A razão de ser da obstinação terapêutica tem sido atribuída por muitos à medicina defensiva prática que infelizmente tem se alastrado cada vez mais Entendese como uma decisão ou ação clínica do médico motivada total ou parcialmente com a intenção de se proteger de uma possível acusação de má prática médica16 Para que não sejamos obstinados e ao mesmo tempo possamos estar livres do medo de alguma acusação precisamos sempre estar muito bem embasados tecnicamente Em Cuidados Paliativos a população de pacientes é muito heterogênea Temos pa cientes com doença avançada e que se mantêm com bom karnofsky performance status KPS e temos aqueles que como preferimos classificar em nosso manual encontramse em fase final da vida Para que não deixemos de tratar aqueles que se beneficiariam com determinado procedimento ou exame mais complexo para controle de sintomas e nem sejamos agressivos com aqueles que não obterão benefício devemos estudar minuciosa mente cada caso utilizando adequadamente os índices de prognóstico Sabemos que al guns índices se encontram bem documentados na literatura médica e podem ajudarnos a nortear e definir nossas condutas Outros ainda estão sendo definidos adequadamente por meio de vários estudos O KPS a síndrome de anorexia e caquexia a presença de disp neia e os fatores metabólicos como hipercalcemia hiponatramia leucocitose linfopenia servem como guia para os profissionais e podem ser mensuradas por meio de escalas No Brasil o Palliative Prognostic Score PaP score já se encontra validado e pode ser consi derado uma das melhores ferramentas atuais para a avaliação prognóstica4 10 12 13 Quando falamos de futilidade terapêutica em Cuidados Paliativos devemos lembrar de algumas questões importantes o tratamento para a cura da doença foi finalizado por ser considerado fútil ou seja tais pacientes já se encontram com suas possibilidades terapêuticas limitadas os índices de prognóstico servem para nortear nossa conduta mas são apenas um com plemento ao estudo individual Várias dúvidas surgem nos profissionais da área quando começamos a avaliar determina da ação como fútil portanto algumas questões necessitam de esclarecimento quais as implicações em se suspender um tratamento considerado fútil É importan te saber que os profissionais não são obrigados a instituir tratamentos que considerem ineficazes Porém não devemos apenas dizer não mas dialogar com paciente quando suas condições clínicas permitirem e familiares proporcionando ferramentas para com preender e decidir Os médicos devem sempre estar convencidos de que o cuidado nunca é fútil e precisam estar aptos portanto a distinguir entre um tratamento agressivo e o que proporciona conforto Nesse contexto é importante que a família esteja ciente de tudo o que acontece com o paciente11 o que é importante para que e a família não insista na futilidade terapêutica Os fami liares precisam sentirse incluídos no processo decisório saber a importância de se evitar o prolongamento da morte receber explicações claras sobre o papel familiar ajudar para chegar a um consenso e uma informação de qualidade em boa quantidade e no momento adequado8 como saber quando um tratamento é fútil em Cuidados Paliativos Para nortear nossa conduta devemos sempre responder as seguintes perguntas qual o prognóstico do paciente 198 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP que benefício trará tal medida ao paciente beneficência que danos tal medida poderá acarretar nãomaleficência qual a opinião do paciente e da família a respeito autonomia que implicações tal conduta trará aos outros pacientes justiça Com esses parâmetros teremos mais condições de definir a conduta a ser tomada Acreditamos que os procedimentos que mais ocasionam dúvidas não são quimiote rapia radioterapia ou cirurgias pois quando conhecemos bem a evolução das doenças nossas dúvidas são mais facilmente sanadas A seguir serão abordados separadamente os procedimentos que mais angustiam os profissionais Ressuscitação cardiopulmonar A escolha pela ordem de não ressuscitar ONR ainda é pouco discutida com os pacien tes em nosso país Nos EUA mediante as informações passadas a respeito do prognóstico pela equipe assistente na figura do médico o paciente escolhe se quer ou não ser subme tido a manobras de ressuscitação No Brasil essas questões estão apenas engatinhando por meio da bioética e do conceito de autonomia Entretanto nossa prática médica ainda muito paternalista propicia imensa dificuldade em aceitar a ideia de não ressuscitar Para nossos pacientes optar pela ONR significa escolher morrer A aceitação da morte não ocorre no mesmo momento nem da mesma forma para os indivíduos Muitas vezes paciente família veem na ressuscitação pulmonar RCP uma última chance para continuar vivendo O ideal é que a decisão seja tomada em conjunto paciente família e equipe que tem como pa pel principal o fornecimento do conhecimento técnico que irá auxiliar na tomada de decisão Precisamos esclarecer aos envolvidos que após as manobras de RCP não surgirão alternativas milagrosas para o controle da doença e as perspectivas de prognóstico não se alterarão2 24 Optar pela ONR não é sinônimo de eutanásia ou suicídio assistido mas uma opção consciente pela melhor conduta com a intenção de viver da melhor forma possível não sendo realizadas manobras invasivas e agressivas para manutenção de funções e sinais vitais que não traduzem uma vida com mínima qualidade quando chegar o fim Alguns serviços de Cuidados Paliativos já possuem bem embasadas e documentadas suas políticas de nãoressuscitação esclarecendo ao paciente no momento de seu ingres so no serviço e implicando a aceitação prévia desse conceito para o seu acompanhamen to No Brasil essa ainda é uma questão que embora bem organizada nos preceitos dos Cuidados Paliativos e da bioética gera controvérsia do ponto de vista jurídico ou mesmo junto aos conselhos profissionais Conselho Regional de Medicina CRM ou Conselho Federal de Medicina CFM Ventilação mecânica A ventilação mecânica em nosso contexto pode ser dividida em duas esferas quando não implementamos a ação ou seja não intubamos o paciente e quando retiramos a ação ou seja extubamos o paciente que se encontrava previamente no respirador Em nosso país a questão da extubação sequer aparece nas discussões pois está intimamente ligada às interpretações duvidosas sobre eutanásia Nos Estados Unidos essa prática embora não seja tão frequente aparece bem documentada e é bastante diferenciada da eutanásia19 Neste estudo será abordada apenas a questão da nãointubação 199 Sabemos que grande parte de nossos pacientes apresentará dispneia em seus mo mentos finais seja por doença primária secundária ou mesmo pela fadiga intensa Nesses casos colocar o paciente em prótese ventilatória não só implica futilidade te rapêutica pois sabemos da nãoreversibilidade do quadro com o uso do procedimento como pode implicar distanásia pois estaremos prolongando o sofrimento dele Nesses casos possuímos um grande arsenal terapêutico para o controle da dispneia e caso nada gere o resultado esperado podemos lançar mão da sedação paliativa cuja tarefa é controlar sintomas refratários que não podem ser controlados de outra forma É uma ação restrita com indicações específicas e que deve ser ministrada por profissional habilitado tecnicamente porém já se apresenta amplamente conhecida no cenário dos Cuidados Paliativos mundial e muito bem documentada na literatura científica3 14 17 18 25 Com isso teremos a certeza do nãosofrimento do paciente e de seus familiares que deverão estar esclarecidos quanto ao procedimento e a segurança da nãoobsti nação terapêutica ou distanásia Hidratação artificial A hidratação artificial tem sido um desafio constante na prática dos Cuidados Paliati vos até mesmo para os médicos pois a ideia de que podemos estar sendo negligentes com a sua retirada ainda paira no ar Sabemos porém que pacientes na fase final da vida não se beneficiarão da hidratação artificial e muitas vezes podem ser prejudicados por ela O fornecimento de fluidos pode aumentar a secreção broncopulmonar gerando esfor ço respiratório e até mesmo dispneia a quantidade de líquidos cavitários como derrame pleural e ascite o grau de edema periférico em geral pacientes nesse momento apre sentam hipoalbuminemia intensa o aumento de secreção gástrica podendo ocasionar episódios eméticos de diurese que piora o desconforto do paciente à mobilização e por fim a sobrecarga circulatória2 5 A maior queixa nesses pacientes é a xerostomia boca seca mais relacionada com o uso de medicações do que com a própria desidratação Tal queixa é mais bem combatida com a atuação da equipe de enfermagem e os cuidados locais com a cavidade oral do que com hidratação artificial Alguns pacientes podem evoluir com delirium e nesses casos temos de excluir as causas mais comuns hipoxemia febre medicações e por fim desidratação Nutrição artificial A suspensão ou nãointrodução da dieta em nossos pacientes é uma questão bastante angustiante principalmente para os familiares pois a questão da alimentação está inti mamente ligada ao cuidado para eles Não há estudos randomizados sobre alimentação artificial em pacientes com neopla sia avançada porém estudos observacionais evidenciam que não há melhoria na qualida de de vida dos doentes em fase final quando recebem alimentação por sonda enteral2 A nutrição parenteral total NPT também não demonstra benefício na sobrevida nem mesmo resposta ou tolerância maior à quimioterapia paliativa Entretanto esses pacien tes apresentam risco de febre e infecção quatro vezes maior 2 Há muitas complicações no suporte nutricional seja enteral ou parenteral O cate 200 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP ter venoso central é associado a complicações como pneumotórax hidrotórax sepsis e trombose venosa O cateter enteral pode causar epistaxe necrose da asa do nariz bron coaspiração obstrução de vias aéreas sinusite náusea vômito e diarreia dependendo da quantidade qualidade e velocidade de infusão da dieta15 Em seus últimos dias de vida o metabolismo encontrase alterado e o gasto de ener gia dispensado para a digestão mesmo de pequena quantidade de alimento tornase muito oneroso para os pacientes No estado de jejum o glicogênio é quebrado para a produção de glicose essencial para o metabolismo cerebral enquanto tecidos periféricos são capazes de utilizar ácidos graxos como combustível Quando o glicogênio se esgota aminoácidos musculares po dem ser utilizados para produzir glicose por meio da neoglicogênese hepática O jejum por tempo prolongado mais de uma semana torna o cérebro capaz de utilizar cetonas como fonte de energia A cetonemia marcadamente suprime neoglicogênese preservan do assim o músculo esquelético Ela também provoca estado de euforia proporciona alí vio da dor provavelmente por meio da liberação de substâncias endógenas opioideslike e principalmente é marcadamente importante para suprimir a fome Se for revertida mesmo que por alguns momentos com até 400 calorias por dia a dor aumenta e a fome volta Portanto há uma forte razão fisiológica para não tentarmos reverter a cetonemia do paciente em seus últimos dias salvo se houver algum processo reversível em jogo2 Conclusão Não possuímos ainda diretrizes nacionais que respaldem nossa prática nossos da dos são precários e a prática pouco difundida Baseamonos sempre em estatísticas es trangeiras embora tenhamos grande número de pacientes atendidos diariamente Faz se necessário construir rotinas consistentes e direcionadas ao nosso perfil de pacientes principalmente no que diz respeito ao perfil socioeconômico pois no aspecto clínico não diferem dos demais Este artigo teve como objetivo trazer a questão dos procedimentos sustentadores de vida em Cuidados Paliativos tema que é de suma importância no momento em que começamos a ganhar um espaço cada vez maior no meio médico atual Não se tem aqui a pretensão de esgotar o assunto mas iniciar uma discussão longa e produtiva para que as ações sejam cada vez mais uniformes e benéficas para os pacientes Referências 1 BEAUCHAMP T L CHILDRESS J F Princípios de ética biomédica São Paulo Edições Loyola 2002 2 BERGUER A M SHUSTER J L Jr VON ROENN J H Principles and practice of palliative care and supportive oncology USA Lippincott Williams Wilkins 3 ed 2007 3 Definition of sedation for symptom relief a systematic literature review and a proposal of operational criteria Journal of Pain and Symptom Management v 24 n 4 2002 4 DEN DAAS N Estimating length of survival in endstage cancer a review of literature J Pain Symptom Manage v 10 n 7 p 54855 1995 Comment In J Pain Symptom Manage v 12 n 4 p 205 1996 5 ELLERSHAW J SUTCLIFFE J SAUNDERS C Dehydration and the dying patient J Pain Symptom Manage v 10 n 3 p 1927 1995 6 Ética Prática Peter Singer São Paulo Martins Fontes 2002 7 Fundamentos da Bioética Engelhardt Edições Loyola São Paulo Brasil 1998 8 GARROS D Uma boa morte em UTI pediátrica Isto é possível J Pediatr v 79 suppl 2 p S358 2003 201 9 GRUENIGEN V E DALY B Futility clinical decisions at the endoflife in women with ovarian cancer Gynecologic Onclogy v 97 p 63844 2005 10 HIGGINSON I J CONSTANTINI M Accuracy of prognosis estimates by four Palliative Care teams a prospective cohort study BMC Palliat Care v 1 n 1 p 1 2002 11 KASMAN D When is Medical Treatment Futile J Gen Intern Med v 19 n 10 p 10536 2004 Comment In J Gen Intern Med v 19 n 10 10667 2004 12 MALTONI M AMADORI D Prognosis in advanced cancer Hematol Oncol Clin North Am v 16 n 3 p 71529 2002 13 MALTONI M et al Clinical prediction of survival is more accurate than the Karnofsky performance status in stimating life span in terminally ill cancer patients Eur J Cancer v 30A n 6 p 7646 1994 14 MERCADANTE S DE CONNO F RIPAMONTI C Propofol in terminal care J Pain Symptom Manage v 10 n 8 p 63942 1995 15 MITCHELL S L KIELY D K HAMEL M B Dying with advanced dementia in the nursing home Arch Intern Med v 164 p 3216 2004 16 MONTEIRO F Ventilação mecânica e obstinação terapêuticaa dialética da alta tecnologia em medicina intensiva Rev Port de Pneumol v 12 n 3 p 28191 2006 17 MORITA T MIOSHY M Efficacy and Safety of Palliative Sedation Therapy a multicenter prospective observational study conducted on specialized palliative care units in Japan J Pain Symptom Manage v 30 v 4 p 3208 2005 18 MORITA T MIOSHY M Ethical validity of palliative sedation therapy a multicenter prospective observational study conducted on specialized palliative care units in Japan J Pain Symptom Manage v 30 v 4 p 30819 2005 19 OMAHONY S et al Ventilator withdrawal procedure and outcomes Report of a collaboration between a critical care division and a palliative care service J Pain Symptom Manage v 26 p 95461 2003 20 PELLEGRINO E D Decisions to withdraw lifesustaining treatment a moral algorithm JAMA v 283 n 8 p 10657 2000 Comment In JAMA v 284 n 11 p 13801 2000 author reply 13812 21 PINTO C S Quando o tratamento oncológico pode ser fútil Do ponto de vista do Paliativista Rev Bras de Cancerologia v 54 n 4 p 3936 2008 22 REGO S PALÁCIOS M A finitude humana e a saúde pública Rio de Janeiro Cad Saúde Pública v 22 n8 2006 23 TROTOCHAUD K Medically Futile treatments require more than going to court TCM p 604 2006 24 URBAN C A et al Implicações éticas das ordens de não ressuscitar São Paulo Rev Assoc Med Bras v 47 n 3 2001 25 VERKERK M et al A national guideline for palliative sedation in the Netherlands J Pain Symptom Manage v 34 n 6 p 66670 2007 202 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Sedação paliativa CéliA mAriA KirA Introdução É muito bem documentado pela literatura que pacientes numa fase avançada de doença oncológica ou não apresentam vários sintomas causadores de intenso sofrimento que podem ser físicos como dor dispneia constipação psicoemocio nais como agonia ou delirium ou espirituais desesperança Se não adequadamente tratados esses sintomas geram mais angústia e sofrimento ao paciente e aos seus familiares e quando há refratariedade no seu controle a sedação paliativa é uma opção de tratamento Dados da literatura mundial mostram que a prevalência de sedação paliativa varia en tre 16 e 52 No estudo de Ventafridda et al30 a sedação para controle de sintomas em pacientes domiciliares ocorreu em 52 Fainsinger et al9 no Canadá em uma unidade de Cuidados Paliativos encontraram prevalência de 16 de sedação Em hospices Morita et al17 no Japão descreveram 48 de sedação enquanto Fainsinger11 na África do Sul encontrou uma taxa de 30 e Chiu et al6 em Taiwan relataram 20 de pacientes sedados No Brasil na enfermaria de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo HSPESP Ferreira14 encontrou prevalência de sedação paliativa de 367 A variação entre os percentuais de prevalência de sedação paliativa nos diversos es tudos é devida à diferença entre as populações estudadas sintomas refratários tipo de doença aspectos socioculturais e religiosos tipo de ambiente Atualmente a sedação paliativa ainda é confundida com eutanásia mascarada e suicídio assistido por alguns profissionais da área da saúde bem como por pacientes e familiares por acreditarem que tal procedimento apresse a morte do paciente Normal mente a sobrevida após o início da sedação paliativa é muito pequena variando de horas a poucos dias10 12 21 29 Vários trabalhos mostram que não há diferenças significativas na sobrevida entre os pacientes que receberam sedação paliativa e os que não necessitaram de sedação em unidades de Cuidados Paliativos19 21 Segundo Stone27 a necessidade de sedação paliativa sugere mais um indicador de uma morte iminente que a causa de uma morte prematura Também não existe padronização do procedimento Os motivos pelos quais se indi ca a sedação paliativa o momento mais adequado para sua introdução as medicações escolhidas a dose das drogas a via de administração e a duração da sedação são muito variáveis entre os serviços de saúde Sedação paliativa se faz com drogas sedativas e não com drogas analgésicas ou coquetel de drogas aleatórias Não se deve usar a meperidina Dolantina pelos seus vários efeitos colaterais e seu baixo poder analgésico assim como não se usam soros M1 M2 etc Pretendese neste capítulo orientar o profissional da saúde quanto à melhor indicação e ao uso da sedação paliativa caso esse procedimento seja uma opção de tratamento para o seu paciente 203 Conceitos Sedação paliativa é a administração deliberada de fármacos em doses e combinações necessárias para reduzir o nível de consciência com o consentimento do paciente ou de seu responsável e possui o objetivo de aliviar adequadamente um ou mais sintomas refratários em pacientes com doença avançada terminal2 1826 Sedação terminal foi o primeiro termo utilizado para nomear a sedação paliativa porém tem sido abandonado nos últimos anos devido à falta de clareza da palavra ter minal que pode estar associada ao paciente ou ao objetivo da sedação terminar a vida18 Considerase sintoma refratário tudo o que não pode ser adequadamente controlado apesar de repetidas e intensas tentativas de tratamento tolerável que não comprometa o nível de consciência Os critérios diagnósticos para designar sintoma refratário incluem a despeito de outras possíveis intervenções invasivas e nãoinvasivas no controle desses sintomas incapacidade de promover alívio adequado associação às excessivas e intoleráveis morbidades aguda e crônica improvável obtenção de alívio em curto prazo5 15 Sugerese que a determinação da refratariedade do sintoma deva ser sempre que possível um consenso entre os membros da equipe que cuida o maior número possível de membros eou deve haver uma consultoria com outros especialistas Um exemplo prático de sintoma refratário é o paciente com intensa dispneia provocando sofrimento e ansiedade para si próprio e seus familiares A despeito de todas as tentativas de tratamento se a dispneia e o estresse persistirem depois de um tempo razoável devese começar a aceitar a refratariedade do sintoma e prescrever uma sedação O objetivo nesse momento é diminuir o estresse mental do paciente causado pela sensação de sufocamento e ansiedade gerada pela perda de controle da situação ora vivenciada Não se deve confundir sintoma refratário com sintoma difícil5 15 o qual é concei tuado como o sintoma que para ser adequadamente controlado precisa de intervenção terapêutica intensiva além das medidas habituais tanto farmacológicas quanto instru mentais e psicológicas22 Muitos sintomas considerados refratários por médicos ge neralistas como por exemplo delirium induzido por medicamentos ou quadro delirante por outras causas desidratação distúrbios eletrolíticos infecção nãoaparente podem ser controlados adequadamente por médicos com treinamento e habilidades adequados ou especialista na área Stoutz e Bruera28 demonstraram que o rodízio de opioides redu ziu a necessidade de sedação para controle dos sintomas induzidos pela sua toxicidade mioclonia alucinações delírio náuseas vômitos e dor persistente De 80 pacientes que alternaram opioides nesse estudo 73 se beneficiaram com a conduta Considerações éticas em sedação paliativa A grande controvérsia ética da sedação paliativa ocorre porque as pessoas leigas assim como os profissionais da área da saúde desconhecem os princípios dos Cuidados Paliativos e associam erroneamente este procedimento à eutanásia8 20 As principais distinções entre sedação paliativa e eutanásia23 26 são apresentadas no Quadro 1 204 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Apesar de a palavra sintoma geralmente denotar doença física por exemplo dor e dispneia Cherny e Portenoy5 reconhecem o sofrimento psicoexistencial como um sinto ma Entretanto a sedação paliativa nesse tipo de sofrimento é ética e moralmente proble mática para a maioria dos médicos pois pacientes em sofrimento existencial podem estar acordados alertas lúcidos e sem sintoma físico associado Morita19 em 2004 descreveu os efeitos benéficos da sedação paliativa para o alívio de sofrimento psicoexistencial administrada em 90 casos prevalência de 1 Os principais sintomas de sofrimento em seu estudo foram desesperança dependência e inabilidade para o autocuidado medo ansiedade e pânico da morte desejo de controlar o momento da morte isolamento e ausência de suporte social Brandão1 levanta a questão da necessidade de reflexão do médico diante da situação de incurabilidade e morte próxima Antes de sedar o paciente deverseiam sedar os próprios sintomas e sentimentos de angústia ansiedade frustração impotência onipo tência falta de informação e medo da própria morte A sedação paliativa tem dois efeitos o desejado reduz os sofrimentos físico e psico lógico e o indesejado pode diminuir o tempo de vida do paciente O princípio do duplo efeito16 22 torna a sedação paliativa moralmente aceita uma vez que a intenção alívio do sofrimento tem mais importância que a consequência diminuição do tempo de vida privação da consciência no julgamento ético desse procedimento Em outras palavras o princípio da beneficência tem precedência sobre o da nãomaleficência Classificação Porta22 sugere uma classificação didática quanto à sedação paliativa com base em objetivo temporalidade e intensidade como pode ser visto no Quadro 2 A sedação paliativa nem sempre é administrada de forma primária contínua e pro funda A administração de uma droga sedativa não necessariamente significa supressão permanente do nível de consciência E é necessário lembrar que o objetivo final dessa sedação é aliviar o estresse e promover conforto O nível de sedação deve ser titulado em função de cada paciente e do alívio de seu sintoma ou estresse sedação proporcionada Indicações de sedação paliativa Os sintomas refratários mais comuns relatados na literatura são delírio agitado disp neia e dor Qualquer outro sintoma se diagnosticado como refratário pode e deve ser Quadro 1 Distinção entre sedação paliativa e eutanásia Sedação paliativa Eutanásia Intenção Aliviar sintoma refratário Provocar a morte para cessar o sofrimento Processo drogas e doses Drogas sedativas ajustadas à resposta do paciente Drogas letais que garantam uma morte rápida Objetivo Alívio do sofrimento Morte rápida 205 Quadro 2 Classificação da sedação paliativa Objetivo Sedação primária a finalidade da intervenção terapêutica é a diminuição do nível de consciência Sedação secundária o rebaixamento do nível de consciência é consequência do efeito farmacológico da medicação usada para controlar um sintoma específico como ocorre por exemplo nos tratamentos da dor uso de opioides e do delírio uso de neurolépticos Temporalidade Sedação intermitente é aquela que permite períodos de alerta do paciente Sedação contínua a diminuição do nível de consciência ocorre de forma permanente Intensidade Sedação superficial mantém um nível de consciência no qual o paciente ainda pode se comunicar verbalmente ou não Sedação profunda a que mantém o paciente em estado de inconsciência sedado paliativamente náusea e vômitos hemorragia maciça convulsão mioclonia in sônia prurido angústia medo pânico ansiedade terror7 1012 21 27 As circunstâncias que envolvem a prescrição de uma sedação paliativa são geral mente cercadas de emoções dor total sofrimento angústia o que pode dificultar uma abordagem correta com a família sobre procedimento e clareza de decisões Em Cuidados Paliativos podemos ter três situações clínicas distintas às vezes superpostas doença avançada terminal com sintomas refratários quadro agudo ameaçador da vida em tempo curto e morte iminente com sofrimento intenso O tipo da sedação a droga escolhida a dose a via e a taxa de administração dos sedativos vão variar conforme a necessidade clínica de cada paciente Alguns necessitarão de sedação em momentos particulares es pecíficos do dia ou da noite enquanto outros necessitarão de sedação mais contínua Porta23 faznos refletir sobre os aspectos clínicos da sedação paliativa como proce der nessas situações e acerca da importância de esclarecer e obter o consentimento para o procedimento No caso de sintomas refratários a equipe de saúde deve ser capaz de explicar ao paciente e aos seus familiares de maneira compreensível razoável e sensível o que está acontecendo da necessidade de uma mudança de estratégia de tratamento e tentar obter o consentimento Quando o paciente está consciente e lúcido devese respeitar sua autonomia quando não é mais autônomo recomendase tentar saber sobre seus desejos e valores prévios e obter consentimento da família Quando ele não possui família ou essa se sente incapaz de tomar tal decisão a equipe de saúde deve agir de acordo com o interesse do paciente e assegurarlhe seu bemestar Todas as decisões devem sempre ser registradas no prontuário médico bem como suas justificativas Pacientes com quadros agudos ou inesperados evoluindo para uma situação ameaçadora da vida como hemorragia maciça ou tromboembolismo pulmonar maciço necessitarão ser sedados mais rapidamente Nessa situação o tempo é curto e é mais difícil conseguir o consentimento porém devese tentar obtêlo Em geral os familiares aceitam a decisão médica recomendada Felizmente esses quadros agudos não são fre quentes e muitas vezes o paciente falece antes de receber a sedação 206 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A terceira situação clínica a da morte iminente pode ser percebida por qualquer membro da equipe de saúde pelo próprio paciente e até mesmo por familiares O pa ciente já apresenta sinais de diminuição da atividade como um todo além de dificul dade respiratória e agitação A intenção nesse caso quando há sofrimento intenso associado é propiciar uma morte mais tranquila e digna A família também deve estar envolvida no processo decisório da sedação paliativa seja ela superficial ou profunda Lembramos que na maioria das vezes a morte ocorre sem a necessidade de sedar o paciente No Quadro 3 sugerese uma lista de situações em que a sedação paliativa é uma opção terapêutica Antes de iniciar uma sedação paliativa várias questões devem ser respondidas para garantir que essa seja a opção mais adequada3 as quais estão listadas no Quadro 4 Quadro 3 Indicações de sedação paliativa Sintomas refratários delírio agitado agitação terminal ou inquietude refratária a neurolépticos dor refratária a opioides e analgésicos adjuvantes vômitos refratários à agressiva terapêutica antiemética dispneia refratária a oxigênio broncodilatadores e opioides sofrimento psicológico ou existencial refratário à intervenção apropriada antidepressivos suporte religioso e espiritual Quadro agudo ameaçador da vida em tempo curto Morte iminente horas a dias com sofrimento intenso leia o texto com cuidado Quadro 4 Questões a serem respondidas antes da indicação da sedação paliativa3 Todos os esforços foram feitos para identificar e tratar as causas reversíveis geradoras do sofrimento Interconsultas foram realizadas com equipe em Cuidados Paliativos eou com outros especialistas Todas as abordagens nãofarmacológicas já foram aplicadas como por exemplo técnicas de relaxamento e distração para ansiedade e dispneia Todos os outros tratamentos farmacológicos foram aplicados como por exemplo titulação adequada de opioides no caso de dispneia ou dosagem adequada de neurolépticos para o delírio agitado Sedação intermitente foi considerada nos casos de delirium potencialmente reversíveis ou nos casos de sofrimento psicoexistencial extremo Os objetivos da sedação foram explicados e discutidos com o paciente e seus familiares A sedação foi consensual paciente família e equipe 207 Um algoritmo para tomada de decisão na indicação de sedação paliativa25 é sugerido na Figura 1 Medicações utilizadas em sedação paliativa Na literatura os principais sedativos utilizados são benzodiazepínicos midazolam diazepam lorazepam neurolépticos levomepromazina clorpromazina haloperidol barbitúricos fenobarbital anestésicos propofol ketamina Figura 1 Algoritmo para indicação de sedação paliativa Traduzido e adaptado de Sedación Paliativa25 Sintomas refratários Sofrimento insuportável Prognóstico limitado Sem outras opções de tratamento sem comprometer o nível de consciência Consulta com especialista Competência do paciente Dúvidas SIM SIM NÃO Valorizar o desejo da família 1o Vontades antecipadas diretrizes prévias 2o Valores e desejos prévios história clínica 3o Família agregados Desejo explícito do paciente SIM Consentimento informado verbal ou escrito Compartilhar a decisão com a equipe Registrar no prontuário INDICAR SEDAÇÃO PALIATIVA SIM Dúvidas Consulta com especialista 208 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 5 Sugestão de soro com midazolam Midazolam 10 ml 50 mg SG ou SF 240 ml Para uma concentração de midazolam 02 mgml SG soro glicosado SF soro fisiológico O midazolam é o sedativo mais frequentemente referido na literatura para indu ção de sedação paliativa e entre os benzodiazepínicos o mais utilizado É facilmente titulável com rápido início de ação 2 minutos após administração intravenosa IV e curta duração 15 a 25 horas Pode ser administrado por via subcutânea SC em bolus em infusões contínuas IV e SC não se precipitando se usado no mesmo soro com a morfina A dose máxima recomendada é de 120160 mgdia pois acima desse nível não ocorre mais inibição dos receptores do ácido gamaaminobutírico GABA havendo então necessidade de associar outra droga O uso concomitante com algumas medicações carbamazepina fenitoína rifampicina pode resultar em rápida diminuição da ação do midazolam em um curto período de tempo Entretan to a associação a outras drogas inibidoras do P450 3A4 cetoconazol itraconazol fluconazol eritromicina azitromicina diltiazem verapamil saquinavir cimetidina ranitidina pode levar a sedação profunda mesmo com uma dose relativamente baixa do midazolam Uma sugestão prática de preparação do midazolam no soro é apresentada no Quadro 5 A levomepromazina é a droga neuroléptica mais citada na literatura porém a clor promazina é mais utilizada no Brasil em função de ser disponível aqui sua aplicação IV e SC Ferreira14 recomenda que a sedação paliativa da dispneia refratária seja iniciada com a associação de midazolam e morfina A morfina é um opioide forte com ação primaria mente analgésica e nãosedativa Apesar de não existir um sítio de ação específico na dispneia acreditase em ação em receptores de opioides distribuídos na árvore traqueo brônquica e no tronco cerebral centro respiratório modulando percepção e ansiedade4 Aos pacientes que apresentarem efeito paradoxal ao midazolam ou sedação difícil suge rese a associação de um neuroléptico clorpromazina a um opioide e benzodiazepínico Para a paliação do delírio agitado refratário iniciar com um neuroléptico clorpromazina e nos casos de efeito paradoxal a essa droga ou sedação difícil associar o midazolam Para a dor refratária manter o opioide já prescrito associálo ao midazolam e nos casos de efeito paradoxal ao benzodiazepínico ou de sedação difícil adicionar um neuroléptico clorpromazina Por ausência de evidência suficiente na literatura não há recomendações específicas a res peito do uso de drogas sedativas podendose estabelecer recomendações gerais Não há des crição de doses máximas dos sedativos exceto para o midazolam uma vez que cada paciente necessitará de uma dose distinta Cherney e Portenoy5 recomendam iniciar com a dose mínima do sedativo suficiente para paliar o sintoma ajustandoa conforme as reavaliações periódicas A via SC é sempre mais cômoda e prática caso o paciente não tenha acesso venoso Uma sugestão prática na utilização dessas drogas foi compilada a partir de dados da literatura3 14 15 24 25 e está indicada no Quadro 6 209 Quadro 6 Sugestões de drogas em sedação paliativa Drogas Sintomas Dose Observações MIDAZOLAM Ampola de 3 ml 5 mgml Dor dispneia delírio agitado sofrimento psíquico Indução bolo de 255 mg Iniciar infusão contínua SC 0408 mgh Máxima diária 160200 mg Resgate bolus de 255 mg Dose máxima de 120160 mgdia Interação com outras drogas ver texto LEVOMEPROMAZINA Ampola de 5 ml 5 mgml no Brasil disponível em gotas ou comprimidos Delírio como sintoma predominante Indução bolo de 12525 mg Iniciar infusão contínua SC 100 mgdia Resgate bolus de 125 mg Usos VO e SC Dose máxima diária 300 mg CLORPROMAZINA uso mais comum no Brasil Ampola de 5 ml 5 mgml Delírio como sintoma predominante 12550 mg a cada 412 h VOIV Dose máxima 25375 mgdia HALOPERIDOL Ampola de 1 ml 5 mgml Delírio 255 mg de 1212 h SC Dose máxima de 510 mgdia FENOBARBITAL Ampola de 2 ml 100 mgml Dor dispneia delírio agitado sofrimento psíquico Indução bolo de 2 mgkg lento Iniciar infusão contínua SC 600 mg24 h Infusão contínua IV 1 mgkg Indução bolo de 100200 mg seguido de 40 mgh SCIV sn Antes de iniciar a infusão suspender benzodiazepínicos e neurolépticos Reduzir opioides pela metade PROPOFOL Ampola de 20 ml 10 mgml Necessidade de supervisão de um médico anestesista ou treinado Refratariedade a outros sedativos Indução bolo de 115 mgkg Iniciar infusão contínua IV 2 mgkgh Resgate bolo com metade da dose da indução Antes de iniciar a infusão suspender benzodiazepínicos e neurolépticos e reduzir opioides pela metade Somente uso IV e não misturar com outras drogas KETAMINA Ampolas de 2 ml 50 mgml Dor e refratariedade a outros sedativos 515 mg SC Bloqueio de receptores NMDA Dobrar dose se houve uso prévio de benzodiazepínico SC subcutânea VO via oral IV intravenoso sn se necessário NMDA nmetilDaspartato 210 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 7 Drogas em sedação paliativa Midazolam Clorpromazina Haloperidol Iniciar com 061 mghora 1524 mgdia 25375 mgdia 510 mgdia Soro SG ou SF a 09 250 ou 500 ml Midazolam 5 mg ou 75 mg IV ou SC 88 h No mesmo soro do midazolam No mesmo soro do midazolam SG soro glicosado SF soro fisiológico IV intravenoso SC subcutâneo Outra sugestão de esquema de sedação paliativa é o utilizado no HSPESP14 Quadro 7 Nos casos em que o paciente tenha indicação inicial de sedação profunda reco mendase o esquema do Edmonton General Hospital apresentado no Quadro 812 13 Iniciase com 14 mgh aumentando progressivamente até atingir o nível de sedação desejada Quadro 8 Esquema de sedação do Edmonton General Hospital SG 5 ou SF 09 100 ml IV ou SC em infusão contínua Midazolam 100 mg SG soro glicosado SF soro fisiológico IV intravenoso SC subcutâneo A sedação paliativa intermitente pode ser realizada no domicílio benzodiazepíni co neuroléptico por via oral VO ou SC Nos casos de sedação contínua e profunda a realização é recomendada em ambiente hospitalar pela necessidade da titulação das drogas e reavaliações clínicas frequentes Alguns sintomas de natureza dramática como hemorragia maciça dispneia e vômitos incoercíveis são mais facilmente controlados em ambiente hospitalar Um algoritmo para a escolha do tratamento farmacológico em sedação paliativa25 tanto para uso hospitalar quanto domiciliar com base no sintoma predominante está demonstrado na Figura 2 Uma vez prescrita a sedação paliativa algumas ações devem ser efetivadas3 14 e es tão compiladas no Quadro 9 No Quadro 10 encontrase a escala de Ramsay Para finalizar alguns lembretes importantes sobre sedação paliativa13 14 estão no Quadro 11 211 Figura 2 Algoritmo para a escolha do tratamento farmacológico em Sedação Paliativa Traduzido e adapta do de Sedación Paliativa25 SC via subcutânea IV via intravenosa Quadro 9 Ações após o início da sedação paliativa Reavaliação sintomática quanto ao tipo e à dose da medicação escolhida individualizada com monitorização contínua e regular do processo para ajuste da sedação Titulação da dose sedativa utilizando a escala de avaliação de Ramsay Manter as medidas de higiene e conforto Manter as medicações para controle de dor opioides Suspender medicações nãoessenciais vitaminas hormônios tireoidianos etc ou tratamentos médicos ineficazes para o bemestar do paciente Atentar para retenção urinária e impactação fecal fecaloma que geram grande desconforto nos pacientes sedados Orientar os familiares que a sedação paliativa não é o mesmo que eutanásia e não apressa a morte Orientar os familiares quanto aos sinais do processo da morte ronco da morte sororoca cianose de extremidades mudança da cor da pele hipotensão e diminuição da diurese Fornecer suportes psicológico e espiritual à família Proporcionar presença da equipe que cuida compreensão privacidade e disponibilidade Delírio Domicílio SC 1a opção midazolam clorpromazina 2a opção fenobarbital 1a opção levomepromazina clorpromazina Que sintoma predomina Dor Dispneia Hemorragia Ansiedade Pânico Outros Indicada sedação 2a opção Hospital IV midazolam levomepromazina clorpromazina propofol fenobarbital SC midazolam clorpromazina fenobarbital Domicílio SC midazolam fenobarbital Hospital IV midazolam propofol fenobarbital SC midazolam fenobarbital 212 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 10 Escala de Ramsay Nível I agitado angustiado Nível II tranquilo orientado e colaborativo Nível III resposta a estímulos verbais Nível IV resposta rápida a estímulos dolorosos Nível V resposta lenta a estímulos dolorosos Nível VI sem resposta Quadro 11 Lembretes importantes sobre sedação paliativa Cada paciente deve receber o sedativo e a dose adequados para paliar o seu sintoma refratário específico Visar primariamente sedar o sintoma refratário e não o paciente Não usar dolantina Sempre que possível iniciar com a menor dose do sedativo sedação leve Os opioides são drogas primariamente analgésicas e não sedativas A única exceção a essa regra é a associação da morfina ao midazolam para sedação paliativa da dispneia refratária Para agitação por efeito paradoxal ou não do midazolam devese associar um neuroléptico haloperidol ou clorpromazina à sedação Em delírio agitado refratário o sedativo inicial deve ser um neuroléptico em doses progressivas somente associar o midazolam nos casos de sedação difícil Referências 1 BRANDÃO C Sedação terminal reflete necessidade de ensino e pesquisa em medicina paliativa e cuidados paliativos Revista Prática Hospitalar v 34 p 4952 2004 2 BRAUN T C HAGEN N A CLARK T Development of a clinical practice guideline for palliative sedation J Palliat Med v 6 p 34550 2003 3 CAPITAL HEALTHCARITAS HEALTH GROUP REGIONAL PALLIATIVE CARE PROGRAM Palliative Sedation Guideline 2005 4 CHAN K S et al Palliative medicine in malignant respiratory diseases In DOYLE D et al orgs Oxford textbook of Palliative Medicine 3 ed Oxford University Press 2005 cap 88 p 587618 5 CHERNY N PORTENOY R Sedation in the management of refractory symptoms guidelines for evaluation and treatment J Palliat Care v 10 p 318 1994 6 CHIU T Y et al Sedation for refractory symptoms of terminal cancer patients in Taiwan J Pain Symptom Manage v 21 p 46772 2001 7 COWAN JD WALSH D Terminal sedation in palliative medicine definition and review of the literature Support Care Cancer v 9 p 4037 2001 8 DICKENS B M Commentary on slow euthanasia J Palliat Care v 12 n 4 p 423 1996 9 FAINSINGER R et al Symptom control during the last week of life on a palliative care unit J Palliat Care v 7 n 1 p 511 1991 10 FAINSINGER R L et al Sedation for delirium and other symptoms in terminally ill patients in Edmonton J Palliat Care v 16 n 2 p 510 2000 213 11 FAINSINGER R L et al Sedation for uncontrolled symptoms in a South African hospice J Pain Symptom Manage v 16 p 14552 1998 12 FAINSINGER R L et al A multicentre international study of sedation for uncontrolled symptoms in terminally ill patients Palliat Med v 14 p 25765 2000 13 FERREIRA S P KIRA C M Sedação paliativa Manuscrito para o Curso de Educação Continuada Módulo de Cuidados Paliativos Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo CREMESP 2006 14 FERREIRA S P Sedação paliativa experiência do programa de cuidados paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo Revista Prática Hospitalar v 47 p 558 2006 15 FÜRST C J DOYLE D The terminal phase In DOYLE D et al orgs Oxford textbook of palliative medicine 3 ed Oxford University Press 2005 cap 18 p 1128 16 GARCIA J L A Double effect In REICH W T ed Encyclopedia of bioethics New York Simon and Schuster 1995 vol 2 p 63641 17 MORITA T INOUE S CHIHARA S Sedation for symptom control in Japan the importance of intermittent use and communication with family members J Pain Symptom Manage v 12 p 328 1996 18 MORITA T TSUNETO S SHIMA Y Definition of sedation for symptom relief a systematic literature review and a proposal of operational criteria J Pain Symptom Manage v 24 p 44753 2002 19 MORITA T Palliative sedation to relieve psychoexistential suffering of terminally ill cancer patients J Pain Symptom Manage v 28 p 44550 2004 20 MOUNT B Morphine drips terminal sedation and slow euthanasia definitions and facts not anecdotes J Palliat Care v 12 n 4 p 317 1996 21 MULLERBUSCH H C ANDRES I JEHSER T Sedation in palliative care a critical analysis of 7 years experience BMC Palliat Care v 2 p 2 2003 22 PORTA J Aspectos éticos de la sedación en cuidados paliativos Med Pal Madrid v 9 p 415 2002 23 PORTA J Clinical aspects of sedation in palliative care in ethics and sedation at the close of life Barcelona Fundación Victor Grifols i Lucas 2003 Disponível em httpwwwfundaciogrifolsorgdocs pub920engpdf Acesso em 24 maio 2009 24 SEDACIÓN EN CUIDADOS PALIATIVOS Disponível em httpwwwsecpalcomguiasmindex phpaccseeguiaidguia8 Acesso em 24 abr 2009 25 SEDACIÓN PALIATIVA In Guia de práctica clínica sobre cuidados paliativos 2008 cap 8 p 10913 Disponível em httpwwwguiasaludesegpccuidadospaliativosresumidadocumentosCuidados20PaliativosResumida pdf Acesso em 24 abr 2009 26 SEPCAL Sedación en cuidados paliativos Sociedad Española de Cuidados Paliativos Disponível em httpwwwsecpalcomguiasmindexphpaccseeguiaidguia8 Acesso em 24 abr 2009 27 STONE P et al A comparison of the use of sedatives in a hospital support team and in a hospice Palliat Med v 11 p 1404 1997 28 STOUTZ N D BRUERA E ALMAZOR M S Opioid rotation for toxicity reduction in terminal cancer patients J Pain Symptom Manage v 10 n 5 p 37884 1995 29 SYKES N THORNS A Sedative use in the last week of life and the implications for endoflife decision making Arch Intern Med v 163 p 3414 2003 30 VENTAFRIDDA V et al Symptom prevalence and control during cancer patients last days of life J Palliat Care v 6 n 3 p 711 1990 214 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do médico na equipe de Cuidados Paliativos leonArdo Consolim O médico tem toda sua formação acadêmica voltada para diagnóstico e trata mento de doenças Quando encontra um paciente necessitado de Cuidados Palia tivos de modo que o foco deixa de ser a doença e passa a ser o doente nos seus âmbitos físico psicológico social e espiritual ele obrigatoriamente tem de rever seus conceitos de saber e aprender a trabalhar em equipe Por melhor que sejam os conhecimentos técnicos do médico ele sozinho não consegue suprir todas as necessidades que o cuidado integral de um paciente e de sua família exige Para que o trabalho em equipe dê os frutos que dele se esperam é importante que cada um de seus integrantes tenha bons conhecimentos sobre sua área além de saber trabalhar com os outros profissionais das diferentes especialidades A chave para o sucesso é a comunicação que vai além das facilidades ou dificuldades in terpessoais ou de áreas afins mas que avança para um planejamento terapêutico realizado por toda a equipe Historicamente as equipes de saúde se organizam de forma hierarquizada em que os diferentes profissionais têm seus trabalhos reconhecidos socialmente de forma diferente mesmo dentro da própria equipe2 3 Nesse contexto o médico é colocado como o detentor do papel predominante Porém se ele aceitar essa situação todo trabalho necessário para que o paciente e sua família tenham sofrimento arrefecido dor controlada e uma vida digna até o final pode não ter o êxito necessário Dentro da sua especificidade o profissional deve realizar os diagnósticos clíni cos conhecer a doença sua história natural os tratamentos já realizados e qual a evolução esperada para aquele paciente naquele momento Se necessário for deve entrar em contato com as outras especialidades médicas que já trataram ou ainda estejam tratando o doente para discutir uma conduta específica A responsabilidade de propor tratamentos medicamentosos ou não que tragam alívio nos sintomas desconfortáveis é do médico Mas talvez a principal tarefa do médico em uma equipe de Cuidados Paliativos seja coordenar a comunicação entre os profissionais envolvidos o paciente e sua família que esperam ouvir do médico informações sobre diagnóstico e prognóstico da doença O profissional da medicina não deve passar para outros integrantes da equipe a responsabilidade de conversar sobre esses aspectos diretamente ligados ao doente e à doença É ainda muito importante que o médico se comunique de forma eficaz com a equipe para que todos os profissionais ao serem questionados pelo paciente e pela família tenham a mesma postura e falem a mesma língua Agindo dessa forma o médico vai funcionar como elemento facilitador para que toda a equipe trabalhe e ajude o paciente a exercer sua autonomia1 Com isso escolhas e decisões passam a ser partilhadas entre paciente família e equipe de Cuidados Paliativos Dessa forma todos se tornam corresponsáveis pela promoção de saúde e de vida cumprindo os propósitos de cuidar do paciente de forma integral individualizada com foco no seu bemestar e na sua qualidade de vida independen temente de quão avançado seja o estado de sua doença 215 Referências 1 PEDUZZI M Equipe multiprofissional de saúde a interface entre trabalho e interação 1998 254p Tese Doutorado Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas São Paulo 1998 2 PEDUZZI M Equipe multiprofissional de saúde conceito e tipologia Rev Saúde Pública v 35 n 1 p 1039 2001 3 SAAR S R C TREVISAM M A Papéis Profissionais de uma equipe de saúde visão de seus integrantes Rev Latinoam Enfermagem v 15 n 1 2007 216 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do enfermeiro na equipe de Cuidados Paliativos FláviA Firmino O processo do cuidar que está inserido na prática profissional do enfermeiro faz in terface com todos os membros da equipe de saúde com a família com a comunidade e também com o ambiente onde ele executa seu trabalho Ele está obrigatoriamente introduzido numa relação direta processual dialógica interativa e subjetiva inerente ao cuidado da vida humana1 A atuação desse profissional compreende tarefas e relações que vão desde a interação com cada cliente até articulações mais complexas com familiares equipe de saúde mul tiprofissional e institucional e permeia diferentes faces do processo de cuidado desde a entrada até a saída do paciente seja pela alta hospitalar seja pelo óbito Especificamente no âmbito dos Cuidados Paliativos o enfermeiro exerce seu papel desenvolvendo ações práticas e gerenciais em maior consonância com toda a equipe de saúde cujos profissionais nesse momento tão específico do tratamento terapêutico convergem seus discursos para a estrutura do cuidado ante a estrutura da cura Temse então um ambiente genuíno para a prática da enfermagem fundamental Tratase de uma abordagem de enfermagem generalizada numa prática médica cli nicamente especializada Nesse espaço clínico o enfermeiro deverá ocupar seu espaço profissional junto à equipe multiprofissional desenvolvendo as habilidades clínicas ine rentes ao controle dos sinais e sintomas e à comunicação genuína para agregar as ações dos diversos profissionais em função do benefício do paciente de sua família e também da instituição Por analogia inferese que o enfermeiro que atua ou atuará nessa área não precisará de maiores competências clínicas nem experiência em lidar com equipe multiprofissional De uma forma muito mais inconsciente do que consciente a desvalorização social do paciente dito terminal é transferida para a enfermeira que dele cuida2 No entanto no que diz respeito à sua competência clínica é necessário destacar a sapiência do enfermeiro no controle da dor visto ser esse um dos sintomas que mais impõem sofrimento aos pacientes dos Cuidados Paliativos Tratase de um desafio a ser vencido com esforços sinceros pois o déficit de conhecimento é realidade também jun to a outros profissionais da equipe de saúde Para esse verdadeiro problema que causa entraves na qualidade dos cuidados à saúde os programas de educação acadêmica e de técnicas médicas precisam unir forças para implementar o ensino e o ambiente em que as práticas da saúde são desenvolvidas O Conselho Internacional de Enfermagem CIE fundado em 1899 reconhece os Cui dados Paliativos como uma questão atual da saúde e da sociedade e também vê neles a importância do controle da dor pela enfermeira em conjunto com a necessidade de prover auxílio no controle dos demais sintomas e prestar apoios psicológico social e espiritual para os pacientes sob seus cuidados O CIE afirma que uma pronta avaliação a identificação e a gestão da dor e das 217 necessidades físicas sociais psicológicas espirituais e culturais podem diminuir o sofri mento e melhorar de fato a qualidade de vida dos pacientes de Cuidados Paliativos e de seus familiares3 Ações objetivas de cunho pragmático como domínio da técnica de hipodermóclise curativos nas lesões malignas cutâneas frequentemente ditas feridas tumorais téc nicas de comunicação terapêutica cuidados espirituais zelo pela manutenção do asseio e da higiene medidas de conforto e trabalho junto às famílias são requisitos fundamentais para a melhor atuação do enfermeiro em Cuidados Paliativos4 As habilidades dos enfermeiros deverão estar voltadas para a avaliação sistemática dos sinais e sintomas para o auxílio da equipe multiprofissional no estabelecimento de prioridades para cada cliente bem como para a própria equipe e para a instituição que abriga o atendimento designado como Cuidados Paliativos na interação da dinâmica familiar e especialmente no reforço das orientações feitas pelos demais profissionais da equipe de saúde de modo que os objetivos terapêuticos sejam alcançados Por isso é que as competências clínica e relacional do enfermeiro recebe destaque nos Cuidados Paliativos Adicionamente tanto para a equipe quanto para o paciente e para a instituição é necessário que o profissional tenha habilidades de comunicação posto que asseguram o melhor desenvolvimento de suas práticas clínicas Referências 1 BOURDIEU P Meditações pascalianas Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2001 2 CASTANHA M L A Invisibilidade da prática de cuidar do ser enfermeiro sob o olhar da equipe de saúde 2004 161f Dissertação Mestrado em Enfermagem Universidade Federal do Paraná Curitiba Paraná 3 CONSELHO INTERNACIONAL DE ENFERMEIRAS Genebra La enfermería importa Cuidados paliativos Página informativa ca2007 Disponível em httpwwwicnchmatterspalliativesppdf Acesso em 21 abr 2009 4 OCONNOR M ARANDA S Guia prático de cuidados paliativos em enfermagem São Paulo Andrei 2008 218 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do psicólogo na equipe de Cuidados Paliativos luAnA visCArdi nunes Introdução Este texto inserese num manual palavra que pertence à classe dos substantivos pequeno livro compêndio mas que passa a adjetivo quando se refere àquilo que é feito ou movido a mão A etimologia dessa palavra remete portanto ao fazer à atividade prática Assim a pergunta que sustenta a discussão que se fará neste texto é o que faz o psicólogo na equipe de Cuidados Paliativos Enfatizar a prática não implica oferecer receitas ou fórmulas prontas nem desbancar a teoria Ao contrário a atividade cotidiana lança indagações e desafios aos quais o psicólogo deve responder criativamente buscando fundamentar seu trabalho num refe rencial teórico consistente psicanálise psicologia analítica psicologia social análise do comportamento etc É no avanço articulado entre teoria e prática que se vai definindo sua identidade na equipe Trabalho em equipe Paralelamente é imprescindível conhecer os princípios dos Cuidados Paliativos O tra balho em equipe é um deles e pressupõe que o psicólogo desenvolva a habilidade de comunicarse com profissionais de outras áreas do conhecimento Parece consensual na bibliografia referente ao tema a ideia de que a interdisciplinaridade requer flexibili dade mas não o apagamento das especificidades Essas últimas são fundamentais para que necessidades distintas médicas sociais psicológicas espirituais etc do doente da família e da equipe possam ser reconhecidas e atendidas pela articulação entre ações de diferentes áreas Para se colocar em condição de participar de trocas efetivas com profissionais de outros saberes é necessário que o psicólogo procure ter clareza sobre as possibilidades e os limites do seu campo de trabalho evitando tomar para si modelos estranhos à sua prática o modelo médico ou o religioso por exemplo É desejável então que o psicólogo identifique o seu objeto de estudo e intervenção reconhecendo o campo epistemológico em que se situa sua prática Integração dos aspectos psicológicos ao tratamento do doente A noção de dor total desenvolvida na década de 1960 pela médica inglesa Cecily Saunders implica diretamente a ação do psicólogo visto que reconhece ao lado das razões orgânicas o fator emocional além do social e espiritual acrescentaria Saunders como aspecto envolvido na dor e em outros sintomas físicos É possível observar que de acordo com a disposição psicológica do doente as limi tações impostas por sintomas organicamente determinados podem ser incrementadas num caso e abrandadas em outros Talvez esse seja um ponto de partida para entender a 219 impressão frequente de quem trabalha com Cuidados Paliativos de que dentro de certos limites os pacientes escolhem a hora de sua morte A ideia de dor total reconhece en tão que não há um organismo biológico independente dos estados psíquicos Do ponto de vista da teoria psicanalítica a doença e todo o contexto que a envolve serão inevitavelmente interpretados pelo doente à luz de seu discurso isto é de seu sistema de afetos e crenças conscientes e inconscientes Considerando isso uma das atuações possíveis do psicólogo é a escuta clínica ao paciente a fim de ajudálo a reconhecer e transformar a forma de olhar que traz prejuízo e sofrimento Para tanto o ideal é que o acompanhamento psicológico se inicie o mais precocemente possível algo aliás que se ajusta aos princípios preconizados para o bom tratamento paliativo Lembremos que o atendimento em Cuidados Paliativos se dá em diferentes regimes enfermaria ambulatório hospedaria hospice interconsulta e visita domiciliar Assim é possível considerar que há casos em que o doente pode ser acompanhado pela equipe ao longo de muitos anos Vale mencionar que nem sempre há condições para que se realize o atendimento clinicopsicológico strictu senso com o doente seja pela existência de restrições físicas muito severas falta de demanda por esse tipo de intervenção ou qualquer outra con tingência Isso entretanto não necessariamente representa um limite para a ação do psicólogo É possível criar outros dispositivos de trabalho mais adequados à situação que se lhe apresenta O registro de narrativas ligadas à história de vida por exemplo cria um espaço de interlocução e confiança entre o doente e o psicólogo que pode propiciar o reconhecimento de que o primeiro tem ainda um papel social a desempenhar lembrar e contar A narrativa de episódios afetivamente relevantes para o paciente pode ajudar na reorganização de uma autoimagem vilipendiada pela doença pela internação hospitalar e pela proximidade da morte constituindose num modo indireto de elaboração da ex periência do morrer Atenção à família A experiência indica que a qualidade da relação entre o doente e seus cuidadores pode ser benéfica ou interferir negativamente nos processos de adoecimento morte e luto É por esse motivo que em Cuidados Paliativos a atenção à família do doente é outro aspecto norteador das ações da equipe Notese que a atenção à família requer do psicólogo a ca pacidade de manejar situações grupais Algumas vezes em nome de poupar o doente a família pode restringir e falsear a comu nicação acerca do diagnóstico e de suas perspectivas de tratamento algo que em Cuidados Paliativos é conhecido como conspiração de silêncio expressão que vem sendo revista devido à forte carga culpabilizadora contida na palavra conspiração Pois se por um lado oferecer informações ao paciente é importante por outro levar em conta os temores da fa mília de que tal comunicação seja feita é igualmente relevante Nesses casos é comum que a família fique ameaçada pela irrupção dessa temática e obstrua o canal de comunicação entre o médico e o doente Esse último por sua vez entrevê burburinhos além é claro de perceber as modificações em seu corpo e desempenho físico Mas fica só e restrito em suas possibilidades de tornar assimiláveis as experiências pelas quais está passando É por isso que o psicólogo estimula doente e família a pensar e falar livremente sobre sua situação Desse modo procura legitimar seu sofrimento e contribuir para a elabora ção das experiências de adoecimento processo de morte e luto 220 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Atenção à equipe Para identificar possíveis demandas de trabalho junto à equipe é fundamental que o psicólogo mantenha canais de comunicação formalizados eou informais sempre aber tos com os diferentes profissionais em interação no serviço auxiliares de enfermagem médicos enfermeiros assistente social capelão etc A prática permite identificar por exemplo a recorrência de algumas circunstâncias em que a intervenção do psicólogo é solicitada pela equipe o doente eou a família são agressivos não seguem as recomendações que lhes são feitas burlam as regras do servi ço acusam culpam negam a gravidade do estado de saúde do doente etc São situações que representam importante fonte de estresse para a equipe e que podem estar ligadas àquilo que em Cuidados Paliativos costuma ser chamado de síndrome de Burnout Cabe ao psicólogo ajudálos a compreender tais condutas como expressões do sofrimento do doente eou da família oferecendo um espaço de escuta em que os aspectos psíquicos da relação com o paciente e a família possam ser acolhidos e elaborados para uma meto dologia interessante de intervenção junto à equipe ver o modelo do Grupo Balint Desse modo diminuemse as possibilidades de que a equipe se coloque em posição de contra ataque sempre desfavorável ao cuidar Conclusão A experiência com situações de adoecimento e morte pode dependendo do contexto em que se dá ser favorecedora da aceitação de nossos limites ou ser importante fonte geradora de angústia e isso vale não só para o doente ou a família mas também para os profissionais incluído o psicólogo Trabalhando em Cuidados Paliativos o psicólogo poderá sentirse impelido a retro ceder entendendo que não há o que ele possa oferecer Em outros casos poderá desejar ocupar a posição de um protetor que restaura as seguranças perdidas Mas a situação ideal é aquela em que ele cria sentidos para a prática dentro dos limites e possibilidades de seu campo de conhecimento Nesse sentido a participação em espaços de interlocução sobre questões ligadas à atuação supervisão grupos de estudo psicoterapia publicações congressos etc pode ser ferramenta valiosa para que faça de seu trabalho em Cuidados Paliativos uma expe riência de crescimento pessoal e profissional Referências 1 GOLDGRUB F W O neurônio tagarela São Paulo Samizdat 2008 2 HATANAKA V M A Medicina paliativa conceito e filosofia No prelo 3 KÓVACS M J Educação para a morte temas e reflexões São Paulo Casa do Psicólogo FAPESP 2003 4 LABAKI M E P Morte São Paulo Casa do Psicólogo 2001 5 MACIEL M G Ética e cuidados paliativos na abordagem de doenças terminais A Terceira Idade n 38 6 MORETO M L T O que pode um analista no hospital São Paulo Casa do Psicólogo 2001 7 ROMANO B W org A prática da psicologia nos hospitais São Paulo Pioneira Thomson 2002 8 WORLD HEALTH ORGANIZATION Better palliative care for older people Geneva WHO 2004 Disponível em httpwwweurowhointdocumente82933pdf 221 Papel do assistente social na equipe de Cuidados Paliativos letíCiA AndrAde Introdução Em nosso entender cuidar paliativamente de alguém seja em hospitais ambulatório e enfermaria ou em domicílio requer prioritariamente um trabalho interdisciplinar que prima pela complementação dos saberes partilha de responsabilidades tarefas e cuidados e negação da simples sobreposição entre as áreas envolvidas O reconhecimento de que o cuidado ade quado requer o entendimento do homem como ser integral cujas demandas são diferenciadas específicas e que podem e devem ser solucionadas conjuntamente oferece às diferentes áreas do conhecimento oportunidade e necessidade de se perceberem incompletas A percepção das necessidades múltiplas do indivíduo em Cuidados Paliativos e a certeza de que somente uma área não oferecerá respostas necessárias fazem crescer e se consolidar a busca inegável por um trabalho efetivamente em equipe interdisciplinar3 4 Por isso o papel do assistente social nas equipes de atenção em Cuidados Paliativos orientase pela atuação junto a paciente familiares rede de suporte social instituição na qual o serviço encontrase organizado e diferentes áreas atuantes na equipe Em todas as instâncias o conhecimento prévio em consonância com uma proposta de ação adequada resultará em resultado satisfatório para todos os envolvidos na questão Paciente família e rede de suporte social No que se refere à perspectiva social buscase primeiramente conhecer família pa ciente e cuidadores É necessário traçar um perfil socioeconômico com informações que serão fundamentais na condução do caso Assim é importante reconhecer a família com quem manteremos contato como ela exatamente é família real e não como gostaríamos que fosse família ideal2 Nem sempre os vínculos foram formados de maneira satisfa tória nem sempre aquele que está morrendo é amado por todos nem sempre a família tem condições adequadas de cuidar financeiras emocionais eou organizacionais e nem sempre o paciente quer ser cuidado de forma segundo nossa avaliação necessária e ideal Conhecer e compreender essa família em seus limites e possibilidades é o primeiro passo para um atendimento adequado para tanto a escuta e o acolhimento são ações impres cindíveis assim como o reconhecimento do momento adequado para a abordagem Não ouviremos tudo em uma primeira entrevista e não perceberemos muito em uma primeira abordagem Por isso é fundamental que o profissional do serviço social saiba a maneira e o tempo certos de colher informações ou o momento adequado de só ouvir e acolher Com relação à avaliação socioeconômica algumas informações são fundamentais e devem ser obtidas na primeira abordagem composição familiar local de moradia renda religião formação profissão e situação empregatícia do paciente 222 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Esses dados embasarão o atendimento social pois nos darão parâmetros adequados sobre as necessidades vividas pelas famílias ou nos mostrarão seus mecanismos de enfre tamento dos limites e dessa forma podemos apontar um esquema composição familiar com quem o paciente reside e com quem poderá ou não contar no que se refere aos cuidados se a família é extensa nuclear ou monoparental5 e se tem outros indivíduos no mesmo núcleo familiar que demandam cuidados específicos crianças idosos dependentes ou outros doentes Esses dados nos oferecerão subsídios para auxiliar a família na busca de alternativas quando o cuidado não for suficiente para as necessidades do paciente local de moradia item também relacionado com a possibilidade de entendimento sobre a rede de suporte social Dependendo do local onde o indivíduo reside é necessário per ceber a precariedade ou suficiência das redes de suporte social assim como a facilidade ou dificuldade de comparecer às consultas ou demais procedimentos A ciência dessas dificuldades ou facilidades possibilita ao assistente social viabilizar e encaminhar ade quadamente para recursos da região providenciar a solicitação de transporte de outras instituições ou buscar assistência domiciliar da própria instituição ou do bairromunicípio onde o paciente reside conforme o grau de dificuldades apresentado pela família em comparecer aos retornos agendados ou em oferecer a atenção solicitada formação profissão e situação empregatícia do paciente essas informações são fundamen tais principalmente quando o paciente é o mantenedor da família A orientação e o encami nhamento adequados da questão oferecerão a garantia de sustento para o núcleo familiar renda familiar estreitamente relacionada com o item anterior embora nem sempre obtendo a importância devida na análise deve sempre ser conhecida para que a equipe tenha parâmetros reais para futuras solicitações Exigências além do que a família pode arcar relacionadas especificamente com custos costumam inviabilizar a atenção ao pa ciente e gerar situações de estresse desnecessários para os envolvidos religião aspecto cultural importantíssimo na avaliação social do paciente em Cuidados Paliativos A religião da família e do paciente traz subsídios para abordagens adequadas sobre morte cuidados ao final da vida rituais e diferentes necessidades relacionadas com crenças e significados pessoais Isso deve ser conhecido e compartilhado com a equipe para que na medida do possível os cuidados ao final da vida sejam ajustados ao que é significativo e simbólico para família e paciente rede de suporte social relacionase com entidades instituições grupos formais serviços ou pessoas parentes amigos vizinhos com que o paciente e seus familiares podem contar em casos de necessidade As redes de suporte são tão mais suficientes e eficazes quanto maior disponibilidade e segurança oferecem aos indivíduos que a elas recorrem tal efetividade não se relaciona com a renda dos envolvidos mas sim com vínculos estabelecidos e fortalecidos no decorrer do tempo1 Algumas instituições religiosas oferecem redes mais organizadas e eficazes principalmente em situações de doença ou fragilidade de seus membros Instituição Aqui nos referimos especificamente a cada instituição onde está vinculado o serviço de atenção em Cuidado Paliativo Faz parte da proposta de trabalho do assistente social Informações detalhadas e atualizadas direitos e formas de acesso constantes da parte 6 deste manual 223 conhecer a fundo a instituição na qual realiza sua ação Esse conhecimento oferecerá condições para o profissional se inteirar dos serviços disponíveis e dos canais de en caminhamento da clientela É necessário que o assistente social saiba criar a sua rede intrainstitucional no intuito de bem atender aos pacientes e na certeza de que um único serviço também não é capaz de solucionar todas as demandas dos que necessitam de cuidado mesmo estando esse inserido em uma grande instituição Conhecer as interfaces estabelecer parcerias saber os fluxos adequados de encaminhamento e agilizar a inserção do paciente nos serviços também é parte da atuação do assistente social nos grupos de Cuidados Paliativos Atuação junto à equipe É específico do assistente social o conhecimento e a abordagem sobre a realidade socioeconômica da família bem como sobre os aspectos culturais que compõem esse universo Assim a decodificação dessa realidade para a equipe de trabalho constituise em uma de suas principais atribuições Esse profissional tornase o interlocutor entre pacientefamília e equipe nas questões apontadas que são fundamentais para se alcançar os objetivos almejados em Cuidados Paliativos morte digna e cuidado aos que ficam Conclusão A atuação do assistente social em equipes de atenção paliativa pode ser resumida em conhecer paciente família e cuidadores nos aspectos socioeconômicos visando ao ofere cimento de informações e orientações legais burocráticas e de direitos imprescindíveis para o bom andamento do cuidado ao paciente e para a garantia de morte digna Cabe também a esse profissional avaliar a rede de suporte social dos envolvidos para junto a eles acionála em situações apropriadas conhecer e estabelecer uma rede intrainstitucio nal no intuito de garantir atendimento preciso ao paciente além de constituirse como interlocutor entre pacientefamília e equipe nas questões relacionadas com aspectos cul turais e sociais que envolvem o cuidado de forma geral Somase a isso a importância da escuta e da acolhida no momento tão especial que é o do enfrentamento de uma doença incurável e em fase final de vida Referências 1 BIFFI R G MAMEDE M V Suporte social na reabilitação da mulher mastectomizada o papel do parceiro sexual Rev Escola de Enfermagem USPEDUSP n 38 p 2629 2004 2 CARVALHO M C B Org A família contemporânea em debate São Paulo CortezEDUC 1995 3 JAPIASSU H Interdisciplinaridade e patologia do saber Rio de Janeiro Imago 1976 4 MARTINELLI M L et al Orgs O uno e o múltiplo nas relações entre as áreas do saber São Paulo Cortez EDUC 1995 5 VITALE M A F Famílias monoparentais indagações Rev Serviço Social Sociedade ano XXIII São Paulo Cortez n 71 p 4562 2002 224 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do farmacêutico clínico na equipe de Cuidados Paliativos solAnGe briColA O farmacêutico clínico conjuntamente com a equipe interdisciplinar busca trazer alívio e conforto voltados às demandas do tratamento farmacológico ao paciente sob Cuidados Paliativos A assistência farmacêutica em Cuidados Paliativos está principalmente focada em in formar sobre as disponibilidades dos medicamentos aos demais membros da equipe com relação às possibilidades farmacotécnicas e aos aspectos legais bem como aos pacientes e familiares quanto ao uso e ao armazenamento corretos dos medicamentos A terapêutica farmacológica deve ser monitorada de maneira preventiva com rela ção aos problemas relacionados com os medicamentos PRMs e por fim implementar a farmacoterapia por meio das preparações magistrais viabilizando a utilização de alguns medicamentos indisponíveis no mercado comercial O tratamento farmacológico do paciente em Cuidados Paliativos representa um braço das ações possíveis e indicadas em sinergia com outras medidas nãofarmacológicas atu ando conjuntamente com os esforços de todos os profissionais envolvidos com o trabalho referente aos cuidados no final da vida A necessidade da utilização dos medicamentos está fundamentalmente pautada no sofrimento físico dos doentes em decorrência da progressão da doença manifestada atra vés de distintas caracterizações da dor física levando ao comprometimento social emo cional e sobretudo limitando o indivíduo no exercício de suas atividades O uso de opioides constituise um instrumento de alívio e conforto aos pacientes nessa fase mas por vezes encontra barreiras com relação aos mitos que acometem profis sionais desde prescrição dispensação e administração até dúvidas que povoam paciente e família Atualmente os mitos referentes à morfina principalmente estão mais esclarecidos e dissipados no cenário brasileiro porque a informação com relação à necessidade do uso de horário e não de demanda bem como o esclarecimento com relação ao fato de que morfina não abrevia a vida não causa dependência física nem psíquica aos nossos pacientes vêm sendo trabalhados inclusive pelo profissional farmacêutico no ato da dispensação As classes terapêuticas envolvidas no tratamento da dor e dos sintomas em Cui dados Paliativos são diversas e os recursos medicamentosos estão disponíveis na rede pública pela da assistência farmacêutica em um programa denominado Medicamen tos Excepcionais O Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional PMDCE é uma das estratégias do Ministério da Saúde MS para efetivar o acesso da população brasileira a medicamentos e assistência farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde SUS na rede pública Apesar dos esforços públicos de liberação dos medicamentos imprescindíveis ao 225 tratamento da dor do câncer não encontramos ações condizentes com gravidade e necessidade dos pacientes que padecem com dor e demais sintomas Exemplos diários da penetração da farmacotécnica magistral nos cuidados mi nistrados a pacientes em fase final de vida não faltam Assim diante da angústia da equipe de saúde a fim de atender os pacientes que por exemplo utilizam uma sonda nasoenteral ou tenham perdido a via de acesso oral para uso dos medicamentos ou os que apresentem rebaixamento do nível de consciência resgatamos a prática de fazer segundo a arte FSA por meio da farmacotécnica artesanal Nos pacientes oncológicos com doença avançada a dor será experimentada em aproximadamente 60 a 90 e o alívio da dor é possível em aproximadamente 80 dos casos adotandose o princípio básico de administrar os medicamentos de acordo com a escada analgésica da Organização Mundial da Saúde OMS Recomendações peculiares como preferencialmente administrar os medicamen tos por via oral VO seguindo rigorosamente os intervalos entre as doses e particu larizando os medicamentos às necessidades individuais dos pacientes são premissas que norteiam a informação na elaboração do esquema terapêutico Para a promoção da adesão nos valemos de um instrumento denominado Tabela de Orientação Farmacêutica na qual são dispostos os medicamentos ao longo do dia respei tando as meiasvidas plasmáticas dos fármacos bem como hábitos de vida de paciente e familiares além de atuar de maneira próativa com relação ao risco de ocorrência de interações medicamentosas e reações adversas Quadro A complexidade de atenção aos pacientes em Cuidados Paliativos implica a organiza ção de uma equipe interdisciplinar alinhada e convergente a atender às necessidades do paciente e da família visando à qualidade de vida e à dignidade no processo da morte Cicely Saunders precursora da filosofia de Cuidados Paliativos sabiamente nos dei xou a seguinte mensagem Não se preocupar em proporcionar mais dias de vida e sim mais vida aos dias que se tem Referências 1 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO CÂNCER Cuidados paliativos Disponível em httpwwwabcancerorgbrsobrephpc8s59lang16 Acesso em 02 jun 2009 2 CORRER C J et al Riscos de problemas relacionados com medicamentos em pacientes de uma instituição geriátrica Revista Brasileira de Ciências Farmacêuticas 2007 v 43 n 1 3 LEE J MCPHERSON M L Outcomes of recommendations by hospice pharmacists American journal of healthsystem pharmacy 2006 v 63 p 22359 4 LYNN J ADAMSON D White paper Living well at the end of life Adapting health care to serious chronic illness in old age Santa Monica Rand Health 2003 5 PAIN IN PALLIATIVE CARE A REVIEW The Pharmaceutical Journal v 278 p 67982 2007 Disponível em httpwwwpjonlinecompdfcpdpj20070609palliativecare01pdf Acesso em 30 abr 2009 6 WORLD HEALTH ORGANIZATION WHO Definition of palliative care 2002 Disponível em http wwwwhointcancerpalliativedefinitionen Acesso em 30 jun 2009 226 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro Tabela de orientação farmacêutica Ambulatório de Cuidados Paliativos Como usar o seu medicamento WCA RGHC XXXXXXX Hora Quantidadeágua Café da manhã 6 h Omeprazol 2 mgml 10 ml 6 h Clorpromazina 4 5 gotas 6 h Morfina 1 mggota 15 gotas 6 h Escopolamina dipirona gotas 40 gotas Manhã 10 h Saliva artificial Instilar um contagotas em cada lado da boca 10 h Dexametasona 05 mg5 ml 20 ml 10 h Morfina 1 mggota 15 gotas 10 h PEG 250 ml Almoço 12 h Escopolamina dipirona gotas 40 gotas Tarde 14 h Morfina 1 mggota 15 gotas 14 h Clorpromazina 4 5 gotas 18 h Escopolamina dipirona gotas 40 gotas 18 h Morfina 1 mggota 15 gotas Ao deitar 22 h Escopolamina dipirona gotas 40 gotas 22 h Morfina 1 mggota 30 gotas 22 h Clorpromazina 4 5 gotas 22 h PEG 250 ml 22 h Saliva artificial Instilar um contagotas em cada lado da boca PEG diluir um envelope em um litro de água e ingerir 250 ml a cada horário Traga esta tabela em todo retorno médico Data 31012007 Farmacêutica responsável Dra Solange Brícola 227 Papel da nutricionista na equipe de Cuidados Paliativos AndréA Gislene do nAsCimento O ato de se alimentar é muito mais que um processo de fornecer calorias e nutrientes aos indivíduos está diretamente relacionado com os aspectos emocionais socioculturais religiosos e as experiências vividas ao longo da vida Os pacientes sob Cuidados Paliativos possuem menos apetite consomem os alimentos em menor quantidade têm menos sede e muitas vezes acabam recusando a alimentação em função de sintomas como dor náuseas vômitos obstipação diarreia entre outros Além disso sofrem perda do paladar e têm os processos de deglutição digestão absorção e excreção alterados Por esses motivos a família se preocupa pois o indivíduo começa a recusar os alimentos Devido à baixa ingestão de alimentos os pacientes podem apresentar perda de peso depleção dos tecidos magro e adiposo e síndrome anorexiacaquexia3 É muito difícil para os familiares entenderem que o doente está morrendo em função da doença de base e não pela falta de alimentação e hidratação Os objetivos do tratamento de vem ser a promoção da qualidade de vida o alívio do sofrimento e a minimização do estresse É fundamental que os desejos e as necessidades do paciente sejam atendidos Na nutrição em Cuidados Paliativos é importante respeitar os princípios da bioética dando autonomia ao indivíduo no que se refere a liberação suspensão ou nãoindicação da alimentação por via oral VO ou alternativa sonda ou ostomia evitandose muitas vezes o tratamento fútil e consequentemente reduzindo o seu sofrimento7 Segundo a American Dietic Association ADA a nutrição em Cuidados Paliativos deve oferecer conforto emocional prazer auxiliar na diminuição da ansiedade no aumento da autoestima e da independência permitir uma maior integridade e melhor comunicação com os seus familiares1 O nutricionista dentro de uma unidade de Cuidados Paliativos deve conhecer o prognóstico da doença e a expectativa de vida do indivíduo quais os sintomas apre sentados o grau de reversibilidade da desnutrição e dentro desses aspectos junto com paciente familiar e equipe discutir qual terapia nutricional é mais indicada avaliando os riscos e benefícios Antes de indicar a terapia o nutricionista deve realizar uma avaliação nutricional por meio de medidas antropométricas e exames clínicos e bioquímicos conhecer hábito alimentar preferências aversões alimentares e aspectos psicossociais relacionados com a alimentação do paciente para posteriormente realizar os diagnósticos nutricionais e estabelecer quais serão as condutas adotadas O objetivo da terapia nutricional vai variar de acordo com a fase de progressão da doença fase inicial manter ou recuperar o estado nutricional e evitar a progressão da doença fase terminal promover sensação de bemestar e conforto qualidade de vida e alívio dos sintomas9 228 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A via de alimentação fisiológica é oral e sempre que possível deve ser privilegiada Caso o paciente não tenha condições de se alimentar por VO é necessário utilizar uma via alternativa de alimentação podendo ser por meio de sonda ou ostomia O importante é que o doente mantenha vínculo com o alimento aliviando os sintomas de fome e ansie dade e melhorando a qualidade de vida É muito importante que o paciente tenha suporte psicológico nessa fase7 Antes de indicar a via de alimentação o nutricionista precisa avaliar alguns aspectos como capacidade do indivíduo em se alimentar grau de desconforto causado tanto pela doença como pelo ato de se alimentar nível de consciência do paciente presença de dor e disfagia preferências e aversões alimentares do paciente adaptação da alimentação com relação a consistência temperatura e horários Dicas de nutrição em cuidados paliativos os pacientes devem consumir os alimentos de sua preferência e comer quando sentem vontade respeitar os desejos do indivíduo como não comer comer menos ou recusar a nu trição enteral ou parenteral dar tempo adequado para o paciente comer respeitando seu ritmo de ingestão oferecer alimentos em pequenas quantidades ouvir o paciente quanto à presença de sintomas relacionados com alimentação mudar a rotina alimentar oferecendo os alimentos quando o paciente estiver menos fatigado nauseado ou com menos dor combinar métodos diferentes de alimentação dieta oral e enteral dar preferência à VO oferecer utensílios adequados para facilitar a alimentação como colher copo ca nudo etc dar preferência a pratos coloridos e atraentes oferecer suplementos nutricionais na forma de mousse milk shake sopa etc junto com as preparações prestar atenção nos aspectos psicossociais que podem interferir na alimentação2 4 5 8 O nutricionista precisa ouvir o paciente respeitar seus desejos e suas necessidades no que se refere à alimentação respeitando a sua autonomia O mais importante é pro porcionar diminuição do seu sofrimento alívio dos sintomas e promover uma melhor qualidade de vida Referências 1 AMERICAN DIETITIC ASSOCIATION Position of the american dietitic association issues in feeding the terminally ill adult J Am Diet Assoc v 2 n 8 p 9961002 1992 2 CARVALHO R T TAQUEMORI L Y Nutrição e hidratação In OLIVEIRA R A coord Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 22157 3 CORRÊA P SHIBUYA E Administração da terapia nutricional em cuidados paliativos Rev Bras Cancerologia v 53 n 3 p 31723 2007 4 MACIEL M G S Definições e princípios In OLIVEIRA R A coord Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 1532 229 5 MELO D A Nutrição In OLIVEIRA R A coord Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 812 6 SHIBUYA E Cuidados paliativos em oncologia pediátrica Aspectos Nutricionais Disponível em httpwwwcuidadospaliativoscombrartigophpcdTexto307 Acesso em 17 jan 2008 7 SOCHACKI M et al A dor de não mais alimentar Rev Bras Nutr Clin v 23 n 1 p 7880 2008 8 TAQUEMORI L Y SERA C T N Interface intrínseca equipe multiprofissional In OLIVEIRA R A coord Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 557 9 VOGELZANG J L Quality endoflife care where does nutrition fit Home Health Nurse v 19 n 2 p1102 2001 230 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do fisioterapeuta na equipe de Cuidados Paliativos biAnCA Azoubel de AndrAde CelisA tiemi nAKAGAwA serA sAmirA AlenCAr YAsuKAwA A fisioterapia é uma ciência aplicada cujo objeto principal de estudo é o movi mento humano World Confederation for Physical Therapy WCPT Como processo terapêutico a fisioterapia lança mão de seus conhecimentos e recursos próprios com os quais considerando as condições sociais psíquicas e físicas iniciais do cliente busca promover aperfeiçoar ou adaptar principalmente as condições físicas do indivíduo numa relação terapêutica que envolve paciente terapeuta e recursos físicos e natu rais Quando falamos em Cuidado Paliativo é imprescindível a inclusão da família do seu meio ambiente e seus entornos social e espiritual nessa relação terapêutica O fisioterapeuta a partir de sua avaliação vai estabelecer um programa de tra tamento adequado com utilização de recursos técnicas e exercícios objetivando por meio de abordagem multiprofissional e interdisciplinar alívio de sofrimento dor e outros sintomas estressantes além de oferecer suporte para que os pacientes vivam o mais ativamente possível com impacto sobre a qualidade de vida com dignidade e conforto além de oferecer suporte para ajudar os familiares na assistência ao pa ciente no enfrentamento da doença e no luto Vale salientar a importância da multidisciplinaridade e da interdisciplinaridade diante das necessidades do paciente sob Cuidado Paliativo considerando que sintomas como dor e dispneia podem apresentar características complexas e incapacitantes e o sucesso terapêutico requer múltiplos esforços para a obtenção de bons resultados O programa de tratamento deve ser elaborado de acordo com os graus de depen dência e progressão do paciente Perracini8 divide o foco de atuação do fisioterapeu ta de acordo com a funcionalidade do paciente Pacientes totalmente dependentes Objetivos manter a amplitude de movimento aquisição de posturas confortá veis favorecendo respiração e outras funções fisiológicas propiciar a higienização e evitar complicações como úlceras por pressão edema em membros e dor Posicionamento e orientação quanto às mudanças de decúbito e transferências cama cadeira de rodas poltrona cadeira de banho mobilização global do paciente e orientação ao cuidador além de orientação postural prevenção do imobilismo e de suas consequências Prevenção quanto à instala ção de deformidades identificação dos meios de locomoção do paciente e promoção de mudanças ambientais necessárias e possíveis 231 priorização das condições ventilatórias do indivíduo por meio de treino e orientação de exercícios respiratórios manobras que favoreçam a retirada de secreções quando ne cessário assim como orientações quanto à aspiração traqueal e ao estímulo de tosse Pacientes dependentes porém com capacidade de deambulação Objetivo manutenção de suas capacidades de locomoção autocuidado e funcio nalidade Mudanças de decúbito com orientações quanto às transferências e posturas ado tadas adaptação a perdas funcionais com novas estratégias de movimentos facilitação e indicação de dispositivos de auxílio à marcha órteses e calçados ade quados treino de marcha em casa e em ambientes externos Adequação ambiental favore cendo fixação e aquisição de novos padrões motores mobilização global adequada de acordo com as condições clínicas exercícios de coordenação motora e equilíbrio exercícios respiratórios e treino de tosse Pacientes independentes porém vulneráveis Objetivo manutenção ou melhora de sua capacidade funcional Potencialização de mecanismos protetores como proteção mioarticular e faci litação de ganhos motores Monitoramento de déficits potenciais para perdas fun cionais como déficits sensoriais musculares e articulares treinos de marcha coordenação e equilíbrio Orientação postural cinesioterapia para ganhos de amplitude articular força e elasticidade nos movimentos de acordo com as condições clínicas Cinesioterapia respiratória treino em ambientes com demandas de requisitos motores compatíveis com a complexidade de tarefas que desempenham no seu diaadia melhoramanutenção de seu condicionamento físico tolerância aos esforços físicos adaptação de dispositivos de auxílio à marcha Identificação e eliminação de fatores de risco para quedas encaminhamento para centros de reabilitação ou ambulatórios de fisioterapia No controle da dor o fisioterapeuta pode utilizar terapias manuais eletroterapia como o Transcutaneous Electrical Nerve Stimulation TENS associado ou não a fármacos biofeedback termoterapia frio e calor exercícios e mobilizações posi cionamentos adequados e técnicas de relaxamento2 9 A massoterapia pode ser utilizada com o objetivo de induzir o relaxamento muscular e o alívio da dor reduzir o estresse os níveis de ansiedade e parte dos efeitos colaterais provoca dos pela medicação como náuseas e vômitos9 O benefício final é a melhora das qualidades de sono e vida A massagem além de sua indicação na melhora da dor é um recurso tera pêutico utilizado na intensificação do relacionamento favorece maior resistência contra as doenças estimula digestão e eliminação de gases e diminui cólicas devido ao relaxamento do trato gastrointestinal além de estimular respiração e circulação7 Em presença de dispneia ou desconforto respiratório utilizar técnicas que favoreçam a manutenção de vias aéreas pérvias e ventilação adequada além de relaxamento dos 232 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP músculos acessórios da respiração diminuindo o trabalho respiratório sempre que possí vel Associar a cinesioterapia respiratória à mobilização e ao alongamento dos músculos da caixa torácica com melhora de sua complacência em posturas adequadas que faci litem a ação dos músculos respiratórios por ex decúbito elevado favorecendo a ação do diafragma e até mesmo o uso de incentivadores respiratórios estimulando tanto a inspiração quanto a expiração e ventilação nãoinvasiva como auxiliares para melhora ventilatória10 O paciente pediátrico Ao prestar assistência ao paciente pediátrico devemos lembrar que além de pos suir características diferentes dos adultos a criança ainda se encontra em processos de aprendizagem e amadurecimentos físico emocional cognitivo social e espiritual o que influencia o surgimento de sintomas multidimensionais Muitas crianças são restringidas desnecessariamente ainda que sejam capazes de maiores graus de atividade e independência6 Elas são afastadas da convivência com outras crianças da mesma idade seja no ambiente escolar domiciliar ou social As mudanças de rotina e a inatividade refletem em suas condições musculoesquelé ticas É importante manter um mínimo de movimentação que evite o agravamento de sintomas desagradáveis como dor fraqueza falta de ar e indisposição1 gerando imobilismo acúmulo de secreção e tosse ineficaz A avaliação de sintomas é o primeiro passo para que se desenvolva um planeja mento terapêutico Há escalas bem descritas na literatura para avaliação de dor em pediatria que são adequadas para diferentes idades e níveis de compreensão Porém para os outros sintomas a avaliação é mais complexa sendo ainda mais difícil no caso de crianças préverbais e com atraso de desenvolvimento4 Antes da escolha de qualquer recurso é obrigatória a avaliação criteriosa das necessidades específicas de cada criança considerando faixa etária desenvolvimen to neuropsicomotor e condição clínica Permitir quando possível que a criança ou o adolescente participe da escolha da terapêutica adequada e que lhe pareça mais prazerosa fortalecerá sua autonomia O ato de brincar é um instrumento que fornece a experiência necessária para que a criança se desenvolva em todos os aspectos A utilização do lúdico como recurso terapêutico permite que a criança com deficiência tenha liberdade para criar diversas situações e realizar movimentos inesperados5 minimizando fatores estressantes A participação de familiares nos atendimentos deve ficar preferencialmente a critério da criança ou do adolescente Contudo devese incentivar a participação de membros da família nas atividades propostas nos cuidados e nas orientações favore cendo a convivência entre si e aproximandoos dos profissionais da equipe A assistência ao adolescente implica um grande desafio para a equipe de Cuidados Paliativos O grande foco nesse grupo deve ser a aquisição de sua máxima autonomia um processo que deve ter início o mais precocemente possível Se esse objetivo for alcançado até a terminalidade a equipe terá contribuído de forma importante na vida desse jovem3 É papel do fisioterapeuta instituir um plano de assistência que ajude o paciente a se desenvolver o mais ativamente possível facilitando a adaptação ao progressivo 233 desgaste físico e às suas implicações emocionais sociais e espirituais até a chegada de sua morte Referências 1 DALLANESE A P M SCHULTZ K Equipe interdisciplinar fisioterapia In CAMARGO B KURASHI MA A Y Cuidados paliativos em oncologia pediátrica o cuidar além do curar São Paulo Lemar 2007 p 619 2 DOYLE L MCCLURE J FISHER S The contribution of physiotherapy to palliative medicine In DOYLE D HANKS G CHERNY N CALMAN K Oxford Textbook of Palliative Medicine 3 ed Oxford University Press 2005 cap 15 p 10506 3 FREYER D R Care of the dying adolescent special considerations Pediatrics v 113 n 2 p 3818 2004 4 GOLDMAN A ABC of palliative care special problems of children BMJ v 316 p 4952 1998 5 LORENZINI M V Brincando a brincadeira com a criança deficiente novos rumos terapêuticos São Paulo Manole 2002 6 MARCUCCI F C I O papel da fisioterapia nos cuidados paliativos a pacientes com câncer Revista Brasileira de Cancerologia v 51 n 1 p 6777 2005 7 NIELSEN A L A massagem do bebê São Paulo Manole 1989 8 PERRACINI M R A interprofissionalidade e o contexto familiar o papel do fisioterapeuta In DUARTE Y A O DIOGO M J D Atendimento domiciliar um enfoque gerontológico Ed Atheneu 2000 cap 10 p 11743 9 SAMPAIO L R MOURA C V RESENDE M A Recursos fisioterapêuticos no controle da dor onco lógica Rev Bras Cancerologia v 51 n 4 p 33946 2005 10 SERA C T N MEIRELES M H C Sintomas respiratórios In Cuidado Paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 40921 234 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do fonoaudiólogo na equipe de Cuidados Paliativos AdriAnA ColombAni Pinto Dentro da medicina paliativa os cuidados oferecidos são em geral para pacientes com câncer avançado e AIDS Entretanto essa atuação está se expandido para pacientes com doenças crônicas progressivas e neurodegenerativas como esclerose lateral amiotró fica mal de Parkinson doença de Alzheimer e outras demências A partir disso podemos perguntar Qual deve ser a conduta mais adequada para aque le paciente com tantas necessidades Até onde se deve ir Quando parar Algumas questões surgem diante desse quadro Qual a via de alimentação mais segu ra Será que o paciente está broncoaspirando Será que a consistência da alimentação é segura para permitir nutrição e hidratação suficientes sem oferecer complicações pulmo nares Quanto o paciente compreende e como se encontra seu nível de consciência Diante dessas perguntas a fonoaudiologia pode contribuir para melhorar a quali dade de vida do paciente e de seus familiares Isso é feito auxiliando o doente a atingir e manter os máximos potenciais físico psicológico social e espiritual sabendose das limitações impostas pela progressão da doença Observase que na fase avançada 60 dos pacientes com câncer apresentam alte rações orais como xerostomia boca seca sendo possível sugerir uso de salivas artificiais dieta baixa em açúcares uso diário de flúor para prevenção de cáries e chicletes sem açú car2 redução da higiene oral estomatites candidíase mucosites ulcerações halitoses alteração de paladar hipersalivação utilizando em muitos casos butilescopolamina gel para diminuir o acúmulo de sialorreia principalmente em laringe Esses sintomas são decorrentes de medicações quimioterapia radioterapia e quadros de imunodepressão Com o tempo podem ocorrer alterações de deglutição disfagia náuseas e vômitos odinofagia anorexia desidratação alteração do nível de consciência e alterações de comunicação7 Esses aspectos estão intimamente vinculados à fonoau diologia seja no início ou no fim da evolução da doença Dessa forma devese atuar garantindo o alívio do sintoma e dando suporte para pa ciente e familiares lembrandose das diretrizes dos Cuidados Paliativos Diante desses sintomas o profissional tem o papel de manter a deglutição segura e possível por via oral VO por meio de adequações de postura manobras garantir con sistência adequada do alimento uso de espessante para líquidos4 oferecendo pequenas quantidades várias vezes mas com qualidade garantindo a apresentação e o tamanho do prato para minimizar a sensação de fracasso em torno da alimentação Quadro 1 Quando a disfagia se intensifica evidenciando alguns sintomas Quadro 2 que tor nam a via oral insegura fazse necessário em muitos casos estabelecer uma via alterna tiva sonda nasoenteral gastrostomia ou jejunostomia É importante lembrar que todas as possibilidades têm o intuito de garantir o alívio dos sintomas aumentando o conforto a qualidade de vida e diminuindo o sofrimento a fim de proporcionar satisfação prazer e segurança para o paciente e seus familiares 235 A comunicação dos pacientes pode apresentarse alterada rebaixamento do nível de consciência efeitos colaterais das medicações alterações de mobilidade e tônus da muscu latura facial déficit de memória nível de atenção reduzido e uso de palavras incoerentes5 dificultando a relação pacienteequipe em muitas tomadas de atitude que são necessaria mente decididas pelo paciente6 Assim cabe ao profissional buscar alternativas de comunicação seja por meio de pranchas de comunicação gestos ou observação de manifestações corporais do paciente na tentativa de garantir na relação equipepacientefamília maior aproximação com paciente e familiares Devese respeitar acima de tudo desejos e autonomia do enfermo dentro do processo da terminalidade3 tentando suprir aflições sentimentos de impotên cia e angústia por parte dos familiares Em suma o processo de atuação deve ser individualizado e vinculado a um planeja mento de cuidados visando maximizar o conforto durante o processo da morte respei tando os desejos do paciente e dos familiares de forma tranquila segura e consensual juntamente com a equipe interdisciplinar Quadro 31 Quadro 1 Deglutição assistida Rotina Pequenas porções Feche os lábios Mastigue Aguarde Engula Aguarde Quadro 2 Avaliação da disfagia Informação fornecida Interpretação possível Paciente inclina a cabeça para baixo durante a deglutição Reflexo de deglutição lento ou fechamento da laringe insuficiente Paciente atira a cabeça para trás durante a deglutição Problema com fase oral da deglutição geralmente devido a problemas de movimentação da língua Dificuldade em iniciar deglutição com sólidos Controle deficiente da língua Dificuldade com líquidos Controle deficiente da língua reflexo de deglutição reduzido ou ausente obstrução severa descoordenação muscular paralisação ou fixação do palato mole Sensação de comida parada globus faríngeos Obstrução o paciente pode localizar precisamente o local obstruído Regurgitação nasal frequente Disfunção palatal Falta de consciência de onde o alimento está durante a deglutição Perda de sensibilidade 236 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 3 Etapas para alimentação segura assistida Etapa 1 Postura Certifiquese de que você está sentado confortavelmente e com a cabeça reta Etapa 2 Relaxe Certifiquese de que você está calmo antes de comer e beber Etapa 3 Não fale Permaneça quieto antes e enquanto come e bebe Etapa 4 Boceje Antes da refeição se sentir a garganta rígida boceje para relaxar Etapa 5 Textura Procure evitar a mistura de sólido com líquido Etapa 6 Programese Não tenha pressa sempre pare a alimentação quando ficar cansado Faça pequenas e regulares refeições e não apenas uma grande Etapa 7 Sentese Permaneça sentado pelo menos meia hora após comer e beber Etapa 8 Ao final Após a refeição beba pequenas doses de água para limpar a boca Tussa para garantir que a garganta está limpa Fonte Oxford Nextbook Textbook of Palliative Medicine Referência 1 CARVALHO R T TAQUEMORI L Y Nutrição e hidratação cuidado paliativo Cremesp p 221 57 2008 2 FORMIGA F et al Xerostomia em el paciente anciano Revista muitidisciplinar de gerontologia v 13 n 1 p 248 2003 3 KOSEKI N M BRUERA E Decisão médica ética em casos de pacientes terminais Revista Brasileira de cancerologia v 42 n 1 p 1529 1996 4 LOGEMANN J A Swallowing problems associated with degenerative disease In Evolution and treatment of swallowing disorderss1se p 32943 1998 5 MAC DONALD A ARMSTRONG L The contribution of speech and language therapy to palliative medicine In DOYLE D et al Oxford textbook palliative medicine 3 ed Oxford UK Oxford University Press 2004 cap 155 section 15 p 105763 6 SALT N DAVIES WILKINSON S The contribution of speech and language therapy to palliative care European Journal of Palliative Care v 6 p 1269 1999 7 WATSON M S Oxford Handbook of palliative care Gastrointestinal symptoms cap 6b p 237 82 2005 237 Papel do terapeuta ocupacional na equipe de Cuidados Paliativos mAriliA bense othero Terapia Ocupacional é um campo de conhecimento e de intervenção em saúde em edu cação e na esfera social que reúne tecnologias orientadas para a emancipação e autonomia de pessoas que por diversas razões ligadas a problemáticas específicas físicas mentais sen soriais sociais apresentam temporária ou definitivamente limitações funcionais eou dificuldades na inserção e participação na vida social Universidade de São Paulo USP De acordo com Ferrari2 é por meio da ação que o indivíduo explora domina e transforma a si e o mundo que o cerca Dessa forma ele se relaciona realizase cria descobre aprende ou seja constrói sua própria história A vida é um grande conjunto de ações e fazeres dependente da história dos sujeitos e de seus meios social e cultural Entretanto a doença e a internação trazem muitas rupturas dor e outros sintomas po dem aparecer e as atividades do cotidiano são interrompidas Limitações também estão presentes e consequentemente o tratamento passa a ocupar grande parte da rotina e das preocupações tanto para os pacientes como para seus familiares Porém mesmo nesse contexto de limitações inerentes ao processo de adoecimento e segundo os princípios dos Cuidados Paliativos3 devese prover um sistema de apoio e ajuda para que o paciente viva tão ativamente quanto possível até sua morte Assim a intervenção em terapia ocupacional é fundamental pois ainda que o co tidiano esteja muito limitado sem a possibilidade de escolhas eou fazeres a vida não pode perder seu sentido Em toda a sua atuação o terapeuta ocupacional busca criar possibilidades de ampliação da autonomia e das possibilidades do fazer compreen dendo as atividades como possibilitadoras de experiências de potência permitindo o resgate de capacidades remanescentes bem como a criação de projetos a serem rea lizados Toda intervenção está voltada para a permanência de atividades significativas no cotidiano do paciente e de sua família O cuidado a famílias e cuidadores é parte integrante e fundamental na assistência terapêutica ocupacional O principal objetivo é orientar o cuidador acerca dos estímulos positivos ao paciente e treinálo para que seja um facilitador da independência nas ati vidades da vida diária AVDs A escuta e o acolhimento a demandas próprias do familiar também têm espaço na intervenção terapêutica ocupacional O Quadro apresenta os principais objetivos da terapia ocupacional descritos de maneira resumida Em sua prática o terapeuta ocupacional tem como recurso terapêutico as ativi dades sejam elas artísticas expressivas manuais de lazer autocuidado entre outras Segundo Castro et al1 elas são recursos que proporcionam a conexão entre o sujeito e seu meio permitindo ampliar o viver e tornálo mais intenso são enriquecedoras permitem reestruturar e integrar diferentes experiências intensificando o sentimento de vida e potência 238 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP É importante ressaltar que na fase final de vida o terapeuta ocupacional acompa nha o paciente há mudança no foco tendo na organização da rotina e na diminuição dos estímulos um modo de propiciar conforto Em alguns casos é possível manter suas atividades significativas a partir de recursos como música e leitura trazendo melhor acolhimento e conforto ao paciente No acompanhamento familiar podese ajudar nas despedidas na expressão de sentimentos e emoções e na abertura de novos canais de comunicação por meio de atividades O acompanhamento pósóbito é parte integrante da assistência terapêutica ocupacional especialmente por ligações telefônicas ou visi tas de luto em conjunto com outras áreas Portanto a atuação em terapia ocupacional nos Cuidados Paliativos é importante possibilitando a construção de brechas de vida potência criação e singularidade em um cotidiano por vezes empobrecido e limitado pela doença A vida não pode perder seus sentido e significado até o último momento e devese promover de fato a digni dade ao paciente fora de possibilidade de cura Somente com um trabalho em equipe é possível oferecer assistência de qualidade de maneira que pacientes e familiares sejam acolhidos e cuidados Referências 1 CASTRO E D LIMA E M F A BRUNELLO M I B Atividades humanas e terapia ocupacional In DE CARLO M M R P BARTALOTTI C C Terapia ocupacional no Brasil Fundamentos e perspectivas São Paulo Plexus 2001 p 4159 2 FERRARI M A C Lazer e ocupação do tempo livre na terceira idade In NETTO M P org Geron tologia A velhice e o envelhecimento em visão globalizada São Paulo Atheneu 2005 p 98105 3 MCCOUCHLAN M A necessidade de cuidados paliativos In PESSINI L BERTACHINI L Humani zação e cuidados paliativos São Paulo Edições Loyola 2004 p 167180 Quadro Terapia ocupacional objetivos em Cuidados Paliativos Manutenção das atividades significativas para o doente e sua família Promoção de estímulos sensoriais e cognitivos para enriquecimento do cotidiano Orientação e realização de medidas de conforto e controle de outros sintomas Adaptação e treino de AVDs para autonomia e independência Criação de possibilidades de comunicação expressão e exercício da criatividade Criação de espaços de convivência e interação pautados nas potencialidades dos sujeitos Apoio escuta e orientação ao familiar eou cuidador AVDs atividades da vida diária 239 Papel do assistente espiritual na equipe de Cuidados Paliativos elenY vAssão de PAulA AitKen A morte alcança todo ser vivente mas nunca estamos preparados para aceitála Criados para a vida alimentamos a esperança de perpetuála Por essa razão é tão difícil lidar com pacientes em processo de morte Mesmo sendo quase uma rotina no hospital nunca nos acostumaremos com ela O sofrimento e a proximidade da morte fazemnos reavaliar a vida enfocando nossas mentes em seus valores essenciais Valeu a pena Qual foi o meu saldo Estou deixando sau dades O que realizei deu sentido à minha vida e à de outros Para onde irei depois da morte Que legado estou deixando Quando Deus é conhecido pessoalmente fazendonos sentir Seu amor misericórdia e graça sendo parte de cada detalhe de nossos dias a vida não acaba com a morte a esperança vai além dignidade qualidade de vida utilidade paz e alegria permanecem até mesmo à sombra da morte Com a introdução do conceito de Cuidados Paliativos princípios claros publicados pela Organização Mundial da Saúde OMS em 1990 e reafirmados em 2002 vieram reger as suas atividades O cuidado espiritual atende a cada um deles ajudando a promover o alívio da dor e de outros sintomas estressantes reafirmando a vida e vendo a morte como processo natural integrando aspectos psicossociais e espirituais ao cuidado oferecendo um sistema de suporte para auxiliar o paciente a viver tão ativamente quanto possível até a morte e amparando a família durante todo o processo da doença Para que haja condições de oferecer este cuidado integral ao enfermo e a sua família tornase muito importante a intervenção do capelão e de sua equipe de capelania também chamados de assistentes espirituais Em 2005 o Comitê das Organizações de Acreditação dos Cuidados em Saúde JCAHO notando que os valores espirituais dos pacientes afetavam a maneira como respondiam ao tratamento incluiu uma norma de acreditação requerendo das instituições de saúde que tra tassem das necessidades espirituais dos doentes Quando se fala sobre religião e espiritualidade podese pensar na religião como associada a comunidades religiosas organizadas artefatos e escrituras com regras e mandamentos ofi ciais treinados cerimônias e dogmas A espiritualidade tende a ser experimentada como algo mais caloroso e espontâneo e está associada a amor inspiração integralidade profundidade e mistério sendo mais de caráter pessoal Crenças religiosas estão relacionadas com melhores saúde e qualidade de vida Estudos científicos1 2 têm identificado uma relação contrária entre depressão e religiosidade Esses estudos afirmam também que ter uma religião eou pertencer a um grupo religioso melhora o suporte social e a saúde física diminuindo os gastos com a enfermidade Para o cuidado inte gral de paciente e sua família tanto uma coisa como a outra são necessárias o atendimento espiritual individual e diário trará ao enfermo e a seus queridos ouvidos atentos condições para reflexões profundas sobre questões existenciais confrontos e desafios quanto a pro pósito de vida perdão acerto de contas vida eterna qualidade e utilidade de vida 240 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Apoiado na fé em Deus e no suporte da comunidade religiosa o paciente experi mentará maior bemestar senso de pertencer ser amado ter dignidade e paz além da certeza de que será acompanhado até o fim de seus dias O fato de saber que sua família continuará recebendo suporte conforto no luto e amparos social emocional e espiritual ajudará o enfermo a ter paz Oferecer o atendimento espiritual como parte do serviço de saúde é permitir ao be neficiado expressar seus sentimentos e emoções conversando abertamente sobre a morte e o morrer e ajudandoo a participar de todas as decisões referentes a seu tratamento e aos desejos finais O Cuidado Paliativo reconhece que as curas espiritual e emocional podem ocorrer mesmo quando a física eou a recuperação se tornam impossíveis Muitas pessoas gra vemente enfermas ou em fase terminal falam sobre terem descoberto uma riqueza e o preenchimento do vazio de sua vida que elas nunca haviam encontrado antes A equipe de saúde também será muito beneficiada ao receber o suporte do capelão em situações de estresse pessoal ou na perda de seus pacientes Mesmo em seu trabalho diário encontrará mais segurança na tomada de decisões em questões de bioética envol vendo dilemas de fim de vida de seus pacientes Referências 1 KOENIG H LEWIS G The healing connection Nashville Word Publishing 2000 2 KOENIG H G MD The healing power of faith New York Touchstone 2001 241 Papel do dentista na equipe de Cuidados Paliativos sumAtrA melo dA CostA PereirA JAles José tAdeu tesseroli de siQueirA Introdução O Cuidado Paliativo em odontologia pode ser definido como o manejo de pacientes com doenças progressivas ou avançadas devido ao comprometimento da cavidade oral pela doença ou seu tratamento direta ou indiretamente Nesses casos o foco do cuidado é melhorar a qualidade de vida8 A condição mais frequente que afeta profundamente as funções orais é o câncer de cabeça e pescoço principalmente em estágios avançados Esse tipo de câncer além de despertar a percepção de morte também traz o risco de sequelas funcionais e estéticas Ademais da dor a autoimagem a socialização e a habilidade de realizar funções rotineiras como mastigar engolir e respirar podem piorar devido ao tumor ou ao seu tratamento7 A despeito dos avanços essa é uma área que carece de atenção de modo a conjugar a necessidade desses doentes por problemas decorrentes do tumor com a possibilida de de doenças odontológicas corriqueiras muitas delas infecciosas que comprometem mais ainda sua precária condição de saúde Figura 1 Nesse cenário a participação do cirurgiãodentista contribui para o diagnóstico e os tratamentos em sua área mas tam bém para a realização de Cuidados Paliativos orais que possam beneficiar esses doentes Orientar doentes e cuidadores e discutir esses aspectos com a equipe multiprofissional ajuda sua integração nesse importante segmento da área da saúde4 XEROSTOMIA Cárie Candidíase Dor Halitose Dor Disfagia Dor Sangramento Sangramento Desnutrição Dor Lesão oral Dor Úlcera Prótese desadaptada Doença periodontal Disgeusia Figura 1 Relação dos problemas mais frequentes que afetam a cavidade oral dos doentes em Cuidados Paliativos 242 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Nem sempre os pacientes se queixam espontaneamente de seus problemas e desconfortos com a boca por acreditarem serem próprios de sua doença principalmente no câncer avança do de boca ou por estarem mental ou fisicamente inaptos a fazêlo Portanto eles devem ser questionados e avaliados regularmente também quanto a tais aspectos de saúde6 Cuidados Paliativos orais Pacientes em Cuidados Paliativos apresentam sérias restrições funcionais e gran de comprometimento das funções orais particularmente quando a doença atinge a cavidade oral como no câncer de cabeça e pescoço Nessa condição os sintomas habituais agravamse e nem sempre são curáveis necessitando de atenção e cui dados especiais Os sintomas orais mais frequentes são dor sangramento trismo feridas abertas infecções oportunistas disfagia xerostomia desnutrição desidrata ção anorexia caquexia e desfiguração As secreções em doentes traqueostomizados também comprometem a comunicação verbal causam disfunção oral e sofrimento3 Dor ulceração sangramento e trismo são os mais importantes sintomas em casos de câncer oral avançado2 O tratamento inadequado ou a sua ausência resulta em desconforto e prejuízos nutricionais comprometendo mais ainda a qualidade de vida desses doentes5 O cirurgiãodentista contribui fornecendo intervenções próprias de sua área de atua ção profissional além de cuidados de suporte que assegurem uma boca mais saudável livre de infecção e dor As complicações do câncer de boca e de seu tratamento já são bem conhecidas entretanto em pacientes sob Cuidados Paliativos elas podem tomar dimensões exageradas Diagnóstico de afecções ou doenças odontológicas associadas A existência de enfermidades orais como raízes dentárias infectadas ou doença perio dontal deve ser detectada pois contribui para agravar o estado de saúde Para minimizar as complicações orais a prioridade é a higiene oral minimamente de modo a manter a saúde oral reduzir a irritação e o dano tecidual e promover mais conforto1 Deve ser ava liada a capacidade que o paciente possui de se cuidar a fim de se desenvolverem alter nativas para melhorar a escovação dos dentes incluindo indicações específicas de escova dental pastas e colutórios que deveriam ser fornecidas ao paciente e a seu cuidador3 Escovas de dente extramacias são mais suaves aos tecidos orais que as convencionais e devem ser usadas em associação aos cremes dentais sem laurilsulfato de sódio para não estimular ou exacerbar a descamação da mucosa oral A solução de clorexidina a 012 pode ser utilizada por doentes com comprometi mento médico predispostos a infecções orais pacientes com longa estadia em hospitais idosos ou pacientes elegíveis para Cuidados Paliativos com o objetivo de prevenir infec ções orais e sistêmicas Os pacientes devem ser orientados a remover suas próteses à noite e deixálas em solução antisséptica como clorexidina a 012 por 30 minutos ou solução com cloro a 2 5 ml ou uma colher de chá de alvejante em 250 ml de água3 243 A presença de xerostomia e a perda do volume facial podem causar diminuição da retenção da prótese Está indicada nesse caso a aplicação de adesivos na superfície da prótese bem como lubrificantes à base de água ex KY gel a fim de proporcionar efetiva adesão da prótese à mucosa oral Protocolo para Cuidados Paliativos orais Depois de uma minuciosa avaliação do doente devese aplicar uma sequência de cuidados que melhorem preventiva ou curativamente sua condição de saúde Nas Figuras 2 3 e 4 uma sugestão de protocolo para Cuidados Paliativos orais Protocolo sugerido para Cuidados Paliativos orais Orientação de higiene oral Pacientes e cuidadores Mecânica e medicamentosa Próteses dentárias Medicações tópicas antissépticas Gaze e ataduras Soluções e pomadas anestésicas Limpeza e proteção de feridas intra e extraorais Controle da dor em feridas intra e extraorais Figura 2 Esquema da sequência de cuidados orais preventivos curativos e paliativos em pacientes sob Cuidados Paliativos Protocolo sugerido para Cuidados Paliativos orais Infecções oportunistas candidíase oral Antifúngicos sob a forma de bochechos Higiene das próteses dentárias Hidratante oral Saliva artificial Evitar alimentos cítricos condimentados e quentes para proteção da mucosa oral xerostômicaulcerada Xerostomia Orientação dietética Figura 3 Esquema da sequência de cuidados orais preventivos curativos e paliativos em pacientes sob Cuidados Paliativos 244 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Conclusão Quanto à boca vários avanços permitiram a melhora da qualidade de vida O tratamento sintomático da dor e os cuidados locais como higiene oral e limpeza de feridas contribuem para a redução de dor desconforto e infecções oportunistas Em casos de extrema morbida de como a mucosite oral o laser terapêutico parece eficaz na prevenção de lesões e dimi nuição da dor dos pacientes Hidratantes orais reduzem o desconforto da hipossalivação Essa é uma área especializada que envolve oncologia e dor e que ainda é carente de cirur giõesdentistas com formação em dor orofacial e experiência com pacientes oncológicos mas que está gradativamente despertando a consciência da necessidade de integração a equipes multidisciplinares especializadas incluindo os Cuidados Paliativos Esperase que no futuro essa integração beneficie os doentes com novas terapêuticas e que cuidados que aliviem seu sofri mento sejam estendidos de modo padronizado a todos os que deles necessitarem Referências 1 EPSTEIN J B et al Quality of life and oral function following radiotherapy for head and neck cancer Head Neck v 21 p 111 1999 2 NARAYANAN R S NAIR M K PADMANABHAN T K Palliation of pain in advanced oral cancer Headache v 28 p 2589 1988 3 PAUNOVICH E D et al The role of dentistry in palliative care of the head and neck cancer patient Tex Dent J v 117 n 6 p 3645 2000 4 SIQUEIRA J T T et al Dor orofacial e cuidados paliativos orais em doentes com câncer Prática Hospitalar v 62 p 12733 2009 5 SWEENEY M P BAGG J Oral care for hospice patients with advanced cancer Dent Update v 22 p 4247 1995 6 SWEENEY M P BAGG J The mouth and palliative care Am J Hosp Palliat Care v 17 n 2 p 11824 2000 7 VILLARET D B WEYMULLER E A Pain caused by cancer of the head and neck In LOESER J D et al eds Bonicas management of pain 3 ed New York Lippincott Williams Wilkins 2001 p 94865 8 WISEMAN M A Palliative care dentistry Gerodontology v 17 n 1 p 4951 2000 Protocolo sugerido para Cuidados Paliativos orais Focos infecciosos Doença periodontal e cárie Alisamento de superfícies dentárias pontiagudas Prótese traumática ajuste Reembasamento com adesivos e condicionadores teciduais Traumatismo mucoso Prótese desadaptada Figura 4 Esquema da sequência de cuidados orais preventivos curativos e paliativos em pacientes sob Cuidados Paliativos 245 Ação prática do profissional de Cuidados Paliativos no domicílio JulietA FriPP Internação domiciliar diagnóstico situacional A internação domiciliar compreende o conjunto de atividades prestadas no domi cílio a indivíduos clinicamente estáveis que exijam intensidade de cuidados de menor complexidade que no ambiente hospitalar1 Ela está inserida no contexto da atenção domiciliar que inclui também a assistência domiciliária Em abril de 2002 foi sancionada pelo Ministério da Saúde MS a Lei no 10424 como subsistema da Lei no 8080 que es tabelece no âmbito do Sistema Único de Saúde SUS assistência e internação domiciliar Esta lei inclui procedimentos médicos de enfermagem fisioterapêuticos psicológicos e de assistência social necessários ao cuidado integral dos usuários em seu domicílio por equipe exclusiva para este fim28 O crescimento do atendimento domiciliar no Brasil é recente e tal modalidade de prestação de serviços ocorre tanto no setor privado quanto no público fazendo parte da pauta de discussão das políticas de saúde que pressionadas pelos altos cus tos das internações hospitalares buscam saídas para melhor utilização dos recursos financeiros15 A internação domiciliar proporciona assistência humanizada e integral contribuindo para a otimização dos leitos hospitalares reintegra o paciente em seus núcleos familiar e de apoio por meio de maior aproximação da equipe de saúde com a família e promovendo educação em saúde Com relação ao idoso a internação domiciliar preserva ao máximo sua autonomia buscando a recuperação de sua independência funcional13 Os indivíduos em situação de fragilidade nos momentos de adoecimento buscam a atenção hospitalar para reduzirem o seu sofrimento e o hospital responde a certo grupo de problemas oferecendo tecnologias que permitem garantir o acolhimento necessário à demanda Por outro lado existem riscos desnecessários inerentes ao ambiente hospi talar que precisam ser evitados Nesse sentido inúmeras instituições de saúde buscam a construção e a operação de práticas voltadas a uma assistência com intensidades variá veis de cuidados tendo como característica comum realizar a intervenção terapêutica no interior do domicílio do usuário14 A internação domiciliar pode servir de elo entre o nível hospitalar e a atenção bá sica fortalecendo o sistema e particularmente as estratégias de saúde da família re conhecendo as competências de cada instância O estabelecimento de responsabilidade compartilhada entre níveis distintos da rede de serviços de saúde tornase imprescin dível a fim de garantir a continuidade indispensável ao atendimento das necessidades de grupos vulneráveis como os portadores de incapacidade funcional em processos de adoecimento27 A atenção referente aos Cuidados Paliativos requer coordenação entre os sistemas de saúde principalmente de internação hospitalar em que se encontra a maioria dos pacientes com neoplasias em estágio avançado e o sistema de atenção domiciliar 246 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP permitindo assim a continuidade dos cuidados e mantendo o acolhimento de pacientes e familiares em ambiente domiciliar16 A atenção domiciliar vem demonstrando potencial de se concretizar como modali dade substitutiva de cuidado envolvendo todo o contexto domiciliar do usuário possi bilitando a produção de um cuidado mais próximo individualizado e menos tecnicista do que no hospital Não se trata de uma desospitalização irresponsável e prematura mas da possibilidade de reestruturar o modo de operar o cuidado no espaço físico e nas estratégias de cuidado17 A busca de autonomia para andar a própria vida deve servir de guia central para qualquer projeto de internação domiciliar evitando restrições da autonomia asseguran do processos de ganho contínuo dos usuários em ambiente favorável e com equipe de profissionais comprometida com a busca de alívio de sintomas e resultando na maior independência dos pacientes em seu próprio território26 Cuidados Paliativos no domicílio uma estratégia de cuidado integral O envelhecimento da população resulta no aumento da incidência e prevalência de enfermidades debilitantes progressivas Entre essas enfermidades as causas neurodege nerativas e as neoplasias ocupam lugar de destaque sendo responsáveis pelo elevado grau de sofrimento dos pacientes e de seus familiares Essa situação se verifica espe cialmente na fase terminal dessas doenças A maioria dos pacientes com enfermidades em fase terminal deseja morrer em seu próprio domicílio e não dispensa uma atenção adequada para o controle de sintomas2 Na primeira definição da Organização Mundial da Saúde OMS para Cuidados Pa liativos esses eram categorizados como o último estágio de cuidado sendo os cuidados oferecidos por uma equipe interdisciplinar e voltados para pacientes com doença em fase avançada ativa em progressão cujo prognóstico é reservado e o foco da atenção é a qua lidade de vida8 A seguir a OMS considerando que os Cuidados Paliativos podem e devem ser oferecidos o mais cedo possível no curso de qualquer doença crônica potencialmente fatal definiuos como uma abordagem que melhora a qualidade de vida de pacientes e suas famílias na presença de problemas associados a doenças que ameaçam a vida me diante prevenção e alívio de sofrimento pela detecção precoce e por tratamento de dor ou outros problemas físicos psicológicos sociais e espirituais estendendose inclusive à fase de luto36 Atualmente os Cuidados Paliativos são considerados a quarta diretriz estabele cida pela OMS para o tratamento do câncer associados a prevenção diagnóstico e tratamento35 A conjugação de Cuidados Paliativos com internação domiciliar é uma tarefa que re quer vocação de serviço organização de sistema de saúde e conhecimentos científicos Os pacientes escolhem o domicílio como lugar preferencial para receber os cuidados quando não existe mais possibilidade de cura da sua doença14 A internação domiciliar oferece vantagens não somente aos pacientes mas também à família e ao sistema de saúde mediante a redução de custos Em geral os pacientes quando questionados referem que receberam assistência satisfatória no hospital mas que preferiam receber tratamento no domicílio pelo conforto e pela rede familiar mais abrangente 247 A equipe interdisciplinar é fundamental para garantir o sucesso de cuidados e aco lhimento dos usuários e seus familiares tendo cada profissional o seu papel Médicos enfermeiros assistentes sociais psicólogos fisioterapeutas nutricionistas assistentes espirituais entre outros compartilham diariamente as necessidades manifestadas pelos usuários em situação de terminalidade em ambiente domiciliar atuando com o objetivo de aliviarlhes os sofrimentos físico emocional social e espiritual Os Cuidados Paliativos e as relações desenvolvidas em domicílio configuramse como o melhor exemplo de tecnologia leve tecnologias de relações com produção de vínculo autonomia acolhimento cumplicidade associada a técnicas que visam alívio de sofri mento de pacientes e familiares longe da tecnologia dura equipamentos tecnológicos do tipo máquinas normas estruturas organizacionais comuns no ambiente hospitalar26 A assistência paliativa em casa requer que o paciente permita e participe dos cui dados com apoio da família A comunicação contínua entre paciente família e equipe facilita a realização dos cuidados sem objetivo de cura e sim de conforto e alívio de sofrimento11 Um estudo romeno descreve as atividades e intervenções para pacientes com câncer avançado tratados em domicílio por equipe de Cuidados Paliativos e analisa as mudanças que ocorreram nos sintomas físicos principalmente na dor O número de sintomas físicos reduziu consideravelmente após a inclusão dos pacientes no programa de Cuidados Palia tivos particularmente daqueles com condição socioeconômica menos favorável9 Em ensaio clínico randomizado realizado na Noruega foram incluídos 434 pacientes com doença maligna incurável e com sobrevida de três a nove meses sendo os grupos divididos de forma aleatória O grupo de intervenção foi aquele que recebeu Cuidados Paliativos por equipe especializada Os resultados encontrados com relação ao local da morte demonstraram que 25 dos pacientes do grupo de intervenção morreram em casa enquanto somente 15 do grupocontrole morreram em domicílio p 005 O estudo concluiu que os Cuidados Paliativos favorecem o óbito dos pacientes em casa reduzindo as internações hospitalares desnecessárias21 Outro estudo randomizado realizado na Califórnia EUA buscou avaliar satisfação quanto aos cuidados utilização de serviços médicos local da morte e custos dos cui dados em saúde sendo que no grupo de intervenção os pacientes receberam Cuidados Paliativos em domicílio e no grupocontrole tratamento tradicional Os participantes do estudo foram indivíduos com doenças terminais n 298 e sobrevida de cerca de um ano ou menos O grupo de intervenção relatou maior satisfação com relação aos cuidados p 005 teve mais probabilidade de morrer em casa p 0001 e era menos propenso a buscar atendimento em serviços de emergência p 001 ou internação hospitalar p 0001 Os custos foram relativamente mais baixos na prestação de cuidados com relação ao grupocontrole p 003 O estudo demonstra fortes indícios da necessidade de ampliar o olhar e a assistência à saúde dos pacientes em situação de terminalidade5 Os cuidados contínuos em domicílio vêm de encontro e favorecem os princípios dos Cuidados Paliativos que afirmam a vida reconhecem a morte como um processo natural sem antecipála ou retardála providenciam alívio da dor e de outros sintomas físicos integram os aspectos psicológicos espirituais e sociais do cuidado ao paciente oferecem um sistema de suporte para ajudálos a viver o mais ativamente possível e oferecem su porte para auxiliar a família a cooperar durante a doença e trabalhar o luto e a perda10 248 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Cuidador de indivíduos em situação de terminalidade As doenças sem possibilidade de cura em estágio avançado têm grande impac to na vida do paciente e de seu entorno modificando a estrutura e a dinâmica da família envolvida com aproximação ou afastamento de seus membros em especial quando há sobrecarga na família como costuma ocorrer com a intensificação dos sintomas e o avanço da doença13 O cuidador pelo longo tempo de exposição no curso de uma doença sem pos sibilidade de cura manifesta desgaste físico e sobrecarga emocional O cuidador informal em geral familiar apresenta além das sobrecargas objetiva e subjetiva alterações na qualidade de vida Em estudo transversal realizado com pacientes internadas com câncer de mama ou ginecológico sem possibilidade de cura foram avaliadas as situações de depressão e ansiedade em seus cuidadores O estudo apli cou a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão HAD instrumento validado e que apresenta boa sensibilidade apesar de sua baixa especificidade para pacientes com dor crônica Os resultados demonstraram a presença de depressão em 74 e ansiedade em 53 dos cuidadores6 e levaram à conclusão de que o processo de cuidar de um indivíduo em fase terminal gera conflitos emocionais intensos e sugere que outras variáveis associadas ao impacto mental do cuidar necessitam ser investigadas32 Durante a trajetória da doença os comportamentos físico e emocional do cuidador vão sendo afetados principalmente quando o número de sintomas do paciente aumenta exigindo maior dedicação o que determina falta de tempo para descanso ou outras atividades sociais aspectos associados a isolamento social e depressão Em estudo randomizado realizado em Michigan EUA foi avaliada depressão em cuidadores de pacientes com câncer sendo o grupo de intervenção n 118 aquele em que os cuidadores receberam acompanhamento e apoio sistemático de enfermagem para facilitar os cuidados aos pacientes O grupocontrole n 119 não recebeu tal suporte durante o processo de cuida dos O estudo concluiu depois de 20 semanas que a intervenção de enfermagem clínica isolada não tem efeito benéfico sobre os cuidadores com depressão e que devido à complexidade apresentada sugere que sejam realizados mais estudos para avaliar outras formas de apoio ao contexto do cuidador e do paciente com câncer24 Equipe de atenção domiciliar e Cuidados Paliativos bem preparada oferece condições para o alívio de sobrecarga dos cuidadores estabelecendo cumplicida de e vínculos muitas vezes ausentes em ambiente hospitalar Essa relação pode ser decisiva para que tais situações sejam enfrentadas da melhor maneira possí vel tanto pelo paciente quanto pelo cuidador8 Experiência de um serviço Em abril de 2005 implantamos no Hospital Escola e Fundação de Apoio Uni versitário da Universidade Federal de Pelotas UFPel o Programa de Internação Domiciliar Interdisciplinar PIDI para pacientes oncológicos sob Cuidados Paliati 249 vos complementando assim a atenção integral aos indivíduos que necessitavam de cuidado continuado em ambiente domiciliar evitando as internações hospitalares de repetição e também reduzindo o afastamento dos seus familiares na fase final da vida O reconhecimento local das ações desenvolvidas pelo PIDI é evidente com grande satisfação dos pacientes e dos familiares assistidos pelo programa Durante o período de quatro anos cerca de 400 pacientes foram assistidos pelo programa e cerca de 70 evoluíram para óbito A equipe de profissionais do programa observa uma relação de cumplicidade com os pacientes e seus familiares mantendo os cui dados durante todo o processo de adoecimento terminal31 A comunicação tem sido essencial para garantir o êxito na terapêutica dos pa cientes muitas vezes fragilizados juntamente com seus familiares pela doença e por experiências frustradas com profissionais e serviços a que foram expostos em seus tratamentos anteriores12 30 Objetivos do PIDI oncológico Complementar o Serviço de Oncologia da UFPel oferecendo tratamento de Cuidados Paliativos aos pacientes com câncer com e sem indicação de quimiotera pia ou radioterapia e que possam receber cuidados em ambiente domiciliar humanizar os cuidados dos pacientes com câncer incluindo a família no pro cesso de cuidador do paciente fazendoa dessa forma participar ativamente do tratamento em casa possibilitar a ampliação de leitos em ambiente domiciliar evitando que os pacientes precisem procurar o prontosocorro quando apresentarem intercorrências clínicas inerentes ao tratamento do câncer servir como referência para o encaminhamento de pacientes com câncer sob Cuidados Paliativos que estão internados na rede hospitalar do município incluir ensino pesquisa e extensão no processo de cuidados domiciliares aos pacientes oncológicos trabalhar na perspectiva da interdisciplinaridade incluindo profissionais médi cos enfermeiros técnicos de enfermagem nutricionistas assistentes sociais psicó logos fisioterapeutas assistentes espirituais entre outros proporcionar alívio de sintomas físicos emocionais sociais e espirituais dos pacientes em fase de Cuidados Paliativos capacitar os familiares e oferecer ao grupo de cuidadores suporte para situa ções de sobrecarga nos cuidados com apoio interdisciplinar no luto2230 Instrumentos e escalas de avaliação validados passíveis de aplicação em ambiente domiciliar Palliative prognostic score PaP Score Tabela estima a sobrevida no período de 30 dias a partir das avaliações clínica e laboratorial18 25 pacientes com probabilidade reduzida de sobreviver mais de 30 dias se beneficiam com os cuidados em ambiente domiciliar por equipe interdisciplinar escala aplicada por profissional médico 250 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Tabela PaP Score Variável Pontos Dispneia Presente 1 Ausente 0 Anorexia Presente 15 Ausente 0 Estimativa clínica 12 0 1112 2 910 25 78 25 56 45 34 6 12 85 Índice de Karnofsky 30 0 1020 25 Leucócitos totais por mm3 8500 0 85011000 05 11000 15 Porcentagem de linfócitos 12 25 12199 1 20 0 Grupos de risco Total de pontos A probabilidade de sobreviver 30 dias 70 055 B probabilidade de sobreviver 30 dias 3070 5611 C probabilidade de sobreviver 30 dias 30 111175 Escala de Avaliação Funcional de Karnofsky18 29 Quadro 1 Permite conhecer a capacidade do paciente para poder realizar atividades cotidianas 251 elemento preditor independente de mortalidade em patologias oncológicas e não oncológicas útil para a tomada de decisões clínicas e para valorizar o impacto de um tratamento e a progressão da doença escore 50 ou inferior indica elevado risco de morte durante os seis meses seguintes escala aplicada por profissional médico ou enfermeiro Sistema Avaliação de Sintomas de Edmonton ESAS Quadro 2 Lista 10 escalas numéricas que avaliam a intensidade dos sintomas pontuação de 0 a 10 pedese que o paciente selecione o número que melhor indi que a intensidade de cada sintoma sendo zero o mínimo sintoma e 10 o máximo aplicabilidade em período de tempo determinado de acordo com a rotina do serviço ou segundo a condição do paciente diária dias intercalados semanal escala aplicada por profissional médico ou enfermeiro4 8 19 29 33 Quadro 1 Escala de Avaliação Funcional de Karnofsky Graduação Significado 100 Normal ausência de queixas sem evidências de doença 90 Capaz de realizar atividades normais com sinais e sintomas mínimos da doença 80 Atividade normal com esforço e alguns sinais ou sintomas da doença Incapacidade para grande esforço físico mas consegue deambular 70 Não requer assistência para cuidados pessoais mas é incapaz de realizar atividades normais como tarefas caseiras e trabalhos ativos 60 Requer assistência ocasional mas consegue realizar a maioria dos seus cuidados pessoais 50 Requer considerável assistência e frequentes cuidados médicos 40 Incapacitado requer cuidados pessoais e assistência Autocuidado limitado Permanece mais de 50 do horário vígil sentado ou deitado 30 Severamente incapacitado com necessidade de tratamento de suporte permanente embora a morte não seja iminente 20 Paciente muito doente completamente incapaz com necessidade de tratamento de suporte permanente confinado ao leito 10 Moribundo processo de morte progredindo rapidamente 252 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Avaliação socioeconômica Instrumento que permite traçar o perfil socioeconômico de pacientes e seu núcleo familiar para realizar os cuidados em ambiente domiciliar existe a necessidade de condições mínimas no domicílio como água potável energia elétrica e um leito para o paciente A presença de um cuidador responsável também é imprescindível inclui as seguintes informações cor escolaridade renda familiar cômodos da casa quantidade de pessoas que residem no domicílio condição profissional do paciente atual e passada qual o serviço de saúde que procura quando necessita de atendimento médico cuidador principal aplicada por profissional assistente social Genograma O genograma Figura é uma representação gráfica da família e tem sido utilizado em diversos contextos pode ser aplicado em Cuidados Paliativos pois possibilita identificar a rede fami liar cultural e social mais ampliada dos pacientes podendo dessa forma desfazer ou amenizar conflitos que estejam causando sofrimentos social emocional ou espiritual principalmente em situações de terminalidade23 os cuidados em ambiente domiciliar facilitam a coleta das informações para a cons trução do genograma À medida que confiança e cumplicidade com a equipe interdisci plinar se fortalecem a comunicação acontece resultando num gráfico bastante rico e facilitador para a abordagem dinâmica do núcleo familiar o genograma pode ser construído em softwares específicos pelos quais as informa ções do paciente são inseridas no sistema gerando o gráfico final com ilustrações de cada situação referida como por exemplo relações de proximidade conflitos distanciamen tos uso de drogas nascimentos doenças e óbitos etc escala aplicada por profissional médico enfermeiro assistente social ou psicólogo as simbologias do genograma são inúmeras sempre relacionando o paciente com a família e suas redes34 Quadro 2 Sistema Avaliação de Sintomas de Edmonton Mínimo sintoma Intensidade Máximo sintoma Sem dor 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima dor Sem cansaço 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máximo cansaço Sem náuseas 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima náusea Sem depressão 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima depressão Sem ansiedade 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima ansiedade Sem sonolência 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima sonolência Bom apetite 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Sem apetite Máximo bemestar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máximo malestar Sem dispneia 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima dispneia Sem insônia 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima dificuldade para dormir 253 Escala de Zarit reduzida Quadro 3 avaliação da claudicação familiar em Cuidados Paliativos sendo definida como a situação de incapacidade dos elementos de uma família em oferecer uma resposta ade quada às múltiplas necessidades e solicitações do doente A escala de Zarit reduzida em Cuidados Paliativos é útil fácil rápida e confiável apresentando sensibilidade e especifi cidade elevadas para medir a claudicação familiar20 instrumento utilizado para avaliar a sobrecarga do cuidador principal apresenta sete perguntas relacionando aspectos físicos e emocionais do cuidador associados a sua rotina diária com o paciente classifica a sobrecarga do cuidador em leve moderada e grave escala aplicada por profissional assistente social ou psicólogo Homem Abuso de álcool ou drogas Morte X Morando junto Casamento Nascimento de uma criança morta Aborto espontâneo Aborto induzido Gestação Filho adotivo Distante Muito estreito Coalizão Harmônico Vulnerável Triangulação Conflituoso Rompimento Aliança Fundido e conflitual Relacionamentos Filhos ordem de nascimento com o mais velho à esquerda Gêmeos idênticos Gêmeos fraternos Divórcio Separação conjugal Mulher Sexo indefinido Pessoaíndice Figura Exemplos de simbologias do genograma 254 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 3 Escala de Zarit reduzida 1 Sente que por causa do tempo que utiliza com o seu familiardoente já não tem tempo suficiente para você mesmo Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 2 Sentese estressadoangustiado por ter que cuidar do seu familiardoente e ao mesmo tempo ser responsável por outras tarefas p ex cuidar de outros familiares ter de trabalhar Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 3 Acha que a situação atual afeta a sua relação com amigos ou outros elementos da família de forma negativa Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 4 Sentese exausto quando tem de estar junto do seu familiardoente Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 5 Sente que sua saúde tem sido afetada por ter de cuidar do seu familiardoente Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 6 Sente que tem perdido o controle da sua vida desde que a doença do seu familiar doente se manifestou Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 7 No geral sentese muito sobrecarregado por ter de cuidar do seu familiardoente Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 Sobrecarga leve até 14 pontos sobrecarga moderada 1521 pontos sobrecarga grave acima de 22 pontos Hipodermóclise e Cuidados Paliativos em domicílio Consiste na administração de fluidos pela via subcutânea SC3 tem grande aplicabilidade em pacientes internados em domicílio pois permite o envolvimento mais seguro do cuidador capacitado em situações nas quais existe a neces sidade de administrar medicamentos injetáveis em curtos intervalos de tempo via alternativa para pacientes com dificuldade de manter acesso venoso permanen te e que necessitam receber drogas injetáveis7 255 garante a manutenção da hidratação em pacientes impedidos de recebêla por via oral VO quando ainda não foi estabelecida uma via enteral mais segura possibilita uma via segura para pacientes com necessidade de analgesia intermiten te principalmente com drogas opioides garante a continuidade de tratamento em domicílio quando há necessidade de administrar antibióticos injetáveis técnica utilizar cateter agulhado escalpe 21G ou 25G ou nãoagulhado 18G e 24G Após os cuidados de assepsia introduzir a agulha na pele em ângulo de 30 a 45 graus em direção centrípeta com o bisel voltado para cima velocidade de infusão a hidratação pode ser em bolo de 500 ml em 20 minutos repetindo até três vezes em 24 horas Em infusão contínua o volume diário não poderá ultrapassar 3000 ml Administração de volume em período noturno é mais confortável garantindo mais autonomia dos pacientes durante o dia zonas de punção regiões deltóidea infraclavicular abdominal e face lateral da coxa drogas administráveis por via SC29 As drogas e suas respectivas indicações encontramse no Quadro 4 Quadro 4 Fármacos e suas indicações Fármaco Indicações Morfina Dor dispneia Tramadol Dor Escopolamina Estertores premortem sialorreia secreções respiratórias obstrução intestinal Midazolam Convulsões sedação paliativa Metoclopamida Náuseas e vômitos Haloperidol Náuseas e vômitos por opioides vômitos em obstrução intestinal delirium Levomepromazina Ansiedade agitação Dexametazona Múltiplas indicações em CP Octreotida Obstrução intestinal Ceftriaxona cefepima ampicilina Infecção Furosemida ICC anasarca IRA CP Cuidados Paliativos ICC insuficiência cardíaca congestiva IRA infecção respiratória aguda Conclusão Internação domiciliar e Cuidados Paliativos com enfoque interdisciplinar obedecen do aos conceitos validados de melhor qualidade de vida aos pacientes e a seus familia res caracterizamse como excelentes estruturas para prestar acolhimento integral em situações de terminalidade oferecendo suporte humanizado com alívio facilitado dos sintomas físicos emocionais sociais e espirituais em ambiente domiciliar Escalas de ava 256 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP liação de sintomas em Cuidados Paliativos são perfeitamente aplicáveis em domicílio facilitando sua pronta resolução pela equipe interdisciplinar sempre com apoio do cui dador principal Referências 1 ANVISA Agência nacional de Vigilância Sanitária Resolução de Diretoria Colegiada 11 ed Brasília Ministério da Saúde 2006 2 BENÍTEZ DEL ROSARIO M A MARTÍN A S Cuidados paliativos y atención primaria aspectos de organización Berlim Springer 2000 3 BRUERA E et al Hypodermoclysis for the administration of fluids and narcotics analgesics in patients with advanced cancer J Pain Symptom Manage v 5 n 218 p 21820 1990 4 BRUERA E et al The Edmonton Symptom Assessment System ESAS a simple method for the assessment of palliative care patients J Palliat Care v 7 n 2 p 69 1991 5 BRUMLEY R et al Increased satisfaction with care and lower costs results of a randomized trial of inhome palliative care J Am Geriatr Soc v 55 n 7 p 9931000 2007 6 CASTRO M M C et al Validade da Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão em pacientes com dor crônica Revista Brasileira de Anestesiologia v 56 n 5 p 4707 2006 7 COYLE N CHERNY N PORTENOY R Subcutaneous opioid infusion at home Oncology v 8 p 217 1994 8 DOYLE D et al eds Oxford textbook of palliative medicine Oxford New York 2004 9 DUMITRESCU L HEUVELOLAROIU M HEUVEL W J Changes in symptoms and pain intensity of cancer patients after enrollment in palliative care at home J Pain Symptom Manage v 34 n 5 p 48896 2007 10 DUNLOP R Hospital based palliative care teams Oxford University Press In Cancer palliative care London SpringerVerlag 1998 p 2 11 ECHEVERRI T A El cuidado paliativo en casa al paciente terminal MEDUNAB v 4 n 10 p 111 2001 12 FINLAY I et al Palliative care in hospital hospice at home results from a systematic review European Society for Medical Oncology v 13 n 4 p 25764 2002 13 FLORIANI C A SCHRAMM F R Atendimento domiciliar ao idoso problema ou solução Cad Saúde Pública v 20 n 4 p 98694 2004 14 FLORIANI C A SCHRAMM F R Desafios morais e operacionais da inclusão dos cuidados paliativos na rede de atenção básica Cad Saúde Pública v 23 n 9 p 207280 2007 15 FLORIANI C A Cuidados do idoso com câncer avançado uma abordagem bioética In Escola Nacional de Saúde Pública Rio de Janeiro FIOCRUZ 2004 p 136 16 FORNELLS H A Cuidados paliativos en el domicilio Acta Bioethica v 6 n 1 p 6375 2000 17 FREIRE H M F Residência terapêutica inventando novos lugares para se viver Micropolítica do Trabalho e o Cuidado em Saúde Rio de Janeiro Universidade Federal do Rio de Janeiro 2006 18 GLARE P CHRISTAKIS N A Prognosis in advanced cancer Oxford Oxford University Press 2008 p 439 19 GLARE P VIRIK K JONES M A systematic review of physicians survival predictions in terminally ill cancer patients BMJ v 327 n 26 2003 20 GORT A et al Escala de Zarit reducida en cuidados paliativos Medicina Clínica v 124 v 17 p 6513 2005 21 JORDHOY M S et al A palliative care intervention and death at home a cluster randomised trial Lancet v 356 n 9233 p 88893 2000 22 KIRK P KIRK I KRISTJANSON L What do patients receiving palliative care for cancer and their families want to be told A Canadian and Australian qualitative study BMJ v 328 n 7452 p 1343 2004 23 KRUGER L WERLANG B O genograma como recurso no espaço conversacional terapêutico Aval Psicol v 7 n 3 p 41526 2008 24 KURTZ M E et al A randomized controlled trial of a patientcaregiver symptom control intervention effects on depressive symptomatology of caregivers of cancer patients J Pain Symptom Manage v 30 p 11222 2007 257 25 MALTONI M et al Successful validation of the palliative prognostic score in terminally ill cancer patients Journal of Pain and Symptom Management v 17 n 4 p 2407 1999 26 MERHY E E Saúde a cartografia do trabalho vivo Rio de Janeiro Hucitec 2002 v 1 27 MINISTÉRIO DA SAÚDE Portaria nº 2529 institui a internação domiciliar no âmbito do SUS Ministério da Saúde 2006 28 MINISTÉRIO DA SAÚDE Lei nº 10424 do subsistema de atendimento e internação domiciliar complemento da Lei nº 8080 Brasília Ministério da Saúde 2002 29 MINISTERIO DE SANIDAD Y CONSUMO Guía de práctica clínica sobre cuidados paliativos anexos 2008 VitoriaGasteiz Servicio Central de Publicaciones del Gobierno Vasco 30 PARKER S et al A Systematic review of prognosticendoflife communication with adults in the advanced stages of a lifelimiting illness patientcaregiver preferences for the content style and timing of information Journal of Pain and Symptom Management v 34 n 1 p 8193 2007 31 PIDI Programa de Internação Domiciliar Interdisciplinar para pacientes oncológicos Internação domiciliar e cuidados paliativos 2009 Disponível em httpwwwfaucombrpidi Acesso em maio 2009 32 REZENDE V L et al Depressão e ansiedade nos cuidadores de mulheres em fase terminal de câncer de mama e ginecológico Rev Bras Ginecol Obstet v 27 p 73743 2005 33 VIGNAROLI E et al The Edmonton Symptom Assessment System as a screening tool for depression and anxiety Journal of Palliative Medicine v 9 n 2 p 296303 2006 34 WENDT N CREPALDI M A Utilização do genograma como instrumento de coleta de dados na pesquisa qualitativa Psicologia Reflexão e Crítica v 21 n 2 p 30210 35 WHO World health Organization Cancer control knowledge into action WHO Guide for Effective Programmes Geneva WHO 2007 36 WHO World Health Organization National Cancer control Programmes policies and managerial guidelines world 2002 258 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Cuidados com feridas e curativos renAto rodriGues CAmArão Introdução A abordagem da ferida oncológica pelo profissional da saúde pode seguir duas linhas de ação A primeira é a abordagem da lesão oncológica como um ente clínico isolado que exi ge por suas características e seu prognóstico ímpares uma série de condutas e protocolos bem definidos Essas condutas frequentemente diferem das ações preconizadas para todos os outros tipos de ferida E elas devem estar bastante claras para todos os profissionais dire tamente envolvidos no tratamento das lesões de modo que os mesmos ofereçam cuidados que deem respostas prontas efetivas e que atendam as necessidades do doente A segunda linha de ação é aquela que satisfaz mais plenamente os princípios gerais dos Cuidados Paliativos Não se trata da abordagem focada na ferida oncológica mas na pessoa portadora da lesão E essa abordagem compreende as dimensões física psicológi ca social e espiritual Entre outros estados associados à presença da ferida oncológica a pessoa portadora geralmente apresenta sensação de mutilação rejeição de si mesma perda da autonomia e da autoestima medo tendência à automutilação déficit de autocuidado perda da es perança diminuição da libido por fatores sistêmicos e por déficit de informação3 7 9 A ferida determina discriminação e rejeição social desde o âmbito familiar até as atividades produtivas humilhação pena medo nojo desagrado Os pacientes sentemse podres por dentro3 o que os afasta das outras pessoas para não se exporem a comen tários desagradáveis ou temendo rejeição O aparecimento da ferida oncológica também tem repercussões no âmbito familiar É importante ao profissional da saúde considerar que no câncer em seu curso avançado normalmente ocorre a transferência dos cuidados para a família Esse aumento da so brecarga tem consequências físicas psíquicas sociais e econômicas para cada familiar Geralmente a atividade profissional do cuidador fica em segundo plano levando ao de semprego e à desestruturação financeira da família13 21 Realizar os curativos em domicílio é considerado uma das principais dificuldades en contradas pelos cuidadores12 Depois de analisar esses diferentes aspectos inserindo paciente família e sociedade profissionais instituições e serviços num funcionamento dinâmico eficaz e justo é possí vel vislumbrar uma resolubilidade maior ao problema da ferida oncológica Conceito As feridas oncológicas são formadas pela infiltração das células malignas do tumor nas estruturas da pele Ocorre quebra da integridade do tegumento em decorrência da proliferação celular descontrolada que o processo de oncogênese induz levando à forma ção de uma ferida evolutivamente exofítica1517 259 Podem ocorrer por extensão do tumor primário ou ainda por uma metástase im plantação acidental de células na pele durante um procedimento cirúrgico ou diagnósti co ou invasão de linfonodos próximos ao tumor primário6 O termo ferida oncológica não é consensual na literatura Encontramse ainda outros nomes como lesões tumorais úlceras neoplásicas feridas malignas e lesões neoplásicas6 Classificação As feridas oncológicas se classificam quanto à localização e à topografia quanto à origem primária originase no local do tumor primário metastática tem como origem um local de metástase quanto à aparência fungosa aparência fungosa semelhante à couveflor ulcerativa forma crateras fungosa maligna ulcerativa apresenta ambos os aspectos quanto ao estadiamento Quadro 1 Características As principais características e sintomas locais da ferida são1618 progressão rápida e inviabilidade de cicatrização hemorragias odor fétido exsudato abundante alto risco para infecção alto risco para miíase presença de necrose tecidual dor prurido agressão do tecido saudável perilesional Condutas Alguns tratamentos nãoespecíficos são sugeridos para o controle das feridas oncológicas radioterapia destrói células tumorais diminui o tamanho da lesão o exsudato e o sangramento4 18 quimioterapia reduz o tumor e melhora a dor hormonoterapia diminui a maior parte dos sintomas quando indicada laser reduz a dor e a necrose tissular 260 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 1 Estadiamento de feridas oncológicas segundo HaisfieldWolfe e BaxendaleCox 199917 Estádio 1 Pele íntegra Tecido de coloração avermelhada eou violácea Nódulo visível e delimitado Encontrase em estado assintomático Estádio 1N Feridas fechadas ou com abertura superficial por orifícios de drenagem de secreção límpida amarelada ou de aspecto purulento Tecido avermelhado ou violáceo lesão seca ou úmida Pode haver dor e prurido Não apresenta odor e configurase sem tunelizações eou formação de crateras Estádio 2 Feridas abertas envolvendo derme e epiderme Ulcerações superficiais podendo apresentarse friáveis sensíveis à manipulação com secreção ausente lesões secas ou em pouca quantidade lesões úmidas Intenso processo inflamatório ao redor em que o tecido exibe coloração vermelha eou violácea e o leito da ferida configurase com áreas secas e úmidas Pode haver dor e odor Não formam tunelizações pois não ultrapassam o tecido subcutâneo Estádio 3 Feridas que envolvem derme epiderme e subcutâneo Têm profundidade regular mas com saliências e formação irregular São friáveis com áreas de ulcerações e tecido necrótico liquefeito ou sólido e aderido Fétidas secretivas já com aspecto vegetativo mas que não ultrapassam o subcutâneo Podem apresentar lesões satélites em risco de ruptura iminente Tecido de coloração avermelhada violácea O leito da lesão é predominantemente de coloração amarelada Estádio 4 Feridas invadindo profundas estruturas anatômicas Com profundidade expressiva por vezes não se visualizam seus limites Têm secreção abundante odor fétido e dor O tecido ao redor exibe coloração avermelhada violácea O leito da lesão é predominantemente de coloração amarelada No entanto a terapia tópica específica é a que traz melhores resultados no manejo da úlcera neoplásica A ferida oncológica é uma entidade clínica dinâmica e por esse motivo exige avalia ção diária e preparo adequado da equipe para identificar os sinais presentes ou potenciais de complicação O paciente a família e os cuidadores devem ser treinados a identificar essas situações e reportálas aos profissionais da saúde A conduta terapêutica deve ser ajustada às características da lesão obedecendo aos princípios de cuidados com feridas A meta principal dessas condutas deixa de ser a ci catrização que é improvável e passa a focar a o conforto do paciente com relação à ferida b a prevenção e o controle dos sintomas locais As condutas serão adequadas aos principais sintomas conforme descrito a seguir 261 Hemorragias Estão relacionadas com o crescimento da rede neovascular na região do tumor associada muitas vezes à presença de tecido friável o que favorece o rompimento de vasos Os sangramentos podem ser espontâneos ou causados por atividades e procedimen tos como ações de vida diária banho cuidados pessoais movimentação no leito deam bulação movimentos bruscos radioterapia local compressão mecânica traumatismos utilização ou retirada dos curativos de forma inadequada abrasão durante a técnica de curativo ou a realização de desbridamento Os principais sítios de sangramento são feridas cutâneas notadamente lesões de cabeça e pescoço cavidade oral úterovagina sangramentos gástricos Prevenção4 5 17 18 Manter o meio úmido evitando a aderência de gazes ao sítio ou à superfície e às bordas da lesão Para isso podese utilizar gaze embebida em soro fisiológico ou gaze com petrolato Contraindicase o uso de óleos essenciais como por exemplo os triglicérides de cadeia média TCM devido à sua propriedade de estimular a neoangiogênese retirar coberturas de curativo cuidadosamente Na ausência de sangramento ativo inspecionálas buscando sinais de sangramentos anteriores evitar a abrasão do leito da ferida quando potencialmente sangrante durante o procedimento de curativo na medida do possível manter o local da ferida livre de compressões mecânicas restringir os desbridamentos àqueles casos em que o benefício ao paciente seja maior que o risco de hemorragia e apenas quando houver recursos disponíveis para controlála Tratamento18 19 Avaliar intensidade origem e causa do sangramento aplicar pressão diretamente sobre os vasos sangrantes com o amparo de gazes ou compressas a aplicação tópica de soro fisiológico gelado realiza hemostasia principalmente em pequenos sangramentos considerar a aplicação tópica de adrenalina pela sua ação vasoconstritora aplicar gel de alginato de cálcio com carboximetilcelulose na lesão com gazes esté reis ou placa de alginato de cálcio Depois da aplicação o curativo com alginato de cálcio deve ser mantido no local por no mínimo 24 horas a não ser que haja necessidade de outra intervenção no local Devese evitar o contato do alginato de cálcio com as bordas da lesão devido ao risco de maceração da pele íntegra avaliar a possibilidade de iniciar antifibrinolítico sistêmico intervenção cirúrgica sutura cauterização ou radioterapia hemostática em casos de sangramento intenso em hemorragias grandes ou frequentes considerar a coleta de exames laboratoriais com vistas a hemotransfusões 262 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Em caso de sangramento de lesões intravaginais18 realizar irrigação intravaginal com soro fisiológico gelado Utilizar sonda de nela ton no 12 lubrificada com lidocaína gel e introduzida com cuidado para não aumentar o sangramento em caso de refratariedade à irrigação vaginal com soro gelado utilizar duas ampo las de adrenalina diluídas em um frasco de 250 ml de soro fisiológico gelado e realizar irrigação vaginal com essa solução considerar a possibilidade de tratamento antifibrinolítico sistêmico Odor fétido É considerado o sintoma mais castigador das feridas oncológicas em decorrência da sensação de enojamento imputada ao paciente17 Ocorre devido à colonização bacteria na principalmente de anaeróbias no sítio da ferida As principais causas são a presença de necrose exsudato abundante associado a curativos de baixa absorção oclusão dos vasos sanguíneos locais e a consequente redução de oxigênio Prevenção Controlar o exsudato considerar o riscobenefício de desbridamento Tratamento8 17 18 A conduta é eleita mantida ou alterada depois da quantificação do odor Quadro 2 A avaliação deve ser realizada diariamente Devemse sempre levar em conta os rela tos e as queixas do paciente da família e dos cuidadores No caso de internação em en fermarias conjuntas mais de um paciente por enfermaria o relato dos outros pacientes e acompanhantes também é importante Quadro 2 Classificação de odor18 Grau I O odor fétido é sentido apenas ao se abrir o curativo Grau II O odor fétido é sentido ao se aproximar do paciente sem abrir o curativo Grau III O odor fétido é sentido no ambiente sem abrir o curativo e caracteristicamente forte eou nauseante O Quadro 3 traz a conduta para controle do odor conforme o grau É importante cobrir o curativo primário com gaze embebida em petrolato instalar curativo secundário com coxins ou gazes a depender da quantidade de exsudato e ocluir completamente com fita adesiva microporosa ou equivalente Recomendase observar o padrão alimentar do paciente e elaborar um plano de cui dados que evite a troca de curativos próximo aos horários das refeições 263 Feridas oncológicas de cavidade oral e necrose de base de língua Prevenção ou odor grau I orientar o paciente a fazer bochecho com solução de bicarbonato de sódio no mí nimo três vezes por dia na ausência da solução de bicarbonato usar a metronidazol solução injetável diluída em solução fisiológica na proporção 11 b metronidazol comprimido de 250 mg macerado e diluído em 50 ml de solução fisiológica orientando o bochecho dessa solução no mínimo três vezes por dia Odor graus II e III ou pacientes que não conseguem fazer bochecho utilizar metronidazol comprimido 250 mg preparar uma solução com um comprimido macerado a cada 50 ml de solução fisiológica adicionar a cada 50 ml de solução uma a duas colheres de sopa de sulfadiazina de prata meia colher de óleo mineral misturar até formar uma papa Aplicar com uma espátula sobre a ferida Para assegurar e melhorar o conforto devemse tomar medidas que incluam o controle de odor ambiental principalmente se houver odor grau III Entre esses cui dados estão o aporte e a circulação de ar seja por janelas ou sistema de condicio namento de ar Quadro 3 Controle do odor conforme o grau Odor grau I19 Proceder à limpeza com solução fisiológica a 09 Deixar gazes embebidas em hidróxido de alumínio ou metronidazol gel no leito da ferida Odor grau II Proceder à limpeza com solução fisiológica a 09 Irrigar a ferida com solução de metronidazol Podemse usar a solução injetável diluída em solução fisiológica na proporção 11 b comprimido de 250 mg macerado e diluído em 50 ml de solução fisiológica Verificar presença de tecido necrótico endurecido Se houver realizar escarotomia Ocluir a ferida com curativo industrializado de carvão ativado Na ausência ou impossibilidade do uso de carvão ativado aplicar metronidazol comprimido de 250 mg macerado ou gel a 08 sobre a ferida Na ausência de qualquer um desses anteriores instalar gazes embebidas em solução injetável de metronidazol diluída em soro fisiológico na proporção 11 Odor grau III Considerar emergência dermatológica Seguir os passos conforme odor grau II Associar o uso de metronidazol sistêmico ao tratamento local 264 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Exsudato A monitoração do exsudato diminui o odor aumenta o conforto e melhora a autoestima do paciente O controle da infecção local e da quantidade de tecido necrótico pode diminuir o exsudato da ferida em alguns casos Tratamento17 18 Aplicar curativos absortivos conforme a quantidade de exsudato Indicase gel de alginato de cálcio com carboximetilcelulose ou a placa seca de alginato de cál cio no leito da lesão Devese evitar o contato do alginato de cálcio com as bordas íntegras da ferida cobrir com gazes ou coxins curativo secundário manter a placa de alginato na lesão por no máximo 24 horas trocar o curativo secundário sempre que necessário na ausência de qualquer apresentação de alginato de cálcio utilizar coberturas primária e secundária com gazes ou coxins trocandoos sempre que se mostrarem saturados de secreção é importante avaliar aumento na frequência de trocas Devese ter cuidado com sangramento nesses casos em caso de secreção purulenta em grande quantidade principalmente quando associada a odor fétido considerar a utilização de antibiótico sistêmico de acordo com os protocolos institucionais e com as indicações para odor grau III Miíase É uma dermatozoonose causada pela presença de larvas de insetos mais co mumente moscas em órgãos e tecidos humanos5 17 18 Pode ser classificada pela localização em cutânea subcutânea e cavitária6 Prevenção Controle ambiental utilização de sistemas de condicionamento de ar instala ção de telas protetoras em portas e janelas nos locais de exposição ao ar ambiente protocolos e ações adequados de limpeza e higiene da unidade controle do odor e do exsudato da ferida na presença de ostomias orientar a proteção do orifício com gaze ou outro tecido fino ou com bolsas apropriadas para esse fim no caso de risco de exposição aos insetos Tratamento5 17 18 Utilizar antiparasitário por via oral VO Recomendase ivermectina 6 mg um comprimido por VO30 kg de peso em dose única limpeza rigorosa da ferida retirada mecânica das larvas quando possível Atenção ao risco de sangramento 265 troca de curativos com maior frequência até que haja controle de odor e ex sudato e a certeza de que todas as larvas foram eliminadas detectar possível infecção secundária e necessidade de antibioticoterapia sistêmica Dor A dor pode estar localizada na própria ferida oncológica ou aparecer em decorrên cia dessa Está relacionada com os seguintes fatores21 infiltração do tumor em áreas inervadas compressão de tecidos e nervos devido ao crescimento do tumor necrose tecidual localizada como resultado da invasão tumoral exposição de terminações nervosas no local da lesão procedimentos invasivos de diagnóstico e tratamento realização de técnicas de curativo inadequadas instalação de curativos compressivos ou inadequados no local complicações ocasionadas pelo próprio tratamento como infecções e inflamação tecidual incapacidade de movimento ou alinhamento corporal inadequado determinados pela presença da ferida oncológica Há alguns desafios no controle da dor Um deles é sua própria natureza complexa e pluricausal e suas expressões1 4 13 O outro é o convívio cotidiano e passivo dos profis sionais da saúde com a dor do outro13 19 A dor terá tratamento adequado apenas quando for prioridade13 Prevenção e tratamento17 18 Monitorar a dor Recomendase a escala visual analógica EVA realizar analgesia prévia ao procedimento de curativos 30 minutos em analgesia VO ou subcutânea SC 5 minutos para a via endovenosa EV início imediato para a via tópica irrigar o curativo com soro fisiológico a 09 antes da retirada do mesmo Remo vêlo delicadamente com atenção às expressões de dor do paciente empregar técnica cautelosa sem abrasão mecânica do leito ulcerado considerar a necessidade de aplicação de gel anestésico sobre o leito da ferida Recomendase lidocaína gel a 4 utilizar coberturas que mantenham a umidade no leito da ferida comunicar e discutir com a equipe os casos de sofrimento álgico que fogem ao controle da conduta preconizada Prurido Algumas classificações e escalas de dor consideram o relato de prurido um grau de dor A dor e o prurido na ferida oncológica possuem várias causas em comum Em alguns casos a falta de proteção à pele íntegra perilesional pode levar a irritação e consequente prurido5 17 18 266 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Prevenção e trAtAmento18 19 Investigar alergias prévias do paciente pesquisar se a causa do prurido é decorrente de alergia aos produtos utilizados no curativo ou à fita adesiva Nesse último caso utilizar fita hipoalergênica micro porosa2 10 11 14 controlar o exsudato que é potencialmente agressivo à pele íntegra considerar o uso de dexametasona pomada a 01 no local referido ou a necessi dade de terapia sistêmica nos casos mais persistentes Necrose tecidual O desbridamento da ferida oncológica deve ser considerado com muito bom senso e essa possibilidade deve passar por rigorosa análise de cada caso pela equipe inter disciplinar Levamse em consideração a extensão da área a ser desbridada a presença de infecções locais a vascularização e neovascularização do local os riscos para o paciente cujo principal é o sangramento durante ou após o procedimento e os benefí cios diminuição de volume de feridas fungosas controle de odor refratário às terapias padronizadas17 18 A presença de necrose tecidual é um fenômeno comum na ferida oncológica sendo discutível se há alguma forma de prevenila Tratamento17 18 Proceder ao desbridamento enzimático primeiramente e se necessário ao cirúrgico posteriormente Para se realizar o desbridamento enzimático é necessário determinar a área de necrose a ser desbridada em relação à área total da ferida limpar a ferida com soro fisiológico a 09 em jato de alta pressão se houver área de necrose seca proceder à escarificação da mesma pela técnica de quadriculação aplicar hidrogel sobre a área de necrose com o auxílio de gazes O hidrogel facilitará o desbridamento autolítico no local na ausência de hidrogel utilizar papaína gel ou creme diretamente sobre o leito da ferida A concentração da papaína será proporcional à área de necrose a ser retirada Quadro 4 cobrir usando gazes ou coxins O processo de desbridamento enzimático exige acompanhamento atencioso e inspe ção frequente por parte da equipe Deve ser interrompido sempre que houver qualquer sinal de hemorragia na lesão Quadro 4 Concentração de papaína com relação à área de necrose18 Papaína a 10 a 12 Necrose na maior parte da lesão Papaína a 6 Necrose em 50 da lesão Papaína a 2 Necrose na menor parte da lesão 267 Cuidados com a pele perilesional18 19 A pele perilesional deve ser inspecionada diariamente a cada troca de curativos2 10 11 14 17 limpa com soro fisiológico e seca cuidadosamente sem abrasões Em seguida usase um dos produtos a seguir dependendo da extensão de pele a ser protegi da das condições da ferida e da disponibilidade desses produtos Hidrocoloide em placa ou gel podese usar curativo transparente para fixar a placa aplicar o gel com o auxílio de gazes Trocar diariamente pois seca mais rápido Triglicérides de cadeia média aplicar gazes embebidas em TCM com cuidado para que o mínimo do produto es corra para o leito da ferida Vitamina A aplicar a vitamina A de forma semelhante ao TCM a vitamina A estimula a reepitelização rápida devendo portanto ser usada com parcimônia Creme de sulfato de zinco aplicar em toda a borda da perilesão Não oferece riscos se cair no leito da ferida Além dos cuidados já propostos devese fazer o controle da infecção e do exsudato posto que interferem diretamente sobre a pele íntegra Nas feridas ou fístulas cutâneas altamente exsudativas considerar o uso de bolsas coletoras6 17 Referências 1 ARANTES A C L Q A terapêutica da dor intratável no câncer terminal Revista Einstein São Paulo Hospital Israelita Albert Einstein 2005 2 BORGES E L et al Feridas como tratar Belo Horizonte Coopmed Editora Médica 2001 3 BRAGANÇA A T N M O acolhimento como promoção da saúde entre pacientes com câncer 2006 Dissertação Mestrado Universidade Federal do Rio Grande do Norte Rio Grande do Norte 2006 4 BRASIL Ministério da Saúde Instituto Nacional de Câncer Cuidados paliativos oncológicos con trole da dor Rio de Janeiro INCA 2001 5 CANDIDO L C Nova abordagem no tratamento de feridas São Paulo Editora SENACSP 2001 6 CREMESP Cuidado paliativo Coordenação institucional de Reinaldo Ayer de Oliveira São Paulo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo 2008 7 FEIJÓ A M et al Mudanças relacionadas à sexualidade nos pacientes oncológicos submetidos ao tratamento radioterápico Projeto de Pesquisa Rio Grande do Sul Universidade Federal de Pelotas 2007 8 FIRMINO F et al O controle do odor em feridas tumorais através do uso de metronidazol Revista Prática Hospitalar v IV n 24 p 303 2002 9 GUTIÉRRES M G R et al Natureza e classificação das intervenções de enfermagem em ambulató rio de quimioterapia de adultos Revista LatinoAmericana de Enfermagem v 8 n 3 p 339 2000 10 HESS C T Tratamento de feridas e úlceras Rio de Janeiro Reichmann Affonso Ed 2002 11 JORGE S A et al Abordagem multiprofissional no tratamento de feridas São Paulo Atheneu 2003 12 KALINKE L P et al As dificuldades apresentadas por cuidadores familiares de pacientes oncológi cos em cuidados domiciliares uma visão da enfermagem Paraná Universidade de Tuiuti 2006 268 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP 13 LEÃO E R CHAVES L D Dor quinto sinal vital 2 ed Rio de Janeiro Martinari 2007 14 MANUAL DE TRATAMENTO DE FERIDAS Universidade Estadual de Campinas UNICAMP Hospital das Clínicas Grupo de Estudos de Feridas 1999 15 OTTO S E Oncologia Rio de Janeiro Reichmann Affonso 2002 16 POLETTI N A A et al Feridas malignas uma revisão de literatura Revista Brasileira de Cancero logia n 48 n 3 p 4117 2002 17 PROTOCOLO DE ENFERMAGEM PARA O ATENDIMENTO DE FERIDAS TUMORAIS MALIGNAS CUTÂ NEAS Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal Gerência de Atenção Domiciliar Núcleo Regional de Atenção Domiciliar de Sobradinho NRAD Equipe de Cuidados Paliativos BrasíliaDF 2009 18 PROTOCOLO MULTIDISCIPLINAR DE TRATAMENTO DE FERIDAS E ESTOMIAS DO HOSPITAL DE APOIO DE BRASÍLIA Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal Hospital de Apoio de Brasília Nú cleo de Enfermagem Comissão de Educação Permanente do Núcleo de Enfermagem BrasíliaDF 2007 19 SILVA L M H ZAGO M M F O cuidado do paciente oncológico com dor crônica na ótica do enfermeiro Revista LatinoAmericana de Enfermagem v 9 n 4 2001 20 STERN T A SEKERES M A Facing cancer a complete guide for people with cancer their families and careguivers New York McGrawHill Companies 2004 21 TULLI A C P PINHEIRO C S C TEIXEIRA S Z Dor oncológica os cuidados de enfermagem Revista da Sociedade Brasileira de Cancerologia v 7 n 1 1999 269 Cuidado com ostomias AnAliCe Assis CunhA As palavras ostomia ostoma estoma e estomia de origem grega significam boca ou abertura e são utilizadas para indicar a exteriorização de qualquer víscera oca do corpo por meio de ato cirúrgico ou seja a abertura que passa ter contato com meio externo Segundo a Associação Brasileira de Ostomizados ABRASO estimase que no Brasil há cerca de 50 mil ostomizados e 10 mil inscritos no Programa de Ostomizados do Siste ma Único de Saúde SUS As causa que levam à realização de uma ostomia são neoplasias traumas abdominais doenças inflamatórias doenças congênitas Dependendo da etiologia da doença o cirurgião indica a realização de uma ostomia temporária ou definitiva A realização desse procedimento acarreta uma série de mudan ças na vida diária do paciente e da família sendo necessário um cuidado de enferma gem O paciente terá de conviver com a mudança fisiológica e todas as implicações decor rentes dessa alteração Principais cuidados no préoperatório apoio psicológico demarcação preparação da área para cirurgia conhecimento da indicação do dispositivo realização de teste de sensibilidade com o dispositivo indicado Pósoperatório imediato visualizar efluentes não exercer pressão abdominal primeira troca deve ser realizada pela equipe de enfermagem com higiene criteriosa realizar o corte do dispositivo bolsa coletora do tamanho exato do estoma Tipos de ostomias Alimentação Gastrostomia procedimento cirúrgico ou percutâneo que consiste na confecção de uma fístula entre o estômago e o exterior através da parede abdominal com colocação de um cateter 270 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP jejunostomia inserção de um cateter com 20 a 30cm no duodenojejuno com finalidade descompressiva ou para alimentação sendo a indicação mais usada Eliminação Colostomia procedimento que promove desvio do trânsito intestinal mediante a construção de um ânus artificial na parede abdominal permitindo a eliminação de fezes e gazes ileostomia esteriorização do íleo terminal geralmente no quadrante inferior di reito do abdome para desvio do trânsito intestinal ou como porção terminal do tubo digestivo urostomia intervenção cirúrgica que consiste em desviar o curso normal da via urinária Figura 1 Ostoma intestinal1 Figura 2 Ostoma intestinal1 271 Cuidados com o estoma Observar cor vermelhovivo brilho umidade presença de muco tamanho e forma fazer a higiene do estoma durante o banho com água e sabão sem esfregálo Nunca usar substâncias agressivas à pele como álcool mertiolate benzina colônia pomadas ou cremes benjoim pois podem favorecer o ressecamento da pele e o processo alérgico tomar cuidado com insetos que podem ter acesso ao estoma evitar roupas apertadas e com elástico caso ocorra alguma alteração procurar serviço médico sugerir que regularmente se esvazie e se limpe a bolsa para maiores segurança e conforto nos momentos mais íntimos Independentemente de ser definitivo ou temporário esse procedimento acarreta mudanças na vida do paciente e na imagem corporal sendo necessária a intervenção da equipe de enfermagem O enfermeiro deverá fornecer informações que facilitem a adaptação à nova con dição de vida estimular o autocuidado e ser o elo de informação entre o ostomizado e a família ou cuidador facilitando assim reabilitação valores pessoais e autoestima do paciente O profissional de enfermagem deve trabalhar também crenças medos e tabus pro duzindo a manutenção dos convívios profissional social e familiar e acompanhando a adaptação à nova condição de vida do doente Complicações em ostomias Hérnia abaulamento ao redor do estoma isquemia e necrose alteração da cor do estoma resultante da circulação sanguí nea deficiente sangramento ou hemorragia pouco frequente pode decorrer de hemostasia ina dequada tanto na parede abdominal como na mucosa da alça intestinal edema complicação comum pode ser considerado pelo trauma cirúrgico ou ma nuseio da alça intestinal no trajeto aberto da parede abdominal estenose estreitamento do estoma produzido por circulação sanguínea deficien te ou má cicatrização prolapso exteriorização ou protusão de segmento da alça intestinal que desliza na parede abdominal ocorrendo falha na sua fixação Objetivos da intervenção da enfermagem Garantir o tratamento do ostomizado e de sua família ajudálo no processo de adaptação escolher e ajustar dispositivos de modo individualizado evitando expor o cliente e a família instruir o ostomizado sobre a utilização do material ou dieta promover autoestima e autocuidado para facilitar a reabilitação promover a participação ativa da família em todo processo desde o diagnóstico 272 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Figura 3 Aspectos importantes a considerar na orientação do paciente ostomizado Os cuidados de enfermagem ao ostomizado quando iniciados nos momentos do diag nóstico e da indicação cirúrgica tendem a minimizar o sofrimento e facilitar a reabilita ção do paciente O enfermeiro deve ter uma visão holística de forma a criar capacidade para que o paciente desfrute de uma qualidade de vida igual ou melhor à de antes do estoma Existem três elementos fundamentais no cuidar de pacientes ostomizados ter conhecimento teórico sobre doença tratamentos e seus efeitos empatia e autoconhecimento habilidade prática e experiência no cuidado Autoestima e autocuidado facilitam a reabilitação do paciente Figura 3 troCA do disPositivo Limpar bem a pele periestoma retirando o resíduo medir o tamanho do estoma A placa que é colada no abdome pode ser recortada e como possui marcação de fábrica permite escolher qual o tamanho compatível com o orifício do estoma cortar o dispositivo sem deixar pele exposta sempre três milímetros maior que o estoma aderir o dispositivo à pele a primeira troca deve ser realizada por um profissional de enfermagem e assistida por um cuidador ou familiar para esclarecer todas as dúvidas incentivar o autocuidado além do apoio emocional orientar a família a retirar os dispositivos vidA soCiAl e FAmiliAr seXuAlidAde AsPeCto FísiCo ensino 273 Figura 4 Bolsa coletora adequadamente posicionada e fixada mate rial distribuído pelo SUS permitindo a drenagem de resíduos SUS Sistema Único de Saúde Referências 1 FIGURAS E IMAGENS SOBRE ESTOMAS Assistência em estomaterapia do Hospital do Servidor Público Estadual 2 GEOVANINI T OLIVEIRA JR A G Manual de curativos 2 ed rev e ampl São Paulo Corpus 2008 3 ORIENTAÇÕES SOBRE OSTOMIAS Disponível em httpwwwabrasoorgbrsite 4 ORIENTAÇÕES SOBRE OSTOMIAS Disponível em httpwwwincagovbrpublicaçõesostomiaspdf Acesso em 2009 5 SANTOS V L C G CESARETTI I U R Assistência em estomaterapiacuidando do ostomizado São Paulo Atheneu 2001 p 11332 6 SIMÕES I Cuidados de enfermagem ao doente ostomizado Revista Referência São Paulo n 9 nov 2002 274 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Higiene e conforto ivAnYse PereirA Introdução Falar sobre higiene em Cuidado Paliativo pode parecer redundante quando pensamos num contexto hospitalar No entanto se partirmos do princípio de que Cuidado Paliativo é uma filosofia de atendimento muito mais do que o espaço físico que nos cerca a hi giene parecerá ter pertinência para ser abordada num capítulo que se propõe a abordar o conforto do paciente A palavra higiene originase do grego hugieinós que ajuda a manter a saúde En tendese por higiene um conjunto de práticas de limpeza tanto com o corpo quanto com o ambiente em que se vive Durante séculos as normas de asseio inexistiram Foram neces sárias epidemias e consequentes perdas humanas para que boas práticas higiênicas fossem incorporadas ao cotidiano da humanidade Silva 2004 Ainda hoje há sociedades que vivem em condições precárias de salubridade e com grandes problemas de saúde pública Em Cuidados Paliativos a tônica não é diferente quando se fala em higiene O que muda nessa modalidade de atendimento é que os padrões higiênicos preconizados em saúde pública devem ser adaptados ao conjunto de valores socioculturais do paciente Com a adequação dos conceitos de higiene do científico e contemporâneo com o indivi dual e cultural surge o conforto do paciente A equipe que assiste o paciente e sua família deverá realizar análise sistemática e contínua do plano de cuidados objetivando sempre um planejamento assistencial viável inclusive economicamente Com o declínio clínico eou psicológico dos pacientes os cuidados voltados para hi giene e conforto físico vão obtendo dimensões cada vez maiores em consequência da per da de autonomia e dificuldade do autocuidado Essa realidade faz com que os pacientes sob Cuidados Paliativos tenham grande demanda por ajuda seja ela parcial ou integral para a manutenção de higiene corpórea integridade da pele asseio pessoal estética necessária para assegurar a sua dignidade e manutenção de seus papéis sociais ante si mesmo e a família Lembrar que essa dignidade deve ser estendida também ao preparo do seu corpo depois do óbito As práticas que usualmente têm mais impacto na higiene e no conforto físico dos pacientes estão apresentadas no Quadro Higiene do ambiente Como higiene do ambiente entendese um conjunto de práticas que faça a manuten ção da ventilação do ambiente sua iluminação adequada e a limpeza do espaço físico sem desvinculálo da identidade do paciente Os apontamentos descritos aqui podem ser 275 Quadro Práticas mais comuns para higiene e conforto Higiene do ambiente Banho de aspersão de chuveiro Banho no leito Higiene do couro cabeludo Higienes oral e íntima Adequação da cama e sua arrumação Troca de fraldas Tricotomia facial Massagem de conforto Mudança de decúbito Readequação do vestuário adaptados desde para instituições hospitalares com enfermaria de Cuidados Paliativos até hospedarias e domicílios no entanto é importante lembrar que higiene do ambiente abrange todos os espaços por onde o paciente circula O conjunto de práticas objetivando a redução do número de infecções hospitalares ou comunitárias não é fator secundário na execução da assistência ao paciente sob Cuidado Paliativo O espaço físico onde o pacien te está acomodado deve favorecer conforto acolhimento e proteção de riscos externos à sua condição clínica atual Em uma instituição hospitalar a flexibilidade nos horários de visitas a companhia permanente no quarto com entrada de crianças e um espaço no qual as famílias possam relacionarse umas com as outras são medidas importantes para que o Cuidado Paliativo aconteça de fato O maior desafio das instituições hospitalares talvez seja criar normas que possibilitem a entrada de pertences pessoais e adaptações no quarto de acordo com os desejos do paciente pois há barreiras legais a serem transpostas A permissão para a colocação de plantas fotografias e objetos pessoais de decoração são medidas possíveis e com implicações pequenas no controle das infecções hospitalares A liberação de animais para visitação hospitalar é outra medida de conforto que também poderia ser oferecida aos pacientes em Cuidados Paliativos no entanto ainda carece de regulamentação e reflexão dos profissionais da saúde sobre o assunto no Brasil Nos EUA a entrada de animais de estimação nos hospitais e hospices segue um protocolo específico produzido pela American Veterinary Medical Association AVMA4 Animais saudáveis vacinados e bemcuidados não necessariamente transmitem doenças Com bom senso e algumas precauções os benefícios das atividades e terapias com animais de estimação geralmente superam os riscos especialmente entre crianças e idosos No domicílio a higiene do ambiente deve partir do valor cultural familiar e da agre gação de novas práticas orientadas pelo enfermeiro que assiste o paciente sob Cuidado Paliativo Reconhecer e entender as limitações da família não nos exime de promover uma mudança comportamental no núcleo familiar e em suas práticas de limpeza Caberão aos profissionais as orientações sobre remoção da poeira com pano úmido e limpeza da cama 276 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP e dos utensílios utilizados com o paciente Fazer junto com o cuidador familiar mostra que a mudança é possível Desde 2004 a Joint Comission on Accreditation of Healthcare Organizations JCAHO tem em seus protocolos de controle de qualidade um programa de vigilância em infec ção para o atendimento domiciliário e hospice4 No estado de São Paulo a Associação Paulista de Estudos e Controle de Infecção Hospitalar APECIH publicou em 2004 um livro com orientações de prevenção e controle de infecções em assistência domiciliária instituições de longa permanência e outras modalidades de atendimento à saúde2 Em bora a modalidade hospice não tenha sido citada as orientações para instituições de longa permanência são passíveis de adequação e utilização nesse modelo2 Uma supervisão adequada dessa prática é demonstrada na Figura 1 Instituição Animais possui Domicílio tem contato com o paciente são vacinados Ventilação possui janelas elas se abrem facilmente Visita hospitalar foi liberado Iluminação o paciente fecha os olhos para enxergar a luz incide diretamente sobre o paciente Piso possui tacos soltos É encerado é passível de limpeza com água e sabão Limpeza quem executa realizada diariamente remove pó de móveis e utensílios Banho de aspersão A execução do banho de aspersão demanda que o paciente tenha grau de sustentação corpórea condizente com as estruturas físicas do ambiente Por exemplo barras de sus tentação tapetes antiderrapantes suporte para frascos de soros entre outros acessórios que possam facilitar a permanência do paciente sob o chuveiro em posição ortostática O banho de aspersão também possibilita que a higienização do couro cabeludo seja realiza da com mais praticidade e conforto para o paciente Enquanto o banho no leito pode representar a oficialização do declínio das funções cognitivas ou funcionais do paciente o de aspersão pode ser considerado por muitos pacientes uma prova de autonomia e enfrentamento da progressão das doenças dege nerativas Ele também pode ser um marcador do nível de independência do paciente Dependendo do estágio de reconhecimento e enfrentamento da doença ele poderá ser relutante ao banho no leito e optar pelo de aspersão em posição ortostática ainda que seja desprovido de condições físicas que assegurem a execução dessa técnica Embora seja difícil para uma unidade de internação separar os pacientes segundo critérios de demanda de cuidados não é boa prática deixar pacientes sob Cuidados Palia Figura 1 277 tivos dependentes junto daqueles mais independentes para as atividades de vida diária invariavelmente um padrão de comparação se estabelece e os sentimentos de impotência e tristeza aumentam gradativamente Para a realização do banho de aspersão há que se ter a garantia de segurança da in tegridade física do paciente Por isso é necessário checar a existência de barras de apoio e se no piso do banheiro existem falhas descolamentos e superfícies cortantes Os banhos de aspersão em posição ortostática com auxílio de uma ou duas pessoas ou com o uso de chuveirinho ou em cadeira higiênica são opções muito utilizadas para os pacientes sob Cuidados Paliativos As cadeiras higiênicas apresentam vários modelos e preços Um modelo acessível é o com adaptador universal para os diversos assentos de vaso sanitário Sempre que possível opte por um assento almofadado para prevenção de dor no momento do banho Pacien tes emagrecidos têm mais dificuldade para adaptarse aos assentos de polipropileno com consequente dor e pontos de pressão na região trocantérica portanto vale a pena improvisar com cadeiras de marfinite fazendo furos na base para o escoamento da água inclusive Nos idosos por terem a pele mais fina mais permeável e com menos pelos portanto menos protegida contra infecções o cuidado com a temperatura da água e o uso de hi dratantes depois do banho são fundamentais A secagem dos pés após o banho dificulta a proliferação de fungos e bactérias causadores de odores desagradáveis e infecções O banho antes de ser uma prática higiênica deve ser prazeroso relaxante e revigo rante Num banho de aspersão no qual o paciente se desgasta sofre com dores e sola vancos vale refletir sobre a possibilidade de realizálo no leito Afinal Cuidado Paliativo é conforto Banho no leito Habitualmente indicado para o paciente acamado muitas vezes tornase uma prática também utilizada para aqueles com sensação de extrema fadiga eou quadro de depressão O medo de deambular o esforço desencadeador de dor e o isolamento social também são situações em que o banho no leito tem indicação Em casa o banho no leito muitas vezes é a única prática higiênica possível Banheiros compartilhados e distantes da cama bem como o seu difícil acesso ainda são realidades da prática assistencial E se considerarmos que nas construções atuais o espaço é cada vez mais otimizado o cuidador tem dificuldades para transitar com a cadeira higiênica pelos cômodos da casa Por esse motivo os profissionais da saúde deveriam ter menos restrição eou resistência à execução do banho no leito nos pacientes sob Cuidados Paliativos Conversar sobre o assunto com paciente e cuidador costuma eliminar problemas e possíveis medos O paciente tem o direito de escolher a melhor prática para si O profis sional da saúde tem a obrigação de prestar as informações necessárias para uma escolha com melhores benefícios A oferta de uma cadeira higiênica a garantia de um suporte de oxigênio ou mesmo a presença de um familiar junto no banho além do incentivo ao banho de aspersão chuveiro podem auxiliar o paciente na sua tomada de decisão O banho no leito até pela sua adaptação ao mobiliário consome mais tempo em sua execução No entanto pequenos detalhes fazem a diferença na extensão do procedimen 278 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP to como a avaliação da necessidade de mais de uma pessoa para realizálo e a organiza ção do material água quente sabonete toalhas etc previamente ao procedimento Os pacientes queixamse do procedimento quando existe manipulação prolongada de seu corpo quando a água esfria e no modo como são tocados durante o processo desenca deando dor no momento e perdurando por horas Bordim e Fonseca1 verificaram que o banho no leito no paciente inconsciente ou seja com dependência total dos profissionais de enfermagem gastou o tempo médio de 50 minutos quando realizado somente por um profissional Quando porém contase com dois profissionais este tempo médio foi reduzido para 14 minutos Embora o foco do trabalho citado seja economia de tempo em Cuidado Paliativo ter duas pessoas realizando o banho é importante para minimizar o desconforto do paciente Em nossa experiência quanto mais os minutos finais se aproximam mais suavidade se faz necessária durante todo e qualquer procedimento Na dependência do quadro clínico que se apresenta procedimentos simples como movimentar as articulações para a higie nização do corpo podem tornarse demorados em função do tempo do paciente e não da execução da técnica De modo geral não se indica o uso de sabonetes perfumados talcos e óleos perfuma dos pois podem causar alergia especialmente em pacientes que evoluem com quadro de caquexia No entanto se para o paciente utilizálos for importante melhor negociar o uso e observar Uma maneira de preservar a hidratação natural da pele durante o banho é acrescentar óleo de girassol ou de canola ricos em ácidos graxos essenciais AGE insa turados à água de enxágue que é facilmente encontrado em supermercados tem baixo custo e é inodoro No mercado há grande oferta de AGEs insaturados com complementa ção de vitaminas Esse seguimento em franca expansão ainda tem um custo considerável e que onera o orçamento das famílias com pacientes acamados no domicílio Higiene do couro cabeludo A higiene do couro cabeludo promove maior conforto ao paciente e previne o acúmulo de escamas seborreicas muito comuns quando se está acamado por tempo prolongado Figura 2 279 Para o paciente acamado sem possibilidade de ser levado para o banho de asper são a higiene deve ser realizada duas vezes por semana e sempre com dois cuidadores para agilizar o procedimento A lavagem frequente do couro cabeludo ajuda a evitar a ocorrência de piolhos principalmente nos pacientes que moram em casas adaptadas sem saneamento básico e espaço reduzido O exame do couro cabeludo pacientes acamados podem desenvolver úlceras por pressão no couro cabeludo e a indicação de produtos especiais para tratamento de alterações do tecido epitelial são questões que não devem passar despercebidas pela equipe multiprofissional Existem dispositivos próprios para o procedimento no leito com um mínimo de manipulação No entanto são dispositivos que ainda têm custo elevado para uma parcela significativa da população brasileira Os membros da equipe deverão orientar a adaptação do leito para o apoio de uma bacia plástica para o escoamento da água morna utilizada no procedimento A higiene do couro cabeludo exige treinamento do cuidador para que seja realiza da no leito O quarto deve estar fechado a temperatura do ambiente compatível com a corporal e a circulação de ar contida Higiene oral Comer é uma maneira de se conectar à vida Então cuidar da higiene oral é fun damental é pelo paladar que se inicia essa conexão Pacientes com dentes devem uti lizar escova com cerdas macias e preferencialmente pequena ou infantil A indicação do tamanho da escova justificase pelo fato de que nem sempre o paciente consegue expandir a musculatura facial permitindo a higiene completa dos dentes molares Escovas menores permitem maior alcance dentário sem muito esforço do paciente Na presença de dentes amolecidos ou sangramento gengival oriente o cuidador a Figura 3 280 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP realizar a higiene delicadamente e sem pressa A contenção de sangramentos pode ser feita com o uso de água gelada e compressa de gaze embebida em soro fisiológico SF a 09 gelado Pacientes que não se alimentam por via oral também devem ter a higiene oral realizada quatro vezes ao dia Na ausência de dentes uma gaze embebida em água bicarbonatada a 10 e enrolada no dedo indicador deve ser utilizada para a higiene da gengiva e da língua de maneira suave Higiene íntima A limpeza adequada das regiões genital e anal contribui para a prevenção de corri mentos e vulvovaginites Nos pacientes acamados especialmente do sexo feminino devi do à proximidade entre o ânus a vagina e a uretra a troca de fraldas deve ser frequente e a higienização da genitália seguir os seguintes passos afaste com os dedos polegar e indicador os grandes lábios e proceda à limpeza da vulva e do períneo obedecendo ao sentido vaginaânus Isso previne problemas decorrentes do contato com fezes urina e outros irritantes que podem provocar infecção Para os pacientes acamados do sexo masculino a higiene íntima deve contemplar tração do prepúcio higiene local com água e sabonete e redução da membrana a fim de evitar a balanopostite No uso de fraldas descartáveis devese realizar a troca a cada seis hora no máximo para prevenir as der matites por fralda também conhecidas por dermatite de contato3 As de algodão embora mais trabalhosas para limpar absorvem melhor a transpiração com consequente redução das dermatites Arrumação da cama Pacientes mais dependentes devem ter sobre o colchão normal um que favoreça maior circulação sanguínea e consequente prevenção de úlceras por pressão No mer cado há uma variedade de colchões que oferece boa relação entre conforto e prevenção de úlceras por pressão no entanto há que se ter claro que o paciente é o usuário e ele é quem deve determinar se lhe é confortável ou não Um colchão de última geração e com múltiplos benefícios tecnicamente descritos nem sempre é a melhor escolha Com o paciente sob Cuidado Paliativo a prioridade deve ser o conforto o que necessariamente não está relacionado com melhor tecnologia reparadora De modo geral os colchões terapêuticos de espuma lacunar ou perfilada mais conhe cidos como colchão caixa de ovos são mais acessíveis por conta do custo relativamente baixo e pela facilidade em encontrálos em casas de colchões e hipermercados Outro benefício é a lavagem da espuma caso algum acidente ocorra com o paciente e é impor tante que os profissionais da saúde saibam orientar a limpeza Esses colchões têm prazo de validade de seis meses de uso Os lençóis devem estar perfeitamente esticados sobre a cama livres de pregas e rugas que machucam a pele além de ser trocados quando estiverem molhados Sem pre que possível manter lençóis de algodão para melhor absorção da umidade Se o paciente recebe sua alimentação no leito eleve a cabeceira e ao final inspecione a 281 cama para remover quaisquer resíduos de alimento que eventualmente tenham caído durante a refeição Qualquer sinal de hiperemia na pele deve merecer maior atenção Proteja a re gião avermelhada com hidratantes faça massagens que irão ativar a circulação e se possível exponha a região ao calor A higiene rigorosa da pele é a maior arma que se tem para se prevenir ou deter a evolução de uma escara Por isso em caso de pequena lesão aberta essa deve ser lavada com água e sabão e não sofrer pressão de nenhuma espécie Readequação do vestuário As roupas devem ser confortáveis simples de se vestir e adequadas ao clima e aos desejos do paciente Sempre que possível dê preferência aos tecidos de algodão por se rem macios e permitirem melhor movimentação Resíduos de produtos químicos usados na lavagem das roupas podem ser causa de irritações na pele O uso de tecidos sintéticos e inflamáveis e de colchetes correntes e alfinetes deve ser abolido evitando com isso possíveis acidentes e traumatismos É importante também que para o paciente impossibilitado de manifestar sua sensi bilidade à temperatura externa o profissional esteja atento para a colocação ou retirada de agasalhos orientando o cuidador familiar para que também esteja atento a essas necessidades no domicílio É importante que os cuidadores mantenham a calma no auxílio do vestuário Pa cientes sob Cuidado Paliativo se cansam com facilidade e por isso mesmo é importante manter vestimentas simples com aberturas laterais ou frontais e uso de velcro para fechamento Quanto a pacientes limitados a cadeiras de rodas ou poltronas optar por roupas confortáveis largas especialmente nos quadris Para aqueles com lesões extensas de pele independentemente da causa as orientações dizem respeito a adaptações de roupas e camisolas as mangas podem sem desmembradas do corpo da roupa e adaptadas ao corpo do paciente por meio dos dispositivos anteriormente citados Mudanças de decúbito De maneira ideal a mudança de decúbito deve ser realizada pelo menos a cada duas horas No entanto a mobilização no leito na fase final de vida deve ser criteriosa observe as condições do colchão no qual o paciente repousa Como elemento nor teador para maior conforto do paciente ouça o que ele próprio pensa sobre a sua aco modação avalie a dor para a execução de movimentos simples Se com movimentos simples houver dor escolha outras maneiras de prevenção de maiores agravos observe se os lençóis estão esticados e se não há excesso de cobertores na cama verifique a pele do paciente sua hidratação e quais os pontos de pressão use co xins apoios macios e hidrocoloides ver capítulo sobre feridas para proteger as áreas com risco aumentado para abertura de lesões Pacientes com lesões ósseas por exemplo não serão mobilizados com essa frequência 282 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP para o Cuidado Paliativo no domicílio orientase o cuidador a fazer uma tabela com horários para as mudanças de decúbito em associação a uma escala de avaliação de dor O objetivo é sempre conciliar formas de prevenção de maiores agravos com o máximo conforto do paciente incluindo aí a ausência de dor Considerações finais A reflexão para os cuidados de higiene e conforto no Cuidado Paliativo deve partir de que planejamento do cuidar passa sempre pela questão do tempo do indivíduo e suas possibilidades de futuro O tempo do nosso paciente é certamente diferente daquele de quem dele cuida O desconforto e a dor no cuidado geralmente são entendidos como uma ponte para melhora e recuperação breve E quando se fala em melhora geralmente a ideia remetida é a perspectiva de cura No entanto para o paciente sob Cuidado Palia tivo fora de possibilidade de cura mas com a realidade de viver intensamente o que o tempo lhe concede geralmente a barganha não vale a pena Cabe à equipe estabelecer um canal de comunicação com o paciente mantendo bom vínculo de confiança para o estabelecimento de práticas de conforto medidas reais e concretas O mais importante é não conformarse com o cuidado básico é necessária a reavaliação diária e constante para que o conforto impere Lembrar que no cuidado não cabe culpa e se ela surgir há que se ter uma reflexão da prática assistencial e uma escuta mais atenta para valores e desejos do paciente Planejar para o outro o que o profissional deseja para si não pode ser a regra e se houver regra essa deve ser sempre a de respeitar o que o paciente deseja o que ele julga melhor para si Um paciente nunca é igual ao outro ainda que a manifestação da doença seja igual para a maioria Enxergar a singularidade de cada paciente é o que nos guia para o seu conforto Referências 1 BORDIM L C FONSECA A Mensuração do tempo gasto para a realização dos cuidados de enfermagem no departamento de clínica cirúrgica de um hospital privado 2005 2 COUTINHO A P et al coords Prevenção e controle de infecções associadas à assistência médica extrahospitalar ambulatórios serviços diagnósticos assistência domiciliar e serviços de longa permanência São Paulo Associação Paulista de Estudos e Controle de Infecção Hospitalar 2004 3 HASHIMOTO M R K Estudo retrospectivo das condutas de enfermagem para assaduras na região abrangida pelas fraldas de recémnascidos 1997 Dissertação Mestrado Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo São Paulo 1997 4 RHINEHART E MCGOLDRICK M Infection control in home care and hospice 2 ed London Jones and Bartlett Publishers International 2006 283 Providências práticas para toda a família letíCiA AndrAde Introdução Em Cuidados Paliativos pressupõese que no final da vida equipe e família já tenham estabelecido um vínculo adequado e que os dois lados já tenham ciência das possibilida des e dos próprios limites Porém esse vínculo nem sempre é possível apenas se efetiva quando há tempo hábil espaço e interesse de ambas as partes Muito se fala de vínculos entre paciente e família ou entre paciente e cuidador mas pouco da necessidade de con fiança mútua entre pacientefamília e equipe de cuidados O reconhecimento de limites e possibilidades de cuidado e atenção de todos os envol vidos na questão paciente família e equipe é o ponto crucial para que a assistência pro posta surta o efeito desejado Afinal esse reconhecimento traz a tranquilidade necessária para a equipe atuar adequadamente não exigindo e solicitando demais ou de menos da família e do paciente sem ir além do que cada um pode oferecer A justa medida deve ser buscada e pode ser obtida visto que em nenhum momento o cuidar pode representar uma imposição e o ser cuidado deve ser sempre uma possibilidade e não uma tortura No que se refere à equipe é imprescindível a clareza com relação ao que o serviço se compromete a oferecer Dessa forma é extremamente importante a abordagem junto à família sobre o tipo de atenção dispensada horário de funcionamento o que se espera do cuidador familiar critérios de dispensação de medicamentos frequência das consultas ou visitas domiciliares etc O reconhecimento de limites e possibilidades o controle adequado da dor e do des conforto a ciência do diagnóstico a possibilidade de optar pelo local de sua própria morte se assim desejar e o tempo para realização dos últimos desejos e resolução de pendências legais podem garantir a tão almejada qualidade de vida nos momentos finais e uma morte digna Os estágios ou fases pelos quais supostamente passam os pacientes em processo de finalização de vida tão bem exposto nos primeiros estudos sobre o tema por Klüber Ross3 ainda nos oferecem nos dias atuais parâmetros para melhor cuidado e atenção aos pacientes A surpresa a negação a barganha a revolta e a aceitação são ainda passíveis de serem reconhecidas nos pacientes e no nosso entender nas famílias destes Não é necessário dizer que não há passagem obrigatória pelas fases citadas mas a importância do conhecimento das mesmas se dá no intuito de compreendêlas para melhor atender paciente e família já que nem sempre o desconhecimento a respeito da doença é uma realidade Em algumas situações estamos lidando com a negação e nem sempre a busca de uma segunda opinião ou o nãocrédito com relação ao que é explicado pela equipe revela uma família difícil ou nãoaderente mas traduz a surpresa pelo diag nóstico e pelas afirmações de que o tratamento curativo não é mais possível A nãoacei tação do tratamento proposto e a recusa de medicação e medidas de conforto que tanto angustiam familiares e equipe podem ser apenas revolta pela finalização da vida pela impossibilidade de cura e pela inexistência de tanto tempo de vida como cada um gosta 284 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP ria de determinar E finalmente a tristeza o recolhimento em si mesmo a necessidade que alguns pacientes apresentam de ficarem sozinhos em silêncio de não participarem das atividades em família e de estarem mais consigo mesmos não necessariamente se caracterizam como sinais de depressão mas sim de aceitação da situação que vivenciam e de desligamento progressivo da vida Com esse entendimento não há por que esperar ou incentivar uma participação mais ativa do paciente na rotina da casa e nas conversas familiares pois é possível que não haja mais esse interesse não há por que cobrar uma adesão cega ao tratamento Em algumas situações outras dores trazem preocupações ainda maiores do que as físicas e não há motivo para se falar tanto e tantas vezes sobre diagnóstico e prognóstico pois família e paciente já o sabem e às vezes já não querem mais ouvir sobre o assunto É imprescindível lutar contra a conspiração do silêncio atitude que nega ao paciente e às vezes à família a ciência do diagnóstico mas também é necessário reconhecer quando parar de abordar o assunto É preciso perceber quando o excesso de detalhes e informações e a insistência no processo de finalização de vida passam a ser uma verdadeira tortura para quem ouve em vez de fonte de conhecimento e preparo para família e paciente Atualmente a conspiração do silêncio vem sendo substituída pelo que denominamos de ditadura da verdade atitude marcada pela insistência dos profissionais em abordarem centenas de vezes junto a familiares e pacientes a proximidade da morte como se eles não soubessem o que os aguarda Cada família e paciente devem ser vistos como únicos e ter suas necessidades atendi das da forma mais adequada possível mesmo quando essas não são condizentes com as da equipe de atendimento A grande preocupação e o foco do assistente social em Cuidados Paliativos nessa fase final de vida podem ser resumidos em garantia da qualidade de vida nos momentos finais morte digna para o paciente e auxílio na manutenção do equilíbrio possível para a família Tal equilíbrio familiar referese ao respeito a tudo o que já foi mencionado e também ao trabalho efetivo junto às famílias de não somente entendêlas mas e principalmente de junto a elas propor alternativas que amenizem o sofrimento e a preocupação enfrentados Pendências e providências legais As orientações e providências tomadas junto ao paciente estão obviamente rela cionadas com o grau de consciência e o poder de decisão mantidos por ele Se cons ciente e lúcido o paciente deve ser ouvido a respeito de últimos desejos pendências e providências cuja resolução depende de sua vontade e anuência Testamentos re gistros de filhos regularização de uniões obtenção de tutelas e curatelas demandam tempo e profissionais tecnicamente preparados para orientações seguras e adequadas Tais providências devem ser tomadas junto ao paciente e seu familiar mais próximo e legalmente autorizadas evitandose que essas situações que porventura não sejam adequadamente resolvidas possam trazer preocupações e dificuldades nos momentos finais Cabe ao assistente social propiciar essa abordagem a fim de que o paciente seja orientado na busca do profissional indicado 285 São necessários cuidados especiais no que se refere a situações de famílias mo noparentais famílias compostas por um único indivíduo adulto acompanhado de seus filhos menores7 quando é o adulto que está sob Cuidados Paliativos a guarda dos filhos deve ser adequadamente trabalhada e decidida ouvindose o paciente em questão O Conselho Tutelar da região e a Vara da Infância devem ser acionados em casos de conflito pela guarda ou inexistência de responsável Estresse do cuidador familiar ou informal Denominamos cuidador4 6 aquele familiar ou responsável pelo cuidado ao pa ciente sendo o principal responsável por receber orientações e esclarecimentos da equipe assim como se constituindo em elo entre paciente e equipe para algumas demandas Em nossa prática cotidiana percebemos que o cuidador principal2 geral mente é o mais envolvido no cuidado por isso o mais sujeito a estresse e sobrecarga Por esse motivo reafirmamos sempre a necessidade quando possível da divisão de tarefas e responsabilidades entre os familiares mais próximos evitandose assim a sobrecarga de apenas um indivíduo Se para o paciente os cuidados com o controle da dor do desconforto e demais sintomas são sempre presentes nem sempre nos atentamos para algumas situações que parecem simples mas causam grande estresse para a família Essas situações que podem ser senão evitadas contornadas pela atuação dos profissionais referemse a falta de sono do paciente à noite delírios desinformação sobre diagnóstico pre conceito com relação ao uso de determinados medicamentos e conflitos familiares anteriores à doença que só tendem a ser exacerbados em situações de estresse No trabalho cotidiano com pacientes sob Cuidados Paliativos e suas respectivas famílias é quase rotina o relato de que os pacientes não dormem durante a noite solicitam a presença do cuidador o tempo todo e parecem ter medo de permanecer sozinhos considerando que alguns até relatam tal dificuldade Como parece ser uma ocorrência que não diz respeito à equipe mas sim somente à rotina da residência nem sempre atentamos para o fato de que o descanso do cuidador é imprescindível para a manutenção da saúde física e mental e para a garantia do cuidado adequado ao paciente Se não há possibilidade ou interesse de divisão de tarefas o fato de o paciente não dormir à noite seja pelos efeitos colaterais da medicação pela forma como esta está distribuída nos horários noturnos ou por medo representa também a impossibilidade de descanso para o familiar que no decorrer do dia terá a seu cargo todas as tarefas que lhe competem e à noite será novamente impedido de descansar Essa rotina em pouquíssimo tempo leva à exaustão do cuidador e à impossibilidade de manutenção dos cuidados adequados Reunião familiar É sempre indicada a realização de uma reunião de família com o objetivo de cla rificar os demais membros sobre a proximidade da morte e de uniformizar as infor mações geralmente centralizadas no cuidador principal Essa prática quase sempre traz tranquilidade para o indivíduo que passa a não se ver como único detentor de informações e angustiado pela cobrança dos demais familiares pela cura que não 286 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP vem A realização dessa reunião deve ser uma prática adotada pelas equipes de aten ção em Cuidados Paliativos principalmente nos âmbitos hospitalar ambulatorial e de enfermaria onde geralmente a presença de somente um ou dois familiares mais próximos ao paciente é possível o que invariavelmente impossibilita a participação de outros interessados No domicílio é mais comum principalmente nos dias finais a presença de mais pessoas que se envolvem no cuidado estando mais esclarecidas sobre o processo de doença ou de morte pelo qual passa o paciente As situações em que há mais de uma família envolvida nos casos de uniões ante riores o cuidado na abordagem é imprescindível Nem sempre as separações ocorre ram de forma consensual e há casos em que a mágoa ainda permanece em ambos os lados Quando é desejo do paciente rever antigos companheiros ou filhos distantes pela separação anterior tal providência deve ser tomada em consonância com a família atual do contrário essa atitude poderá exacerbar conflitos antigos ou fazer surgir novas mágoas Como já afirmado cabe à equipe o auxílio na manutenção do equilíbrio familiar na perspectiva de que este se mantenha após o falecimento do paciente Ocorrência da morte no domicílio Se o foco é sempre a manutenção da qualidade de vida nos momentos finais morte digna e garantia do equilíbrio familiar possível a morte no domicílio do pa ciente sob Cuidados Paliativos hoje representa grande ponto de discussão Nem todo paciente tem condições de falecer em casa nem todos optam por isso e nem todas as famílias podem aceitar tal desenlace Se por um lado morrer no do micílio pode trazer conforto para o paciente por estar em um ambiente que lhe é fa miliar respeitando seus desejos e estando próximo da família por outro pode causar extrema angústia para os familiares que estarão mais perto por trazer a sensação de impotência ou de não ter feito o suficiente podendo acarretar complicações no processo de luto dos envolvidos1 Além disso o significado de morte o quadro clínico do paciente a organização da família e as questões burocráticas devem ser bem avaliados pela equipe em conjunto com a família A agonia respiratória a dispneia a possibilidade de sangramento e a dor incontrolável são sempre fatores que inviabilizam a morte em casa por causarem demasiado sofrimento para paciente e familiares Quanto ao paciente estar em casa pode proporcionar sofrimento maior do que o esperado e passível de ser controlado no ambiente hospitalar e com relação à família a sensação de não ter evitado a dor ou de ter sido responsável por tamanha agonia é a causa do sofrimento Mesmo que tudo tenha sido minuciosamente explicado a razão nesse momento não se sobrepõe à emoção de se presenciar tamanha dor Por esse motivo essa si tuação não deve ser imposta com a justificativa de que era um desejo do paciente se esse desejo não for extensivo à família e se as situações citadas não forem ade quadamente abordadas a ocorrência da morte em casa constituirseá em violência para paciente e família e a nosso ver irresponsabilidade da equipe Além disso as questões burocráticas que se apresentam devem ser antecipada mente solucionadas a família deve ter informações precisas sobre o que fazer logo 287 após o óbito a quem recorrer para a obtenção da declaração de óbito e os procedi mentos de praxe própria equipe médico da família ou na impossibilidade desses comunicar à delegacia mais próxima do bairro serviços funerários disponíveis na re gião documentos exigidos e todas as demais questões burocráticas que nem sempre são explicadas e que trazem tantos transtornos quando não encaminhadas da forma adequada Sugerese que o assistente social atuante na equipe elabore uma cartilha de orientações com as informações necessárias a ser distribuída na reunião de família ou em intervenções próximas ao falecimento do paciente Nessa cartilha é importante constar as informações apresentadas no Quadro Quadro Sugestão de informações que devem constar na cartilha de orientações sobre o óbito Observações Documentos do paciente a serem apresentados na ocorrência do óbito para a obtenção do atestado de óbito Cédula de identidade RG CPF certidão de nascimento ou casamento e comprovante de residência para que o endereço seja obtido de forma precisa O atestado de óbito deve ser fornecido pelo médico que vinha prestando assistência ao paciente desde que não haja suspeita de morte violenta ou inesperada5 No caso de impossibilidade outras alternativas devem ser criadas conjuntamente entre equipe e família Documentos a serem apresentados no serviço funerário Além dos documentos acima acrescidos do atestado de óbito cartão do INSS aposentadoria ou pensão e documentos comprobatórios de posse de túmulo se houver Lembrar que o familiar que irá providenciar a documentação e a compra do serviço para o sepultamento também deve estar de posse de sua documentação pessoal com foto cédula de identidade Serviço funerário Endereços e telefones das agências funerárias da região ou do município com horário de funcionamento Atentar para o fato de que nem todas as agências atendem 24 horas e acrescentar informações de como realizar o sepultamento gratuito para os casos em que haja essa necessidade lembrandose sempre de que tal prerrogativa é um direito garantido por lei RG registro geral CPF cadastro de pessoa física INSS Instituto Nacional do Seguro Social 288 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Representações e significado da morte Diante do exposto cabe aos profissionais entender e respeitar o significado da morte para paciente e família questões religiosas devem ser sempre abordadas e crenças que em uma análise superficial parecem sem sentido consideradas pela equipe na avaliação sobre o local onde ocorrerá o óbito Por exemplo resguardados os devidos cuidados e preparos indicase o domicílio como local mais indicado para o óbito nas situações em que a religião professada pelo paciente regulamenta que somente um membro designado pelo grupo religioso poderá tocar no corpo após o fa lecimento Já nos casos em que se espera que não haja a ocorrência de autópsia para preservação do corpo e tanto a equipe quanto a família não conseguirão garantir o fornecimento do atestado de óbito o mais indicado é que o paciente faleça durante uma internação programada em que a equipe tenha ciência do caso e possa auxiliar adequadamente nesses momentos finais Nas situações em que apesar de todo o trabalho realizado pela equipe o núcleo familiar não consegue perceber a morte daquele indivíduo como uma ocorrência na tural mas a vivencia como uma situação extremamente traumática não há por que incentivar o óbito no domicílio mesmo que seja esse o desejo do paciente Devese abordar tal assunto demonstrando o quanto essa ocorrência pode ser traumática para esses familiares e o quanto isso pode representar um processo de luto compli cado para os que ficam Há que se respeitar a autonomia do paciente mas essa au tonomia é sempre relativa e partilhada quando se vive em família e principalmente quando se vive uma situação de dependência de outrem como nos casos de doenças em fase final de cuidados Deve existir um cuidado especial por parte da equipe nas situações em que há envolvimento de crianças e caso seja um dos pais que está sob Cuidados Paliativos É um direito de o indivíduo deixar ou recusar a participação de seus filhos em seu processo de morte Muitos adultos ainda optam por seus filhos pequenos não esta rem próximos quando ocorrer o óbito não com o intuito de negar a morte mas de não forçálos a presenciar esse desenlace Essa participação nunca deve ser motivo de insistência da equipe com a justificativa de que é necessária a naturalização da morte paciente e família são autônomos para decidir o que querem para si e para seus filhos e devem ter o direito de até o final definir qual a imagem que querem que seus filhos mantenham de si próprios Conclusão Com as informações e orientações apresentadas é necessário que o assistente social tenha disponibilidade de oferecer sempre apoio e escuta Tempo disponível e espaços adequado físico e emocional devem fazer parte da rotina desse profissional que atende em Cuidados Paliativos Em algumas ocasiões só é necessário estarmos junto da família ouvir entender e esperar não há mais o que ser dito quando tudo já foi explicado não há mais o que cobrar quando tudo já está sendo feito E é essa a abordagem mais difícil a necessidade que temos de nos mostrar ativos em inter venções e atividade constantes faznos esquecer de que às vezes só é necessário estarmos presentes e o não fazer já é por si só uma ação 289 Referências 1 COLIN M P Luto estudos sobre a perda na vida adulta São Paulo Summus Editorial 1998 2 DUARTE Y A O DIOGO M J D Atendimento domiciliar um enfoque gerontológico São Paulo Atheneu 2000 3 KLUBERROSS E Sobre a morte e o morrer São Paulo Martins Fontes 1969 4 LAHAN C F ANDRADE L O cuidador In JACOB FILHO W Avaliação global do idoso São Paulo Atheneu 2005 p 17180 5 LAURENTI R MELLO J HELENA P O atestado de óbito São Paulo Centro Brasileiro de Classificação de Doenças Ministério da Saúde Secretaria de Vigilância em Saúde 1996 6 SANTOS S M A Idosos família e cultura um estudo sobre a construção do papel do cuidador Campinas Alínea 2003 7 VITALE M A F Famílias monoparentais indagações In Rev Serviço Social e Sociedade São Paulo Cortez XXIII n 71 p 4562 2002 290 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP As últimas 48 horas de vida Ariel de FreitAs Quintão AmériCo Como é morrer a gente entra em coma Dói como são as últimas horas Introdução Muitas questões envolvem os últimos momentos de vida As incertezas são a abso luta verdade dos momentos que cercam a morte Detalhes pequenos são questionados ora devido ao humano desejo de controle ora por questões espirituais ora por questões desconhecidas da nossa consciência Ter controle da situação reduz a possibilidade de variação o medo e a ansiedade Questões pessoais antigas são redimensionadas e podem se dissolver pela proximidade do fim esperado As últimas horas costumam ser inundadas de tristeza melancolia e saudade Desejos de paz boa partida e boa hora Assim como o nascimento o momento da morte é único e sozinho Cuidadores e fa miliares o descrevem de forma sucinta como um momento de muito sofrimento mesmo quando os sintomas estão bem controlados A conceituação precisa do início das últimas horas não é exata na literatura Entre tanto essa definição transcende a necessidade real que é a identificação desse momento cercado de sintomas exacerbados e que exige alteração do planejamento de tratamento e cuidado contínuo As últimas horas do paciente em fase final de vida são a continuidade da evolução progressiva de sinais e sintomas Entretanto devemos estar preparados para o apareci mento de novas causas de sofrimento tanto para o paciente quanto para a sua família O uso de recursos terapêuticos de forma fútil ou obstinada repetição de exames uso de respiradores infusão de medicamentos vasoativos e outros procedimentos essenciais à manutenção de funções vitais deve ser evitado pois seus efeitos são nocivos e os benefí cios são menores Submete as pessoas a mais dor e sofrimento do que sua própria doença lhe provocaria Isso acontece nos ambientes em que não se aceita a morte como evento natural e esperado ou onde os profissionais têm medo de infundada responsabilização civil ou criminal2 O uso desmedido desses recursos pode resultar num número crescente de pessoas completamente dependentes do suporte hospitalar de última geração sem possibilidade de contato com sua família e sem individualidade como em situações de internação em centros de terapia intensiva A morte não deve ser antecipada nem adiada12 Esses fatos vitimam qualquer sistema de saúde com custos elevados e sofrimento da equipe Esta ao final de tudo experimenta grande frustração por não poder alcançar o objetivo que lhe parece único o da imortalidade 291 Cuidados Paliativos das últimas horas Compreendem o conjunto de condutas e cuidados com o paciente que se encontra em rá pido declínio funcional por causa irreversível nos seus momentos finais O objetivo que deve mos ter nessa fase é promover o controle dos sintomas de forma completa prevenir os agravos das últimas horas de vida suavizar a agonia final além de evitar tratamentos que possam ser considerados fúteis nessa fase Devemse evitar investigações clínicas e procedimentos que não se prestem exclusivamente a melhor compreensão e manejo dos sintomas Reconhecer o processo de morte é uma das tarefas mais difíceis no campo da medi cina É perceber que a partir de um determinado momento da evolução de um doente as disfunções são irreversíveis e todo tratamento que tenta o prolongamento da vida implica prolongamento do sofrimento As atitudes recomendadas são preservar a vida sem tornar o tratamento mais sofrido que a própria doença e atender prioritariamente às necessidades do doente em termos de alívio de sintomas12 O quadro clínico do doente Quadro 1 deve ser reavaliado se possível duas ou mais vezes ao dia Novas decisões devem ser consideradas sempre que necessário Nas últimas horas o paciente se torna progressivamente mais ausente da vida Não consegue mais se comunicar alimentarse ou movimentarse Até mesmo a ex pressão facial muitas vezes sugestiva de dor ou sofrimento tornase difícil de ser inter pretada Os familiares percebem a gravidade e irreversibilidade do quadro Quando esse momento é calmo tanto pelos cuidados ao paciente quanto pela resposta do mesmo aos tratamentos a espiritualidade da família pode transformar o momento de partida Então a morte acontece com serenidade Quadro 1 Quadro clínico das últimas horas Fase final últimas 48 horas Anorexia e nenhuma ingestão de líquidos Imobilidade Alteração cognitiva e sonolência eou delirium Mioclônus Dor Colapso periférico falências funcionais Ronco final Internar OU tratar em casa com consentimento ÓBITO Principais sinais sintomas e tratamento das últimas horas da vida Quando todos os sintomas que serão apresentados se exacerbam e começa a emergir quadro de morte próxima e irreversível a sobrevida média do doente é de horas a dias 292 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Esse quadro é chamado de últimas 48 horas processo ativo de morte agonia terminal ou simplesmente agonia2 Os sintomas mais indicativos dessa fase e sua conduta são descritos a seguir Anorexia Nas últimas 48 horas as atividades metabólicas estão diminuídas ocasionando uma anorexia fisiológica O doente pode não ter nenhuma ingesta de alimentos e a aceitação de líquidos se torna progressivamente mais difícil Forçar a alimentação por meio do uso de sondas enterais pode ser considerado um procedimento iatrogênico na medida em que provoca desconforto físico tanto pela presença da sonda em si como por novos sintomas que podem surgir como náuseas vômitos risco elevado de aspiração brônquica sensa ção de plenitude e desconforto abdominal A falta completa de aceitação de líquidos nas últimas horas é bem tolerada pelo paciente CondutA A hidratação artificial nessa fase deve ser cuidadosa para evitar acúmulos e edemas desnecessários assim como quadros de congestão pulmonar e desconforto respiratório A via subcutânea SC pode ser a melhor escolha principalmente em ambiente domiciliar Suporta um volume de até 1500 ml diários de soluções isotônicas num mesmo ponto de infusão4 Hidratar os lábios com gaze molhada ou cubos de gelo pode ser confortante1 Imobilidade Característica muito comum aos doentes em final de vida O doente não consegue mais se movimentar Contudo devese movimentálo cuidadosamente a fim de evitar desconfortos CondutA A equipe e os cuidadores domiciliares devem ser muito bem treinados para rea lização da movimentação passiva do doente e auxílio ativo nas transferências as quais devem ser evitadas por serem muito desconfortáveis e dolorosas nessa fase Familiares devem ser orientados quanto à limitação desse momento Insistências e tentativas desnecessárias devem ser evitadas Ordens explícitas sobre prevenção de úlceras de pressão mobilização cuidados com pele e mucosas mobilização passiva não devem faltar às prescrições Familiares devem ser estimulados a tocar no paciente como forma de expressar carinho conversar ainda que o mesmo não esboce respostas e evitar conversas desagradáveis no ambiente Devese manter o quarto o mais calmo possível estendendose também às atitudes de todos os membros da equipe de saúde Todas as alterações de condutas intercorrências e impressões do caso devem ser anotadas no prontuário Sonolência No final o doente dorme praticamente todo o tempo embora continue sendo desper tável em alguns raros momentos Pode se comunicar precariamente abre os olhos com muita dificuldade e momentaneamente retornando ao sono a seguir 293 CondutA Esse sintoma é esperado nas últimas horas e não justifica redução ou suspensão das doses de sedativos Entretanto a avaliação dos medicamentos deve ser considerada se a sonolência surgir concomitante ao início do uso dos medicamentos Alterações da cognição Sintoma frequente na maioria dos pacientes variando em intensidade Nessa fase a memória e o raciocínio se deterioram As respostas são demoradas e por vezes inade quadas ou inexistentes Em alguns momentos podem surgir visões alucinações e expe riências sensoriais diferentes O doente fala com pessoas que não vemos comunicase com parentes mortos há muito tempo sinais que podem ser avaliados do ponto de vista místico por familiares Seu olhar se torna fixo e muito profundo Nas últimas horas podem surgir quadro de delirium e agitação motora ou simplesmente um rebaixamento progressivo do nível da consciência caracterizando um semicoma e coma que antecedem a morte O delirium terminal frequente em 80 dos pacientes com câncer avançado na última semana é sinal de deterioração funcional significativa e indica a proxi midade da morte O delirium da fase final pode estar relacionado com vários fatores como hipóxia variações tóxicometabólicas como uremia encefalopatia hepática infecções desi dratação acúmulo de medicamentos como os opioides anticolinérgicos e diazepínicos3 CondutA Alterações da cognição e pequenas alucinações devem ser toleradas Intervenções medicamentosas são recomendadas quando o delirium se torna agitado e representa ameaça ao conforto e à segurança do doente São elas instituir uma hidratação de até 1000 mldia pode prevenir a instalação do quadro Podese optar em fazêla no período noturno reavaliar e ajustar dose dos opioides em torno de 20 a 30 abaixo da dose an terior nos casos de oligúriaanúria dando preferência às infusões contínuas ou opioides de curta ação utilizar medicamentos que devem ser ajustados de acordo com a necessidade Neu rolépticos em baixas doses são suficientes para controlar o delirium4 na maioria dos casos podendo a dose ser ajustada de acordo com a demanda individual Quadro 2 Os medicamentos podem ser usados por via parenteral contínua controlada por bomba de infusão isoladamente ou associados a outros fármacos As constantes reavaliações pos sibilitarão a titulação das doses adequadas Quadro 2 Neurolépticos mais usados1 3 Medicação Forma de administração Considerações Haloperidol 1 mg via oralsubcutânea a cada 6 ou 8 horas 2 mg subcutânea Em caso de urgência Clorpromazina 125 mg a cada 12 horas 294 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 3 Medicação Forma de administração Considerações Midazolam A partir de 1 mghora Infusão contínua 5 a 75 mg bolo SC ou EV No momento da crise Clonazepam 1 a 3 mg VO gotas 2 ou 3xdia Dose tetodia 20 mg Fenitoína 300 mgdia EV Se já em uso anteriormente SC subcutânea EV endovenosa VO via oral Associar medicamentos A conjugação de delirium mais agitação pode requerer a associação de um ansiolítico de curta ação em pequenas doses ou infusão contínua O medicamento mais usado é o midazolam por infusão contínua de 05 até 6 mghora ou SC em bolo de 25 a 5 mg inicialmente3 6 Mioclônus Os abalos musculares involuntários são frequentes e indicativos de neurotoxicidade Podem ser secundários a medicamentos distúrbios metabólicos uremia hipóxia de sidratação ou por edema do sistema nervoso central SNC no caso de tumores e me tástases centrais São precursores de convulsões e devem ser controlados o mais rápido possível No domicílio o cuidador deve ser minuciosamente orientado para reconhecer o sintoma e comunicarse rapidamente com a equipe assistente1 6 CondutA Nessas condições a prevenção é fundamental e são utilizados anticonvulsivantes como apresentado no Quadro 3 Exacerbação da dor e da dispneia Sintomas que estavam sendo razoavelmente controlados podem se exacerbar nos últimos dias de vida e tornaremse refratários à terapêutica habitual O tratamento de sintomas como dor e dispneia deve ser mantido até o final da vida mesmo quando se instala um coma e não se conhece mais a dimensão do sintoma A dor é um sintoma pre ponderante entre pacientes em Cuidados Paliativos mas dificilmente surge nessa última fase se já não existisse previamente A suspensão abrupta de sedativos e opioides pode levar à abstinência física e provocar desconforto desnecessário ao doente Entretanto a suspensão de fármacos coadjuvantes como antidepressivos pode ser necessária a fim de evitar efeitos adversos exacerbados e dificuldade de controle dos efeitos colaterais6 CondutA Para o controle da dispneia afastadas as possíveis causas reversíveis como derrames pleurais infecções respiratórias ou desconforto causado por ascite por exemplo o medi camento de escolha é a morfina em baixas doses associada ou não a benzodiazepínicos como o midazolam ambos em infusão contínua e parenteral A dose inicial da morfina 295 para alívio da dispneia em doentes em final de vida é de 10 mg24 horas No caso do midazolam podese iniciar com infusão de 05 mghora a 1 mghora Quanto aos broncodilatadores só devem ser indicados nos casos de comprovado broncoespasmo Os corticoides como hidrocortizona 300 a 500 mg IV podem ser usa dos no broncoespasmo e também nas condições em que seu uso como antiinflamatório pode ajudar a reduzir um edema peritumoral que provoca dispneia como nas linfangi tes pulmonares compressões de veia cava superior compressões de traqueia por tumo res extrínsecos4 8 A eficácia dos corticoides é variável e seu emprego deve ser seguido por avaliação contínua e descontinuado se ineficaz6 O excesso de secreção brônquica pode ser aliviado pelo uso de anticolinérgicos como indicado a seguir na conduta para ronco Para controle do quadro álgico os analgésicos usados anteriormente devem ser mantidos em doses equipotentes procedendose aos ajustes necessários para a via de administração escolhida A via endovenosa EV só deve ser utilizada para as infusões contínuas A via SC porém pode ser usada para infusão contínua ou intermitente de opioides O controle do quadro álgico pode ser mantido por meio de opioides O mais usado é a morfina que permite ampla utilização devido ao fato de colaborar para o controle de outros sintomas dispneia fadiga e tosse além da facilidade de adminis tração por várias vias e ausência de dose teto3 O uso do fentanil transdérmico também deve ser considerado em relação à facilidade de administração e sua potência Colapso periférico As perdas de função orgânica que se desencadeiam nesse processo levam ao colapso periférico caracterizado por palidez cutânea extremidades frias pele marmórea e cia nose periférica São comuns as alterações de padrão respiratório com irregularidades no ritmo e períodos cada vez mais prolongados de apneia CondutA As vias de administração de medicamentos necessitam ser reavaliadas e adaptadas a cada caso Os acessos venosos periféricos tornamse difíceis e as repetidas tentativas de punção podem ser bastante dolorosas Acessos venosos centrais não devem ser instalados nessa fase pelo alto risco que representam e por não se encontrar justificativa diante do quadro clínico instalado É de grande valor nessa fase o manejo adequado da hipodermóclise7 ou acesso subcu tâneo Por meio da instalação de um pequeno scalp do tipo buterfly de calibre 25 ou 27 no tecido celular subcutâneo preferencialmente abdominal podese proceder à hidratação do doente e administrar fármacos diversos A maioria dos medicamentos essenciais ao controle de sintomas nessa fase pode ser administrada por via SC com boa efetividade e sem efeitos colaterais indesejáveis Quadro 4 Ronco É evento comum à maioria dos doentes e caracterizase por uma respiração rui dosa plena de secreções Tem como causa a incapacidade de deglutir saliva e outras 296 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP secreções É um dos sintomas que mais incomodam os acompanhantes e a família provocando sensação de sofrimento CondutA O ronco deve ser prevenido ou minimizado O emprego de anticolinérgicos em doses generosas como a hioscina 10 a 20 mg a cada 4 ou 6 horas é suficiente para atenuar o sintoma Devem ser evitadas as repetidas aspirações de vias aéreas pelo desconforto que causam ao doente Na escolha de outros medicamentos nessa fase considerar aqueles de maior efeito anticolinérgico Por exemplo na hora de optar por um neuroléptico a clorpromazina é mais eficiente para diminuir secreções que o haloperidol e pode ser melhor indicada nas últimas horas de vida Momento da morte As últimas incursões respiratórias podem ser longas e suspirosas ou muito superfi ciais e pausadas A cessação da respiração normalmente precede a parada dos batimen tos cardíacos Após a morte ocorre o relaxamento da expressão facial CondutA O apoio e algum preparo espiritual tornamse essenciais nesse momento Não devem ser confundidos com os rituais religiosos A religião do doente deve ser sempre respeitada e jamais o doente pode ser pressionado no final da vida a aceitar qualquer tipo de preceito religioso novo Devemse evitar atribuições de possíveis culpas temores divinos ou qualquer outra si tuação que possa induzir medo no paciente9 A assistência espiritual deve ser essencialmente amorosa livre simples como um toque ou olhar Escutar é mais importante que se fazer ouvir transmitir ao outro a presença de um acolhimento constante e sincero é essencial Considerações Nas últimas horas caracterizase uma agonia final Todos os sintomas devem ser minuciosamente tratados e antevistos sempre que possível A prevenção é a melhor medida Além da terapêutica específica medidas de conforto bem como de apoios espiritual e familiar são fundamentais nessa fase A terapêutica dirigida a pacientes em final de vida tem que seguir a lógica da racio nalidade terapêutica de forma muito cuidadosa A maioria dos medicamentos usados para o tratamento de doenças crônicas como hipertensão e diabetes podem ser sus pensos quando o paciente entra em perfil de últimas 48 horas para evitar interações medicamentosas indesejáveis Os sintomas desconfortáveis são prioridades absolutas e muitas vezes a terapêutica se dirige exclusivamente a eles11 O uso de profiláticos con tra tromboses antidepressivos diuréticos protetores gástricos a menos que se esteja em corticoterapia também não se justificam nessa fase É importante que o paciente se sinta acolhido em seu ambiente com presença contínua de alguém querido ao seu lado suficientemente capaz de cuidar de deta 297 lhes do conforto e ao mesmo tempo permitir partida serena e digna O ambiente do quarto deve ser individualizado arejado e agradável respeitando al guns hábitos do doente e de sua família Luzes fortes conversas indesejáveis e desres peitosas devem ser evitadas Em ambiente domiciliar pode ser importante que a família esteja orientada e tenha à disposição pelo menos uma dose de medicamentos como haloperidol morfina ou midazolam Quadro 4 Drogas que podem ser usadas por via subcutânea Grupo farmacológico Medicamentos Hidratantes Solução glicosada a 5 Solução glicosada 5 com eletrólitos Solução fisiológica a 09 Solução de Ringer Analgésicos opiodes Tramadol Sulfato de morfina Metadona Antieméticos Metoclopramida Ondansetron Dimenidrinato Anticolinérgicos Hioscina Esteroides Dexametasona uso isolado devido ao risco de precipitação Diurético Furosemida Antitérmicos Dipirona uso isolado Protetores gástricos Ranitidina Omeprazol administração lenta e diluída Antiinflamatórios Diclofenaco uso diluído Ketorolaco Neurolépticos Haloperidol Clorpromazina uso diluído Sedativos Midazolam Clonazepam Fenobarbital uso isolado Fonte Maciel 2006 298 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Conclusão Os cuidados dirigidos aos últimos momentos de vida requerem trabalho em equipe de forma sincronizada e detalhada respeitando a racionalidade terapêutica e as singularidades de cada paciente e sua família Medo tristeza saudade e angústia de familiares e membros da equipe não devem ser desconsiderados ou tratados apenas com medicamentos A decisão sobre o local da morte seja em hospital ou em domicílio deve ser feita em conjunto com a família previamente discutida com a equipe e consideradas as condições e recursos de apoio como estrutura domiciliar familiar e do cuidador O auxílio de um assistente espiritual pode ser importante para o conforto da família respeitando os preceitos religiosos as crenças e a história de vida do doente Ainda que várias questões sobre o processo de morte sejam desconhecidas muitos sintomas desconfortáveis podem ser controlados com carinho interesse e técnicas médi cocientíficas Cabe a nós perceber o doente como pessoa humana diante da sua maior limitação o fim da vida Esse confronto pelo qual todos nós passaremos requer humani dade carinho e amor Também exige de nós profissionais em Cuidados Paliativos o má ximo possível de conhecimento acerca desse momento e a legítima habilidade de tornálo mais sereno É fundamental que o paciente se sinta seguro e acolhido em seu ambiente com a presença contínua de alguém querido a seu lado Alguém amoroso o suficiente para cuidar dos detalhes do seu conforto e ao mesmo tempo ter o desapego de permitir uma partida serena e digna Maria Goretti S Maciel Referências 1 ADAM J ABC of palliative care the last 48 hours BMJ London British Medical Association 1997 v 315 p 16003 2 BARBOSA A NETO I G Manual de cuidados paliativos Lisboa Faculdade de Medicina de Lisboa 2006 3 BONICA J J The management of pain 2 ed London 1990 v 2 4 BREITBART W COLEN K Delirium in the terminally ill In CHOCHINOV H M BREITBART W Handbook of psychiatry in palliative medicine Oxford Oxford University Press 2000 p 7590 5 DOYLE D WOODRUFF R The IAHPC manual of palliative care 2 ed London IAHPC Press 2004 6 DOYLE D GEOFFREY H Palliative medicine Oxford Oxford University Press 2005 7 FAINSINGER et al The use of hypodermoclysis for rehydration in terminally ill cancer patients Journal of Pain and Symptom Management v 9 p 298302 1994 8 HOLLANDFREI Cancer Medicine 6 American Cancer Society BC Becker Inc Hamilton London 2003 p 110121 9 PIMENTA C A M Dor e cuidados paliativos Enfermagem medicina e psicologia São Paulo Manole 2003 10 TORRES J H R Deixar morrer é matar Revista do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo ed 43 2008 11 TWYCROSS R LITCHER I 1998 The terminal phase In DOYLE D HANKS G W C MACDONALD N Oxford Textbook of Palliative Medicine 3 ed Oxford Oxford University Press 2005 p 459587 12 WORLD HEALTH ORGANIZATION Câncer pain relief and palliative care report Genebra WHO 1990 13 WORLD HEALTH ORGANIZATION National cancer control programmes policies and managerial guidelines 2 ed Geneva WHO 2002 299 Suporte a paciente e família na fase final da doença ivone biAnChini de oliveirA Paralelamente a toda a angústia gerada pela incerteza e por outros sentimentos que existem quando se tem um familiar gravemente enfermo com uma doença irreversível e em fase final há outras questões que também trazem preocupações São demandas de ordem prática que exigem providências orientações e encaminhamentos a fim de contri buir para a organização da família frente à difícil situação que se avizinha Faz parte também desse trabalho a preocupação com provisão de recursos financeiros que deem conta de suprir as necessidades do paciente nessa fase e garantir futuramente a manutenção de seus familiares Na prática diária o profissional precisa ter discernimento para decidir o melhor mo mento de tomar providências e também percepção de que algumas propostas evidenciam às vezes contundentemente a fase em que o paciente se encontra Isso pode ser muito problemático nos casos em que a família não está preparada para a ocorrência da morte muitas vezes voltandose contra a equipe que assiste o paciente Se não houver habilidade para condução ou seja percepção de que se deve tratar de cada assunto a seu tempo as medidas que poderiam ser de grande auxílio e benefício poderão trazer mais transtornos Um exemplo disso é a possibilidade de propiciar a quebra da confiança truncando a relação entre profissionais paciente e familiares Evidentemente a percepção desse tempo que norteará as ações só pode ocorrer quando há participação efetiva dos profissionais envolvidos agindo conjuntamente e si nalizando o momento adequado para cada abordagem Optouse por dividir o foco da atenção em dois momentos para melhor organizar ações e intervenções A identificação desses momentos depende do estágio de evolução da doença Primeiro momento regularização de documentos afastamento do trabalho e benefícios O primeiro momento é quando o paciente tem o seu quadro agravado e necessita afastarse do trabalho esteja ele parcialmente dependente de cuidados eou sem pers pectiva de recuperação A reorganização da família vai requerer um aporte financeiro para o enfrentamento pois além de cuidados serão necessários aquisição de medica mentos material para curativos ou fraldas dieta ou suplemento industrializado para alimentação e contratação de uma pessoa para auxiliar nos cuidados Há às vezes necessidade de adquirir ou alugar cama hospitalar cadeira de rodas e de banho apa relho para inalação aspirador e outros equipamentos a fim de propiciar mais conforto ao paciente 300 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Dependendo da evolução da doença esse período pode ser curto mas nem por isso menos dispendioso daí a necessidade imprescindível de orientações que permitam à fa mília lançar mão de todas as alternativas possíveis para amenizar essas preocupações Documentação e regularização de estado civil É importante orientar paciente e família quanto à necessidade de a documentação pessoal do paciente estar corretamente regularizada Caso haja alguma pendência quanto à exatidão de dados ou divergência entre documentos devese providenciar a retificação Isso evita futuros problemas com a concessão de benefícios inventário etc Devese atentar para a mudança do estado civil na documentação pois é comum ca sarse e não providenciar essa alteração assim como se separar e não averbar os termos do divórcio na certidão de casamento inclusive com a determinação de pensão alimen tícia É importante também regularização de estado civil celebração de casamento ou declaração de união estável em cartório Para a comprovação da condição de companheira por exemplo a previdência exige três provas plenas É necessária a orientação sobre a existência dessas provas e sobre como reunir os documentos comprobatórios referentes à convivência sob o mesmo teto conta bancária conjunta beneficiário em seguro de vida ou seguro saúde bens adquiridos conjuntamente comprovante de residência no mesmo endereço filhos em comum e de claração firmada em cartório ou pelo próprio paciente a respeito da vida em comum O reconhecimento de filhos poderá ser feito por escritura pública ou escrito particular a ser arquivado em cartório conforme dispõe o Código Civil4 em seu art 1609 lembran do sempre da importância dessas providências para a proteção da família Portanto casarse quando possível ou registrar em cartório a declaração de união estável é recomendável para se evitar transtornos futuros assim como o reconhecimento dos filhos para não deixálos em desamparo Em alguns casos demorase tanto para tomar essas providências que com o agravamento do estado do paciente isso já não é possível quer pelo tempo exíguo ou pela impossibilidade de o paciente manifestar sua vontade Documentação de representação civil Prevendose dificuldades futuras o paciente pode nomear entre os familiares um que o represente Para isso é necessária procuração para fins definidos ou não Caso o paciente já não tenha mais condição em função de comprometimentos cog nitivos poderá ser interditado nomeandose um curador Isso visa evitar transtornos com por exemplo recebimento do benefício previdenciário e permite movimentar a conta bancária evitandose dificuldades com a própria manutenção dos cuidados e o sustento da família Lembramos que a realização de procuração é um procedimento simples pois requer somente que a pessoa manifeste a sua vontade podendo ir ao cartório ou o tabe lião ir até sua casa ou ao hospital para lavrar o documento Outro procedimento possível é a curatela que exige tempo um pouco maior e é feito no judiciário com a assessoria de um advogado Para filhos menores de pacientes viúvos ou solteiros já com a ausência de um dos pais é recomendável pensar em quem será o 301 responsável por eles quando o paciente falecer Se for possível o paciente poderá mani festar essa vontade para facilitar o processo de tutela Abrir uma conta conjunta bancária com um familiar normalmente o cônjuge quando o paciente está lúcido é uma forma rápida de facilitar a movimentação bancária garan tindo a manutenção da família Documentação e regularização de bens É também de grande importância que se regularizem imóveis com escrituras não registradas em cartório prestações vencidas de financiamento condomínios atrasados etc No caso do financiamento da casa própria são de suma importância regularização do imóvel assim como documentação pessoal do mutuário e seus dependentes pois na aposentadoria por invalidez ou no caso de falecimento quitase a dívida do financiamen to Contudo é necessário que a situação dos herdeiros esteja regular Quando há intenção de deixar testamento ou doações é necessária agilidade nessas providências para tornar a vida da família um pouco mais fácil após o falecimento Documentação de seguro Familiares normalmente não tocam em assuntos que possam parecer ao paciente que eles preveem seu falecimento Assim por se tratar de um assunto complicado para a família deixase de verificar quais são os beneficiários constantes em apólices de seguro É mais comum principalmente em seguro feito há muito tempo quando o paciente era ainda solteiro e tinha os pais como beneficiários que por ocasião do casamento e nascimento dos filhos tenha deixado de fazer a alteração da apólice na seguradora Para essa abordagem é recomendável que se perceba o momento oportuno e se eleja a pessoa da família com maior habilidade para conduzir um assunto tão delicado Essa incumbência pode ser também do assistente social que o atende desde que as condições sejam propícias PISPASEP e FGTS1 7 Uma vez regularizada a documentação é importante identificar quais alternativas irão viabilizar os recursos a que paciente e família têm direito Se o paciente foi inscrito no PIS até 04 de outubro de1988 mesmo que no momento esteja desempregado ele pode sacar a cota do Plano de Integração SocialPrograma de Formação do Patrimônio do Ser vidor Público PISPASEP conforme dispõem as Resoluções nos 1 de 151096 neoplasia maligna e 2 de 17121992 vírus da imunodeficiência humana HIV Quanto ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço FGTS tratandose de HIV o saque tem como base a Lei n 767088 e a neoplasia maligna a Lei nº 892294 que permite levantar o total existen te na conta vinculada inclusive os saldos dos planos econômicos É importante lembrar que há possibilidade de saque do PIS e do FGTS pelo titular das contas Quadros 1 e 2 caso um de seus familiares adoeça e esteja nas condições anteriormente citadas Afastamento do trabalho As orientações quanto à necessidade de justificar a ausência no trabalho por meio de relatórios médicos e realização de perícia para embasar afastamento são pontos comuns 302 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 1 Para efetuar o saque do PISPASEP é necessário estar munido de Documentação pessoal do titular Comprovante de inscrição PISPASEP Carteira de trabalho Cédula de identidade RG CPF Documentação pessoal do dependente Cédula de identidade RG Certidão de casamento ou nascimento Documentação médica comprobatória Atestado médico em papel timbrado contendo Diagnóstico expresso da doença CID Estágio clínico atual da doença Menção à Resolução n 0196 do Conselho Diretor do Fundo de Participação do PISPASEP Carimbo que identifique nome e número do CRM do médico Mencionar no relatório médico Paciente encontrase sintomático para a doença classificada na CID PISPASEP Plano de Integração SocialPrograma de Formação do Patrimônio do Servidor Público RG registro geral CPF cadastro de pessoa física CID Classificação Internacional de Doenças CRM Conselho Regional de Medicina Quadro 2 Para efetuar o saque do FGTS é necessário estar munido de Documentação pessoal do titular Carteira de trabalho original e fotocópia Comprovante de inscrição PISPASEP Cédula de identidade RG CPF Documentação pessoal do dependente Cédula de identidade RG Certidão de casamento ou nascimento Documentação médica comprobatória Atestado médico em papel timbrado contendo Diagnóstico expresso da doença CID Menção à Lei n 8922 de 250794 Estágio clínico atual da doença e do paciente Carimbo legível do médico com o número do CRM Mencionar no relatório médico Paciente encontrase sintomático para a doença classificada no CID FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Serviço PISPASEP Plano de Integração SocialPrograma de Formação do Patrimônio do Servidor Público RG registro geral CPF cadastro de pessoa física CID Classificação Internacional de Doenças CRM Conselho Regional de Medicina 303 independente de instituições ou empresas Com relação à concessão de benefícios a nor matização no caso das instituições públicas depende de cada estatuto Os empregados de empresa inclusive os domésticos e contribuintes individuais são filiados ao Regime Geral da Previdência Social RGPS Neste texto nos deteremos nas orientações específicas para o afastamento do traba lho pela Previdência Social8 Auxíliodoença O paciente que contribui para a Previdência Social filiado ao RGPS estando incapaz para o trabalho por mais de 15 dias tem direito de solicitar auxíliodoença após 12 con tribuições Essa carência8 pode ser dispensada se o paciente for portador de alguma das seguin tes doenças doença profissional esclerose múltipla neoplasia maligna tuberculose ativa hanseníase distúrbio mental cegueira paralisia irreversível e incapacitante cardiopatia grave doença de Parkinson espondiloartrose anquilosante artrose aguda nas vértebras nefropatia grave doença de Paget inflamação deformante dos ossos em estágio avançado AIDS contaminação por radiação com base em conclusão da medicina especializada hepatopatia grave Dispensase a carência mas permanece a obrigatoriedade de estar vinculado à pre vidência Poderá ainda pedir benefício o paciente que estiver em período de graça ou seja tempo durante o qual o segurado está sem contribuir mas que mantém a qualidade de segurado por ter contribuído por menos de 10 anos durante 12 meses e para os que contribuíram por mais de 10 anos 24 meses Em ambos os casos acrescentamse mais 12 meses ao período de graça se houve o registro do desemprego no Ministério do Trabalho Esse registro normalmente se dá pela solicitação do segurodesemprego O paciente pode estar há a algum tempo sem emprego sem contribuição e com seu período de graça esgotado porém se a doença teve início quando ele ainda se encontrava na condição de segurado existe possibilidade de solicitar auxíliodoença retroativo Evidentemente haverá exigências de documentação da época como rela tórios médicos declaração de internação hospitalar exames etc Quando isso ocorre o auxílio é somente da data do início da doença o que possibilita a concessão do benefício porém sem retroação do pagamento 304 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP É sempre bom reforçar que o pedido do auxíliodoença deve ser feito dentro de 30 dias da data do afastamento Se isso não ocorreu o início do auxíliodoença é conside rado a partir da data do protocolo Daí a importância de o profissional ter esse conheci mento e reforçar ao paciente ou a seus familiares sobre a necessidade de solicitar a quem presta assistência relatórios tanto para os empregadores visando ao abono dos primeiros 15 dias como para a perícia da Previdência Social Se há dúvidas sobre a concessão do benefício devese procurar uma agência do Instituto Nacional de Seguro Social INSS Não é necessário intermediário e o próprio paciente ou familiar pode agendar a perícia pelo telefone 135 É importante ter em mãos cédula de identidade cadastro de pessoa física CPF PIS carteira profissional carnês comprovante de endereço e anotações corretas do dia local e horário da perícia Quando do comparecimento à perícia acrescentar aos docu mentos os relatórios médicos com validade por 30 dias e os resultados de exames Se o paciente estiver internado ou sem condições de comparecer à agência do INSS podese solicitar perícia hospitalar ou domiciliar o auxíliodoença é um benefício temporário8 devendo o segurado submeterse periodicamente à perícia e em todas elas comprovar doença e tratamento por meio de relatórios médicos e exames Aposentadoria por invalidez O auxíliodoença se converte em aposentadoria por invalidez quando a perícia médica da previdência8 conclui que a doença é irreversível com incapacidade definitiva Isso pode ser imediato dependendo do estado do paciente ou poste rior a um período com o benefício de auxíliodoença Pode ainda ser constatado que o paciente é também dependente para as atividades diárias concedendo a aposentadoria já acrescida de 25 correspondente ao benefício de assistência permanente Esse benefício só cabe aos aposentados por invalidez e poderá ser solicitado quando o paciente que já se encontrava por algum tempo aposentado tem seu estado de saúde agravado tornandose dependente dos cuidados de ter ceiros Solicitase na agência em que foi concedida a aposentadoria A aposentadoria por invalidez permite o saque do PIS e do FGTS caso não tenha ocorrido anteriormente e a quitação do financiamento da casa própria Quanto a seguros pessoais é preciso verificar se a invalidez faz parte dos sinis tros contemplados nas cláusulas do contrato inclusive o seguro em grupo de empresa Amparo assistencial Lei Orgânica da Assistência Social Ao paciente que não possui fonte de renda e se encontra totalmente dependente é possível solicitar o amparo assistencial3 previsto na Lei Orgânica da Assistência Social LOAS Lei nº 874293 no valor de um salário mínimo Para obtenção desse benefício a renda familiar per capita deve ser menor que 14 do salário mínimo O paciente deverá passar por perícia médica por isso a necessidade de se elaborar relatório médico atestando o estágio da doença e a condição de dependência Embora seja um benefício assistencial sua concessão é feita pelo INSS que conta com infraestrutura e rede bancária para viabilizálo Assim para solicitar informações ou agendar perícia usase o mesmo número de telefone 135 305 Este benefício também cabe aos idosos maiores de 65 anos6 em igual condição econômi ca ou seja renda per capita menor que 14 do salário mínimo É importante lembrar que esse benefício não se transforma em pensão sendo extinto com o falecimento do paciente Segundo momento reorganização familiar após o óbito Em um segundo momento após o falecimento do paciente e depois de um período normalmente difícil a família procura novamente se reorganizar agora em um novo for mato revendo todos os aspectos inclusive o financeiro pois a preocupação real passa a ser a manutenção da família O conforto e a atenção dados aos familiares passa por essa compreensão e há de se achar uma forma de ajudálos efetivamente Uma abordagem cuidadosa respeitando o período de luto mas não se excedendo nesse tempo procura orientar sobre providências a serem tomadas principalmente aquelas nas quais os prazos se expiram pensão inventário documentação do financiamento da casa própria e seguro de vida É preciso inventariar as fontes dos recursos possíveis identificando as alternativas que redundarão em renda de forma a normalizar o mais breve possível a rotina e o coti diano da família Seguro de vida em grupo ou individual Cabe às pessoas que o paciente designou como beneficiárias Se entre elas houver menores o valor do prêmio que lhes cabe deverá ser depositado em caderneta de poupança e só poderá ser retirado com alvará judicial sob assessoria de um advogado O menor pode ser representado por um dos pais um tutor natural ou na falta desse um tutor nomeado Pensão por morte É o benefício pago aos dependentes habilitados após a morte do paciente que man tinha sua qualidade de segurado como contribuinte da Previdência Social8 ou se encon Quadro 3 Documentação necessária para recebimento do amparo assistencial quando inválido Cédula de identidade RG CPF Carteira de trabalho Comprovante de residência Relatório médico Resultados de exames Requerimento de solicitação do benefício Declaração do requerente ou de seu representante Fonte wwwprevidênciagovbr RG registro geral CPF cadastro de pessoa física 306 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP trava em gozo de benefício Para sua solicitação não é necessária carência mas se exige vinculação à previdência Normalmente é conversão de benefício que o paciente já estava recebendo Os dependentes habilitados são aqueles considerados pela Previdência Social cônjuge companheirao e filhos menores de 21 anos não emancipados ou inválidos Esses são chamados de preferenciais e têm sua dependência econômica presumida Há porém exigência de comprovação da condição de companheirao o que já foi mencio nado anteriormente Cabe aqui lembrar que a exesposa tem direito à pensão por morte desde que conste o direito à pensão alimentícia na averbação da separação em certidão de casamento Em tal situação a pensão é rateada entre a exesposa e a companheira assim como filhos de outras uniões desde que menores ou inválidos O prazo para ser requerida a pensão é de 30 dias depois do qual o início do benefício passa a ser a partir da data do protocolo por isso a importância de agendar pelo telefone 135 da Previdência Social o mais rápido possível sendo a forma mais simples de contato inclusive para tirar dúvidas É preciso comparecer no dia na hora e no local onde deverá ser entregue a documentação necessária para a concessão da pensão Os filhos menores serão representados por mãe ou pai tutores naturais ou quem detiver guarda e tutela posteriormente2 Quadro 4 Documentação necessária para recebimento de pensão por morte cópias e originais Documento de identificação do segurado Título de eleitor Certidões de nascimento ou casamento Cédula de identidade RG CPF Carteira de trabalho ou outro documento que comprove a atividade Inscrição no PISPASEP Carnês de recolhimento quando for contribuinte individual Certidão de óbito Comprovante de residência RG registro geral CPF cadastro de pessoa física PISPASEP Plano de Integração SocialPrograma de Formação do Patrimônio do Servidor Público No caso de companheira acrescentar as provas plenas exigidas pelo INSS ver item sobre regularização civil Filhos inválidos deverão submeterse à perícia médica Na ausência dos dependentes considerados preferenciais outros que dependem eco nomicamente do paciente como pais irmãos menores ou inválidos terão de provar essa dependência quando da solicitação da pensão É importante lembrar que o direito à pen são não prescreve porém o pagamento não retroage daí reforçar mais uma vez a impor tância de se protocolar o benefício o mais rápido possível A pensão tem o mesmo valor da aposentadoria do segurado falecido se o segurado ainda não estiver aposentado calculase uma aposentadoria por invalidez com início na data do óbito 307 caso o viúvo ou a viúva volte a se casar não perde o direito à pensão caso o dependente já seja pensionista poderá optar pela pensão de maior valor5 Quadro 5 Documentação necessária dos dependentes para recebimento da pen são por morte cópias e originais Cédula de identidade RG CPF Certidão de casamento Certidão de nascimento dos filhos menores ou inválidos Comprovante de residência RG registro geral CPF cadastro de pessoa física A pensão permite o saque de PIS e FGTS pelos dependentes por meio da certidão de dependentes que acompanha a carta de concessão da pensão emitida pelo INSS Permite também o recebimento de saldo de rescisão do contrato de trabalho do falecido Se hou ver dependentes menores todas as importâncias que a eles couberem são depositadas numa caderneta de poupança da Caixa Econômica Federal CEF Esses valores só podem ser liberados por meio de alvará judicial com assessoria de advogado Caso não haja dependentes com direito a pensão o INSS pode emitir uma certidão de inexistência de dependentes para fundamentar alvará judicial que irá liberar as impor tâncias para os familiares por ordem de sucessão Conclusão A Legislação é ampla e não seria possível colocála na íntegra mesmo porque a in tenção não é substituir os profissionais que dela têm competência como os advogados que devem sempre ser solicitados quando a situação exigir A intenção na verdade é contribuir para que o assunto seja conhecido possibilitar que o profissional que atende ao paciente e à família nessa condição reconheça quando e como encaminhar tais ques tões de forma adequada evitando perda de tempo precioso para as resoluções que dizem respeito à manutenção da família Referências 1 BARBOSA A Câncer direito e cidadania Como a lei pode beneficiar os pacientes e seus familiares São Paulo Arx 2003 2 BRASIL Lei n 8069 de 13 de julho de 1990 Estatuto da criança e do adolescente Disponível em httpwwwcresssporgbrindexaspfuseactionlegregidsubsecao9 Acesso em 16 jun 2009 3 BRASIL Lei n 8742 de 7 de dezembro de 1993 Lei orgânica da assistência social LOAS Dispõe sobre a organização da assistência social e dá outras providências Disponível em httpwwwcresssp orgbrindexaspfuseactionlegregidsubsecao9 Acesso em 16 jun 2009 4 BRASIL Código Civil Rio de Janeiro editora Escala 2007 308 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP 5 DIVISÃO DE SERVIÇO SOCIAL DO ICHCFMUSP Cartilha de Atualização de Previdência Social São Paulo 2008 6 ESTATUTO DO IDOSO Lei n 10741 São Paulo editora Saraiva 2006 7 HOSPITAL DO CÂNCER A C CAMARGO Câncer Direitos do Paciente manual de orientação sobre legislação e benefícios 8 TUDO O QUE VOCÊ QUER SABER SOBRE A PREVIDÊNCIA SOCIAL Brasília Ministério da Previdência e Assistência Social 2002 309 Aspectos particulares e ritos de passagem nas diferentes religiões luis Alberto sAPoretti Alini mAriA orAthes Ponte silvA Importância da abordagem religiosa e espiritual em Cuidados Paliativos Muitas pessoas encontram em suas crenças religiosas a ajuda para entender sofri mento significação e incerteza de sua vida As religiões procuram de algum modo miti gar a agonia de nossa finitude e nosso sofrimento Deus segundo a formulação de várias culturas não apenas suaviza a dor da mortalidade por meio da vida eterna como também alivia um isolamento temível oferecendo Sua presença eterna e providenciando um pro jeto claro para que a vida seja significativa Não há mais dúvida quanto à importância dos aspectos religiosos e espirituais no cuidado dos pacientes embora ainda haja muitos questionamentos a respeito de como acessar a dimensão espiritual do ser humano e quanto a em que consiste o bom cuida do espiritual19 34 Noventa e cinco por cento dos americanos creem em alguma força superior12 21 e 93 gostariam que seus médicos abordassem essas questões se ficassem gravemente enfermos6 32 No Brasil a maioria da população apresenta crenças religio soespirituais e as considera uma questão muito importante4 Entre os idosos a quase totalidade acredita em Deus e 95 consideram a religião importante9 Estudos com pacientes internados demonstram que 77 gostariam que seus valores espirituais fossem considerados pelos seus médicos e 48 que seus médicos rezassem com eles15 Con traditoriamente a maior parte dos pacientes disse que seus médicos jamais abordaram o tema15 Parece que o envolvimento religioso positivo e espiritual está associado a uma vida mais longa e saudável20 e a um sistema imunológico mais eficaz16 Outros estudos também demonstram que o estresse religioso negativo pode piorar o estado de saúde17 A atenção aos aspectos espirituais em Cuidados Paliativos tem tanta relevância que alguns autores ousam colocála como maior indicador de boa assistência ao paciente no final da vida34 Diante do desafio de cuidar do paciente no final da vida de maneira tão completa devemos expandir nossa compreensão do ser humano para além de sua dimensão bio lógica Na Figura podemos visualizar a representação esquemática das dimensões do ser humano29Tratase apenas de uma representação didática das diferentes facetas do homem uma vez que é totalmente impossível analisar uma sem a interferência da outra A dimensão física ϕ representa nossa biologia nosso corpo e os sofrimentos com ele relacionados como dor dispneia náuseas vômitos astenia caquexia confusão mental depressão ansiedade etc Exponho aqui os distúrbios mentais como diagnósticos médicos que fazem grande interface com a próxima esfera a psíquica ψ Nessa esfera encontram 310 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP se nossos medos raivas mágoas alegrias e tristezas os quais têm suas particularidades no paciente terminal Nas esferas social e cultural δ estão nossa etnia nacionalidade religião escolaridade classe social e os sofrimentos peculiares de cada uma Existem reli giões e etnias que lidam melhor com a morte outras não A família γ como menor núcleo de subsistência do paciente relacionase com a questão financeira e suas atribulações A esfera existencial ε engloba todas as outras dando significado e questionamentos a cada uma delas Para cada um de nós família dinheiro cultura corpo emoções e sentimentos são expressões de nós mesmos com maior ou menor importância e diferentes significa dos Por fim a dimensão espiritual ζ engloba a relação do indivíduo com o transcendente αω sendo necessário diferenciála das questões existenciais e religiosas Alguns autores consideram a dimensão existencial sinônimo da espiritual o que é uma verdade apenas em parte Todas as coisas que dão significado à vida de uma pessoa família trabalho religião etc podem apresentar clara relação com o transcendente Deus o metafísico o sobrenatural ou o sagrado A profissão pode ser por exemplo a manifestação desse sagrado na Terra Chamamos essa dimensão entre o existencial e o transcendente de espiritual A religião instituída por exemplo pertence às dimensões cultural e social e pode ser considerada espiritual se realmente relaciona o indivíduo com o seu sagrado ou transcendente Cada religião expressa o espiritual de um povo conforme suas caracterís ticas sociais e culturais Figura Dimensões do ser humano ϕ física ψ psíquica γ familiarfinanceira δ sociocultural ε existencial ζ espiritual e αω transcendente A dimensão espiritual relaciona o existencial com o transcendente seja ele Deus natureza sobrenatural ou sagrado30 311 O sofrimento humano pode nascer em qualquer dessas dimensões e é integrado pelos significado e sentido a ele associados O sofrimento espiritual se alicerça na violação da essência do eu o que se caracteriza frequentemente pela perda de sentido e identidade assim como do prazer de viver seguido então pelo desejo de abreviar a vida13 19 33 O sofrimento religioso se caracteriza pela dor moral conduzida pela quebra de dogmas e preceitos daquela religião13 Embora alguns autores vejam a distinção entre religiosidade e espiritualidade como desnecessária a espiritualidade movese para além da ciência e da religião instituída Ela é considerada mais primordial mais pura e mais diretamente relacionada com a alma em sua relação com o divino Já a religião é uma forma secun dária dogmática e frequentemente distorcida por forças socioeconômicas culturais e políticas32 Como abordar as questões relativas a religiosidade e espiritualidade Entre as dificuldades para abordar a questão espiritual no final da vida estão o próprio desconhecimento da equipe a respeito da sua espiritualidadereligiosidade e a ignorância do paciente com relação à sua finitude25 Apesar de a maioria dos pacientes desejar saber a respeito da gravidade de seu prognóstico a maior parte dos médicos não é favorável a fazêlo17 Dados brasileiros demonstram que a maioria expressiva dos pacientes idosos 83 gostaria de saber caso tivessem uma doença terminal e 77 de participar das decisões médicas quando perto da morte9 Não é possível abordar as questões espirituais sem uma real percepção da morte A morte é a última crise a ser enfrentada e a última oportunidade para o crescimento espiritual sendo seu grande desafio manter íntegra a identidade da pessoa diante da possibilidade da desintegração13 Ao se avaliar a história religiosaespiritual devese identificar sua importância na vida do paciente e de sua família assim como isso pode ser incluído nos cuidados do pa ciente Puchalski e Maugans sugerem uma abordagem inicial por meio das siglas FICA25 e SPIRIT18 como mostram os Quadros 1 e 2 Quadro 1 FICA Puchalski Faith fé Você se considera uma pessoa religiosa ou espiritualizada Tem alguma fé Se não o que dá sentido à sua vida Importance importância A fé é importante em sua vida Quanto Community comunidade Você é membro de alguma igreja ou comunidade espiritual Address abordagem Como nós equipe podemos abordar e incluir essa questão no seu atendimento Na busca pelo alívio do sofrimento e pela morte digna e pacífica a equipe deve ter como objetivo no domínio religioso que o paciente esteja em paz com o Criador receba o perdão Dele e os ritos adequados da sua tradição durante e após a morte Do ponto de 312 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP vista espiritual devemse buscar o sentimento de continuidadetranscendência a síntese de sabedoria e a percepção do legado espiritual Entre os aspectos a serem levantados durante a anamnese religiosaespiritual estão possíveis conflitos com o Criador religiosos familiares pendências com relação a ritos sacramentos obrigações e promessas perda do significado maior da existência Quadro 2 SPIRIT Maugans Spiritual belief system crença religiosa Qual é sua religião Personal spirituality espiritualidade pessoal Descreva as crenças e práticas de sua religião ou sistema espiritual que você aceita ou não Integration within spiritual community afiliação a comunidades espirituais ou religiosas Você pertence a alguma igreja algum templo ou outra forma de comunidade espiritual Que importância você dá a isso Ritualized practices and restrictions rituais e restrições Quais são as práticas específicas de sua religião ou comunidade espiritual ex meditação ou reza Quais os significados e restrições dessas práticas Implications for medical care implicações médicas Qual desses aspectos espirituaisreligiosos você gostaria que eu estivesse atento Os ritos de passagem São celebrações que marcam mudanças na condição do indivíduo As principais tran sições marcadas por esses ritos são nascimento entrada na idade adulta casamento e morte Sempre que a força de um ato é maior em seu significado simbólico do que no seu resultado prático estamos falando de um gesto ritual Os ritos constituem uma sequên cia de gestos que visam estabelecer uma conexão entre as realidades relativa do mundo consciente e absoluta ou imaterial do inconsciente coletivo3 O mundo moderno é carente de rituais claros de passagem o que frequentemente causa dificuldade na identificação de um momento para outro da vida Muitos rituais cumprem apenas uma função social o que não auxilia as pessoas a realmente transcen derem seu sofrimento A tendência hoje é fazer tudo depressa o mais indolor possível reduzindose a simbologia ao mínimo necessário7 ou melhor ao mínimo suportável Características gerais dos ritos mortuários nas diferentes religiões Os ritos mortuários se confundem com a própria história da humanidade Cinco mil anos antes de nossa era os homens neolíticos já realizavam ritos fúnebres e incinera vam seus mortos Todos os povos cada um ao seu modo e de acordo com sua cultura ritualiza a morte e crê num tipo de existência pósmorte Embora nossas culturas 313 sejam tão diversas podemos notar como tais ritos e visões do além se assemelham de forma impressionante Todas as culturas pretendem comunicar ao inconsciente uma mensagem Assim rito mortuário pretende mostrar um caminho uma realidade sim bólica a qual o inconsciente reconhece e valida Um ato que torna real o imaginário e conduz ao transcendente O rito tranquiliza pois se situa fora do tempo Os atos de preparar o corpo banhálo ungilo e vestilo reafirmam ao falecido sua condição de pessoa e prolongam sua permanência com os que ficam retardando a separação A vigília as orações e o fato de o morto dever estar sempre acompanhado garantem sua presença nesse mundo assegurando sua identidade até a hora de sua partida para o além3 Chega a hora da partida a natureza reclama o corpo Ele deve ser entregue Àquele que o criou Cada povo segundo suas tradições encontra um modo de entregar a ma téria à natureza e o espírito ao Criador Alguns buscam o suave curso das águas o corpo é colocado em uma balsa ou liber to livre no mar para encontrarse com o berço da vida as águas do liquido amniótico É uma súplica para que o espírito encontre seu novo caminho e renasça em outro local outro ventre aqui ou no imaterial A balsa se afasta e com ela afastase a morte Pode mos retornar à vida o falecido já tem seu caminho no além Sob a terra a grande estrutura que sustenta a vida repousamos enfim nosso últi mo sono Buscamos a profundidade da mãe terra como crianças se enroscando em seu travesseiro A terra nos acolhe acolhe a todos O corpo é coberto cada nova porção de terra afastanos da morte esconde nossa fragilidade apaga nossa mortalidade A terra encobre o falecido como se nada tivesse ocorrido Do pó ao pó nada apenas uma porção de pó Em breve novas vidas lá surgirão na eterna transformação que a terra propõe O fogo princípio transformador e destruidor por excelência liberta e purifica seja dos micróbios seja dos fantasmas que assombram a vida A fumaça ascende aos céus o que é imaterial retorna ao mundo dos espíritos O que é denso permanece na terra o pó A Deus o que é de Deus a César o que é de César Além de garantir ao falecido seu caminho no plano imaterial os ritos pretendem dar aos entes que ficam o conforto e a possibilidade de vivenciar a morte numa dimensão transcendente Os ritos mortuários nas diferentes religiões Cristianismo11 26 Na visão do cristianismo a morte é o despertar para a vida eterna é a ressurreição que leva à abertura da consciência para se alcançar uma realidade mais ampla e infinita A morte é considerada um momento de passagem isto é a pessoa passa de uma vida fini ta para a vida eterna Nessa visão é preciso considerar o conceito da alma que é imortal A morte é apenas a separação do corpo físico da alma Há uma aceitação do mistério da morte para encontrar uma nova vida totalmente com Cristo Os rituais de morte e luto no cristianismo têm similaridades incluindo unção velório enterro e orações cultos e missas A fé cristã tem certas orações canções e rituais que 314 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP são realizadas em volta da cama da pessoa que está morrendo Para os cristãos católicos os sacramentos são um sinal da presença de Deus Normalmente a unção dos enfermos acontece após a absolvição dos pecados A unção se destina a dar aos doentes força espi ritual e consolo durante a enfermidade Após a morte o corpo do cristão é velado no ce mitério em casa ou na igreja Durante o velório podemse entoar cantos religiosos fazer orações e celebrar missa Ao padre cabe efetuar a encomendação do corpo com leituras de textos sagrados do Novo Testamento Sete dias depois do enterro é celebrada uma missa pela alma do falecido na qual se reúnem parentes e amigos Os católicos adotam o 2 de novembro como dia de finados para reverenciar os mortos mas nada impede que parentes e amigos visitem os túmulos em qualquer outra data podendo acender velas levar flores e rezar pela alma do falecido É importante ressaltar que segundo o Papa João Paulo II a renúncia a meios extraor dinários ou desproporcionais não equivale ao suicídio ou a eutanásia exprime antes a aceitação da condição humana diante da morte Assim como é lícito o uso de narcóticos para supressão da dor e da consciência desde que o paciente não tenha deveres morais e religiosos a serem cumpridos Pio XII 195723 O próprio Papa optou no final de sua existência por permanecer em seus aposentos e não ter sua vida estendida por outros recursos Infelizmente como em todas as reli giões as angústias pessoais com relação à morte são passionalmente misturadas aos desígnios do Criador e ao desconhecimento a respeito da premissas de cada religião levando pessoas a opiniões e atitudes extremadas e fora dos princípios daquela reli gião23 A crença em milagres e na imoralidade do deixar morrer levam frequentemen te pacientes com câncer avançado a serem submetidos a terapias de suporte em unida des de terapia intensiva UTIs e reanimações cardiopulmonares desnecessárias25 Budismo8 27 No budismo a morte é parte natural da vida que todos terão de enfrentar um dia Por meio da meditação os budistas se preparam para a morte que possibilita a compreensão de que tudo é transitório e interligado Segundo Dalai Lama se quisermos morrer bem devemos aprender a viver bem se esperamos morrer em paz devemos cultivar a paz em nossa mente e nosso modo de vida O budismo crê na reencarnação conceito segundo o qual após a morte a pessoa renasce A maioria dos budistas adota a cremação No budismo tibetano quando alguém morre a família chora a perda e começa a preparar o funeral Os lamas locais ou monges se posicionam ao lado do corpo a fim de lerem o Livro Tibetano dos Mortos que é uma descrição precisa do que cada um enfrentará na outra vida uma experiência que os tibetanos chamam de bardo As palavras são destinadas a guiar o morto ao mundo do além Depois de dias de orações ao lado do morto o corpo está preparado para o funeral No Tibete o corpo deverá voltar à posição fetal ser envolvido em panos e levado a um local distante ficando como oferenda aos abutres Pode parecer triste e mórbido do ponto de vista ocidental mas os tibetanos acreditam que o corpo sem vida é totalmente inútil a menos que ele ofereça um último presente à terra servir de alimento para outros seres viventes Esse é o fim do corpo mas não da alma Durante 49 dias o espírito vagaria no além até a reencarnação Do ponto de vista do budismo tibetano a verdadeira ex periência da morte é muito importante Embora como e onde renascer sejam condições 315 que em geral dependam de forças cármicas o estado de espírito no momento da morte pode influir na qualidade do próximo renascimento Assim o modo como se morre é fun damental para um renascimento auspicioso Desse modo vemos que frequentemente os adeptos do budismo aceitam a possibilidade da morte de modo mais tranquilo e desejam respeito e paz nessa hora Espiritismo14 Segundo o espiritismo assim que ocorre a morte a alma regressa ao mundo dos espí ritos de onde tinha saído momentaneamente para mais uma encarnação A reencarnação é necessária para a purificação da alma que busca a perfeição A morte é um instante em meio a um caminho infinito É uma transição e não um ponto final Segundo a doutrina espírita de Allan Kardec só existe a morte do corpo físico enquanto o espírito imortal retorna a sua verdadeira vida que é a espiritual A doutrina espírita acaba com o conceito da morte como algo mórbido e finito a partir do momento que a encara como processo de renovação e reconstrução para outra etapa O velório é dirigido ao espírito do falecido e são realizadas preces na intenção da alma criandose um clima de vibração positiva em favor do espírito desencarnado inclu sive utilizando música Os espíritas não adotam o uso de velas nem a prática do luto Após o enterro eles não preveem cerimônia alguma Sempre que desejam e de acordo com o foro íntimo de cada um fazem preces para pedir boas vibrações para os desencarnados Segundo O Livro dos Espíritos a visita ao túmulo é uma maneira de mostrar que se pensa no espírito ausente é a imagem A prece é que santifica o ato da lembrança pouco im porta o lugar quando se ora com o coração Judaísmo2 10 O judaísmo crê que a morte é o fim do corpo material A verdadeira pessoa que é a alma é eterna A própria morte é considerada uma parte da criação No pensamento judaico vida e morte formam um todo sendo aspectos diferentes da mesma realidade complementares uma da outra A morte não significa a extinção do ser mas o começo de uma nova fase Não há para o judaísmo motivos para o prolongamento artificial da vida ou para deixar a pessoa em sofrimento exceto por desejo do próprio doente31 Assim o uso de analgésicos para alívio da dor e até mesmo a sedação para conforto são estratégias pos síveis desde que com a concordância do pacientefamília Prolongar a agonia por meio de recursos artificiais também não é justificado no entanto a suspensão de medidas já estabelecidas que causem a morte não é considerada adequada31 O enterro ocorre logo após a morte Adiar o sepultamento é visto como um desres peito para com o morto e uma interferência nos planos do Criador exceto no Shabat e no Yom Kipur A cremação não é permitida e o corpo do falecido é lavado vestido com uma roupa branca e colocado num caixão de madeira simples Os homens são enterrados com seu xale de oração Não se usam flores nem música na cerimônia O rabino faz um discurso em memória do morto e os filhos homens ou o parente mais próximo do sexo masculino recitam cantos de louvor a Deus o kadish Após o funeral a família fica de luto por uma semana shivá abstendose de quaisquer atividades profissionais ou de 316 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP lazer Parentes e amigos fazem visitas de condolências à casa dos enlutados e três vezes por dia de manhã à tarde e à noite realizamse serviços religiosos A noção de vida após a morte é uma declaração da crença na vinda do Messias que ressuscitará fisicamente os mortos Por este motivo o judaísmo proíbe a mutilação do cadáver A instituição da shivá tem como finalidade dar à família folgas psicológicas e espi rituais para continuar a vida depois da perda de um ente querido O enlutado não está só muito pelo contrário ele faz parte da comunidade dos enlutados de Sion É essa consciência de grupo que lhe dá conforto já que recebe apoio e consolo de familiares e amigos durante esses dias o que lhe permite emergir fortalecido preparado para enfren tar as vicissitudes da vida e pronto para reassumir suas responsabilidades perante o seu povo No aniversário de falecimento yahrzeit costumase visitar o túmulo do falecido e mantémse uma vela acesa durante 24 horas Os filhos recitam o kadish na véspera à noite e no próprio dia do yahrzeit de manhã e à tarde Algumas pessoas jejuam no dia do yahrzeit de um parente chegado em sinal de pesar Os chassidim entretanto conside ram o yahrzeit uma ocasião de júbilo com base no conceito místico de que a cada ano que passa a alma do falecido ascende a um nível espiritual mais alto A comunidade judaica conta em vários estados brasileiros com a Chevra Kadisha uma entidade que providencia os cuidados com o corpo e organiza o funeral de acordo com a tradição Islamismo11 26 O islamismo deixa claro aos muçulmanos que a morte e a vida são presentes de Deus Desde a infância é passada a noção de que tudo que começa tem um fim Estimulam a usar este mundo sabiamente e a fazer o bem para prepararse para a vida que está por vir Os muçulmanos acreditam no dia do juízo final na vida após a morte e em que o praticante da religião receberá sua recompensa ou punição pelo que fez na Terra A morte humana é o ingresso para a vida eterna num outro mundo Morrer não significa término da existência mas o começo da eternidade Sendo a morte e a vida presentes de Deus devem ser respeitadas como tais O sofrimento humano deve ser aliviado a eutanásia não é permitida e o uso de suporte artificial de vida deve ser desencorajado pela equipe médica Cuidados especiais devem ser tomados com o corpo em especial das mulheres O uso de sedativos e opioides para fins médicos é permitido sendo necessária uma explicação clara a respeito dos objetivos A sedação para conforto pode prejudicar as práticas religiosas e assim só será aceita se realmente essencial para alívio do paciente1 31 Constatado o óbito devemse tirar os adornos anéis brincos aliança relógio corren tes etc e posicionar o corpo olhando em direção à Meca No cemitério o corpo é retirado do caixão e despido para que se realizem três banhos Preces com a intenção de purificação serão recitadas e então uma mortalha feita de tecido branco 100 natural cobrirá o corpo Por considerar a morte uma coisa natural não há ritual de luto A primeira noite é vista como a mais difícil para o falecido então se deve orar na intenção de sua alma Nos segundo e sétimo dias missas são celebradas na mesquita sendo também costume celebrar nos 30o 40o e 60o dias bem como uma vez por ano Visitas ao cemitério são importantes para não se esquecer do falecido O islamismo 317 prega que os falecidos só conseguem um vínculo com esse mundo pelas obras de caridade que fizeram em benefício dos outros e por intermédio de seus filhos orando por eles Tradições afrobrasileiras28 Nas tradições afrobrasileiras as percepções da natureza e do mundo espiritual estão integradas e seus ritos são de acordo com essa perspectiva Ao contrário de tradições judaicocristãs não há uma separação nítida entre a vida e a morte o céu e a terra o material e o imaterial o homem e a natureza o bem e o mal Tudo se encontra unido pela enorme teia da vida No candomblé morrer é passar para outra dimensão e permanecer junto com os es píritos orixás e guias A morte é bem vista para os idosos pois completaram seu destino e podem seguir seu caminho no òrun plano espiritual ou imaterial livres das amarras terrenas e adquirindo poderes que podem auxiliar seus descendentes na Terra Já a morte de um jovem é vista como uma tragédia Prematura é entendida como uma consequência de infração grave contra os orixás ou uma inobservância de suas obrigações com a co munidade as quais os ancestrais resolvem disciplinar Os ritos fúnebres na tradição iorubá visam preparar a passagem do morto do àiyé mundo material para o òrun mundo do além assim como restabelecer as relações sociais e espirituais causadas pela ausência do falecido Quanto maior a posição social e religiosa do indivíduo maiores serão os vínculos a serem cortados e os esforços para o reequilíbrio Nada deve reter o morto no àiyé O falecido após receber seus rituais passa a ser um ancestral e poderá ser invocado como égún Esse ritual o àsèsè ocorre por sete dias após a morte A umbanda cujo nome deriva do termo quimbundo angolense quer dizer feiti ceiro xamã ou curandeiro O termo umbanda u mbanda significa arte mágica da cura ou simplesmente magia É uma religião essencialmente brasileira fruto da união entre candomblé práticas ameríndias catolicismo popular e conceitos espíritas kardecistas Segundo a umbanda após a morte o ser desencarnado será encaminhado para uma esfera espiritual condizente com seus atos e vibração emocional acumulada durante a passagem no corpo físico existindo a possibilidade da continuidade da vida no mundo espiritual ou na reencarnação A umbanda reconhece também as forças naturais na forma dos orixás do culto africano que frequentemente são sincretizado com santos católicos O funeral umbandista é dividido em duas partes purificação do corpo e do espírito que acontece somente com a presença do sacerdote um ajudante e um parente e a cerimô nia social para encomenda do espírito realizada no velório e no túmulo Esse ritual não deve ser envolvido de tristeza e sim de alegria pois o desencarnado está retornando para o plano eterno fora das ilusões e poderá retomar sua evolução de forma consciente se assim estiver preparado Finalizando Longe de querer esgotar o tema este capítulo apenas abre as portas do tema àqueles que cuidam do ser humano no final da vida Muitas são as religiões não descritas aqui 318 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP maiores ainda as subdivisões e fragmentações de todas elas No entanto podemos per ceber que em todas há relação de aceitação da morte e continuidade da existência junto ao Criador A natureza religiosa e espiritual do ser humano é uma área ainda pouco abordada pe los profissionais da saúde e tornase vital nos cuidados com aqueles que estão partindo Conhecer nossas próprias questões sobre finitude religião e espiritualidade é o ponto de partida para auxiliarmos melhor nossos pacientes A equipe deve ser treinada para aceitar os diferentes valores religiosos e espirituais não impondo conceitos próprios mas respeitando e incentivando a participação do pa ciente em sua prática A abordagem das questões espirituais e religiosas dos pacientes deve ocorrer no início do acompanhamento para que as medidas necessárias sejam tomadas em direção à reso lução de possíveis demandas de paciente família e equipe Referências 1 ALSHAHRI M Z ALKHENAIZAN A palliative care for muslim patients J Support Oncol v 3 p 4326 2005 2 ASSOCIAÇÃO CEMITÉRIO ISRAELITA DE SÃO PAULO Chevra Kadisha ACISP Dis ponível em httpwwwchevrakadishaorgbr ou httpwwwchevrakadishacombr Acesso em 20 maio 2009 3 BAYARD J P Sentido oculto dos ritos mortuários São Paulo Ed Paulus 1996 4 DATAFOLHA Disponível em httpdatafolhafolhauolcombrpodossiesindex shtml Acesso em 5 maio 2007 5 DEL GIGLIO A Cuidados com o paciente terminal com câncer segundo a tradição judaica Rev Bras de Cancerologia v 4 n 15 p 69 2001 6 EHMAN J et al Do patients want physicians to inquire about their spiritual or religious beliefs if they become gravely ill Arch Intern Med v 159 p 18036 1999 7 ELABORAÇÃO DO LUTO EXIGE RITOS DE PASSAGEM Jornal de psicologia v 19 n 130 2001 Disponível em httpwwwcrpsporgbr Acesso em 25 maio 2009 8 EWANSWENTZ W Y O livro tibetano dos mortos Editora Pensamento 2000 9 GIL L A J CURIATI J A E SAPORETTI L A Influência da qualidade de vida nas expectativas e nas decisões de fim de vida em idosos Monografia de conclusão do curso de 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possuíamos Podemos passar por perdas saindo ilesos da vivência no entanto algumas delas nos são caras e significativas mobilizando sentimentos conflitantes e dolorosos Quando falamos em perdas não nos referimos necessariamente à morte mas perdas psíquicas físicas materiais entre outras Autores como Fonseca e Parkes4 11 citam outros tipos de experiências que envolvem perdas como a separação entre as pessoas vivas a doença como parte da pessoa que morre o próprio desenvolvimento humano como for mas de evolução e morte a morte psíquica as amputações a perda de uma casa entre outras tantas possibilidades Desde o nascimento somos treinados por meio da vivência de perdas e mortes sim bólicas a nos aproximarmos da noção de finitude No entanto o condicionamento pelo nãoperder é imperativo não podemos perder a hora o controle da nossa rotina e não admitimos sequer deixar de ganhar uma competição Sabemos da vulnerabilidade humana e que existe adoecimento e fragilidade mas no íntimo vivemos com a ilusão de que isso só ocorre a nossa distância Contudo somos forçados a olhar para o que temíamos quando nós algum familiar ou um amigo querido adoece No caso do acometimento por uma doença que ameace a continuidade da vida não perdemos só a saúde e a ilusão de imortalidadeonipotência mas também papéis ante riormente exercidos nos contextos profissional social afetivo e econômico De acordo com Kovacs8 as perdas e suas elaborações fazem parte do cotidiano já que ocorrem em todos os momentos do desenvolvimento humano e embora sejam expe riências universais são vividas de forma particular por cada indivíduo Neste texto especificamente será abordada a atenção às situações de perdas por doença e morte e seus desdobramentos no cotidiano de pacientes familiares e profis sionais da saúde 322 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Adoecimento e morte anunciada A partir do diagnóstico de uma doença potencialmente mortal seguido pela evolução da enfermidade paciente e família deparamse com rupturas limitações e privações A rotina anteriormente vivida é alterada e situações pouco familiares como exames medi cações e procedimentos ganham espaço Ao longo das hospitalizações e dos tratamentos os membros que assumem os cuidados principais do doente necessitam conciliar papéis antigos ao novo papel de cuidador vivenciando portanto não só sentimentos geradores de sofrimento frente às perdas relacionadas com o ente querido como também às suas próprias Os arranjos familiares dos séculos XX e XXI sugerem escassez na rede de suporte familiarsocial uma vez que as famílias tornaramse menos numerosas as residências ficaram menores e as mulheres e os jovens passaram a trabalhar fora de casa Como con sequência a situação comum é que apenas um componente da família assuma o cuidado principal acarretando intensas sobrecargas física e emocional Sentimentos ambíguos podem permear a vivência ou seja além de compaixão soli dariedade e pesar os familiares podem também sentir raiva e desejo de breve retorno à sua rotina de atividades Com a piora clínica do doente a ambiguidade de sentimentos pode tornarse ainda mais evidente O aumento das reais possibilidades de sofrimento e dor do paciente pode suscitar em muitos familiares o desejo de que tal sofrimento se finde ou em oposição a isso o apego a uma ilusão fervorosa de cura e melhora mesmo que isso fuja totalmente das possibilidades viáveis Diante da ambiguidade posturas de superproteção ou afastamento podem surgir Carter e McGoldrick3 destacam que uma reação que ocorre na família quando da perda de um de seus elementos é com relação ao seu movimento que pode ser de aproximação centrípeto ou de afastamento centrífugo entre seus membros Com a evolução da doença caso o doente apresentese debilitado física e emocio nalmente pode haver a necessidade de os familiares assumirem a responsabilidade pela tomada de decisões e fazer valer a autonomia do paciente pelo que compartilharam de sua biografia até o momento atual Essa é uma das mais árduas tarefas para o sistema familiar que compreende um de seus membros gravemente enfermo Decidir por alguém mesmo que tal decisão esteja pautada no desejo do paciente reforça ao familiar uma representação de falta do ente querido Há uma representação de morte em vida Nesses casos o luto antecipatório que será definido em breve neste texto é vivenciado Pacientes afásicos comatosos demenciados grandes sequelados neurológicos extre mamente debilitados pela doença e incapacitados de exprimir decisões segundo Boss1 entram na caracterização da perda ambígua uma vez que estão vivos mas psicologica e socialmente ausentes Tal ausências podem desencadear a antecipação do processo de luto O familiar vivencia um estranhamento de si e do ente amado O ato de cuidar visando ao conforto e à qualidade de vida de acordo com o que permitir a situação estreita e in timiza o contato com o doente Isso possibilita ressignificações desse vínculo e faz muitas vezes com que as experiências sejam as mais intensas em comparação às de toda vida Porém as alterações físicas a evolução da doença e a possibilidade de morte representam um choque de realidade ao familiar que ora está intimamente e intensamente próximo 323 ao doente ora tem que iniciar a aceitação de que essa pessoa em algum momento não estará mais com ele Iniciase o que muitos autores chamam de vivência ou elaboração do luto antecipatório a exemplo de Fonseca4 que consiste na vivência de conjunto de sentimentos relacionados com a dor da notícia da existência de uma doença em estágio avançado ou da perda iminente de algum membro do sistema familiar Podese ter tal experiência nas esferas cognitiva emocional e comportamental Segundo Rando in Franco12 o processo de luto é iniciado a partir do momento em que é recebido o diagnóstico de uma doença potencialmente mortal pelas perdas concre tas ou simbólicas que essa doença possa trazer para a pessoa e sua família Para Lindermann10 a ameaça de morte ou separação pode por si própria iniciar uma reação de luto Pesquisadores sugerem que as intervenções realizadas durante o luto an tecipatório podem prevenir o desenvolvimento de problemas no luto pósmorte4 Aos profissionais de saúde que acompanharem o paciente na fase final de vida por tanto durante a vivência do luto antecipatório é importante levar em consideração a in tensidade do valor afetivo do mesmo para cada familiar Esse dado auxilia na compreensão das reações psíquicas e comportamentais e no entendimento de que há um tempo interno para aceitação e elaboração da perda peculiar a cada membro da família Na mesma proporção é necessário que também seja dada atenção aos profissionais de saúde envolvidos nos cuidados ao paciente uma vez que juntamente vivenciam o luto antecipatório Processo do luto Para o profissional que trabalha em contextos de perdas e morte é imprescindível o conhecimento a respeito da definição de luto e das reações comuns suscitadas por ele uma vez que esse evento causará muitas mudanças de comportamento nos familiares e no próprio doente Bromberg2 aponta o luto como um conjunto de reações a uma perda significativa e pon tua que nenhum é igual ao outro pois não existem relações significativas idênticas Engel apud Worden17 pontua que a perda de uma pessoa amada é psicologicamente traumática na mesma medida em que sofrer uma queimadura grave é fisiologicamente traumático Ele refere que o luto representa uma saída do estado de saúde e bemestar e assim como a cura é necessária no campo fisiológico um período de tempo é necessário para que o enlutado retorne ao estado similar de equilíbrio Worden17 lista categorias no processo de luto normal dividindoas em sentimentos tristeza raiva culpa ansiedade solidão fadiga desamparo choque anseio emancipação alívio e estarrecimento sensações físicas vazio no estômago aperto no peito nó na garganta hiper sensibilidade ao barulho sensação de despersonalização falta de ar respiração curta fraqueza muscular falta de energia e boca seca cognições descrença confusão preocupação sensação de presença e alucinações comportamentos distúrbios de sono distúrbios do apetite comportamento aé reo isolamento social sonhos com a pessoa que morreu evitar lembranças do falecido procurar e chamar pela pessoa suspiros hiperatividade choro visitar lugares e carregar objetos que lembrem o falecido 324 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Seguindo a linha de sintomas físicos e psíquicos vale destacar a necessidade de cau tela quanto ao diagnóstico de depressão da pessoa enlutada Tristeza não é depressão Depressão reativa é esperada mas a intensidade e a duração se exacerbadas podem indicar patologia A medicação pode inibir ou adiar reações necessárias para a resolução do processo de luto Para fins didáticos apresentamos as fases do luto descritas por Bromberg2 uma vez que o conhecimento dessas fases fornece bases para lidar produtivamente com os recursos disponíveis respeitando as defesas necessárias a cada uma das fases É fundamental res saltar que as fases não ocorrem de maneira rígida e não constituem regra necessária no processo de luto uma vez que existem a individualidade e a subjetividade do enlutado entorpecimento reação inicial à perda por morte em que ocorre choque entor pecimento e descrença A duração pode ser de poucas horas ou de muitos dias A pessoa recentemente enlutada se sente aturdida atordoada desamparada imobilizada e perdida Há também possíveis evidências de sintomas somáticos como respiração curta e suspi rante rigidez no pescoço e sensação de vazio no estômago A negação inicial da perda pode ser uma forma de defesa contra um evento de tão difícil aceitação estando também presente nessa fase a tentativa de automaticamente continuar vivendo como antes anseio e protesto fase de emoções fortes com muito sofrimento psicológico e agitação física À medida que se desenvolve a consciência da perda há muito anseio de reencontrar a pessoa morta com crises de profunda dor e espasmos incontroláveis de choro Apesar da consciência da perda irreversível o desejo de recuperar a pessoa às vezes é insuperável Há momentos em que o indivíduo tem a viva sensação da presença do falecido Aquilo que não tem relação com o morto tem pouco significado A pessoa se mostra afastada e introvertida Também é comum que o enlutado sinta muita raiva às vezes dirigida contra si mesmo na forma de acusações com sentimentos de culpa por pequenas omissões e cuidados que possam ter acontecido Às vezes a culpa é dirigida contra outras pessoas principalmente aquelas que oferecerem ajuda e consolo ao enlu tado que também pode dirigir a raiva ao próprio morto por têlo abandonado A pessoa enlutada vivencia inquietude como em busca do morto principal característica dessa fase e mostrase obsessivamente preocupada com lembranças pensamentos e objetos do falecido Ocorrem também sentimentos contrários ou incompatíveis como esperança e desapontamento desespero nessa fase o enlutado deixa de procurar pela pessoa perdida e reco nhece a imutabilidade da perda O enlutado duvida de que qualquer coisa que valha a pena na vida possa ser preservada assim podem surgir apatia e depressão O processo de superação é lento e doloroso É comum que ocorram afastamento das pessoas e das atividades falta de interesse e inabilidade para se concentrar em funções rotineiras ou para iniciar atividades Os sintomas somáticos persistem incluindo falta de sono perdas de apetite peso e distúrbios gastrointestinais recuperação e restituição a depressão e a desesperança começam a se entrelaçar com frequência cada vez maior a sentimentos mais positivos e menos devastadores A pessoa enlutada pode aceitar as mudanças em si e na situação Vem daí uma nova iden tidade que lhe permite desistir da ideia de recuperar a pessoa morta Dáse o retorno da independência e da iniciativa Mesmo com o processo de recuperação ainda em anda mento é comum a volta de sintomas que haviam cedido particularmente em datas que ativam lembranças como dias de nascimento morte e casamento 325 A descrição das fases permite inclusive a identificação de alterações nãoadaptativas frente ao processo de luto ao que é chamado luto complicado sendo muito útil o enca minhamento ao profissional especializado para acompanhamentos médico e psicológico Vale ressaltar novamente que o luto é um processo individual e subjetivo e que não existe uma regra rígida quando pensamos nas fases e no enfrentamento do mesmo Elizabeth Kübler Ross14 descreve as fases de enfrentamento do luto como negação revol ta barganha depressão e aceitação mas nem todo processo de enlutamento e resolução do luto compõe todas as etapas que são válidas como um norte para os profissionais que assistem pacientes e familiares em situações de doença e morte Rando13 também é outro autor que dividide as fases do luto em reconhecer a perda reagir à separação expressividade emocional recordar e reexperienciar a pessoa perdidarelacionamento objetos fotos abandonar velhos apegoselaboração reajustar para se mover adaptativamente ao novo sem esquecer o velho reinvestir Worden17 refere que considerando o luto um processo é adequado observálo em termos de estágio embora nem todos os enlutados passem por estágios em série O autor reforça que há risco de ignorar o individual e pensar de maneira literal especialmente na interpretação de profissionais novatos Segundo Walsh16 o campo da saúde mental ainda prioriza a atenção individual nos processos de luto não valorizando o impacto da perda na família como um sistema intera cional No entanto entendese que para haver um prognóstico favorável ao enfrentamento individual é necessário que se levem em consideração os processos familiares que acompa nham os efeitos imediatos e a longo prazo da morte e as cadeias transgeracionais Walsh16 estudou os efeitos da morte de um membro da família e aponta como re sultados o aumento da vulnerabilidade à doença e a morte prematura de membros so breviventes Atenção a detalhes e comunicação Em Cuidados Paliativos a comunicação é um dos principais aspectos determinantes de sucesso ou insucesso na construção de vínculo e condução do caso A comunicação é vital no curso do processo da perda Embora existam particulari dades de cada núcleo familiar quanto a cultura crença valores modo de expressão de sentimentos e dúvidas é fato que a comunicação clara facilita a adaptação A comunicação deve seguir o pressuposto da verdade lenta e progressivamente su portável O tempo necessário para que essa comunicação seja suportável só pode ser de terminado a partir da vinculação empática e do conhecimento de alguns dados familiares e individuais A boa comunicação deve ter início desde o diagnóstico e ser clara em cada etapa do processo de doença e evolução para a morte Existem algumas variáveis que podem agir como facilitadores ou afetar adversamente nos processos de luto das famílias Franco5 descreve fatores que podem interferir signifi cativamente no processo de morte e luto 326 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP natureza e significados relacionados com a perda qualidade da relação que se finda papel que a pessoa à morte ocupa no sistema familiarsocial recursos de enfrentamento do enlutado experiências prévias com morte e perda fundamentos culturais e religiosos do enlutado idade do enlutado e da pessoa à morte questões nãoresolvidas entre a pessoa à morte e o enlutado percepção individual sobre o quanto foi realizado em vida perdas secundárias circunstâncias da terminalidade Todos esses fatores oferecem ao profissional possibilidades de compreensão da dinâ mica e relação do núcleo de cuidados e facilitam o estabelecimento do ritmo e tempo da comunicação Situações de crise tendem a exacerbar padrões de relacionamento tanto positivos quanto negativos Esse dado deve ser considerado pelo profissional O padrão de comunicação da família deve receber uma atenção especial por parte da avaliação da equipe de cuidados Comunicação bloqueada permeada de segredos mitos e tabus influencia na forma com que as informações circulam dentro do sistema familiar levando a malentendidos e interferindo muitas vezes no processo de elaboração da per da Quando o profissional não está atento a esses padrões de comunicação pode acabar fazendo alianças com familiares acobertando mentiras ou sustentando silêncios prejudi ciais Segundo Carter e McGoldrick3 os terapeutas como também as equipes de saúde devem ser modelos para as famílias informando de forma factual e clara considerações sobre a morte para que assim não haja má interpretação dos consulentes e se evite a transmissão de informações distorcidas a outros membros da família A proximidade com a morte mesmo que não seja anunciada pelo médico e pela equi pe muitas vezes é clara para o doente que chega mesmo a verbalizálo gerando senti mentos de desconforto tanto para a família como para a equipe Embora a eficiência da comunicação durante todo o processo de tratamento da doença até o desfecho da morte dependa da clareza com que informações e sentimentos são expressos não exime de sofrimento para quem ouve e sente que o fim está próximo A equipe de cuidados que acompanha a família também pode ajudála a seguir em frente esclarecendo possíveis reações normais de luto Não são raros os relatos de fami liares que dizem abertamente mas eu não tenho direito de estar sorrindo sendo que eu perdi a pessoa mais importante da minha vida Autorizar a família a seguir em frente por meio de uma conversa acolhedora e franca pode desmistificar possíveis inadequações em termos de comportamentos esperados diante do luto como culpa e autorreprovação Com relação às famílias com crianças pequenas é importante segundo Walsh16 auxiliálas a abordarem a questão da morte do familiar ao invés de manteremse os véus do segredo As informações deverão ser abordadas levando em consideração as aptidões cognitivas para compreensão do fenômeno da morte conforme a idade não as sobre carregando nem as superprotegendo Grupos de irmãos geralmente são negligenciados afetivamente quando os pais estão enlutados uma vez que não estão disponíveis em recursos internos para acolher as crianças Dessa forma é importante que o profissional de saúde auxilie a identificar quem é a rede de apoio com que a família poderá contar e aponte para os membros do sistema familiar a possibilidade de acionar a rede para dar 327 conta dos cuidados básicos como quem ficará com as crianças durante as providências de funeral por exemplo A dificuldade dos pais em acolher crianças e adolescentes sobreviventes pode de sencadear nestes culpa e persecutoriedade o que só amplifica sofrimento e conflitos de toda a família As intervenções terapêutica e educativa são necessárias no luto Idosos também costumam ser excluídos de alguns passos do processo da perda pois são subestimados pela representação de fragilidade do velho o que é bastante negativo e provoca a sensação de falta de lugar ser um peso e de que ele é quem devia ter morrido Intervenções junto ao enlutado Existem alguns princípios apontados por Worden17 referentes às tarefas que os mem bros da família vivenciam durante o processo de luto A primeira diz respeito à necessi dade de tornarse mais ciente de que a perda realmente ocorreu pois geralmente há a sensação de irrealidade e de que tudo permanece igual O segundo princípio consiste em auxiliar as pessoas que sobrevivem à morte a iden tificar e expressar seus sentimentos mais comuns nesse tipo de situação como raiva culpa ansiedade desamparo e tristeza A maior parte dos enlutados procura ajuda para eliminar esses sentimentos e de forma recorrente por meio de medicação o que não é absolutamente benéfico já que não soluciona a fonte do problema Para isso é importan te estimular os sobreviventes a falarem sobre os sentimentos evocados pela morte bem como descrevêla como aconteceu quem lhe contou o que sentiu onde estava quando ficou sabendo etc O papel do terapeuta consiste em ajudar as pessoas a entenderem seus sentimentos aceitálos e na maior parte das vezes desmistificar muitos deles uma vez que por meio da terapia podemos revisitar com o paciente várias cenas vividas e entender que não há culpados O terceiro princípio baseiase em ajudar o paciente a viver sem a pessoa falecida fa cilitando a sua habilidade em tomar decisões de forma independente Worden17 descreve como ajustarse a um ambiente onde está faltando a pessoa que faleceu Já o quarto princípio está relacionado com o fornecimento de tempo para o luto pois a família geralmente tem dificuldades em entender e aceitar essa necessidade e elucidá la facilita o processo de elaboração é como autorizar as famílias a se permitirem esperar o tempo necessário para que as coisas se encaixem no seu lugar Outro ponto importante é identificar para as famílias o comportamento dito normal do luto salvo que o curso do luto seja complicado uma vez que frente a uma perda importante principalmente de um filho muitas pessoas têm a sensação de que estão enlouquecendo ou vão enlouquecer Clarificar reações normais desse processo traz maior segurança e noção de realidade às famílias e pode ser tarefa de um aconselhamento de luto Ainda com relação ao quarto princípio Worden17 diz que a tarefa do profissional não é a de ajudar o enlutado a desistir de sua relação com a pessoa que faleceu mas a de ajudálo a encontrar um local adequado para o falecido em sua vida emocional Ao longo de tarefas estratégias e recursos como linguagem evocativa utilização de simbolismos e analogias escrita desenho encenação reestruturação cognitiva evocação de memórias e imaginação dirigida podem ser utilizados seguidos por resultados bastante positivos 328 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Outras intervenções relevantes no pósmorte Com relação aos procedimentos pósmorte é interessante que a equipe de cuidados possa encorajar a família a planejar e participar de rituais memoriais funerais visitas ao túmulo etc O ritual funerário de acordo com Walsh e McGoldrick15 tem o objetivo de colocar o ente querido em contato íntimo com os familiares e amigos sobreviventes oferecendo possibilidades de despedida e de encerramento da relação para que possam então seguir em frente com suas vidas O objetivo do funeral é atingido quando ele pos sibilita que as pessoas envolvidas na perda estejam no melhor contato funcional possível umas com as outras e com o fato da morte A intervenção da equipe de saúde responsável pelos cuidados pósmorte com a família sobrevivente poderá ser um telefonema de condolências aproveitando para oferecer um momento de acolhida podendo ser dentro ou fora do ambiente hospitalar Para as famílias esse é um momento que favorece o fechamento de um ciclo com posto muitas vezes por desgaste de energia psíquica e de longo tempo de suas vidas carecendo de um ritual de passagem para o retorno à vida social O envio de uma carta de condolências em torno de 15 dias após a morte também costuma ser bem recebido pelos familiares As equipes de saúde que trabalham amparadas na filosofia dos Cuidados Paliativos têm a possibilidade de encerrar suas intervenções no acompanhamento do processo de luto de familiares tanto em atendimento individual como em grupo sempre que possí vel e necessário O tempo de duração da prestação desses serviços é variável e está in timamente relacionado com a disponibilidade da equipe em conjunção com a demanda do enlutado Poderão ser feitos encaminhamentos para serviços especializados quando não for possível o acompanhamento a longo prazo Os objetivos específicos do trabalho do profissional no processo de luto familiar são correspondentes às quatro tarefas descritas por Worden17 aumentar a realidade da perda ajudar a pessoa a lidar com afetos manifestos e latentes ajudar a pessoa a su perar obstáculos para se reajustar depois da morte e encorajar a pessoa a dizer adeus adequado e sentir conforto ao reinvestir novamente na vida Um fator que auxilia os profissionais de saúde a manejar com a dor das famílias é reconhecer a importância da espiritualidade para a manutenção da saúde mental em momentos de intensa dor Conforme Walsh16 a capacidade de fundamentarse dentro do sistema de crenças espirituais da família proporciona significado consolo e conforto podendo promover a aceitação tão necessária nessa fase do ciclo vital Se gundo Franco6 a fé é um instrumento importante para o restabelecimento daquele que enfrenta o processo do luto pois traz a possibilidade de aproximação com o sagrado confortando e atenuando os sentimentos de desamparo Diante desse aspecto é relevante que o profissional esteja atento à existência de alguma religiosidade na família incentivando a busca de amparo nessas crenças que antes da perda eram fonte de acalento caso a pessoa verbalize tal importância Também poderá caber aos profissionais de saúde incentivar o engajamento da pessoa enlutada e do sistema familiar em redes potencialmente sustentadoras que segundo Walsh16 podem ser grupos religiosos sociais e comunitários A falta de conexões comunitárias torna a dor mais difícil de suportar e dentro da própria co munidade pode haver pessoas passando pelo mesmo pesar do processo de luto 329 Frente a tudo isso o papel mais importante do profissional de saúde é a estimulação das competências familiares para que o próprio sistema familiar seja capaz de promover a reestruturação tanto individual como familiar Assim a família poderá lançar mão de recursos próprios para enfrentar do processo do luto não sendo necessária a intervenção sistemática Quando os desafios são identificados e trabalhados de forma adequada tendem a promover adaptação imediata e também a longo prazo dos membros da família tendo como resultado o fortalecimento desse grupo como uma unidade funcional É necessário um investimento no compartilhamento da experiência da morte e posteriormente em uma reorganização da sistemática familiar sem a pessoa que morreu para que se possa pensar em reinvestimentos em outros relacionamentos e em outras realizações na vida Kovacs7 acrescenta que o luto mal elaborado está se tornando um problema de saúde pública É grande o número de pessoas doentes em função da excessiva carga de sofri mento sem possibilidade de elaboração fenômeno que também acomete os profissionais de saúde que são cuidadores do sofrimento alheio não tendo muitas vezes espaço para cuidar de sua própria dor Também está em risco o profissional de saúde que não reconhe ce seu limite ao lidar com as perdas no ambiente de trabalho e na vida pessoal tampouco busca uma rede de apoio para lidar com suas perdas tanto reais como simbólicas e tem grandes chances de adoecer tanto psíquica como fisicamente Finalizando O que se observa é que o ser humano não é preparado para a finitude Fomos introdu zidos ao universo da celebração dos nascimentos mas não da morte Os rituais de perda e morte da cultura ocidental elucidam o quanto é sofrida a vivência da morte A morte do outro nos impõe o confronto com nossa vida e nossa própria morte e isso gera descon forto ansiedade e sofrimento Somos forçados a olhar atentamente para a qualidade da nossa vida e de nossas relações uma vez que a morte é a fase final do ciclo vital Os Cuidados Paliativos representam nesse sentido o resgate do valioso cuidar abrin do espaço para o viver e o morrer com paciente e familiares considerados agentes ativos no processo junto à equipe de saúde Nesse cenário é possível legitimar os desafios ine rentes à fase final de vida à morte e ao luto Sendo o luto a última etapa da intervenção da equipe surge a dúvida a respeito de quando ele termina Não há resposta pronta Parkes11 diz que o processo de luto está terminado quando uma pessoa completa a fase final do luto de restituição em que uma pessoa pode reinvestir suas emoções na vida e no viver Worden17 explica que o luto está terminado quando suas respectivas tarefas são completadas Completa ainda com o fato de que uma pessoa ao ser capaz de pensar em quem faleceu sem dor está dando um sinal de reação de luto terminado Existe sempre uma sensação de tristeza quando se pensa em alguém que se amou e se perdeu mas é um tipo diferente de tristeza sem a presença de manifestações físicas como o choro intenso O recolhimento é um movimento essencial para a reorganização dos sentimentos que se confundem diante de uma perda significativa É necessário um tempo para organizar um espaço para a dor como também outros espaços para significar e resignificar essa perda Reflexões sobre que parte do enlutado foi ferida e perdida junto com a pessoa que 330 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP morreu e sobre os caminhos possíveis de trilhar sem a pessoa amada revelam que a morte gera uma crise nos sistemas individual e familiar sendo necessária uma reorganização Não existe amor sem perda E não existe a superação da perda sem alguma experiên cia de luto Não ser capaz de vivenciála é ser incapaz de entrar no grande ciclo da vida humana de morte e renascimento ser incapaz isto é de viver novamente Referências 1 BOSS P A perda ambígua In WALSH MCGOLDRICK Morte na família sobrevivendo às perdas Porto Alegre Artmed 1998 2 BROMBERG M H P F A psicoterapia em situações de perdas e luto Campinas Editorial Psy II 2000 3 CARTER B MCGOLDRICK M As mudanças no ciclo de vida familiar uma estrutura para a terapia familiar Tradução de M A V Veronese 2 ed Porto Alegre Artes Médicas 1995 4 FONSECA J P Luto antecipatório Campinas Editora Livro Pleno 2004 5 FRANCO M H P Luto em cuidados paliativos In Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 6 FRANCO M H P Nada sobre mim sem mim estudos sobre a vida e morte Campinas Editora Livro Pleno 2005 7 KOVACS M J Educação para a morte temas e reflexões São Paulo FAPESP e Casa do Psicólogo 2003 8 KOVACS M J Morte e desenvolvimento humano São Paulo Casa do Psicólogo 1992 9 LINDER Morte na família sobrevivendo às perdas Tradução de C O Dornelles In WALSH F MCGOLDRICK M Porto Alegre Artes Médicas 1998 10 LINDERMANN E Symptomatology and management of acute grief American Journal of Psychiatry 1944 11 PARKES C M Luto estudos sobre a perda na vida adulta São Paulo Summus 1998 12 RANDO Luto em cuidados paliativos In FRANCO M H P Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 13 RANDO T A Treatment of complicated mourning Illinois Research Press 1993 14 ROSS E K Sobre a morte e o morrer 8 ed São Paulo Martins Fontes 2005 15 WALSH F MCGOLDRICK M Morte na família sobrevivendo às perdas C O Dornelles Trans Porto Alegre Artes Médicas 1998 16 WALSH F Fortalecendo a resiliência familiar São Paulo Roca 2005 17 WORDEN W W Terapia do luto um manual para o profissional de saúde mental 2 ed Porto Alegre Artes Médicas 1998 331 Anexo Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico Alteração de sonovigília insônia ocorre em 29 a 59 dos casos de câncer avançado Dor noturna Depressãoansie dade Maior inatividade durante o dia Cochiladas diurnas Efeito colateral de medicações Álcool e cafeína Técnicas de relaxa mento Ouvir os medos do paciente Diminuir as cochila das diurnas Incentivar exer cícios e atividades moderadas durante o dia Evitar álcool e cafeína Tratar eficazmente a dor Benzodiazepínicos lorazepam 12 mg 1 2xdia ou midazolam 1530 mg Clorpromazina em doses baixas Levomepromazina 46 gotasnoite Rever horário e administração de esteroides Se delírio associado haldol 255 mg noite Anorexia caquexia tratamento polêmico Progressão da doença Alteração do paladar Vômitos Dor intensa dispneia ou depressão Boca seca Dieta fracionada em pequenas quantidades várias vezes ao dia Dietas coloridas com levantamento prévio do antigo cardápio alimentar anamnese alimentar Se indicada dieta por SNE em posição gástrica ou gastrostomia Esteroides prednisona 515 mg dia ou dexametasona 24 mg de 88 h Megestrol 1601600 mgdia Suplementação vitamínica Antidepressivos tricíclicos ISRS etc sn dose usual Uso experimental ômega 3 canabinoides pentoxifilina GH talidomida 332 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Astenia Progressão da doença Anemia Dor Depressão Insônia Infecções crônicas e agudas Má absorção Apoio emocional Conservar energia Períodos de descanso mais frequentes Se indicado uso de equipamentos como andador e cadeira de rodas Tratar as causas específicas Transfusão sanguínea para conforto conforme o caso Considerar uso de estimulantes do SNC metilfenidato Ritalina 520 mgdia Boca seca Efeito colateral de medicação Desidratação Respirar de boca aberta Candidíase oral Vômitos anorexia Depressão ansiedade Oferecer frequentes goles de água ou outro líquido Umedecer os lábios Oferecer líquidos cítricos e gelados sucos gelatina iogurte Oferecer pedacinhos de gelo Rever medicação anticolinérgica hioscina morfina atropina amitriptilina e diuréticos Saliva artificial se disponível Tratar candidíase nistatina oral fluconazol se for o caso Broncorreia hipersecreção Hipersecreção pela doença de base DPOC ICC anasarca Incapacidade de tossir ou deglutir secreção Posicionamento em decúbito lateral Estado de hipo hidratação Se indicada aspiração de vias aéreas com sonda Tratar infecção se presente ou se indicado Diuréticos para diminuir edemas Drogas anticolinérgicas ver em sororoca Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 333 Confusão mental demência ou delírio Encefalopatia metástases cerebrais Causas metabólicas desidratação e distúrbios eletrolíticos Efeito colateral de drogas anticolinérgicas e da morfina Manter o paciente num ambiente seguro e familiar Remover objetos perigosos Usar frases simples Diminuir sons televisão rádio Medicação deve ser supervisionada Corrigir os distúrbios hidroeletrolíticos rever medicações Tranquilizante diazepam 255 mg 12xdia ou midazolam 15 mgnoite Haloperidol 510 mg25 mg no idoso se paranoia ou dificuldade em dormir à noite Convulsões 10 dos pacientes na fase terminal podem apresentar convulsões Hipertensão intracraniana Tumor ou metástase em SNC Pósneurocirurgia Distúrbios hidroeletrolíticos Na Ca Mg glicose Abstinência de anticonvulsivantes Explicar em linguagem simples o que é convulsão e suas causas Exame neurológico e FO Se tumor dexametasona 4 mg de 66 h Corrigir distúrbios hidroeletrolíticos Drogas benzodiazepínicos anticonvulsivantes doses habituais Manter anticonvulsivantes VR ou midazolam 510 mg SC ou fenobarbital SC deve ser diluído 110 Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 334 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Constipação Inatividade fraqueza Menor ingestão alimentar e de líquidos Obstrução intestinal pelo tumor Hipercalcemia Confusão mental e depressão Efeito colateral de medicações Encorajar atividade física se possível Oferecer mais água Dieta rica em fibras Chá de sene Movimentar os membros inferiores Realizar massagem abdominal no sentido horário Rever medicação codeína dose morfina antidepressivos tricíclicos Óleo mineral 1 medida 2xdia Bisacodil 510 mg até 2xdia Lactulose 10 ml 2xdia máximo de 30 ml 3xdia Outros laxativos orais Enteroclismas sn Delírio mais de 40 dos pacientes apresentarão confusão mental ou delírio na fase final de vida Fase terminal da doença Alterações do nível de consciência Encefalopatia metabólica Distúrbios hidroeletrolíticos Na Ca glicose Infecção Efeito colateral da morfina Suportes emocional e psicológico Presença de familiares Presença de calendário e relógio Ambiente tranquilo Música suave Corrigir os distúrbios hidroeletrolíticos se cabível Neurolépticos em geral olanzapina risperidona e quetiapina Haloperidol é a droga de escolha 510 mg25 mg no idoso até de 88 h Benzodiazepínicos midazolam 15 mgnoite lorazepam 12 mgdia diazepam 255 mg 12xdia Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 335 Depressão Percepção da fase terminal da doença Sensação de inutilidade Sofrimento contínuo Dor não adequadamente controlada Suportes emocional e psicológico Presença de familiares Seguimento com psicologiapsiquiatria Antidepressivos várias classes doses usuais e crescentes Diarreia Medicação laxativa em excesso Abstinência de opioides Antibióticos antiácidos Infusão rápida da dieta por SNE Gastroparesia DM hipertireoidismo doença inflamatória intestinal etc Aumentar a ingestão de líquidos água reidratantes orais energéticos esportivos oferecer líquidos em pequenas porções várias vezes ao dia Manter dieta porém SEM fibras Infundir dieta por SNE mais lentamente Rever medicação opioide Drogas constipantes se não for diarreia infecciosa como codeína 1030 mg 66 h VO ou loperamida 4 mg VO dose única Antiespasmódicos sn Disfunção urinária a prioridade é melhorar o desconforto da retenção urinária Progressão da doença Alterações do nível de consciência Efeito colateral de medicações Dispositivo urinário nãoinvasivo Uripen bolsa coletora ou garrafa plástica homens Uso de comadre mulheres Uso de fraldas descartáveis Prevenção de dermatite Se incontinência introduzir sn anticolinérgicos antidepressivos tricíclicos Se retenção rever medicação constipante codeína morfina antidepressivos tricíclicos Antibióticos se infecção de trato urinário Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 336 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Dispneia causas multifatoriais avaliar sempre a causa base Linfangite carcinomatosa metástases pulmonares Ansiedade ou pânico Progressão da doença pulmonar de base Infecção pulmonar Derrame pericárdico com tamponamento Acidose metabólica com falência de múltiplos órgãos Atmosfera muito seca Derrame pleural Anemia Reposicionar o paciente na cama ou cadeira Elevar o decúbito Abrir janelas Ventilar o paciente Oferecer água Fazer exercícios respiratórios Oxigênio suplementar CPAP O2 contínuo Corticoides nas linfangites compressões tumorais Broncodilatadores sn Se hipersecreção hioscina 10 mg VO 88 h Se tosse seca codeína 510 mg 66 h Se indicada toracocentese de alívio Morfina iniciar com 255 mg 44 h VO ou 2 mg 44 SC Sedação paliativa se dispneia incontrolável midazolam associado a morfina como primeira opção Mioclonias Efeito colateral de medicações metoclopramida opioides dose alta neurolépticos Abstinência de álcool benzodiazepínicos barbitúricos anticonvulsivantes Por hipóxia do SNC Explicar em linguagem simples o que é mioclonia e suas causas Rever medicações Rever dose de opioides Sedar com midazolam 510 mg SC de hora em hora até cessarem as mioclonias depois 2030 mgdia Alternativas diazepam 1020 mg VR de hora em hora Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 337 Náuseas e vômitos não administrar gastrocinéticos se vômitos por obstrução TGI Obstrução intestinal Dismotilidade gástrica Efeito colateral de medicações Efeitos da QT Distúrbios metabólicos hipercalcemia uremia infecção Dieta fracionada e em pequenas porções Alimentos e líquidos frios e azedos gelatina sorvetes sorbets pedaços de gelo musses Técnicas de relaxamento Higiene oral pré e pósprandial Antieméticos metoclopramida 1030 mg 8844 h ou dramamine Outras drogas haloperidol 12 mgdia clorpromazina 2550 mg a cada 612 h diazepam 5 mg Ondansetrona 48 mg de 88 h se pósQT Via de administração SC preferencial ou supositórios Prurido Pele seca Alergia Dermatites Infecção fúngica ou escabiose Hidratação da pele óleo com ácido graxo essencial girassol ou canola Banho água não muito quente Checar medicação alimentos Tratar dermatites Antihistamínicos corticoides sn Tratar infecção fungoparasita Ronco da morte sororoca em inglês death rattle Ocorre em 25 a 92 na fase final de vida Secreção acumulada na garganta por não conseguir deglutir geralmente paciente já inconsciente ou quase inconsciente Explicar o significado do ruído à famíliacuidador Eventualmente aspiração de VAS procedimento que pode impressionar muito Hioscina homatropina ou escopolamina 30 gotas na boca até de 66 h ou 1 ampola de Buscopan SC de 66 ou até de 44 h Atropina colírio a 1 VO 23 gotas 13 mg a cada 68 h cuidado com taquicardia Se disponível adesivo de escopolamina Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 338 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Soluços checar a causa Dispepsia Tumor ou metástase do SNC Irritação do nervo vagofrênico Efeito colateral de medicações corticoides BCC anticonvulsivantes Dieta fracionada e líquidos frios Esfregar com gaze o céu da boca Xilocaína gel uma colher de sopa de açúcar diluído em um pouco de suco de limão ou laranja Checar medicação Se distensão abdominal dimeticona 3060 gotas na boca Tratar dispepsia Metoclopramida 1020 mg VO ou SC 3 a 4xdia ou haloperidol 125 mg 13xdia Baclofeno 10 mg VO a cada 812 h Sudorese checar a causa Febre infecção Por tumor geralmente associado a linfoma de Hodgkins tumores malignos eou metástase hepática Distúrbio hormonal Medicações Suspensão abrupta de opioides Secar sudorese com tecido absorvente Diminuir a temperatura do ambiente Propiciar fluxo de ar no ambiente Evitar alimentos quentes eou picantes Tratar a causa da febre infecção Descontinuar antipiréticos Diminuir sudorese paraneoplásica naproxeno 250375 mg 2xdia cimetidina 400800 mg 23xdia propranolol 1020 mg 23xdia olanzapina 5 mgdia estudos com talidomida 100 mgnoite Trocar antidepressivos por venfalaxina 37575 mgdia VO Considerar rodízio de opioides Autoria da Dra Celia Maria Kira SNE sonda nasoenteral GH hormônio de crescimento SNC sistema nervoso central DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica ICC insuficiência cardíaca congestiva FO fundo de olho TGI trato gastrointestinal VR via retal SC subcutâneo DM diabetes mellitus VO via oral CPAP sistema de pressão positiva contínua das vias aéreas QT quimioterapia sn se necessário VAS vias aéreas superiores BCC bloqueador do canal de cálcio Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico Referências 1 DOYLE D et al Oxford textbook of palliative medicine 3 ed 2005 2 GUIA FARMACOGERIÁTRICA Disponível em httpwwwsemeresdocsFarmacogeriatricapdf 3 INCA Cuidados paliativos oncológicos controle de sintomas Disponível em httpwwwincagov brrbcn48v02pdfcondutas3pdf 4 SYMPTOMS AND SYMPTOMS MANAGEMENT FORUM IN ENCICLOPEDIA OF DEATH AND DYING SYVI Disponível em httpwwwdeathreferencecomSySiSymptomsandSymptomManagementhtml 5 WHO Paliative care symptom management and endoflife care 2004 Disponível em httpwww whoint3by5publicationsdocumentsengenericpalliativecare082004pdf
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M251 Manual de cuidados paliativos Academia Nacional de Cuidados Paliativos Rio de Janeiro Diagraphic 2009 320p Inclui bibliografia ISBN 9788589718271 1 Tratamento paliativo I Academia Nacional de Cuidados Paliativos 094985 CDD 616029 CDU 616085 180909 230909 015273 CIPBRASIL CATALOGAÇÃONAFONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS RJ Diagraphic Rio de Janeiro 2009 Diretor Newton Marins Gerente Editorial Verônica Cobas Coordenadora editorial Jane Castelo Revisora chefe Claudia Gouvêa Revisão Danielle Ribeiro e Marcela Lima Programação visual Katia Bonfadini Toda correspondência deve ser dirigida a Av Paulo de Frontin 707 CEP 20261241 Rio de JaneiroRJ telefax 21 25027405 email editoradiagraphiccombr site wwwdiagraphiccombr AS MATÉRIAS ASSINADAS BEM COMO SUAS RESPECTIVAS FOTOS DE CONTEÚDO CIENTÍFICO SÃO DE RESPONSABILIDADE DOS AUTORES NÃO REFLETINDO NECESSARIAMENTE A POSIÇÃO DA EDITORA DISTRIBUIÇÃO EXCLUSIVA À CLASSE MÉDICA Reprodução e distribuição proibidas Título Manual de Cuidados Paliativos 1ª edição DIA GRA PHIC E D I T O R A Edição e produção Agradecimentos A Academia Nacional de Cuidados Paliativos ANCP representada por sua diretoria orgulhase e agradece a todos os colegas paliativistas do Brasil que sem medir esforços contribuíram direta ou indiretamente para a rea lização de mais este trabalho O esforço coletivo é e sempre será a nossa mais profunda marca Entretanto alguém dedicou muitas horas a mais a este trabalho nosso editor Ricardo Tavares de Carvalho secretáriogeral da ANCP Ele realizou a leitura criteriosa de todos os textos cobrou pontualidade estimulou colegas sugeriu formas de tornar os trabalhos mais bem compreendidos e tentou dar ao Manual a seriedade e o rigor científico que me rece um texto assinado pela nossa entidade Nosso agradecimento e respeito ao colega Carla D Bartz assessora de comunicação da ANCP também foi fundamental para a realização deste trabalho fazendoo com os mesmos zelo e presteza com que cuida dos assuntos da Academia O Sr Jackson Morishita da Farmacêutica Wyeth e a Diagraphic Editora mostraramse bons e fiéis parceiros em todos os momentos A todos os nossos mais profundos respeito e gratidão 6 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP O Manual de Cuidados Paliativos ANCP é uma publicação da Academia Nacional de Cuidados Paliativos Editor e secretário nacional da ANCP Dr Ricardo Tavares de Carvalho Editora assistente e coordenadora de comunicação da ANCP Carla Dórea Bartz Diretoria da ANCP Gestão 20092010 Presidente Dra Sílvia Maria de Macedo Barbosa SP Vicepresidente Dr Roberto Bettega PR Secretário nacional Dr Ricardo Tavares de Carvalho SP Tesoureira Dr Dalva Yukie Matsumoto SP Coordenação científica Dra Maria Goretti Sales Maciel SP Conselho Consultivo Dra Claudia Burlá RJ Dra Maria Goretti Sales Maciel SP Capítulo Gaúcho da ANCP Dra Julieta Fripp RS Capítulo Paranaense da ANCP Dr Luís Fernando Rodrigues PR Comissão de Psicologia Debora Genezini SP Comissão de Terapia Ocupacional Marília Othero SP Mais informações Site wwwpaliativoorgbr Blog wwwcuidadospaliativoswordpresscom Twitter wwwtwittercomancpaliativos Orkut ANCP Cuidados Paliativos TV ANCP wwwyoutubecomtvancp email contatopaliativoorgbr Endereço Alameda dos Jurupis 410 Conj 184 Moema CEP 04088001 São PauloSP 7 Prefácio O Cuidado Paliativo sem dúvida é o exercício da arte do cuidar aliado ao conhecimento científico em que a associação da ciência à arte propor ciona o alívio do sofrimento relacionado com a doença Por ser parte fun damental da prática clínica pode ocorrer de forma paralela às terapias destinadas à cura e ao prolongamento da vida A evolução do conhecimento na área do Cuidado Paliativo é exponencial Não há dúvida de que ocorreu um grande progresso na ciência médica como um todo e como consequência temse uma sobrevida de pacientes com doenças crônicas e limitantes de vida cada vez maior Devemos ter em mente que nem sempre a sobrevivência implica qualidade de vida Por outro lado 50 dos pacientes diagnosticados com câncer no mun do desenvolvido morrerão da progressão da doença sendo essa trajetória normalmente acompanhada de grandes sofrimentos físico psíquico espiritual e social Devido à natureza complexa multidimensional e dinâmica da doença o Cuidado Pa liativo avança como um modelo terapêutico que endereça olhar e proposta terapêutica aos diversos sintomas responsáveis pelos sofrimentos físico psíquico espiritual e social responsáveis por diminuir a qualidade de vida do paciente Tratase de uma área em crescimento e cujo progresso compreende estratégias diversas que englobam bioética comunicação e natureza do sofrimento A necessidade desse cuidado independe da faixa etária pois é um tipo de cuidado universal que se amplia para o paciente e sua família Os Cuidados Paliativos devem focar a adequada avaliação e o manuseio dos sintomas físicos psíquicos sociais e espirituais do paciente e da sua família e estar presentes em todas as fases da trajetória da doença Neles há maior entendimento dos mecanismos das doenças e dos sintomas além das diversas opções terapêuticas para os sintomas físicos e psíquicos Neste manual tentamos fornecer atualização em alguns temas importantes no Cuida do Paliativo Vários assuntos são abordados como sintomas físicos psíquicos questões de comunicação o luto o papel da equipe a construção de um serviço entre tantos outros Somos afortunados pois os autores deste manual são pessoas que atuam na área e têm grande comprometimento com o tema e sua disseminação Esperamos que este manual alcance a meta de melhorar a qualidade de vida dos pa cientes e de suas famílias e ajude a encontrar o nível essencial do controle da doença a prevenção e o tratamento do sofrimento Boa leitura Sílvia Maria de Macedo Barbosa Presidente da Academia Nacional de Cuidados Paliativos 8 Índice Parte I Cuidados Paliativos conceito fundamentos e princípios 14 Indicações de Cuidados Paliativos 20 Avaliação do paciente em Cuidados Paliativos 37 Comunicação em Cuidados Paliativos 49 Modalidades de atuação e modelos de assistência em Cuidados Paliativos 58 Cuidado Paliativo em pediatria 63 Organização de serviços de Cuidados Paliativos 72 Parte II Controle da dor 86 Dispneia tosse e hipersecreção de vias aéreas 104 Náusea e vômito 117 Obstipação e diarreia 124 Fadiga sudorese e prurido 132 Controle de sintomas delirium 139 Ansiedade e depressão em Cuidados Paliativos como tratar 144 Parte III Caquexia e anorexia 154 Cuidados Paliativos nas demências 162 Obstrução intestinal maligna 168 Cuidados Paliativos em pacientes com HIVAIDS 174 Síndrome da veia cava superior 181 Síndrome de compressão medular 184 Parte IV Hipodermóclise um método alternativo para a administração de fluidos e medicamentos por via subcutânea 186 9 Procedimentos sustentadores de vida em Cuidados Paliativos uma questão técnica e bioética 195 Sedação paliativa 202 Parte V Papel do médico na equipe de Cuidados Paliativos 214 Papel do enfermeiro na equipe de Cuidados Paliativos 216 Papel do psicólogo na equipe de Cuidados Paliativos 218 Papel do assistente social na equipe de Cuidados Paliativos 221 Papel do farmacêutico clínico na equipe de Cuidados Paliativos 224 Papel da nutricionista na equipe de Cuidados Paliativos 227 Papel do fisioterapeuta na equipe de Cuidados Paliativos 230 Papel do fonoaudiólogo na equipe de Cuidados Paliativos 234 Papel do terapeuta ocupacional na equipe de Cuidados Paliativos 237 Papel do assistente espiritual na equipe de Cuidados Paliativos 239 Papel do dentista na equipe de Cuidados Paliativos 241 Parte VI Ação prática do profissional de Cuidados Paliativos no domicílio 245 Cuidados com feridas e curativos 258 Cuidado com ostomias 269 Higiene e conforto 274 Providências práticas para toda a família 283 Parte VII As últimas 48 horas de vida 290 Suporte a paciente e família na fase final da doença 299 Aspectos particulares e ritos de passagem nas diferentes religiões 309 Assistência ao luto 321 Parte VIII Controle de outros sintomas que não dor 331 10 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Autores AdriAnA ColombAni Pinto Fonoaudióloga coordenadora do Serviço de Fonoaudiologia do Hospital Santa Helena Alini mAriA orAthes Ponte silvA Médica de família e comunidade pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo membro do ambulatório de Geriatria e Gerontologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo HCFMUSP AnA CláudiA de limA QuintAnA ArAntes Geriatra presidente da Associação Casa do Cuidar coordenadora do Serviço de Cuidados Pa liativos do Hospital Israelita Albert Einstein HIAE AnAliCe de Assis CunhA Enfermeira atuando no Serviço de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo HSPESP e do Premier Residence Hospital AndréA Gislene do nAsCimento Nutricionista do Grupo de Dor e Cuidados Paliativos supervisora da Área de Educação Conti nuada da Divisão de Nutrição do Instituto da Criança ICR do HCFMUSP Ariel de FreitAs Quintão AmériCo Anestesiologista coordenadora da Clínica de Dor e Cuidados Paliativos dos hospitais Lifecenter e Mater Dei biAnCA Azoubel de AndrAde Fisioterapeuta do Instituto da Criança do HCFMUSP CéliA mAriA KirA Médica do Programa de Assistência Domiciliária do Hospital Universitário HU da USP CelisA tiemi nAKAGAwA serA Fisioterapeuta doutora em Neurociências e Comportamento pelo Instituto de Psicologia da USP docente do Departamento de Fisioterapia Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da FMUSP ClAudiA burlá Geriatra membro da Câmara Técnica sobre a Terminalidade da Vida e Cuidados Paliativos do Conselho Federal de Medicina CFM diretora de Defesa Profissional da Sociedade Brasi leira de Geriatria e Gerontologia SBGG secretária geral e vicepresidente da International Association of Gerontology and Geriatrics IAGG CristhiAne s Pinto Médica especialista em Cuidados Paliativos pelo Instutito Nacional de Câncer INCA atual chefe do ambulatório interdisciplinar do Hospital do Câncer IV do INCA HC IV 11 dAlvA YuKie mAtsumoto Oncologista coordenadora da Hospedaria de Cuidados Paliativos do HSPMSP diretora do Hospital Premier do Instituto Paliar e da ANCP dAniel limA Azevedo Geriatra do Hospital de Aeronáutica dos Afonsos HAAF especialista pela SBGG deborA Genezini Coordenadora do Serviço de Psicologia do Hospital Premier especialista em Psicologia Hospita lar mestranda em Gerontologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP elenY vAssão de PAulA AitKen Capelã titular membro da equipe multidisciplinar de Cuidados Paliativos do Hospital Emílio Ribas e do HSPESP eliete FAriAs Azevedo Enfermeira oncologista da Unidade de Cuidados Paliativos do INCAHC IV elisA mirAndA Aires Infectologista especialista em dor e Cuidados Paliativos pela Santa Casa de São Paulo cola boradora da equipe de Cuidados Paliativos do Hospital Emílio Ribas FláviA Firmino Enfermeira oncologista especializada em Cuidados Paliativos pelo INCA docente da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade do Rio de Janeiro EEAPUNIRIO membro da Asso ciação LatinoAmericana de Cuidados Paliativos ALCP membro da International Association for Hospice and Palliative Care IAHPC henriQue A PArsons Médico fellow dos Departamentos de Cuidados Paliativos e Medicina de Reabilitação e Terapêutica de Investigação do Câncer do MD Anderson Cancer Center da Universidade do Texas ivAnYse PereirA Enfermeira do HUUSP especializada em atendimento domiciliar pela USP ivone biAnChini de oliveirA Assistente social do Núcleo de Assistência Domiciliar Interdisciplinar NADI do HCFMUSP José tAdeu tesseroli de siQueirA Cirurgiãodentista supervisor da Equipe de Dor Orofacial da Divisão de Odontologia do HCFMUSP JulietA CArriConde FriPP Médica coordenadora do Programa de Internação Domiciliar Interdisciplinar PIDI para pa cientes oncológicos da Universidade Federal de Pelotas UFPeL leonArdo de oliveirA Cosolin Médico coordenador do Serviço de Cuidados Paliativos do Hospital do Câncer de Barretos 12 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP letíCiA AndrAde Doutora em Serviço Social atuando na Divisão de Serviço Social no Ambulatório de Cuida dos Paliativos e no NADI do HCFMUSP luAnA visCArdi nunes Psicóloga da equipe de Cuidados Paliativos do HSPESP especializada em Psicanálise pelo Instituto Sedes Sapientiae luCiAnA reGinA bertini CAbrAl Geriatra membro do Programa de Cuidados Paliativos do Serviço de Clínica Médica do Insti tuto do Câncer do Estado de São Paulo ICESP luis Alberto sAPoretti Geriatra do Serviço de Geriatria do HCFMUSP coordenador do Programa de Cuidados Paliati vos em Geriatria do Serviço de Geriatria do HCFMUSP luís FernAndo rodriGues Médico coordenador da equipe de Cuidados Paliativos do Hospital do Câncer de Londrina e do Sistema de Internação Domiciliar da Secretaria Municipal da Saúde de Londrina mAriA Goretti sAles mACiel Médica coordenadora do Serviço de Cuidados Paliativos do HSPESP diretora da ANCP do Hospital Premier e do Instituto Paliar membro da Câmara Técnica sobre Terminalidade da Vida e Cuidados Paliativos do CFM mAriA FernAndA bArbosA Farmacêutica da Unidade de Cuidados Paliativos do INCAHC IV especialista em Farmácia Hospitalar em Oncologia pelo INCA mAriA JúliA PAes dA silvA Professora titular da Escola de Enfermagem EE da USP diretora do Departamento de Enfer magem do HUUSP líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Comunicação Interpessoal do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPQ mAriliA bense othero Terapeuta ocupacional coordenadora do setor de Terapia Ocupacional TO do Hospital Pre mier e da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia ABRALE especialista em Saúde Co letiva pela FMUSP mirlAne GuimArães de melo CArdoso Anestesiologista professora da Universidade Federal de Alagoas UFA responsável pelo Serviço de Terapia de Dor e Cuidados Paliativos da Fundação Centro de Oncologia do Amazonas FCECON môniCA CeCíliA boChetti mAnnA Médica da equipe de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Prof Edmundo Vasconcelos e da Hospedaria de Cuidados Paliativos do HSPMSP 13 môniCA mArtins trovo de ArAúJo Enfermeira doutoranda pela EEUSP membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Comunica ção Interpessoal do CNPQ renAto rodriGues CAmArão Enfermeiro da Unidade de Cuidados Paliativos do Hospital de Apoio de Brasília membro do Programa Cuidar Sempre do Distrito Federal riCArdo tAvAres de CArvAlho Cardiologista coordenador do Grupo de Cuidados Paliativos do HCFMUSP diretor do Hospital Premier do Instituto Paliar e da ANCP ritA de CássiA dewAY GuimArães Médica diretora do Núcleo Assistencial para Pessoas com Câncer paliativista da assistência multidisciplinar em Oncologia roberto t C betteGA Médico vicepresidente da ANCP coordenador do Serviço de Cuidados Paliativos e Alívio da Dor do Núcleo de Estudos Oncológicos do Paraná sAmirA AlenCAr YAsuKAwA Fisioterapeuta do ICR do HCFMUSP especializada em Cuidados Paliativos pelo Instituto Pallium silviA mAriA de mACedo bArbosA Médica presidente da ANCP coordenadora do Serviço de Cuidados Paliativos do Instituto da Criança da FMUSP solAnGe A Petilo de CArvAlho briColA Farmacêutica clínica do Serviço de Clínica Geral do NADI e do Ambulatório de Cuidados Pa liativos do HCFMUSP sumAtrA melo dA CostA PereirA JAles Cirurgiãdentista pósgraduada em Odontologia Hospitalar pelo HCFMUSP toshio ChibA Geriatra membro do Programa de Cuidados Paliativos do Serviço de Clínica Médica do ICESP verusKA meneGAtti AnAstáCio hAtAnAKA Médica assistente do Serviço de Clínica Médica do ICESP 14 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Cuidados Paliativos conceito fundamentos e princípios dAlvA YuKie mAtsumoto Introdução Nas últimas décadas assistimos ao envelhecimento progressivo da população assim como ao aumento da prevalência de câncer e outras doenças crônicas5 Em contraparti da o avanço tecnológico alcançado principalmente a partir da segunda metade do século XX associado ao desenvolvimento da terapêutica fez com que muitas doenças mortais se transformassem em crônicas levando à longevidade de seus portadores No entanto apesar dos esforços dos pesquisadores e do conhecimento acumulado a morte continua sendo uma certeza e ameaça o ideal de cura e preservação da vida para o qual nós pro fissionais da saúde somos treinados Os pacientes fora de possibilidade de cura acumulamse nos hospitais recebendo in variavelmente assistência inadequada quase sempre focada na tentativa de recuperação utilizando métodos invasivos e alta tecnologia Essas abordagens ora insuficientes ora exageradas e desnecessárias quase sempre ignoram o sofrimento e são incapazes por falta de conhecimento adequado de tratar os sintomas mais prevalentes sendo a dor o principal e mais dramático Não se trata de cultivar uma postura contrária à medicina tecnológica mas questionar a tecnolatria6 e refletir sobre a nossa conduta diante da mortalidade humana tentando o equilíbrio necessário entre conhecimento científico e humanismo para resgatar a dignidade da vida e a possibilidade de se morrer em paz Cada vez mais encontramos em nossos serviços pacientes idosos portadores de sín dromes demenciais de variadas etiologias ou com graves sequelas neurológicas Devemos enfrentar o desafio de nos conscientizar do estado de abandono a que esses pacientes estão expostos inverter o atual panorama dos cuidados oferecidos e tentar implantar me didas concretas como criação de recursos específicos melhoria dos cuidados oferecidos nos recursos já existentes formação de grupos de profissionais e educação da sociedade em geral3 Os Cuidados Paliativos despontam como alternativa para preencher essa lacu na nos cuidados ativos aos pacientes Breve história dos Cuidados Paliativos O Cuidado Paliativo se confunde historicamente com o termo hospice que definia abrigos hospedarias destinados a receber e cuidar de peregrinos e viajantes O relato mais antigo remonta ao século V quando Fabíola discípula de São Jerônimo cuidava de viajantes vindos da Ásia da África e dos países do leste no Hospício do Porto de Roma1 Várias instituições de caridade surgiram na Europa no século XVII abrigando pobres órfãos e doentes Essa prática se propagou com organizações religiosas católicas e pro testantes que no século XIX passaram a ter características de hospitais 15 O Movimento Hospice Moderno foi introduzido pela inglesa Cicely Saunders com formação humanista e médica que em 1967 fundou o St Christophers Hospice cuja estrutura não só permitiu a assistência aos doentes mas o desenvolvimento de ensino e pesquisa recebendo bolsistas de vários países7 Na década de 1970 o encontro de Cicely Saunders com Elisabeth KlüberRoss nos Estados Unidos fez com que o Movimento Hospice também crescesse naquele país Em 1982 o Comitê de Câncer da Organização Mundial da Saúde OMS criou um grupo de trabalho responsável por definir políticas para o alívio da dor e cuidados do tipo hospice que fossem recomendados em todos os países para pacientes com câncer O termo Cuidados Paliativos já utilizado no Canadá passou a ser adotado pela OMS devido à dificuldade de tradução adequada do termo hospice em alguns idiomas4 A OMS publicou sua primeira definição de Cuidados Paliativos em 1990 cuidado ativo e total para pacientes cuja doença não é responsiva a tratamento de cura O controle da dor de outros sintomas e de problemas psicossociais e espirituais é pri mordial O objetivo do Cuidado Paliativo é proporcionar a melhor qualidade de vida possível para pacientes e familiares Essa definição foi revisada em 2002 e substi tuída pela atual Filosofia e fundamentos éticos dos Cuidados Paliativos Halina Bortnowska filósofa e escritora polonesa voluntária num hospice discorreu sobre as éticas da cura e da atenção Descreveu ética como uma constelação de va lores sustentados pela pessoa Dizia que na ética da cura as virtudes militares eram predominantes não se dar por vencido perseverar ser duro Já na ética da atenção o valor central é a dignidade humana enfatizando a solidariedade entre o paciente e o profissional da saúde em atitude que resulta numa compaixão afetiva Na ética da cura o médico é o general na da atenção o paciente é o soberano Dr Robert Twycross fala sobre a dificuldade do médico em dizer a verdade ao pa ciente quando essa verdade desnuda a terminalidade da vida e a ausência de perspec tiva de cura Colocamse em jogo o seu próprio medo da morte e as pressões culturais a ela associadas Fica a ideia de que com a verdade dolorosa podemos destruir a es perança e levar o paciente irreversivelmente ao desespero e à depressão Conclui que a mentira e a evasão são o que realmente isolam o paciente atrás de um muro de palavras ou no silêncio que impede a adesão terapêutica e a possibilidade de compartilhar seus medos angústias e preocupações Enfatiza que devemos ter o compromisso da abertura e da honestidade e que o primeiro desafio ético do médico seria equipar a si mesmo de boas habilidades de comunicação e sensibilidade10 Segundo Siqueira9 a ética médica tradicional concebida no modelo hipocrático tem um forte acento paternalista Somente na década de 1960 os códigos de ética profissional passaram a reconhecer o enfermo como agente autônomo Com base no princípio bioético da autonomia do paciente por meio do consen timento informado possibilitando que ele tome suas próprias decisões no princípio da beneficência e da nãomaleficência os Cuidados Paliativos desenvolvem o cuida do ao paciente visando à qualidade de vida e à manutenção da dignidade humana no decorrer da doença na terminalidade da vida na morte e no período de luto 16 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Conceito de Cuidado Paliativo Segundo a definição da OMS revista em 2002 Cuidado Paliativo é uma abordagem que promove a qualidade de vida de pacientes e seus familiares que enfrentam doenças que ameacem a continuidade da vida por meio da prevenção e do alívio do sofrimento Requer identificação precoce avaliação e tratamento da dor e outros problemas de natu reza física psicossocial e espiritual O Cuidado Paliativo não se baseia em protocolos mas em princípios Não se fala mais em terminalidade mas em doença que ameaça a vida Indicase o cuidado desde o diag nóstico expandindo nosso campo de atuação Não falaremos também em impossibilidade de cura mas na possibilidade ou não de tratamento modificador da doença afastando dessa forma a ideia de não ter mais nada a fazer Pela primeira vez uma abordagem inclui a espiritualidade entre as dimensões do ser humano A família é lembrada portanto assistida também após a morte do paciente no período de luto Princípios dos Cuidados Paliativos Os Cuidados Paliativos baseiamse em conhecimentos inerentes às diversas especia lidades possibilidades de intervenções clínica e terapêutica nas diversas áreas de conhe cimento da ciência médica4 e de conhecimentos específicos A OMS publicou em 1986 princípios que regem a atuação da equipe multiprofissional de Cuidados Paliativos Esses princípios foram reafirmados na sua revisão em 2002 e estão listados adiante Promover o alívio da dor e de outros sintomas desagradáveis Dessa forma é necessário conhecimento específico para a prescrição de medicamen tos adoção de medidas nãofarmacológicas e abordagem dos aspectos psicossociais e es pirituais que caracterizam o sintoma total plagiando o conceito de dor total criado por Dame Cicely Saunders em que todos esses fatores podem contribuir para a exacerbação ou atenuação dos sintomas devendo ser levados em consideração na abordagem Afirmar a vida e considerar a morte um processo normal da vida Bernard Lown em seu livro A arte perdida de curar afirma As escolas de medicina e o estágio nos hospitais os preparam os futuros médicos para tornaremse oficiais maiores da Ciência e gerentes de biotecnologias complexas Muito pouco se ensina sobre a arte de ser médico Os médicos aprendem pouquíssimo a lidar com moribundos A realidade mais fundamental é que houve uma revolução biotecnológica que possibilita o prolongamento interminável do morrer9 O Cuidado Paliativo resgata a possibilidade da morte como um evento natural e esperado na presença de doença ameaçadora da vida colocando ênfase na vida que ainda pode ser vivida Não acelerar nem adiar a morte Enfatizase dessa forma que Cuidado Paliativo nada tem a ver com eutanásia como muitos ainda querem entender Essa relação ainda causa decisões equivocadas quanto à realização de intervenções desnecessárias e enorme dificuldade em prognosticar paciente portador de doença progressiva e incurável e definir a linha tênue e delicada do fazer e do 17 nãofazer Um diagnóstico objetivo e bem embasado o conhecimento da história natural da doença um acompanhamento ativo acolhedor e respeitoso e uma relação empática com o paciente e seus familiares nos ajudarão nas decisões Dessa forma erraremos me nos e nos sentiremos mais seguros Integrar os aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao paciente A doença principalmente aquela que ameaça a continuidade da vida costuma tra zer uma série de perdas com as quais paciente e família são obrigados a conviver quase sempre sem estarem preparados As perdas de autonomia autoimagem segu rança capacidade física respeito sem falar das perdas concretas materiais como de emprego de poder aquisitivo e consequentemente de status social podem trazer an gústia depressão e desesperança interferindo objetivamente na evolução da doença na intensidade e na frequência dos sintomas que podem apresentar maior dificuldade de controle A abordagem desses aspectos sob a ótica da psicologia se faz fundamental A novidade é a possibilidade de abordálos também sob o ponto de vista da espiritua lidade que se confunde e se sobrepõe invariavelmente à questão religiosa Noventa e cinco por cento dos americanos creem numa força superior e 93 gostariam que seus médicos abordassem essas questões se ficassem gravemente enfermos8 Segundo Sa poretti8 espírito do latim spiritus significa sopro e se refere a algo que dá ao corpo sua dimensão imaterial oculta divina ou sobrenatural que anima a matéria O espírito conecta o ser humano à sua dimensão divina ou transcendente É mais esse aspecto o da transcendência do significado da vida aliado ou não à religião que devemos estar preparados para abordar sempre lembrando que o sujeito é o paciente sua crença e seus princípios Oferecer um sistema de suporte que possibilite ao paciente viver tão ativamente quanto possível até o momento da sua morte Não devemos nos esquecer de que qualidade de vida e bemestar implicam obser vância de vários aspectos da vida Problemas sociais dificuldades de acesso a serviços medicamentos e outros recursos podem ser também motivos de sofrimento e devem ser incluídos entre os aspectos a serem abordados pela equipe multiprofissional Viver ativa mente e não simplesmente viver remetenos à questão da sobrevida a qualquer custo que esperamos combater É nosso dever e nossa responsabilidade sermos facilitadores para a resolução dos problemas do nosso paciente Oferecer sistema de suporte para auxiliar os familiares durante a doença do paciente e o luto Nunca estamos completamente sós O ser humano é por natureza um ser gregário Todo o núcleo familiar e social do paciente também adoece Segundo a Dra Maria Helena Pereira Franco2 a unidade de cuidados pacientefamília se coloca como una e específica ao mesmo tempo A célula de identidade do ser humano é a família res peitadas todas as condições que fazem dela um universo cultural próprio muitas vezes distante ou até mesmo alheio ao universo cultural dos profissionais da saúde A famí lia tanto a biológica como a adquirida amigos parceiros etc pode e deve ser nossa parceira e colaboradora Essas pessoas conhecem melhor do que nós o paciente suas 18 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP necessidades suas peculiaridades seus desejos e suas angústias muitas vezes nãover balizados pelo próprio paciente Da mesma forma essas pessoas também sofrem e seu sofrimento deve ser acolhido e paliado Oferecer abordagem multiprofissional para focar as necessidades dos pacientes e seus familiares incluindo acompanhamento no luto Na prática do cuidado ao paciente frequentemente iremos nos deparar com inúmeros fatores que atuarão concomitantemente na modificação da resposta te rapêutica medicamentosa na evolução da própria doença e na relação com o pa ciente e a família A integração sugerida pelo Cuidado Paliativo é uma forma de observarmos o paciente sob todas as suas dimensões e a importância de todos esses aspectos na composição do seu perfil para elaborarmos uma proposta de aborda gem Ignorar qualquer dessas dimensões significará uma avaliação incompleta e consequentemente uma abordagem menos efetiva e eficaz dos sintomas O sujeito da ação é sempre o paciente respeitado na sua autonomia Incluir a família no processo do cuidar compreende estender o cuidado no luto que pode e deve ser realizado por toda a equipe e não somente pelo psicólogo A equipe multiprofis sional com seus múltiplos olhares e sua percepção individual pode realizar esse trabalho de forma abragente Melhorar a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso da doença Com uma abordagem holística observando o paciente como um ser biográfico mais que um ser simplesmente biológico poderemos respeitando seus desejos e suas necessidades melhorar o curso da doença e segundo a experiência de vários serviços de Cuidados Palia tivos também prolongar sua sobrevida Vivendo com qualidade ou seja sendo respeitado tendo seus sintomas impecavelmente controlados seus desejos e suas necessidades aten didas podendo conviver com seus familiares e resgatando pendências com certeza nossos pacientes também viverão mais Iniciar o mais precocemente possível o Cuidado Paliativo juntamente com outras medidas de prolongamento da vida como quimioterapia e radioterapia e incluir todas as investigações necessárias para melhor compreender e controlar situações clínicas estressantes Pela própria definição de Cuidados Paliativos da OMS esses devem ser iniciados desde o diagnóstico da doença potencialmente mortal Dessa forma iremos cuidar do paciente em diferentes momentos da evolução da sua doença portanto não devemos priválo dos recursos diagnósticos e terapêuticos que o conhecimento médico pode oferecer Devemos utilizálos de forma hierarquizada levando em consideração os benefícios que podem trazer e os malefícios que devem ser evitados4 Uma abordagem precoce também permite a prevenção dos sintomas e de compli cações inerentes à doença de base além de propiciar diagnóstico e tratamento ade quados de enfermidades que possam cursar paralelamente à doença principal Uma boa avaliação embasada nos exames necessários além da definição da performance do paciente é indispensável para a elaboração de um plano integral de cuidados adequado a cada caso e adaptado a cada momento da evolução da doença 19 O Cuidado Paliativo no Brasil O Cuidado Paliativo no Brasil teve seu início na década de 1980 e conheceu um crescimento significativo a partir do ano 2000 com a consolidação dos serviços já exis tentes e pioneiros e a criação de outros não menos importantes Hoje já somos mais de 40 iniciativas em todo o Brasil Ainda é pouco levandose em consideração a extensão geográfica e as necessidades do nosso país Assim será maior a nossa responsabilidade em firmarmos um compromisso para unidos num único propósito ajudarmos a construir um futuro promissor para os Cuidados Paliativos a fim de que um dia não muito distante todo cidadão brasileiro possa se beneficiar dessa boa prática Referências 1 CORTES C C Historia y desarrollo de los cuidados paliativos In Marcos G S ed Cuidados paliativos e intervención psicossocial em enfermos com cáncer Las palmas ICEPS 1988 2 FRANCO M H P Multidisciplinaridade e interdisciplinaridade psicologia Cuidado paliativo CREMESP 1III p 746 2008 3 GALRIÇA NETO I Pequeno manual básico de cuidados paliativos Região de Saúde de Lisboa 4 MACIEL M G S Definições e princípios Cuidado paliativo CREMESP 1I p 1821 2008 5 MONTEIRO M G F Transição demográfica e seus efeitos sobre a saúde da população In BARATA R B et al Eqüidade e saúde contribuições da epidemiologia Rio de Janeiro FIOCRUZABRASCO 1997 6 PESSINI L Cuidados paliativos alguns aspectos conceituais biográficos e éticos Prática hospitalar n 41 p 10712 2005 7 PESSINI L Distanásia até quando investir sem agredir Bioética v 4 p 3143 1996 8 SAPORETTI L A Espiritualidade em cuidados paliativos Cuidado paliativo CREMESP 4I p 5223 2008 9 SIQUEIRA J E Doente terminal Cadernos de Bioética do CREMESP v 1 2005 10 TWYCROSS R Medicina paliativa filosofia e considerações éticas Acta Bioética n 1 2000 20 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Indicações de Cuidados Paliativos AnA ClAudiA de limA QuintAnA ArAntes Introdução Pela definição da Organização Mundial da Saúde OMS para Cuidados Paliativos todos os pacientes portadores de doenças graves progressivas e incuráveis que ameacem a continui dade da vida deveriam receber a abordagem dos Cuidados Paliativos desde o seu diagnóstico Entretanto sabemos que se essa referência tivesse de ser cumprida a maioria dos pacientes permaneceria sem nenhuma assistência paliativa pois não temos ainda disponibilidade de profissionais e serviços que possam dar conta do atendimento dessa população No Brasil segundo dados do Departamento de Informação e Informática do Sistema Único de Saúde DATASUS13 em 2006 faleceram 1031691 brasileiros Se avaliarmos apenas os óbitos decorrentes de doenças de evolução crônica ou degenerativa e neo plasias teremos um montante de mais de 725 mil pessoas que morreram no Brasil com grande possibilidade de sofrimento intenso Tabela 1 Mais de 690 mil pessoas faleceram em hospitais e 224 mil em casa Tabela 2 Por conta dessa dificuldade de avaliar e cuidar do sofrimento estabelecemos alguns critérios de recomendação para Cuidados Paliativos considerando a possibilidade de in dicação para aqueles pacientes que esgotaram todas as possibilidades de tratamento de manutenção ou prolongamento da vida que apresentam sofrimento moderado a intenso e que optam por manutenção de conforto e dignidade da vida Um dos critérios mais discutidos é o que se refere ao prognóstico de tempo de vida do paciente O limite designado em seis meses de expectativa de vida poderia ser utilizado para indicação de Cuidados Paliativos exclusivos uma vez que esse critério foi importado do Medicare americano19 que estabelece o tempo de sobrevida esperado como um dos critérios de indicação para assistência de hospice São critérios do Medicare a expectativa de vida avaliada é menor ou igual a seis meses o paciente deve fazer a opção por Cuidados Paliativos exclusivos e abrir mão dos trata mentos de prolongamento da vida o paciente deve ser beneficiário do Medicare Avaliação de prognóstico Nas raízes da prática da medicina encontramos certa harmonia entre a ciência e o sacerdócio místico que envolvia os poderes do médico em avaliar e curar doenças Apesar disso a arte de prever o futuro ainda não se tornou suficientemente científica a pon to de especializar o médico no exercício de prognosticar Essa avaliação busca reforços constantes em escalas sinais e sintomas que podem identificar o processo de morte em fases precoces mas ainda envolve julgamentos fisiológicos e sociais bastante complexos Mesmo que a morte seja um fenômeno biológico claramente identificado as percepções de significado tempo e circunstâncias em que o processo de morrer e a morte se sucedem ainda permanecem num conhecimento pouco estabelecido e ensinado 21 Tabela 1 Mortalidade no Brasil 2006 Óbitos para residência por capítulo CID10 e região Capítulo CID10 Norte Nordeste Sudeste Sul C Oeste Total I Algumas doenças infecciosas e parasitárias 3271 12735 21171 6158 3173 46508 II Neoplasias tumores 6439 31803 77260 31238 9056 155796 III Doenças sangue órgãos hemat e transt imunit 390 1665 2517 624 300 5496 IV Doenças endócrinas nutricionais e metabólicas 2659 17923 26790 8374 3158 58904 V Transtornos mentais e comportamentais 270 3040 4802 1444 700 10256 VI Doenças do sistema nervoso 686 3620 10262 3448 1150 19166 VII Doenças do olho e anexos 4 12 7 3 2 28 VIII Doenças do ouvido e da apófise mastoide 9 43 67 18 8 145 IX Doenças do aparelho circulatório 11795 75711 147933 49073 18305 302817 X Doenças do aparelho respiratório 4627 20166 53983 18215 5875 102866 XI Doenças do aparelho digestivo 2389 12473 25830 8073 3159 51924 XII Doenças da pele e do tecido subcutâneo 104 629 1401 217 115 2466 XIII Doenças do sistema osteomuscular e tecido conjuntivo 199 716 1851 579 252 3597 XIV Doenças do aparelho geniturinário 774 3715 9468 2497 967 17421 22 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Tabela 1 Mortalidade no Brasil 2006 Óbitos para residência por capítulo CID10 e região Capítulo CID10 Norte Nordeste Sudeste Sul C Oeste Total XV Gravidez parto e puerpério 178 567 521 237 134 1637 XIV Doenças do aparelho geniturinário 774 3715 9468 2497 967 17421 XVI Algumas afecções originadas no período perinatal 3414 10212 9838 2932 1940 28336 XVII Malformações congênitas deformidades e anomalias cromossômicas 966 2950 4069 1543 869 10397 XVIII Sintomas sinais e achados anormais em exames clínicos e laboratoriais 8391 24275 40372 9424 3081 85543 XX Causas externas de morbidade e mortalidade 9307 33884 55708 19291 10198 128388 Total 55872 256139 493850 163388 62442 1031691 Tabela 2 Mortalidade no Brasil 2006 Local ocorrência Hospital Domicílio Região Norte 33658 14222 Região Nordeste 144946 82682 Região Sudeste 358906 78740 Região Sul 110765 35648 Região CentroOeste 42581 12147 Total 690856 223439 CID10 décima revisão da Classificação Internacional de Doenças continuação 23 O maior perigo desse exercício de avaliar tempo de sobrevida de uma pessoa é deter minar a morte social antes da morte física propriamente dita Uma vez que se estabele ce que um paciente tem uma expectativa de vida pequena em dias ou semanas corremos o risco de subestimar suas necessidades e negligenciar a possibilidade de conforto real dentro da avaliação do paciente e de sua família Em geral a avaliação prognóstica de pacientes em fases avançadas de doenças graves ainda apresenta erro otimista considerável principalmente quando avaliamos pacientes com doenças nãoneoplásicas Um estudo em 2000 de Christakis et al9 demonstrou que a acurácia de prognóstico geralmente apresenta erro para o lado do otimismo Apenas 20 dos médicos têm acurácia de prognóstico de 33 dos pacientes dentro do período atual de sobrevida sendo que 63 são muito otimistas e 17 subestimam o tempo de sobrevida Uma conclusão interessante foi a de que à medida que aumenta o tempo de relação médicopaciente a acurácia de prognóstico diminui demonstrando que o vínculo que se estabelece entre o médico e seu paciente determina um desejo do médico de prever uma condição que implica menor capacidade de avaliar a realidade Esse resultado nos permitiria iniciar uma discussão pertinente de o quanto os desejos e as expectativas do próprio médico não poderiam interferir na avaliação do prognóstico de seu paciente Uma das ferramentas que temos disponíveis na avaliação de prognóstico diz respeito à capacidade funcional do paciente Entretanto sabemos que a capacidade funcional pode estar diretamente relacionada com uma condição de sofrimento intensa nãoavaliada ou nãotratada adequadamente e que deforma a avaliação de prognóstico Por exemplo um paciente com câncer de próstata pode estar comprometido em sua funcionalidade por causa de uma dor óssea intensa nãotratada e não por deterioração sistêmica causada por sua doença de base Nesse caso a deterioração sistêmica se deve ao sofrimento e não ao avanço da doença para órgãos vitais Quanto à avaliação de capacidade para as atividades da vida diária temos as recomendações de Cuidados Paliativos para pacientes dependentes em determinadas atividades como incapacidade para se locomover alimen tarse e incontinências Quadro 1 Quadro 1 Principais dependências funcionais ABVD Incontinências urinária e fecal Alimentação por tubos enterais ou incapacidade de alimentarsehidratarse sem auxílio Imobilização permanente em leito ou poltrona ABVD atividades básicas de vida diária Como medir os declínios funcional e clínico A escala de performance status de Karnofsky Tabela 3 foi desenvolvida para pa cientes com câncer como um meio objetivo de documentar o declínio clínico do pacien te avaliando sua capacidade de realizar determinadas atividades básicas A maioria dos pacientes com escala Karnofsky inferior a 70 tem indicação precoce de assistência de Cuidados Paliativos Performance de 50 nessa escala indica terminalidade reafirmando que esses são pacientes elegíveis para Cuidados Paliativos a menos que exista um ganho 24 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP previsivelmente benéfico em sustentar terapia para a doença de base que seja simulta neamente disponível e possa ser tolerado Outro instrumento útil para medir a condição clínica do paciente é a Escala de Performance Paliativa PPS Tabela 4 que foi desen volvida em 1996 em Victoria British Columbia e revista em 2001 Para contornar a dificuldade de avaliação prognóstica foram estabelecidos alguns critérios clínicos para cada doença ou para cada condição clínica que auxiliam na decisão de encaminhar o paciente aos Cuidados Paliativos Alguns desses critérios dizem respeito a condições mórbidas específicas como insuficiência cardíaca congestiva ICC doença pulmonar obstrutiva crônica DPOC câncer esclerose lateral amiotrófica ELA demência e outras doenças degenerativas progressivas Indicadores nãoespecíficos como perda ponderal progressiva declínio de proteínas plasmáticas e perda funcional também são utilizados Doença cardíaca Nos Estados Unidos 58 das mortes foram causadas primária ou secundariamente pelas doenças cardiovasculares DCV17 No Brasil em 2005 mais de 302 mil pessoas fa leceram por causa de uma DCV 29 que é a principal causa de morte em todos os anos do século XX exceto 1918 Embora as DCVs sejam mais comuns com a idade avançada principalmente a insuficiência cardíaca IC elas não se restringem aos idosos Mais de 152 mil americanos com idade inferior a 65 anos morrem de DCV por ano3 A morte de causa cardiovascular mais característica é a morte súbita Pacientes com IC representam um desafio adicional na arte do prognóstico pois cerca de 60 deles classe funcional II da National NYHA morrem subitamente Se incluirmos os pacientes com classe funcional IV esse número representa 25 dos pacientes levan do à média de 35 Os critérios para previsão de morte súbita nesses pacientes ainda permanecem controversos11 31 Os estudos mais recentes sobre esses fatores prognósti cos incluem peptídeo natriurético do tipo B BNP fração de ejeção diâmetro diastólico Tabela 3 Escala de performance de Karnofsky 100 Sem sinais ou queixas sem evidência de doença 90 Mínimos sinais e sintomas capaz de realizar suas atividades com esforço 80 Sinais e sintomas maiores realiza suas atividades com esforço 70 Cuida de si mesmo não é capaz de trabalhar 60 Necessita de assistência ocasional capaz de trabalhar 50 Necessita de assistência considerável e cuidados médicos frequentes 40 Necessita de cuidados médicos especiais 30 Extremamente incapacitado necessita de hospitalização mas sem iminência de morte 20 Muito doente necessita de suporte 10 Moribundo morte iminente 25 Tabela 4 Escala de performance paliativa Deambulação Atividade e evidência de doença Autocuidado Ingestão Nível de consciência 100 Completa Normal sem evidência de doença Completo Normal Completo 90 Completa Normal alguma evidência de doença Completo Normal Completo 80 Completa Com esforço alguma evidência de doença Completo Normal Completo 70 Reduzida Incapaz para o trabalho alguma evidência de doença Completo Normal ou reduzida Completo 60 Reduzida Incapaz de realizar hobbies doença significativa Assistência ocasional Normal ou reduzida Completo ou com períodos de confusão 50 Sentado ou deitado Incapacitado para qualquer trabalho doença extensa Assistência considerável Normal ou reduzida Completo ou com períodos de confusão 40 Acamado Idem Assistência quase completa Normal ou reduzida Completo ou com períodos de confusão 30 Acamado Idem Dependência completa Reduzida Completo ou com períodos de confusão 20 Acamado Idem Idem Ingestão limitada a colheradas Completo ou com períodos de confusão 10 Acamado Idem Idem Cuidados com a boca Confuso ou em coma 0 Morte final presença de taquicardia ventricular nãosustentada e diabetes mellitus DM 6 50 A presença de fenômenos tromboembólicos parada cardiorrespiratória PCR prévia e diagnóstico de AIDS e outras arritmias ventriculares complexas também contribuem para a avaliação de prognóstico reservado A avaliação precisa da incidência de morte súbita tem sido mais complexa por causa do aumento da prevalência de uso do cardioversor desfibrilador interno automático5 14 26 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Vale ressaltar que todos os pacientes com indicação de transplante de órgãos sólidos inclusive transplante cardíaco são candidatos formais para Cuidados Paliativos pois têm doença avançada e podem ter alcançado sintomas de grande intensidade e desconforto A persistência da incerteza sobre o prognóstico torna a discussão com o paciente sobre as suas preferências de cuidados um momento muito difícil na melhor das hipóteses Um trabalho realizado com pacientes que têm câncer sugere que mesmo com 10 de probabilidade de não sobreviver aos próximos seis meses eles ponderam sobre diferen tes opções de tratamento51 Em parte por causa desses prognósticos de incerteza os pacientes que morrem de IC têm sido considerados os que têm a menor compreensão de sua condição e o menor envolvimento no processo de tomada de decisões relativas aos seus cuidados33 Um estudo de 274 óbitos 26 por DCV concluiu que alguns tratamentos foram suspensos ou retirados em 84 dos pacientes No entanto apenas 35 desses pacientes foram capazes de participar do processo de tomada de decisão18 Os doentes que morrem de IC não repentinamente apresentam um processo gradual de deterioração Esse proces so pode ser interrompido por episódios agudos que frequentemente aumentam o risco de morte súbita o que torna a previsão de riscos ainda mais difícil No entanto as condições crônicas cardiovasculares determinam grande sofrimento aos pacientes A morte em geral ocorre no hospital e embora essa tendência possa cor responder às preferências do paciente e de sua família aqueles com DCV estão entre os que menos recebem assistência domiciliar e Cuidados Paliativos Em 2000 os pacientes com DCV foram responsáveis por cerca de 20 de todos os encaminhamentos para Cuidados Paliativos exclusivos enquanto os com câncer consti tuem mais de 70 dos usuários de hospices americanos7 Estimase que apenas 4 dos pacientes com IC recebem Cuidados Paliativos5 A incerteza quanto ao prognóstico e à trajetória da fase final da vida de pacientes com IC pode induzir ao que foi denominado paralisia prognóstica Isso atrasa o início da discussão sobre os Cuidados Paliativos e a real efetividade dos tratamentos propostos até então47 Um dos autores deste artigo sugeriu que os pacientes que têm IC sejam considerados candidatos para os Cuidados Paliativos caso algum médico responda não à pergunta Você se surpreenderia se esse paciente morresse nos próximos 12 meses33 Na verdade para qualquer condição clínica de gravidade essa pergunta se aplica e poderia ser considerada o melhor critério de indicação para Cuidados Paliativos O período de 12 meses é bastante restrito se pensarmos em tempo de vida mas insuportavelmente longo se corresponder a tempo de sofrimento Outro algoritmo sugerido daria início aos Cuidados Paliativos durante ou logo após a recuperação de uma exacerbação aguda da IC21 O que parece claro a partir da experiên cia de muitos serviços é que os Cuidados Paliativos precisam ser considerados muito mais cedo no decurso do processo da DCV Doença pulmonar Assim como a maior parte das doenças crônicas determinar o prognóstico ou ainda a esperança de vida em pacientes que tenham DPOC é um campo cheio de incertezas Em todos os grupos idade tabagismo perda da função pulmonar e baixo índice de massa corporal IMC são importantes preditores de mortalidade4 8 25 27 42 27 Em pacientes idosos os preditores de mortalidade em DPOC incluem volume ex piratório forçado no primeiro segundo VEF1 gravidade da debilidade física idade avançada e uso de oxigênio por longo prazo Tabagismo depressão qualidade de vida e presença de comorbidades bem como frequência das internações por qualquer outra causa parecem não predizer mortalidade52 Se analisarmos as internações decorren tes de aumento da frequência de exacerbações da DPOC observamos que se correla ciona com o aumento da mortalidade sendo então um preditor independente de mau prognóstico46 Em pacientes com 65 anos ou mais a mortalidade após uma internação em unidade de terapia intensiva UTI por exacerbação de DPOC pode ser elevada che gando a 30 em cerca de 30 dias após a alta hospitalar Cinquenta e nove por cento falecem em um ano45 O mesmo estudo mostrou que a mortalidade hospitalar e a de longo prazo estiveram fortemente relacionadas com o comprometimento de outros órgãos e o aumento da gra vidade da doença pulmonar mas não com a necessidade de ventilação mecânica45 Na evolução de uma internação por exacerbação da DPOC em idosos comorbi dades depressão maior estado civil e índice de qualidade de vida demonstraram ser fortes preditores de mortalidade2 Mesmo assim pode ser difícil identificar quando um paciente de DPOC está entrando na fase final da evolução da sua doença Além disso grande parte do tratamento habitual de DPOC é de baixo risco e relacionado com os sintomas Esses fatores limitam a utilidade de uma distinção nítida entre os tratamen tos ativo e paliativo da doença principalmente em pacientes que apresentam períodos de relativa estabilidade Cerca de 20 a 25 dos pacientes que apresentam DPOC grave experimentam dor depressão ansiedade e dispneia intensa no fim da vida10 16 30 A intervenção de Cuidados Paliativos pode oferecer a oportunidade de discussão de escolhas nesse momento como renunciar à intubação e à ventilação mecânica limitar a duração dessas intervenções ou até mesmo recusar internação hospitalar Porém como são pouco referidas para Cuidados Paliativos essas discussões são infrequentes Doença renal Sabese que quase 20 dos pacientes com insuficiência renal sob tratamento dia lítico param a diálise antes da morte Provavelmente quase todos os nefrologistas es tão envolvidos nos cuidados de fim de vida desses pacientes com doença renal terminal DRT23 No entanto os médicos são mal treinados em Cuidados Paliativos e muitas vezes sentemse desconfortáveis com o cuidado de pacientes que morrem15 22 Em um estudo com médicos americanos e canadenses por exemplo apenas cerca de 40 dos 360 nefrologistas entrevistados afirmaram que se sentiam muito bem preparados para discutir decisões de fim de vida com seus pacientes15 No Brasil essa tendência ainda é pior pois ainda estamos longe das condições ideais de formação adequada na área de Cuidados Paliativos Com a progressão da doença renal os Cuidados Paliativos assumem grande importân cia levando a um gerenciamento mais adequado do controle de sintomas e à discussão sobre as diretrizes avançadas considerando a possibilidade de interrupção do tratamento dialítico por escolha do paciente e de sua família Os principais critérios de terminalidade para insuficiência renal são descritos no Quadro 2 28 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 2 Indicações de Cuidados Paliativos segundo as condições do paciente Paciente não é candidato à terapia curativa Paciente tem doença grave e prefere não ser submetido a tratamento de prolongamento da vida Nível inaceitável de dor por mais de 24 horas Sintomas nãocontrolados náusea dispneia vômitos etc Sofrimento psicossocial eou espiritual nãocontrolado Visitas frequentes ao atendimento de emergência mais de uma vez no mês pelo mesmo diagnóstico Mais do que uma admissão hospitalar pelo mesmo diagnóstico nos últimos 30 dias Internação prolongada sem evidência de melhora Internação prolongada em UTI Prognóstico reservado documentado pela equipe médica UTI unidade de terapia intensiva Doença hepática Nos Estados Unidos a doença hepática crônica DHC determina mais de um milhão de visitas médicas e mais de 300 mil internações por ano28 A progressão da doença hepática leva os pacientes a experimentarem complicações clínicas como encefalopatia desnutrição perda muscular ascite hemorragia de varizes esofagogástricas peritonite bacteriana espontânea fadiga e depressão O transplante de fígado uma opção válida de tratamento aumenta o tempo de vida e reduz muitos sintomas mas com a atual escassez de órgãos 10 a 15 desses pacientes morrem Muitos também não são candidatos a transplante devido à presença de comor bidades Além disso alguns pacientes transplantados sucumbem diante das complicações do transplante em si e enfrentam com suas famílias o dilema de uma doença potencial mente tratável mas ainda frequentemente fatal28 A atuação dos Cuidados Paliativos se propõe a oferecer ao paciente o controle dos sinto mas tanto na espera do transplante como nos cuidados após o procedimento Os critérios de indicação para Cuidados Paliativos são os mesmos da indicação do transplante mas direcio nada para os pacientes que não podem realizar a cirurgia A interface mais intensa se apre senta na condição de falha do transplante ou detecção de condições mórbidas que agravem o quadro do paciente como por exemplo o câncer hepático Observase o compromisso de maximizar a qualidade e se possível o tempo de vida Indicações de Cuidados Paliativos em UTI As UTIs fornecem tratamentos sofisticados a doentes graves Os pacientes portadores de doenças crônicas que apresentam exacerbações ao longo da evolução da doença estão vivendo mais tempo por causa dos avanços oferecidos em seus tratamentos e em geral vivem mais mas com piores condições de vida 29 Infelizmente ainda existem muitas barreiras para prestar Cuidados Paliativos eficazes nessa área da saúde Porém graças à boa prática médica à medicina com base em evi dências e ao bom senso a ciência está ao lado dos Cuidados Paliativos12 Em 2006 a revista Critical Care Medicine publicou um suplemento inteiro dedicado ao tema Cuidados Paliativos na UTI contemplando diversos dilemas vividos nesse setor Além da formação insuficiente do médico e de sua dificuldade em perceber que não pode mais atuar em direção à cura temos ainda a dificuldade de encarar a própria finitude e a impotência diante da inevitabilidade da morte Os problemas éticolegais que permeiam essas decisões também influenciam a vivência desses dilemas Entre os dilemas de comunicação temos38 39 comunicação insuficiente sobre as decisões de fim de vida incapacidade de pacientes de participar nas discussões sobre seu tratamento expectativas nãorealistas por parte dos pacientes e de seus familiares sobre o prognós tico ou a eficácia do tratamento na UTI falta de oportunidades para discussão sobre a forma como eles desejam receber os cuidados no final da vida Podemos considerar algumas situações encontradas em UTI que nos auxiliam a identificar pacientes que teriam benefício em receber atenção de Cuidados Paliativos Quadro 339 Quadro 3 Critérios de indicação para Cuidados Paliativos em UTI39 Admissão proveniente de instituição de longa permanência portador de uma ou mais condições crônicas limitantes por exemplo demência Duas ou mais estadias na UTI na mesma internação Tempo prolongado de ventilação mecânica ou falha na tentativa de desmame Falência de múltiplos órgãos Paciente candidato à retirada de suporte ventilatório com possibilidade de óbito Câncer metastático Encefalopatia anóxica Sofrimento familiar que comprometa a tomada de decisões UTI unidade de terapia intensiva HIVAIDS Apesar dos avanços no tratamento do HIVAIDS ainda não existe cura conhecida Ao contrário de outras doenças terminais como o câncer não é fácil prever quando a morte é iminente Um paciente com AIDS pode morrer em consequência de sua pri meira manifestação do HIV ou em constante risco de adquirir novas doenças capazes de abreviar sua vida A maioria dos pacientes no entanto vive com frequentes problemas de saúde até a fase de imunossupressão grave ao longo de vários anos À medida que a doença progride a necessidade de alívio sintomático tornase mais importante do que o tratamento curativo 30 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Os pacientes com AIDS estarão na fase terminal da sua doença se19 CD4 25 célulasmcl carga viral persistente 100 mil cópiasml houver associação a qualquer uma das situações abaixo linfoma de sistema nervoso central SNC perda de 33 de massa corporal magra bacteremia por Mycobacterium avium nãotratada que não responde ao tratamento ou o recusa leucoencefalopatia multifocal progressiva linfoma sistêmico com doença avançada pelo HIV e resposta parcial à quimioterapia sarcoma de Kaposi visceral nãoresponsivo à terapia insuficiência renal nãoelegível ou que não deseja diálise infeccção por Cryptosporidium toxoplasmose que não responde à terapêutica baixa performance status Karnofsky menor que 50 Paciente com AIDS sem critérios de terminalidade como os descritos anteriormente devem receber recomendação para Cuidados Paliativos quando houver19 diarreia persistente por um ano albumina sérica menor que 25 uso persistente de drogas ilícitas idade 50 anos ausência de terapia retroviral quimioterapia e outras medicações relacionadas com a profilaxia da doença por HIV demência avançada por AIDS toxoplasmose e ICC sintomática ao repouso Doença neurológica de longa duração Cuidar de pacientes graves com doenças irreversíveis e progressivas já se configura um desafio diário na prática dos Cuidados Paliativos Por outro lado cuidar de pacientes com doenças graves incuráveis com condições de dependência irreversíveis mas que apresentam progressão lenta e imprevisível ainda é o maior desafio de qualquer profis sional da área da saúde Os pacientes portadores de doenças neurológicas de instalação precoce ou adquirida na fase mais tardia da vida apresentam sofrimentos de menor ou maior intensidade físi cos emocionais familiares sociais e espirituais e que frequentemente não são detectados por seus médicos cuidadores ou familiares O lugar dos Cuidados Paliativos nãooncológicos está sendo progressivamente reco nhecido1 35 40 44 especialmente em condições neurológicas rapidamente fatais como a doença do neurônio motor DNM29 41 Muitos guidelines agora recomendam a indicação precoce de Cuidados Paliativos para esses casos36 37 Pacientes com essas doenças possuem necessidades diferentes dos portadores de câncer36 40 49 e podem ser caracterizados como portadores de sintomas de desconforto relacionados com sua condição neurológica com duração e intensidade muito variáveis Devido ao comprometimento cognitivo muitas vezes os sintomas são avaliados indireta mente por meio da percepção de familiares e cuidadores 31 Isso traz algumas dificuldades para a equipe de Cuidados Paliativos com relação ao manejo adequado de sintomas em geral as condições neurológicas apresentam curso de evolução longo e raramente conseguimos identificar claramente quando se inicia a fase final da doença os sintomas são variados e muitos pacientes apresentam disfunção cognitiva compor tamental ou de comunicação além de déficits físicos Nessa realidade fica muito difícil avaliar a diferença entre disfasia e déficit cognitivo levando a equipe de Cuidados Paliativos a procurar por constantes atualização e treina mento para o manejo desses pacientes É comum a crença de que a reabilitação é uma intervenção de curta duração e rela cionada com um evento pontual Entretanto o manejo da condição crônica de disfun cionalidade é um fator central no sucesso dos cuidados dispensados a esses pacientes determinando a qualidade de assistência oferecida no final de vida24 32 Na doença neu rológica de longa duração a interface entre o neurologista o fisiatra e o Cuidado Paliati vo encontra uma rara clareza de papéis que pode ser transportada para outras condições clínicas facilitando até a discussão entre os serviços provedores dos cuidados convênios seguros e serviço público O Royal College of Physicians renomada instituição inglesa publicou um excelente guideline de cuidados aos pacientes com doenças neurológicas da longa duração48 Um dos propósitos do trabalho foi explorar a interação entre essas especialidades médicas e definir o papel de cada uma delas nos cuidados dos pacientes nessas condições A pesquisa mostrou um alinhamento sobre as contribuições oferecidas por cada especiali dade embora não tenha foco na atuação multiprofissional que se desencadeia a partir da atuação médica O neurologista se envolve na avaliação no diagnóstico e no manejo da doença neurológica o fisiatra coordena a terapia o equipamento e as ações de suporte social e psicológico durante a fase entre o diagnóstico e a morte sem o intuito de realizar o trabalho dos profissionais específicos Os médicos de Cuidados Paliativos são os respon sáveis pelas recomendações dos cuidados terminais e pelo manejo do processo de morte e luto que é realizado por ele e por todos os profissionais da equipe Deficiência mental As pessoas com doenças mentais morrem prematuramente em comparação com a população em geral Apesar disso existem poucos relatórios ou estudos de investigação sobre planejamento dos cuidados no fim de vida desses pacientes Informações básicas sobre as circunstâncias da morte preferências dos cuidados de saúde ou disponibilidade de hospice e serviços de Cuidados Paliativos nunca foram avaliadas para essa população mesmo em países desenvolvidos Essa informação é importante para o planejamento sen sato de práticas procedimentos e orientações a fim de proporcionar qualidade de vida para pessoas com doença mental Acidente vascular encefálico Os principais critérios para indicação de Cuidados Paliativos para pacientes que so freram um acidente vascular encefálico AVE contemplam avaliação nutricional e capa cidade funcional 32 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP escala de performance paliativa PPS vide capítulo sobre avaliação do paciente menor ou igual a 40 como descrito adiante nos próximos itens grau de deambulação permanece principalmente na cama atividadeextensão da doença incapaz de trabalhar incapacidade para autocuidado ingestas alimentar e hídrica diminuídas estado de consciência sonolentoconfuso perda de peso 10 durante os seis meses anteriores perda de peso 75 nos últimos três meses albumina sérica 25 gdl história atual de aspiração pulmonar sem resposta efetiva das intervenções fonoau diológicas Demência Para a doença de Alzheimer DA e outras enfermidades relacionadas a identifica ção de determinadas alterações estruturais e comprometimentos funcionais além das frequentes comorbidades deve servir como base para intervenções e planejamento dos Cuidados Paliativos Em última instância na fase terminal de doença os efeitos combina dos da DA Functional Assessment Staging FAST estádio 743 e qualquer outro estado de comorbidade ou condição secundária delirium úlceras de pressão pneumonia aspirativa devem ser tais que caracterizem um prognóstico de seis meses ou menos19 Esclerose lateral amiotrófica A esclerose lateral amiotrófica ELA é um distúrbio neurodegenerativo de origem des conhecida progressivo e associado à morte do paciente em um tempo médio entre três e quatro anos Sua incidência estimada é de um a 25 indivíduos portadores para cada 100 mil habitantesano com prevalência de 25 a 85 por 100 mil habitantes A ELA tende a progredir de forma linear ao longo do tempo de modo que a taxa global de redução funcional em cada paciente é bastante constante e previsível Embora geral mente se apresente em uma área anatomicamente localizada a identificação do local de apresentação inicial não tem relação com o tempo de sobrevida Em sua fase final de ELA dois fatores são cruciais para determinar o prognóstico a capacidade de respirar e em menor medida a capacidade de deglutição19 No Quadro 4 encontramos as indicações de Cuidados Paliativos para ELA Considera se que um paciente está em fase terminal de ELA quando apresenta uma das situações que se seguem dentro dos últimos 12 meses Considerações especiais Alguns pacientes idosos apresentam condições de fragilidade intensa sem diagnóstico específico mas que parecem estar em declínio progressivo de vitalidade e aparentemente desenvolvendo trajetória previsível em direção à morte dentro dos próximos meses Para esses pacientes a indicação de Cuidados Paliativos é importante com o objetivo de atingir a condição de bemestar global Indicações nãoconvencionais para Cuidados 33 Quadro 4 Indicações de Cuidados Paliativos para pacientes com ELA Capacidade respiratória diminuída conforme critérios Capacidade vital inferior a 30 do normal Significativa dispneia em repouso Necessidade de oxigênio suplementar em repouso Paciente recusa ventilação artificial Outros critérios para indicação de Cuidados Paliativos Progressão para deambulação dependente de cadeira de rodas Dificuldade para falar discurso pouco inteligível ou ininteligível Progressão da dieta normal para pastosa Progressão de dependência na maioria ou em todas as principais AVDs ou necessidade de assistência para todas as AVDs Comprometimento nutricional crítico Ingestão de nutrientes e fluidos insuficientes para sustentar a vida Perda de peso continuada Desidratação ou hipovolemia Ausência de métodos de alimentação artificial Complicações com risco de vida Pneumonia aspirativa recorrente Infecção do trato urinário superior Sepse Febre recorrente após a terapia antibiótica ELA esclerose lateral amiotrófica AVDs atividades da vida diária Paliativos como a síndrome da fragilidade incluem indivíduos idosos com comprometi mento funcional progressivo perda de peso progressiva e que podem ter várias doenças crônicas simultâneas por exemplo hipertensão arterial doença coronariana diabetes mas sem condição fatal iminente Eles podem ter tido uma aceleração recente dos declínios cognitivo e funcional ou ter tomado decisão de não prosseguir com o tratamento agressivo devido a idade avançada má saúde geral estado cognitivo ou custos excessivos Em pacientes idosos uns dos mais sensíveis nessas condições da síndrome da fragili dade a perda de peso inexplicável de 10 ao longo de um período de seis meses ou um IMC 22 kgm2 indica Cuidados Paliativos A combinação de perda de peso progressiva e dificuldades com as atividades da vida diária AVDs é importante preditor de mortalidade em seis meses geralmente mais re levante do que diagnóstico estado mental ou admissão em UTI19 Se essas condições estiverem presentes a comunicação adequada com esses pacientes e suas famílias pode facilitar o planejamento das diretrizes avançadas Isso reduz muito o estresse causado pelas condições de agudização e intercorrências clínicas nesses indivíduos O Quadro 5 resume as indicações de Cuidados Paliativos 34 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Referências 1 ADDINGTONHALL J FAKHOURY W MCCARTHY M Specialist palliative care in nonmalignant disease Palliat Med v 12 p 41727 1998 2 ALMAGRO P et al Mortality after hospitalization for COPD Chest v 121 n 5 p 14418 2002 3 AMERICAN HEART ASSOCIATION Heart and Stroke Statistics 2006 Update Dallas American Heart Association 2005 Disponível em httpwwwamericanheartorg 4 ANTHONISEN N R WRIGHT E C HODGKIN J E Prognosisin chronic obstructive pulmonary disease Am Rev Respir Dis v 133 n 1 p 1420 1986 Quadro 5 Considerar a consulta sobre Cuidados Paliativos para pacientes com critérios de terminalidade de suas doenças de base26 Câncer Qualquer paciente com câncer metastático ou inoperável Doenças cardíacas Sintomas de ICC durante o repouso FE 20 Uma nova disritmia Ataque cardíaco síncope ou AVC Idas frequentes ao PS devido aos sintomas Doenças pulmonares Dispneia durante o repouso Sinais ou sintomas de insuficiência cardíaca direita Saturação de O2 88 pCO2 50 Perda de peso nãointencional Demência Incapacidade para andar Incontinência Menos de seis palavras inteligíveis Albumina 25 ou menor ingestão por via oral Idas frequentes ao PS Doenças hepáticas TP 5 s Albumina 25 Ascite refratária Peritonite bacteriana espontânea Icterícia Desnutrição ou perda de massa muscular Doenças renais Não candidato à diálise Depuração da creatinina 15 mlmin Creatinina sérica 6 Síndrome da fragilidade Idas frequentes ao PS Albumina 25 Perda de peso nãointencional Úlceras de decúbito Confinamento ao leitodomicílio ICC insuficiência cardíaca congestiva FE fração ou ejecção AVC acidente vascular cerebral PS prontosocorro pCO2 pressão parcial de CO2 TP tempo de protrombina 35 5 BARDY G H et al Amiodarone or an implantable cardioverterdefibrillator for congestive heart failure N Engl J Med v 352 p 22537 2005 6 BERGER R et al Btype natriuretic peptide predicts sudden death in patients with chronic heart failure Circulation v 105 p 23927 2002 7 BOUVY M L et al Predicting mortality in patients with heart failure a pragmatic approach Heart v 89 p 6059 2003 8 BURROWS B EARLE R H Prediction of survival in patients with chronic airway obstruction Am Rev Respir Dis v 99 n 6 p 86571 1969 9 CHRISTAKIS N A LAMONT E B Extent and determinants of error in doctors prognoses in terminally ill patients prospective cohort study BMJ v 320 p 46972 2000 10 CLAESSENS M T et al Dying with lung cancer or chronic obstructive pulmonary disease insights from SUPPORT Study to Understand Prognoses and Preferences for Outcomes and Risks of Treatments J Am Geriatr Soc v 48 suppl 5 p S14653 2000 11 COHN J N et al Acomparison of enalapril with hydralazineisosorbide dinitrate in the treatment of chronic congestive heart failure N Engl J Med v 325 p 30310 1991 12 BYOCK I Improving palliative care in intensive care units identifying strategies and interventions that work Crit Care Med v 34 suppl 11 S3025 2006 13 DADOS DE MORTALIDADE BRASIL Disponível em httpw3datasusgovbrdatasusdatasus 14 DAUBERT J P et al Predictive value of ventricular arrhythmia inducibility for subsequent ventricular tachycardia or ventricular fibrillation in multicenter automatic defibrillator implantation trial MADIT II patients J Am Coll Cardiol v 47 p 98107 2006 15 DAVISON S N et al Nephrologistsreported preparedness for endoflife decisionmaking Clin J Am Soc Nephrol v 1 p 1256 2006 16 ELKINGTON H et al Thelast year of life of COPD a qualitative study of symptoms and services Respir Med v 98 n 5 p 43945 2004 17 EMANUEL L L BONOW R O Libby Braunwalds heart disease a textbook of cardiovascular medicine 8 ed Chapter 30 Care of Patients with EndStage Heart Disease 18 FABERLANGENDOEN K A multiinstitutional study of care given to patients dying in hospitals ethical and practice implications Arc Intern Med v 156 p 21306 996 19 FINE P Hospice referral and care practical guidance for clinicians Disponível em httpcme medscapecomviewarticle487401 20 GUNDA S THOMAS M SMITH S National survey of palliative care in endstage renal disease in the UK Nephrol Dial Transplant v 20 p 392 2005 21 HAUPTMAN P J HAVRANEK E P Integrating palliative care into heart failure care Arch Intern Med v 165 p 3748 2005 22 HOLLEY J L et al The need for endoflife care training in nephrology National survey results of nephrology fellows Am J Kidney Dis v 42 p 813 2003 23 HOLLEY J L Up to date Palliative care in endstage renal disease Disponível em httpwww uptodatecompatientscontenttopicdo 24 JOHNSON J SMITH P GOLDSTONE L Executive summary Evaluation of MS specialist nurses a review and development of the role London and Letchworth South Bank University and MS Research Trust 2001 25 KANNER R E et al Predictors of survival in subjects with chronic air flow limitation Am J Med v 74 n 2 p 24955 1983 26 KINZBRUNNER B M Predicting Prognosis how to decide when endoflife care is needed In KINZBRUNNER B M WEINREB N J POLICZER J 20 Common Problems in EndofLife Care New York McGraw Hill 2001 27 LANDBO C et al Prognostic value of nutritional status in chronic obstructive pulmonary disease Am J Respir Crit Care Med v 160 n 6 p 185661 1999 28 LARSON A M CURTIS J R Integrating palliative care for liver transplant candidates Too Well for Transplant Too Sick for Life JAMA v 295 n 18 p 216876 2006 doi101001jama295182168 29 LEIGH P N et al The management of motor neurone disease J Neurol Neurosurg Psychiatry v 74 suppl 4 p 3247 2003 30 LYNN J et al Living and dying with chronic obstructive pulmonary disease J Am Geriatr Soc v 48 5 suppl p S91S100 2000 31 MAISEL A Btype natriuretic peptide levels diagnostic and prognostic in congestive heart failure 36 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Circulation v 105 p 232831 2002 32 MILLER R G et al Practice parameter the care of the patient with amyotrophic lateral sclerosis an evidencebased review report of the Quality Standards Subcommittee of the American Academy of Neurology ALS Practice Parameters Task Force Neurology v 52 p 131123 1999 33 MURRAY S A et al Dying of lung cancer or cardiac failure prospective qualitative interview study of patients and their carers in the community BMJ v 325 p 92933 2002 34 MURRAY S A BOYD K SHEIKH A Palliative care in chronic illness we need to move from prognostic paralysis to active total care BMJ v 330 p 6112 2005 35 MURTAGH F E M PRESTON M HIGGINSON I Patterns of dyingpalliative care for nonmalignant disease Clin Med v 4 p 3944 2004 36 NATIONAL INSTITUTE FOR CLINICAL EXCELLENCE Guidance on cancer services improving supportive and palliative care for adults with cancer The manual London NICE 2004 37 NATIONAL INSTITUTE FOR CLINICAL EXCELLENCE Multiple sclerosis national clinical guidelines for diagnosis and management in primary and secondary care London Royal College of Physicians 2003 38 NELSON J E DANIS M Endoflife care in the intensive care unit where are we now Crit Care Med v 29 suppl 2 p N29 2001 Review 39 NELSON J E MEIER D E Palliative care in the intensive care unit Part I Journal of Intensive Care Medicine v 14 n 3 p 1309 1999 40 OBRIEN T Neurodegenerative disease In ADDINGTONHALL U M HIGGONSON I J eds Palliative care for noncancerpatients Oxford Oxford University Press p 4453 2001 41 OBRIEN T KELLY M SAUNDERS C Motor neurone disease a hospice perspective BMJ v 304 p 4713 1992 42 POSTMA D S et al Assessment of ventilatory variables in survival prediction of patients with chronic airflow obstruction the importance of reversibility Eur J Respir Dis v 67 n 5 p 36081 1985 43 REISBERG B Functional assessment staging FAST Psychopharmacol Bull v 24 p 65359 1998 44 Royal College of Physicians Palliative care services meeting the needs of patients Report of a working party London RCP 2007 45 SENEFF M G et al Hospital and 1year survival of patients admitted to intensive care units with acute exacerbation of chronic obstructive pulmonary disease JAMA v 274 n 23 p 18527 1995 46 SOLERCATALUNA J J et al Severe acute exacerbations and mortality in patients with chronic obstructive pulmonary disease Thorax v 60 v 11 p 92531 2005 47 STEWART S MCMURRAY J J V Palliative care for heart failure time to move beyond treating and curing to improving the end of life BMJ v 325 p 9156 2002 48 TURNERSTOKES L et al Longterm neurological conditions management at the interface between neurology rehabilitation and palliative care NATIONAL Guidelines March 2008 Disponível em http wwwrcplondonacukpubscontents55a60dba3ba6429c8d2db1f178513b2bpdf 49 VOLTZ R BORASIO G D Palliative therapy in the terminal stage of neurological disease J Neurol v 244 suppl 4 p S210 1997 50 WATANABE J et al Accumulation of risk markers predicts the incidence of sudden death in patients with chronic heart failure Eur J Heart Fail v 8 p 23742 2006 51 WEEKS J C et al Relationship between cancer patients predictions of prognosis and their treatment preferences JAMA v 279 p 170914 1998 52 YOHANNES A M BALDWIN R C CONNOLLY M Mortality predictors in disabling chronic obstructive pulmonary disease in old age Age Ageing v 31 n 2 p 13740 2002 37 Avaliação do paciente sob Cuidados Paliativos mAriA Goretti sAles mACiel Introdução Um dos paradigmas da medicina paliativa no contexto atual é afirmar que a morte é parte da vida e fenômeno fisiológico que quando inicia seu processo cursa de forma irreversível O desafio é a boa avaliação do doente além da identificação de parâmetros que apoiem de formas científica e clínica o diagnóstico desse processo Cuidados Paliativos e medicina paliativa requerem conhecimento técnico refinado aliado à percepção do ser humano como agente de sua história de vida e determinante do seu próprio curso de adoecer e morrer Valorizamse as histórias natural da doença pessoal de vida e as reações fisiológicas emocionais e culturais diante do adoecer Pro movemse uma atenção dirigida para o controle de sintomas e o bemestar do doente e de seu entorno Os familiares precisam compreender a evolução da doença e da cadeia de acontecimentos que levará ao evento final É por essa questão que há necessidade de uma prática altamente individualizada Medicina paliativa não é medicina de protocolos clínicos mas de princípios e como tal deve partir da prerrogativa de que a melhor ferramenta para a boa paliação de sintomas é a avaliação do paciente Independentemente da modalidade de atendimento em regime de internação ou am bulatorial a avaliação do paciente deve conter elementos fundamentais que possibilitem a compreender quem é a pessoa doente o que facilita identificar preferências e dificul dades qual a cronologia da evolução de sua doença e os tratamentos já realizados as necessidades atuais e os sintomas o exame físico os medicamentos propostos as demais decisões clínicas e a impressão a respeito da evolução do prognóstico e das expectativas em relação ao tratamento proposto As evoluções subsequentes devem registrar o impacto do tratamento proposto a ava liação dos sintomas o exame físico os resultados de eventuais exames e as novas propos tas assim como as informações trocadas com o paciente e seus familiares A conclusão do caso clínico deve resumir os principais fatos da internação e quando for o caso estabelecer um plano de cuidados que contemple as necessidades do doente nas próximas semanas até a próxima vista ou consulta No caso de óbito deve constar o relato sucinto das últimas horas de vida Os principais elementos da avaliação clínica do doente estão relacionados a seguir Dados biográficos Devem conter nome e forma como gosta de ser chamado sexo e idade estado marital filhos e netos se os tiver trabalho que realizou por mais tempo ou com o qual mais se identificou 38 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP local de nascimento e região de moradia com quem mora e por quem é cuidado a maior parte do tempo religião e crenças o que gosta de fazer o que sabe sobre sua doença e o quanto quer saber Esses dados podem ser colhidos com o doente em conversa aparentemente informal para que se possa estimulálo a descreverse e para que permita a percepção de quem é Se algo na conversa chamar a atenção do profissional deve ser descrito Exemplo Maria de Fátima 56 anos casada por 25 anos e divorciada há cinco Três filhas 29 25 e 20 anos e duas netas 5 e 3 anos Professora do ensino fundamental aposentada há dois anos gosta de cozinhar e cuidar das netas Nasceu em Minas mora na Aclimação com as duas filhas mais novas é católica praticante e muito religiosa Sabe de sua doença e da gravidade mas tem fé na possibilidade de cura Cronologia da doença atual e tratamentos realizados Tratase do registro da doença de base com a época mês e ano do diagnóstico e o tratamento realizado no mesmo período Em seguida a sequência de diagnósticos secundários à doença de base com época e tratamentos Registrar também outras complicações relacionadas com o quadro principal e os diagnósticos nãorelacionados com a doença em questão ou preexistentes Exemplo Câncer de mama outubro1998 mastectomia radioterapia quimioterapia metástase óssea maio2007 radioterapia metástases pulmonar e pleural setembro2008 quimioterapia pleurodese metástase para o sistema nervoso central SNC atual neurocirurgia radioterapia finalizada há uma semana trombose venosa profunda de membro inferior direito MID janeiro2009 anticoagulantes outros hipertensão leve controlada De forma sucinta a cadeia de eventos está clara e indica a evolução da doença os recursos terapêuticos usados e os outros diagnósticos que precisam ser observados Avaliação funcional A avaliação funcional em Cuidados Paliativos é fundamental para a vigilância da curva evolutiva da doença e se constitui em elemento valioso na tomada de decisões na previsão de prognóstico e no diagnóstico da terminalidade Existem algumas escalas de avaliação funcional que podem ser usadas em Cuidados Paliati vos Os serviços de oncologia costumam usar a escala de Karnofsky elaborada nos anos 1940 A escala de Karnosfsky ainda é muito usada em oncologia para a tomada de decisões9 10 Em 1996 o Victoria Hospice no Canadá desenvolveu um instrumento de avaliação de performance com base no Karnosfky e adaptado aos Cuidados Paliativos Tratase da Palliative Performance Scale PPS Em 2002 aperfeiçou a escala agregando texto de instruções e definições1 11 39 A escala possui 11 níveis de performance da 0 a 100 divididos em intervalos de 10 ou seja não existem valores intermediários A PPS deve ser utilizada todos os dias para pacientes internados em todas as consul tas ambulatoriais e visitas domiciliares A tradução oficial para o português está sendo desenvolvida por profissionais da Aca demia Nacional de Cuidados Paliativos ANCP em São Paulo O Quadro 1 mostra a tradução preliminar brasileira Quadro 1 Palliative Performance Scale PPS Deambulação Atividade e evidência de doença Autocuidado Ingesta Nível da consciência 100 Completa Atividade normal e trabalho sem evidência de doença Completo Normal Completo 90 Completa Atividade normal e trabalho alguma evidência de doença Completo Normal Completo 80 Completa Atividade normal com esforço alguma evidência de doença Completo Normal ou reduzida Completo 70 Reduzida Incapaz para o trabalho doença significativa Completo Normal ou reduzida Completo 60 Reduzida Incapaz para hobbies trabalho doméstico doença significativa Assistência ocasional Normal ou reduzida Completo ou períodos de confusão 50 Maior parte do tempo sentado ou deitado Incapacitado para qualquer trabalho doença extensa Assistência considerável Normal ou reduzida Completo ou períodos de confusão 40 Maior parte do tempo acamado Incapaz para a maioria das atividades doença extensa Assistência quase completa Normal ou reduzida Completo ou sonolência confusão 30 Totalmente acamado Incapaz para qualquer atividade doença extensa Dependência completa Normal ou reduzida Completo ou sonolência confusão 20 Totalmente acamado Incapaz para qualquer atividade doença extensa Dependência completa Mínima a pequenos goles Completo ou sonolência confusão 10 Totalmente acamado Incapaz para qualquer atividade doença extensa Dependência completa Cuidados com a boca Sonolência ou coma confusão 0 Morte Fonte Victoria Hospice Society J Pall Care v 9 n 4 p 2632 Tradução livre de Maria Goretti Maciel Ricardo Tavares de Carvalho 40 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A PPS tem sido usada na tomada de decisões em Cuidados Paliativos e parece ter algum valor prognóstico quando associada a outros sintomas como edema delirium dispneia e baixa ingesta alimentar68 12 A construção de um gráfico diário a partir dos registros da PPS tem ajudado na compre ensão da evolução da doença em pacientes internados na enfermaria de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual HSPE desde o início de janeiro de 2009 Exemplo O sr A S 89 anos com diagnóstico de carcinoma espinocelular de esôfago era acompanhado no domicílio e o último registro de PPS era de 60 em 4 de janeiro uma semana antes da internação hospitalar que durou 19 dias No prontosocorro em 12 de janeiro a queixa inicial era de confusão e sonolência e PPS de 40 atribuídos inicial mente à infecção do trato urinário No primeiro dia na enfermaria fez quadro de delirium agitado seguido de torpor caindo a PPS para 10 O diagnóstico definitivo foi de hiper calcemia Iniciado o tratamento houve resposta razoável elevando a PPS para 30 Após sete dias de tratamento e ajustes terapêuticos começou a recuperar desempenho funcio nal e retornou a 50 patamar ideal para alta hospitalar em 29 de janeiro Figura 70 Domicílio PS Internação 15jan 16jan 17jan 18jan 19jan 20jan 21jan 22jan 23jan 24jan 25jan 26jan 27jan 28jan Alta 60 50 40 30 20 10 0 PPS Figura PPS diária paciente A S 89 anos CEC de esôfago Fonte Registros diários enfermaria de Cuidados Paliativos HSPE 2009 PS prontosocorro PPS Palliative Performance Scale Avaliação de sintomas Objetivo e tarefa dos Cuidados Paliativos a avaliação de sintomas deve ser realizada de forma sistemática na admissão nas evoluções diárias consultas ambulatoriais e visitas domiciliares A Edmonton Symptom Assessment Scale ESAS desenvolvida no Canadá é um ins trumento valioso nessa tarefa Consiste num pequeno questionário com nove sintomas determinados e um décimo de livre escolha do paciente que passará a ser registrado dia riamente A cada sintoma solicitase ao paciente que atribua uma nota de 0 a 10 sendo 41 0 a ausência do sintoma e 10 a sua maior intensidade O profissional deve se manter im parcial e permitir que o paciente expresse a sua própria avaliação A ESAS inclui sintomas objetivos e subjetivos Na impossibilidade de o paciente estabelecer uma comunicação coerente dementados por exemplo a ESAS pode ser preenchida por seu cuidador com base na observação cuidadosa do seu comportamento e nesse caso os sintomas subjeti vos cansaço depressão ansiedade e malestar devem ser deixados em branco24 5 A tradução para o português que apresentamos foi realizada pela Dra Isabel Galriça Neto de Portugal e sua validação no Brasil está em andamento A ESAS deve ser avaliada criteriosamente todos os dias e usada como plataforma para as ações necessárias para o alívio de sintomas usandose todos os recursos necessários para esse fim Quadro 2 Por princípio nenhum questionamento deve ser feito ao paciente se não for utilizado em seu benefício Por isso é que os interrogatórios devem ser breves objetivos e práticos também para a equipe Em Cuidados Paliativos escalas longas e cansativas devem ser evitadas Além da ESAS deve ser realizado o registro livre do motivo principal da consulta ou internação das necessidades do doente e das suas preocupações subjetivas Novas obser vações e elaborações acerca de sua evolução e percepção da doença devem ser sempre registradas Quadro 2 Escala de Avaliação de Sintomas de Edmonton ESAS Avaliação de sintomas Paciente Registro Preenchido por Data Por favor circule o nº que melhor descreve a intensidade dos seguintes sintomas neste momento também se pode perguntar a média durante as últimas 24 horas Sem dor 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior dor possível Sem cansaço 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior cansaço possível Sem náusea 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior náusea possível Sem depressão 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior depressão possível Sem ansiedade 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior ansiedade possível Sem sonolência 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior sonolência possível Muito bom apetite 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior apetite possível Sem falta de ar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior falta de ar possível Melhor sensação de bemestar possível 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Pior sensação de bemestar possível Outro problema 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Fonte Regional Palliative Care Program Capital Health Edmonton Alberta 2003 Traduzido e adaptado ao português por Neto IG 2006 42 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Exames físico e complementares e avaliações de especialistas Os procedimentos clínicos em Medicina Paliativa são os mesmos da prática clínica Porém por princípio o Cuidado Paliativo objetiva o bemestar e o conforto do doente Isso significa que nenhum exame clínico nenhuma coleta de exames ou outra forma de investigação devem ser realizados se não tiverem por objetivo a compreensão necessá ria ao alívio de um sintoma ou ao controle de situação potencialmente reversível Especialmente na fase final da vida nada justifica por exemplo aplicar ao doente um es tímulo doloroso para investigar seu nível de consciência colher exames ou realizar exames de imagem apenas para documentação do caso utilizar placebos ou suspender analgésicos e outros medicamentos agora essenciais para testar nível de consciência no doente Avaliações e procedi mentos especializados que não tragam benefício para o doente não devem ser solicitados Decisões terapêuticas Um prontuário em Cuidados Paliativos deve conter todas as decisões terapêuticas tomadas a partir de uma avaliação clínica medicamentos e doses início ou suspensão de medidas solicitações de exames e avaliações necessidades de intervenções psíquicas necessidades sociais intervenções realizadas ou solicitadas com a família necessidades espirituais efeito esperado das ações Impressão e prognóstico Componentes fundamentais da avaliação em Cuidados Paliativos a impressão acerca do estado em que se encontra o doente a expectativa acerca do tratamento proposto e a impressão prognóstica devem constar na admissão e todas as vezes em que forem modificadas ao longo do tempo Uma forma simplificada de fazer o registro e comunicar o prognóstico é estabelecer prazos horas a dias pacientes com perfil de últimas 48 horas dias a semanas perfil de últimas semanas de vida semanas a meses habitualmente até seis meses de expectativa meses a anos para expectativas superiores a seis meses Plano de cuidados Considerando a possibilidade de trabalho em rede assistencial é fundamental que cada consulta visita ou internação resulte em um plano de cuidados ao paciente e à família Qual quer que seja a fase da doença é fundamental ter clareza do problema das necessidades da evolução em que se encontra e da possibilidade de antever e prevenir novas crises O plano de cuidados deve ser claro o bastante para que o tratamento proposto possa ser continuado por toda a rede assistencial inclusive em unidades de emergência e hos 43 pitais gerais onde o paciente poderá ser atendido por outras equipes O Quadro 3 propõe um modelo de plano de cuidados de preenchimento simples e objeti vo Nele priorizase o registro da identificação do doente do cuidador e do médico responsá vel dos principais diagnósticos da PPS em caso de internações inicial e final da última ESAS das medicações em uso e por fim das recomendações para as próximas semanas Quadro 3 Plano de cuidados Serviço de Cuidados Paliativos Plano de cuidados Nome Cuidador Médico CRM Idade Sexo Prontuário Data Diagnósticos PPS inicial PPS atual 1 2 3 4 5 6 Escala de avaliação de sintomas de Edmonton Medicamentos Dor 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 1 Fadiga 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 2 Náusea 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 3 Depressão 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 4 Ansiedade 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 5 Sonolência 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 6 Falta de apetite 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 7 Falta de ar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 8 Malestar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 9 Outro sintoma 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 10 Recomendações Retorno Profissional PPS Palliative Performance Scale 44 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Exemplo manter curativos das feridas com metronidazol tópico vigiar capacidade de deglutição vigiar sintomas de hipercalcemia ter atenção à filha mais nova e às netas providenciar isenção de transporte para a filha cuidadora Sugestão de impressos Os impressos usados em unidades de Cuidados Palaitivos devem ser simples de fáceis visualização e preenchimento sem omitir informações fundamentais No Anexo 1 há uma ficha de encaminhamento para ser usada por outros serviços ou especialidades para referir pacientes à unidade de Cuidados Paliativos No verso a equipe preenche dados sobre o cuidador e endereços determina a PPS circulando os itens compatíveis e com base na performance determina a forma de atendimen to Pacientes com PPS igual ou superior a 50 podem ser atendidos em unidade am bulatorial Aqueles com PPS entre 30 e 40 devem ser atendidos no domicílio e os com PPS de 20 ou 10 devem ser referidos para atendimento imediato em unida de de internação quando forem portadores de doença rapidamente progressiva O Anexo 2 é composto por uma ficha médica ambulatorial para ser usada na primeira consulta em frente e verso O Anexo 3 é uma sugestão de ficha de prontuário domiciliar com base no plano de cuidados que deve ser renovado a cada visita O verso da ficha é usado para texto livre caso o profissional julgue necessário As fichas estão acessíveis para download no site da ANCP wwwpaliativoorgbr Referências 1 ANDERSON F et al Palliative Performance Scale PPS a new tool J Palliat Care v 12 n 1 p 5 e 11 1996 2 BRUERA E et al The Edmonton Symptom Assessment System ESAS a simple method of the assessment of palliative care patients Journal of Palliative Care v 7 p 69 1991 3 BRUERA E MACDONALD S Audit methods the Edmonton Symptom Assessment In HIGGINSON I ed Clinical audit in palliative care Oxford Radcliffe Medical Press p 6177 1993 4 CAPITAL HEALTH Guidelines for using Edmonton Symptom Assessment System ESAS Capital Health PDF 2001 5 CHANG V T HWANG S S FEUERRMAN M Validation of the Edmonton Symptom Assessment Scale Cancer v 88 n 9 p 216471 2000 6 HEAD B RITCHIE C S SMOOT T N Prognostication in hospice care can the palliative performance scale help Journal of Palliative Medicine v 8 n 3 p 492502 2005 7 LAU F et al Using the Palliative Performance Scale to provide meaningful survival estimates Journal of Pain and Symptom Manegement in press 2009 8 MORITA T et al Validity of the Palliative Performance Scale from a performance scale from a survival perspective J Pain Symptom Manage v 18 n 1 p 23 1999 letter 9 OTOOLE D M GOLDEN A M Evaluating cancer patients for rehabilitation potential West J Med v 155 p 3847 1991 10 SCHAG C C HEINRICH R L GANZ P A Karnofsky performance status revisited reliability validity and guidelines J Clin Oncology v 2 p 18793 1984 45 11 VICTORIA HOSPICE SOCIETY Palliative Performance Scale PPS 2004 12 VIRIK K GLARE P Validation of the Palliative Performance Scale for inpatients admitted to a palliative care unit in Sydney Australia J Pain Symptom Manage v 23 n 6 p 4557 2002 46 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Anexo 1 FICHA DE ENCAMINHAMENTO CUIDADOS PALIATIVOS NOME Idade Sexo Nº prontuário Serviço Médico CRM Diagnóstico principal época Diagnósticos secundários 1 2 3 4 5 6 Tratamentos realizados Necessidades sintomas e cuidados especiais Medicamentos em uso Encaminhar o familiar com esta ficha ao 12º andar Ala Par Cuidados Paliativos 47 Anexo 2 SERVIÇO DE CUIDADOS PALIATIVOS FICHA DE ATENDIMENTO AMBULATORIAL NOME Idade Karnofsky Encaminhamento Acompanhante Data Diagnóstico principal Data Diagnósticos secundários Outros diagnósticos Motivo da consulta Tratamento realizado 48 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Anexo 3 SERVIÇO DE CUIDADOS PALIATIVOS VISITA MÉDICA DOMICILIAR DATA NOME Cuidador Diagnósticos PPS 1 2 3 4 5 6 Avaliação ESAS Escala de Avaliação de Sintomas de Edmonton Medicamentos Sem dor 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 1 Sem cansaço 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 2 Sem náusea 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 3 Sem depressão 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 4 Sem ansiedade 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 5 Sem sonolência 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 6 Muito bom apetite 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 7 Sem falta de ar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 8 Melhor sensação 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 de bemestar possível 9 Recomendações Retorno Médico PPS Palliative Performance Scale 49 Comunicação em Cuidados Paliativos mAriA JúliA PAes dA silvA moniCA mArtins trovo de ArAúJo Sentido da comunicação em Cuidados Paliativos Uma vez que se relacionar é estar com o outro fazendo uso de habilidades de comu nicações verbal e nãoverbal para emitir e receber mensagens12 a comunicação é um elemento fundamental na relação humana e um componente essencial do cuidado O emprego adequado de técnicas e estratégias de comunicação interpessoal pelos profis sionais da saúde é medida terapêutica comprovadamente eficaz permitindo ao paciente compartilhar medos dúvidas e sofrimento contribuindo para a diminuição do estresse psicológico e garantindo a manifestação de sua autonomia2 7 Para os pacientes sob Cuidados Paliativos a comunicação interpessoal e o relaciona mento humano são ressignificados representando a essência do cuidado que sustenta fé e esperança nos momentos mais difíceis que são enfrentados1 O paciente sob Cuidados Paliativos deseja ser compreendido como um ser humano que sofre porque além da dor física possui conflitos existenciais e necessidades que os fármacos ou os aparelhos de alta tecnologia não podem suprir Assim ademais de com partilhar seus medos e anseios relacionandose com seus pares ele necessita sentirse cuidado amparado confortado e compreendido pelos profissionais da saúde responsáveis por ele Expressões de compaixão e afeto na relação com o paciente trazem a certeza de que ele é parte importante de um conjunto o que ocasiona sensação de proteção e consolo além de paz interior6 Para que essas necessidades sejam atendidas e o cuidado ao fim da vida seja bem sucedido é necessário que os profissionais da saúde resgatem a relação interpessoal em pática e compassiva como base para suas ações e condutas Mais do que habilidades técnicas para diagnosticar e tratar além de informações sobre doença e tratamento os pacientes que vivenciam a terminalidade esperam que a relação com os profissionais da saúde seja alicerçada por compaixão humildade respeito e empatia Na prática a imple mentação e a sustentação desses conceitos subjetivos é possível com o uso adequado de habilidades de comunicação O Quadro 1 evidencia o sentido da comunicação interpessoal no cuidado ao final da vida O que precisamos entender sobre comunicação Independente da área de formação básica ou da categoria profissional os profissio nais da saúde têm como base de seu trabalho as relações humanas e por isso precisam aprimorar suas habilidades de comunicação Médicos enfermeiros fisioterapeutas psicó logos e outros especialistas que trabalham com seres humanos em situação de doença e sofrimento principalmente com aqueles que vivenciam a terminalidade necessitam saber não apenas o que mas quando e como falar Precisam até mesmo saber o momento de calar substituindo a frase por um toque afetivo ou potencializar o efeito de um ansiolí 50 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP tico com um bom par de ouvidos estando mais próximo e acessível às reais necessidades dos pacientes Comunicação interpessoal não se resume à troca de mensagens entre duas ou mais pessoas tampouco à mera transmissão de informações Tratase de um processo comple xo que envolve percepção compreensão e transmissão de mensagens por parte de cada sujeito envolvido na interação considerandose contexto cultura valores individuais experiências interesses e expectativas de cada um10 Todo processo de comunicação é constituído por duas dimensões verbal e nãoverbal A verbal é aquela que ocorre por meio de palavras com o objetivo de expressar um pen samento clarificar um fato ou validar a compreensão de algo12 Porém ela é insuficiente para caracterizar a complexa interação que ocorre no relacionamento humano É necessário qualificála oferecerlhe emoções sentimentos e adjetivos para que seja possível perceber e compreender não só o que significam as palavras mas também os sentimentos implícitos na mensagem e é a dimensão nãoverbal do processo de comunicação que permite demonstra ção e compreensão dos sentimentos nos relacionamentos interpessoais A linguagem verbal é qualificada pelo jeito e tom de voz com que as palavras são ditas por gestos que acompanham o discurso olhares e expressões faciais postura corporal distância física que as pessoas man têm umas das outras e até mesmo por roupas acessórios e características físicas Para facilitar o estudo da comunicação nãoverbal propõese classificála12 em paralinguagem cinésica proxêmica características físicas fatores do meio ambiente e tacêsica A paralinguagem referese a qualquer som produzido pelo aparelho fonador e utili zado no processo de comunicação ou seja o modo como falamos Representamna os ruídos a entonação da voz o ritmo do discurso a velocidade com que as palavras são ditas o suspiro o pigarrear o riso e o choro É também chamada paraverbal e confere emoção às informações transmitidas verbalmente Quadro 1 Metas para a comunicação ao final da vida Ao final da vida esperase que uma comunicação adequada permita Conhecer problemas anseios temores e expectativas do paciente Facilitar o alívio de sintomas de modo eficaz e melhorar sua autoestima Oferecer informações verdadeiras de modo delicado e progressivo de acordo com as necessidades do paciente Identificar o que pode aumentar seu bemestar Conhecer seus valores culturais espirituais e oferecer medidas de apoio Respeitarreforçar a autonomia Tornar mais direta e interativa a relação entre profissional da saúde e paciente Melhorar as relações com os entes queridos Detectar necessidades da família Dar tempo e oferecer oportunidades para a resolução de assuntos pendentes despedidas agradecimentos reconciliações Fazer com que o paciente se sinta cuidado e acompanhado até o fim Diminuir incertezas Auxiliar o paciente no bom enfrentamento e na vivência do processo de morte 51 O termo cinésica criado por Ray Birdwhistell precursor no estudo da fala e dos sinais emitidos pelo corpo durante as interações diz respeito à linguagem corporal É ca racterizado por gestos expressões faciais olhar características físicas e postura corporal Conhecer a linguagem do corpo é importante não apenas por trazer informações sobre o outro mas também para o autoconhecimento A proxêmica aborda as teorias que dizem respeito ao uso que o homem faz do espa ço físico dentro do processo de comunicação O neologismo proxêmica foi criado por Edward Hall ao identificar os fatores envolvidos na distância que o indivíduo mantém do outro na interação O toque e todas as características envolvidas são estudados pela cinésica O contato físico é capaz de provocar por meio de seus elementos sensoriais alterações neuro musculares glandulares e mentais Não apenas em caráter técnico e instrumental mas também como forma de oferecer apoio e demonstrar afeto o toque é um instrumento terapêutico valioso na área da saúde12 A comunicação nãoverbal é fundamental para o estabelecimento do vínculo que embasa o relacionamento interpessoal imprescindível na relação entre profissionais da saúde e pacientes1 4 11 13 Com frequência mesmo antes que a interação direta com o paciente aconteça existe um julgamento prévio a respeito do profissional com base na análise de seu comportamento e características nãoverbais expressos nos corredores do hospital ou na interação com os outros colegas E pode ser até nesse momento que o paciente decida se o profissional é ou não digno de sua confiança e se quer ou não ser cuidado por ele sem que palavra alguma seja trocada entre ambos É principalmente por meio da emissão dos sinais nãoverbais do profissional da saúde que o paciente desenvolve confiança e permite que se estabeleça uma relação terapêutica efetiva Assim tanto o comportamento verbal quanto o nãoverbal do profissional devem demonstrar empatia e transmitir segurança conforme evidencia o Quadro 2 Ao cuidar do paciente em processo de morte uma das principais habilidades de co municação necessárias ao profissional é a escuta Ela atenta e reflexiva é um dos mais importantes instrumentos do profissional da saúde que atua em Cuidados Paliativos visto que permite identificar as reais demandas dos pacientes Sentarse ao lado do paciente mostrandose interessado por sua história e disponível para ouvilo e compreendêlo é uma maneira comprovadamente eficaz de assistilo emocional e espiritualmente Ser ouvido é uma importante demanda de quem vivencia a terminalidade4 Quadro 2 Elementos essenciais do comportamento empático Comportamento empático envolve Manter contato com os olhos durante aproximadamente 50 do tempo da interação Ouvir atentamente Permanecer em silêncio enquanto o outro fala utilizando eventualmente meneios positivos Sorrir Manter tom de voz suave Voltar o corpo na direção de quem fala e manter os membros descruzados Utilizar eventualmente toques afetivos em braços mãos ou ombros 52 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quando se utiliza adequadamente a comunicação interpessoal no contexto dos Cui dados Paliativos frequentemente é possível decifrar informações essenciais e dessa for ma diminuir a ansiedade e a aflição de quem está próximo da morte proporcionando mais qualidade ao nosso cuidar e conquistando mais satisfação pessoal O Quadro 3 identifica estratégias de comunicações verbal e nãoverbal que devem ser utilizadas na atenção a pacientes sob Cuidados Paliativos As notícias difíceis como falar a respeito de perdas terminalidade e morte Em um contexto de desenvolvimentos técnico e científico ímpares na história das ciências da saúde em que a percepção de que quase todos os problemas podem ser resol vidos com o uso de aparatos tecnológicos a terminalidade e a morte permanecem como limites ao ser humano Desse modo pacientes familiares e até mesmo os profissionais da saúde evitam falar sobre o tema Criase assim uma situação conhecida como cerca ou conspiração de silêncio9 Essa condição se manifesta com a transmissão de mensagens ambivalentes nas quais o discurso verbal otimista e focado em assuntos diversos e superficiais é contradito pela linguagem nãoverbal que expressa claramente o agravamento da situação Profissionais e familiares por acharem que poderão aumentar o sofrimento e a de pressão evitam falar sobre terminalidade e morte para poupar o paciente que por sua vez visando proteger suas pessoas queridas também evita abordar o assunto Criase as sim uma espécie de isolamento emocional de um lado o paciente e do outro a família todos com sentimentos dúvidas e anseios semelhantes porém não compartilhados Receber boas informações honestas claras e compassivas é um desejo universal dos pacientes em estado avançado da doença conforme evidencia a literatura3 5 14 16 Em estudo realizado no Brasil com 363 pacientes identificouse que mais de 90 dos entrevistados desejam ser informados sobre suas condições de saúde incluindo eventuais diagnósticos de doenças graves5 Outro estudo europeu16 realizado com 128 indivíduos que tiveram o diagnóstico de câncer incurável revelou que grande parte desses doentes gostaria de ser informada sobre opções de tratamento efeitos colaterais sintomas físicos e como e onde encontrar ajuda e aconselhamento a respeito de dietoterapia cuidados psicossociais e complementares Embora muitos pacientes queiram saber sobre sua condição de saúde eles também têm o direito de não querer receber informações a esse respeito Nesse caso seu desejo precisa ser respeitado e tornase necessário identificar um familiar ou alguém próximo que possa receber as informações e ser o interlocutor A comunicação de notícias difíceis ou más é uma das mais penosas tarefas do pro fissional da saúde Isso porque eles aprendem nos bancos da academia a salvar vidas e buscar a saúde e não a lidar com situações de perdas de saúde vitalidade esperança e morte Assim uma das dimensões em que esse profissional mais almeja desenvolver habilidades é na comunicação de notícias difíceis como informar o diagnóstico de uma doença sem possibilidades de cura a piora irreversível do quadro ou mesmo comunicar a morte para os familiares Uma questão muito frequente é sobre contar ou não ao paciente E à medida que res postas não são encontradas para este questionamento utilizase a mentira piedosa ou o silêncio cheio de significados dúbios Contudo há alternativas para esse tipo de situação 53 Quadro 3 Estratégias para a adequada comunicação ao final da vida Verbais Nãoverbais Repetir a informação pausadamente sempre que for necessário Ouvir reflexivamente Validar a compreensão do que foi falado estimulando comparações Utilizar toque afetivo mãos braços ou ombros Utilizar clareza e sinceridade no que for dito Sorrir Disponibilizar tempo e verbalizar a disponibilidade para interação Utilizar o silêncio Estabelecer opções e apontar diferentes pontos de vista Estar junto com mais frequência presença Oferecer feedback ao que o outro manifesta Manter proximidade física preferencialmente sentandose próximo ao outro Utilizar linguagem coloquial com vocabulário adequado à compreensão do outro Atentar para as próprias expressões faciais Verbalizar disponibilidade para o cuidado e nãoabandono compreensão e aceitação Identificar emoções e sentimentos nas expressões faciais do outro Evitar a conspiração de silêncio não evitar falar sobre o assunto doença terminalidade Manter contato visual Repetir as últimas palavras ditas pela pessoa para estimulála a aprofundar o assunto Atentar para a postura corporal membros descruzados e relaxados orientação do tórax na direção do outro cuidado com gestos excessivos ou que denotam ansiedade Estimular verbalização de medos e angústias Utilizar tom de voz adequado Oferecer reforços positivos elogie as conquistas do outro Atentar para as reações que você provoca no outro Utilizar perguntas abertas para estimular a expressão de sentimentos e valorizar os sentimentos identificados Promover ambiente reservado e tranquilo para uma conversa Estabelecer junto com o paciente metas e planos de ação para atingilas Atentar para sua própria aparência física vestuário adequado asseio Valorizar todas as informações dadas pelo paciente ou seu familiar Evitar ruídos que dispersem a atenção campainha de telefone celular por exemplo 54 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP o uso de habilidades de comunicação pode auxiliar o profissional a modificar o foco da questão de contar ou não para como informar Ao invés da mentira piedosa podese utilizar a sinceridade prudente e progressiva transmitindo ao paciente as informações de acordo com suas condições emocionais de modo gradual e suportável E nesse contexto são essenciais adequadas percepção e in terpretação dos sinais nãoverbais do paciente que permitirão a identificação do estado emocional do doente e mostrarão ao profissional até onde ir naquele momento Ao comunicar notícias difíceis é importante que o profissional mostre atenção empa tia e carinho em seu comportamento e sinais nãoverbais A expressão facial o contato visual a distância adequada e o toque em mãos braços ou ombros ajudam conforme já referido a demonstrar empatia e oferecer apoio e conforto O paciente precisa sentir que por pior que seja sua situação ali se encontra alguém que não o abandonará em quem poderá confiar e que poderá cuidar dele O Quadro 4 traz estratégias para a comunicação progressiva de notícias difíceis Quadro 4 Estratégias para a comunicação progressiva de notícias difíceis Etapas Estratégias Preparese para comunicar Escolha o local de preferência onde haja acomodações para sentar Cuide da privacidade Reserve tempo para a conversa Descubra o quanto o paciente sabe o quanto quer ou aguenta saber Utilize perguntas abertas o que você sabe sobre sua doença O que você teme sobre sua condição Atente aos sinais nãoverbais do paciente durante as respostas Identifique sinais de ansiedade extrema ou sofrimento exacerbado avaliando as condições emocionais do paciente Compartilhe a informação Informe com tom de voz suave porém firme utilizando vocabulário adequado à compreensão do outro Seja claro e faça pausas para que o paciente tenha oportunidade de falar Valide a compreensão fazendo perguntas curtas Utilize o toque afetivo e a proximidade física Verbalize compaixão e solidariedade ao sofrimento do outro Acolha os sentimentos Permaneça junto do paciente Permita e estimule a expressão de sentimentos de modo verbal eou nãoverbal Verbalize disponibilidade para ouvilo Planeje o seguimento Fale concisamente sobre sintomas possibilidades de tratamento e prognósticos Estabeleça junto com o paciente metas a curto e médio prazos e ações para atingilas Verbalize a disponibilidade para o cuidado e o nãoabandono Deixe claro como e onde encontrálo se necessário 55 A comunicação como instrumento terapêutico na identificação das necessidades emocionais e espirituais Independente de idade etnia ou sexo alguns pensamentos e sentimentos são fre quentes a quem vivencia a terminalidade como a preocupação com os familiares que ficam o medo do desconhecido perante a morte o sofrimento intenso no momento da morte e estar sozinho quando tudo isso acontecer que são comuns e geram intenso sofrimento psíquico para o doente Reflexões sobre o processo de revisão de sua vida também são frequentemente realizados e podem trazer angústias para o paciente que tem assuntos inacabados ou conflitos a serem resolvidos Se o paciente ainda é capaz de verbalizar pode haver o desejo de compartilhar com alguém da equipe de saúde ou com familiares os seus sentimentos e anseios E mesmo quando já não é mais possível falar sobre seus anseios o paciente que vivencia a terminalidade demonstra de maneiras nãoverbal e fisiológica seu sofrimento Nesse contexto as palavras mostramse secundárias e a comunicação nãoverbal assume o papel de instrumento do cuidado nessa fase final Os Quadros 5 e 6 evidenciam necessidades espirituais e emocionais ao final da vida e apontam estratégias úteis de comunicação para abordar tais necessidades Quadro 5 Necessidades espirituais expressas de modo verbal eou nãoverbal e estratégias de comunicação úteis para o cuidado ao fim da vida Aspectos espirituais identificados Necessidades relacionadas Estratégias de comunicação Reflexões ou questionamentos sobre o significado da vida Construir um sentido para vida e a própria existência Ouvir atentamente estimular reflexão e expressão de sentimentos perguntas abertas Preocupações com o legado resgate dos relacionamentos Agradecer e demonstrar amor a quem lhe é importante perdoar e ser perdoado despedirse Estimular permitir e promover reencontros conversar com familiares flexibilizando horários de visita promover ambiente agradável para essas interações familiares disponibilizar cadeiras ambiente privativo Questionamentos acerca da morte ou o que vem depois dela ressignificação de dor e sofrimento Estreitar relação com o Ser Supremo reafirmar crenças Ouvir atentamente utilizar toque afetivo para demonstração de compreensão e apoio respeitar momentos de silêncio do outro Ações comunicativas eficazes para a família na terminalidade É praticamente impossível cuidar do indivíduo de forma completa sem considerar contexto dinâmica e relacionamento familiar As informações contínuas e acessíveis aos 56 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 7 Ações comunicativas no apoio ao familiar na terminalidade Ações comunicativas eficazes Presença mais frequente Verbalização de disponibilidade compaixão e pesar pela perda Perguntar o que ela precisa ou o que você pode fazer para ajudálo naquele momento Respeitar crenças rituais e expressão de sentimentos e se puder participar junto Utilizar o toque afetivo Quadro 6 Necessidades emocionais expressas de modo verbal eou nãoverbal e estratégias possíveis de comunicação úteis para o cuidado ao fim da vida Aspectos emocionais identificados Necessidades relacionadas Estratégias possíveis de comunicação Sentimentos de tristeza Autoimagem e autoestima alteradas Medo de incapacidade e deterioração física Medo de ter dor Medo de estar sozinho no momento da morte Luto pelas perdas antecipadas vida relacionamentos etc Ser ouvido Ser aceito Ser confortado Ser valorizado Sentirse seguro Exercer sua autonomia Estar sempre acompanhado Ter valores e crenças respeitados Ouvir Utilizar toque afetivo Estar mais presente junto ao paciente Verbalizar nãoabandono Verbalizar disponibilidade e interesse Estimular visitas e permanência de cuidador acompanhante familiares são os elementos essenciais que permitirão uma vivência mais serena e tran quila do processo de morte do doente sem gerar expectativas que não podem ser atendi das Os familiares têm a necessidade de se manter informados sobre o que acontece e o que esperar do processo de morte de seus entes Desse modo uma das necessidades mais proeminentes da família é o estabelecimento de uma comunicação clara honesta e mais frequente com os membros da equipe que cuidam do paciente8 A metanálise de vários estudos sobre as necessidades de um familiar do paciente gra vemente enfermo em iminência de morte aponta que ele deseja sentirse útil no cuidado de seu ente entender o que está sendo feito por ele e o porquê ser informado acerca de mudanças nas condições clínicas e proximidade de morte ser assegurado do conforto do doente poder expressar suas emoções ter seus sentimentos compreendidos e ser confor tado encontrando algum significado na perda da pessoa amada15 Assim informações e orientações simples e claras nesse momento são extremamente benéficas aos membros da família como o estímulo para a verbalização de sentimentos e a escuta Quadro 7 57 Considerações finais Relacionarse com o outro é essencial para a vida porque confirma a existência do homem e fundamenta sua experiência humana Por meio dos relacionamentos os seres humanos compartilham experiências comuns fortalecendo seus elos e revelando simi laridades anseios e necessidades Na terminalidade permitem que não antecipemos a morte de alguém à medida que continuamos ouvindo e respeitando suas necessidades e desejos Para o profissional atento a comunicação em Cuidados Paliativos o questiona sobre a própria vida e lhe permite redirecionála quando necessário Referências 1 ARAÚJO M M T Quando uma palavra de carinho conforta mais que um medicamento necessidades e expectativas de pacientes sob cuidados paliativos Dissertação Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo São Paulo 2006 2 ARAÚJO M M T SILVA M J P Comunicandose com o paciente terminal Rev Soc Bras Cancer v 6 n 23 p 1620 2003 3 ASPINAL F et al What is important to measure in the last months and weeks of life a modified nominal group study International Journal of Nursing Studies v 43 n 4 p 393403 2006 4 CARVALHO M V B O cuidar no processo de morrer na percepção das mulheres com câncer uma atitude fenomenológica Tese Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo São Paulo 2003 5 GULINELLI A et al Desejo de informação e participação nas decisões terapêuticas em caso de doenças graves em pacientes atendidos em um hospital universitário Rev Assoc Med Bras v 50 n 1 p 417 2004 6 HAWTHORNE D L YURKOVICH N J Human relationship the forgotten dynamic in palliative care Palliative Support Care v 1 n 3 p 2612650 2003 7 HIGGINSON I CONSTANTINI M Communication in endoflife cancer care a comparison of team assessment in three European countries Journal of Clinical Oncology v 17 n 20 p 367482 2002 8 KIRCHHOFF K T SONG M K KEHL K Caring for the family of the critically ill patient Critical Care Clinics v 20 45366 2004 9 KÓVACS M J Comunicação nos programas de cuidados paliativos In PESSINI L BERTACHINI L Humanização e cuidados paliativos São Paulo Loyola 2004 10 LITTLEJOHN S W Fundamentos teóricos da comunicação humana Rio de Janeiro Guanabara Koogan 1988 11 SILVA M J P Comunicação com pacientes fora de possibilidades terapêuticas reflexões Mundo Saúde v 27 n 1 p 6470 2003 12 SILVA M J P Comunicação tem remédio a comunicação nas relações interpessoais em saúde São Paulo Gente 1996 13 STEINHAUSER K E et al Factors considered important at the end of life by patients family physicians and other care providers JAMA v 284 n 19 p 247682 2000a 14 STEINHAUSER K E et al In search of a good death observations of patients families and providers Annals of Internal Medicine v 132 n 10 p 82532 2000b 15 TROUG RD et al Recommendations for endoflife care in the intensive care unit The Ethics Committee of the Society of Critical Care Medicine Critical Care Medicine v 29 n 12 p 233248 2001 16 VOOGT E et al Information needs of patients with incurable cancer Support Care Cancer v 13 n 11 p 9438 2005 58 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Modalidades de atuação e modelos de assistência em Cuidados Paliativos luís FernAndo rodriGues Introdução Nos últimos 10 anos os Cuidados Paliativos têm se disseminado fortemente em todo o mundo e no nosso país não tem sido diferente O contraste que observamos no entanto diz respeito justamente aos modelos de assistência empregados nos diversos países para atender à necessidade dos cuidados em fim de vida Na Europa a referência aos hospices como locais de cuidado intensivo na terminalidade entendendo intensivo como presença intensa junto ao paciente visando execução de reavaliações e ajustes constantes de me didas para alívio de sofrimento e não emprego de maquinário com tecnologia avançada evidencia o quão diferente a organização dos serviços pode ser Desde o cuidado de nível 1 executado por equipes de saúde da família para necessida des mais básicas até o de nível 3 com equipes capacitadas para resolução de problemas complexos os cenários de atuação são diversificados4 O objetivo deste texto é explorar vantagens e dificuldades para a execução de cuidados em cada um desses cenários Modelos de assistência Hospital Historicamente quando falamos de cuidado de saúde e principalmente quando fa lamos em cuidados em etapa terminal de enfermidade imediatamente nossa mente nos remete ao cuidado hospitalar já que quem está muito doente em nossa cultura deve procurar um hospital E é nesse ambiente que temos visto se desenvolver alguns dos principais serviços de Cuidados Paliativos no Brasil Hospital Emílio Ribas de São Paulo Instituto Nacional do Câncer INCA no Rio de Janeiro Hospital do Servidor Público Es tadual de São Paulo HSPESP Grupo Interdisciplinar de Suporte Terapêutico Oncológico GISTO do Hospital Erasto Gaertner em Curitiba Centro de Estudos e Pesquisas Oncoló gicas CEPON de Florianópolis Hospital do Câncer de Barretos Hospital Costa Cavalcanti de Foz do Iguaçu Hospital do Câncer de Londrina entre tantos outros serviços que se multiplicam Existe também esse serviço no Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo HSPMSP Ele atua em espaço físico fora do hospital sendo algo mais próximo do modelo de hospice existente na Europa O ambiente hospitalar com suas peculiaridades faz com que seja buscado prioritariamente como um ambiente de cuidados em fim de vida No Quadro 1 estão as vantagens e desvantagens desse ambiente Uma das maiores desvantagens do ambiente hospitalar é o fato de o paciente estabe lecer associação com procedimentos invasivos e por vezes dolorosos como punções ve nosas ou arteriais sondagens urinárias nasogástricas etc drenagens e intubação num momento da vida em que importantes são o conforto e o alívio dos sintomas A existência 59 de uma unidade de Cuidados Paliativos em um hospital pode dar a impressão aos outros pacientes e familiares que é uma unidade para moribundos o que não corresponde à rea lidade pois o cuidado de fim de vida é apenas um dos aspectos dos Cuidados Paliativos podendo fazer com que desta forma o nível de ansiedade do paciente possa aumentar significando piora do controle dos sintomas psíquicos Quadro 1 Vantagens e desvantagens do cuidado hospitalar2 VANTAGENS Profissionais disponíveis 24 horas Arsenal medicamentoso disponível Logística adaptada ao ambiente DESVANTAGENS Horários para visitas restritos Número de acompanhantes restrito Pacientes sob Cuidados Paliativos entre pacientes com outros diagnósticos hospital geral Pacientes sob Cuidados Paliativos entre pacientes em outras etapas de doença Unidade exclusiva para Cuidados Paliativos pode dar a má impressão de que é unidade para moribundos Proporção pacientesfuncionário alta diminuindo o tempo disponível para pacientes Domicílio Quando os profissionais conseguem conduzir seu mister de tratar os pacientes fora de possibilidade terapêutica de cura e dentro da ótica dos Cuidados Paliativos de maneira ótima abordando de forma franca honesta e verdadeira as questões relativas a diagnós tico prognóstico e planejamento de cuidados por vezes o paciente solicita os cuidados em sua própria residência Isso lhe confere mais conforto e serenidade além de poder garantir sua autonomia Embora possa parecer tendencioso defender o domicílio como local preferencial de cui dados por enfatizarmos os aspectos mais subjetivos do tratamento nesse ambiente deve mos avaliálo de maneira crítica e observar seus prós e contras Quadro 21 Uma das grandes vantagens observadas é o fato de permitir ao indivíduo ter as suas necessidades atendidas na medida de suas preferências sem a necessidade de seguir a ri gidez de regras e horários do hospital6 Simbolicamente o domicílio representa o retorno ao ventre materno local de aconchego calor e proteção situações que são procuradas pelas pessoas portadoras de doença ameaçadora da vida e que se encontram vulneráveis Como disse Rubem Alves a morte é o parto ao contrário e para se fazer o caminho inverso é necessário retornar ao útero Como isso é fisicamente impossível a simbologia do lar visto como um ambiente protetor se encaixa perfeitamente nessa observação No entanto para atingirmos o sucesso no atendimento domiciliar com o enfoque paliativo é necessário reunir uma série de condições que propiciará um cuidado eficaz como podemos verificar no Quadro 3 É importante destacar que para essa modalidade 60 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 3 Critérios para inclusão no atendimento domiciliar6 Ter diagnóstico definido Ter um plano terapêutico definido e registrado Residir em domicílio que ofereça as condições mínimas para higiene luz e água encanada Ter cuidador responsável e capaz de compreender as orientações dadas pela equipe Desejo eou permissão expressa para permanecer no domicílio dados pelo paciente ou familiar no impedimento desse Quadro 2 Vantagens e desvantagens do cuidado domiciliar VANTAGENS Atender as necessidades conforme a preferência do paciente Maior sensação de conforto e proteção Disponibilidade dos cuidadores direcionada totalmente ao paciente DESVANTAGENS Dependendo da forma como o serviço está estruturado a disponibilização de drogas pode não ser imediata Residir o paciente longe de recursos de saúde Dificuldade na obtenção da declaração de óbito para pacientes que optam por morrer em casa de atenção a anuência do paciente eou da família é extremamente importante e que apesar de ser possível que o óbito aconteça em casa é necessário checar se paciente e família conseguirão desenvolver a capacidade de lidar com tal situação durante a evolu ção do período de cuidado Modalidades de assistência3 Câncer A história dos Cuidados Paliativos se iniciou com o câncer quando Cicely Saunders cuidou de seu amigo David Tasma e acompanhou a trajetória de dor e sofrimento pelo qual ele passou antes de morrer Daí surgiu a sua ideia de agregar os conhecimentos nas várias áreas do saber científico e empregálos no auxílio daqueles que sofriam até morrer O grande dilema ético nessa situação é em que momento interromper os tratamentos dirigidos ao tumor e começar a redirecionálos para o sofrimento em seu sentido mais amplo5 Então a medicina logo percebeu que essa filosofia de cuidados poderia se esten der a outros grupos de doenças 61 Doença pulmonar obstrutiva crônica DPOC Em recente levantamento não publicado o Sistema de Internação Domiciliar SID da Secretaria Municipal de Saúde de Londrina evidenciou em 384 pacientes acompanhados no ano de 2008 aproximadamente 14 de portadores de DPOC segundo grupo de doen ças depois das neoplasias número semelhante a outros levantamentos Dispneia tosse e ansiedade são sintomas frequentes nesse grupo que devem ser abordados de forma eficaz por equipe devidamente capacitada Insuficiência cardíaca congestiva ICC É outro grupo frequente muito associado em nosso país a doença de Chagas hiper tensão arterial HA nãocontrolada e diabetes As internações hospitalares pela des compensação dessa condição contribuem para as altas taxas de ocupação hospitalar de maneira repetitiva Esse grupo também pode ser alvo dos Cuidados Paliativos Insuficiência renal crônica IRC Também uma consequência da HA e do diabetes mal controlados encontra na terapia renal substitutiva um modo de prolongar a vida dos pacientes portadores dessa condição No entanto assim como o câncer apresenta uma etapa terminal principalmente aquele paciente que não consegue o transplante e evolui para uma situação de fim de vida Existem trabalhos europeus que exploram as questões relativas à suspensão da diálise e à condução do paciente de forma paliativa Doenças neurológicas degenerativas Com o envelhecimento da população aumentou a incidência das patologias degene rativas mormente Alzheimer e Parkinson são doenças que não têm evolução tão ace lerada como o câncer mas que também têm sua etapa terminal O controle da dor da obstipação da insônia e das crises de agitação psicomotora é o maior desafio no grupo de pessoas acometidas por essas doenças Cuidado Paliativo na unidade de terapia intensiva UTI Parece contraditória essa abordagem pois os pacientes com doença avançada e pró ximos da morte não devem ser encaminhados e manejados em uma UTI mas todos aque les que precisarem de UTI terão o direito de receber Cuidados Paliativos As condições crônicas não devem a priori ser cuidadas em ambiente de terapia intensiva embora os cuidados que eles requeiram sejam intensivos no sentido de proximidade intensa do profissional e não em intensidade de verificação de sinais e medidas para sustentação da vida Já os pacientes que tiverem critérios para terapia intensiva podem evoluir para uma situação de nãoreversibilidade e devem ter suas dores aliviadas A família deverá ser abordada e auxiliada na elaboração do luto Cuidado Paliativo em pediatria Situação das mais desafiadoras e difíceis exige do pediatra experiente que cuida de crianças com critérios para Cuidados Paliativos toda sua habilidade para lidar com a disrupção do binômio mãefilho A morte da criança é difícil de ser aceita não apenas por 62 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP mãe e familiares mas também pela equipe de profissionais que deve ser cuidadosamente preparada para trabalhar nesse cenário especial Referências 1 DOYLE D et al The Oxford Textbook of Palliative Medicine Oxford University Press 3rd ed 2006 2 DUNLOP R HOCKLEY G M Hospital based palliative care teams Oxford University Press 1st ed 1998 3 EMANNUEL L LIBRACH L Palliative care core skills and clinical competences Saunders Elsevier 2007 4 MACIEL M G S et al Critérios de qualidade para os cuidados paliativos no Brasil Academia Nacional de Cuidados Paliativos 2007 5 PALMER E HOWARTH J Palliative care for the primary care team quay books 2005 6 RDC 11 de 26 de Janeiro de 2006 ANVISA Publicada no DOU de 30012006 63 Cuidado Paliativo em pediatria sílviA mAriA de mACedo bArbosA Epidemiologia da morte em pediatria A morte em pediatria é um evento nãonatural e normalmente nãoesperado em bora seja uma realidade inquestionável Com os avanços tecnológicos associados ao progresso da ciência médica cada vez mais crianças vivem com condições clínicas complexas Nos Estados Unidos aproximadamente 55 mil crianças e adolescentes en tre 019 anos morrem anualmente em decorrência dessas condições6 Um terço das mortes ocorre no período neonatal metade no primeiro ano de vida e um quarto entre 15 e 19 anos Na cidade de São Paulo segundo dados levantados no Programa de Apri moramento das Informações de Mortalidade no Município de São Paulo PROAIM as causas de morte por condições clínicas complexas de 0 a 19 anos têm a seguinte apre sentação por ordem de incidência doenças cardiovasculares DCV neurodegenerativas e oncológicas9 O Cuidado Paliativo em pediatria deve ser considerado para uma gama de doenças que evoluem com condições complexas crônicas as quais crônicas são definidas como uma condição médica que apresenta ao menos 12 meses de sobrevivida e envolve o aco metimento de um ou mais sistemas de órgãos que necessitam do atendimento pediátrico especializado4 Várias são as condições em pediatria que podem se beneficiar do Cuidado Paliativo como doenças congênitas incompatíveis com a vida desordens cromossômicas e meta bólicas condições cardíacas complexas e doenças neuromusculares Doenças oncológicas e AIDS podem se beneficiar de intervenções paliativas precoces Devemos porém lembrar que as mortes relacionadas com o câncer têm incidência menor do que as mortes por outras condições nãomalignas4 Quatro são as condições de progressão de doença para a qual os Cuidados Paliativos estão indicados5 6 condições nas quais o tratamento potencialmente curativo falhou doenças oncológicas e cardíacas congênitas graves ou doenças cardíacas adquiridas graves condições nas quais o tratamento intensivo a longo prazo pode se prolongar mas a morte prematura é esperada fibrose cística infecção por HIV desordens gástricas graves ou malformações como gastroquise epidermólise bolhosa grave insuficiência renal em que a diálise e o transplante não são possíveis ou não são indicados imunodeficiências graves e distrofia muscular condições progressivas nas quais o tratamento é quase exclusivamente paliativo mas pode se estender por muitos anos doenças neurodegenerativas doenças metabólicas progressivas anormalidades cromossômicas como as trissomias do 13 ou do 18 e formas graves de osteogênese imperfeita condições neurológicas nãoprogressivas que resultam em alta suscetibilidade às com plicações e morte prematura prematuridade extrema sequelas neurológicas importantes ou de doenças infecciosas lesões cerebrais hipóxicas 64 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A definição da Organização Mundial da Saúde OMS enfatiza o conceito do cui dado total ativo dos pacientes e tem como meta a melhor qualidade de vida possível para eles e suas famílias consistente com os seus valores independentemente da localização do paciente1 7 De uma forma ideal o Cuidado Paliativo é uma interven ção precoce que deve ser instituída no tempo do diagnóstico por meio do curso da terapia curativa Quando o processo de doença não responde mais às intervenções curativas o foco do cuidado passa a ser a maximização da qualidade de tempo que a criança e seus familiares passam juntos enquanto se minimizam o sofrimento e a dor A intervenção paliativa precoce deve ser considerada para todos os pacientes que apresentam condições que colocam a vida em risco Devese sublinhar que a relação entre os Cuidados Paliativos e os cuidados curativos não é de exclusão mú tua Os Cuidados Paliativos não são a filosofia do cuidado que substitui os esforços curativos ou que estendam o tempo de vida Ao contrário a terapia curativa e a que maximiza o conforto e a qualidade de vida devem se sobrepor como componentes do cuidado3 Os mesmos princípios que norteiam os Cuidados Paliativos da população adulta o fazem com os Cuidados Paliativos pediátricos ocorrendo algumas adaptações inerentes à faixa etária O modelo de cuidado integral para oferecer o Cuidado Paliativo a crianças que estejam com a vida em risco ou em condições terminais é o proposto pela Academia Americana de Pediatria AAP2 e com base em cinco princípios respeito à dignidade dos pacientes e suas famílias acesso a serviços competentes e sensíveis suporte para os cuidadores melhora dos suportes profissional e social para os Cuidados Paliativos pediátricos progresso contínuo dos Cuidados Paliativos pediátricos por meio da pesquisa e da educação As intervenções oferecidas pelos Cuidados Paliativos pediátricos englobam três níveis preocupações com o físico como os sintomas dor fadiga agitação náusea vômitos e prurido preocupações psicossociais identificação dos medos e das preocupações da família e da criança com suporte necessário preservação de uma comunicação de qualidade identificação das expectativas e das vivências anteriores e necessidade de suportes com portamental e espiritual preocupações espirituais O adequado manuseio da dor e dos outros sintomas deve ser a pedra fundamental no manejo da criança sob Cuidados Paliativos O suporte e a educação para a família também devem estar presentes na trajetória da doença Os profissionais da saúde responsáveis pelo cuidado devem ser capazes de discutir a possibilidade da morte o potencial de des gastes físico e emocional e as estratégias para essa prevenção A importância do adequado manuseio da dor e dos outros sintomas implica a familia ridade com o uso de estratégias terapêuticas farmacológicas e nãofarmacológicas para o tratamento da dor da dispneia da náusea dos vômitos da sialorreia e das convulsões A consulta à equipe de Cuidados Paliativos pediátricos ou especialistas em dor não deve ser descartada A comunidade pediátrica sofre de uma carência de experiência em lidar com a morte Há nas formações pediátricas geral e específica falta de educação formal em Cuidados Paliativos 65 Quadro 1 Elementos essenciais na abordagem do Cuidado Paliativo pediátrico6 Esfera física Áreas de avaliação Plano Preocupação física Identificação da dor e dos outros sintomas Crie e dissemine os tratamentos farmacológico e nãofarmacológico Medicação de emergência em casa Consulta com a equipe de Cuidados Paliativos se necessário Preocupação psicossocial Identificação dos medos e das preocupações da criança e da família Identificação da forma de reação da criança e dos estilos de comunicação Discussão de experiências prévias sobre a morte e sobre o morrer e outros eventos traumáticos Avaliação de recursos para o suporte do luto Converse de forma honesta Assegure a família e a criança de que não serão abandonados Converse sobre as preocupações sobre os irmãos e o resto da família Ajuste o cuidado às possibilidades de resposta da família e da criança e aos estilos de comunicação Comuniquese com a criança segundo o grau de desenvolvimento Modifique os planos de cuidados e as escolhas com base nas experiências anteriores da criança Encaminhe se necessário a criança e seus familiares para profissionais de saúde mental Planeje o seguimento da família após a morte da criança Garanta à família que não será abandonada Preocupações espirituais Fazer uma avaliação das questões espirituais rever os sonhos da criança esperança valores da vida credos e fé Encaminhe paciente e sua família para o atendimento espiritual adequado Ofereçase se a família quiser para explicar a doença para o responsável pelo atendimento religioso Permita que haja tempo para que a criança e sua família reflitam sobre os significados da vida e os seus propósitos Institucionalmente as barreiras para se oferecer um ótimo Cuidado Paliativo podem ser superadas pelo desenvolvimento e pela implementação de protocolos clínicos e insti tucionais e procedimentos para os Cuidados Paliativos final da vida e cuidados no luto Idealmente esse cuidado deve ser oferecido por uma equipe interdisciplinar na qual se incluem médicos enfermeiros assistentes sociais psicólogos e capelania Essa equipe deve promover a coordenação e a continuidade do cuidado A importância do tratamento da dor e dos outros sintomas no fim da vida deriva da alta prevalência dos sintomas e do sofrimento No último mês de vida 89 das crianças com câncer relatam experiências de uma grande porção de sofrimento de pelo menos 66 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 1 continuação Cuidado avançado Identificação dos responsáveis Discussão da trajetória da doença Identificar as metas do cuidado Itens dos cuidados e das preocupações próximas ao fim da vida Quem toma as decisões Comunique a toda equipe de saúde responsável pelos cuidados o nome do responsável pelas decisões Forneça informações necessárias para o entendimento Estabeleça consenso sobre o que se espera da trajetória da doença Identifique os efeitos da doença na capacidade funcional da criança e na sua qualidade de vida Identifique o tempo provável até a morte Estabeleça se as medidas são curativas incertas ou de conforto primário Comunique as metas para a equipe de saúde Crie ou dissemine os planos do cuidado refletindo as escolhas para intervenções específicas relacionadas com as mudanças no status de saúde Forneça informações antecipadas sobre as mudanças físicas que ocorrem próximo à morte a quem chamar e quem manejará os sintomas da criança Preocupações práticas Estabelecer comunicação e coordenação com a equipe médica Preferências de local de cuidado para a criança e sua família Conhecer domicílio e ambiente escolar da criança Avaliação do status corrente presente e futuro Identifique o coordenador do cuidado e mostre que o contato é sempre possível Insira novos profissionais se necessário para alcançar as metas do cuidado equipe de Cuidados Paliativos Plano de cuidado disponível para toda a equipe Garanta à criança e aos familiares que as metas do cuidado serão alcançadas independentemente do local do cuidado Converse sobre os planos sobre o local da morte contatos na hora da morte Plano de cuidados que leva o ambiente em consideração Tente visitar locais como a escola para promover educação e suporte se possível em parceria com comunidades locais Solicite equipamento hospitalar como cama hospitalar cadeira de rodas e aspirador antecipandose às necessidades da criança 67 um sintoma e 51 das crianças sofrem de três ou mais sintomas10 O manejo intensi vo dos sintomas é prioridade do cuidado e requer avaliação dos sintomas intervenções agressivas reavaliações frequentes e flexibilidade para combinar as diversas modalidades terapêuticas Uma abordagem dos sintomas e do sofrimento no Cuidado Paliativo pediátrico torna se com sentido e efetivo se associada ao processo de reintegração em que as metas de cuidado são constantemente reavaliadas A associação das diversas modalidades terapêu ticas e intervenções tem como objetivo tornar a criança o centro das atenções e não um ser isolado com sintomas A construção de uma abordagem holística em que as diversas dimensões do ser humano física psicológica psicossocial e espiritual são integradas com o objetivo de aliviar o sofrimento e com isso preservar a dignidade Esse é o signifi cado maior de valorizar a vida até o último momento Quadro 2 Medicações utilizadas para controle da dor Droga Dose Intervalo Observações Dor Paracetamol VO 1015 mgkg dose máxima 26 g 66 horas Necrose hepática dosedependente Deficiência de G6PD Dipirona VO ou EV 66 horas Agranulocitose fatal púrpura trombocitopenia anemia aplásica anemia hemolítica rash edemas tremores náuseas vômitos hemorragia gastrointestinal anúria reações alérgicas Hipersensibilidade e discrasia sanguínea Lactentes 10 mgkg 1 g Préescolares 15 mgkg 1 g Escolares 25 mgkg 2 g Adolescentes adultos 2530 mgkg 3 g Ibuprofeno 6 meses 510 mgkg 40 mgkg 66 88 h Irritação gástrica alteração da função plaquetária náuseas vômitos diarreia azia constipação Diástese hemorrágica pós operatório Adultos 200600 mg 66 88 h Naproxeno 2 anos 5 a 7 mgkg 88 h a 1212 h Irritação gastrointestinal plaquetopenia cefaleia tontura vertigem zumbido Diástese hemorrágica pósoperatório com risco de sangramento 68 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 2 continuação Cetoprofeno 1 ano VO 66 h a 88 h Irritação gastrointestinal broncoespasmo plaquetopenia cefaleia tontura diástese hemorrágica pósoperatório com risco de sangramento doentes renais úlceras de estômago ou duodeno 1 a 7 anos 1 mgkg 7 a 11 anos 25 mg 11 anos 50 mg Cetorolaco 2 anos Irritação gastrointestinal Diástese hemorrágica pósoperatório com risco de sangramento lactentes doentes renais úlceras de estômago ou duodeno IV 05 a 08 mgkg 66 h a 88 h IM 1 mgkg Opioide Dose inicial Intervalo entre doses Codeína oral 05 a 1 mgkg 44 h a 66 h 120 mgdose dose máxima Tramadol oral parenteral 07 a 1 mgkg Dose máxima 100 mg dose 400 mgdia 44 h a 66 h Morfina oral ação rápida 02 a 05 mgkg 44 h Morfina parenteral 01 mgkg 44 h Oxicodona oral de liberação lenta 1212 h Metadona oral 01 a 02 mgkg 66 h a 1212 h Metadona parenteral 01 mgkg 66 h a 1212 h Fentanil parenteral 1 mcgkg 1 mcgkgh 11 h ou EV contínuo Fentanil transdérmico 4848 h a 7272 h VO via oral EV endovenosa G6PD glicose6fosfato desidrogenase IV intravenosa IM intramuscular 69 Quadro 3 Medicamentos adjuvantes9 Coanalgésicos Medicamento Dose Comentários Antidepressivos Amitriptilina Dor neuropática contínua com insônia 02 a 05 mgkg 1xd Aumentar 025 mgkg a cada 5 a 7 dias se necessário Analgesia pelo bloqueio da recaptação de serotonina e norepinefrina retarda transmissão do impulso doloroso Auxilia na dor associada à depressão utilize nortriptilina se o paciente estiver sedado Efeitos analgésicos percebidos antes que os antidepressivos Efeitos colaterais boca seca constipação retenção urinária AnticonvulsivAntes Gabapentina Dor neuropática 5 mgkg à noite Aumentar para 2xd no D2 e 3xd no D3 Dose máx 3600 mgd Mecanismo de ação desconhecido Efeitos colaterais sedação ataxia nistagmo tontura Carbamazepina Dor neuropática lancinante Neuropatias periféricas Dor do membro fantasma 6 anos 25 a 5 mgkg 2xd Aumentar 20 mgkgd divididos 2xd a cada semana máx 100 mgd 2xd 6 a 12 anos 5 mgkg 2xd Aumentar 10 mgkgd divididos 2xd a cada semana máx 100 mgdose 2xd 12 anos 200 mg 2xd Aumentar 200 mgd divididos 2xd a cada semana máx 16 a 24 gd Efeito analgésico semelhante ao da amitriptilina Monitorizar níveis séricos para toxicidade Efeitos colaterais pancitopenia ataxia irritação gastrointestinal Ansiolíticos Lorazepam Espasticidade muscular ou ansiedade 003 a 01 mgkg 44 h a 66 h Dose máx 2 mgdose Pode aumentar a sedação se associado a opioides Pode causar depressão com uso prolongado Diazepam 01 a 03 mgkg 44 h a 66 h Dose máx 10 mgdose Hidrato de cloral Agitação 25 a 100 mgkg 66 h Dose máx 1 gdose ou 2 gdia Sem efeito analgésico não causa depressão respiratória Efeito cumulativo Efeitos colaterais irritação gástrica potencialização de anticoagulantes Evitar em neonatos disfunções renal e hepática sedação prolongada 70 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 4 Controle de vômitos e constipação9 Sintoma Medicamento Técnicas nãofarmacológicas Constipação Óleo mineral 1 a 2 colheres de chá por dia Aumentar ingesta hídrica Leite de magnésia 2 anos 05 mlkgdose 1xdia 2 a 5 anos 5 a 15 ml por dia 6 a 12 anos 15 a 30 ml 1xdia 12 anos 30 a 60 ml 1xdia Suco de ameixa farelo de trigo aveia vegetais Lactulose 75 mldia após o café da manhã adulto 15 a 30 ml por dia PEG 1 envelope 548 g diluído em 1 litro de água conservar em geladeira por até 3 dias iniciar com 50 a 100 ml 1 ou 2 vezes ao dia e titular dose até efeito desejado pode ser administrado na sopa ou papa Vômitos Metoclopramida oral IM retal 6 anos 01 mgkgdose 88 h 6 anos 015 mgkgdose 88 h até 10 mg 88 h Relaxamento Respiração profunda e lenta Dimenidrato oral IM IV 125 mgkgdose 66 h 2 a 6 anos máx 75 mgdia 6 a 12 anos máx 150 mgdia 12 anos máx 300 mgdia Ondansetrona oral IV indicado para vômitos por quimioterapia ou radioterapia relatos episódicos de uso para vômitos por outras causas 01 a 015 mgkgdose de 88 h ou 1212 h até 44 h Dose máxima 8 mgdose PEG polietilenoglicol IM intramuscular IV intravenosa Referências 1 AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS COMMITTEE ON BIOETHICS AND COMMITTEE ON HOSPITAL CARE Palliative care for children Pediatrics v 106 Pt 1 p 3517 2000 2 AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS COMMITTEE ON BIOETHICS AND COMMITTEE ON HOSPITAL CARE Palliative care for children Pediatrics v 106 Pt 1 p 35172000 71 3 ANGHELESCU D L OAKES L HINDS P S Palliative care and Pediatrics Anesthesiology Clin N Am v 24 p 14561 2006 4 FEUDTNER C et al Deaths attributed to pediatric complex chronic conditions national trends and implications for supportive care services Pediatrics v 107 n 6 p E99103 2001 5 GOLDMAN A ABC of palliative care special problems of children BMJ v 316 n 7124 p 4952 1998 6 HIMELSTEIN B P et al Pediatric palliative care N Engl J Med v 350 n 17 p 175262 2004 7 LEVETOWN M Compendium of pediatric palliative care Childrens International Project on Palliative Hospice Services ChIPPS Alexandria VA7 National Hospice and Palliative Care Organization 2000 8 OLIVEIRA R A Grupo de trabalhos em cuidados paliativos CREMESP C Cadernos Cremesp Cuidado Paliativo 2008 9 PROAIM Prefeitura de São Paulo 10 WOLFE J et al Symptoms and suffering at the end of life in children with cancer N Engl J Med v 342 n 5 p 32633 2000 72 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Organização de serviços de Cuidados Paliativos mAriA Goretti sAles mACiel Introdução Cuidado Paliativo significa valerse de conhecimento apropriado com objetivos bem determinados e foco na vida até seu último momento É reconhecer a morte como algo inexorável e parte de um processo a ser monitorado e aliviado mas não como um objetivo final O termo hospice que por muito tempo designou a prática dos Cuidados Paliativos no mundo tem origem nas hospedarias medievais que abrigavam peregrinos doentes órfãos e pobres com necessidade de cuidados realizados de forma empírica e caridosa Nos séculos XVIII e XIX instituições religiosas assumiram o papel do cuidado aos en fermos pobres e portadores de doenças incuráveis como o câncer e a tuberculose1 Em meados do século XX a então enfermeira Cicely Saunders trabalhando numa instituições dessas em Londres percebeu que os doentes precisavam de atenção es pecífica de conhecimentos médicos para o alívio da dor e de atenção às necessidades espirituais Decidiu formarse em medicina para desenvolver este conhecimento1 Em 1968 a Dra Cicely Saunders fundou em Londres a primeira instituição voltada para o conceito moderno do cuidado ao doente no final da vida e com isso deu início ao Movimento Moderno de Hospice Em 1975 o Canadá adotou o termo Cuidado Palia tivo para designar a prática clínica associada ao hospice e desde então esse cuidado tem passado por várias discussões e aperfeiçoamento1 Atualmente o termo hospice tem sido mais frequentemente utilizado para designar uma instituição de média complexidade como um hospital especializado na prática dos Cuidados Paliativos e que possui como característica principal a excelência da prática clínica associada ao trabalho muito bem articulado de uma equipe multipro fissional com espaços apropriados para tal fim O objetivo é compreender e assistir as necessidades de doentes portadores de doenças terminais No Brasil a prática dos Cuidados Paliativos é relativamente recente A maioria dos grupos atuais iniciou suas atividades por volta de 2000 com acentuado progresso nos últimos quatro anos4 No entanto a prática ainda carece de regulamentação definições e inserção nas políticas assistenciais tanto no setor público como no privado A medicina paliati va ainda não é reconhecida como especialidade no Brasil o que impede a formação adequada de profissionais Da mesma forma a prática de enfermagem e de todas as demais profissões também não é reconhecida A maioria das equipes trabalha sem educação formal e o conhecimento se baseia nas iniciativas autodidáticas de profis sionais dedicados e nos cursos de curta duração muitas vezes sem adequação à nossa realidade Da mesma forma as referências internacionais sobre modelos de atenção em Cui dados Paliativos ainda são escassas e cada país tem buscado se adaptar à prática de tais cuidados com recursos preexistentes 73 Esta é de fato a grande recomendação para os Cuidados Paliativos da Organização Mundial da Saúde OMS uma assistência pautada em conceitos e princípios e adap tada à realidade de cada país ou região Neste capítulo analisaremos as diferentes modalidades de assistência em Cuidados Paliativos existentes no Brasil e o que deve ser comum a todas comentando vanta gens desvantagens e necessidades básicas de cada modelo numa tentativa de homo geneizar as ações desenvolvidas no país O documento de recomendações denominado Getting Started Guidelines and Suggestions for Those Starting a HospicePalliative Care Services elaborado pelo Dr Derek Doyle que atua em Cuidados Paliativos na Escócia há mais de 30 anos serve como ponto de partida para análise e considerações a seguir Esse documento foi pu blicado e é divulgado pela da Associação Internacional de Hospice e Cuidado Paliativo IAHPC3 Princípios da atuação Qualquer que seja o modelo de prestação de serviços as equipes de Cuidados Pa liativos possuem em comum3 reconhecimento e alívio da dor e de outros sintomas quaisquer que sejam sua causa e natureza reconhecimento e alívio do sofrimento psicossocial incluindo o cuidado apropriado para familiares ou círculo de pessoas próximas ao doente reconhecimento e alívio do sofrimento espiritualexistencial comunicação sensível e empática entre profissionais pacientes parentes e colegas respeito à verdade e à honestidade em todas as questões que envolvem pacientes familiares e profissionais atuação sempre em equipe multiprofissional em caráter interdisciplinar Equipes de Cuidados Paliativos habituamse a considerar sempre que há muito sofrimento envolvido nos processos de adoecimento e morte e que o ensino da medi cina não capacita o profissional de forma adequada para compreensão e alívio desse sentimento nos últimos anos e meses de vida O sofrimento físico inclui dor severa dispneia fadiga perda do apetite náusea e vômito obstipação insônia feridas delirium convulsões e outros sintomas de varia das naturezas que devem ser investigados e prontamente aliviados preferencialmente pelo controle de causas reversíveis3 O sofrimento psíquico inclui ansiedade medo depressão perda da dignidade so lidão medo de se tornar um estorvo e causar sofrimento aos entes queridos medo de que seus sentimentos não sejam valorizados e também de ser abandonado3 O sofrimento existencial inclui questões de cunho religioso os significados da vida da morte e do sofrimento culpas necessidade de perdão entre outros temas muito particulares3 Toda essa problemática junto com as de natureza social é determinante de um difícil e doloroso processo de morrer com muitas implicações para a rede de saúde em geral pelo alto custo da assistência voltada apenas para o modelo médicointerven cionista pelo estresse ocasionado às equipes de saúde e pelas consequências de um luto complicado para os familiares 74 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Que serviço se pretende construir Na estruturação de um serviço de Cuidados Paliativos as questões fundamentais a serem respondidas nesse período inicial de planejamento são as seguintes3 Quais os objetivos do serviço O serviço de Cuidados Paliativos pode ter por objetivo3 a resolução ágil de uma intercorrência no curso de uma doença avançada o cuidado pertinente à fase final da vida o cuidado prolongado a doentes incapacitados a reabilitação de pacientes gravemente incapacitados após acidente vascular ou trau mático recente em fase póscrítica mas de grande vulnerabilidade o cuidado a doentes com falência funcional avançada com períodos de instabilidade clínica e necessidade de intervenções proporcionais Qual a demanda de necessidades de Cuidados Paliativos É fundamental conhecer diagnósticos mais frequentes principais necessidades de doentes e familiares possibilidade de inserção do serviço de Cuidados Paliativos na cadeia da assistência existente Essa pergunta responde à primeira com base na necessidade local definese o obje tivo do serviço Que recursos materiais e humanos já existem Qual o modelo que mais se enquadra no objetivo proposto Qual o investimento proposto para este projeto Quais os obstáculos e resistências que envolvem as equipes profissionais Qual a necessidade de treinamento das equipes locais Depois da análise das necessidades demanda e intenção de investimento na ope racionalização do modelo de Cuidados Paliativos a ser implantado o passo seguinte é estudar cada estrutura e escolher a que melhor se adapta3 O Cuidado Paliativo nunca pode estar isolado da cadeia de serviços de saúde que caracterizam a atenção global ao paciente O fluxo de pacientes para internação numa unidade de Cuidados Paliativos as necessidades de investigação diagnóstica e o segui mento do doente durante sua estadia no domicílio devem ser parte de uma rede integrada e muito bem articulada de modo a oferecer segurança ao doente e a sua família em todas as etapas do adoecimento e no respeito às decisões previamente acordadas para o final da vida A Figura mostra um exemplo de rede de atenção em Cuidados Paliativos 75 Unidades de internação em Cuidados Paliativos Enfermaria de Cuidados Paliativos Consiste numa ala de um hospital geral secundário ou terciário que opera em leitos próprios e com equipe especializada em Cuidados Paliativos A equipe deve ser composta por médicos enfermeiras e técnicos de enfermagem psicólogo assistente social e capelão de caráter ecumênico Pode contar também com fisioterapeutas farmacêuticos clínicos e voluntários além da ação intermitente de outros profissionais e clínicas do hospital3 Funciona como uma clínica de especialidade no hospital com equipe constante e bem treinada maior flexibilidade com relação a visitas de familiares alimentação e regras do hospital A família deve ficar bem acomodada e receber atenção da equipe Preferencialmente a acomodação deve ser em quarto individual para a preservação da intimidade e das par ticularidades do doente com sua família No Brasil um exemplo de enfermaria de Cuidados Paliativos é a do Hospital do Ser vidor Público Estadual de São Paulo HSPESP com uma ala de 10 quartos individuais para o paciente e sua família O hospital tem complexidade terciária e possui 700 leitos ativos A enfermaria trabalha em consonância com o ambulatório de Cuidados Paliativos e atendimento domiciliar5 vAntAGens Integração dos Cuidados Paliativos com todas as especialidades do hospital facilitação do acesso de pacientes à internação nas 24 horas facilidade de acesso aos profissionais das equipes que até então o acompanhavam menos sensação de abandono respostas rápidas ao doente e maior segurança à família Hospedaria Figura Modelo de rede integrada em Cuidados Paliativos Assistência domiciliar Ambulatório Unidade de internação 76 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP facilidade para o ensino de Cuidados Paliativos disseminação de uma cultura de Cuidados Paliativos de forma científica e controlada dentro de um grande hospital contribuindo para a desmistificação de conceitos inade quados sobre a questão desvAntAGens O ambiente hospitalar é um fator limitante e as internações devem sempre ser curtas por dificuldades como acesso do paciente a áreas verdes e jardins e facilidade de reabilitação ambiente hospitalar como fator de agravo ao humor em especial para pacientes ido sos em hospitais pequenos o custo de uma unidade com menos de 10 leitos pode ser dema siadamente elevado pela necessidade de equipe treinada em período integral neCessidAdes Além de área física leitos e acomodações para pelo menos um familiar acompanhan te há a necessidade de se estabelecer fluxo de internações para pacientes externos prontosocorro e transferências de outras clínicas do hospital impressos apropriados ou templates específicos de internação e evolução diária quando houver prontuário eletrônico fluxo de encaminhamento para pacientes no período pósalta pois todos devem con tinuar inseridos no atendimento em Cuidados Paliativos seja ambulatorial ou domiciliar de acordo com o desempenho do doente política de padronização dos medicamentos necessários à boa paliação bem como fa cilidades de dispensação na alta hospitalar espaço físico e horas semanais destinadas à discussão de casos por equipe multipro fissional bem como espaço e ações que ajudem a equipe a elaborar o próprio luto de corrente dos óbitos e as situações de estresse pela convivência estreita com situações de sofrimento humano Grupo consultor em Cuidados Paliativos Consiste na criação de uma equipe profissional muito bem treinada que se coloca à disposição de todas as equipes de diferentes especialidades no hospital para a elaboração de um plano de cuidados dirigido ao paciente e a sua família Nesse caso a equipe não assume o doente de forma integral3 As equipes de interconsulta podem estar vinculadas e ser originadas nas enfermarias de Cuidados Paliativos quando existentes ou trabalhar de forma exclusiva em pequenos hospitais onde não comportem leitos próprios A maioria das equipes de Cuidados Paliativos para pacientes internados no Brasil funciona nessa modalidade neCessidAdes Nesse modelo assistencial a maior necessidade é a formação de uma equipe mínima de Cuidados Paliativos muito bem treinada e disponível no hospital A equipe deve contar com 77 um médico em período parcial de trabalho uma enfermeira treinada e que atue em consonância com a enfermeira da clínica de origem uma psicóloga muito bem treinada na prática de Cuidados Paliativos uma assistente social de acordo com a demanda local outros profissionais nãovinculados diretamente à equipe mas que atuem em con sonância com os princípios dos Cuidados Paliativos e que possam prestar assistência ocasional em situações selecionadas pelo grupo nutricionista fisioterapeuta terapeuta ocupacional farmacêutico etc uma sala para guardar o material da equipe e realizar reuniões regulares do grupo para a discussão dos casos visitados treinamento da equipe e educação continuada pois todos precisam ter muita segurança nos conhecimentos inerentes à prática proposta vAntAGens Baixo custo e rapidez de implantação do serviço pela necessidade de poucos profissionais possibilidade de interação de profissionais com alto conhecimento em Cuidados Palia tivos com diversas equipes do hospital desvAntAGens Dificuldade de aceitação pelas equipes especializadas dos novos paradigmas clínicos dos Cuidados Paliativos receio do profissional médico de ser invadido em suas decisões e condutas pessoais3 baixa adesão ao tratamento proposto especialmente no tocante a uso de opioides pro posição de novas vias de administração de medicamentos e suspensão de procedimentos e terapêuticas considerados fúteis Para minimizar esses problemas o grupo precisa retornar diariamente ao leito checar prescrições e interagir constantemente com a equipe local necessidade de equipe muito bem treinada e com perfil de educadores para o enfren tamento dessas dificuldades Unidade hospitalar especializada em Cuidados Paliativos Este é o termo equivalente ao inglês hospice Consiste numa unidade de saúde com complexidade mediana apta a dar respostas rápidas às necessidades mais complexas dos doentes Diferenciase do hospital geral pelo espaço destinado a atividades diversas e convivência inclusive para familiares flexibilidade e atuação contínua de equipes multi profissionais além de programação distinta e de caráter holístico3 A unidade hospitalar especializada em Cuidados Paliativos pode atender também a diferentes necessidades desde pacientes em fase final da vida e em crise de necessidades com perfil de internação curto média de 14 dias ou abrigar doentes com necessidades de internação prolongada média de dois a três meses em perfil de recuperação neuro lógica enfermidade crônica avançada como doenças pulmonar cardíaca ou renal com descompensações de repetição em curto período e fase avançada das demências com alto grau de incapacidade Precisa ser equipada para atender ocorrências clínicas e para isso necessita de pre sença médica durante 24 horas exames laboratoriais e radiologia contando com referên 78 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP cia para exames mais complexos como ressonância magnética RM e procedimentos pa liativos como inserção de cateteres urinários stents radioterapia paliativa entre outros Pode localizarse na área de um hospital de referência em um prédio isolado ou quando distante contar com rápidos sistemas de referência e transporte quando houver necessidade de intervenção mais complexa do que a oferecida na unidade3 No Brasil existem poucas unidades nessa modalidade sendo exemplos o Hospital do Câncer IV do Instituto Nacional de Câncer INCA no Rio de Janeiro a Unidade de Cui dados Paliativos do Hospital do Câncer de Barretos e o Hospital Local de Sapopemba em São Paulo que atende à clientela do Sistema Único de Saúde SUS e o Hospital Premier que atende convênios de saúde vAntAGens A unidade hospitalar de Cuidados Paliativos permite a prática especializada dos cui dados em toda sua plenitude com abordagem impecável aos sintomas físicos psicosso ciais e espirituais como uma série de atividades que permitem ao doente viver mesmo na fase final da doença com mais liberdade e funcionalidade facilidade para o trabalho com voluntários apesar de a assistência permitir a mesma complexidade do hospital a sensação de estar internado é atenuada na Unidade de Cuidados Paliativos permite maior convivência entre pacientes e familiares desvAntAGens A maior desvantagem da Unidade de Cuidados Paliativos é a necessidade de transfe rência do doente para uma unidade distinta a distância do hospital de referência pode elevar os custos com transporte e serviços de apoio quando necessários as visitas dos profissionais que previamente participavam ativamente do seu tratamen to são raras risco de o paciente sentirse abandonado ou relegado a segundo plano na rede assis tencial tendência equivocada de outros especialistas de verem como unidade de doentes crônicos ou apenas destinada ao final da vida o que distorce o conceito dos Cuidados Paliativos neCessidAdes A organização de uma unidade hospitalar em Cuidados Paliativos exige a construção ou a adaptação de um prédio apropriado e agradável que conte com jardins áreas de lazer e salas especiais para as atividades coletivas As acomodações devem ser preferencialmente individuais com espaço para instala ção de um familiar ou acompanhante com mobiliário leve e agradável Idealmente deve ter espaço para atividades de terapia ocupacional e de reabilitação exames laboratoriais ultrassonografia US endoscopia e radiologia assim como sala para pequenos procedimentos paliativos como gastrostomia por via endoscópica A unidade deve contar com equipe multiprofissional completa com formação em Cui dados Paliativos que inclui médicos enfermeiras psicólogos assistentes sociais fisio 79 terapeutas terapeutas ocupacionais musicoterapeutas fonoaudiólogos nutricionistas farmacêuticos odontólogos assistentes espirituais e voluntários O corpo clínico deve ser organizado segundo as exigências regionais com regimen to adequado comissões de ética médica e de óbitos comissão de controle de infecção hospitalar núcleo de reabilitação além de consultores nas áreas de geriatria oncologia cirurgia geral e outras de acordo com necessidade e objetivo do trabalho O parâmetro médico sugerido pela IAHPC é de 10 a 15 leitos por médico em período integral inclusive nos feriados e finais de semana Os plantões noturnos devem ser diários e há necessidade de profissional igualmente treinado em Cuidados Paliativos3 As unidades hospitalares de Cuidados Paliativos no Brasil têm em média 50 a 60 leitos disponíveis Podem abrigar uma unidadedia atividade ambulatorial integrada e núcleo de atendimento domiciliar A atividade de ensino deve contar com centro dotado de biblioteca sala de estudos aulas e reunião clínica Os profissionais devem ser estimulados a manter ao menos 3 ho ras semanais de estudos e atualização em Cuidados Paliativos segundo sugestão do Dr Doyle do IAHPC3 Por fim o fluxo de pacientes em sistema de referência e contrarreferência deve ser claro e objetivo quem encaminha quais os critérios de admissão qual o propósito da internação e para onde será encaminhado o paciente após a alta hospitalar atendimento domiciliar ambulatório ou hospedaria de Cuidados Paliativos Unidades de atendimento a pacientes externos Ambulatório de Cuidados Paliativos Definido como unidade ambulatorial baseada no modelo de consultas com um espe cialista destinase ao atendimento de pacientes portadores de doença avançada pro gressiva ameaçadora da vida e com poucas chances de cura O objetivo da assistência ambulatorial em Cuidados Paliativos é proporcionar ao doente o excelente controle de sintomas de sua doença a comunicação adequada de informações sobre a evolução da enfermidade suas perspectivas de tratamento e a opor tunidade de elaborar as dificuldades pessoais de ser portador de doença ameaçadora da vida em que a possibilidade de morte é tão ameaçadora quanto o curso da doença O principal benefício do ambulatório de Cuidados Paliativos é poder acompanhar os pacientes mais precocemente numa fase em que a doença apesar de significativa tem pouco impacto sobre o perfil funcional do doente Nessa fase o controle ideal de sintomas e a abordagem emocional podem contribuir para a melhoria da qualidade de vida com possibilidade de ter impacto também sobre a sobrevida do doente O acompanhamento ambulatorial deve sempre vislumbrar a possibilidade de agir na prevenção de crises de necessidades Atendendo ao princípio da atenção multiprofissional ao doente o ambulatório de Cuidados Paliativos deve ser organizado para garantir o tratamento por equipe multiprofissional de Cuidados Paliativos a ser definido como equipe mínima médi co enfermeiro psicólogo com ou sem assistente social ou equipe nuclear completa médico enfermeiro psicólogo fisioterapeuta terapeuta ocupacional nutricionista e assistente social com possibilidade de acessar outros profissionais quando ne cessário 80 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Há a possibilidade de conciliar no mesmo espaço físico o atendimento ambulatorial com uma unidade de atendimentodia em Cuidados Paliativos que será descrita a seguir o que facilita a integração de uma equipe multiprofissional completa ao ambulatório neCessidAdes Para o funcionamento de um unidade ambulatorial básica é necessário equipe composta por um médico em período parcial um enfermeiro assistencial e um psicólogo todos com formação específica na área um assistente social pode participar em um ou mais períodossemana como referência recepção e sala de espera com recepcionistasecretária um técnico de enfermagem para a organização de material e auxílio em procedimentos curativos e coleta de exames consultórios uma sala adequada para a realização de reunião familiar aproveitada também para reuniões de equipe uma sala para realização de procedimentos simples como paracenteses curativos com plexos enteroclismas etc salas de limpeza e preparo de material para esterilização em local conveniente Todas as instalações devem contar com espaços amplos portas largas e todas as facilida des ao acesso de pacientes em cadeira de rodas e eventualmente em macas O mesmo espaço pode ser compartilhado por equipes de geriatria clínica médica e oncologia possibilitando ao doente o vínculo com o espaço e a integração com o trabalho dos Cuidados Paliativos em todas as fases da doença O parâmetro estabelecido pela Câmara Técnica de Cuidados Paliativos do Ministério da Saúde do Brasil é de seis consultasprofissional em período de 4 horas Esse número permite uma consulta com duração média de 40 minutos o mínimo para uma atenção detalhada com pacientes com necessidades de Cuidados Paliativos Unidadedia de Cuidados Paliativos Tratase de uma modalidade de assistência destinada a pacientes que permanecem no domicílio cujo foco da atenção é prover a atenção em determinadas necessidades no curso de uma doença grave3 A unidadedia inclui fisioterapia terapia ocupacional musicoterapia arteterapia cuidados com a aparência nutrição e encontro com outros doentes e familiares possibi litando a troca de experiências de forma dirigida por profissionais muito bem qualificados para a tarefa Se houver a intenção de conciliar o espaço da unidadedia de Cuidados Paliativos com o atendimento ambulatorial o que tende a ser uma otimização de espaço físico e uma oferta de conforto para doentes e familiares haverá necessidade de agregar no espaço físico do ambulatório acomodações para atividade de terapia ocupacional pequeno núcleo de reabilitação refeição supervisionada descanso de pacientes em poltronas confortáveis amenidades leitura música cuidados com a aparência 81 área verde e de jardinagem com possibilidade de utilizarse de animais treinados petterapia Os benefícios da unidadedia não se estendem apenas aos doentes que passam a ter oportunidades e acesso a diversas terapêuticas complementares A permanência do doen te no local também beneficia o cuidador domiciliar que pode usar o tempo desobrigado do doente em qualquer outra atividade segundo sua necessidade A folga do cuidador domiciliar por um ou mais dias da semana propicia melhor adesão ao tratamento sentindose estimulado ao acompanhamento do doente em sua residência por mais tempo De modo geral as unidadesdia de Cuidados Paliativos funcionam de 5 a 6 horas du rante o dia Permanências mais longas só se justificam por necessidade clínica A equipe precisa de tempo antes e depois para se organizar e permanências longas podem ser cansativas para o doente3 Atendimento domiciliar em Cuidados Paliativos A modalidade de atendimento a pacientes em Cuidados Paliativos no domicílio ca racterizase por atividade destinada a portadores de doença avançada em progressão e com necessidade contínua de monitoramento de sintomas e aplicação de um plano de cuidados previamente estabelecido3 As visitas podem ser realizadas por médico ou enfermeiro treinados para esse fim e atento às especificidades dos Cuidados Paliativos Porém o paciente deve ser referenciado para ambulatório ou unidade especializada que elabora o seu plano de cuidados que consiste numa série de ações determinadas de forma individualizada Idealmente deve ser realizada pela equipe de atenção primária mais próxima de sua resi dência em consonância e em contínua troca de informações com a equipe especializada No Brasil a equipe do Programa de Internação Domiciliar Interdisciplinar de Pelotas RS é exemplo de gestão dessa modalidade de serviço no âmbito do SUS vAntAGens A permanência do doente em sua residência e ao lado de sua família é sem dúvida a condição ideal que lhe assegura a melhor qualidade de vida seja como for a casa do doente é seu local de maior identidade e onde as suas relações de vida se mostram mais presentes o acompanhamento do doente pela equipe primária de saúde ajuda a desmistificar a complexidade de sua doença os medos com relação aos medicamentos sobretudo os opioides e o faz sentirse inserido em sua história de vida e adoecimento o controle de medicamentos e insumos tende a ser mais eficiente assim como a adesão aos tratamentos propostos O maior envolvimento da comunidade ajuda no apoio ao doente e à família no caso de o paciente optar pela morte no domicílio aumenta a segurança quanto aos trâmites legais a serem seguidos quando se tem uma equipe presente e atuante pró xima da residência desvAntAGens Há necessidade de cuidador familiar atento e bem preparado para acionar a rede 82 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP de apoio em caso de surgimento de novas necessidades sintomas malcontrolados e mudanças no quadro clínico as visitas a pacientes em Cuidados Paliativos tendem a ser demoradas com duração mí nima de 45 a 50 minutos e exigem atenção a detalhes e tempo com repetidas orientações o treinamento das equipes de atenção primária precisa ter ótima qualidade e ainda assim várias ocorrências podem passar despercebidas e ser negligenciadas Normalmente as equipes da atenção comunitária atendem a demandas diversas de saúde e não se sen tem preparadas para a complexidade dos Cuidados Paliativos A estrutura ideal inclui uma equipe específica só para as visitas a pacientes em Cuidados Paliativos neCessidAdes Para um bom programa de atendimento domiciliar a primeira necessidade é o treina mento da equipe visitadora vinculada à atenção primária Enfermagem muito bem treinada pode monitorar as necessidades do doente e de sua família e alertar para possíveis mudanças nas prescrições novas orientações ou outras necessidades de assistência É necessária a compreensão de gestores de saúde no sentido de prover uma equipe exclusiva para os Cuidados Paliativos no domicílio o que muito facilita o trabalho e pos sibilita de fato a boa paliação no nível da atenção primária Há que se garantir uma política de medicamentos que devem ser dispensados de forma regular com controle pela equipe local As equipes necessitam de um núcleo ou base e de um sistema de comunicação 24 ho rasdia e sete dias por semana para o atendimento imediato de situações de emergência Nessas situações deve ser garantido o transporte do doente para o hospital de referência em Cuidados Paliativos Uma equipe exclusiva de Cuidados Paliativos tem capacidade de atender até 30 doen tes por vez na modalidade de assistência com visitas intermitentes e 10 na modalidade internação domiciliar com visitas diárias É o que acontece em alguns serviços do Brasil como os Programas de Internação Domiciliar PIDs de Pelotas e Londrina e em serviços de assistência como o do HSPE A referência do PID criado pela Portaria Ministerial no 2529 de 19 de outubro de 2006 é de 30 pacientesmês por equipe e permanência máxima de 30 dias de internação Deve haver uma equipe para cada 100 mil habitantes No entanto mes mo prevendo a internação em Cuidados Paliativos a portaria necessita de revisão no tocante aos Cuidados Paliativos pois em média os doentes têm sobrevida de dois a três meses podendo prolongarse E o perfil de necessidades é diferenciado A questão dos Cuidados Paliativos está contemplada na portaria que cria as Diretrizes Nacionais de Cuidados Paliativos elaborada pela Câmara Técnica de Dor e Cuidados Paliativos do Ministério de Saúde criada pela Portaria GMMS no 3150 de 12 de dezembro de 2006 e que aguarda aprovação Hospedarias de Cuidados Paliativos Concebidas com base no que os americanos chamam de nursing homes são unidades destinadas a pacientes relativamente estáveis com grau variado de dependência funcio nal e sintomas bem controlados ou de intensidade leve a moderada3 83 As hospedarias abrigam pacientes que poderiam permanecer em seus domicílios mas não conseguem por fatores distintos como falta de cuidador habilitado distância do cen tro de tratamento em situação de necessidade de intervenções paliativas e dificuldades relativas a alta dependência Um exemplo pioneiro de hospedaria no Brasil é a Hospedaria de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo HSPMSP Tratase de uma casa adaptada para receber até 10 pacientes com um acompanhante cada que funciona de forma independente mas muito próxima ao hospital de referência Na hospedaria uma equipe multiprofissional composta por médicos enfermeiros técnicos de enfermagem assistente social psicólogo e assistente espiritual todos com treinamento em Cuidados Paliativos assiste os doentes por um período variável com permanência média na casa em torno de seis meses6 Recebem visitas médicas periódicas duas a três vezes por semana e atendimento nas intercorrências Dois médicos permanecem disponíveis a distância 24 horas durante sete dias O hospital fornece todos os medicamentos e insumos para o provimento das necessidades do serviço6 Considerações gerais Seja qual for a necessidade e o objetivo em se montar um serviço de Cuidados Pa liativos alguns parâmetros devem ser respeitados na hora de se conceber o modelo de escolha O Quadro sugere os parâmetros a serem considerados e os diferentes modelos su geridos anteriormente Ela foi originalmente construída pelo Dr Derek Doyle porém foi necessário adaptar algumas situações à realidade nacional além de transformar as indi cações de leve moderada e severa em ou respectivamente Não existe no Brasil parâmetros oficiais para o cálculo das necessidades de Cuidados Paliativos Segundo a OMS a necessidade de Cuidados Paliativos pode ser baseada no perfil de mortalidade de uma população Considerase que entre as mortes ocorridas por causa natural 50 a 80 são passíveis de necessidades de Cuidados Paliativos considerando se todos os diagnósticos No caso do câncer e do HIVSIDA a porcentagem de pessoas com necessidade de Cuidados Paliativos por ano é de 80 acrescidos de seus cuidadores8 A Associação Europeia de Cuidados Paliativos EAPC por meio de documento elabo rado para a União Europeia classifica como ideal a proporção de leitos hoje existente no Reino Unido onde existe cerca de 50 leitos de Cuidados Paliativos para cada um milhão de habitantes7 A necessidade de leito hospitalar depende no entanto de características epidemioló gicas da região qualidades da assistência no hospital e oferta de serviços de apoio como ambulatório e atendimento domiciliar Nas diretrizes elaboradas pela Câmara Técnica de Cuidados Paliativos do Ministério da Saúde ficam estabelecidos quatro níveis de atenção em Cuidados Paliativos com base em documento elaborado pela Academia Nacional de Cuidados Paliativos ANCP2 ação paliativa cuidado dispensado em nível comunitário por equipe vinculada ao Programa de Saúde da Família PSF treinada para tal finalidade Cuidado Paliativos de grau I cuidado dispensado por equipe especializada em Cuida 84 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP dos Paliativos em nível hospitalar ambulatorial ou domiciliar porém sem leito próprio Exemplo de equipe consultora em Cuidados Paliativos Cuidado Paliativo de grau II cuidado dispensado por equipe especializada em Cuidados Paliativos em nível hospitalar ambulatorial ou domiciliar que atua com leitos próprios de internação Equivale tanto às enfermarias em hospitais gerais quanto às unidade hospi talares independentes Cuidado Paliativo de grau III mesma característica do cuidado de grau II acrescida de capacidade para a formação de profissionais em Cuidados Paliativos As portarias que regulamentam as diretrizes para os Cuidados Paliativos no SUS aguar dam a sua assinatura desde 13 de junho de 2008 Referências 1 CORTES C C Historia y desarrollo de los cuidados paliativos In MARCOS G S ed Cuidados paliativos e intervención psicosocial en enfermos de cáncer Las Palmas ICEPS 1988 2 CRITÉRIOS DE QUALIDADE PARA OS CUIDADOS PALIATIVOS NO BRASIL Documento elaborado pela Academia Nacional de Cuidados Paliativos Brasil 2007 3 DOYLE D Getting started guidelines and suggestions for those starting a hospicepalliative care services 2 ed Houston IAHPC Press 2009 Quadro Parâmetros de inserção de pacientes em diferentes modelos Parâmetro do Cuidado Paliativo Enfermaria em hospital geral Equipe consultora Hospitalar Unidade hospitalar especializada Ambulatório e unidadedia Serviço domiciliar Hospe daria Sintomas Instabilidade psicossocial Instabilidade clínica Dependência funcional Necessidade de atendimento médico contínuo Necessidade de estrutura social a a a Necessidade de cuidados de enfermagem Fonte DOYLE D Getting Started 2008 Adaptado por MACIEL M G 2009 85 4 MACIEL M G S A terminalidade da vida e os cuidados paliativos no Brasil considerações e perspectivas Prática Hospitalar v 47 p 469 2006 5 MACIEL M G S Modelos de assistência em cuidados paliativos enfermaria em cuidado paliativo São Paulo Cadernos CREMESP 2008 6 MATSUMOTO D Y Modelos de assistência em cuidados paliativos hospedaria em cuidado paliativo São Paulo Cadernos CREMESP 2008 7 MORENO J M M et al Palliative care in the European Union Document requested by European Parliaments Committee on the Environment Public Health and Food Safety Ref IPAENVIIC2007 123 2008 Disponível em httpwwweuroparleuropaeuactivitiescommitteesstudiesdownload dofile21421 Acesso em 13 jun 2009 8 WORLD HEALTH ORGANIZATION Guides for efective programs palliative care Geneve WHO 2007 Leitura recomendada DOYLE D The provision of palliative care In Oxford textbook of Palliative Medicine 2 ed Oxford University Press 1998 DOYLE D JEFFREY D Palliative care in the home Oxford University Press 2000 WHITE K R Non clinical outcomes of hospitalbased palliative care Journal of Health Care Manegement v 51 n 4 p 26073 2006 WORLD HEALTH ORGANIZATION Better palliative care for older people Geneve WHO 2004 86 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Controle da dor mirlAne GuimArães de melo CArdoso Introdução Doenças avançadas frequentemente estão relacionadas com sintomas associados ao sofrimento destacandose nesse contexto a dor que é conceituada pela Associação In ternacional para o Estudo da Dor IASP como uma experiência sensitiva e emocional de sagradável associada a dano real ou potencial dos tecidos ou descrita em termos de tais lesões14 Significa portanto que a dor é uma experiência única e individual modificada pelo conhecimento prévio de um dano que pode ser existente ou presumido ou seja em qualquer situação a dor é o que o paciente refere e descreve Muitas pesquisas nessa área relacionamse com pacientes com câncer já que neles a dor aparece como o sintoma que significativamente afeta a qualidade de vida na ter minalidade constituindo um fator importante do sofrimento relacionado com a doença mesmo quando comparado à expectativa de morte Estudos multicêntricos de controle da dor em pacientes com câncer revelam consistentemente que cerca de metade dos pacien tes recebe analgesia insuficiente chegando a 51 na França 42 nos Estados Unidos e 59 na China Da mesma forma ocorrendo com milhões de portadores de HIVSIDA em que 60 a 100 irão sentir dor em alguma fase da sua doença4 Revisões em outras populações têm sido realizadas incluindo pacientes com doen ça associada a insuficiência respiratória grave e distúrbios musculoesqueléticos nos quais foi observado que a prevalência dos sintomas na evolução dessas diferentes doenças crônicas é variável Porém o interessante é identificar nesses levantamentos que os sintomas são comuns tanto no câncer como nas doenças nãooncológicas inclusive a dor Tabela Tabela Prevalência de sintomas relatados retrospectivamente por cuidadores no último ano de vida dos pacientes1 Sintoma Câncer da população Nãocâncer da população Dor 71 72 Dispneia 63 64 Tosse persistente 50 42 Xerostomia 43 34 Anorexia 33 21 Náuseas e vômitos 55 50 Constipação 65 69 Confusão mental 42 44 Insônia 44 45 Mau humor 67 73 87 Esses dados estatísticos qualificam a dor crônica como um problema de saúde pública importante que requer atenção independente da origem da doença que a ocasionou Dezenas de milhões de americanos sofrem de algum tipo de dor crônica transitória ou persistente sem qualquer relação com neoplasias malignas neuralgias diabetes com neuropatias distúrbios cervicais e lombares artrites fibromialgias cefaleias distúrbios dolorosos faciais dores torácica e pélvica No Michigan Pain Study 70 dos entre vistados ainda tinham dores crônicas após o tratamento e 22 acreditavam que esse havia agravado a dor A sequência de tratamentos falhos agrava ainda mais o processo de condicionamento patológico mesmo quando são escolhidas as terapêuticas corretas Esse cenário sugere que fatores interrelacionados e alheios à medicina como problemas conceituais administrativolegais e educacionais na transferência de tecnologia na área de dor mantêm essa condição desfavorável6 Base neural da dor Uma das importantes funções do sistema nervoso é fornecer informações sobre lesões corporais em potencial que são expressas pela dor A percepção corporal da dor é deno minada nocicepção Quanto aos mecanismos neurofisiológicos a dor pode ser classificada em nociceptiva quando as vias nociceptivas se encontram preservadas sendo ativadas pelos nociceptores de tecidos cutâneos dor somática ou profundos dor visceral nãonociceptiva ou neuropática quando as vias nociceptivas apresentam alterações na estrutura eou função resultante de lesão seletiva do trato neoespinotalâmico dor central ou de lesões no sistema nervoso periférico dor periférica psicogênica que se origina de distúrbios psíquicos A dor oncológica é considerada frequentemente mista Considerando a dor um sistema complexo didaticamente ela pode ser dividida nos seguintes componentes nociceptores tratos nociceptivos ascendentes centros mais ele vados do sistema nervoso central SNC e sistemas inibitórios descendentes da dor O termo nociceptor é empregado para descrever terminações livres de fibras aferentes primárias que respondem a estímulos de uma ampla variedade de tecidos como vísceras polpa dentária músculos articulações além da pele As fibras aferentes nociceptivas primárias normalmente fibras Adelta Aδ e C transmitem sinais químicos mecânicos e térmicos por meio do trato de Lissauer fazendo sinapse com neurônios do corno dorsal da medula espinal Numerosos neurotransmissores e mediadores bioquímicos excitatórios glutamato substância P fatores de crescimento e inibitórios opioides ácido gama aminobutírico GABA e glicina são liberados no corno dorsal provenientes de três fontes principais fibra aferente primária interneurônios e sistema de fibras descendente As células do corno dorsal possuem receptores específicos para essas substâncias Portanto essa sinapse no corno dorsal seria o ponto no qual as informações dolorosas são conduzi das pelos tratos espinotalâmico e espinohipotalâmico aos centros superiores ou inibidas por ativação do sistema analgésico descendente composto por três componentes princi pais interrelacionados funcionalmente opioide noradrenérgico e serotoninérgico Os centros mais elevados do SNC estão envolvidos na discriminação da dor incluindo componente afetivo da dor componentes relacionados com memória e controle motor associado à resposta imediata aversiva aos estímulos dolorosos2 88 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Estratégia para o controle da dor O controle da dor deve se basear em avaliação cuidadosa com elucidação de suas pos síveis causas e seus efeitos na vida do paciente investigando fatores desencadeantes e atenuantes além dos psicossociais que possam influenciar o seu impacto Nesse sentido as equipes multiprofissionais dedicadas aos Cuidados Paliativos devem estabelecer preco cemente vias de comunicação claras para assistência O familiar é um pilar fundamental para incentivar a adesão ao tratamento já que uma analgesia insuficiente se traduz em sobrecargas física e psicológica para o paciente e sua família São diversas as barreiras existentes para manejo e controle adequados da dor com a nãoadesão ao tratamento por parte dos doentes a relutância na prescrição de opioides por parte dos médicos e a crença de que a dor é inevitável observada rotineiramente na prática no ambiente hospitalar Adicionalmente destacamos um aspecto fundamental que antecede até mesmo a própria sintomatologia álgica do paciente que é a formação acadêmica relacionada com a área de dor A estratégia de base científica para o controle adequado da dor e de outros sintomas se resume segundo Twycross21 na sigla EEMMA evolução da dor explicação da causa manejo terapêutico monitorização do tratamento atenção aos detalhes Evolução da dor A doença terminal é progressiva com grande variabilidade individual associada a múltiplos sintomas intensos e oscilantes Cada indivíduo tem suas próprias vivências as quais induzem a uma subjetividade de resposta diante da expressão de dor envolvendo respostas afetivas e cognitivas Portanto é necessário reconhecer o termo dor total introduzido por Cicely Saunders e explicado por meio de um esquema por Twycross2 Figura 1 Esse conceito mostra a importância de todas as dimensões dos sofrimentos humanos físico mental social e espiritual Portanto o alívio adequado da dor não é alcançado sem darse atenção a essas dimensões indissociáveis Estrategicamente devemse identificar quatro aspectos básicos na evolução a causa da dor o mecanismo da dor Quadro 1 os fatores nãofísicos envolvidos com a expressão de dor a discriminação detalhada da dor localização duração irradiação fatores temporais de agravamento e alívio impactos no sono e na capacidade funcional e intensidade 010 Com base no que o próprio paciente refere para avaliação da intensidade da dor su geremse as escalas uni e multidimensionais como instrumento de avaliação Destacase a escala visual analógica EVA por ser considerada sensível simples reproduzível e universal podendo ser compreendida em distintas situações em que há diferenças culturais intelectu ais ou mesmo de linguagem do avaliador É um método de autoavaliação representado por uma linha reta de 10 cm onde em um dos extremos se descrimina a ausência de dor e no outro a dor insuportável como representado na Figura 220 89 Falta de amigos Demora no diagnóstico Médicos inacessíveis Fracasso terapêutico Perda da posição social Perda do trabalho Perda da família Fadiga crônica e insônia DEPRESSÃO IRA Medo do hospital Medo da dor Medo da morte Preocupação com a família Angústia e culpa ANSIEDADE D O R T O T A L 1 Sintomas de debilidade 2 Efeitos colaterais da terapia 3 Patologia nãooncológica 4 Câncer FONTE SOMÁTICA Figura 1 Esquema de TWYCROSS21 Quadro 1 Tipos subtipos e características da dor Tipo Subtipos Características Exemplos Nociceptiva Somática Constante e bem localizada que se exacerba com movimentos e alivia com o repouso Osteoartrose metástase óssea infiltração de tecidos moles Visceral Constante aperto mal localizada associada a reações autonômicas náuseas sudorese Neoplasia eou metástases intraabdominais Cólicas Obstrução intestinal cólica renal Neuropática Disestésica1 Ardência constante hiperalgesia2 ou alodínea3 Radiculopatia por protrusão discal neuropatia pós quimioterapiaradioterapia Lancinante Episódica paroxismo tipo choque Invasão de plexo braquial ou do trigêmeo Adaptado de Pereira J L17 1 Sensação anormal e desagradável espontânea ou provocada 2 resposta mais intensa a um estímulo que normalmente é doloroso 3 quando um estímulo nãonocivo é percebido como dor 90 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Sobre essa linha o paciente deve marcar a posição mais aproximada da inten sidade da sua dor e podemos utilizar a escala numérica para qualificála A dor é considerada leve quando a intensidade varia de 1 a 3 na EVA a intensidade de 4 a 7 é considerada dor moderada e de 8 a 10 dor severa O registro da intensidade deve incluir não somente o momento da dor mas também quando a mesma é aliviada ou exacerbada Por essa razão o médico deve ensinar pacientes e familiares a utilizar as escalas de avaliação da dor Na prática clínica a falta de sistematização na avaliação da dor frequentemente leva a um subtratamento apesar dos avanços terapêuticos Portanto na investiga ção da dor a possibilidade de o paciente discorrer sobre ela mediante um autorre lato é o ponto de partida para diagnóstico implementação terapêutica e posterior avaliação de sua eficácia Explicação da causa As explicações de causa mecanismo da dor e fatores que podem modificar a sua intensidade como o resgate do padrão de sono a diminuição do cansaço e a melhora do humor por meio de uma linguagem simples para o paciente e sua família habi tualmente contribuem para confiança e adesão ao tratamento O envolvimento direto pelo tumor é a causa mais frequente de dor nos pacientes oncológicos 70 porém em 17 a dor está relacionada com o tratamento anti tumoral Quadro 23 23 O uso do antineoplásico paclitaxel Taxol no tratamento de tumores refratários à quimioterapia convencional está relacionado com o apare cimento de artralgias mialgias e neuropatias periféricas incapacitantes e limitantes do tratamento7 SEM DOR PIOR DOR POSSÍVEL ESCALA VISUAL ANALÓGICA SEM DOR PIOR DOR POSSÍVEL ESCALA NUMÉRICA 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Figura 2 Escalas visual analógica e de categoria numérica 91 Quadro 2 Síndromes dolorosas relacionadas com o câncer e seu tratamento3 Dor por infiltração direta Dor relacionada com o tratamento Dor nãorelacionada com a doença Infiltração óssea Pósoperatória Neuropatia diabética 1 Dor da base do crânio 2 Dor do corpo vertebral 3 Síndrome do sacro 4 Lesão de ossos longos 1 Dor póstoracotomia 2 Dor em membro fantasma Infiltração visceral Pósquimioterapia Artrites gota e artrose 1 Pleural 2 Hepática 3 Peritoneal 4 Pancreática 1 Neuropatia 2 Mucosite 3 Cistite hemorrágica 4 Neuralgia pósherpética 5 Artralgias e mialgias Infiltração de vasos Pósradioterapia Lombalgias 1 Arterial 2 Venoso 3 Linfático 1 Mucosites 2 Esofagites 3 Proctites 4 Queimaduras 1 Enfermidade degenerativa discal Infiltração de nervos 1 Plexo braquial 2 Plexo lombar 3 Plexo sacral 4 Epidural 5 Meníngea Manejo da dor Implica a consideração de três aspectos que podem estar combinados identificar e tratar a causa da dor quando possível3 Quadro 2 medidas nãofarmacológicas12 Quadro 3 medidas farmacológicas Quadro 3 Exemplos de abordagens de tratamento nãofarmacológico12 Técnicas de relaxamento distração e imaginação dirigida Terapia física por aplicação de calor em casos de espasmos musculares e artralgias Terapia física por aplicação de frio em casos de dor musculoesquelética contusão e torção Acupuntura em casos de dor devida a espasmos musculares disestesias e nevralgias Massoterapia nos casos em que se desejam relaxamento muscular e sensação de conforto Neuroestimulação elétrica transcutânea TENS em casos de dor por compressões tumoral nervosa óssea e em região de cabeça e pescoço 92 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Tratamentos paliativos modificadores de doença podem ser indicados para controle da dor Por exemplo em pacientes com dor localizada por fratura patológica a fixação cirúrgica dessa fratura controla satisfatoriamente os sintomas dolorosos Na paliação de doenças nãooncológicas esses princípios são igualmente aplicados Já a terapia medicamentosa referese à arte e à ciência no uso combinado de três grupos farmacológicos analgésicos nãoopioides analgésicos opioides sendo a morfina a droga de eleição e drogas adjuvantes ou coanalgésicos Nesse sentido a Organização Mundial da Saúde OMS publicou em 1986 um modelo clínico eficaz para o tratamento da dor oncológica que serve até os dias atuais validado e aceito mundialmente com base em seis princípios básicos23 pela boca usar a via oral sempre que possível pelo relógio horário regular e não apenas em doses se necessário para o indivíduo de acordo com as necessidades específicas do doente uso de coanalgésicos ou adjuvantes atenção aos detalhes pela escada analgésica Segundo esse algoritmo a dor deve ser tratada de acordo com uma escala ascenden te de potência medicamentosa relacionada com sua intensidade As drogas analgésicas aumentam sua potência começando com os analgésicos nãoopioides englobando os analgésicos antipiréticos dipirona paracetamol os antiinflamatórios nãohormonais AINHs e coxibes na dor leve passando pelos opioides fracos na dor moderada e opioides fortes como a morfina nas dores severas Todos esses medicamentos podem estar acom panhados de drogas adjuvantes que concedem o alívio da dor neuropática e controlam os efeitos adversos dos opioides favorecendo assim uma terapêutica com menor risco de toxicidade Adicionalmente a prescrição de fármacos profiláticos para sintomas per sistentes deve ser observada A eficácia desse modelo de escada analgésica foi avaliada em trabalho recente com pacientes terminais o qual evidenciou maior alívio da dor quando se utilizaram opioides potentes em dores com escores inferiores a 6 na EVA O resultado sugere que esses opioides como a morfina podem ser iniciados nas dores leves e moderados em baixas doses em substituição aos opioides fracos13 Já outros autores sugerem que deve ser acrescido um quarto degrau à escada analgésica da OMS15 Em 2003 com base em uma revisão Cochrane22 e nas recomendações da Associação Europeia de Cuidados Paliativos EAPC9 sobre os analgésicos opioides e seus efeitos indesejá veis foram associados ao escalonamento opiáceo os procedimentos anestésicos neurolíticos e neuroaxiais representados no quarto degrau da escada analgésica da OMS Figura 3 Entre os analgésicos nãoopioides os AINHs Quadro 4 são os agentes terapêuti cos mais utilizados sendo prescritos para o controle da dor e do edema nas artropatias crônicas osteoartrite e artrite reumatoide e nas anormalidades musculoesqueléticas traumatismo fraturas e lesões de partes moles além de proporcionarem alívio das do res pósoperatória dental bem como de cefaleias e dismenorreia Geralmente são bem tolerados em curto prazo mas preferencialmente devese escolher um analgésico com mecanismos adicionais sinérgicos como o caso da dipirona que ativa a via Larginina óxido nítrico NOmonofosfato de guanosina cíclico GMPccanal de potássio sensível ao trifosfato de adenosina KATP e ao mesmo tempo interage com o sistema glutama térgico resultando numa analgesia inquestionável19 93 ESCADA ANALGÉSICA DA OMS 1986 Modificada 3º degrau DOR SEVERA Opioides fortes morfina oxicodona metadora fentanil Drogas adjuntes ATENÇÃO FAMILIAR SUPORTE EMOCIONAL E COMUNICAÇÃO 1º degrau DOR LEVE Analgésicos nãoopiodes Drogas adjuvantes e técnicas anestésicas e neurocirúrgicas 4º degrau OPIOIDES por outras vias EV SC espinal intratecal 2º degrau DOR MODERADA Opioides fracos codeína tramadol propoxifeno Drogas adjuvantes Figura 3 Escada analgésica da OMS modificada9 22 OMS Organização Mundial da Saúde EV via endovenosa SC via subcutânea Quadro 4 Doses recomendadas de analgésicos nãoopioides disponíveis no Brasil18 Droga Doses recomendadas para crianças e adultos 50 kg DMD Dipirona 500 a 1000 mg 66 h 6 g Paracetamol 500 a 1000 mg 46 h 6 g Diclofenaco 50 a 100 mg 68 h Retard 612 h 200 mg Tenoxicam 20 a 40 mg 24 h 40 mg Cetoprofeno 50 a 100 mg 8 h 400 mg Piroxicam 20 a 40 mg 24 h Nimesulida 50 a 100 mg 12 h Meloxicam 75 a 15 mg 1224 h Eterocoxib 60 a 90 mg 24 h DMD dose máxima diária Esse fato somado ao perfil físicoquímico e às diferentes formas farmacêuticas dis poníveis torna seu uso mais tolerável do que o dos AINHs ácidos no que diz respeito à toxicidade gástrica com uso prolongado 94 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Na escolha de um AINH clássico ou um coxibe AINHs altamente seletivos para ciclo oxigenase 2 COX2 deve ser priorizada a história clínica dos pacientes e os seus efeitos colaterais criteriosamente monitorados Monitorização do tratamento É necessário o seguimento não só para avaliação da eficácia terapêutica mediante escalas mas também para identificar progressão da doença tipo e padrão temporal de dor desenvolvimento de tolerância medicamentosa aparecimento de efeitos adversos intratáveis e necessidade de rodízio dos opioides As respostas aos fármacos que o paciente recebeu previamente são avaliadas procu randose ajustar a posologia doses intervalos agregandose fármacos adjuvantes quan do necessário modificandose os fármacos prescritos ou adaptandose a via de admi nistração dos medicamentos já que mais da metade dos doentes com câncer avançado necessita de duas ou mais vias de administração de analgésicos antes do óbito Atenção aos detalhes O controle da dor tem uma base científica mas existem também aspectos de ordem prática como a adoção de uma postura detalhista para evoluir e não presumir associada a uma boa dose de atitude humanitária o que contribui para a eficácia da terapêutica analgésica As recomendações médicas assistenciais por exemplo devem ser escritas e exausti vamente orientadas verbalmente A melhor prescrição para controlar uma dor severa pode falhar porque as receitas foram escritas com letras ilegíveis ou porque o paciente não recebeu a adequada orientação Quanto mais fácil for o regimento terapêutico maior a possibilidade de seu cumprimento Alguns fármacos são de diferentes cores o que ajuda comunicação e orientação diárias com alguns pacientes Diversificar a forma de apre sentação de diferentes medicamentos comprimidos pastilhas cápsulas soluções gotas pode fazer com que o doente tenha a impressão de que não ingeriu tantos medicamentos assim Podemos ainda adicionar essência de laranja ou menta à solução de morfina e carbamazepina sabidamente amargos para que resulte em um sabor mais agradável Dentro do possível limitase a prescrição em quatro a cinco medicamentos preferen cialmente de ação prolongada garantindo assim maior adesão Infelizmente isso nem sempre é possível devido à evolução flutuante da dor da maioria dos doentes Evitar o retardo no tratamento da dor utilizar dosesresgate durante a titulação dos opioides não usar placebos e manter constante comunicação com o paciente e sua famí lia são outros cuidados do tratamento sintomático que devem ser lembrados10 Farmacoterapia básica com opioides princípios gerais Estudos demonstram que a farmacoterapia adequada com opioides pode aliviar a dor e o sofrimento dos pacientes oncológicos em 75 a 90 quando os consensos reco mendados pela OMS mundialmente aceitos são sistematicamente aplicados Porém as estatísticas indicam outra realidade mais de 25 morrem sem controle da dor O alívio da dor no câncer tem sido considerado pela OMS um problema que fere os direitos hu 95 manos porque seu manejo inadequado é reputado um grave problema de saúde pública em todo o mundo4 O termo opioide se refere a toda substância natural ou sintética que exerça sua ação mediante interação com receptores específicos distribuídos no SNC induzindo uma analgesia por ativação dos sistemas inibitórios opioidesdependentes na forma ção reticular do tronco cerebral da medula espinal e do sistema límbico Os opioides compreendem as drogas semelhantes à morfina que são antagonizadas pela naloxo na um antagonista opioide Essas drogas modificam o componente afetivomotiva cional da dor reduzindo sofrimento ansiedade e produzindo sedação e aumento da tolerância à dor A inclusão dos opioides no regime analgésico demonstra boa resposta à dor de caráter no ciceptivo e resposta variável às dores neuropáticas com favorável relação de riscobenefício Selecionar e titular individualmente as doses de opioides A escolha do opioide mais adequado deve basearse a princípio na intensidade da dor Em geral nas dores de pequena intensidade essa classe de analgésicos segundo a escada analgésica da OMS não está indicada devendose dar preferência aos analgésicos antiinflamatórios enquanto nas de maior intensidade EVA 5 preferemse os opioides de baixa potência codeína e tramadol associados a antiinflamatórios ou opioides de alta potência morfina metadona oxicodona e fentanil conforme proposto pela OMS Figura 3 Entre os opioides disponíveis destacase a morfina como o padrãoouro no tratamen to da dor moderada e severa Seu consumo medido em miligrama per capita é conside rado um indicador de qualidade no tratamento da dor Ela está disponível no Brasil sob a forma de solução oral e de comprimidos de liberação imediata contendo respectiva mente 10 mgml 10 mg e 30 mg para prescrição inicial a cada 46 horas Há cápsulas de liberação lenta para uso a cada 12 horas com 30 mg 6 0mg e 100 mg As ampolas contêm 2 mgml e 10 mgml e devem ser usadas preferencialmente por via subcutânea SC em bolo ou infusão contínua em pacientes sob Cuidados Paliativos Recomendase iniciar a terapêutica com morfina de liberação imediata até o controle da dor lembrando que os opioides não apresentam efeitoteto o que permite que doses crescentes sejam empregadas progressivamente sendo limitada apenas pela tolerância aos efeitos colaterais individuais A dose inicial depende da história de uso de analgésicos do paciente Se o paciente já estava em uso de opioide fraco codeína 60 mg ou tramadol 100 mg a titulação pode ser iniciada a partir de 10 mg de morfina oral de ação rápida Quadro 5 Devese repetir a dose de 5 mg de hora em hora até se obter a analgesia satisfatória Em seguida a dose total diária definida de morfina é prescrita como regular em intervalos de 4 a 6 horas Após controle do quadro doloroso a mudança para morfina de liberação controlada associada à doseresgate SOS para o controle da dor episódica é recomendada principalmente para os doentes com dificuldade de adesão ao tratamento A prescrição da doseresgate é feita com a morfina de liberação imediata e calculada como um sexto da dose total diária consumida Quadro 6 Essa dose extra pode ser repetida de hora em hora até o alívio da dor11 Na nossa experiência a dose máxima de morfina mais comumente empregada pela via oral tem sido 30 mg a cada 4 horas o que significa 180 mg ao dia próximo ao verificado 96 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 5 Fatores de conversão de opioides eou via de administração17 Droga Droga Regra De Para Codeína oral Morfina oral Dividir por 10 Tramadol oral Morfina oral Dividir por 5 Tramadol parenteral Morfina parenteral Dividir por 10 Morfina oral Morfina subcutânea Dividir por 2 Morfina oral Morfina endovenosa Dividir por 3 Morfina oral Fentanil transdérmico Dividir por 3 Quadro 6 Etapas para o rodízio dos opioides3 Calcular a dose diária total do opioide nas 24 horas incluindo doseresgate Utilizar as tabelas de equivalência analgésica para calcular a dose do novo opioide Considerar que a tolerância cruzada nem sempre é completa Ao trocar de um opioide para o outro diminuir a dose do novo opioide em 20 a 30 Estabelecer a dose de manutenção Dividir a dose diária total do novo opioide pelo número de doses que serão administradas em um dia Prescrição de dosesresgate Acompanhar diariamente os pacientes durante o período de troca utilizando menos de três dosesresgate nas 24 horas desde que não ocorram efeitos adversos até se estabelecer o controle do quadro álgico Exemplo prático trocar a morfina de liberação imediata pela de liberação controlada 1 Calcular a dose diária total da morfina de liberação imediata Morfina 10 mg de 44 horas por via oral é igual a 60 mg24 horas 2 Calcular a quantidade de cada dose individual Dividir a dose diária total pela frequência das doses necessárias nas 24 horas Morfina 60 mg2 morfina de liberação controlada 30 mg de 1212 horas por via oral 3 Prescrever doseresgate 16 da dose diária total 606 10 mg de morfina de ação imediata por via oral a cada hora de acordo com a necessidade para o controle da dor por Zech et al24 cuja dose máxima diária raramente ultrapassou 240 mgdia considera da baixa Acreditase que o uso da morfina associada aos AINHs e coanalgésicos explica seu emprego em baixas doses o que é verificado no nosso meio e em outros países A utilização simultânea de dois opioides não se traduz em analgesia adicional portanto deve ser evitada exceto em alguma situação excepcional Por exemplo morfina de ação ime diata como doseresgate de tratamentos com fentanil transdérmico Da mesma forma não se recomenda a combinação de fármacos do segundo e terceiro degraus da escada analgésica Figura 3 No segundo e terceiro degraus se podem associar os analgésicos do primeiro já que atuam por mecanismos diferentes AINHs Se for necessário alterar o opioide ou sua via de 97 administração poderão ser utilizados os fatores de conversão Quadro 5 devendo sempre ser ajustada a dose individualmente Surgindo intolerância aos efeitos colaterais reduzir a dose em 50 a cada dois dias ou utilizar outro opioide em dose equivalente Em caso de suspensão da morfina ou de outro opioide por exemplo nos casos de dor controlada pósradioterapia reduzir inicialmente para um quarto da dose em seguida diminuir 50 até atingir a dose equivalente a 10 a 15 mgdia suspendendo ao fim de dois dias17 A escolha de um opioide potente nem sempre pode aplicarse à dor crônica central ou neuropática caso em que a primeira opção é muitas vezes um anticonvulsivante ou um antidepressivo tricíclico Nesse caso o tramadol e a metadona são os opioides de escolha nas agudizações desse tipo de dor O tramadol é um opioide fraco que tem baixa afinidade por receptores opioides sendo parcialmente antagonizado pela naloxona Adicionalmente inibe a captação de noradre nalina e serotonina ativando assim o sistema inibitório descendente da dor As apresen tações farmacêuticas podem ser em soluções de 50 ou 100 mgml 25 gotas comprimi dos de liberação imediata de 50 e 100 mg administrados em intervalos de 4 a 6 horas comprimidos de liberação lenta 12 h ou ainda comprimidos de 375 mg associados ao paracetamol A dose diária não deve exceder 400 mg Também pode ser usado pela via SC de forma intermitente ou contínua Não apresenta ação antitussígena como a codeína e é menos constipante e mais nauseante A metadona é considerada um opioide excelente para as dores resistentes à morfina e principalmente para o controle da dor neuropática Compartilha com os outros opioides as mesmas propriedades porém tem algumas peculiaridades que a diferenciam Além de ser agonista de receptores opioides é antagonista de receptores nmetilDaspartato NMDA o que pode justificar sua maior eficácia no controle da dor neuropática e seu menor desenvolvimento de tolerância em comparação com a morfina Apresenta meia vida longa e imprevisível 10 a 75 horas o que dificulta sua avaliação Ao contrário do que se faz com a morfina durante a titulação individual as doses de metadona se suce dem de acordo com a dor do paciente só havendo horários fixos como recomendado pela OMS depois da primeira semana de titulação11 No Brasil a oxicodona é comercializada em comprimidos especiais de 10 20 e 40 mg administrados de1212 horas que não podem ser mastigados ou triturados Com a in disponibilidade de comprimidos de ação imediata e formulação injetável é necessário utilizar a morfina de liberação imediata nas dosesresgate Considerada um opioide sem o estigma da morfina é frequentemente usada no tratamento de dores crônica não oncológicas e com a vantagem adicional de uma absorção bifásica pelo organismo sendo o primeiro pico plasmático com menos de uma hora e o segundo aproximadamente com seis horas Apesar de ser um opioide uma vez e meia a duas vezes mais potente que a mor fina parece ter menor incidência de tolerância e efeitos adversos o que leva essa droga a em alguns centros ser utilizada no segundo degrau da escada analgésica como ocorre na nossa prática à frente do Serviço de Terapia da Dor e Cuidados Paliativos da Fundação Centro de Controle de Oncologia do Amazonas FCECON Rodízio entre os opioides Rotineiramente somente 10 a 30 dos pacientes demonstram resposta pobre aos opioides durante uma administração de rotina e esse é um fenômeno complexo que pode 98 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP estar relacionado com um ou mais grupos de fatores diversos e ainda pouco compreen didos Os pacientes que desenvolvem efeitos adversos intoleráveis mesmo antes de al cançar a analgesia adequada já que o incremento da dose é impraticável devem receber tratamento efetivo para prevenir ou tratar os efeitos adversos e somente quando essa intervenção falhar devese considerar o rodízio de opioides Quadro 6 Alucinações falha cognitiva mioclonias e náuseas são outras indicações para o ro dízio de opioides além da dor nãocontrolada e a mudança de via de administração No rodízio de opioides o objetivo é alcançar uma ótima analgesia com o mínimo de efeitos tóxicos relacionados com a sobredose ou com o inadequado controle da dor com uso de subdose Uso preferencial da via oral sem esquecer as vias alternativas Os opioides podem ser empregados pelas vias oral VO retal VR sublingual SL intramuscular IM intraventricular IV subcutânea SC transdérmica TD epidural in tratecal intraarticular e nos troncos nervosos Em Cuidados Paliativos o objetivo de conforto prevalece também na escolha da via de administração dos fármacos Recomendase simplificar a prescrição e evitar vias endoveno sas que agregam desconforto dependência riscos e custos geralmente desnecessários À exceção de alguns tumores de vias digestivas altas e de situações clínicas como vômitos disfagia intolerância obstrução intestinal caquexia e necessidade de sedar o paciente que justificam uma via alternativa a VO além de ser a recomendada pela OMS aparece como a preferida em mais de 75 dos pacientes podendo ser mantida até os últimos dias de vida No entanto essa via exerce influência sobre a incidência de meta bólitos tóxicos da morfina no SNC morfina3glicurônioM3G e morfina6glicurônio M6G quando em comparação com a administração endovenosa Os pacientes que re cebem morfina VO apresentam prevalência três vezes maior de mioclonias em compra ração àqueles que tomam a droga por via parenteral A diminuição da dose de morfina em 25 a 30 a troca de via de administração e a hidratação podem reverter o quadro de neurotoxicidade caracterizado por sintomas neuropsiquiátricos confusão déficit de atenção perda de memória delírios e alucinações5 Quando a VO não é possível a mais utilizada é a SC hipodermóclise por sua efetivi dade e facilidade de uso Proporciona o mínimo de desconforto para o paciente eliminan do a necessidade de injeções frequentes sendo confortável e segura para uso domiciliar As regiões peitoral deltoide mesogástrica e coxofemoral são as zonas de punção mais utilizadas podendo permanecer somente por dois a três dias mesmo que não se identifi quem complicações da técnica inflamação hematomas e infecção Midazolam morfina haloperidol tramadol metroclopramida e dexametasona são alguns dos medicamentos mais frequentemente infundidos por esta via pois não são irritantes Essa administração pode ser em bolo ou infusão contínua diluída preferencialmente em solução salina ou soro glicosado a 5 combinados ou não com o cuidado de não exceder o volume limite de 10 mlh diminuindo assim a possibilidade de irritação local e má absorção A equi valência da dose de morfina oralsubcutânea é de 21 ou seja a dose oral de morfina é reduzida em 50 para ser administrada por via SC A infusão exclusiva de morfina permite a manutenção do mesmo local de punção por até duas semanas podendo ser interrompida a qualquer hora sem risco de trombose 99 A VR pode ser uma alternativa à VO porém se associa a menor adesão de doentes e a irregularidade na absorção As doses empregadas VO e VR são bem semelhantes As formas de apresentação transdérmica em que o fármaco é incorporado a um patch para produzir uma taxa constante de suprimento e evitar o metabolismo présistêmico e a consequente diminuição da biodisponibilidade inerente à VO só são apropriadas para fár macos altamente lipossolúveis como o fentanil que na pele proporciona biodisponibilidade em torno de 92 mantendo uma concentração sistêmica estável por 72 horas Os adesi vos possuem superfície coberta com microporos de tamanhos diferentes que controlam a frequência de liberação do fentanil em aproximadamente 25 50 75 e 100 µgh que pro movem crescentes concentrações plasmáticas da droga É importante lembrar que a derme funciona como um reservatório secundário de forma que depois da remoção do adesivo pode haver manutenção da concentração plasmática da droga com efeitos colaterais tardios 8 a 12 horas A adoção dessa via deve ser precedida da administração de morfina oral ou parenteral a fim de aferir eficácia e tolerância aos opioides bem como para determinação da dose apropriada utilizando a ajuda de uma tabela de conversão Quadro 6 Portanto ela não está indicada a doentes que necessitam de titulação rápida já que seu início de ação é de aproximadamente 12 a 24 horas para atingir concentrações de equilíbrio e controle da dor Caso isso não ocorra nas 48 horas devese reajustar a dose utilizando um patch adicional de 25 µgh e tendo como base a doseresgate necessária nesse período Os adesivos devem ser fixados sobre a pele limpa em superfícies planas regiões lombar e dorsal e braços sem pelos evitando as áreas irritadas e irradiadas da pele A via IV é a de escolha quando a VO não é possível e há necessidade de uma titulação mais acelerada da dose analgésica Entretanto associase a maior desconforto do doente custos e riscos de infecções locais e sistêmicas A via IM é pouco indicada por ser dolorosa e desconfortável Quando um fármaco não é eficaz por via sistêmica ou instalase a tolerância as vias peri dural subaracnóidea ou intraventricular podem ser utilizadas desde que sejam realizadas por profissionais capacitados para tal procedimento motivo pelo qual são de rara ocorrência Por essas vias a analgesia é mais prolongada do que a sistêmica em doses inferiores Doses sistemáticas Ao se prescreverem analgésicos devese conhecer a sua faixa terapêutica analgésica que representa os níveis nos quais sua concentração se mantém constante para permane cer na zona de analgesia pois a dor crônica requer tratamento preventivo portanto eles devem ser prescritos em intervalos regulares Ao se administrarem doses subterapêuticas as concentrações analgésicas se mantêm baixas e consequentemente o paciente perma nece com dor Se forem administradas doses supraterapêuticas conseguese a analgesia em curto período de tempo obtendose rapidamente os efeitos colaterais Portanto o tra tamento deve ser iniciado com doses baixas de opioides administrados em intervalos fi xos para se manterem os níveis plasmáticos e consequentemente a faixa terapêutica24 Usar drogas adjuvantes Os medicamentos adjuvantes são usados com o objetivo de aumentar a eficácia analgé sica dos opioides prevenir e tratar sintomas concomitantes que exacerbam a dor e colaborar 100 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP com o manejo da dor neuropática Podem ser usados em todos os degraus da escada analgé sica da OMS Entre os coanalgésicos temos corticoides dexametasona anticonvulsivantes car bamazepina gabapentina topiramato pregabalina antipsicóticos clorpromazina e haloperidol antidepressivos tricíclicos amitriptilina e imipramida antihistamínicos prometazina ketamina anestésicos locais e bifosfonatos Esses agentes são sinérgicos aos opioides ou seja podem ser associados em doses mais baixas do que as prescritas isoladamente o que pode reduzir o potencial tóxico de cada um Os antidepressivos tri cíclicos e anticonvulsivantes Quadro 7 são amplamente prescritos e amiúde fornecem benefícios reais Quadro 7 Anticonvulsivantes e antidepressivos tricíclicos disponíveis no Brasil17 Princípio ativo Dose Carbamazepina Iniciar 100 mg de 1212 h aumentar 200 mg a cada semana Dose de manutenção 400 a 600 mg de 1212 h Reduzir em idosos ou casos de insuficiência renal Monitorizar leucograma e função hepática Gabapentina Iniciar 300 mgdia ao deitar 300 mg de 1212 h Aumentar 300 mg a cada 3 dias até a dose de 1800 mgdia Reduzir em idosos ou casos de insuficiência renal Pregabalina Iniciar 75 mg de 1212 h aumentar após 3 dias para 150 mg de 1212 h Aumentar após 7 dias para 300 mg de 1212 h Dose máxima de 300 mgdia Reduzir em idosos ou casos de insuficiência renal Amitriptilina Iniciar 10 a 25 mg ao deitar Titular a cada semana Dose máxima de 50 a 75 mgdia em duas doses diárias ou em uma tomada ao deitar Nortriptilina Iniciar 25 mg ao deitar Titular a cada semana Dose máxima de 100 mgdia de 88 h Minimizar os efeitos indesejáveis Na hora de prescrever um fármaco temos de avaliar vantagens e desvantagens além dos inconvenientes efeitos secundários já que são a causa mais frequente de abandono do tratamento Aproximadamente 22 dos pacientes com dores nãooncológicas des continuam o uso de opioide em função dos seus efeitos adversos Os efeitos colaterais dos opioides Quadro 8 são fatores limitantes tanto para seu uso prolongado como para o acréscimo de doses na busca da concentração analgésica desejada 101 Quadro 8 Efeitos colaterais dos opioides9 Cognitivos Sonolência sedação desorientação confusão mental euforia disforia miose borramento visual inconsciência e coma Digestivos Xerostomia aumento do tono da musculatura lisa depressão da motilidade gastrointestinal prolongamento do esvaziamento gástrico reduções do ácido clorídrico e da secreção pancreática constipação intestinal espasmo no trato biliar náuseas e vômitos Neurovegetativos Rubor facial diaforese e piloereção Inibição simpática hipotensão postural e ativação vagal bradicardia Depressão respiratória tolerância ao CO2 Urológicos Urgência miccional retenção urinária espasmo do esfíncter uretral e diminuição da libido Tolerância Necessidade de ajuste periódico das doses Dependência e vício Dependência física caracterizada pela síndrome de abstinência lacrimejamento espirros bocejos agitação dores no corpo diarreia psicoses e alucinações É comum mas não constitui obstáculo para o uso dos opioides Dependência psíquica comportamento obsessivocompulssivo de busca pelo uso do opioide para fins recreacionais Raro 2 a 18 nos doentes que utilizam para alívio da dor A constipação intestinal é o efeito adverso mais comum no uso dos opioides É dose dependente e não desenvolve tolerância portanto deve ser energicamente prevenida e tratada Juntamente com um opioide se prescreve um laxante em dose única diária ma tinal sulfato de magnésio ou supositório de glicerina ou noturna bisacodil hidróxido de magnésio sene lactulose ou sorbitol Se o paciente ficar alguns dias sem evacuar devese prescrever óleo mineral duas a quatro colheres de sopa à noite e na manhã seguinte aplicar o enema As náuseas e os vômitos têm grande variação individual e desenvolvem tolerância com três a quatro dias Frequentemente são causados pela constipação porém devemse excluir outras causas comuns como hipertensão intracraniana insuficiências hepática e renal compressão mecânica de alças intestinais hipercalemia e hipernatremia além do uso de drogas A associação entre um antagonista dopaminérgico haloperidol 10 a 20 gotasdia e um prócinético bromoprida é bastante eficaz Alternativamente os anta gonistas serotoninérgicos como ondrasetrona metroclopramida e difenidramina podem ser empregados Assim como as náuseas a sedação a confusão mental e a retenção urinária são efei tos transitórios desaparecendo em três a quatro dias Particularmente a sedação pode ser o primeiro sinal de sobredose da medicação e nesse caso devese considerar a redução da dose e excluir outras causas como as metabólicas infecciosas e hidroeletrolíticas 102 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A retenção urinária é tratada com redução da dose manobras de esvaziamento vesical e sondagem vesical A tolerância por ser considerada um fenômeno natural é compensada com a eleva ção gradual da dose da frequência de administração além do uso de medidas adjuvantes AINHs e outras modalidades de analgésicos Não há consenso na literatura quanto ao uso de antagonistas opioides no tratamento desses efeitos adversos porém existe a concordância entre os profissionais dos Cuidados Paliativos de que o importante é informar ao paciente e à família sobre esses efeitos cada vez que se inicia a terapia com opioide esclarecendo assim a prescrição de medicamen tos nãoanalgésicos Dor na atenção domiciliar Na presença de um paciente com diagnóstico de doença terminal associada à dor to tal a equipe de saúde presencia dois tipos de conduta A princípio ocorrem o abandono e o cessar da atenção ao paciente transferindose essa responsabilidade para a família que passa a utilizar os serviços de emergência devido a quadros de dor que no melhor dos casos são estabilizados em centros assistenciais e transferidos para outro ocasionando gasto institucional e maior incerteza para o paciente e sua família É nesse momento que a atenção domiciliar tem espaço O outro tipo de conduta é o encarceramento terapêuti co sendo os pacientes vítimas de quadros dolorosos associados a tratamentos curativos agressivos cujos efeitos secundários e cuja escassa ou nula melhoria implicam custos físico e econômico para paciente sua família e o sistema público de saúde A analgesia domiciliar segue os mesmos princípios já discutidos anteriormente que são efetivos para a analgesia sem riscos notáveis de efeitos adversos Entretanto os bons resultados vão requerer maior compromisso das famílias É vital portanto avaliar a dis ponibilidade da família em conduzir as recomendações médicas Devemse avaliar o grau de conflitos interpessoais a dinâmica familiar o tipo de família a religião e os valores com relação à morte ao tipo de atenção domiciliar e à farmacoterapia proposta para o alívio da dor O provedor dos cuidados pode ser um familiar motivado por um componente emocio nal cuidador informal ou uma pessoa contratada cuidador formal Frequentemente na maioria das famílias o cuidado do paciente crônico é assumido por um único membro da família chamado de cuidador principal podendo ocorrer voluntariamente ou por acordo familiar O cuidador deve exercer diferentes tipos de habilidades para as quais não foi trei nado além de cumprir com o resto de suas responsabilidades particulares o que repercute na qualidade da atenção delegada ao paciente e no estresse emocional do cuidador pela situação vivida Por tudo isso é recomendável que o médico desde o princípio aborde o grupo familiar e identifique aquele que tem propensão para cumprir as tarefas de cuida dor principal buscando acordo e colaboração de todo o grupo Na atenção domiciliar é disponibilizada uma equipe multiprofissional integrada por médico psicólogos assistentes sociais e enfermeiros que informam ao grupo familiar sobre a doença de seu parente a evolução o prognóstico e sobre como os cuidados além de oferecerem apoio moral aju dam psicologicamente A equipe também contará com apoio dado por um guia espiritual Os Cuidados Paliativos domiciliares englobam valores científicos e éticos que não devem ser considerados um luxo restrito a uma elite que pode adquirir esse tipo de cuida 103 do de forma privada mas sim devem ser vistos como uma forma solidária de assistência integrada no sistema de saúde pública8 Referências 1 ADDINGTONHALL J FAKHOURY W McCARTHY M Specialist palliative care in nonmalignant disease Pall Med v 12 p 41727 1998 2 BALLANTYNE J FISHMAN S M ABDI S The Massachusetts 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dispneia Tratase de uma sensação eminentemente subjetiva caracterizada pela percepção des confortável da respiração receio de não conseguir respirar ou ainda uma sensação de avidez por ar É um sintoma muito frequente acometendo cerca de 21 a 90 dos pacientes com câncer com ou sem envolvimento pulmonar12 É importante ter em mente que 24 dos pacientes que apresentam dispneia não possuem patologia cardiopulmonar Isso se explica pela complexidade do sintoma e pelas diversas possibilidades de etiologias além do componente emocional que deve ser cuidadosamente avaliado Como princípio na abordagem de qualquer sintoma em Cuidados Paliativos a primei ra preocupação do profissional de saúde deve ser a minuciosa avaliação da situação Nesse contexto a avaliação da dispneia apresenta uma particularidade não existe uma forma ainda padronizada de se abordar esse sintoma em todos os seus aspectos físico emocional comportamental e circunstancial Dessa forma a avaliação apropriada e a conduta a ser tomada dependem de uma percepção muito acurada de toda equipe e principalmente do médico que acompanha o paciente Existem 33 escalas diferentes para avaliação de dispneia mas nenhuma delas é ade quada para uso isolado porque elas avaliam características unidimensionais do sinto ma3 ou somente a intensidade física ou apenas o componente emocional etc Aspectos diferentes e importantes a serem avaliados são o impacto na funcionalidade de vida e a resposta à terapêutica Quando se faz uma avaliação dos sintomas respiratórios é fundamental que se ava liem não só a intensidade pequena média ou grande mas também as suas característi cas como desencadeantes ritmo de evolução fatores de melhora e piora além da doença que leva ao sintoma Figura 1 Quando se quer explicar e essa é a próxima etapa da abordagem desses pacientes em Cuidados Paliativos é necessário que o paciente entenda o que ocorre de forma que ele seja parceiro do médico e da equipe no controle dos sintomas pois é ele quem nos sinaliza se o sintoma está sendo adequadamente abordado ou não 105 É fundamental que entendamos que dispneia e síndromes respiratórias não são algo a se temer ou muito difícil de abordar e que sempre teremos de fazer as mesmas coisas para todos os tipos de pacientes Tornouse comum julgar que há tão pouco a fazer Um conjunto de sintomas comuns a várias doenças não deve ser sempre abordado de forma padronizada A fisiopatologia da dispneia se caracteriza por uma interação bastante complexa entre receptores sensíveis a estímulos químicos como as pressões parciais de gás carbônico e oxigênio no sangue e mecanoreceptores sensíveis ao grau de expansão da caixa torácica Os impulsos aferentes a partir desses receptores integramse no sistema nervoso central SNC sofrem influência de estruturas pontinas e geram resposta eferente que se traduz em expansibilidade torácica e aumento da frequência respiratória Realizada a insuflação pulmonar existe o reflexo Hering Breuer que faz um feedback negativo com o centro respiratório enviando sinais para que se interrompam os estí mulos à musculatura respiratória Isso tem também influência direta do córtex cerebral demonstrando que as questões emocionais são importantes componentes dessa sintoma tologia7 Figura 2 Outra forma de entender a ocorrência da dispneia é didaticamente dividir suas cau sas de acordo com o estímulo que leva à ativação do centro respiratório e gera o drive ventilatório aumentado e a sensação desconfortável ao respirar Figura 3 A próxima etapa do processo depois de tentar avaliálo e explicálo de forma apro priada e conhecer a fisiopatologia é tentar abordar o que é passível de ser corrigido Havendo causas corrigíveis é possível controlar a dispneia de forma mais fácil e rá pida Quando há derrame pleural por exemplo punção drenagem e eventualmente pleu rodese em caso de derrame pleural de repetição podem ser condutas extremamente úteis Além disso podese lançar mão de anticoagulação no caso de tromboembolismo pulmonar radioterapia laser stents de vias aéreas no caso de obstrução mecânica não Figura 1 Avaliação da dispneia ICC insuficiência cardíaca congestiva DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica 106 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Figura 2 Fisiopatologia da dispneia Figura 3 Mecanismos de gênese da dispneia removível corticosteroides no caso de linfangite carcinomatosa diuréticos em caso de edema pulmonar etc Figura 4 O último princípio na abordagem aos sintomas em Cuidados Paliativos deve ser a atenção aos detalhes 107 Figura 4 Algumas causas corrigíveis e possíveis condutas VNI ventilação nãoinvasiva TEP tromboembolismo pulmonar Os detalhes são sempre o diferencial que evidencia na prática quem é a equipe e quem é principalmente o médico que está cuidando do paciente Nesse sentido é impor tante também como princípio em Cuidados Paliativos a lembrança de que cada paciente é único Além disso devese atentar para qual etapa da doença o paciente se encontra tentar entender o que podemos e devemos fazer para que nossa atitude seja pertinente com diagnóstico e prognóstico e sempre observar necessidades individuais Nesse senti do é importante perceber que a história natural de diferentes doenças é variável como o câncer por exemplo que apresenta uma evolução bastante previsível com a fase final mais bem marcada Para quem se destina a fazer esse tipo de assistência são muito mais difíceis os pacientes com doenças crônicas que evoluem com descompensações repetidas como cardiopatas e pneumopatas Nesses casos nunca se sabe se a agudização atual culminará com a morte ou se irá ocorrer recuperação Além disso existe a possibilidade de morte súbita posteriormente o que é um evento relativamente frequente nessa população De qualquer forma é importante que se tenha em mente por exemplo que se a dispneia ou insuficiência respiratória ocorre após esforço físico isso provavelmente denota uma fase mais inicial na qual é possível corrigir uma série de distúrbios lançando mão de tratamentos farmacológicos com diuréticos broncodilatadores e medicações que tendam a reverter a causa de base da insuficiência respiratória Assim nessa fase em que isso é factível não devemos nos prender apenas aos aspectos meramente relacionados com o controle de sin tomas mas também pensar na intervenção para tentar conter a evolução da doença À medida que os sintomas passam a surgir em repouso o tratamento sintomático toma um papel mais importante ficando muito mais evidente na fase final13 Figura 5 108 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Figura 5 Abordagem diferenciada da dispneia de acordo com a evolução temporal da doença do início dos sintomas até a fase final adaptado de Wilcock A Nottingan University13 Assim a American College of Chest Physicians redefiniu em 20076 diretrizes para o tratamento da dispneia sob o ponto de vista paliativo envolvendo o uso de opioides ansiolíticos oxigênio e também tratamento nãofarmacológico As questões relativas à ventilação nãoinvasiva são controversas e relacionamse com o balanço entre benefício real e desconforto ocasionado pelo dispositivo Isso sem dúvida alguma é um detalhe importante que precisa ser lembrado Opioides O mecanismo de ação dos opioides no controle da dispneia é relativamente desco nhecido Sabese que existem receptores opioides no SNC em toda árvore respiratória e principalmente nos alvéolos Existe um potencial efeito de depressão respiratória advinda dos opioides fazendo com que seu uso seja temido Entretanto esse efeito é infrequente apresenta desenvolvimento rápido de tolerância quando a droga é usada de forma apropria da e tende a ocorrer somente em pacientes que não são usuários crônicos de opioides De qualquer maneira acreditase que isso ocorra por uma alteração da sensibilidade dos receptores centrais a hipercapnia e hipóxia além de alteração da sensibilidade do mecanoceptores da caixa torácica Um contraponto importante nesse contexto é que frequentemente pacientes que apresentam dispneia principalmente em fase avançada da doença apresentam conjuntamente o sintoma de dor que se beneficia também do uso do opioide A dor é um estímulo excitatório contribuindo para minimizar a eventual depressão respiratória Assim o que se recomenda para tratamento da dispneia em casos leves e em pa cientes virgens de tratamento é o uso de codeína na dose de 30 mg via oral VO a cada 109 4 horas Frequentemente a dose pode ser menor mas devese sempre respeitar a poso logia do horário para que o paciente não fique períodos sem a ação do medicamento A prescrição em intervalo posológico diferente é inadequada Para pacientes com dispneia grave e virgens de tratamento as doses eficazes são extremamente individuais Sugerese sulfato de morfina 5 mg VO de 44 h ou outros opioides12 Apesar de recomendada na literatura internacional para uso a cada 4 horas a oxicodona em nosso meio existe sob a forma de liberação lenta e pode ser usada a cada 12 horas A ressalva é que ela é uma medicação cara e acaba por não ser vantajosa prin cipalmente em serviços públicos Vale lembrar que podem ser dadas doses de resgate nos intervalos entre as tomadas programadas e devemse titular as doses totais diárias cuidadosamente com aumen tos de 50 a cada 24 horas Lembrar que pacientes com DPOC e cardiopatas são mais sensíveis e devem ter o início do seu tratamento com metade da dose usual12 também é importante Em pacientes tolerantes ao opioide o manuseio das doses pode ser mais liberal sempre lembrando dos resgates Esses ajustes de dose para cada tipo de paciente é um detalhe relevante Figura 6 Do acordo com as evidências na literatura os opioides por VO ou parenteral são medicações de uso reconhecidamente aprovado em controle de sintomas respiratórios O uso de opioides por via inalatória é controverso na literatura bem como seu uso para dispneia de esforço Com relação aos efeitos adversos há a tendência de serem iguais àqueles observados no tratamento de dor mas não existe uma evidência forte muito pelo contrário de que o uso de opioides possa trazer algum tipo de alteração na saturação de oxigênio por conta do potencial efeito de depressão respiratória Isso demonstra que os opioides não são Figura 6 Uso de opioides na dispneia VO via oral DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica Fonte Thomas R The Lancet Oncology 2002 3 2238 110 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP portanto uma medicação perigosa para o controle de dispneia mesmo em pacientes em fase avançada de doença2 A crítica que se faz sempre aos estudos relativos aos opioides é a de que são extrema mente heterogêneos quanto às populações estudadas aos diferentes tipos de doenças em fases de evolução diferentes além de ao uso de doses e às vias de administração variadas Tudo isso torna a comparação entre os estudos extremamente problemática Benzodiazepínicos O uso desse tipo de medicações é justificado pela presença de componente emocional importante nos sintomas de natureza respiratória Nesse contexto o uso de benzodiaze píniocos tem papel definido A droga mais estudada para esse fim nesse contexto é o midazolan e as doses utilizadas são baixas em torno de 5 a 10 mg em 24 horas É frequente o uso em associação ao opioide tanto por VO intravenosa IV ou subcutânea SC Apesar de alguns estudos mostrarem que o efeito da associação no controle da dispneia é se melhante ao uso do opioide isolado a experiência mostra que quando o componente emocionalafetivo é marcante existe melhora adicional expressiva Além do uso do midazolam descrevese também o uso de lorazepan em doses de até 05 a 1 mg VO por hora e diazepam A manutenção se faz com doses tituladas ministradas a cada 6 ou 8 horas9 Oxigênio O uso de oxigênio como medida paliativa vem sendo estudado de forma sistemática apenas mais recentemente Entretanto na prática é um recurso bastante comum Nesse sentido existe uma preocupação em se identificar um ponto de equilíbrio para a indicação de um artefato que por um lado nem sempre é benéfico e por outro possui custo bastante elevado Em revisão bibliográfica sobre o uso de oxigênio em Cuidados Paliativos1 1996 a 2006 classificando somente artigos envolvendo população adulta de língua inglesa e estudos randomizados e placebo controlados identificamos 29 artigos Em cinco artigos relacionados com câncer o número de pacientes estudado foi pe queno 14 a 51 e o que se observa é que em quatro estudos houve melhora na dispneia tanto com oxigênio como com ar comprimido Isso pode ser explicado pela existência de receptores de estímulos mecânicos na região da face que respondem ao fluxo aéreo Assim não é necessário que muitas vezes se coloque oxigênio nasal Abrir uma janela deixar o doente em lugar arejado e fresco ou mesmo o uso de um ventilador frequentemente têm efeito positivo que pode ser explicado por serem esses receptores responsivos ao contato mecânico do ar com o rosto diminuindo a sensação subjetiva de dispneia De qualquer maneira alguns estudos também mostram que ocorre melhora só com oxigênio e que isso ocorreu de forma mais consistente somente nos pacientes com saturação de oxigênio menor que 90 Em pacientes com DPOC que representam a maior parte da população analisada 21 artigos existem estudos em situações diferentes repouso e durante atividade física e com resultados controversos Excetuandose aqueles que já apresentem indicação clara 111 Figura 7 Uso de oxigênio para paliação da dispneia para oxigenioterapia contínua o uso de oxigênio acaba sendo preconizado para as agu dizações nãoresponsivas a outros tratamentos e nas quais a saturação de oxigênio fica abaixo de 90 Na insuficiência cardíaca existem apenas três estudos em pacientes em classe fun cional CF I II New York Heart Association NYHA um deles com uso em repouso e dois com uso em exercício A grande dúvida é se esses resultados são extrapoláveis para os pacientes com ICC CF IV Os resultados são inconclusivos Portanto não há estudos que demonstrem que o uso de oxigênio para paliação da dispneia seja inequivocamente indicado para pacientes com ICC Assim do ponto de vista geral existe ainda pouca evidência do benefício concreto do uso indiscriminado de oxigênio em Cuidados Paliativos A indicação é precisa em subgru pos e situações especiais Figura 7 Ventilação nãoinvasiva e medidas nãofarmacológicas A grande polêmica da utilização da ventilação nãoinvasiva no contexto paliativo está no fato de que esse foi que um aparato terapêutico criado para tratamento de insuficiência res piratória aguda e com benefício comprovado em alguns subgrupos de pacientes com reversão do quadro agudo O uso em Cuidados Paliativos sempre foi muito questionado pela necessidade de se esta belecer um equilíbrio entre alívio de sintomas e eventualmente prolongamento desconfor tável de sofrimento e processo de morte É importante que se tenha em mente exatamente o que se deseja com esse procedimento já que podemos estar levando pacientes em agonia final à condição de privação de um contato mais próximo com a família e de alguma forma de expressão por causa da máscara de pressão positiva que é colocada no rosto podendo piorar ainda mais os sintomas 112 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Dois interessantes estudos em pacientes de unidade de terapia intensiva UTI que possuíam documentação de ordens de nãointubação podem trazer uma visão um pouco diferente do assunto811 Nesse tipo de paciente surgiu a dúvida sobre se seria efetivo e até mesmo ético incluir a ventilação nãoinvasiva como opção para controle de uma eventual agudização Existia uma tendência a se achar que isso poderia ser útil para subgrupos de pacientes com DPOC e ICC a exemplo do que já acontece em situações que não caracterizam terminalidade A conclusão geral é de que tais pacientes que apresentam condições clínicas gerais melhores mais cons cientes menos desnutridos com escores de prognóstico melhores que entendem e aceitam o procedimento etc têm uma mortalidade relacionada com o evento agudo tratado com ven tilação nãoinvasiva modalidade ventilação com pressão positiva contínua bifásica BIPAP bem menor que outros pacientes com insuficiência respiratória hipoxêmica como no caso do câncer por exemplo A taxa de complicações descrita foi relativamente pequena 5 A escolha do paciente a ser submetido ao procedimento deve ser muito criteriosa e definitivamente não é fácil devendo ser compartilhada sempre com paciente e família Além disso uma série de medidas nãofarmacológicas pode ser instituída para pro porcionar conforto e bemestar ao paciente e à família Nesse sentido o trabalho do fisioterapeuta pode ser de grande valor por meio de técnicas e posicionamento que aju dem na manutenção da via aérea pérvia e no relaxamento da musculatura acessória diminuindo o trabalho respiratório além de exercícios para combater o imobilismo e o uso de técnicas de contenção de energia A aspiração de vias aéreas é um procedimento doloroso e deve ser empregado com critério sempre com uso de analgesia de resgate anteriormente O uso de acupuntura e pressoacupuntura foi descrito como positivo na melhora da dispneia em pacientes com DPOC avançada com impacto na melhora da qualidade de vida10 Figura 8 Figura 8 Tratamento nãofarmacológico da dispneia VNI ventilação nãoinvasiva 113 Outro aspecto importante a ser lembrado é que quando tomamos todas as medidas possíveis e pertinentes em cada situação temos os elementos necessários para nos tran quilizarmos e para que possamos dar apoio mais de perto à família Uma das coisas mais conflitantes para a família é notar que a equipe não está coesa ou se encontra tão ou mais ansiosa no controle da situação A equipe e fundamentalmente o médico devem estar seguros para transmitir isso para a família e acolhêla Tosse A tosse afeta cerca de 37 do pacientes com câncer avançado principalmente de pul mão 38 desses com sintomas moderados ou intensos Ocorre mais de 10 vezes por dia em cerca de dois terços dos pacientes interferindo na respiração no sono e às vezes dificultando a fala5 Chega a ser prevalente em 29 a 83 dos pacientes em Cuidados Paliativos Além do câncer em si das suas complicações e até mesmo do seu tratamento o uso concomitante de outras drogas pode participar na gênese do sintoma5 Figuras 9 e 10 O tratamento se baseia em drogas que atuem nos receptores de tosse espalhados por via aérea superior árvore brônquica diafragma membrana timpânica seios paranasais vasos pulmonares pleuras etc que iniciam a condução do estímulo até o centro da tosse no tronco cerebral Havendo uma doença cardíaca ou pulmonar o uso de medicações específicas para esse fim deve ser tentado inicialmente Caso contrário não se espera que o uso dessas medicações tenha grande impacto na tosse presente por exemplo nas doenças neoplásicas Os opioides são as drogas que apresentam melhor efeito antitussígeno no câncer Porém devido aos potenciais efeitos colaterais outras medicações têm sido aventadas como de pri Figura 9 Causas de tosse relacionadas ao câncer e a outras doenças DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica TEP tromboembolismo pulmonar ICC insuficiência cardíaca congestiva 114 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Figura 11 Tratamento da tosse Fluxograma Fonte Am J Hospice and Pall Care v 24 n 2 p 14451 2007 ICC insuficiência cardíaca congestiva DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica meira linha para o tratamento4 Figuras 11 12 e 13 Entretanto por não estarem disponí veis em sua maioria no Brasil os opioides acabam ocupando papel de destaque no controle desse sintoma Anestésicos locais podem também ser usados de forma inalatória Figura 10 Drogas que podem causar tosse 115 Figura 12 Opioides e nãoopioides no tratamento da tosse NMDA receptores nmetilDaspartato Figura 13 Anestésicos locais no tratamento da tosse Hipersecreção de vias aéreas É importante lembrar que sempre há uma forma de trazer algum conforto Do ponto de vista nãofarmacológico é possível um trabalho integrado com o fisiotera peuta utilizando técnicas para adequar o posicionamento da cabeça e da via aérea de modo a facilitar a drenagem de secreções evitando acúmulo e consequente piora do desconforto além 116 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP de respiração ruidosa sororoca muito angustiante para os familiares O controle apropriado de secreções é importante pesando sempre se o uso de aspiração de vias aéreas é apropriado já que se trata de procedimento doloroso e que traz em geral um desconforto muito grande Podese conseguir redução da quantidade de secreções com o uso de corticosteroides cuja ação é melhor nos pacientes com asma do que com câncer antibióticos macrolídeos como eritromicina diminuição de secreção mediada por macrófagos anticolinéticos como hioscina na dose de 10 mg a cada 4 ou 6 horas VO IV ou SC ou mesmo colírio de atropina na própria cavidade oral na dose de duas gotas a cada 6 ou até 12 horas conforme resposta Em última instância podese lançar mão de sedação paliativa Esse recurso é reserva do como a última opção quando as outras alternativas se mostraram ineficazes Como perspectiva no controle de sintomas respiratórios em Cuidados Paliativos é necessá rio que se façam mais estudos em pacientes nãoportadores de câncer para os quais os estudos são mais escassos A identificação do paciente que possa se beneficiar com cada um desses procedimentos e o momento correto para utilizálos constituemse grandes desafios do médico na paliação de sintomas respiratórios Referências 1 BOOTH S et al Expert Working Group of the Scientific Committee of the Association of Palliative Medicine The use of oxygen in the palliation of breathlessness A report of the expert working group of the Scientific Committee of the Association of Palliative Medicine Respir Med v 98 n 1 p 6677 2004 Review Erratum in Respir Med v 98 n 5 p 476 2004 2 CLEMENS K E KLASCHIK E Symptomatic therapy of dyspnea with strong opioids and its effect on ventilation in palliative care patients J Pain Symptom Manage v 33 n 4 p 47381 2007 3 DORMAN S BYRNE A 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de vida Episódios de vômitos são degradantes São particularmente frequentes em pacientes com câncer em especial nos tumores gástricos ginecológicos e intestinais Um terço dos pacientes com câncer avançado tem vômitos e até 60 deles náuseas3 mas nem sempre estão associados O paciente com náusea crônica habitualmente queixase pouco Quando apresenta vômitos é notado e mais eficientemente tratado Descrevese a náusea como sensação subjetiva e desagradável em epigástrio e oro faringe associada à urgente necessidade de vomitar O vômito consiste no esvaziamento forçado do conteúdo gástrico pela boca ocasionado pela contração espasmódica do dia fragma da parede gástrica da musculatura respiratória e da parede torácica3 Fisiopatologia Para que o vômito ocorra um complexo mecanismo precisa ser acionado e nem todas as etapas desse mecanismo estão esclarecidas As ações incluem desde a salivação que precede a expulsão do conteúdo gástrico até o fechamento da epiglote para proteger as vias respiratórias e abertura da glote sem a qual o aumento da pressão em esôfago pode levar ao sangramento da mucosa gastroesofágica síndrome de MalloryWeiss ou à rotura da parede esofágica2 3 5 O centro controlador desse mecanismo localizase em área primitiva do encéfalo próximo dos centros de controle da respiração e de outras funções vitais o que faz crer na náusea e no vômito como proteção da vida em situações como envenenamentos por exemplo3 Importância deve ser dada também à náusea e ao vômito desencadeados por fatores ligados à emoção Vomitar não deixa de ser uma forma de tentar eliminar emoções e sen timentos desagradáveis muitas vezes associados à presença da doença em si ao contato com a possibilidade da própria morte e a outros sentimentos angustiantes O comportamento também pode ser aprendido e a náusea ser desencadeada pela recordação de uma sensação desagradável relacionada com terapia uso de determinado medicamento ou tratamento A quimioterapia é um tratamento comumente associado à presença de vômitos e ao medo ou a outro significado que possa ter Submeterse ao tratamento pode ser um fator determinante de difícil controle desse sintoma Para compreender o mecanismo de náuseavômito e melhor aplicar os recursos te rapêuticos existentes é necessário entender quais as principais áreas envolvidas quais 118 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP os mediadores identificados em cada mecanismo e como agem os principais recursos terapêuticos A Figura ilustra o conteúdo CÓRTEX CEREBRAL Sistema vestibular VÔMITO ZONAS QUIMIORRECEPTORAS ÁREA POSTREMA NÚCLEO DO TRATO SOLITÁRIO Centro do vômito Tronco encefálico Influência psicológica Benzodiazepínicos Ondansetrona Granisetrona Drogas toxinas Trato gastrointestinal Via vago NCL Trato solitário Haloperidol Metoclopramida Fenotiazídicos Corticosteroides Drogas Quimioterapia Radioterapia Ondansetrona Granisetrona Dimenidrinato Prometazina Metoclopramida Dompreridona Cisaprida Eritromicina Modalidade do trato gastrointestinal Dimenidrinato Dopamina Serotonina Hioscina Hidbatropina ACTHm Histamina Histamina ACTHm 5ht3ACTHmDHNMDA Figura Fonte adaptado de Fallon M Welsh J2 5TH serotonina ACTHm acetilcolina muscarínica D dopamina H histamina NMDA receptor nmetilDaspartato 119 Centro do vômito Localizado no mesencéfalo na formação reticular lateral também conhecida como área medular o centro de vômito recebe estímulos de distintas áreas por meio de diferen tes neurotransmissores e controla as ações complexas envolvidas com o vômito Os principais mediadores envolvidos no centro do vômito são acetilcolina muscarínica ACTHm e histamina H1 Drogas que bloqueiem esses mediadores como hioscina hidrobromida atropina e anti histamínicos podem prevenir náuseas e vômitos mediados pelo centro do vômito3 5 Zonas quimiorreceptoras A mais importante zona quimiorreceptora está localizada na área postrema no as soalho do quarto ventrículo fora da barreira hematoencefálica Estruturas especializadas em detectar substâncias químicas potencialmente perigosas na circulação sanguínea e no líquido cerebroespinhal são acionadas na presença das mesmas e se comunicam com o centro do vômito acionandoo Os principais mediadores químicos na área postrema são dopamina D2 e serotonina 5HT3 Os estímulos químicos podem ser desencadeados por medicamentos opioides antidepressivos tricíclicos e inibidores seletivos da recaptação da serotonina ISRS antiinflamatórios quimioterápicos toxinas infecções insuficiências hepática e renal fatores tumorais metabólicos hipercalcemia hiponatremia Os medicamentos com ação antidopaminérgica como a metoclopramida e o halope ridol e os fenotiazínicos de modo geral levemopromazina e clorpromazina são portanto excelentes antieméticos de ação na zona quimiorreceptora Na falência desses podese lançar mão de antisserotoninérgicos que são medicamentos mais recentes e de custo muito mais elevado Sua melhor indicação ainda reside no vômito induzido por quimioterapia e pósradioterapia e pela presença de mediadores 5HT3 no trato gastrointestinal TGI Anta gonistas da serotonina podem agir em sinergia com o haloperidol em alguns casos2 3 5 Sistema vestibular Está relacionado com o vômito por discinesia e outras alterações vestibulares propria mente ditas como compressão tumoral e hipertensão craniana Os principais mediadores no sistema vestibular são a H1 e a ACTHm Nesse caso o dimenidrinato é a medicação com melhor indicação em especial na prevenção do vômito relacionado com discinesia3 120 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Córtex cerebral e sistema límbico Fortemente influenciado por ansiedade medo e outros sentimentos o sintoma de náuseavômito induzido pelo córtex cerebral e modulado pelo sistema límbico parece ser influenciado pelo sistema ácido gamaaminobutírico GABA agonista É o vômito aprendido após associação negativa desencadeado por odor e presença de alimentos Responde a psicoterapia técnicas de relaxamento e benzodiazepínicos3 Trato gastrointestinal Vários mecanismos envolvem o TGI no desencadeamento de náuseavômito quimiorreceptores em parede do TGI serotonina e neurocininas sensíveis particu larmente aos quimioterápicos estímulo vagal mediado por neurotransmissores ao núcleo do trato solitário NTS envolve serotonina dopamina histamina acetilcolina muscarínica e possivelmente o sistema Nmetildietilaspartato NMDA O estímulo pode ser desencadeado na orofa ringe na obstrução intestinal no estímulo mecânico na obstrução intestinal e na carci nomatose peritoneal motilidade do TGI esvaziamento gástrico lentificado e motilidade intestinal prejudi cada por tumores compressão extrínseca distúrbio metabólico drogas como opioides e anticolinérgicos distúrbio autonômico gastrites úlceras pépticas e ascite Envolve como mediadores principalmente a dopamina e a serotonina13 5 Manejo dos sintomas Os princípios do controle de sintomas devem sempre ser aplicados4 investigação criteriosa explicação do sintoma tratamento de causas reversíveis terapia medicamentosa criteriosa e individualizada revaliação contínua dos resultados Investigação Inclui conhecer o doente e a trajetória de sua doença os tratamentos realizados e os medicamentos atualmente em uso bem como a concomitância de outros sintomas Performances anteriores ao quadro e atual são fundamentais para as decisões terapêuticas Cabe também avaliar início intensidade do sintoma em escala de 0 a 10 prefe rencialmente usando a Edmonton Symptom Assessment Scale ESAS fatores desen cadeantes características do vômito fecaloide biliar alimentar líquido de estase presença ou não de sintomas prodrômicos O vômito desencadeado por hipertensão intracraniama e meningismo por exemplo aparece sem pródromos e tem característica de jato Vale verificar exame físico em busca de sinais como desidratação distensão abdomi nal presença de massas de topografia abdominal ou ascite exame de boca e orofaringe sinais de localização neurológica e meningismo 121 Avaliação complementar inicial deve constar de hemograma urinálise e raios X RX de tórax para afastar foco infeccioso avaliação bioquímica das funções hepática e renal e eletrólitos como cálcio sódio e potássio Na suspeita de obstrução de TGI os RX simples de abdome em pé e decúbito horizontal são exames importantes e acessíveis Sinais de falência renal devem ser investigados com ultrassonografia US de vias urinárias especialmente nos portadores de tumores pélvicos Explicação O profissional de Cuidados Paliativos tem por obrigação explicar muito bem ao paciente e seu familiar após primeiras investigações clínicas usando linguagem acessível o que acontece qual ou quais as causas mais prováveis e quais as condutas possíveis neste mo mento Compartilhar decisões sempre que possível é fundamental A equipe também deve entender o que se passa quais as medidas tomadas e a expec tativa com relação ao tratamento para que todos possam reavaliar o impacto das medidas e propor novas intervenções cada qual em sua área de conhecimento Tratamento de causas reversíveis Inclui qualquer medida que busque o controle da causa do vômito como ajuste ou suspensão de medicamentos uso de antimicrobianos para tratar uma causa infecciosa hidratação para correção de distúrbio eletrolítico uso de bifosfonatos na hipercalcemia e cirurgias quando viáveis nos quadros obstrutivos Intervenções por procedimentos requerem sempre compartilhamento de decisões en tre o cirurgião e o profissional de Cuidados Paliativos e entre esse e o pacientea família Manejo medicamentoso A instituição de terapia com antieméticos no controle de náuseavômito deve ser bastante criteriosa e sempre pautada no mecanismo fisiopatológico mais provavelmente envolvido Náuseavômito quimicamente induzidao Metoclopramida por ação antidopaminérgica e gastrocinética quando não houver quadro obs trutivo 30 a 80 mgdia em até quatro tomadas por via subcutânea SC ou infusão contínua haloperidol na impossibilidade do uso de gastrocinética 1 a 2 mg SC em duas a três doses diárias ondansetrona na falência de ambos Tem ação mais específica no vômito desencadeado por quimioterapia e radioterapia Usar 4 a 8 mg SC a cada 8 horas outras opções como a levemopromazina e a clorpromazina têm indicação secundária pela potencial sonolência e frequente hipotensão postural especialmente com a primeira Estase gástrica Considerar sondagem nasogástrica de alívio se distenção abdominal e sintoma muito intenso Retirar a sonda após melhora identificável 122 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP usar inibidores de bomba de próton ou antagonista H2 preferir gastrocinéticos metoclopramida bromoprida domperidona e eritromicina nos casos nãoresponsivos Hipertensão intracraniana e meningismo Corticosteroides em dose elevada 16 a 20 mgdia Podem ser usados por via endove nosa EV ou SC considerar dimenidrinato se alteração vestibulardiscinesia se apresentar como sintoma associado Irritação peritoneal Metoclopramida ou haloperidol como antidopaminérgicos antisserotoninérgicos como a ondansetrona como segunda escolha antihistamínicos como o dimenidrinato via SC a cada 6 a 8 horas e considerar a pro metazina na dose de 125 mg SC a cada 6 a 8 horas ou em infusão contínua Evitase a prometazina pela alta sonolência que provoca Obstrução intestinal Usar haloperidol como primeira escolha em dose de até 15 mg24 horas ondansetrona e dimenidrinato podem ser úteis como segunda opção restringir volume de hidratação usar antissecretores como hioscina butilbromida ou octeotrida usar sonda nasogástrica SNG até melhora da distensão e redução do volume de dre nagem Retirar se o paciente concordar com o jejum corticosteroides podem diminuir edema de alça e de massa tumoral reduzindo o fator de compressão além de fatores inflamatórios locais Náusea associada a ansiedadeemoções Abordagem psicoterápica correta tratar com benzodiazepínicos os casos refratários Reavaliação do sintoma e planejamento do cuidado A abordagem ideal de náuseavômito inclui reavaliação periódica do sintoma por meio da atribuição do valor de 0 a 10 desse sintoma e de outros associados como pirose boca seca dor perda do apetite fadiga etc A princípio além das medidas de controle da causa dos sintomas apenas um antie mético deve ser usado Dose de resgate com outro medicamento pode ser mantida na prescrição no caso de falência da primeira Nesse caso na avaliação subsequente o ideal é substituir o primeiro medicamento pelo segundo antiemético e assim sucessivamente desde que se tenham utilizado dose otimizada e outras medidas de controle 123 A associação de medicamentos é possível desde que o mecanismo fisiopatológico sugira mais de um fator causal ou nos casos de difícil controle Devese evitar associar medicamentos a mecanismo de ação semelhante como a metoclopramida e o haloperidol Em qualquer caso obtido o controle do sintoma e corrigido o fator desencadeante o objetivo é retornar progressivamente à dieta usual voltar à prescrição prévia por via oral e avaliar a necessidade de manutenção do antiemético ou sua gradual suspensão Lembrar sempre que nenhum medicamento é isento de efeito adverso e que pres crições racionais devem conter apenas o que de fato é necessário ao doente Reavaliar prescrições é tarefa de todas as consultas Referências 1 ELSAYEM A DRIVER L BRUERA E The MD Anderson Symptom Control and Palliative Care Handbook MD Anderson Cancer Center 2 Ed Houston 2003 2 FALLON M WELSH J Management of gastrointestinal symptoms In FAULL C CARTER Y WOOF R Handbook of palliative care London Blakweel Science 1998 3 PACE V Nausea and vomiting In SYKES N EDMOND P Management of advanced disease 4 ed London Arnold 2004 4 TWYCROSS R Cuidados paliativos 2 Ed Lisboa Climepsi Editores 2003 5 WATSON M et al Oxford Handbook of Palliative Care 2 ed Oxford Oxford University Press 2009 124 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Obstipação e diarreia verusKA meneGAtti AnAstáCio hAtAnAKA Alterações do hábito intestinal são queixas comuns entre pacientes sob Cuidados Pa liativos sejam determinadas pela patologia de base eou pelo tratamento a ela direciona do paliativo ou não Cerca de 50 dos pacientes admitidos em hospices são obstipados O problema porém é ainda maior ao se considerar que muitos já se encontram em terapia laxativa Menos comum a diarreia é queixa premente em 7 a 10 dos pacientes com câncer à admissão em hospices e em 27 daqueles positivos para o vírus da imunodefi ciência adquirida HIV A atenção a esses sintomas orientase em conformidade com os preceitos delineados a seguir Obstipação Caracterizada por episódios de evacuações difíceis ou dolorosas associados à dimi nuição da frequência dessas eou presença de fezes endurecidas a obstipação assume natureza multifatorial em pacientes sob Cuidados Paliativos Quadro 16 8 podendo determinar complicações como as listadas no Quadro 29 Opioides interferem direta mente na motilidade do trato gastrointestinal por meio da redução das atividades neu ral e propulsora determinando retardo do trânsito do conteúdo intestinal e aumento da capacidade absortiva de fluidos O manuseio efetivo da obstipação em Cuidados Paliativos exige procedimento atento anteciparse a esse problema comum questionar o paciente sobre sua função intestinal habitual iniciar laxantes profiláticos em concomitância ao início do uso de opioides dar preferência a laxantes orais aos retais combinar laxantes se necessário titular o tratamento visando atingir evacuações confortáveis considerar sempre que possível medidas nãofarmacológicas como aumento da inges tão de líquidos e fibras na dieta atividade física e respeito à privacidade do paciente no uso do toalete evitando por exemplo o uso de fraldas A terapêutica farmacológica baseiase em drogas com efeitos laxantes ou seja capazes de determinar aumento do número de deposições de matéria fecal com di minuição de sua consistência O efeito purgante ou catártico se apresenta quando as fezes se tornam líquidas A diferença entre tais efeitos quase sempre se restringe à titulação da dose Os laxantes podem ser classificados em grupos como podemos observar no Quadro 3 A escolha do laxante deverá ser pautada em alguns princípios diversas combinações poderão ser igualmente efetivas a preferência do paciente poderá ditar a escolha combinações fixas de laxantes reduzem o número de comprimidos necessários ao dia laxantes administrados separadamente permitem melhor titulação de seus componentes comparativamente ao dantron o sene traduzse em maior tendência a causar cólica 125 Quadro 1 Causas de obstipação em Cuidados Paliativos Neoplasia Diretamente devidas ao tumor Obstrução intestinal Dano à medula espinal cauda equina Hipercalcemia Devidas aos efeitos secundários da doença Diminuição do apetite Dieta pobre em fibras Desidratação Fraqueza Inatividade Confusão mental Depressão Alterações dos hábitos de toalete Drogas Opioides Drogas com efeitos anticolinérgicos Antiácidos contendo cálcio e alumínio Diuréticos Anticonvulsivantes Ferro Agentes antihipertensivos Vincristina Doenças concomitantes Diabetes Hipotireoidismo Hipocalemia Hérnia Doença diverticular Retocele Fissura ou estenose anal Prolapso mucoso anterior Hemorroidas Colite Modificado de Sykes et al8 126 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 2 Possíveis complicações da obstipação Dor em cólica ou contínua Obstrução intestinal Retenção urinária Diarreia por transbordamento Incontinência fecal Confusão mental Quadro 3 Tipos de laxante Laxantes que aumentam o volume das fezes Nãoosmóticos formadores de bolo carboximetilcelulose metilcelulose e psyllium Osmóticos sorbitol glicerina lactulona e laxantes salinos hidróxido de magnésio sulfato de sódio Laxantes que facilitam o deslizamento das fezes Lubrificantes parafina líquida Surfactantes docusato de sódio Laxantes estimulantes da mucosa colônica Sene dantron e bisacodil Laxantes que aumentam o volume das fezes Os laxantes formadores de bolo fecal atuam como as fibras aumentando a motilidade colônica em decorrência do aumento do volume fecal Sua efetividade somente se verifica quando a ingestão de líquido se mantém normal Caso contrário pode resultar em obs trução intestinal pela impactação de matéria fecal no cólon motivo pelo qual raramente estão indicados para pacientes sob Cuidados Paliativos Laxantes osmóticos atuam gerando um meio hiperosmótico que atrai água aumen tando o volume das fezes e diminuindo sua consistência Assim a lactulose por exemplo na dose de 15 ml é capaz de drenar para o lúmen intestinal 500 a 600 ml de água Isso por si só pode desencadear desidratação e distúrbios hidroeletrolíticos em pacientes de bilitados Seu uso em Cuidados Paliativos mostrase inapropriado visto a necessidade de adequada ingestão hídrica evolução com presença de distensão abdominal flatulência e cólicas além de aderência prejudicada pelo gosto adocicado de alguns agentes Na cons tipação de difícil controle e impactação fecal no entanto o polietilenoglicol pode exercer papel efetivo2 Diluído em água o volume pode ser um problema para alguns pacientes pode inclusive ser administrado em dose única noturna sem que efeitos colaterais sejam observados como distúrbios hidroeletrolíticos incontinência cólica ou diarreia7 127 Laxantes que facilitam o deslizamento das fezes De natureza lipídica e nãodigerível os laxantes lubrificantes favorecem o desliza mento da matéria fecal ao lubrificála Déficit dos reflexos de deglutição torna seu uso proibitivo devido ao risco de aspiração com subsequente pneumonia lipídica Laxantes surfactantes como docusato diminuem a consistência das fezes ao permitir a penetração de água pela diminuição da tensão superficial das fezes A efetividade des sas drogas é maior quando em associação a laxantes estimulantes Laxantes estimulantes da mucosa colônica Agem estimulando diretamente o plexo mioentérico induzindo peristaltismo e re dução da absorção de água e eletrólitos no cólon daí sua efetividade para obstipação decorrente de opioides constituindose nesses casos em droga de escolha Laxantes retais Estão indicados para situações específicas para tratamento da impactação fecal como tratamento adicional em pacientes cuja constipação não responde adequadamente aos laxantes orais como alternativa para aqueles que não toleram laxantes orais e para o esvaziamento retal em pacientes com compressão da medula espinal A Figura 1 sugere o tratamento para pacientes com impactação fecal10 e a Figura 2 a sequência terapêutica para aqueles com constipação induzida por opioides Embora o bloqueio do receptor opioide com antagonistas específicos constituase em uma in tervenção racional as experiências iniciais com antagonistas opioides tradicionais não corresponderam às expectativas Novas terapias abordam o uso de antagonistas opioides Impactação fecal Fezes amolecidas Fezes endurecidas Figura 1 Tratamento da impactação fecal Supositório de bisacodil 10 a 20 mg seguido após 2 horas por enema salino Enema oleoso de retenção noturno seguido por supositó rio de bisacodil 10 a 20 mg e enema salino na manhã seguinte Figura 1 Tratamento da impactação fecal 128 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP com absorção sistêmica limitada naloxona e antagonistas do receptor μ de ação restrita à periferia metilnaltrexona e alvimopam Naloxona pode reverter a constipação induzida por opioides porém predispõe a reversão da analgesia e presença de sintomas de absti nência mesmo em doses insuficientes para promover evacuação3 Metilnaltrexona por sua vez não atravessa a barreira hematoencefálica portanto não antagoniza os efeitos centrais da morfina ou precipita síndrome de abstinência Sua administração por via subcutânea SC rapidamente induz evacuação em pacientes com doença avançada e constipação induzida por opioides na dose de 015 mgkg4 Alvimopam é um antagonista seletivo do receptor opioide μ que não sofre absorção gastrointestinal ou cruza a barreira hematoencefálica Seu uso está aprovado especifica mente para acelerar a recuperação gastrointestinal após ressecção intestinal Sua dispo nibilidade é restrita devido a aumento da incidência de infartos do miocárdio em estudo de longo prazo envolvendo pacientes em terapia crônica com opioides1 O Quadro 4 especifica o tempo para início da ação de alguns laxantes Laxante estimulante Sem resposta Manter laxante em uso regular Boa resposta Boa resposta Sem resposta Sem resposta Boa resposta Constipação induzida por opioides ex sene 15 mg a cada 1224 h Aumentar a dose ex sene até 225 mg a cada 412 horas Adicionar laxante osmótico ex lactulose 33 g5 ml 15 a 30 ml a cada 1224 horas Adicionar supositório de bisacodil 10 a 20 mg seguido após 2 horas por enema salino Repetir em até três dias se necessário Manter laxante em uso regular Manter laxante em uso regular Figura 2 Tratamento da constipação induzida por opioides 129 Quadro 4 Início de ação de alguns laxantes Bisacodil comprimido 10 a 12 horas Bisacodil supositório 20 a 60 minutos Dantron 6 a 12 horas Docusato 24 a 48 horas Glicerina supositório 1 a 6 horas Lactulose 48 horas Sene 8 a 12 horas O tratamento da obstipação em Cuidados Paliativos baseiase ainda em inadequada evi dência com poucos estudos controlados e randomizados disponíveis incluindo estudos que permitam comparações diretas entre classes distintas de laxantes Persistem portanto dúvi das acerca do melhor manuseio terapêutico da constipação nesse grupo de pacientes5 Diarreia Definese pela passagem de três ou mais fezes não formadas em um período de 24 horas O Quadro 5 delineia causas de diarreia em pacientes em Cuidados Paliativos9 Quadro 5 Causas mais frequentes de diarreia em Cuidados Paliativos Desequilíbrio da terapia laxativa Drogas antibióticos antiácidos AINH ou preparados contendo ferro Impactação fecal com diarreia por transbordamento Radioterapia abdominal ou pélvica Má absorção carcinoma da cabeça do pâncreas gastrectomia ressecção ileal colectomia Tumores colônicos ou retais Tumores endócrinos raros ex tumor carcinoide Doenças concorrentes ex infecção do trato gastrointestinal Hábitos alimentares prévios AINH antiinflamatório nãohormonal O tratamento da diarreia deverá focarse inicialmente na busca de causa específica que justifique o quadro permitindose assim direcionálo de maneira mais apropriada No caso de diarreia persistente agentes nãoespecíficos incluindo agentes absorventes adsorventes inibidores da prostaglandina e opioides poderão ser iniciados 130 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Agentes absorventes Incluindo substâncias formadoras de bolo metilcelulose e pectina atuam absorvendo água constituindo massa coloidal ou gelatinosa que fornece às fezes maior consistência Agentes adsorventes Caracterizamse pela capacidade de acumular moléculas em sua superfície sendo tal capacidade tanto maior quanto a superfície disponível para adsorção Encontramse disponíveis para uso em combinação com outros agentes antidiarreicos recomendando se as doses de caolin 2 a 6 g a cada 4 horas e atapulgita 12 g inicial seguida por 12 g a cada nova evacuação até a dose máxima de 84 gdia Inibidores de prostaglandinas Sua ação reside na redução da secreção de água e eletrólitos pela mucosa O subsa licilato de bismuto apresenta ação adicional antibacteriana e está indicado para trata mento de diarreia nãoespecífica 525 mg a cada 30 minutos até 5 mgdia enquanto a mesalazina 12 a 24 gdia e a aspirina 300 mg a cada 4 horas respectivamente estão indicadas para tratamento da diarreia decorrente de colite ulcerativa e radiação Há de se pesar sempre a relação riscobenefício do uso de doses altas de aspirina com relação aos efeitos colaterais potenciais Agentes opioides Drogas de escolha para o tratamento da diarreia em Cuidados Paliativos os agentes opioides aumentam as contrações tônicas e diminuem as peristálticas com redução sub sequente de água e eletrólitos nas fezes Desses a loperamida é a droga antidiarreica de eleição sendo seu uso recomendado em doses de 4 a 8 mgdia iniciar com 4 mg seguidos por 2 mg a cada evacuação não ultrapassando a dose de 16 mgdia Considerações finais Alterações do hábito intestinal imprimem mudanças significativas no cotidiano de pacientes sob Cuidados Paliativos motivando intervenções frequentes em unidades de prontoatendimento com prejuízo e desvio da atenção concernente a questionamentos psíquicos e emocionais que permeiam essa fase da vida A continência dessas queixas exige abordagem correta e premente permitindo ao paciente seguir seu trajeto sem obs táculos adicionais Referências 1 CADA D LEVIEN T L BAKER D E Alvimopan Hospital Pharmacy v 43 n 10 p 81929 2008 2 CULBERT P GILLETT H FERGUSON A Highly effective new oral therapy for faecal impaction British J of General Practice v 48 p 1599600 1998 3 CULPEPPERMORGAN J A et al Treatment of opioidinduced constipation with oral naloxone a pilot study Clin Pharmacol Ther v 52 p 905 1992 4 KEVIN C et al Methylnaltrexone for opioidinduced constipation in advanced illness NEJM v 358 n 22 p 233243 2008 131 5 MILES C L et al Laxatives for the management of constipation in palliative care patients Cochrane Database of Systematic Reviews 2006 Issue 4 Art n CD003448 DOI 10100214651858 CD003448pub2 6 REDDY S K RAJAGOPAL A GOVIDRAJ N Pain Practice v 2 n 1 p 5664 2002 7 SIEGEL J D DI PALMA J A Medical treatment of constipation Clinics in Colon and Rectal Surgery v 18 n 2 p 7680 2005 8 SKYPES N P Constipation and diarrhea In DOYLE D HANKS G W MAC DONALD N eds Oxford Textbook of Palliative Medicine 2 ed Oxford University Press 2001 p 51326 9 WATSON M et al Oxford Handbook of Palliative Care Oxford University Press 2005 p 2547 10 WHO Symptom Relief in Terminal Illness Geneve 1998 132 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Fadiga sudorese e prurido toshio ChibA luCiAnA reGinA bertini CAbrAl Os sintomas fadiga sudorese e prurido têm em comum o fato de serem pouco reco nhecidos valorizados ou tratados pelos médicos De fato sintomas como dor náuseas e vômitos ou dispneia quando não controlados em geral são mais dramáticos e necessitam ser paliados prioritariamente Mas após o controle inicial desses sintomas as queixas de fadiga sudorese ou prurido muitas vezes assumem grande proporção do sofrimento sentido pelos pacientes sob Cuidados Paliativos por isso devem receber a mesma atenção por parte dos médicos e de toda a equipe multidisciplinar ainda que as opções terapêu ticas sejam mais escassas ou menos efetivas A maioria das publicações sobre o assunto é relativa a pacientes oncológicos São necessários mais estudos para definir se existem condutas específicas e diferentes dessas para pacientes com outras doenças Fadiga Fadiga relacionada com o câncer é definida como perturbadora sensação subjetiva e persistente de cansaço e exaustão física emocional eou cognitiva desproporcional ao nível de atividade física que interfere no status funcional do paciente9 Diferenciase da fadiga do diaadia que é temporária e aliviada com o repouso É um dos sintomas mais prevalentes e desgastantes para o paciente com câncer com impacto negativo na quali dade de vida4 19 Sua prevalência pode chegar a 95 sendo que há grande variabilidade nos estudos a depender do critério diagnóstico utilizado Apesar da alta prevalência e do alto impacto para o paciente dados da literatura mostram que a fadiga é pouco diagnos ticada e tratada pelos médicos17 A fisiopatologia da fadiga relacionada com o câncer é pouco compreendida mas vá rias causas podem sobreporse e contribuir para o seu agravamento As principais causas de fadiga estão relacionadas no Quadro 1 A avaliação da queixa de fadiga deve ser feita de forma ativa por parte do médico que deverá questionar especificamente sobre presençaausência desse sintoma e buscar quantificálo de forma objetiva O mais recomendado é utilizar a escala numérica de 0 a 10 por ser de fácil aplicação e boa para seguimento Na presença de fadiga moderada a intensa 4 a 10 devese proceder a anamnese e exame físico detalhados na busca de causas contribuintes potencialmente tratáveis O tratamento dessas causas para a fadiga constituise na principal opção terapêutica visto que as medidas de tratamento pura mente sintomático são escassas O uso de corticoides dexametasona 1 a 4 mgdia ou prednisona 5 a 20 mgdia pode ser recomendado com base na experiência clínica de melhora sintomática em alguns pacientes entretanto não há evidências científicas para tal uso Além disso devese con siderar que a corticoterapia prolongada acelera a perda de massa muscular Os psicoesti mulantes podem ser indicados para o tratamento da fadiga com base em alguns estudos clínicos Numa recente metanálise com 264 pacientes o metilfenidato 5 a 20 mgdia 133 Quadro 1 Causas relacionadas com a fadiga Anemia Neuromusculares Perda de massa muscular relacionada com caquexia ou imobilidade prolongada Polineuropatia Metabólicas Distúrbios hidroeletrolíticos Hipóxia Insuficiência renalhepática Infecção Endócrinas Insuficiência adrenal Hipotireoidismo Diabetes descompensado Hipogonadismo Nutricionais Deficiênciassíndromes carenciais Anorexianáuseas e vômitos Má absorção Comorbidades Insuficiência cardíacacoronariana DPOCpneumopatias intersticiais Insuficiência renalhepática Psiquiátricas Depressãoansiedade Distúrbios do sono Medicamentos Opioides Ansiolíticoshipnóticosantidepressivos Antihistamínicos diuréticos antihipertensivos hipoglicemiantes etc DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica via oral VO mostrouse superior ao placebo no tratamento da fadiga relacionada com o câncer8 entretanto ainda são necessários dados de maior valor científico O modafinil também tem sido pesquisado com bons resultados em pequenos estudos entretanto esses dados também são escassos e carecem de maior comprovação científica2 Proges tógenos acetato de megestrol e antidepressivos paroxetina não se mostraram efetivos no tratamento sintomático da fadiga8 As medidas nãofarmacológicas com intervenções de toda a equipe interdisciplinar também são muito importantes na abordagem dos pacientes com fadiga principalmente levandose em consideração as poucas opções de tratamento medicamentoso Programas de exercícios físicos podem trazer benefícios na funcionalidade e nos índices de qualidade de vida mesmo em pacientes com doença oncológica avançada11 Além disso terapias psicossociais atividades de lazer orientações quanto a adaptação do ambiente e ativida des cotidianas medidas para higiene do sono e suportes psicológico familiar e nutricional são úteis no atendimento global desses pacientes 134 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Sudorese Sudorese excessiva pode ser um sintoma muito desgastante e de difícil controle para o paciente sob Cuidados Paliativos A prevalência foi de 16 num estudo entre os pacien tes de um hospice14 mas dados de literatura revelam prevalência de até 2812 Muitas vezes a sudorese é pior à noite ou limitada ao período noturno levando a distúrbios do sono Ela pode ser um sintoma típico de alguns tipos de neoplasia como linfoma feo cromocitoma e tumores carcinoides mas qualquer neoplasia avançada pode ser a causa primária desse sintoma As principais causas de sudorese em pacientes com câncer estão listadas no Quadro 2 Quadro 2 Causas de sudorese em pacientes com câncer Infecção associada ou não a febre Paraneoplasica associada ou não a febre linfoma tumores carcinoides feocromocitoma mesotelioma metástases ósseas câncer avançado nãoespecificado Alterações hormonais em decorrência do próprio câncer ou de seu tratamento Medicamentos quimioterápicos opioides antidepressivos tricíclicos inibidores hormonais O tratamento mais adequado deverá ser escolhido conforme a causa da sudorese levandose em conta que muitas vezes a etiologia é múltipla e a causa nem sempre reversível Para os casos de sudorese relacionados com quadro infeccioso o tratamento adequado com antibióticos deverá resolver o sintoma A sudorese associada a tumores neuroendócrinos pode ser controlada com análogo da somatostatina octreotida por via subcutânea SC na dose de 50 a 500 mcg três vezes ao dia Os casos de sudorese as sociada a fogachos em pacientes menopausadas ou naqueles com câncer de próstata submetidos à castração cirúrgica ou farmacológica podem ser tratados com terapia de reposição hormonal acetato de megestrol 20 mg VO duas vezes ao dia ou acetato de medroxiprogesterona 500 mg intramuscular IM quinzenal1 15 mas as contraindica ções relativas e absolutas frequentemente limitam o seu uso em pacientes sob Cuidados Paliativos Homens com câncer de próstata castrados também podem usar estrógenos ou o antiandrogênico acetato de ciproterona 50 mg VO duas vezes ao dia15 Quando a sudorese é associada ao uso de opioide podese tentar fazer rotação para outro opiáceo embora os dados da literatura sugiram que a rotação é pouco eficaz nesses casos20 Os principais fármacos utilizados para o controle sintomático da sudorese são antiinflamatórios nãohormonais AINHs particularmente indicados para os casos de febre paraneoplásica mas também podem ser utilizados para controle da sudorese sem febre naproxeno 250375 mg VO duas vezes ao dia neurolépticos olanzapina 5 mg VO uma a duas vezes ao dia é descrita como alternati 135 va para tratamento da sudorese20 A tioridazina em doses baixas 1025 mgdia também é descrita3 mas o risco de alargamento do intervalo QT e de arritmias fatais praticamen te contraindica seu uso antidepressivos venlafaxina 75 mgdia liberação prolongada tem se mostrado efe tiva no controle da sudorese associada a fogachos em pacientes menopausadas e nos com câncer de próstata submetidos a castração6 13 15 Outros antidepressivos inibidores seletivos da recaptação da serotonina ISRS paroxetina fluoxetina também podem ser empregados7 16 gabapentina na dose de 900 mgdia mostrouse efetiva na redução de sudorese e foga chos em pacientes sob os efeitos de menopausa ou castração e pode ser efetiva também nos casos de sudorese sem causa estabelecida10 12 15 Outras medicações como cimetidina 400800 mg duas vezes ao dia talidomida 100 mg à noite clonidina e hioscina são citadas na literatura como alternativas para controle sintomático da sudorese mas seu uso é limitado pelo alto risco de efeitos cola terais ou pela eficácia questionável Algumas medidas gerais que devem ser recomendadas aos pacientes com queixa de sudorese são listadas no Quadro 3 Quadro 3 Recomendações gerais no manejo da sudorese em Cuidados Paliativos Medidas dietéticas evitar álcool cafeína e alimentos picantes Diminuir a temperatura do ambiente Manter o ambiente mais ventilado Preferir roupas de algodão que absorvem melhor o suor Dormir sobre uma tolha para manter os lençóis secos em caso de sudorese noturna Prurido Prurido representa sensação distinta provinda de camada superficial de pele mucosa incluindo trato respiratório alto ou conjuntiva5 O manejo mais adequado possível de um caso clínico resulta de uso racional de uma medicação por meio de entendimento de fisiopatogenia e compreensão dos mediadores que provocam o prurido em cada situação Quadro 4 Doença sistêmica Prurido na ausência de erupções cutâneas pode ser devido a icterícia insuficiência renal uso de opioide anemia deficiência de ferro tireoidopatia mieloma linfoma poli citemia vera e diabetes Quadro 5 Prurido por problema local Frequentemente pele seca ou escoriada causa coceira por ciclo vicioso de prurido coçadura Eventualmente o simples uso de hidratante ou emoliente pode resolver 136 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 4 Mediadores químicos potenciais que atuam no prurido Aminas histamina serotonina dopamina adrenalina noradrenalina melatonina Proteases triptases quimases carboxipeptidases papaína kallikreina Neuropeptídeos substância P CGRP bradicinina endotelina neurocininas A e B somatostatina CRF VIP CCK alfa e betaMSH neurotensina bombesina Opioides metencefalina leuencefalina betaendorfina morfina Eicosanoides PGE2 PGH2 outros PGs LTB4 outros LTs Fatores de crescimento Citocinas IL1 a IL11 TNFa e TNFb produto eosinofílico Traduzido e adaptado de Krajnik 20015 Quadro 5 Causas mais comuns de prurido em Cuidados Paliativos Prurido senil Colestase Dermatoses infecções fúngicas Doenças linfoproliferativas Medicações opioide sistêmica ou espinal Outras medicações como furosemida Uremia Câncer síndrome paraneoplásica Psicogênico Traduzido e adaptado de Krajnik 20015 Prurido por causa nãocutânea A seguir um roteiro com opções de manejo Roteiro e opções de manejo de prurido de causa nãocutânea conforme etiologia5 acompanhar pelo Quadro 6 medidas gerais corte de unhas hidratante após banho exclusão de dermatoses especialmente escabiose tratamento de causa removível como drenagem biliar e rotação de opioide clorfeniramina 4 mg VO 88 h inefetivo em insuficiência renal crônica IRC e colestase loção de calamine ou mentol localmente pururido associado à colestase colestiramina 4 a 8 g VO ao dia rifampicina 150 mg VO 1212 h ondansetrona para prurido induzido por opioide e uremia 4 a 8 mg endovenosos EV inicialmente depois 4 mg VO 1212 h18 137 paroxetina 20 mg 1 comprimido VO ao dia nos casos de prurido relacionado com a neoplasia Efeito esperado após quatro a sete dias18 cimetidina 200 mg 66 h em doença lifoproliferativa policitemia vera e uremia18 capsaicina creme de 0025 a 0075 88 h Prurido urêmico localizado18 hidroxizina 25 a 100 mg VO até 88 h caso insônia caracterize consequência impor tante no prurido18 Quadro 6 Manejo de prurido em doenças nãocutâneas Condição Etapa 1 Etapa 2 Etapa 3 Medidas gerais B Corrigir o corrigível Creme emoliente Sedativo como benzodiazepínico e clorfenamima 4 mg 88 h Uremia Fototerapia UVB A ou se localizado creme de capsaicina 0025 a 0075 12xdia A Naltrexona 50 mg 1xdia A Talidomida 100 mg A Colestase Naltrexona 125 a 250 mg 1xdia A Rifmpicina 75 a 300 mg 1xdia A ou paroxetina 5 a 20 mg 1xdia A Metiltestosterona 25 mg SL 1xdia ou alternativa como danazol 200 mg 1 a 3xdia U Linfoma de Hodgkin Predinisolona 10 a 20 mg 3xdia Cimetidina 800 mg24h B Mirtazapina 15 a 30 mg VO Induzido por opioide espinal Bupivacaína intratecal A AINH diclofenaco 100 mg A ou tenoxicam 20 mg EV A Ondansetrona 8 mg EV A Induzido por opioide sistêmico Sedativos como benzodiazepínicos Ondansetrona 8 mg VO 2xdia Rotação de opioide Prurido paraneoplásico Paroxetina 5 a 20 mg VO 1xdia A Mirtazapina 15 a 30 mg VO U Talidomida 100 mg U Outras causas eou desconhecidas Paroxetina 5 a 20 mg VO 1xdia A Mirtazapina 15 a 30 mg VO U Talidomida 100 mg U A pelo menos um estudo controlado randomizado B estudo nãorandomizado C baseado em opinião de especialista ou consenso U nãoclassificado relato de um caso ou série pequena de caso Traduzido e adaptado de Twycross 200318 UVB ultravioleta B SL sublingual VO via oral EV via endovenosa AINH antiinflamatório nãohormonal 138 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Referências 1 BERTELLI G et al Intramuscular depot medroxyprogesterone versus oral megestrol for the control of postmenopausal hot flashes in breast cancer patients a randomized study Ann Oncol v 13 n 6 p 8838 2002 2 CARACENI et al Psychostimulants new concepts for palliative care from the modafinil experience Journal of pain and symptom management v 28 n 2 p 979 2004 3 COWAP J HARDY J Thioridazine in the management of cancerrelated sweating J Pain Symptom Manage v 15 n 5 p 266 1998 4 CURT G A et al Impact of cancerrelated fatigue on the lives of patients new findings from the Fatigue Coalition Oncologist v 5 p 353 2000 5 KRAJNIK M ZYLICZ Z Understanding Pruritus in Systemic Disease J Pain Symptom Manage v 21 p 15168 2001 6 LOPRINZI C L et al Venlafaxine in management of hot flashes in survivors of breast cancer a randomised controlled trial Lancet v 356 n 9247 p 205963 2000 7 LOPRINZI C L et al Phase III evaluation of fluoxetine for treatment of hot flashes J Clin Oncol v 20 n 6 p 157883 2002 8 Minton et al A systematic review and metaanalysis of the pharmacological treatment of cancer related J Natl Cancer Inst v100 p 115566 2008 9 NATIONAL COMPREHENSIVE CANCER NETWORK NCCN Clinical practice guidelines in oncology cancerrelated fatigue version 1 2009 Search under Guidelines for supportive care Available at httpwwwnccnorg 10 PANDYA K J et al Gabapentin for hot flashes in 420 women with breast cancer a randomised doubleblind placebocontrolled trial Lancet v 366 n 9488 p 81824 2005 11 POROK D et al The effect of exercise on fatigue in patients with advanced can cer a pilot study Journal of Palliative Care v 16 p 306 2000 12 PORZIO G et al Gabapentin in the treatment of severe sweating experienced by advanced cancer patients Support Care Cancer v 14 p 38991 2006 13 QUELLA S K et al Pilot evaluation of venlafaxine for the treatment of hot flashes in men undergoing androgen ablation therapy for prostate cancer J Urol v 162 n 1 p 98102 1999 14 QUIGLEY S C BAINES M Descriptive eipdemiology of sweating in a hospice population J Palliative Care v 13 p 226 1997 15 SPETZ A C et al Incidence and management of hot flashes in prostate cancer J Support Oncol v 1 n 4 p 2636 26970 2723 16 STEARNS V et al Paroxetine controlled release in the treatment of menopausal hot flashes a randomized controlled trial JAMA v 289 n 21 p 282734 2003 17 STONE P et al Cancerrelated fatigue inevitable unimportant and untreatable Results of a multi centre patient survey Cancer Fatigue Forum Ann Oncol v 11 p 971 2000 18 TWYCROSS R Itches Indian Journal of Palliative Care v 9 n 2 p 4761 2003 19 VOGELZANG N J et al Patient caregiver and oncologist perceptions of cancerrelated fatigue results of a tripart assessment survey The Fatigue Coalition Semin Hematol v 34 p 4 1997 20 ZYCLICZ Z KRAJNIK M Flushing and sweating in an advanced breast cancer patient relieved by olanzapine J Pain Symptom Manage v 25 p 4945 2003 139 Controle de sintomas delirium dAniel limA Azevedo Definição Delirium é um diagnóstico comum na prática dos Cuidados Paliativos sobretudo em pacientes idosos portadores de doença terminal associada a múltiplas doenças crônicas Toda a equipe de saúde precisa estar capacitada para reconhecêlo De acordo com os critérios do texto revisado da quarta revisão do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSMIVTR delirium consiste em uma alteração do nível de consciência de instalação aguda horas ou dias e curso flutuante acompanhada de déficit de atenção e alteração da cognição como déficit de memória ou desorientação Deve existir evidência na história nos exames físico e laboratoriais de que a alteração é causada por uma condição orgânica subjacente ou é consequência direta de uma condi ção médica geral ou de seu tratamento A apresentação do delirium pode assumir duas formas hiperativa ou hipoativa Na forma hiperativa que é a mais diagnosticada ocorrem agitação hipervigilância e alu cinações O paciente encontrase inquieto com discurso incoerente e até agressividade física o que leva os familiares ou a enfermagem a solicitar de imediato uma avaliação médica Por outro lado na forma hipoativa o paciente parece confuso e sedado com retardo no funcionamento motor olhar fixo e apatia4 O delirium hipoativo ocorre em até 85 dos pacientes idosos internados em unidades de terapia intensiva UTI10 e geral mente passa despercebido possuindo prognóstico pior A abordagem do paciente não é diferente daquela usada para o delirium hiperativo Os pacientes podem alternar as duas formas caracterizando um delirium misto Para o diagnóstico costumase empregar o Confusion Assessment Method CAM que é uma ferramenta simples e validada em língua portuguesa5 8 cuja versão curta pode ser aplicada em poucos minutos Quadro 1 O delirium traz desconforto para o paciente e interfere na avaliação de seus sintomas provocando ansiedade em familia res e cuidadores Assim para pacientes com risco aumentado de desenvolver delirium devem ser adotadas medidas preventivas com o intuito de reduzir sua ocorrência Além disso a aplicação periódica do CAM durante uma internação contribui para identificar precocemente a instalação do quadro permitindo a pronta adoção de medidas de tratamento Fatores de risco Um dos objetivos dos cuidados deve ser a prevenção do delirium Para isso o profis sional precisa ficar atento aos principais fatores de risco Quadro 2 e procurar limitálos Uma revisão sistemática da prescrição é vital para reduzir a incidência de iatrogenias me dicamentosas evitandose o uso regular de benzodiazepínicos ou anticolinérgicos sempre que possível A identificação dos fatores de risco e medidas preventivas voltadas para os mesmos resultam na redução de 40 do delirium em idosos hospitalizados7 140 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 1 Versão em português do CAM Presença dos três itens do primeiro bloco um ou dois itens do segundo sugere delirium Início agudo e curso flutuante Há evidência de mudança aguda do estado mental de base do paciente Este comportamento anormal variou durante o dia isto é tendeu a surgir e desaparecer ou aumentar e diminuir de gravidade Distúrbio de atenção O paciente teve dificuldade em focalizar sua atenção isto é distraiuse facilmente ou teve dificuldade em acompanhar o que estava sendo dito Pensamento desorganizado O pensamento do paciente era desorganizado ou incoerente com a conversação dispersiva ou irrelevante fluxo de ideias pouco claro ou ilógico ou com mudança imprevisível de assunto Alteração do nível de consciência O paciente encontrase hiperalerta hipersensível a estímulos ambientais assustando se facilmente letárgico em estupor ou coma CAM Confusion Assessment Method Quadro 2 Fatores de risco para delirium Déficit cognitivo Uso de psicofármacos Imobilidade Desidratação Desnutrição Idade avançada Déficit auditivo ou visual Causas O delirium é uma alteração classicamente multifatorial em que um paciente já vul nerável portador de fatores de risco desenvolve o quadro após exposição a uma série de fatores precipitantes As principais causas de delirium encontramse no Quadro 3 A lista de drogas que podem induzir delirium é longa com destaque para antidepressivos anticolinérgicos benzodiazepínicos bloqueadores H2 e antihistamínicos Processos in fecciosos de qualquer sítio podem ser responsáveis pelo delirium e a equipe precisa estar apta a reconhecer manifestações atípicas em idosos que não apresentam leucocitose ou 141 Quadro 3 Principais causas de delirium Medicações Dor Infecção Mudança de ambiente Imobilidade Uso de cateteres venosos ou urinários Contenção física Distúrbios metabólicos Desidratação Hipóxia IAM Privação sensorial Procedimentos cirúrgicos Privação de sono IAM infarto agudo do miocárdio resposta febril Na situação de uma idosa que habitualmente consegue comer sem ajuda e caminhar com auxílio de andador e que em poucos dias desenvolve dificuldade para se alimentar e leve confusão mental seguida de uma queda da própria altura é obrigatório investigar em caráter de emergência as hipóteses de infecção urinária ou pneumonia mesmo que a anamnese não evidencie disúria dor lombar tosse ou dispneia Constipação intestinal secundária a imobilidade ou uso de opioides é outra causa comum assim como o são dor e distúrbios hidroeletrolíticos A simples mudança de um ambiente com o qual o paciente encontrase familiarizado como o de sua casa para um novo onde ele é assistido por pessoas desconhecidas como um quarto de hospital pode ser suficiente para desencadear delirium Tratamento A abordagem de um paciente em delirium começa necessariamente pela identificação das causas prováveis que costumam ser múltiplas O tratamento envolve a correção des sas causas quando possível e o controle dos sintomas6 Toda avaliação de um quadro de delirium iniciase por uma revisão criteriosa da pres crição atual buscando identificar se existe algum fármaco que possa ser responsável pelo quadro agudo de desorientação Quando possível os fármacos potencialmente indutores de delirium devem ser suspensos ou trocados por outros que não apresentem esse risco Ao mesmo tempo o ambiente em que o paciente se encontra precisa ser analisado de forma crítica existe algum fator que possa estar contribuindo para causar desconforto ou agitação no momento da avaliação Muitas vezes a mudança de pequenos detalhes do ambiente será suficiente para o sucesso no controle do delirium As medidas mais importantes são as nãofarmacológicas Quadro 4 que buscam otimizar a orientação do paciente A presença constante de um familiar ou cuidador contribui para melhorar a comunicação que deve ser feita com instruções pausadas e claras É importante estimular o uso de relógios calendários e crachás dos profissionais com nomes bem visíveis Com frequência pacientes idosos em delirium são amarrados no leito principalmente em terapia intensiva uma conduta inaceitável e que representa um atestado de insuficiência de pessoal de enfermagem ou má prática a qual tende a fazer com que a agitação se agrave A imobilização deve ser evitada retirando contenções e sondas vesicais e encorajando o paciente a manter a independência e caminhar preco 142 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP cemente A privação de sono pode ser tratada com estratégias para redução de ruídos ambientais e por meio da adoção de horários de medicação que não interrompam o des canso noturno do paciente A correção de déficits sensoriais é crucial para o tratamento do delirium Portanto portadores de déficit visual ou auditivo devem permanecer em uso de óculos ou de prótese auditiva para manter a orientação em relação ao ambiente cuja iluminação precisa ser adequada Por último a desidratação deve ser reconhecida para imediata reposição de volume que pode ser feita com segurança por hipodermóclise11 mesmo em indivíduos muito idosos Quadro 4 Tratamento nãofarmacológico do delirium Suspensão de medicamentos potencialmente causadores Reorientação para o ambiente Permanência de pessoas conhecidas com o paciente Remoção de causas de incômodo sondas acessos venosos Preservação do sono noturno Retirada de contenções físicas Estímulo a caminhadas Hidratação adequada O tratamento farmacológico do delirium serve para o controle dos sintomas enquanto as causas básicas ainda não foram revertidas e deve ser instituído sempre que as medidas não farmacológicas não forem suficientes A droga mais estudada para o tratamento do delirium é o haloperidol feito por via oral VO ou subcutânea SC em dose inicial de 05 a 1 mg que pode ser repetida a cada 30 minutos até que seja alcançada a sedação do paciente1 Em geral a dose necessária fica entre 3 a 5 mg Nos dias subsequentes a prescrição deve incluir 50 dessa dose de maneira regular com redução progressiva após resolução dos sintomas A prática de prescrever 5 mg de haloperidol intravenoso IV ou intramuscular IM como dose inicial para tratamento não somente não está descrita em referências clássicas sobre o tema mas também costuma induzir sedação excessiva com risco de broncoaspiração e em curto prazo tende inclusive a ter efeito contrário ao desejado criando novas situações que aumentam o risco de cronificação do delirium devendo portanto ser evitada O tratamento com outros medicamentos como benzodiazepínicos e antipsicóticos atípicos encontra respaldo limitado na literatura3 não sendo recomendado rotineira mente pela carência de evidências de sua eficácia9 Em casos de delirium refratário com agitação incontrolável causadora de grande desconforto para pacientes e familiares pode ser indicada a sedação paliativa Conclusão Um número expressivo de pacientes sob Cuidados Paliativos cerca de 25 a 75 desenvolve algum tipo de delirium ao longo da evolução da doença2 O quadro é geral mente multifatorial e prejudica a comunicação do paciente podendo ser impactante para 143 a família Os profissionais da saúde precisam identificar os fatores de risco procurando adotar medidas preventivas sempre que possível Em caso de delirium já instalado é im portante reavaliar a prescrição e enfatizar a adoção de medidas nãofarmacológicas que possam contribuir para sua reversão Quando isso não é suficiente o haloperidol deve ser titulado da forma correta até o controle dos sintomas Referências 1 AGOSTINI J V INOUYE S K Delirium In HAZZARD W R et al eds Principles of geriatric medicine and gerontology 5 ed New York McGrawHill 2003 p 150315 2 BYOCK I R HEFFNER J E Palliative and endoflife pearls 1 ed Philadelphia Hanley Belfus 2002 3 CARACENI A MARTINI C SIMONETTI F Neurological problems in advanced cancer In DOYLE Det al eds Oxford Textbook of Palliative Medicine 3 ed Oxford Oxford University Press 2005 p 70812 4 CUNHA U G V GIACOMIN K C Delirium no idoso In FORLENZA O V CARAMELLI P eds Neuropsiquiatria geriátrica São Paulo Atheneu 2001 p 64158 5 FABBRI R M A et al Validação e confiabilidade da versão em língua portuguesa do confusion assessment method CAM para detecção de delirium no idoso Arq NeuroPsiquiatr v 59 n 2A p 1759 2001 6 FABBRI R M A Delirium In FREITAS E V et al eds Tratado de geriatria e gerontologia 2 ed Rio de Janeiro Guanabara Koogan p 32532 2006 7 INOUYE S K et al A clinical trial of a multicomponent intervention to prevent delirium in hospitalized older patients N Engl J Med v 340 p 669 1999 8 INOUYE S K et al Clarifying confusion The confusion assessment method A new method for detection of delirium Ann Intern Med v 113 p 941 1990 9 JACKSON K C LIPMAN A G Drug therapy for delirium in terminally ill patients Cochrane Database of Systematic Reviews 2004 Issue 2 Art No CD004770 DOI 10100214651858CD004770 10 OUIMET S et al Incidence risk factos and consequences of ICU delirium Intensive Care Med v 33 p 6673 2007 11 REMINGTON R HULTMAN T Hypodermoclysis to treat dehydration a review of the evidence JAGS v 55 p 20515 2007 144 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Ansiedade e depressão em Cuidados Paliativos como tratar ritA dewAY GuimArães Introdução Ansiedade e depressão podem ser caracterizadas como enfermidades médicas com sinais e sintomas específicos frequentes na prática clínica mas nem sempre reconhecidas e tratadas de forma correta Atualmente a depressão é considerada problema de saúde pública Os custos da assistência médica o tempo de trabalho perdido e a diminuição da qualidade de vida geram prejuízos sociais e funcionais importantes Os transtornos de ansiedade precisam ser diferenciados da ansiedade fisiológica necessária para a realização das atividades do diaadia A ansiedade patológica se manifesta como uma reação exagerada a diversos estímulos levando a sintomas físicos incapacitantes e tal qual a depressão gerando encargos para toda a socie dade Nesse contexto há um grupo de indivíduos que merece atenção e tratamento especial pacientes sob Cuidados Paliativos A medicina paliativa nasceu da necessi dade de melhorar a qualidade de vida dos pacientes para os quais a cura não é mais possível e a qualidade de vida está ou estará em breve deteriorada Nesses indivídu os o fator desencadeante do seu transtorno ansiedade ou depressão e é justamente ser colocado no limite da sua existência na incerteza de quanto tempo permanecerá vivo o quanto terá que lutar para aumentar a sobrevida passando por perdas reais sejam elas emocionais sociais financeiras e afetivas Neste capítulo tentaremos definir a melhor estratégia terapêutica para os pa cientes sob Cuidados Paliativos que desenvolvem depressão e transtornos de ansie dade visando minimizar o sofrimento e desenvolver condições pessoais de enfren tamento Depressão As doenças crônicas são sabidamente associadas a maior risco de ocorrência de quadros depressivos Os pacientes portadores de doenças crônicodegenerativas costumam criar estratégias de enfrentamento de situações que os levarão à ter minalidade sem necessariamente cursar com depressão No entanto a queda na qualidade de vida com comprometimentos social e afetivo dita o grau de impacto na vida de cada um Apesar de não ser o objetivo deste capítulo sabemos que os principais sinais e sintomas que levam a um correto diagnóstico de depressão são a persistência por um período maior ou igual a duas semanas de distúrbios alimentares como ina 145 petência ou compulsão levando a perda ou ganho de peso excessivo distúrbios do sono disfunção sexual com perda acentuada da libido perda da criatividade e do prazer recorrência de ideias negativas e catastróficas tendência à ociosidade ao isolamento e até quando mais grave à ideação suicida Uma vez diagnosticada e corretamente classificada a depressão devemse iniciar o tratamento e o acompa nhamento desse indivíduo Tratamento A primeira etapa é estabelecer junto a uma equipe multidisciplinar a fase evo lutiva da doença respeitando o princípio da beneficência e da proporcionalidade terapêutica É importante manter o princípio da veracidade e do nãoabandono A equipe deve manter seu acompanhamento regular sabendo passar as informações de ma neira que sejam respeitados seus limites e suas condições de receptividade Devese cuidar do ambiente doméstico manter boa iluminação tentar estimular o apetite e a crença espiritual O controle de sintomas principalmente a dor que é um fator de piora do quadro depressivo ou amplificação do mesmo é essencial A psicoterapia é fundamental para que o paciente consiga expor dúvidas medos e vivências complicadas O psicólogo julgará cada caso e definirá a técnica a ser adotada objetivando a compreensão do processo A acupuntura é uma especialidade reconhecida pelos reais benefícios empre gando técnicas bem estabelecidas para redução dos sintomas de ansiedade com blo queio de pontos específicos além de atuar como coadjuvante nos sintomas físicos especialmente de trato digestivo e álgicos Massoterapia musicoterapia e técnicas de relaxamento são válidas A terapia ocupacional TO representa importante apoio ao paciente resgatando habilidades e melhorando a autoestima A terapia farmacológica fundamentase no uso de antidepressivos podendo ou não estar associada a ansiolíticos A ação terapêutica das drogas antidepressivas tem lugar no sistema límbico o principal centro das emoções Esse efeito terapêutico é consequência de um aumento funcional dos neurotransmissores na fenda sináptica principalmente noradrenalina serotonina e dopamina bem como alteração no número e na sensibilidade dos neurorreceptores Antidepressivos tricíclicos e tetracíclicos Os antidepressivos tricíclicos ADTs aumentam a noradrenalina e a serotonina na fenda sináptica por meio da inibição na recaptação dessas aminas pelos recepto res présinápticos Parece haver também com o uso prolongado dos ADTs diminui ção do número de receptores présinápticos do tipo alfa2 que inibem a liberação da norepinefrina NE 146 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Inibidores seletivos da recaptação de serotonina Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina ISRSs atuam no neurônio pré sináptico inibindo especificamente a recaptação desse neurotransmissor tendo como vantagem a ausência de efeitos anticolinérgicos Neste grupo a fluoxetina a paroxetina e a fluvoxamina são potentes inibidores do sistema enzimático do citocromo P450 CYP mais especificamente CYP2D6 e CYP3A34 É importante que ao escolher esquema de tratamento do paciente sob Cuidados Paliativos tenhase especial atenção para checar drogas que sejam meta bolizadas por esse sistema enzimático bupropriona teofilina amiodarona verapamil diltiazen fluconazol cetoconazol ritonavir itraconazol eritromicina claritromicina opioides anticonvulsivantes cimetidina alprazolam etc pelo risco de elevação do nível sérico da droga eleita e pelas interações farmacológicas indesejáveis As demais drogas desse grupo têm ação inibitória desse sistema enzimático porém significativa mente menos expressiva portanto com menor ocorrência de interações farmacológi cas sendo recomendados como primeira linha de escolha desse grupo o citalopram ou escitalopram e em sequência a sertralina Quadro 1 Droga Dose inicial Dose máxima Amitriptilina Tryptanol Amytril 25 a 50 mg 100 a 300 mg Clomipramina Anafranil 25 mg 100 a 250 mg Mianserina Tolvon 30 mg 30 a 90 mg Doxepin Sinequan 25 a 50 mg 100 a 300 mg Imipramina Tofranil 25 a 50 mg 100 a 300 mg Maprotilina Ludiomil 50 mg 100 a 225 mg Nortriptilina Pamelor 25 mg 50 a 200 mg Mirtazapina Remeron 15 mg 15 a 45 mg Quadro 2 Droga Dose inicial Dose máxima Citalopram Cipramil Procimax 10 a 20 mg 20 a 60 mg Escitalopram Lexapro 10 mg 10 a 20 mg Fluoxetina Daforin Fluxene Prozac Eufor 10 a 20 mg 20 a 60 mg Fluvoxamine Luvox 50 mg 50 a 300 mg Paroxetina Paxil Aropax Pondera Cebrilim 10 a 20 mg 20 a 60 mg Paroxetina CR 125 a 25 mg 25 a 75 mg Sertralina Tolrest Zoloft Novativ Sertrax 50 mg 50 a 200 mg 147 Inibidor de recaptação de serotoninanoradrenalina Os inibidores potentes da recaptação neuronal de serotonina e noradrenalina IRNSs têm fraca ação inibitória do CYP2D6 com baixa incidência de interações medicamento sas exceto quando o paciente está em uso de inibidores da monoamina oxidase IMAOs Em caso de modificação de antidepressivos como fluoxetina e paroxetina por IRNS aten ção para ajuste das doses e controle rigoroso na detecção de efeitos indesejáveis justifi cado pela intensa ação inibitória da fluoxetina e da paroxetina em CYP2D6 e CYP3A34 Quadro 3 Droga Dose inicial Dose máxima Venlafaxina Efexor Alenthus Venlift 375 mg 75 a 300 mg Venlafaxina XR Efexor XR 375 mg 75 a 300 mg Desvenlafaxina Pristiq 50 mg 50 mg Duloxetina Cymbalta 30 mg 60 a 120 mg Quadro 4 Droga Dose inicial Dose máxima Bupropriona Wellbutrin Bup 75 a 150 mg 300 a 450 mg Bupropriona WellbutrinSR Zyban 100 a 150 mg 300 a 400 mg Inibidor de recaptação de dopaminanoradrenalina A bupropiona é um inibidor de recaptação de dopaminanoradrenalina IRDN rela tivamente seletivo com mínimo efeito na recaptação de indolaminas serotonina e não inibindo a monoamina oxidase Quadro 5 Droga Dose inicial Dose máxima Tanilcipromina Parnate Stelapar 10 mg 10 a 60 mg Selegilina Elepril Jumexil 10 mg 5 a 10 mg Moclobemida Aurorix 150 mg 150 a 600 mg Inibidores da monoamina oxidase A monoamina oxidase é uma enzima envolvida no metabolismo da serotonina e das catecolaminas Os IMAOs promovem aumento da concentração desses neurotransmisso res nos locais de armazenamento no sistema nervoso central SNC e no sistema nervoso simpático SNS Tem ação inibitória no sistema enzimático do citocromo P450 e é incom patível com betabloqueadores e outras drogas que sejam metabolizadas principalmente por CYP2D6 e CYP3A34 já citados 148 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Antagonista serotoninérgicoinibidor de recaptação de serotonina Quadro 6 Droga Dose inicial Dose máxima Nefazodona Serzone 50 mg 300 a 600 mg Trazodona Donaren 50 mg 150 a 400 mg Fases do tratamento Fase aguda a resposta inicial do tratamento antidepressivo ocorre entre duas a quatro semanas após o início da medicação e a fase aguda contempla os primeiros três meses O objetivo dessa fase é a diminuição ou remissão completa dos sintomas com obtenção da dose ideal de tratamento fase de continuidade até seis meses O objetivo dessa fase é a completa remissão dos sintomas fase de manutenção até o primeiro ano exceto se já houver relato de três ou mais epi sódios prévios de depressão o que eleva o tratamento para cinco anos O objetivo dessa fase é a descontinuação progressiva da droga ao longo de quatro semanas Se houver sinais de recorrência deverseá retornar ao uso na dose anteriormente utilizada Escolha do medicamento antidepressivo O American College of Physicians ACP após extensa revisão de estudos comparando os grupos antidepressivos suas variáveis clínicas e efeitos colaterais custos aderência tratamento correto e ocorrência de recidivas recomenda o uso de um entre 12 fármacos da segunda geração ISRS IRNS IRND citalopram bupropriona duloxetina escitalopran fluoxetina fluvoxamina mirtazapina nefazodona paroxetina sertralina trazodona ou venlafaxina e ADT 51315 porém o grupo mais bem tolerado com melhor perfil para menor índice de efeitos colaterais e menor complicação em casos de doses muito eleva das foi o ISRS ficando como recomendação de primeira escolha para iniciar o tratamen to com destaque para citalopram escitalopram e sertralina O ACP enfatiza entretanto que os demais grupos têm eficácia comprovada a maioria com respostas equivalentes e que a escolha deverá ser individualizada de acordo com o grau de comprometimento de funções sistêmicas efeitos colaterais e limitações que cada antidepressivo apresente para a patologia de base e comorbidades associadas9 10 O paciente sob Cuidados Paliativos geralmente faz uso de várias medicações portanto se faz necessário checar medicações de uso regular e avaliar os riscos de interações medicamentosas que contraindiquem determinado antidepressivo iniciar tratamento com doses baixas mínimas preconizadas ter cuidado especial com doses de antidepressivo no idoso A desvenlafaxina mostra um perfil ideal nessa faixa etária não necessitando de ajuste de dose e não sendo necessária titulação Os demais grupos exceto os que tenham contraindicação ou restrições por co 149 morbidades devem ter sua dose ajustada para a metade da dose mínima preconizada Pacientes com dor de difícil controle e depressão se beneficiam com o uso de du loxetina e venlafaxina Caso a característica da dor seja neuropática o antidepressivo tricíclico tem resposta excelente para ambas as condições Resposta ao tratamento Se não houver melhora dos sintomas depressivos nas seis primeiras semanas do tra tamento preconizase aumento da dose gradativamente até se obterem sinais de respos ta podendose também associar ansiolíticos7 A mudança do fármaco está indicada se ocorrerem efeitos colaterais indesejáveis graves ou intoleráveis ou ausência de resposta terapêutica após as modificações Contraindicações para grupos especiais IMAO portadores de asma hipertensos usuários de anticonvulsivantes ADT portadores de cardiopatias com distúrbios de condução epilepsia hipertensão glaucoma de ângulo fechado e prostatismo Contraindicação relativa para uso em idosos ISRS evitar dose elevada em pacientes com alterações plaquetárias exceção para o citalopram Duloxetina e nefazodona evitar em portadores de doença hepática Transtornos de ansiedade A ansiedade é definida como um estado de humor desconfortável vivenciado como sentimento difuso de medo e apreensão Nos pacientes sob Cuidados Paliativos o estímu lo desencadeador costuma ser o diagnóstico de uma doença grave sem proposta curativa ou mesmo a percepção de que sua doença evolui de forma refratária Diante de um estí mulo tão intenso o paciente tende a evoluir com ansiedade que comumente evolui para um estado patológico Essa ansiedade patológica deve ser reconhecida precocemente para que se possa iniciar a terapia adequada Após um correto diagnóstico os transtornos de ansiedade devem ser ainda classifica dos em transtorno de ansiedade generalizada transtornos de pânico e fobia social que merecem abordagens diferenciadas Transtorno de ansiedade generalizada Os sintomas característicos do transtorno de ansiedade generalizada TAG podem ser agrupados em três categorias tensão motora hipervigilância e hiperatividade auto nômica trAtAmento A terapia cognitiva comportamental TCC tem eficácia comprovada no tratamento do TAG particularmente em pacientes na fase intermediária de Cuidados Paliativos A atividade física deve ser indicada para pacientes com condições físicas adequadas 150 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quando o paciente está restrito ao leito recomendase fisioterapia de conforto A acupuntura possui técnicas bem estabelecidas para redução dos sintomas de ansie dade com bloqueio de pontos específicos Massoterapia cromoterapia e outras técnicas de relaxamento também são indicadas terAPiA FArmAColóGiCA Benzodiazepínicos É o grupo de escolha para o tratamento do TAG Os benzodiazepínicos BZDs pos suem boa absorção oral e atingem concentração plasmática máxima em 1 hora com forte ligação proteica e alta solubilidade lipídica Os seus efeitos principais são exercidos no SNC com redução da ansiedade sedação e indução de sono Os seus principais efeitos colaterais são sonolência confusão amnésia e déficit de coordenação motora acentua dos nos idosos Preconizase que o seu uso deva ser iniciado com a menor dose que promova alívio da ansiedade e uso de doses fracionadas diminuem a ocorrência de efeitos colaterais O diazepam por possuir meiavida mais longa é considerado uma droga mais fácil de ser retirada Quadro 7 BZD Equivalência com 5 mg de diazepam Dose média ansiedade Dose geriátrica Alprazolam 05 12 02505 Clordiazepóxido 10 1575 530 Clonazepam 025 0515 0251 Clorazepato 75 15675 1560 Cloxazolam 1 28 28 Lorazepam 1 26 0515 Oxazepam 15 3060 1030 BZD benzodiazepínico Buspirona É um composto ansiolítico do grupo das azapironas diferindo dos BZDs por não apre sentar efeitos miorrelaxantes anticonvulsivantes ou hipnóticos É agonista parcial de receptores serotoninérgicos Possui boa absorção oral sendo metabolizado pelo fígado Uma característica interessante dessa classe é que não provoca sintomas de abstinência na retirada e não possui efeitos colaterais graves podendose usar por longo prazo Os efeitos adversos mais comuns são cefaleia fadiga náuseas insônia e tontura A dose ini cial é de 15 mg divididos em três doses com dose máxima de 30 a 40 mgdia A buspirona é indicada quando não se consegue efeito desejado com os BZDs especialmente quando há necessidade de uso por longo tempo 151 Antidepressivos Os fármacos antidepressivos podem ser usados para controle do TAG principal mente quando os BZDs são necessários por longo prazo eou não apresentam resposta satisfatória7 O grupo de escolha é o dos ISRSs podem ser usadas em segunda escolha venlafaxina ou imipramina ver doses em IRNS IRDN e ISRS É importante ressaltar que o efeito terapêutico somente se inicia a partir do 10º dia com ação plena após quatro semanas Transtorno de pânico O transtorno de pânico TP caracterizase pela ocorrência de repetidos ataques de ansiedade conhecidos como crises de pânico Se o paciente encontrase sob Cuidados Paliativos a morte representa o alvo fixo e nessas crises experimentase a sensação de morte iminente sendo em geral uma vivência bastante traumática trAtAmento A psicoterapia está inserida na esfera da TCC A acupuntura possui técnicas bem estabelecidas para redução dos sintomas de ansiedade com bloqueio de pontos es pecíficos Tratamento farmacológico Antidepressivos Os ISRSs são os fármacos de primeira escolha no tratamento do TP Preconizase iniciar com dose mínima e fazer aumento gradual após a primeira semana de tratamento ver doses em IRNS Os ADTs são drogas de segunda linha e têm seu uso limitado em idosos contraindicação relativa e contraindicação para pacientes portadores de doença cardiovascular DCV Benzodiazepínicos Os BZDs mais recomendados no tratamento do TP são alprazolam dose inicial de 025 a 05 mg três vezes ao dia com dose máxima de 6 mgdia e clonazepam dose inicial de 025 a 05 mg duas vezes ao dia com dose máxima de 6 mgdia Fobia social A fobia social se caracteriza pelo desenvolvimento de ansiedade exagerada em situações com exposição pessoal Geralmente o paciente sob Cuidados Paliativos tem importante alteração da imagem corporal decorrente de acentuada perda ponderal alo pecia limitação de movimentos e alterações de pele Essas mudanças físicas causam redução da autoestima deixando o paciente vulnerável e extremamente ansioso pela exposição e análise alheia trAtAmento A psicoterapia é importante instrumento para o tratamento Em geral é recomendada TCC porém a definição fica a critério da psicóloga responsável A acupuntura possui técnicas bem estabelecidas para redução dos sintomas de ansie dade com bloqueio de pontos específicos 152 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Tratamento farmacológico Betabloqueadores propranolol com dose de 20 a 80 mgdia ou atenolol com 50 a 100 mgdia antidepressivos a indicação de primeira linha são os ISRS com destaque para citalo pram 20 a 80 mgdia fluoxetina 5 a 80 mgdia paroxetina 20 a 80 mgdia sertralina 50 a 150 mgdia O tratamento de manutenção deve ser mantido entre seis a 12 meses após melhora dos sintomas mas em casos de evolução para terminalidade e piora da imagem corporal e das atividades gerais a descontinuação pode não se fazer necessária Em fase interme diária havendo resposta a descontinuação deve ser gradativa em quatro semanas para evitar efeitos colaterais e recidivas A psicoterapia deverá ser mantida Referências 1 BABYAK M J et al Exercise treatment for major depression maintenance of therapeutic benefit at 10 months Psychosom Med v 62 n 5 p 6338 2000 2 BERTON O NESTLER E J New approaches to antidepressant drug discovery beyond monoamines Nat Rev Neurosci v 7 n 2 p 13751 2006 3 BULL S A et al Discontinuation of use and switching of antidepressants influence of patient physician communication Jama v 288 n 11 p 14039 2002 4 CIPRIANI A et al Comparative efficacy and acceptability of 12 newgeneration antidepressants a multipletreatments metaanalysis Lancet v 373 n 9665 p 74658 2009 5 DOBSCHA S K et al Depression decision support in primary care a cluster randomized trial Ann Intern Med v 145 n 7 p 47787 2006 6 EBMEIER K et al Recent developments and current controversies in depression Lancet v 367 n 9505 p 15367 2006 7 FURUKAWA T et al Antidepressant plus benzodiazepine for major depression Cochrane Database Syst Rev n 4 p CD001026 2000 8 FURUKAWA T et al Metaanalysis of effects and side effects of low dosage tricyclic antidepressants in depression systematic review BMJ v 325 n 7371 p 991 2002 9 GARTLEHNER G et al Comparative benefits and harms of secondgeneration antidepressants background paper for the American College of Physicians Ann Intern Med v 149 n 10 p 73450 2008 10 GILBODY S et al Collaborative care for depression a cumulative metaanalysis and review of longerterm outcomes Arch Intern Med v 166 n 21 p 231421 2006 11 KROENKE K et al Anxiety disorders in primary care prevalence impairment comorbidity and detection Ann Intern Med v 146 n 5 p 31725 2007 12 MANN J J The medical management of depression N Engl J Med v 353 n 17 p 181934 2005 13 PRACTICE GUIDELINE FOR THE TREATMENT OF PATIENTS WITH MAJOR DEPRESSIVE DISORDER revision American Psychiatric Association Am J Psychiatry v157 n 4 Suppl p145 2000 14 QASEEM A et al Using secondgeneration antidepressants to treat depressive disorders a clinical practice guideline from the American College of Physicians Ann Intern Med v 149 n 10 p 72533 2008 15 RAY W A et al Cyclic antidepressants and the risk of sudden cardiac death Clin Pharmacol Ther v 75 n 3 p 23441 2004 16 ROWBOTHAM M C et al Venlafaxine extended release in the treatment of painful diabetic neuropathy a doubleblind placebocontrolled study Pain v 110 n 3 p697706 2004 17 RUSH A J et al Acute and longerterm outcomes in depressed outpatients requiring one or several treatment steps a STARD report Am J Psychiatry v 163 n 11 p 190517 2006 18 SEMENCHUK M R et al Doubleblind randomized trial of bupropion SR for the treatment of neuropathic pain 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Switzerland World Health Organization 2002 154 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Caquexia e anorexia henriQue A PArsons Introdução e definição Etimologicamente caquexia significa mau estado do grego kakós mau e hexis estado Tradicionalmente a caquexia é relacionada com o emagrecimento excessivo e claramente aparente associado a determinadas enfermidades3 Nos dias de hoje não são muito frequentes os pacientes tipicamente caquéticos extremamente emagrecidos e com proeminências ósseas aparentes Este fato parece decorrer em parte da epidemia de obesidade e também da evolução da ciência médica que permite melhor tratamento das doenças de base nesses pacientes Nos últimos anos também a definição de caquexia vem evoluindo Atualmente ela é considerada uma síndrome que cursa com alguma perda de peso mas essa deve ser associada a uma série de outros fatores inclusive à anorexia redução do apetite com consequente redução do aporte calórico9 Quadro 120 Quadro 1 Critérios atuais para o diagnóstico de caquexia Critério maior Perda de 5 do peso em um ano ou em período mais curto ou IMC 20 kgm2 excluindose edema Critérios menores ao menos três devem estar presentes Anorexia Astenia Baixa força muscular Baixa massa magra Alterações bioquímicas ao menos uma Elevação de marcadores inflamatórios PCR IL6 Anemia Hipoalbuminemia IMC índice de massa corporal PCR proteína C reativa IL6 interleucina 6 Epidemiologia Estimase que a caquexia esteja presente em cerca de 2 da população geral62 Em pacientes com câncer sua prevalência é de aproximadamente 80 aparecendo mais frequentemente nos estágios avançados da doença39 Cerca de 30 dos pacientes com AIDS apresentam caquexia47 embora esta frequência seja bem maior naqueles sem aces so à terapia antirretroviral chegando a níveis semelhantes aos dos com câncer avan çado9 Cerca de 30 dos indivíduos com doença pulmonar obstrutiva crônica DPOC 155 Quadro 2 Fatores agravantes da caquexia Caquexia secundária Má nutrição Redução da ingesta oral estomatites alterações do paladar xerostomia que pode ser resultado de desidratação obstipação intestinal importante obstrução intestinal disfunção autonômica vômitos frequentes sintomas de elevada intensidade como dor dispneia depressão delirium e restrições financeiras Diminuição da capacidade de absorção intestinal síndrome disabsortiva insuficiência pancreática ou diarreia grave Perda ou sequestro proteico ascitederrame pleural com repetidas drenagens síndrome nefrótica Perda de massa muscular por outras causas Inatividade prolongada deficiência de GH hipogonadismo ou mesmo sarcopenia típica do envelhecimento Outros estados hipercatabólicos infecções hipertireoidismo insuficiência hepáticacirrose diabetes mellitus com mau controle ICC ou insuficiência renal GH hormônio do crescimento ICC insuficiência cardíaca congestiva apresentam caquexia sendo ainda maior tal porcentagem naqueles com apresentações mais graves da doença34 52 Pacientes portadores de insuficiência renal crônica também estão sujeitos à ocorrência de caquexia aproximadamente 5040 Insuficiência cardíaca crônica também é causa de caquexia embora sua prevalência ainda seja incerta estima se algo em torno de 15 a 301 2 A síndrome da caquexia é considerada fator de mau prognóstico em todas as doenças descritas1 2 22 29 52 e é associada a pior qualidade de vida23 26 28 30 32 Mecanismo e classificação A caquexia pode ser classificada quanto a sua etiologia em primária ou secundária A caquexia primária é aquela que ocorre como resultado da descompensação metabólica causada pela doença de base Seus mecanismos vêm sendo continuadamente pesquisa dos e o estudo das suas minúcias não faz parte do escopo desta obra Em linhas gerais estão envolvidos na gênese da caquexia primária aumento da atividade inflamatória e da resistência insulínica anorexia hipogonadismo e anemia20 A secundária engloba os fatores agravantes da caquexia primária como má nutrição seja por redução da ingesta oral da capacidade de absorção intestinal ou por perda sequestro proteico perda de massa muscular por outras causas ou outros estados hi percatabólicos Quadro 2 As causas de caquexia secundária podem estar relacionadas com os tratamentos das doenças de base como antineoplásicos antirretrovirais e anti bióticos60 156 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Diagnóstico Clínico Valores de peso tanto o prémórbido quanto outros anteriores à consulta devem ser obtidos pois serão fundamentais na determinação da proporção de peso perdido Deve se dar preferência aos dados de prontuário mas é aceitável utilizar os reportados pelo paciente eou cuidador bem informado quando da inexistência de dados registrados Mediante detalhada história clínica aspectos nutricionais como preferências e hábitos alimentares devem ser explorados Mudanças de hábitos alimentares devem ser identificadas desde o início da doença e quando possível diários alimentares devem ser obtidos de alguns dias ou apenas do dia anterior ao da consulta O ob jetivo desses métodos é estimar a ingesta calórica e com isso determinar se existe déficit energético A anorexia é parte frequentemente integrante mas não obrigatória da síndrome da caquexia De fato na maioria das vezes a caquexia predata o surgimento de alterações do apetite14 Este fato não reduz a importância do correto diagnóstico das alterações de apetite que deve ser realizado de forma sistemática por meio de escalas numéricas ou visuais como o Edmonton Symptom Assessment System pelo qual se solicita ao paciente que gradue o seu apetite em uma escala de 0 a 10 onde 0 está ancorado a o melhor ape tite e 10 a o pior apetite possível5 11 A impressão do paciente sobre a evolução do seu apetite se pior desde o início da doença ou desde o último contato com a equipe ou desde o início de uma terapia por exemplo também fornece dados aceitáveis sobre problemas nesta área37 38 Sintomas do trato digestório como náuseas e vômitos e complicações orais devem ser explorados durante a anamnese É necessário questionar ativamente sobre a saciedade precoce que é causa comum de anorexia e fator associado à gênese da caquexia As alterações do paladar são frequentes e devem ser também investigadas O exame físico da cavidade oral deve ser completo em busca de mucosites estomatites infecções lesões ou quaisquer outras alterações que possam dificultar a alimentação A astenia que pode ser definida como uma redução na capacidade de realizar ativida des físicas ou psicológicas55 pode fazer parte da síndrome da caquexia e seu diagnóstico é clínico por excelência A anamnese orientada para o diagnóstico da astenia deve obriga toriamente explorar a presença de uma sensação generalizada de fraqueza que resulte na inabilidade de iniciar atividades cansaço precoce associado a dificuldade de manter efi cazmente certas atividades e fadiga mental que pode incluir dificuldade de concentração perda de memória e labilidade emocional10 51 Como a astenia cada vez mais as alterações de força muscular vêm sendo descritas como partes integrantes da síndrome da caquexia59 Sua avaliação portanto fazse ne cessária e pode ser realizada por medidas padronizadas como a dinamometria ou pela avaliação subjetiva da força muscular ao exame físico Alimentação apetite e aparência física são extremamente relacionados com emo ções A avaliação psicossocial do paciente sob risco de caquexia é fundamental Diversos problemas familiares costumam aparecer em conjunto com a caquexia geralmente com base na associação quase automática entre o aspecto físico caquético e a proximidade da morte ou em questões relacionadas com a alimentação Portanto uma avaliação abran gente do estado psicológico do paciente bem como dos familiares e cuidadores quando possível pode ser útil para o manejo do caso 157 Antropométrico Evidentemente peso e altura devem ser determinados em todos os encontros com o paciente Recomendase também registrar dados sobre a presença de edema membros inferiores ou ascite por exemplo no mesmo formulário onde será registrado o peso Para o diagnóstico e o acompanhamento da evolução da caquexia devese utilizar a proporção de peso perdido e não medidas individuais de peso que são pouco informativas A determinação da massa magra é significativamente importante no diagnóstico da caquexia Esse dado pode ser facilmente obtido subtraindose do peso total a massa adiposa determinada com o uso de medidas de pregas cutâneas36 Entretanto como a maioria das tabelas de conversão disponíveis é baseada em indivíduos saudáveis o uso das pregas cutâ neas pode não ser o ideal em pacientes severamente doentes Idealmente a massa magra deve ser determinada quando possível por bioimpedância ou métodos de imagem13 54 Laboratorial Ao menos hemoglobina albumina sérica e proteína C reativa PCR devem ser avalia das em pacientes sob risco de caquexia pois podem auxiliar na determinação do plano terapêutico Outras avaliações laboratoriais podem ser necessárias em casos específicos especialmente relacionados com as causas secundárias de caquexia como a dosagem do zinco sérico em pacientes com alterações de paladar da testosterona naqueles com suspeita de hipogonadismo e do hormônio tireoestimulante TSH nos com suspeição de alterações tireoidianas entre outras Conduta Não existe até o momento tratamento comprovadamente capaz de reverter a ca quexia primária Diferentes combinações terapêuticas tendo como alvo os diversos me canismos concomitantes causadores da síndrome vêm sendo estudadas visto que já foi identificada a necessidade de tratamentos abrangentes17 21 58 O primeiro passo para o adequado manejo da síndrome da caquexia é a boa comuni cação com o paciente e seus familiares É comum a interpretação da caquexia como um sinal de morte iminente por falta de alimentação causa de grande sofrimento psicológico em todos os envolvidos41 A comunicação franca combinada com o suporte psicossocial deve permitir que paciente e família realizem a transição do conceito comum de morte por fome para o entendimento do real quadro de desequilíbrio metabólico geralmente irreversível envolvido na caquexia O ato de alimentarse é uma atividade social per se portanto nos casos em que o paciente consegue alimentarse mesmo tendo pouco apeti te ou saciedade precoce o aconselhamento é importante para manter essa atividade du rante o maior tempo possível Orientações gerais como evitar odores durante a elaboração das comidas uso de condimentos de acordo com a preferência do paciente redução do tamanho das porções e realização de refeições mais frequentes podem melhorar o aporte nutricional mas infelizmente não parecem influenciar os sintomas ou a sobrevida49 O tratamento deve ser orientado para as causas secundárias de caquexia que são em sua grande maioria reversíveis ou controláveis Sintomas gastrointestinais e da cavidade oral devem ser tratados de maneira sistemática e intensiva Alterações do paladar se relacionadas com deficiência comprovada de zinco podem ser tratadas com a reposição deste mineral64 25 mg via oral VO três vezes ao dia durante as refeições por cerca 158 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP de três a quatro semanas Xerostomia na ausência de desidratação pode ser prevenida evitandose cítricos álcool e cafeína e tratada com preparações de saliva artificial como carboximetilcelulose ou carmelose A saciedade precoce pode ser tratada com o uso de procinéticos cerca de 30 minutos antes das refeições metoclopramida 10 mg VO três a quatro vezes ao dia Outros sintomas associados como depressão ou delirium devem ser tratados adequadamente Agentes estimulantes do apetite têm seu uso sustentado por sólidas evidências cien tíficas O uso de progestógenos acetato de megestrol VO iniciando com 160 mgdia e progredindo de acordo com a resposta clínica até doses ao redor de 480800 mgdia ou medroxiprogesterona iniciando com 1 gdia até cerca de 5 gdia também de acordo com a progressão da resposta clínica é recomendado pois permite rápida melhora do apetite da fadiga e do bemestar geral4 37 56 Os efeitos colaterais do uso de progestógenos são hipertensão hiperglicemia retenção hídrica hipogonadismo e trombose Seu uso está for malmente contraindicado a pacientes com histórico de trombose venosa profunda ou trom boembolismo pulmonar devendose realizar o monitoramento dos níveis de testosterona Corticosteroides também podem ser utilizados pelo seu efeito estimulador do apetite7 43 18 66 mas seu uso é restrito a poucas semanas devido aos riscos associados a sua utilização prolongada dexametasona 4 mg VO uma vez ao dia pela manhã por exemplo O suporte nutricional está indicado a pacientes com caquexia causada por obstruções do trato digestório ou por impedimentos à alimentação como graves sequelas neuroló gicas grandes tumores de cabeça e pescoço ou mucosites graves por exemplo O uso de nutrição enteral ou parenteral em pacientes com caquexia por outras causas é contro verso e geralmente contraindicado Em pacientes com câncer e caquexia seu uso não é associado a resposta clínica relevante33 42 A administração de talidomida em baixas doses 100 mgdia VO gerou melhoras significativas no apetite nas náuseas e na sensação de bemestar geral depois de 10 dias de uso em pacientes com câncer avançado e caquexia6 Um estudo posterior utilizando 200 mgdia por seis meses comprovou a tolerabilidade da droga e a sua eficácia como estabilizadora do peso e da massa magra entretanto as melhoras sintomáticas não foram reproduzidas25 Pacientes com AIDS e caquexia também foram estudados para o trata mento com talidomida com resultados semelhantes31 O uso de testosterona ou derivados oxandrolona nandrolona parece ser eficaz para o aumento de massa magra em pacientes com AIDS e DPOC que apresentam caquexia e sua utilização pode ser recomendada a essas populações44 48 53 67 O uso do hormônio de crescimento GH recombinante para o tratamento de caque xia já se mostrou eficaz em pacientes com AIDS e caquexia24 61 entretanto seu custo é geralmente proibitivo O ácido eicosapentaenoico EPA óleo de peixe apresentou resultados preliminares promissores que não foram completamente comprovados em estudos posteriores em pa cientes com câncer avançado8 19 27 65 Entretanto efeitos positivos sobre a qualidade de vida e o apetite estão comprovados nesses pacientes12 Alguns psicotrópicos podem ter efeito indireto sobre a caquexia seja no tratamento de quadros depressivos que podem levar à anorexia seja pelo efeito orexígeno direto antidepressivos tricíclicos ou ainda pelo efeito sobre outros sintomas como as náuseas mirtazapina e olanzapina15 159 Potenciais futuros tratamentos A melatonina vem sendo estudada como um agente anticaquexia porém nos estudos realizados até hoje apenas um efeito estabilizador do peso foi notado35 50 Novos estudos com desenho aprimorado estão em andamento O hormônio liberador do hormônio de crescimento GHRH o peptídeo grelina vem sendo testado em pacientes com caquexia associada a insuficiência cardíaca ou DPOC45 46 Em pacientes com câncer um estudo recente comprovou sua segurança e tolerabilidade gerando expectativas quanto ao potencial surgimento de uma nova modalidade terapêu tica para a caquexia57 Anticorpos monoclonais contra interleucina6 IL6 vêm sendo estudados para o tra tamento de câncer e apresentaram efeito anticaquexia Teoricamente a inibição desse importante fator da cascata inflamatória tem potencial para ser o primeiro tratamento eficaz para a caquexia primária63 68 Referências 1 ANKER S D et al Prognostic importance of weight loss in chronic heart failure and the effect of treatment with angiotensinconvertingenzyme inhibitors an observational study Lancet v 361 n 9363 p 107783 2003 2 ANKER S D et al Wasting as independent risk factor for mortality in chronic heart failure Lancet v 349 n 9058 p 10503 1997 3 BILLINGSLEY K ALEXANDER H The pathophysiology of cachexia in advanced cancer and AIDS In BRUERA E HIGGINSON I eds Cachexiaanorexia in cancer patients New York Oxford 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68 ZAKI M H NEMETH J A TRIKHA M CNTO 328 a monoclonal antibody to IL6 inhibits human tumor induced cachexia in nude mice Int J Cancer v 111 n 4 p 5925 2004 162 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Cuidados Paliativos nas demências ClAudiA burlá dAniel limA Azevedo Conceito Demência é um prejuízo adquirido e permanente da capacidade intelectual que afeta pelo menos três das cinco áreas da cognição memória linguagem capacidade visuoespacial emoção e personalidade As principais causas de demência são a doença de Alzheimer 60 a 70 dos casos e as demências vascular por corpos de Lewy e frontotemporal O risco de uma pessoa ser portadora de demência dobra a cada cinco anos a partir dos 60 anos de idade de modo que estimase aproximadamente 50 das pessoas com 85 anos apresentem algum tipo de demên cia Esse percentual alarmante aliado ao atual envelhecimento populacional torna premente a discussão dos Cuidados Paliativos nas demências uma vez que o número de pessoas dementadas crescerá exponencialmente nas próximas décadas5 Este capítulo toma como base a doença de Alzheimer para discutir a abordagem paliativa nas demências Diagnóstico clínico Conforme o texto revisado da quarta revisão do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSMIVTR a doença de Alzheimer é definida por múltiplos déficits cognitivos Para o diagnóstico da doença de Alzheimer além da memória que obrigatoria mente tem que estar comprometida deve estar presente pelo menos uma das seguintes alte rações afasia distúrbio da linguagem apraxia distúrbio da execução agnosia incapacidade para identificar objetos e disfunção executiva incapacidade de planejamento e pensamento abstrato As alterações são graves e causam prejuízo do funcionamento ocupacional e social de uma pessoa que anteriormente era capaz de desempenhar adequadamente suas funções O diagnóstico depende da anamnese e as informações prestadas por cuidadores ou familiares do paciente são vitais uma vez que este geralmente já apresenta dificuldade para reconhecer suas próprias limitações Após anamnese exame físico e avaliação cognitiva exames labora toriais ajudam a descartar causas potencialmente reversíveis de demência como hipotireoi dismo e hipovitaminose B12 e métodos de imagem cerebral contribuem para a exclusão de outras causas como hematoma subdural tumor ou hidrocefalia A doença de Alzheimer é progressiva e incurável Seu curso previsível assim como o de outras doenças crônicas faz com que ela seja um modelo ideal para a aplicação de Cuidados Paliativos Afinal ao longo de sua evolução o profissional tem a oportunidade de conhecer bem a pessoa portadora da doença estreitar os laços com a família e discutir antecipadamente os cuidados que serão adotados Fases evolutivas da demência pela doença de Alzheimer A evolução da doença de Alzheimer pode ser dividida em fases ao longo das quais aumenta a dependência do paciente 163 A fase inicial que dura de dois a quatro anos caracterizase por dificuldade de adap tação a novas situações e confusão espacial Durante a fase intermediária que pode durar de dois a 10 anos costumam surgir agitação insônia prejuízos mais graves de lingua gem incontinência e dificuldades de alimentação A capacidade funcional do paciente encontrase francamente prejudicada e ele passa a depender cada vez mais do auxílio dos cuidadores para executar até mesmo as tarefas mais simples como tomar banho e comer Já a fase final que dura de um a três anos caracterizase por mutismo disfagia desnutrição e imobilidade Podem surgir ulcerações na pele em decorrência da pressão prolongada do corpo sobre uma superfície É comum o paciente aspirar comida ou saliva para as vias respiratórias e desenvolver pneumonia A morte acontece na maioria dos casos por infecção respiratória Na fase avançada da demência a comunicação verbal é precária há dependência funcional para as atividades da vida diária a alimentação pela via oral está comprometida há perda de peso existe risco de broncoaspiração há infecções incontinências urinária e fecal estão presentes Uma dificuldade na prática clínica diária é definir o prognóstico de uma demência o que tem relação com a clássica pergunta dos familiares quanto tempo de vida ainda resta ao paciente É possível estimar que a expectativa de vida seja inferior a seis meses quando um paciente preenche todos os critérios de demência avançada pela Escala de Avaliação Funcional FAST e apresenta pelo menos uma complicação clínica conforme o Quadro baseado nas diretrizes da National Hospice and Palliative Care Organization NHPCO6 8 Quadro Critérios de elegibilidade para Cuidados Paliativos na demência FAST Incapaz de caminhar vestirse e tomar banho sem ajuda Incontinência urinária ou fecal intermitente ou constante Ausência de comunicação verbal significativa capacidade de fala limitada Presença de complicações clínicas Pneumonia por aspiração Pielonefrite ou outras infecções do trato urinário superior Sepse Múltiplas úlceras por pressão Febre recorrente após antibioticoterapia Incapacidade de manter ingesta líquida e calórica suficiente Perda de 10 do peso nos seis meses anteriores Nível de albumina sérica inferior a 25 gdl 164 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Modalidades de intervenção Uma equipe interdisciplinar é essencial nos cuidados a um paciente portador de doença de Alzheimer Médico enfermeiro fisioterapeuta fonoaudiólogo nutricionista psicólogo terapeuta ocupacional assistente social e odontólogo precisam trabalhar em conjunto e falar a mesma linguagem para atingir os objetivos do cuidado identificar e tratar as intercorrências clínicas reconhecer os distúrbios de comportamento otimizar a utilização de fármacos conservar o estado nutricional e a mobilidade oferecer apoio psicológico ao paciente e à família e maximizar e manter o funcionamento do paciente Controle dos sintomas As intercorrências clínicas devem ser avaliadas de maneira minuciosa uma vez que assumem manifestações atípicas em pacientes idosos com demência O que costuma ocorrer no caso de uma pneumonia aguda é taquipneia com piora da confusão mental e da capacidade funcional ao invés do quadro clássico de febre com tosse produtiva e dispneia Da mesma forma o delirium tem que ser avaliado com rapidez pois é um quadro de urgência multifatorial podendo ter como causas infecção dor constipação distúrbio eletrolítico e efeito colateral de medicação entre outras Quedas também são um sinal de alerta cujas causas que vão desde calçados inadequados e privação sensorial até infecções e hipotensão ortostática induzida por fármacos precisam ser pesquisadas à exaustão O trabalho do profissional que lida com demência lembra o de um detetive pois ele muitas vezes já não conta com informações claras prestadas pelo paciente e precisa se basear em pistas da história e do exame físico rigoroso para elucidar o diagnóstico Talvez o maior desafio nessa situação seja o diagnóstico da causa de dor em paciente com demência com grave prejuízo da linguagem quando é fundamental observar o que provoca a fácies de dor para tentar solucionar o problema Transtorno do humor e distúrbio do comportamento são frequentes ao longo da evo lução de uma demência e costumam causar sobrecarga para o cuidador quando não adequadamente tratados Os transtornos mais frequentes são apatia depressão agitação agressividade e delírios Apresentam curso flutuante com períodos de franca exacerba ção O tratamento deve sempre começar pelas medidas nãofarmacológicas A adoção de rotinas e de um programa de exercícios contribui para reduzir a inquietude e a peram bulação O paciente com demência deve ser integrado às atividades da casa evitandose o isolamento e a privação de estímulos Além disso devese procurar reorientálo para a realidade por meio de relógios calendários e fotos Quando se identifica uma causa de agitação a mesma precisa ser evitada Nos casos em que essas medidas não são suficientes para tratar o distúrbio é neces sário empregar fármacos de maneira cuidadosa começando com a menor dose possível e aumentandoa gradativamente Os anticolinesterásicos representam uma categoria inte ressante de medicamentos cujo maior benefício parece ser justamente sobre os transtor nos de comportamento Além disso podem induzir também pequenos ganhos cognitivos ou funcionais quando utilizados na fase inicial ou moderada da doença de Alzheimer Para uso enteral estão disponíveis donepezil galantamina e rivastigmina os quais podem in duzir efeitos gastrointestinais indesejáveis náusea vômitos diarreia que geralmente são transitórios mas que em alguns casos ocorrem de forma persistente ou intensa obrigan 165 do a suspensão do tratamento A rivastigmina também pode ser usada por via transdér mica uma alternativa interessante que reduz a incidência dos efeitos colaterais Quanto aos antipsicóticos devese dar preferência aos atípicos como risperidona quetiapina e olanzapina que induzem menos efeitos colaterais São fármacos com risco de aumento da mortalidade por eventos cerebrovasculares4 e portanto devem ser empregados por períodos curtos com reavaliação frequente de sua indicação A dose inicial recomendada é sempre a menor possível por exemplo 025 mgdia de risperidona com aumento pro gressivo a cada cinco ou sete dias Já os antidepressivos como citalopram ou trazodona costumam ser úteis no tratamento de transtornos de humor agitação ou insônia3 Em suma o que se observa é que existe uma ampla gama de alternativas farmacológicas para abordagem desses transtornos O médico deve tomar o cuidado de conhecer a fundo a farmacologia os efeitos colaterais e as interações medicamentosas de cada um desses medicamentos antes de incorporálos ao seu arsenal terapêutico É fundamental manter a função intestinal uma vez que constipação pode ser causa de grande desconforto e agitação Para tanto podem ser usados laxativos por via oral ou retal Um ponto que não pode ser negligenciado é o cuidado com a integridade da pele Úlceras por pressão e lesões por umidade são causas evitáveis de intenso desconforto Deve ser usado colchão viscoelástico ou de pressão alternante associado a loção de áci dos graxos essenciais Fraldas descartáveis precisam ser trocadas sempre que estiverem úmidas e o lençol do colchão deve estar esticado ao máximo para evitar cisalhamento Existe uma tendência natural dos cuidadores a auxiliar o paciente na execução de tarefas seja por receio de que ele não consiga concluílas ou para acelerar a prestação de cuidados Por exemplo um paciente pode ter dificuldade em vestir uma roupa ou se levantar e o cuidador instintivamente toma a iniciativa e passa a vestilo ou a estender os braços para apoiálo no momento de sair de uma cadeira para caminhar Essa postura de desamparo induzido deve ser evitada pois leva a dependência precoce7 Um dos papéis do cuidador é estimular a independência do paciente dementado Para isso ele deve gentilmente insistir para que o paciente execute as tarefas sozinho oferecendo auxílio somente quando solicitado ou em situação de real necessidade A iluminação dos ambientes deve ser adequada com especial cuidado para a noturna a fim de reduzir a incidência de quedas Barras de segurança em corredores e no banheiro ajudam a manter a independência A morte na maioria das vezes acontece em decorrência de infecções pneumonia infecção urinária ou originada em úlcera por pressão ou por incapacidade de manter ingesta hídrica ou calórica compatível com a vida Os profissionais precisam concentrar esforços para tornar o ambiente mais acolhedor o que pode ser feito com música e inter venção religiosa se conveniente Alimentação na fase final A manutenção do estado nutricional constitui grande desafio uma vez que vários fatores interferem na aceitação da dieta e o paciente dementado em sua fase final tor nase intensamente catabólico Devese ter cuidado ao prescrever fármacos anorexígenos como fluoxetina contraindicada para pacientes idosos e portanto não devendo ser uti lizada e digoxina ou anticolinérgicos amitriptilina por exemplo que são contraindi cados a idosos dementados Próteses dentárias bem adaptadas favorecem a alimentação 166 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP adequada A consistência e o teor dos alimentos variam conforme a aceitação do paciente e a presença de dificuldade de mastigação ou deglutição É indicada a introdução precoce do acompanhamento fonoaudiológico para controle de disfagia e redução do risco de broncoaspiração Já o acompanhamento fisioterápico contribui para retardar a instalação de imobilidade e preservar a independência além de assumir especial relevância na fase avançada de doença quando evita anquiloses e otimiza a dinâmica respiratória preve nindo atelectasias O que fazer diante da recusa alimentar da fase final de demência A decisão de iniciar alimentação artificial é uma das mais difíceis para familiares e profissionais Disfagia anorexia progressiva e a consequente sarcopenia fazem parte da evolução habitual da doença e não devem ser encaradas como intercorrências que precisam ser revertidas Parar de comer é uma das mais tranquilas e confortáveis formas de morrer1 A família precisa estar devidamente orientada sobre isso Embora a confecção de gastrostomia por via endoscópica tenha se tornado comum em função da relativa facilidade técnica do procedimento existem evidências recentes de que a gastrostomia não aumenta a sobre vida não melhora as condições de nutrição nem a imunidade e não previne broncoaspi ração de secreção bucal2 Além disso a gastrostomia pode ser fonte de desconforto e de infecções cutâneas Por essa razão é razoável respeitar a recusa alimentar do paciente com demência avançada que deve ditar a quantidade e o horário do alimento que deseja receber Não existe restrição dietética permitese que ele consuma seus alimentos prefe ridos e à vontade A mucosa oral tende a se ressecar pela recusa de líquidos ou por efeito colateral de medicações e devese cuidar para que ela fique constantemente hidratada usandose gaze embebida em água ou gelo picado COMO ORIENTAR agenda diária rotina do paciente avaliação e intervenção ambiental evitar isolamento e falta de estimulação terapia de orientação para a realidade exercícios para diminuir a inquietude estímulo à formação de grupos serviços de apoio à família O QUE FAZER identificar e tratar intercorrências clínicas estimular o uso da via oral para alimentação reconhecer a caquexia da demência avançada otimizar a utilização de fármacos trabalhar em equipe interdisciplinar reconhecer os distúrbios do comportamento maximizar e manter o funcionamento 167 Comentários finais Todo caso de demência representa uma história de perdas com profundas reper cussões sobre a família que acompanha o declínio cognitivo social e motor de um ente querido Na fase final da doença a família lida com um paciente emagrecido restrito ao leito incapaz de se comunicar e com máxima dependência Sugerese a introdução ao longo do cuidado de suporte psicológico para permitir que a família trabalhe sua relação emocional e afetiva com o paciente que mantém sua iden tidade até o momento da morte Grupos de apoio voluntários ou vinculados a instituições costumam oferecer uma boa oportunidade para reunir e instruir familiares A fase final da doença é caracterizada por fragilidade declínio funcional e falência orgânica Nessa situação o paciente encontrase em situação irreversível ante qualquer terapêutica aplicada Diante do comprometimento de sua autonomia ou seja sua inca pacidade de tomar decisões a família e a equipe enfrentam dilemas éticos e precisam fixar bem o objetivo do tratamento O foco deve ser o cuidado da pessoa e não de um determinado órgão ou sistema que já se encontra em condição de falência evidente Nas palavras de Cicely Saunders lembrese de que uma pessoa é um ser integral física e espiritualmente e a atitude para com essa pessoa deve ser de respeito Cuidar de quem está morrendo é acima de tudo agir com respeito a essa pessoa Nesse momento exi gemse do profissional o máximo de competência técnica no controle dos sintomas e sensibilidade para uma comunicação efetiva com os familiares acolhendo suas dúvidas e os tranquilizando Acima de tudo diante da fragilidade máxima em que os pacientes se encontram o profissional tem o papel de protegêlos de iatrogenias Bons Cuidados Paliativos representam uma questão de saúde pública A demência pode ser uma doença previsível mas seu ritmo evolutivo não Com a expectativa de au mento da prevalência das demências ao longo das próximas décadas os profissionais da saúde devem estar preparados para lidar com os aspectos particulares da evolução dessas doenças reconhecendo a finitude e proporcionando aos pacientes um fechamento digno para suas histórias de vida Referências 1 BYOCK I Dying well peace and possibilities at the end of life Riverhead Books 1997 2 CERVO F A BRYAN L FARBER S Feeding tubes in patients with advanced dementia the decision making process Geriatrics v 61 p 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Embora possa desenvolverse em qualquer momento da doença ocorre mais frequentemente em estágios avançados com a maior incidência variando de 55 a 42 no carcinoma de ovário e de 44 a 42 no câncer de colo retal Também é relatado em outros pacientes com outros cânceres avançados variando de 3 a 15 dos casos18 A obstrução intestinal pode estar presente como característica de malignidade intra abdominal ou de doença concomitante com a história da malignidade A etiologia pode ser em 10 a 48 dos casos de operações causada por aderências ou enterite actínica ou malignidade com sítio único múltiplo ou doença difusa18 Câncer primário recidiva após cirurgia quimioterapia e radioterapia doenças asso ciadas e carcinomatose difusa podem causar obstrução intestinal com diferentes meca nismos Tais fenômenos são frequentemente concomitantes18 O crescimento do tumor primário ou recorrências de massas abdominais fibroses ou aderências pode produzir oclusão extrínseca ou estreitamento do lúmen Lesões po lipoides ou estreitamentos devidos à disseminação podem causar oclusão intraluminal Infiltração da musculatura intestinal ou inflamações repetidas podem produzir oclusão intramural do lúmen Distúrbios da motilidade devidos à perturbação extrínseca neural de controle da víscera podem produzir retardo no trânsito intestinal resultando num quadro clínico semelhante à obstrução intestinal chamado de pseudoobstrução Doenças con comitantes como diabetes síndromes paraneoplásicas e cirurgia gástrica prévia podem contribuir para alterações da motilidade provocando tal quadro Um fator contribuinte para o quadro é a constipação por causa da doença eou de drogas como anticolinérgicos e opioides Dor devida à constipação induzida por opioide erroneamente tratada com aumento da dose do mesmo pode resultar em impactação fecal produzindo sinais de obstrução intestinal17 Fisiopatologia Uma oclusão do lúmen impede ou retarda a propulsão do conteúdo intestinal O acúmulo de secreções nãoabsorvíveis produz distensão e atividade cólica para superar o obstáculo em fases precoces correspondendo a uma fase subobstrutiva possivelmente ainda reversível Em bora exista pequeno ou nenhum movimento do conteúdo intestinal através do lúmen o intesti no continua a se contrair com aumento nãocoordenado da atividade peristáltica Como conse quência o intestino se torna distendido estimulando a secreção de fluidos intestinais criando assim um ciclo vicioso de distensãosecreção estirando mais a parede intestinal Figura Além disso na obstrução intestinal o anormal aumento da flora bacteriana pode também produzir gases no intestino delgado contribuindo para a distensão6 169 Esta fase dita hipertensiva produzirá danos no lúmen com consequente resposta in flamatória A resposta inflamatória envolve ativação das ciclooxigenases e liberação das prostaglandinas potentes secretagogos por efeito direto no enterócito ou por reflexo nervoso entérico6 Polipeptídeos intestinais vasoativos podem ser liberados na circula ção portal ou na periférica e mediarem as alterações fisiopatológicas locais e sistêmicas como hiperemia edema da parede intestinal e acúmulo de fluidos no lúmen graças a esses efeitos estimulantes13 14 Hipóxia causada pela redução da drenagem venosa desde o segmento obstruído é o estímulo primário para liberação dos polipeptídeos vasoativos intestinais assim como o aumento do crescimento bacteriano intraluminal Altos níveis portais de polipeptídeos vasoativos intestinais são conhecidos como causadores de hipersecreção e vasodilatação esplâncnica3 Estudos experimentais demonstraram que taxas maiores de polipeptídeos vasoativos intestinais estão presentes no conteúdo duodenal o que pode explicar achados de redistri buição do fluxo sanguíneo entre o segmento obstruído e o segmento distal à obstrução Alterações de autorregulação local e mecanismos de controle neurohumoral do flu xo esplâncnico são a base para o aparecimento da falência de múltiplos órgãos causada ou piorada pela hipotensão sistêmica comumente observada na fase final da obstrução intestinal15 Fluidos e eletrólitos são sequestrados na parede intestinal e em seu lúmen terceiro espaço na presença de vasodilatação contribuindo para hipotensão e sepse levando à falência de múltiplos órgãos causa da morte em pacientes com obstrução intestinal A fase de hipovolemia pode induzir a insuficiência renal devido ao decréscimo do fluxo renal e como consequência da filtração glomerular Oligúria azotemia e hemoconcentração podem acompanhar a desidratação Distúr bios metabólicos na obstrução intestinal dependem do sítio e da duração da obstrução e são causados por desidratação perdas de eletrólitos e distúrbios do equilíbrio ácido básico4 Alcalose metabólica hipocloremia e hipocalemia serão características de uma obstrução alta devido à perda prevalente de secreção gástrica Numa obstrução baixa ha verá deficiência de cloretos sódio potássio e bicarbonatos por causa da estase intestinal de secreções biliares pancreáticas intestinais e gástricas11 além de acidose devida às lesões isquêmicas ou complicações sépticas8 O aumento da distensão abdominal reduz o retorno venoso e pode prejudicar a ventilação pulmonar resultante da elevação do diafragma Sepse ocorrerá numa fase mais tardia da obstrução intestinal provavelmente como resultado da ação bacteriana Isso consiste na passagem de toxinas do conteúdo in testinal passando através da parede do intestino dentro dos linfáticos e da circulação sistêmica Esse fenômeno resulta em aumento da pressão endoluminal estase e isquemia intestinal junto com gangrena intestinal e perfuração comumente observados em fases tardias de uma obstrução intestinal persistente O tempo de curso desses eventos é variá vel ocorrendo ao longo de vários dias na obstrução intestinal maligna8 11 Causas O próprio tumor tratamentos anteriores como aderências e fibrose isquêmica pósradioterapia 170 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Obstrução intestinal parcial ou completa Redução ou parada de movimentos do conteúdo intestinal Aumento da contratilidade intestinal para superar o obstáculo Aumento da dor em cólica Aumento da distensão intestinal Aumento do conteúdo luminal Amento da área de superfície epitelial Aumento da secreção intestinal de H2O Na Cl Náuseas eou vômitos Danos ao epitélio intestinal Dor contínua Distensão Resposta inflamatória com edema hiperemia e produção de prostaglandinas e polipeptídeos intestinal vasoativo Figura Causas e sintomas na obstrução intestinal maligna modificado de Ripamonte e Mercadante17 medicamentos como por exemplo opioides antimuscarínicos debilidade associada por exemplo a obstipação um estado benigno não relacionado por exemplo hérnia estrangulada17 Características clínicas da obstrução intestinal Na obstrução intestinal aguda existe habitualmente uma lesão isolada enquanto na crônica persistente ou remitente pode haver diversos locais de obstrução parcial tanto no intestino delgado como no grosso A doença retroperitoneal pode originar neuropatia visceral e obstrução funcional Em consequência os quatro sintomas e sinais que apontam para o diagnóstico de obstrução intestinal aguda distensão abdominal dor vômitos e obstipação podem não ser tão óbvios na obstrução crônica no câncer avançado Por exemplo a distensão pode ser mínima devido a múltiplas aderências intraabdominais malignas Os sons intesti nais podem variar entre a ausência e serem hiperativos com borborigmos Os sons de tinitus nos intestinos são raros Alguns doentes sofrem mais de diarreia do que de obstipação17 18 Tratamento cirúrgico A intervenção cirúrgica é paliativa e estará contraindicada nas seguintes circunstâncias laparotomias anteriores afastam as possibilidades de êxito da intervenção carcinomatose intraabdominal difusa evidenciada por tumores intraabdominais di fusos palpáveis 171 ascite que volta a se acumular rapidamente após realização de paracentese Além disso perda de peso superior a 9 kg está associada a maus resultados pósopera tórios Devese considerar a intervenção cirúrgica se todos os seguintes critérios forem preen chidos existência de provável obstrução orgânica isolada e discreta como aderências pósope ratórias ou neoplasia isolada estado geral do paciente bom isto é se a doença não estiver muito disseminada se ele for independente e ativo e se a perda de peso for inferior a 9 kg desejo do doente de ser submetido à cirurgia12 16 O tratamento cirúrgico visa paliar os sintomas e dependerá do sítio e do tipo de obstrução podendo incluir desde um bypass como a enteroenteroanastomose ente roanastomose ou a criação de uma estomia para descompressão Não podemos esquecer que o tratamento cirúrgico pode causar complicações como infecção e deiscência de ferida operatória fístulas enterocutâneas abscessos peritoneais deiscência de anasto moses intestinais sangramentos gastrointestinais embolia pulmonar e trombose venosa profunda1 Tratamento clínico No caso de doentes aos quais a intervenção cirúrgica for contraindicada geralmente é possível aliviar os sintomas de maneira adequada com o uso de medicamentos A sonda nasogástrica e a hidratação intravenosa IV raramente são necessárias O tratamento se dirige primariamente ao alívio dos sintomas principalmente das náuseas e dos vômitos Para os pacientes sem cólicas e que ainda eliminam gases intes tinais um fármaco prócinético constitui a primeira escolha sendo a metoclopramida na dose de 60 a 240 mgdia por via subcutânea SC a primeira opção Aos pacientes que apresentam cólicas intensas indicando piora da obstrução que pode não ser mais parcial os medicamentos prócinéticos são contraindicados sendo recomendado o uso de substância antissecretória e antiespasmódica como o brometo de nbutilescopolami na na dose de 40 a 120 mgdia SC ou IV O glicopirrolato outro anticolinérgico muito utilizado em outros países não é habitualmente usado no Brasil Os laxantes expansores de volume osmóticos e estimulantes também devem ser suspensos e pode ser necessá rio proceder a uma série de mudanças de medicamentos durante vários dias até que se obtenha um resultado satisfatório Para a dor constante do câncer subjacente devese administrar regularmente um opiáceo Se o paciente estiver recebendo metoclopramida ou metilescopolamina por via parenteral o opiáceo também poderá ser dado por infusão SC contínua9 Podese dar um enema de fosfato se a obstipação for um fator causal provável e após prescrever um amolecedor das fezes como comprimidos de docusato de sódio 100 a 200 mg duas vezes ao dia Os corticosteroides podem ser úteis em pacientes com obstrução intestinal inoperá vel pela possível ação redutora do edema peritumoral promovendo o alívio dos sintomas A dose utilizada varia em torno de 8 a 20 mgdia SC4 Existe a possibilidade de administrar octreotide análogo sintético da somatostatina que possui efeito antissecretório em todo o trato alimentar porém é de alto custo e não 172 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP muito utilizado no Brasil Essa substância também pode ser dada por infusão SC contínua na dose de 02 a 09 mg24 h aumentando ocasionalmente A diminuição do conteúdo do estômago reduz a distensão e por isso a probabilidade de cólicas e vômitos5 10 Dado que o aumento da pressão intraluminal provoca a liberação de serotonina 5HT a partir das células enterocromafins da parede dos intestinos alguns doentes têm melhora com um antagonista dos receptores 5HT3 como ondasentrona tropisetrona e ganisetrona7 A gastrostomia raramente é necessária na obstrução crônica no câncer avançado Na verdade os pacientes tratados farmacologicamente devem ser aconselhados a ingerir os seus alimentos sólidos e líquidos preferidos em pequenas quantidades Alguns pacientes têm mais facilidade em se alimentar pela manhã Os fármacos antimuscarínicos e a dimi nuição da ingestão de líquidos provocam boca seca e sede Esses efeitos são geralmente aliviados por uma rigorosa higiene bucal Alguns mililitros de líquido de 30 em 30 minutos podem ser administrados sob a forma de cubos de gelo e muitas vezes bastam para resol ver a questão A hidratação IV raramente é necessária2 Considerações finais A presença da obstrução intestinal maligna de maneira geral costuma ser um sinal de doença progressiva É importante que sua fisiopatologia seja bem conhecida e compreendi da para que o tratamento cirúrgico ou clínico possa promover conforto para o paciente Referências 1 AABO K et al Surgical treatment of intestinal obstruction in the late course of malignant disease Acta Chirurgica Scandinavica v 150 p 1736 1984 2 ASHBY M et al Percutaneous gastrostomy as a venting procedure in palliative care Palliat Med v 5 p 3743 1991 3 BASSON M D Does vasoactive intestinal polypeptide mediate the pathophysiology of small bowell obstruction American Journal of Surgery v 157 p 10915 1989 4 CHAN A WOODDRUFF R K Intestinal obstruction in patients with widespread intraabdominal malignancy Journal of Pain and Symptom Management v 7 n 339 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therapy HAART houve grande mudança na história natural da doença nos países onde a terapia tem sido amplamente utilizada caracterizada principalmente por diminuição da letalidade em média 70 e da morbidade por doenças oportunistas6 28 e aumento das mortes nãorelacionadas com a doença oportunista acidose lática anafilaxia eutanásia sepse acidentes suicídio doença cardiovascular cânceres não oportunistas falência hepática 21 O curso clínico é bastante variável dependendo principalmente do uso ou não da HAART Naqueles que não a utilizam a doença cursa em geral um período de incubação médio de oito a 10 anos desde o momento de infecção até a doença clínica e apresenta sobrevida aproximada de seis a 18 meses Porém quando a utilização da terapia é correta a doença pode evoluir as sintomática durante longos anos com algumas intercorrências infecciosas potencialmente tratá veis até que haja uma doença grave ou falência à HAART podendo desencadear a morte AIDS e Cuidados Paliativos Mesmo com este panorama favorável alguns pontos necessitam ser considerados Sabe se que para uma eficácia plena da HAART é necessária a adesão de 95 em termos de dose e horário A maioria dos estudos demonstra que 40 a 60 dos pacientes aderem menos de 902 Ainda assim os que a utilizam corretamente podem desenvolver resistência ao longo do tempo ou padecer de vários efeitos colaterais da medicação como dor abdominal náu seas vômitos além de aumento da incidência de diabetes e dislipidemias com suas danosas consequências Isso os torna candidatos a Cuidados Paliativos Os Cuidados Paliativos em pacientes com HIVAIDS seguem a mesma filosofia que em qualquer doente ou seja abor dam os pacientes como um todo com todos os seus sofrimentos físicos psíquicos sociais e espirituais cuidam do cuidador e abordam os familiares enlutados Há porém algumas particularidades a serem consideradas em pacientes com AIDS e que podem ser responsáveis pelo aumento do seu sofrimento os pacientes em geral são mais jovens que os portadores de câncer a doença é multissistêmica com muitos diagnósticos simultâneos há necessidade de uso de vários medicamentos o paciente com AIDS em cuidados do miciliares faz uso em média de 33 comprimidos por dia20 175 ocorrem repentinas e dramáticas mudanças na condição clínica gerando dificuldade em identificar a fase terminal há grandes e dinâmicas mudanças nos padrões de tratamento exigindo atualização constante da equipe de saúde o paciente geralmente tem plena consciência a respeito da doença e do seu prognóstico há maior índice de sofrimento psíquico quando em comparação com pacientes com câncer22 há grande isolamento estigma e falta de compaixão da sociedade pelo paciente e sua família é comum a falta de estrutura e de suportes familiar e social pode haver múltiplas mor tes na família alto índice de luto complicado falta de experiência dos médicos em Cuidados Paliativos com esses pacientes Com tudo isso fazse necessário treinamento específico para lidar com Cuidados Paliativos nessa população Prognosticar pacientes com HIVAIDS na era HAART fatores de mau prognóstico Uma das grandes dificuldades dos médicos que cuidam desses doentes é prognosticá los corretamente decidir com segurança o momento de oferecerlhes Cuidados Paliativos exclusivos e discutir por exemplo a suspensão da HAART O que se verifica muitas vezes é que os doentes sofrem um processo longo de distanásia e grande parte morre em uso de HAART mesmo com falência documentada da mesma Essa dificuldade se dá principalmente por alguns motivos13 a AIDS é uma doença infecciosa potencialmente tratável tem períodos de melhora e piora muito rápidos com mudanças rápidas padrões de tratamento e consequentemente prognóstico existem poucos trabalhos científicos que subsidiem as decisões a população em geral é jovem o que pode favorecer a distanásia problemas sociais e psíquicos dificultam algumas decisões terapêuticas Uma das consequências disso é que os médicos que cuidam de pacientes com HIV AIDS são mais relutantes em encaminhálos aos Cuidados Paliativos17 Apesar dos avanços dos conhecimentos e terapia da doença e das dificuldades apon tadas anteriormente algumas situaçõesdoenças ainda são consideradas de mau prognós tico como podemos verificar no Quadro 17 Quadro 1 Situaçõesdoenças consideradas de mau prognóstico LEMP Sarcoma de Kaposi disseminado ou visceral grave Linfoma primário do SNC Demência avançada pelo HIV Doenças oportunistas refratárias ao tratamento disponível Outras doenças crônicas avançadas e progressivas nãorelacionadas com a AIDS como câncer doença de Alzheimer e ELA Falência de órgãos vitais LEMP leucoencefalopatia multifocal progressiva SNC sistema nervoso central HIV vírus da imunodeficiência humana ELA esclerose lateral amiotrófica 176 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Há ainda alguns cofatores que tornam o prognóstico sombrio identificados no Quadro 2 Em pacientes já em fase muito avançada de doença os principais fatores de mau prognóstico são dosagem baixa de albumina sérica perda acentuada de peso comorbida des graves e índice de Karnofsky inferior a 404 Quadro 2 Cofatores que tornam o prognóstico sombrio Falência múltipla aos antirretrovirais Caquexia Dosagem de linfócitos CD4 50 célsmm3 Índice de Karnofsky 40 Sequela neurológica grave Dispneia progressiva e refratária Pelo menos três dos seguintes critérios simultaneamente anorexia fadiga tristeza sonolência úlcera de pressão e diarreia Predição médica subjetiva de sobrevida 6 meses Como em qualquer doença após avaliação clínica de mau prognóstico o médico antes de tomar uma decisão unilateral quanto aos procedimentos de suspensão ou não introdução de terapia deverá discutir o fato com o paciente eou familiares e respeitar a autonomia dos mesmos Principais sofrimentos e abordagens dos pacientes com HIVAIDS em Cuidados Paliativos Os sofrimentos devem ser avaliados e abordados em equipe multiprofissional res peitandose a experiência de cada profissional com uma filosofia de trabalho que se complemente e apresente ajuda mútua Por motivos didáticos dividiremos os sofrimentos nas diferentes esferas Físicos Pacientes com AIDS em fase avançada da doença têm em média 109 a 127 sinto mas concomitantes grande parte negligenciada por eles próprios e seus médicos11 Os sofrimentos físicos em doentes em fase avançada variam em diferentes trabalhos sendo principalmente dor 84 asteniacaquexia 61 anorexia 41 confusão men taldemência 29 náuseavômito 21 e depressão 2014 24 A dor está presente em cerca de 80 dos pacientes em fase avançada da doença e eles têm em média 29 dores concomitantes8 Um trabalho realizado no Brasil aponta prevalência de dor em 54 dos pacientes hospitalizados em diferentes fases de doen ça1 sendo maior quanto mais grave for o estágio clínico Os principais tipos de dores apresentadas pelos pacientes com HIVAIDS são1 25 cefaleia por neurocriptococose neurotoxoplasmose neurotuberculose linfoma cere bral etc 177 neuropatias por HIV citomegalovírus CMV terapia antirretroviral herpeszóster etc ulcerações genitais orais e esofágicas por cândida CMV herpes vírus HIV dor abdominal por infecções intestinais pancreáticas hepáticas linfadenopatia aci dose lática neoplasias dores osteomusculares mialgia artralgia etc A dor tem sido bastante negligenciada nesses doentes quando em comparação com portadores com câncer com subtratamento médio de 83 a 855 12 A abordagem da dor na AIDS segue tradicionalmente a mesma que a da dor oncoló gica ou seja utilizase como base a escada da Organização Mundial da Saúde OMS30 que considera a intensidade da dor e os tipos de analgésicos e adjuvantes proporcionais à mesma Porém há algumas particularidades a serem consideradas no manejo desses pacientes menor experiência dos profissionais nesse campo menor número de estudos científicos grande incidência de hepatopatias nefropatias ulcerações gastrointestinais também dificultando o manejo uso de várias medicações com dificuldade na adesão à analgesia interações medicamentosas entre antirretrovirais e analgésicos e alto índice de abuso de drogas ilícitas o que leva ao temor do médico em prescrever opioides Psíquicos e sociais Os pacientes com HIVAIDS têm grandes sofrimentos psíquicos e sociais ao longo de todo o curso de sua doença culminando no diagnóstico de terminalidade As principais causas de sofrimentos psíquicos e sociais em pacientes com a doença avançada são29 incerteza da expectativa de vida desfiguração perda da capacidade física doença de longa duração com exaustão psicológica interferência direta na sexualidade com risco de contaminação de outras pessoas idade jovem alto índice de uso de drogas ilícitas estigma social problemas financeiros múltiplas mortes na família alto índice de desestruturação familiar Os principais problemas psiquiátricos apresentados por pacientes HIVpositivos são19 principalmente distúrbios de humor depressão e doença bipolar A depressão é bastan te frequente em pacientes com HIV em estágio avançado da doença duas vezes mais frequente que em pessoas HIVnegativas É necessário estar atento ao risco de suicídio Outros problemas também frequentes são distúrbios de ansiedade generalizada pânico distúrbio obsessivocompulsivo estresse póstraumático distúrbio de comportamento problemas de atenção uso de drogas comportamento antissocial entre outros O problema do uso de drogas ilícitas é muito frequente em pacientes com HIV e muitas vezes responsável pela nãoadesão ao tratamento e maior frequência de doença terminal Alguns aspectos importantes e peculiares no manejo psiquiátrico são conhecimento das interações frequentes entre drogas antirretrovirais e psiquiátricas sendo necessário consulta a manuais e tabelas específicas dependência de drogas ilícitas bastante comum nesta população e alto índice de hepatopatias com ajuste de doses quando indicado 178 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Espirituais18 Os principais sofrimentos nessa esfera são medos de condenação moralreligiosa aban dono desamparo da família morte entre outros sentimentos de perda da autoestima do controle da vida e das atividades do sentido da vida da esperança da fé em si no outros e em Deus da dignidade vivência de culpa desespero desejo de morrer e vontade de viver O cuidador de pacientes com HIVAIDS Grande número de pacientes não tem cuidador e frequentemente quando se tornam dependentes são encaminhados a casas de apoio Quando os pacientes possuem cuida dor há inúmeros problemas vivenciados por eles principalmente16 cuidadores com idade jovem e inexperientes como medo de contaminação revolta pela contaminação com HIV negligência com seu autocuidado principalmente as mães de crianças com HIVAIDS po dendo favorecer doenças e morte mais precoce problemas financeiros falta de suporte social alto índice de discriminação por parte da sociedade organizações familiares caóti cas drogadição alcoolismo pobreza extrema etc Isso contribui para dificultar os cuida dos aos doentes fazendoos merecer mais atenção da equipe de Cuidados Paliativos O luto na AIDS Os familiares ou cuidadores de pacientes com AIDS têm vários fatores de risco para luto complicado que devem ser abordados profilaticamente durante o curso da doença Os principais são9 múltiplas mortes na família alto índice de desagregação familiar cuida dores idosos principalmente avós cuidando de crianças doentes ou cuidadores contami nados preconceito e falta de apoio da sociedade com relação aos sobreviventes alto ín dice de enlutados também usuários de drogas ilícitas e com comorbidades psiquiátricas e falta de recursos financeiros Isso gera elevado índice de sintomas depressivos ansiedade e estresse póstraumático23 Nas mulheres tem se verificado maior índice de ansiedade pensamentos e atos suicidas26 Crianças e AIDS As crianças com AIDS em geral têm sobrevivido cada vez mais graças aos progressos terapêuticos e conhecimentos médicos Com isso a morte tem ocorrido mais frequente mente na adolescência ou no início da idade adulta rodeada de grande sofrimento As principais particularidades dos Cuidados Paliativos em crianças com relação aos adultos são10 doença multissistêmica de curso imprevisível e em geral mais lento que em adulto mudanças constantes nos desenvolvimentos físico e psíquico aspectos cog nitivos muito variáveis de acordo com faixa etária e com o grau de acometimento do cérebro pelo HIV demência grande índice de orfandade falta de cuidador e limitações de sexualidade A equipe de Cuidados Paliativos tem enfrentado grande dificuldade na abordagem eficaz dessa população Cuidados Paliativos em AIDS na prática clinica diária Considerando a diferença de evolução entre os pacientes que aderem e os que não aderem à HAART a atuação dos Cuidados Paliativos é variável As principais atuações são 179 o controle de sintomas pontuais sendo a dor o principal deles a abordagem multiprofis sional a todos os sofrimentos a ajuda na avaliação prognóstica com orientações quanto a medidas terapêuticas a melhora na comunicação com paciente família e equipe de saúde o melhor planejamento de ações paliativas ou paliativocurativas a ajuda na so lução de questões éticas de final de vida a abordagem mais planejada na fase final de vida a avaliação dos riscos dos familiares para luto complicado e abordagem profilática e a abordagem ao familiarcuidador após a morte principalmente àqueles que evoluem para luto complicado Conclusão A AIDS tem se tornado uma doença crônica com múltiplos sofrimentos físicos psí quicos sociais e espirituais e aumento de incidência de comorbidades nãooportunistas antes pouco observadas pela curta sobrevida Isso tem corroborado a grande importância da abordagem multiprofissional dos Cuidados Paliativos em qualquer fase de doença Consequência nociva dos inúmeros progressos terapêuticos foi a grande dificuldade em prognosticar esses doentes e o risco frequente de distanásia Os Cuidados Paliativos também têm ajudado muito nesse setor O grande número de particularidades dos doentes e as dificuldades dos especialistas em Cuidados Paliativos em lidar com elas têm incentivado infectologistas a se preo cuparem mais com a melhora dos cuidados desses pacientes em fase avançada O alto índice de falta de cuidador e de luto complicado também tem sido alvo dos Cuidados Paliativos Referências 1 AIRES EM BAMMANN R H Pain in hospitalized HIV positive patients clinical and therapeutical issues Braz J Infect Dis n 9 p 20182005 2 BARTLETT J A Adressing the challenges of adherence Acquir Immune Defic Syndr v suppl 1 p 52 2002 3 BRASIL Ministério da Saúde Programa Nacional de Controle de DSTAIDS Boletim Epidemiológico AIDS Brasília Ministério da Saúde 2008 4 BRECHTL J R et al Palliat support care v 3 n4 p 26572 2005 5 BREITBART W et al The undertreatment of pain in ambulatory AIDS patients Pain v 65 p 2439 1996 6 EASTERBROOK P MEADWAY J The changing epidemiology of HIV infection new challenges for HIV palliative care J R Soc Med v 94 p 442 2001 7 EGGER M et al 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da veia cava superior dAlvA YuKie mAtsumoto môniCA CeCíliA b mAnnA Introdução A síndrome da veia cava superior SVCS é caracterizada por um conjunto de sinais e sintomas dilatação das veias do pescoço pletora facial edema de membros superiores e cianose Os sintomas de cefaleia dispneia tosse edema de membro superior ortopneia e disfagia entre outros são decorrentes da obstrução do fluxo sanguíneo através da veia cava superior em direção ao átrio direito Essa obstrução pode ser causada por compressão extrínseca do vaso invasão tumoral trombose ou dificuldade do retorno venoso ao coração secundária a doenças intraatriais ou intraluminais Aproximadamente 73 a 97 dos casos de SVCS ocorrem durante a evolução de neoplasias malignas intratorácicas que comprimem ou invadem a veia cava superior Esse processo pode ser causado pelo próprio tumor ou por linfonodos mediasti nais acometidos4 6 A neoplasia maligna que mais frequentemente causa a SVCS é o carcinoma bronco gênico 75 dos casos e 3 a 5 dos pacientes portadores de neoplasias malignas de pulmão desenvolvem a SVCS durante a evolução da doença4 5 Os linfomas constituem a segunda maior causa neoplásica da síndrome 15 dos casos e 17 dos linfomas com envolvimento mediastinal causam a SVCS As neoplasias metastáticas correspondem a 7 dos casos7 Fisiopatologia A veia cava superior é susceptível à obstrução devido a algumas características como sua localização estratégica no compartimento visceral do mediastino cercada por estruturas rígidas como o esterno a traqueia o brônquio fonte direito a aorta a artéria pulmonar direi ta sua parede fina facilmente compressível o transporte de sangue em baixas pressões e a presença de linfonodos mediastinais que a circundam completamente10 Quando a veia cava e as suas principais tributárias venosas sofrem obstrução um grande número de vasos colaterais é solicitado por meio de redes venosas extracavitárias principalmente na pele e na musculatura da parede torácica A alta pressão venosa acima da obstrução provoca o aparecimento de shunts em veias e plexos adjacentes de baixa pressão No decorrer do tempo esse aumento mantido de pressão determina distensão e dilatação progressiva das vias colaterais que podem tornarse calibrosas e com alto fluxo sanguíneo Tratamento O tratamento depende da gravidade dos sintomas da causa da obstrução do tipo histológico e do estádio do tumor que a produz Algumas medidas podem ser utilizadas 182 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP até que o diagnóstico seja feito e o tratamento definitivo seja indicado como elevação da cabeça repouso controle do volume hídrico administrado e suplementação de oxigênio Na SVCS associada a neoplasias a escolha do tratamento dependerá do tipo de tumor Por exemplo linfomas e carcinomas pulmonares de células pequenas podem responder rapidamente à quimioterapia isolada enquanto outras neoplasias provavelmente exigirão radioterapia A utilização da radioterapia nos pacientes com SVCS antes da obtenção do diagnóstico histológico é considerada inapropriada por muitos autores8 11 Em geral com a SVCS associada a neoplasias 75 dos pacientes apresentarão me lhora em três a quatro dias e 90 terão grande melhora uma semana depois de instituído o tratamento Os pacientes que não melhorarem na primeira semana podem ter desenvol vido trombose venosa central necessitando de terapia fibrinolítica ou antitrombótica Devido à friabilidade de alguns tumores e à pressão venosa central elevada é ne cessário cautela ao instituir o uso de anticoagulantes Portanto não deve ser usual a anticoagulação profilática O uso de corticosteroides pode aliviar os sintomas no caso da SVCS causada por lin foma e reduzir o edema peritumoral enquanto o paciente recebe radioterapia Seu bene fício é também observado quando há comprometimento respiratório grave Os diuréticos podem oferecer alívio sintomático inicial mas é necessária cautela quanto à hidratação do paciente8 A SVCS refratária ou recorrente principalmente nos pacientes já submetidos à irra diação pode exigir a colocação de stents intravasculares para que se restabeleça o fluxo sanguíneo9 O tratamento cirúrgico raramente é necessário nas SVCS diante dos bons resultados obtidos com radioterapia e quimioterapia As desvantagens da cirurgia incluem morbi dade e mortalidade associadas ao procedimento principalmente nos casos de neoplasias malignas3 As possíveis indicações para o tratamento cirúrgico seriam neoplasias re fratárias radioterapia quimioterapia presença de trombos na veia cava superior ou em suas maiores tributárias e oclusão aguda da veia cava superior com sintomas graves1 Basicamente são utilizados dois procedimentos ressecção e bypass2 Considerações finais A presença das emergências oncológicas de maneira geral costuma ser um sinal de doença progressiva É fundamental se estabelecer o estadiamento correto da neoplasia maligna e o momento da evolução da doença em que o paciente se encontra para que se possa escolher a conduta mais adequada de forma individualizada Para isso a atitude do médico deve ser cuidadosa e solidária levandose em conta a escolha do paciente seu conforto e bemestar Referências 1 ANDERSON R P LI W I Segmental replacement of superior vena cava with spiral vein graft Ann Thorac Surg v 36 n 1 p 858 1983 2 DOTY J R FLORES J H DOTY D B Superior vena cava obstruction bypass using spiral vein graft Ann Thorac Surg v 67 n 4 p 11116 1999 3 EFFENEY D J WINDSOR H M SHANAHAN M X Superior vena cava obstruction resection and bypass for malignant lesions Aust N Z J Surg v 42 n 3 p 2317 1973 183 4 LOCHRIDGE S K KNIBBE W P DOTY D B Obstruction of the superior vena cava Surgery v 85 n 1 p 1424 1979 5 NOGEIRE C MINCER F BOTSTEIN C Long survival in patients with bronchogenic carcinoma complicated by superior vena cava obstruction Chest v 75 n 3 p 3259 1979 6 PARISH J M et al Etiologic considerations in superior vena cava syndrome Mayo Clin Proc v 56 n 7 p 40713 1981 7 PEREZSOLER R et al Clinical features and 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de morbidade muito importante nesses pacientes O diagnóstico precoce é a arma mais importante para garantir a efetividade terapêutica Os cânceres de mama dos brônquios e da próstata são responsáveis por mais de 60 dos casos1 O sítio de maior incidência é o tórax existindo compressão em mais de um nível em mais de 20 dos casos Abaixo do nível da segunda vértebra lombar L2 a compressão se dá na cauda equina ou seja nos nervos periféricos e não no cordão medular A compressão medular maligna ocorre por invasão direta do tumor primário ou por suas metástases A velocidade de instalação da clínica indica a gravidade dos danos A probabilidade de reverter um quadro clínico de paresia está inversamente relacionada com o tempo de ma nutenção do mesmo assim uma paresia instalada há 8 horas tem grande chance de ser revertida de 24 horas a 48 horas pode ainda ser revertida mas após sete dias já se torna irreversível2 A paralisia e a disfunção dos esfíncteres são os estádios clínicos finais dessa urgência oncológica e estão diretamente associados ao menor tempo de sobrevida2 Fisiopatologia A invasão pelo tumor altera a relação entre o plexo venoso epidural corpo vertebral e o canal medular provocando estase venosa e edema medular o que leva à diminuição do fluxo capilar e à liberação de PGE citocinas neurotransmissores e mediadores da inflamação que são responsáveis pelas alterações associadas a hipóxia isquemia e dano tissular neurológico Características clínicas A dor é o sintoma mais frequente e está presente em mais de 90 dos casos antece dendo a disfunção neurológica É progressiva localizada no nível da lesão medular e tem característica mecânica piorando com a manobra de Valsalva e com o movimento A fraqueza é o segundo sintoma frequente em aproximadamente 75 dos casos Pode aparecer gradualmente ou de forma aguda quando ocorre falência vascular grave o chamado choque medular Inicialmente a musculatura proximal é mais afetada e com a evolução a musculatura distal também é comprometida A deambulação fica muito prejudicada e a flacidez e a arreflexia inicial são substituídas pela plegia em flexão As alterações sensoriais podem ocorrer em seguida em torno de 50 dos casos ma nifestandose como parestesias ou hipoestesias que se iniciam nos pés e podem subir até chegar ao nível afetado As disfunções autonômicas e as paralisias são os sinais da última etapa da síndrome 185 Diagnóstico O diagnóstico se baseia na história e nos achados clínicos e neurológicos presentes que indicam o nível medular afetado A ressonância magnética RM de toda a coluna e estruturas adjacentes é a forma de investigação de escolha sendo imprescindível para planejar o tratamento É necessária a utilização de contraste intravenoso para complementar o estudo nos casos de presença de massas tumorais paravertebrais e metástases intramedulares A radiografia simples de coluna pode mostrar alterações ósseas como colapsos ver tebrais lesões blásticas ou líticas e destruição do pedículo vertebral em torno de 70 dos casos Tratamento Embora a compressão medular seja frequentemente de instalação insidiosa deve ser tratada como uma emergência A droga de escolha é a dexametasona na dose inicial de 1020 mg por via intravenosa IV em bolo Durante as próximas 48 horas manter a dose de 4 a 8 mg a cada 6 horas e posteriormente a mesma dose é usada por via oral VO Devese permanecer com essa dose durante o tratamento radioterápico reduzindoa progressivamente após o seu término Reco mendase associação com medicamento inibidor da bomba de prótons assim como o controle dos níveis de glicemia da pressão arterial PA e dos eletrólitos no sangue2 A radioterapia possui papel central no tratamento da compressão medular maligna Realizada junto com a administração da dexametasona apresenta os seguintes resulta dos descomprime o tecido nervoso por citorredução tumoral diminui o déficit neuroló gico em 45 a 60 dos casos reverte a paresia em 11 a 20 controla a dor em 70 dos casos e estabiliza a progressão local da neoplasia O tratamento cirúrgico descompressivo estará indicado quando o diagnóstico for du vidoso sem confirmação histológica houver progressão da lesão com o tratamento radio terápico para pacientes previamente irradiados e quando existir instabilidade mecânica Considerações finais O diagnóstico precoce antes da instalação do dano neurológico grave e a instauração imediata do tratamento são fatores essenciais para evitar a paralisia O prognóstico e a expectativa de vida devem ser levados em conta para a tomada de decisão Devemos sempre nos lembrar de incluir o paciente e seus familiares no processo de escolha do tratamento a ser implementado com base no preceito ético da autonomia Referências 1 LOBLAW D LAPERRIERE N Emergency treatment of malignant extradural spinal cord compression na evidencebased guideline Journal of Clinical Oncology v 16 p 161324 1998 2 ROMERO P et al Compresión medular An Sist Sanit Navar v 24 p 15662 2004 186 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Hipodermóclise um método alternativo para a administração de fluidos e medicamentos pela via subcutânea eliete FAriAs Azevedo mAriA FernAndA bArbosA Hipodermóclise Pacientes em Cuidados Paliativos frequentemente apresentam condições que impos sibilitam a administração de medicamentos e a manutenção adequada de níveis de hidra tação e nutrição necessitando portanto de vias alternativas para suporte clínico Nesse contexto a via subcutânea SC deve ser a primeira escolha e pode ser imple mentada tanto no ambiente hospitalar quanto na assistência domiciliar5 10 Bases para o uso da via subcutânea A pele membrana que reveste toda a superfície corporal é responsável por manter a integridade do corpo proteger contra agressões externas absorver e excretar líqui dos regular a temperatura absorver a radiação ultravioleta e metabolizar vitaminas a vitamina D por exemplo Nela estão contidas epiderme derme e hipoderme ou tecido subcutâneo Figura 115 A hipoderme ou tecido subcutâneo é composta de densas conexões e tecido adiposo abrigando os principais vasos sanguíneos linfáticos as glândulas e os nervos Sua principal função é o depósito nutritivo de reserva energética que funciona como isolante térmico e protetor mecânico do organismo às pressões e aos traumatismos externos Seu efeito de enchimento facilita a mobilidade da pele sobre as estruturas subjacentes A distribuição do tecido subcutâneo depende dos fatores idade hereditariedade e sexo8 15 Por ser dotado de capilares sanguíneos o tecido subcutâneo tornase uma via favo rável à administração de fluidos eou medicamentos uma vez que esses serão absorvidos e transportados à macrocirculação10 21 A vascularização do tecido subcutâneo abriga cerca de 6 do débito cardíaco e per mite uma taxa de absorção muito similar à da administração intramuscular dos medica mentos atingindo concentrações séricas menores mas com tempo de ação prolongado Figura 24 Como outros métodos parenterais evita o clearance présistêmico pelo fígado pos sibilita uma concentração sérica estável do medicamento e evita picos plasmáticos que determinam o possível aparecimento de efeitos colaterais indesejáveis12 Se usada a infu são contínua evitase também que a concentração plasmática caia a níveis insuficientes para o ressurgimento dos sintomas2 12 187 Indicações para o uso da hipodermóclise As principais indicações para o uso da hipodermóclise são prevenção ou tratamento da desidratação moderada pacientes com intolerância ou dificuldade para ingestão de líquidos por via oral VO náuseas e vômitos incoercíveis diarreia obstrução do trato gastrointestinal por neoplasia embotamento cognitivo sonolência e confusão mental10 13 21 impossibilidade de acesso venoso pacientes com difícil acesso venoso veias finas e frágeis e que tenham o seu so frimento aumentado pelas constantes tentativas de punção situações em que o acesso venoso representa impossibilidade ou limitação para a administração de medicamentos e fluidos decorrentes de flebites trombose venosa e sinais flogísticos10 13 21 Figura 1 Anatomia da pele Poro sudoríparo Corpúsculo de Meissner Epiderme Derme Glândula sebácea Pelo Camada córnea queratinizada Terminação nervosa livre Glândula sudorípara Músculo eretor do pelo Tecido subcutâneo adiposo Folículo piloso Artéria Veia Figura 2 Variação da concentração do medicamento na corrente sanguínea conforme o tempo e a via de administração Intravenosa Intramuscular Subcutânea Oral Tempo Concentração do medicamento no sangue 188 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Contraindicações para uso da hipodermóclise As principais contraindicações estão relacionadas com os distúrbios de coagulação edema e anasarca Nas situações de emergência como falência circulatória desequilíbrio hidroeletrolítico severo e desidratação severa por exemplo essa prática é desaconse lhável pois os resultados esperados são insatisfatórios Quando houver risco severo de congestão pulmonar p ex insuficiência cardíaca congestiva e síndrome de veia cava superior devese avaliar criteriosamente cada caso5 10 13 21 Vantagens Via segura com pouco risco de complicação de fáceis manipulação e manutenção mínimo desconforto ou risco de complicação local a utilização da via SC provoca des conforto doloroso ínfimo em alguns pacientes e impõe mínima limitação pelas opções diferenciadas dos sítios de punção comumente distante de articulações Dispensa assim a imobilização de qualquer membro Além disso a infusão pode ser interrompida a qual quer momento sem o risco de complicações como por exemplo formação de coágulos ou trombose de vaso1 10 13 Tal prática apresenta ainda baixa incidência de infecção8 risco mínimo de complicações sistêmicas o risco de complicações sistêmicas como a hiperhidratação e a sobrecarga cardíaca é mínimo e pode ser monitorado ao longo da infusão10 13 baixo custo quando utilizada em situações apropriadas tem menor custo que a tradi cional terapia intravenosa já que os materiais necessários para a instalação da hipoder móclise são relativamente pouco onerosos em comparação com os utilizados em outros tipos de punção conferindo baixo custo ao procedimento Ademais pode ser mantida por semanas embora haja recomendação de troca a cada 96 horas ou antes se forem evidenciados sinais flogísticos e exige menos horas de supervisão técnica da equipe de saúde1 10 21 possibilidade de alta hospitalar precoce e permanência do paciente em domicílio por ser um método seguro sem graves complicações e de manuseio simples possibilita a alta precoce do paciente já que o dispositivo pode ser manejado em domicílio pelo cuidadorfamiliar eou pelo próprio paciente após treinamento pela equipe de enfermagem Pode ainda ser aplicado em domicílio sem a necessidade de internação do paciente hipoidratado e desidratado5 8 10 Desvantagens A hipodermóclise apresenta limitações nas situações em que se desejam velocidade de infusão rápida e reposição com alto volume de fluidos O volume diário recomendado varia entre 2000 e 3000 ml em 24 horas dividindose em dois sítios Assim não é reco mendável sua utilização em casos emergenciais como reversão de choque hipovolêmico e desidratação severa situações em que se faz necessária a infusão de grandes volumes de líquidos1 57 10 13 21 A velocidade de absorção de um medicamento depende da via de administração do mesmo Conforme pode ser observado na Figura 2 medicamentos administrados por via SC têm maior velocidade de absorção do que pela VO porém menor velocidade que pelas vias intravenosa IV e intramuscular IM Essa característica faz com que a via SC 189 não seja a ideal quando se necessita de ajuste rápido de dose apesar de seu perfil de segurança12 Considerações Durante a utilização da terapia subcutânea é importante considerar que os fluidos são absorvidos por difusão capilar por isso a absorção fica reduzida quando há comprometimento da irrigação no sítio de infusão por exemplo em presença de ede mas e hematomas1 10 os opioides são geralmente bem tolerados Pacientes em controle álgico beneficiamse da via SC para os medicamentos de resgate4 10 18 os níveis séricos de opioides por via SC aproximamse daqueles obtidos depois da admi nistração IM o que proporciona segurança e eficácia na administração desses medica mentos11 Soluções de hidratação recomendadas Soluções soros fisiológico SF a 09 e glicosados SG a 5 utilizados para adminis tração por via IV podem ser infundidos também por via SC1 5 7 8 13 20 eletrólitos cloretos de potássio KCl e de sódio NaCl devem ser administrados apenas após a diluição no SF a 09 e SG a 5 em volumes nãoinferiores a 100 ml seguindo a velocidade de infusão recomendada no intervalo de 60 a 125 mlh1 5 13 21 volume o volume não deve ultrapassar 3000 ml em 24 horas É recomendável a prática da infusão em dois sítios separados e simultâneos dividindose 1500 ml por sítio de infusão Alguns pacientes com tecido subcutâneo diminuído devem ter o volume limitado a 2000 ml em 24 horas5 10 13 21 gotejamento recomendase regular o gotejamento da infusão por meio de equipo com dosa dor mlh microgotas ou bomba de infusão conforme a necessidade Devese manter o fluxo em torno de 60 a 125 mlh considerando as condições clínicas e a necessidade do paciente5 10 21 Medicamentos tradicionalmente utilizados Soluções isotônicas e com pH próximo à neutralidade são mais bem toleradas pela via SC Entre os medicamentos tradicionalmente utilizados estão clonidona clorpromazina dexameta sona fenobarbital fentanil furosemida haloperidol hioscina hidrocortisona ketamina metado na metilprednisona metoclopramida midazolam morfina naxolona octreotide ondansetrona oxicodona prometazina ranitidina tramadol entre outros24 710 1618 Com os avanços científicos nessa área de conhecimento outros medicamentos têm sido estudados a fim de ter seu uso padronizado por via SC amicacina ampicilina atropi na cefepima ceftriaxona omeprazol pamidronato tobramicina entre outros6 7 16 Medicamentos nãorecomendados Os medicamentos que têm baixa solubilidade em água e por isso são veiculados em soluções de características oleosas como o propilenoglicol não apresentam bom perfil de 190 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP segurança para utilização por via SC em função do dano que tais soluções podem causar a esse tecido Medicamentos como diazepam diclofenaco e fenitoína apresentam tal par ticularidade Soluções com extremos de pH 2 ou 11 apresentam risco aumentado de precipitação ou irritação local sendo incompatíveis com a via SC Assim contraindicase a utilização de diazepam diclofenaco fenitoína e eletrólitos nãodiluídos10 14 19 Compatibilidade entre os medicamentos A absorção a eficácia e a segurança no uso da via SC foram comprovadas por estudos científicos e devem seguir recomendações principalmente quanto à compatibilidade en tre os medicamentos Figura 33 10 Como utilizar os medicamentos Diluição todos os medicamentos administrados por via SC devem estar na forma líquida e ser diluídos em água para injeção exceto ketamina octreotide e ondansetrona os quais devem ser diluídos em SF a 09 A diluição recomendada é de 1 ml de medicamento em 1 ml de diluente Ex octreotida 01 mcgml ampola de 1 ml diluir em 1 ml de SF3 9 formas de administração os medicamentos podem ser administrados em bolo ou em in fusão contínua conforme a necessidade clínica do paciente seguindo as recomendações de misturas entre medicamentos apresentadas na Figura 32 10 21 Escolha do sítio de punção1 2 4 5 7 10 21 Região deltóidea região anterior do tórax Figura 3 Compatibilidade entre dois medicamentos para administração por via subcutânea CLORPROMAZINA DEXAMETAZONA FENOBARBITAL FUROSEMIDA HALOPERIDOL HIOSCINA INSULINA KETAMINA METADONA METOCLOPRAMIDA MIDAZOLAM MORFINA OCTREOTIDA ONDANSETRONA RANITIDINA TRAMADOL CLORPROMAZINA DEXAMETAZONA FENOBARBITAL FUROSEMIDA HALOPERIDOL HIOSCINA INSULINA KETAMINA METADONA METOCLOPRAMIDA MIDAZOLAM MORFINA OCTREOTIDA ONDANSETRONA RANITIDINA TRAMADOL COMPATÍVEL INCOMPATÍVEL NÃO TESTADO 191 região abdominal faces anterior e lateral da coxa região escapular face lateral da coxa A tolerância de cada região para a infusão varia conforme as condições gerais de cada paciente e o volume a ser infundido Dispositivos recomendados O dispositivo mais utilizado para o procedimento é o escalpe tipo butterfly nos calibres 25 e 27 que pode permanecer até cinco dias No entanto outros dispositivos como o cateter de teflon podem ser utilizados com maior tempo de duração em média 11 dias2 4 5 7 10 14 21 Execução da técnica Materiais necessários8 10 solução preparada para ser instalada soro medicamento equipo com dosador mlhora ou bomba de infusão solução antisséptica gaze e luva de procedimento Figura 4 Locais adequados para punção subcutânea Anterior Posterior 1 1 2 2 3 4 4 5 5 6 6 1 1 192 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP dispositivo escalpe ou cateter de teflon filme transparente para fixar esparadrapo para datar Instalação da punção1 2 8 10 21 Lavar as mãos explicar ao pacientefamília sobre o procedimento escolher o local para a punção tendo em vista maior conforto para o paciente preencher o circuito intermediário do escalpe com SF a 09 cerca de 05 ml fazer antissepsia e a prega na pele introduzir o escalpe num ângulo de 30o a 45o abaixo da pele levantada a agulha deve ficar solta no espaço subcutâneo fixar o escalpe com filme transparente aspirar cuidadosamente de forma a garantir que nenhum vaso seja atingido aplicar o medicamento ou conectar o escalpe ao equipo da solução proceder à identificação da punção com data horário calibre do dispositivo nome do medicamento administrado e nome do profissional que realizou o procedimento Obs o escalpe deve permanecer salinizado no paciente para a administração poste rior de medicamentos regulares e de resgate5 Complicações que devem ser monitoradas47 21 Locais Sinais de irritação local podem aparecer nas primeiras 4 horas Se persistirem por tempo superior ao esperado trocar o sítio de punção Recomendase reavaliação e troca do sítio de punção quando houver sinais flogísticos edema calor eritema persistente e dor no local da infusão endurecimento hematoma necrose do tecido complicação tardia sinais de infecção presença de febre calafrio e dor suspender a infusão cefaleia e ansiedade Sistêmicas Os sinais de sobrecarga cardíaca taquicardia turgência jugular hipertensão arterial tosse dispneia são indicativos para a suspensão do uso5 Recomendações Fazer rodízio do sítio de punção respeitandose a distância mínima de 5 cm do local da punção anterior Atentar para condições clínicas do paciente características ambien tais e do dispositivo6 10 Depois da administração de medicamentos injetar 1 ml de SF a 09 para garantir que todo o conteúdo do dispositivo seja introduzido no sítio de punção21 Se for observado edema local persistente recomendase diminuir o gotejamento ou suspender a infusão10 193 Figura 5 Passo a passo A materiais para antissepsia da pele B materiais para a punção subcutânea C aspiração do SF 09 D preenchimento do circuito com o SF 09 E antissepsia da pele F prega subcutânea G punção subcutânea H aspiração para garantir a ausência de comprometimento de vasos sanguíneos I fixação com filme transparente Fonte Arquivos da autora SF soro fisiológico A B E F G H I C D 194 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Referências 1 BROWN M K Hypodermoclysis another way to replace fluids Nursing v 30 n 5 p 589 2000 2 CARRETERA Y Posibilidades actuales de la enfermería paliativa In AUSTUDILLO W et al Avances recientes en cuidados paliativos 1 ed San Sebastián Sociedad Vasca de Cuidados Paliativos 2002 p 12738 3 CONSULTANT PHYSICIAN IN PALLIATIVE MEDICINE Pall care info Disponível em httppallcareinfo Acesso em 9 maio 2009 4 DA POIAN S H CARACENI A Administração subcutânea de opióides Revista Brasileira de Anestesiologia v 41 p 26771 1991 5 DALAL S BRUERA E Dehydratation in cancer patients to treat or not to treat Journal Supportive Oncology v 2 n 6 p 46787 2004 6 DARDAINEGIRAUD V LAMANDÉ M CONSTANS T Lhypodermoclyse intérêts et indications en gériatrie La Revue de Médicine Interne v 26 p 64350 2005 7 FONZOCHRISTE C et al Subcutaneous administration of drugs in the elderly survey of practice and systematic literature review Palliative Medicine v 19 p 20919 2005 8 GIRONDI J B WATERKEMPER R A utilização da via subcutânea como alternativa para o tratamento medicamentoso e hidratação do paciente com câncer Revista Mineira de Enfermagem v 9 n 4 p 348 54 2005 9 HERNDON C M FIKE D S Continuous subcutaneous infusion practices of United State hospices Journal of Pain and Symptom Management v 22 n 6 p 102734 2001 10 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER Brasil Hipodermóclise ou terapia subcutânea In INCA Ações de enfermagem para o controle do câncer uma proposta de integração ensinoserviço 3 ed Rio de Janeiro INCA 2008 p 53856 11 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER Brasil Normas e recomendações do INCAMS Controle de sintomas do câncer avançado em adultos Revista Brasileira de Cancerologia v 46 n 3 p 24356 2000 12 LÜLLMANN H MOHR K Farmacologia texto e atlas 4 ed Porto Alegre Editora Artmed 2004 p 467 13 LYBARGER E H Hypodermoclysis in the home and longterm care settings Journal of Infusion Nursing v 32 n 1 2009 14 MACMILLAN K et al A prospective comparison study between a butterfly needle and a teflon cannula for subcutaneous narcotic administration Journal of Pain Symptom Management v 9 n 2 p 824 1994 15 MAKLEBUST J SIEGGREEN M Skin anatomy and physiology In MAKLEBUST J SIEGGREEN M Pressure ulcers guidelines for prevention and nursing management 3 ed Pennsylvania EUA 2000 p 112 16 MARQUES C et al Terapêutica subcutânea em cuidados paliativos Revista Portuguesa de Clínica Geral v 21 p 5638 2005 17 NEGRO S et al Physical compatibility and in vivo evaluation of drug mixtures of subcutaneous infusion to cancer patient in palliative care Supportive Care Cancer v 10 p 6570 2002 18 NEGRO S et al Morphine haloperidol and nbutyl bromide combined in SC infusion solutions compatibility and stability evaluation in terminal oncology patients International Journal of Pharmaceutics v 307 p 27884 2006 19 SWEETMAN S Martindale the complete drug reference 35 Ed Pharmaceutical Press p 438 447 889 2007 20 TURNER T CASSANO A M Subcutaneous dextrose for rehydratation of elderly patients evidence based review BMC Geriatrics v 4 n 2 2004 Disponível em httpwwwbiomedcentralcom1471231842 Acesso em 22 abr 2009 21 WALSH G Hypodermoclysis an alternative method for rehydration in longterm care Journal of Infusion Nursing v 28 n 2 p 1239 2005 195 Procedimentos sustentadores de vida em Cuidados Paliativos uma questão técnica e bioética CristhiAne dA silvA Pinto Os Cuidados Paliativos podem ser definidos segundo a World Health Organization WHO como assistência multiprofissional ativa e integral aos pacientes cuja doença não responde mais ao tratamento curativo com o objetivo principal de garantir ao doente e a seus familiares melhor qualidade de vida Nesse contexto devemos avaliar em que momento esses procedimentos invasivos e agressivos se encaixam ou melhor se eles realmente têm alguma utilidade quando falamos em Cuidados Paliativos ou se podemos considerálos futilidade terapêutica Com a evolução técnicocientífica atingida nos últimos 50 anos a expectativa de vida praticamente dobrou modificando todo o panorama as pessoas deixaram de morrer por doenças infectocontagiosas e passaram a ser vitimadas por doenças crônicodegene rativas Nesse momento começaram a surgir questões não somente relacionadas com a cura das doenças mas também com o controle e principalmente a qualidade de vida dos pacientes com doenças crônicas21 Quanto mais a medicina evoluiu em suas técnicas com o surgimento de novos tra tamentos e aparelhos para a manutenção da vida orgânica mais nos deparamos com questões éticas relacionadas com aqueles que mesmo com todas as técnicas disponíveis não poderão obter a cura ou mesmo um prolongamento de vida com qualidade21 O profissional que começa seu trabalho na seara dos Cuidados Paliativos deparase inicialmente com uma importante mudança no foco da atenção Ele que foi inicialmente treinado para lidar com o conceito de saúde passa a trabalhar com o conceito de doen ça em progressão e a tão perseguida cura começa a dar lugar à busca pela qualidade de vida Mas o que é qualidade de vida É um conceito pessoal e intransferível e ninguém tem condições de definir o que realmente é melhor para o outro Nesse sentido o Cuidado Paliativo se cruza com um dos princípios da bioética que será descrito posteriormente autonomia21 A seguir encontrase analogia dos conceitos utilizados em Cuidados Paliativos pela ótica da dos princípios bioética Princípio da beneficência A moralidade requer não apenas que tratemos as pessoas como autônomas e que nos abstenhamos de prejudicálas mas também que contribuamos para o seu bemestar O princípio da beneficência é uma obrigação moral de agir em benefício de outros1 Quando falamos em agir em benefício de outros em Cuidados Paliativos estamos nos referindo principalmente a dois pontos cruciais controle de sintomas e qualidade de vida 196 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A doença em progressão é capaz de infligir extremo sofrimento àqueles que dela pade cem Por isso precisamos conhecer profundamente a história natural da doença para que possamos antecipar as complicações que dela surgirão e com isso controlar os sintomas da doença incurável Procuramos manter a maior qualidade de vida possível em cada caso sempre respeitando os desejos do paciente Princípio da nãomaleficência Tal princípio determina a obrigação de não infligir dano intencionalmente Na ética médica ele está intimamente ligado com a máxima primum non nocere acima de tudo ou antes de tudo não causar dano1 Dentro dos Cuidados Paliativos a prática da distanásia prolongamento da morte com sofrimento é evitada na medida em que procedimentos invasivos e agressivos que não trarão benefício aos pacientes não são instituídos Princípio da autonomia Autonomia derivada do grego autos próprio e nomos regra governo ou lei era inicialmente utilizada como referência à autogestão das cidadesestados independentes gregas Posteriormente passou a referirse ao indivíduo com direitos de liberdade priva cidade escolha individual liberdade da vontade e pertencimento a si mesmo1 Em Cuidados Paliativos a preservação da autonomia dos pacientes é considerada um dos princípios mais importantes no processo de tomada de decisão pois evita os abusos potenciais de um julgamento unilateral22 É nesse momento que se resgata a relação médicopaciente perdida ao longo do avançar técnicocientífico Como lidamos com qualidade de vida subjetiva e individual é imprescindível ouvir o outro com todas as suas dúvidas e experiências No momento em que trabalhamos com o desejo do paciente e não com a vontade do médico abandonamos o antiquado paternalismo médico É nessa perspectiva que se insere o cuidado no fim da vida algo que é pensado e realizado em cada caso concreto e de forma compartilhada entre seres autônomos que se respeitam e constroem um processo de morte no qual os profissionais por meio de conhecimento técnico podem contribuir para que esse caminho final seja vivido digna mente com o mínimo de sofrimento para o doente e seus cuidadores20 Princípio da justiça Nos tratamentos médicos a probabilidade de sucesso é critério relevante pois um recurso médico finito só deve ser distribuído entre os pacientes que tenham chance razoável de se beneficiar Ignorar esse fator é injusto pois resulta em desperdício de recursos1 A futilidade terapêutica é difícil de ser definida e aceita em muitos casos pois o profissional da área de saúde principalmente os médicos é treinado para sempre fazer todo possível para salvar a vida do indivíduo Isso ocorre porque aprendemos desde tenra idade que a vida é sagrada princípio da sacralidade da vida Porém quando trabalhamos com pacientes com doença avançada e em progressão percebemos que a obstinação te 197 rapêutica não tem lugar em Cuidados Paliativos O que queremos é que nossos pacientes tenham uma morte digna e sem sofrimento A razão de ser da obstinação terapêutica tem sido atribuída por muitos à medicina defensiva prática que infelizmente tem se alastrado cada vez mais Entendese como uma decisão ou ação clínica do médico motivada total ou parcialmente com a intenção de se proteger de uma possível acusação de má prática médica16 Para que não sejamos obstinados e ao mesmo tempo possamos estar livres do medo de alguma acusação precisamos sempre estar muito bem embasados tecnicamente Em Cuidados Paliativos a população de pacientes é muito heterogênea Temos pa cientes com doença avançada e que se mantêm com bom karnofsky performance status KPS e temos aqueles que como preferimos classificar em nosso manual encontramse em fase final da vida Para que não deixemos de tratar aqueles que se beneficiariam com determinado procedimento ou exame mais complexo para controle de sintomas e nem sejamos agressivos com aqueles que não obterão benefício devemos estudar minuciosa mente cada caso utilizando adequadamente os índices de prognóstico Sabemos que al guns índices se encontram bem documentados na literatura médica e podem ajudarnos a nortear e definir nossas condutas Outros ainda estão sendo definidos adequadamente por meio de vários estudos O KPS a síndrome de anorexia e caquexia a presença de disp neia e os fatores metabólicos como hipercalcemia hiponatramia leucocitose linfopenia servem como guia para os profissionais e podem ser mensuradas por meio de escalas No Brasil o Palliative Prognostic Score PaP score já se encontra validado e pode ser consi derado uma das melhores ferramentas atuais para a avaliação prognóstica4 10 12 13 Quando falamos de futilidade terapêutica em Cuidados Paliativos devemos lembrar de algumas questões importantes o tratamento para a cura da doença foi finalizado por ser considerado fútil ou seja tais pacientes já se encontram com suas possibilidades terapêuticas limitadas os índices de prognóstico servem para nortear nossa conduta mas são apenas um com plemento ao estudo individual Várias dúvidas surgem nos profissionais da área quando começamos a avaliar determina da ação como fútil portanto algumas questões necessitam de esclarecimento quais as implicações em se suspender um tratamento considerado fútil É importan te saber que os profissionais não são obrigados a instituir tratamentos que considerem ineficazes Porém não devemos apenas dizer não mas dialogar com paciente quando suas condições clínicas permitirem e familiares proporcionando ferramentas para com preender e decidir Os médicos devem sempre estar convencidos de que o cuidado nunca é fútil e precisam estar aptos portanto a distinguir entre um tratamento agressivo e o que proporciona conforto Nesse contexto é importante que a família esteja ciente de tudo o que acontece com o paciente11 o que é importante para que e a família não insista na futilidade terapêutica Os fami liares precisam sentirse incluídos no processo decisório saber a importância de se evitar o prolongamento da morte receber explicações claras sobre o papel familiar ajudar para chegar a um consenso e uma informação de qualidade em boa quantidade e no momento adequado8 como saber quando um tratamento é fútil em Cuidados Paliativos Para nortear nossa conduta devemos sempre responder as seguintes perguntas qual o prognóstico do paciente 198 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP que benefício trará tal medida ao paciente beneficência que danos tal medida poderá acarretar nãomaleficência qual a opinião do paciente e da família a respeito autonomia que implicações tal conduta trará aos outros pacientes justiça Com esses parâmetros teremos mais condições de definir a conduta a ser tomada Acreditamos que os procedimentos que mais ocasionam dúvidas não são quimiote rapia radioterapia ou cirurgias pois quando conhecemos bem a evolução das doenças nossas dúvidas são mais facilmente sanadas A seguir serão abordados separadamente os procedimentos que mais angustiam os profissionais Ressuscitação cardiopulmonar A escolha pela ordem de não ressuscitar ONR ainda é pouco discutida com os pacien tes em nosso país Nos EUA mediante as informações passadas a respeito do prognóstico pela equipe assistente na figura do médico o paciente escolhe se quer ou não ser subme tido a manobras de ressuscitação No Brasil essas questões estão apenas engatinhando por meio da bioética e do conceito de autonomia Entretanto nossa prática médica ainda muito paternalista propicia imensa dificuldade em aceitar a ideia de não ressuscitar Para nossos pacientes optar pela ONR significa escolher morrer A aceitação da morte não ocorre no mesmo momento nem da mesma forma para os indivíduos Muitas vezes paciente família veem na ressuscitação pulmonar RCP uma última chance para continuar vivendo O ideal é que a decisão seja tomada em conjunto paciente família e equipe que tem como pa pel principal o fornecimento do conhecimento técnico que irá auxiliar na tomada de decisão Precisamos esclarecer aos envolvidos que após as manobras de RCP não surgirão alternativas milagrosas para o controle da doença e as perspectivas de prognóstico não se alterarão2 24 Optar pela ONR não é sinônimo de eutanásia ou suicídio assistido mas uma opção consciente pela melhor conduta com a intenção de viver da melhor forma possível não sendo realizadas manobras invasivas e agressivas para manutenção de funções e sinais vitais que não traduzem uma vida com mínima qualidade quando chegar o fim Alguns serviços de Cuidados Paliativos já possuem bem embasadas e documentadas suas políticas de nãoressuscitação esclarecendo ao paciente no momento de seu ingres so no serviço e implicando a aceitação prévia desse conceito para o seu acompanhamen to No Brasil essa ainda é uma questão que embora bem organizada nos preceitos dos Cuidados Paliativos e da bioética gera controvérsia do ponto de vista jurídico ou mesmo junto aos conselhos profissionais Conselho Regional de Medicina CRM ou Conselho Federal de Medicina CFM Ventilação mecânica A ventilação mecânica em nosso contexto pode ser dividida em duas esferas quando não implementamos a ação ou seja não intubamos o paciente e quando retiramos a ação ou seja extubamos o paciente que se encontrava previamente no respirador Em nosso país a questão da extubação sequer aparece nas discussões pois está intimamente ligada às interpretações duvidosas sobre eutanásia Nos Estados Unidos essa prática embora não seja tão frequente aparece bem documentada e é bastante diferenciada da eutanásia19 Neste estudo será abordada apenas a questão da nãointubação 199 Sabemos que grande parte de nossos pacientes apresentará dispneia em seus mo mentos finais seja por doença primária secundária ou mesmo pela fadiga intensa Nesses casos colocar o paciente em prótese ventilatória não só implica futilidade te rapêutica pois sabemos da nãoreversibilidade do quadro com o uso do procedimento como pode implicar distanásia pois estaremos prolongando o sofrimento dele Nesses casos possuímos um grande arsenal terapêutico para o controle da dispneia e caso nada gere o resultado esperado podemos lançar mão da sedação paliativa cuja tarefa é controlar sintomas refratários que não podem ser controlados de outra forma É uma ação restrita com indicações específicas e que deve ser ministrada por profissional habilitado tecnicamente porém já se apresenta amplamente conhecida no cenário dos Cuidados Paliativos mundial e muito bem documentada na literatura científica3 14 17 18 25 Com isso teremos a certeza do nãosofrimento do paciente e de seus familiares que deverão estar esclarecidos quanto ao procedimento e a segurança da nãoobsti nação terapêutica ou distanásia Hidratação artificial A hidratação artificial tem sido um desafio constante na prática dos Cuidados Paliati vos até mesmo para os médicos pois a ideia de que podemos estar sendo negligentes com a sua retirada ainda paira no ar Sabemos porém que pacientes na fase final da vida não se beneficiarão da hidratação artificial e muitas vezes podem ser prejudicados por ela O fornecimento de fluidos pode aumentar a secreção broncopulmonar gerando esfor ço respiratório e até mesmo dispneia a quantidade de líquidos cavitários como derrame pleural e ascite o grau de edema periférico em geral pacientes nesse momento apre sentam hipoalbuminemia intensa o aumento de secreção gástrica podendo ocasionar episódios eméticos de diurese que piora o desconforto do paciente à mobilização e por fim a sobrecarga circulatória2 5 A maior queixa nesses pacientes é a xerostomia boca seca mais relacionada com o uso de medicações do que com a própria desidratação Tal queixa é mais bem combatida com a atuação da equipe de enfermagem e os cuidados locais com a cavidade oral do que com hidratação artificial Alguns pacientes podem evoluir com delirium e nesses casos temos de excluir as causas mais comuns hipoxemia febre medicações e por fim desidratação Nutrição artificial A suspensão ou nãointrodução da dieta em nossos pacientes é uma questão bastante angustiante principalmente para os familiares pois a questão da alimentação está inti mamente ligada ao cuidado para eles Não há estudos randomizados sobre alimentação artificial em pacientes com neopla sia avançada porém estudos observacionais evidenciam que não há melhoria na qualida de de vida dos doentes em fase final quando recebem alimentação por sonda enteral2 A nutrição parenteral total NPT também não demonstra benefício na sobrevida nem mesmo resposta ou tolerância maior à quimioterapia paliativa Entretanto esses pacien tes apresentam risco de febre e infecção quatro vezes maior 2 Há muitas complicações no suporte nutricional seja enteral ou parenteral O cate 200 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP ter venoso central é associado a complicações como pneumotórax hidrotórax sepsis e trombose venosa O cateter enteral pode causar epistaxe necrose da asa do nariz bron coaspiração obstrução de vias aéreas sinusite náusea vômito e diarreia dependendo da quantidade qualidade e velocidade de infusão da dieta15 Em seus últimos dias de vida o metabolismo encontrase alterado e o gasto de ener gia dispensado para a digestão mesmo de pequena quantidade de alimento tornase muito oneroso para os pacientes No estado de jejum o glicogênio é quebrado para a produção de glicose essencial para o metabolismo cerebral enquanto tecidos periféricos são capazes de utilizar ácidos graxos como combustível Quando o glicogênio se esgota aminoácidos musculares po dem ser utilizados para produzir glicose por meio da neoglicogênese hepática O jejum por tempo prolongado mais de uma semana torna o cérebro capaz de utilizar cetonas como fonte de energia A cetonemia marcadamente suprime neoglicogênese preservan do assim o músculo esquelético Ela também provoca estado de euforia proporciona alí vio da dor provavelmente por meio da liberação de substâncias endógenas opioideslike e principalmente é marcadamente importante para suprimir a fome Se for revertida mesmo que por alguns momentos com até 400 calorias por dia a dor aumenta e a fome volta Portanto há uma forte razão fisiológica para não tentarmos reverter a cetonemia do paciente em seus últimos dias salvo se houver algum processo reversível em jogo2 Conclusão Não possuímos ainda diretrizes nacionais que respaldem nossa prática nossos da dos são precários e a prática pouco difundida Baseamonos sempre em estatísticas es trangeiras embora tenhamos grande número de pacientes atendidos diariamente Faz se necessário construir rotinas consistentes e direcionadas ao nosso perfil de pacientes principalmente no que diz respeito ao perfil socioeconômico pois no aspecto clínico não diferem dos demais Este artigo teve como objetivo trazer a questão dos procedimentos sustentadores de vida em Cuidados Paliativos tema que é de suma importância no momento em que começamos a ganhar um espaço cada vez maior no meio médico atual Não se tem aqui a pretensão de esgotar o assunto mas iniciar uma discussão longa e produtiva para que as ações sejam cada vez mais uniformes e benéficas para os pacientes Referências 1 BEAUCHAMP T L CHILDRESS J F Princípios de ética biomédica São Paulo Edições Loyola 2002 2 BERGUER A M SHUSTER J L Jr VON ROENN J H Principles and practice of palliative care and supportive oncology USA Lippincott Williams Wilkins 3 ed 2007 3 Definition of sedation for symptom relief a systematic literature review and a proposal of operational criteria Journal of Pain and Symptom Management v 24 n 4 2002 4 DEN DAAS N Estimating length of survival in endstage cancer a review of literature J Pain Symptom Manage v 10 n 7 p 54855 1995 Comment In J Pain Symptom Manage v 12 n 4 p 205 1996 5 ELLERSHAW J SUTCLIFFE J SAUNDERS C Dehydration and the dying patient J Pain Symptom Manage v 10 n 3 p 1927 1995 6 Ética Prática Peter Singer São Paulo Martins Fontes 2002 7 Fundamentos da Bioética Engelhardt Edições Loyola São Paulo Brasil 1998 8 GARROS D Uma boa morte em UTI pediátrica Isto é possível J Pediatr v 79 suppl 2 p S358 2003 201 9 GRUENIGEN V E DALY B Futility clinical decisions at the endoflife in women with ovarian cancer Gynecologic Onclogy v 97 p 63844 2005 10 HIGGINSON I J CONSTANTINI M Accuracy of prognosis estimates by four Palliative Care teams a prospective cohort study BMC Palliat Care v 1 n 1 p 1 2002 11 KASMAN D When is Medical Treatment Futile J Gen Intern Med v 19 n 10 p 10536 2004 Comment In J Gen Intern Med v 19 n 10 10667 2004 12 MALTONI M AMADORI D Prognosis in advanced cancer Hematol Oncol Clin North Am v 16 n 3 p 71529 2002 13 MALTONI M et al Clinical prediction of survival is more accurate than the Karnofsky performance status in stimating life span in terminally ill cancer patients Eur J Cancer v 30A n 6 p 7646 1994 14 MERCADANTE S DE CONNO F RIPAMONTI C Propofol in terminal care J Pain Symptom Manage v 10 n 8 p 63942 1995 15 MITCHELL S L KIELY D K HAMEL M B Dying with advanced dementia in the nursing home Arch Intern Med v 164 p 3216 2004 16 MONTEIRO F Ventilação mecânica e obstinação terapêuticaa dialética da alta tecnologia em medicina intensiva Rev Port de Pneumol v 12 n 3 p 28191 2006 17 MORITA T MIOSHY M Efficacy and Safety of Palliative Sedation Therapy a multicenter prospective observational study conducted on specialized palliative care units in Japan J Pain Symptom Manage v 30 v 4 p 3208 2005 18 MORITA T MIOSHY M Ethical validity of palliative sedation therapy a multicenter prospective observational study conducted on specialized palliative care units in Japan J Pain Symptom Manage v 30 v 4 p 30819 2005 19 OMAHONY S et al Ventilator withdrawal procedure and outcomes Report of a collaboration between a critical care division and a palliative care service J Pain Symptom Manage v 26 p 95461 2003 20 PELLEGRINO E D Decisions to withdraw lifesustaining treatment a moral algorithm JAMA v 283 n 8 p 10657 2000 Comment In JAMA v 284 n 11 p 13801 2000 author reply 13812 21 PINTO C S Quando o tratamento oncológico pode ser fútil Do ponto de vista do Paliativista Rev Bras de Cancerologia v 54 n 4 p 3936 2008 22 REGO S PALÁCIOS M A finitude humana e a saúde pública Rio de Janeiro Cad Saúde Pública v 22 n8 2006 23 TROTOCHAUD K Medically Futile treatments require more than going to court TCM p 604 2006 24 URBAN C A et al Implicações éticas das ordens de não ressuscitar São Paulo Rev Assoc Med Bras v 47 n 3 2001 25 VERKERK M et al A national guideline for palliative sedation in the Netherlands J Pain Symptom Manage v 34 n 6 p 66670 2007 202 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Sedação paliativa CéliA mAriA KirA Introdução É muito bem documentado pela literatura que pacientes numa fase avançada de doença oncológica ou não apresentam vários sintomas causadores de intenso sofrimento que podem ser físicos como dor dispneia constipação psicoemocio nais como agonia ou delirium ou espirituais desesperança Se não adequadamente tratados esses sintomas geram mais angústia e sofrimento ao paciente e aos seus familiares e quando há refratariedade no seu controle a sedação paliativa é uma opção de tratamento Dados da literatura mundial mostram que a prevalência de sedação paliativa varia en tre 16 e 52 No estudo de Ventafridda et al30 a sedação para controle de sintomas em pacientes domiciliares ocorreu em 52 Fainsinger et al9 no Canadá em uma unidade de Cuidados Paliativos encontraram prevalência de 16 de sedação Em hospices Morita et al17 no Japão descreveram 48 de sedação enquanto Fainsinger11 na África do Sul encontrou uma taxa de 30 e Chiu et al6 em Taiwan relataram 20 de pacientes sedados No Brasil na enfermaria de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo HSPESP Ferreira14 encontrou prevalência de sedação paliativa de 367 A variação entre os percentuais de prevalência de sedação paliativa nos diversos es tudos é devida à diferença entre as populações estudadas sintomas refratários tipo de doença aspectos socioculturais e religiosos tipo de ambiente Atualmente a sedação paliativa ainda é confundida com eutanásia mascarada e suicídio assistido por alguns profissionais da área da saúde bem como por pacientes e familiares por acreditarem que tal procedimento apresse a morte do paciente Normal mente a sobrevida após o início da sedação paliativa é muito pequena variando de horas a poucos dias10 12 21 29 Vários trabalhos mostram que não há diferenças significativas na sobrevida entre os pacientes que receberam sedação paliativa e os que não necessitaram de sedação em unidades de Cuidados Paliativos19 21 Segundo Stone27 a necessidade de sedação paliativa sugere mais um indicador de uma morte iminente que a causa de uma morte prematura Também não existe padronização do procedimento Os motivos pelos quais se indi ca a sedação paliativa o momento mais adequado para sua introdução as medicações escolhidas a dose das drogas a via de administração e a duração da sedação são muito variáveis entre os serviços de saúde Sedação paliativa se faz com drogas sedativas e não com drogas analgésicas ou coquetel de drogas aleatórias Não se deve usar a meperidina Dolantina pelos seus vários efeitos colaterais e seu baixo poder analgésico assim como não se usam soros M1 M2 etc Pretendese neste capítulo orientar o profissional da saúde quanto à melhor indicação e ao uso da sedação paliativa caso esse procedimento seja uma opção de tratamento para o seu paciente 203 Conceitos Sedação paliativa é a administração deliberada de fármacos em doses e combinações necessárias para reduzir o nível de consciência com o consentimento do paciente ou de seu responsável e possui o objetivo de aliviar adequadamente um ou mais sintomas refratários em pacientes com doença avançada terminal2 1826 Sedação terminal foi o primeiro termo utilizado para nomear a sedação paliativa porém tem sido abandonado nos últimos anos devido à falta de clareza da palavra ter minal que pode estar associada ao paciente ou ao objetivo da sedação terminar a vida18 Considerase sintoma refratário tudo o que não pode ser adequadamente controlado apesar de repetidas e intensas tentativas de tratamento tolerável que não comprometa o nível de consciência Os critérios diagnósticos para designar sintoma refratário incluem a despeito de outras possíveis intervenções invasivas e nãoinvasivas no controle desses sintomas incapacidade de promover alívio adequado associação às excessivas e intoleráveis morbidades aguda e crônica improvável obtenção de alívio em curto prazo5 15 Sugerese que a determinação da refratariedade do sintoma deva ser sempre que possível um consenso entre os membros da equipe que cuida o maior número possível de membros eou deve haver uma consultoria com outros especialistas Um exemplo prático de sintoma refratário é o paciente com intensa dispneia provocando sofrimento e ansiedade para si próprio e seus familiares A despeito de todas as tentativas de tratamento se a dispneia e o estresse persistirem depois de um tempo razoável devese começar a aceitar a refratariedade do sintoma e prescrever uma sedação O objetivo nesse momento é diminuir o estresse mental do paciente causado pela sensação de sufocamento e ansiedade gerada pela perda de controle da situação ora vivenciada Não se deve confundir sintoma refratário com sintoma difícil5 15 o qual é concei tuado como o sintoma que para ser adequadamente controlado precisa de intervenção terapêutica intensiva além das medidas habituais tanto farmacológicas quanto instru mentais e psicológicas22 Muitos sintomas considerados refratários por médicos ge neralistas como por exemplo delirium induzido por medicamentos ou quadro delirante por outras causas desidratação distúrbios eletrolíticos infecção nãoaparente podem ser controlados adequadamente por médicos com treinamento e habilidades adequados ou especialista na área Stoutz e Bruera28 demonstraram que o rodízio de opioides redu ziu a necessidade de sedação para controle dos sintomas induzidos pela sua toxicidade mioclonia alucinações delírio náuseas vômitos e dor persistente De 80 pacientes que alternaram opioides nesse estudo 73 se beneficiaram com a conduta Considerações éticas em sedação paliativa A grande controvérsia ética da sedação paliativa ocorre porque as pessoas leigas assim como os profissionais da área da saúde desconhecem os princípios dos Cuidados Paliativos e associam erroneamente este procedimento à eutanásia8 20 As principais distinções entre sedação paliativa e eutanásia23 26 são apresentadas no Quadro 1 204 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Apesar de a palavra sintoma geralmente denotar doença física por exemplo dor e dispneia Cherny e Portenoy5 reconhecem o sofrimento psicoexistencial como um sinto ma Entretanto a sedação paliativa nesse tipo de sofrimento é ética e moralmente proble mática para a maioria dos médicos pois pacientes em sofrimento existencial podem estar acordados alertas lúcidos e sem sintoma físico associado Morita19 em 2004 descreveu os efeitos benéficos da sedação paliativa para o alívio de sofrimento psicoexistencial administrada em 90 casos prevalência de 1 Os principais sintomas de sofrimento em seu estudo foram desesperança dependência e inabilidade para o autocuidado medo ansiedade e pânico da morte desejo de controlar o momento da morte isolamento e ausência de suporte social Brandão1 levanta a questão da necessidade de reflexão do médico diante da situação de incurabilidade e morte próxima Antes de sedar o paciente deverseiam sedar os próprios sintomas e sentimentos de angústia ansiedade frustração impotência onipo tência falta de informação e medo da própria morte A sedação paliativa tem dois efeitos o desejado reduz os sofrimentos físico e psico lógico e o indesejado pode diminuir o tempo de vida do paciente O princípio do duplo efeito16 22 torna a sedação paliativa moralmente aceita uma vez que a intenção alívio do sofrimento tem mais importância que a consequência diminuição do tempo de vida privação da consciência no julgamento ético desse procedimento Em outras palavras o princípio da beneficência tem precedência sobre o da nãomaleficência Classificação Porta22 sugere uma classificação didática quanto à sedação paliativa com base em objetivo temporalidade e intensidade como pode ser visto no Quadro 2 A sedação paliativa nem sempre é administrada de forma primária contínua e pro funda A administração de uma droga sedativa não necessariamente significa supressão permanente do nível de consciência E é necessário lembrar que o objetivo final dessa sedação é aliviar o estresse e promover conforto O nível de sedação deve ser titulado em função de cada paciente e do alívio de seu sintoma ou estresse sedação proporcionada Indicações de sedação paliativa Os sintomas refratários mais comuns relatados na literatura são delírio agitado disp neia e dor Qualquer outro sintoma se diagnosticado como refratário pode e deve ser Quadro 1 Distinção entre sedação paliativa e eutanásia Sedação paliativa Eutanásia Intenção Aliviar sintoma refratário Provocar a morte para cessar o sofrimento Processo drogas e doses Drogas sedativas ajustadas à resposta do paciente Drogas letais que garantam uma morte rápida Objetivo Alívio do sofrimento Morte rápida 205 Quadro 2 Classificação da sedação paliativa Objetivo Sedação primária a finalidade da intervenção terapêutica é a diminuição do nível de consciência Sedação secundária o rebaixamento do nível de consciência é consequência do efeito farmacológico da medicação usada para controlar um sintoma específico como ocorre por exemplo nos tratamentos da dor uso de opioides e do delírio uso de neurolépticos Temporalidade Sedação intermitente é aquela que permite períodos de alerta do paciente Sedação contínua a diminuição do nível de consciência ocorre de forma permanente Intensidade Sedação superficial mantém um nível de consciência no qual o paciente ainda pode se comunicar verbalmente ou não Sedação profunda a que mantém o paciente em estado de inconsciência sedado paliativamente náusea e vômitos hemorragia maciça convulsão mioclonia in sônia prurido angústia medo pânico ansiedade terror7 1012 21 27 As circunstâncias que envolvem a prescrição de uma sedação paliativa são geral mente cercadas de emoções dor total sofrimento angústia o que pode dificultar uma abordagem correta com a família sobre procedimento e clareza de decisões Em Cuidados Paliativos podemos ter três situações clínicas distintas às vezes superpostas doença avançada terminal com sintomas refratários quadro agudo ameaçador da vida em tempo curto e morte iminente com sofrimento intenso O tipo da sedação a droga escolhida a dose a via e a taxa de administração dos sedativos vão variar conforme a necessidade clínica de cada paciente Alguns necessitarão de sedação em momentos particulares es pecíficos do dia ou da noite enquanto outros necessitarão de sedação mais contínua Porta23 faznos refletir sobre os aspectos clínicos da sedação paliativa como proce der nessas situações e acerca da importância de esclarecer e obter o consentimento para o procedimento No caso de sintomas refratários a equipe de saúde deve ser capaz de explicar ao paciente e aos seus familiares de maneira compreensível razoável e sensível o que está acontecendo da necessidade de uma mudança de estratégia de tratamento e tentar obter o consentimento Quando o paciente está consciente e lúcido devese respeitar sua autonomia quando não é mais autônomo recomendase tentar saber sobre seus desejos e valores prévios e obter consentimento da família Quando ele não possui família ou essa se sente incapaz de tomar tal decisão a equipe de saúde deve agir de acordo com o interesse do paciente e assegurarlhe seu bemestar Todas as decisões devem sempre ser registradas no prontuário médico bem como suas justificativas Pacientes com quadros agudos ou inesperados evoluindo para uma situação ameaçadora da vida como hemorragia maciça ou tromboembolismo pulmonar maciço necessitarão ser sedados mais rapidamente Nessa situação o tempo é curto e é mais difícil conseguir o consentimento porém devese tentar obtêlo Em geral os familiares aceitam a decisão médica recomendada Felizmente esses quadros agudos não são fre quentes e muitas vezes o paciente falece antes de receber a sedação 206 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A terceira situação clínica a da morte iminente pode ser percebida por qualquer membro da equipe de saúde pelo próprio paciente e até mesmo por familiares O pa ciente já apresenta sinais de diminuição da atividade como um todo além de dificul dade respiratória e agitação A intenção nesse caso quando há sofrimento intenso associado é propiciar uma morte mais tranquila e digna A família também deve estar envolvida no processo decisório da sedação paliativa seja ela superficial ou profunda Lembramos que na maioria das vezes a morte ocorre sem a necessidade de sedar o paciente No Quadro 3 sugerese uma lista de situações em que a sedação paliativa é uma opção terapêutica Antes de iniciar uma sedação paliativa várias questões devem ser respondidas para garantir que essa seja a opção mais adequada3 as quais estão listadas no Quadro 4 Quadro 3 Indicações de sedação paliativa Sintomas refratários delírio agitado agitação terminal ou inquietude refratária a neurolépticos dor refratária a opioides e analgésicos adjuvantes vômitos refratários à agressiva terapêutica antiemética dispneia refratária a oxigênio broncodilatadores e opioides sofrimento psicológico ou existencial refratário à intervenção apropriada antidepressivos suporte religioso e espiritual Quadro agudo ameaçador da vida em tempo curto Morte iminente horas a dias com sofrimento intenso leia o texto com cuidado Quadro 4 Questões a serem respondidas antes da indicação da sedação paliativa3 Todos os esforços foram feitos para identificar e tratar as causas reversíveis geradoras do sofrimento Interconsultas foram realizadas com equipe em Cuidados Paliativos eou com outros especialistas Todas as abordagens nãofarmacológicas já foram aplicadas como por exemplo técnicas de relaxamento e distração para ansiedade e dispneia Todos os outros tratamentos farmacológicos foram aplicados como por exemplo titulação adequada de opioides no caso de dispneia ou dosagem adequada de neurolépticos para o delírio agitado Sedação intermitente foi considerada nos casos de delirium potencialmente reversíveis ou nos casos de sofrimento psicoexistencial extremo Os objetivos da sedação foram explicados e discutidos com o paciente e seus familiares A sedação foi consensual paciente família e equipe 207 Um algoritmo para tomada de decisão na indicação de sedação paliativa25 é sugerido na Figura 1 Medicações utilizadas em sedação paliativa Na literatura os principais sedativos utilizados são benzodiazepínicos midazolam diazepam lorazepam neurolépticos levomepromazina clorpromazina haloperidol barbitúricos fenobarbital anestésicos propofol ketamina Figura 1 Algoritmo para indicação de sedação paliativa Traduzido e adaptado de Sedación Paliativa25 Sintomas refratários Sofrimento insuportável Prognóstico limitado Sem outras opções de tratamento sem comprometer o nível de consciência Consulta com especialista Competência do paciente Dúvidas SIM SIM NÃO Valorizar o desejo da família 1o Vontades antecipadas diretrizes prévias 2o Valores e desejos prévios história clínica 3o Família agregados Desejo explícito do paciente SIM Consentimento informado verbal ou escrito Compartilhar a decisão com a equipe Registrar no prontuário INDICAR SEDAÇÃO PALIATIVA SIM Dúvidas Consulta com especialista 208 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 5 Sugestão de soro com midazolam Midazolam 10 ml 50 mg SG ou SF 240 ml Para uma concentração de midazolam 02 mgml SG soro glicosado SF soro fisiológico O midazolam é o sedativo mais frequentemente referido na literatura para indu ção de sedação paliativa e entre os benzodiazepínicos o mais utilizado É facilmente titulável com rápido início de ação 2 minutos após administração intravenosa IV e curta duração 15 a 25 horas Pode ser administrado por via subcutânea SC em bolus em infusões contínuas IV e SC não se precipitando se usado no mesmo soro com a morfina A dose máxima recomendada é de 120160 mgdia pois acima desse nível não ocorre mais inibição dos receptores do ácido gamaaminobutírico GABA havendo então necessidade de associar outra droga O uso concomitante com algumas medicações carbamazepina fenitoína rifampicina pode resultar em rápida diminuição da ação do midazolam em um curto período de tempo Entretan to a associação a outras drogas inibidoras do P450 3A4 cetoconazol itraconazol fluconazol eritromicina azitromicina diltiazem verapamil saquinavir cimetidina ranitidina pode levar a sedação profunda mesmo com uma dose relativamente baixa do midazolam Uma sugestão prática de preparação do midazolam no soro é apresentada no Quadro 5 A levomepromazina é a droga neuroléptica mais citada na literatura porém a clor promazina é mais utilizada no Brasil em função de ser disponível aqui sua aplicação IV e SC Ferreira14 recomenda que a sedação paliativa da dispneia refratária seja iniciada com a associação de midazolam e morfina A morfina é um opioide forte com ação primaria mente analgésica e nãosedativa Apesar de não existir um sítio de ação específico na dispneia acreditase em ação em receptores de opioides distribuídos na árvore traqueo brônquica e no tronco cerebral centro respiratório modulando percepção e ansiedade4 Aos pacientes que apresentarem efeito paradoxal ao midazolam ou sedação difícil suge rese a associação de um neuroléptico clorpromazina a um opioide e benzodiazepínico Para a paliação do delírio agitado refratário iniciar com um neuroléptico clorpromazina e nos casos de efeito paradoxal a essa droga ou sedação difícil associar o midazolam Para a dor refratária manter o opioide já prescrito associálo ao midazolam e nos casos de efeito paradoxal ao benzodiazepínico ou de sedação difícil adicionar um neuroléptico clorpromazina Por ausência de evidência suficiente na literatura não há recomendações específicas a res peito do uso de drogas sedativas podendose estabelecer recomendações gerais Não há des crição de doses máximas dos sedativos exceto para o midazolam uma vez que cada paciente necessitará de uma dose distinta Cherney e Portenoy5 recomendam iniciar com a dose mínima do sedativo suficiente para paliar o sintoma ajustandoa conforme as reavaliações periódicas A via SC é sempre mais cômoda e prática caso o paciente não tenha acesso venoso Uma sugestão prática na utilização dessas drogas foi compilada a partir de dados da literatura3 14 15 24 25 e está indicada no Quadro 6 209 Quadro 6 Sugestões de drogas em sedação paliativa Drogas Sintomas Dose Observações MIDAZOLAM Ampola de 3 ml 5 mgml Dor dispneia delírio agitado sofrimento psíquico Indução bolo de 255 mg Iniciar infusão contínua SC 0408 mgh Máxima diária 160200 mg Resgate bolus de 255 mg Dose máxima de 120160 mgdia Interação com outras drogas ver texto LEVOMEPROMAZINA Ampola de 5 ml 5 mgml no Brasil disponível em gotas ou comprimidos Delírio como sintoma predominante Indução bolo de 12525 mg Iniciar infusão contínua SC 100 mgdia Resgate bolus de 125 mg Usos VO e SC Dose máxima diária 300 mg CLORPROMAZINA uso mais comum no Brasil Ampola de 5 ml 5 mgml Delírio como sintoma predominante 12550 mg a cada 412 h VOIV Dose máxima 25375 mgdia HALOPERIDOL Ampola de 1 ml 5 mgml Delírio 255 mg de 1212 h SC Dose máxima de 510 mgdia FENOBARBITAL Ampola de 2 ml 100 mgml Dor dispneia delírio agitado sofrimento psíquico Indução bolo de 2 mgkg lento Iniciar infusão contínua SC 600 mg24 h Infusão contínua IV 1 mgkg Indução bolo de 100200 mg seguido de 40 mgh SCIV sn Antes de iniciar a infusão suspender benzodiazepínicos e neurolépticos Reduzir opioides pela metade PROPOFOL Ampola de 20 ml 10 mgml Necessidade de supervisão de um médico anestesista ou treinado Refratariedade a outros sedativos Indução bolo de 115 mgkg Iniciar infusão contínua IV 2 mgkgh Resgate bolo com metade da dose da indução Antes de iniciar a infusão suspender benzodiazepínicos e neurolépticos e reduzir opioides pela metade Somente uso IV e não misturar com outras drogas KETAMINA Ampolas de 2 ml 50 mgml Dor e refratariedade a outros sedativos 515 mg SC Bloqueio de receptores NMDA Dobrar dose se houve uso prévio de benzodiazepínico SC subcutânea VO via oral IV intravenoso sn se necessário NMDA nmetilDaspartato 210 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 7 Drogas em sedação paliativa Midazolam Clorpromazina Haloperidol Iniciar com 061 mghora 1524 mgdia 25375 mgdia 510 mgdia Soro SG ou SF a 09 250 ou 500 ml Midazolam 5 mg ou 75 mg IV ou SC 88 h No mesmo soro do midazolam No mesmo soro do midazolam SG soro glicosado SF soro fisiológico IV intravenoso SC subcutâneo Outra sugestão de esquema de sedação paliativa é o utilizado no HSPESP14 Quadro 7 Nos casos em que o paciente tenha indicação inicial de sedação profunda reco mendase o esquema do Edmonton General Hospital apresentado no Quadro 812 13 Iniciase com 14 mgh aumentando progressivamente até atingir o nível de sedação desejada Quadro 8 Esquema de sedação do Edmonton General Hospital SG 5 ou SF 09 100 ml IV ou SC em infusão contínua Midazolam 100 mg SG soro glicosado SF soro fisiológico IV intravenoso SC subcutâneo A sedação paliativa intermitente pode ser realizada no domicílio benzodiazepíni co neuroléptico por via oral VO ou SC Nos casos de sedação contínua e profunda a realização é recomendada em ambiente hospitalar pela necessidade da titulação das drogas e reavaliações clínicas frequentes Alguns sintomas de natureza dramática como hemorragia maciça dispneia e vômitos incoercíveis são mais facilmente controlados em ambiente hospitalar Um algoritmo para a escolha do tratamento farmacológico em sedação paliativa25 tanto para uso hospitalar quanto domiciliar com base no sintoma predominante está demonstrado na Figura 2 Uma vez prescrita a sedação paliativa algumas ações devem ser efetivadas3 14 e es tão compiladas no Quadro 9 No Quadro 10 encontrase a escala de Ramsay Para finalizar alguns lembretes importantes sobre sedação paliativa13 14 estão no Quadro 11 211 Figura 2 Algoritmo para a escolha do tratamento farmacológico em Sedação Paliativa Traduzido e adapta do de Sedación Paliativa25 SC via subcutânea IV via intravenosa Quadro 9 Ações após o início da sedação paliativa Reavaliação sintomática quanto ao tipo e à dose da medicação escolhida individualizada com monitorização contínua e regular do processo para ajuste da sedação Titulação da dose sedativa utilizando a escala de avaliação de Ramsay Manter as medidas de higiene e conforto Manter as medicações para controle de dor opioides Suspender medicações nãoessenciais vitaminas hormônios tireoidianos etc ou tratamentos médicos ineficazes para o bemestar do paciente Atentar para retenção urinária e impactação fecal fecaloma que geram grande desconforto nos pacientes sedados Orientar os familiares que a sedação paliativa não é o mesmo que eutanásia e não apressa a morte Orientar os familiares quanto aos sinais do processo da morte ronco da morte sororoca cianose de extremidades mudança da cor da pele hipotensão e diminuição da diurese Fornecer suportes psicológico e espiritual à família Proporcionar presença da equipe que cuida compreensão privacidade e disponibilidade Delírio Domicílio SC 1a opção midazolam clorpromazina 2a opção fenobarbital 1a opção levomepromazina clorpromazina Que sintoma predomina Dor Dispneia Hemorragia Ansiedade Pânico Outros Indicada sedação 2a opção Hospital IV midazolam levomepromazina clorpromazina propofol fenobarbital SC midazolam clorpromazina fenobarbital Domicílio SC midazolam fenobarbital Hospital IV midazolam propofol fenobarbital SC midazolam fenobarbital 212 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 10 Escala de Ramsay Nível I agitado angustiado Nível II tranquilo orientado e colaborativo Nível III resposta a estímulos verbais Nível IV resposta rápida a estímulos dolorosos Nível V resposta lenta a estímulos dolorosos Nível VI sem resposta Quadro 11 Lembretes importantes sobre sedação paliativa Cada paciente deve receber o sedativo e a dose adequados para paliar o seu sintoma refratário específico Visar primariamente sedar o sintoma refratário e não o paciente Não usar dolantina Sempre que possível iniciar com a menor dose do sedativo sedação leve Os opioides são drogas primariamente analgésicas e não sedativas A única exceção a essa regra é a associação da morfina ao midazolam para sedação paliativa da dispneia refratária Para agitação por efeito paradoxal ou não do midazolam devese associar um neuroléptico haloperidol ou clorpromazina à sedação Em delírio agitado refratário o sedativo inicial deve ser um neuroléptico em doses progressivas somente associar o midazolam nos casos de sedação difícil Referências 1 BRANDÃO C Sedação terminal reflete necessidade de ensino e pesquisa em medicina paliativa e cuidados paliativos Revista Prática Hospitalar v 34 p 4952 2004 2 BRAUN T C HAGEN N A CLARK T Development of a clinical practice guideline for palliative sedation J Palliat Med v 6 p 34550 2003 3 CAPITAL HEALTHCARITAS HEALTH GROUP REGIONAL PALLIATIVE CARE PROGRAM Palliative Sedation Guideline 2005 4 CHAN K S et al Palliative medicine in malignant respiratory diseases In DOYLE D et al orgs Oxford textbook of Palliative Medicine 3 ed Oxford University Press 2005 cap 88 p 587618 5 CHERNY N PORTENOY R Sedation in the management of refractory symptoms guidelines for evaluation and treatment J Palliat Care v 10 p 318 1994 6 CHIU T Y et al Sedation for refractory symptoms of terminal cancer patients in Taiwan J Pain Symptom Manage v 21 p 46772 2001 7 COWAN JD WALSH D Terminal sedation in palliative medicine definition and review of the literature Support Care Cancer v 9 p 4037 2001 8 DICKENS B M Commentary on slow euthanasia J Palliat Care v 12 n 4 p 423 1996 9 FAINSINGER R et al Symptom control during the last week of life on a palliative care unit J Palliat Care v 7 n 1 p 511 1991 10 FAINSINGER R L et al Sedation for delirium and other symptoms in terminally ill patients in Edmonton J Palliat Care v 16 n 2 p 510 2000 213 11 FAINSINGER R L et al Sedation for uncontrolled symptoms in a South African hospice J Pain Symptom Manage v 16 p 14552 1998 12 FAINSINGER R L et al A multicentre international study of sedation for uncontrolled symptoms in terminally ill patients Palliat Med v 14 p 25765 2000 13 FERREIRA S P KIRA C M Sedação paliativa Manuscrito para o Curso de Educação Continuada Módulo de Cuidados Paliativos Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo CREMESP 2006 14 FERREIRA S P Sedação paliativa experiência do programa de cuidados paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo Revista Prática Hospitalar v 47 p 558 2006 15 FÜRST C J DOYLE D The terminal phase In DOYLE D et al orgs Oxford textbook of palliative medicine 3 ed Oxford University Press 2005 cap 18 p 1128 16 GARCIA J L A Double effect In REICH W T ed Encyclopedia of bioethics New York Simon and Schuster 1995 vol 2 p 63641 17 MORITA T INOUE S CHIHARA S Sedation for symptom control in Japan the importance of intermittent use and communication with family members J Pain Symptom Manage v 12 p 328 1996 18 MORITA T TSUNETO S SHIMA Y Definition of sedation for symptom relief a systematic literature review and a proposal of operational criteria J Pain Symptom Manage v 24 p 44753 2002 19 MORITA T Palliative sedation to relieve psychoexistential suffering of terminally ill cancer patients J Pain Symptom Manage v 28 p 44550 2004 20 MOUNT B Morphine drips terminal sedation and slow euthanasia definitions and facts not anecdotes J Palliat Care v 12 n 4 p 317 1996 21 MULLERBUSCH H C ANDRES I JEHSER T Sedation in palliative care a critical analysis of 7 years experience BMC Palliat Care v 2 p 2 2003 22 PORTA J Aspectos éticos de la sedación en cuidados paliativos Med Pal Madrid v 9 p 415 2002 23 PORTA J Clinical aspects of sedation in palliative care in ethics and sedation at the close of life Barcelona Fundación Victor Grifols i Lucas 2003 Disponível em httpwwwfundaciogrifolsorgdocs pub920engpdf Acesso em 24 maio 2009 24 SEDACIÓN EN CUIDADOS PALIATIVOS Disponível em httpwwwsecpalcomguiasmindex phpaccseeguiaidguia8 Acesso em 24 abr 2009 25 SEDACIÓN PALIATIVA In Guia de práctica clínica sobre cuidados paliativos 2008 cap 8 p 10913 Disponível em httpwwwguiasaludesegpccuidadospaliativosresumidadocumentosCuidados20PaliativosResumida pdf Acesso em 24 abr 2009 26 SEPCAL Sedación en cuidados paliativos Sociedad Española de Cuidados Paliativos Disponível em httpwwwsecpalcomguiasmindexphpaccseeguiaidguia8 Acesso em 24 abr 2009 27 STONE P et al A comparison of the use of sedatives in a hospital support team and in a hospice Palliat Med v 11 p 1404 1997 28 STOUTZ N D BRUERA E ALMAZOR M S Opioid rotation for toxicity reduction in terminal cancer patients J Pain Symptom Manage v 10 n 5 p 37884 1995 29 SYKES N THORNS A Sedative use in the last week of life and the implications for endoflife decision making Arch Intern Med v 163 p 3414 2003 30 VENTAFRIDDA V et al Symptom prevalence and control during cancer patients last days of life J Palliat Care v 6 n 3 p 711 1990 214 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do médico na equipe de Cuidados Paliativos leonArdo Consolim O médico tem toda sua formação acadêmica voltada para diagnóstico e trata mento de doenças Quando encontra um paciente necessitado de Cuidados Palia tivos de modo que o foco deixa de ser a doença e passa a ser o doente nos seus âmbitos físico psicológico social e espiritual ele obrigatoriamente tem de rever seus conceitos de saber e aprender a trabalhar em equipe Por melhor que sejam os conhecimentos técnicos do médico ele sozinho não consegue suprir todas as necessidades que o cuidado integral de um paciente e de sua família exige Para que o trabalho em equipe dê os frutos que dele se esperam é importante que cada um de seus integrantes tenha bons conhecimentos sobre sua área além de saber trabalhar com os outros profissionais das diferentes especialidades A chave para o sucesso é a comunicação que vai além das facilidades ou dificuldades in terpessoais ou de áreas afins mas que avança para um planejamento terapêutico realizado por toda a equipe Historicamente as equipes de saúde se organizam de forma hierarquizada em que os diferentes profissionais têm seus trabalhos reconhecidos socialmente de forma diferente mesmo dentro da própria equipe2 3 Nesse contexto o médico é colocado como o detentor do papel predominante Porém se ele aceitar essa situação todo trabalho necessário para que o paciente e sua família tenham sofrimento arrefecido dor controlada e uma vida digna até o final pode não ter o êxito necessário Dentro da sua especificidade o profissional deve realizar os diagnósticos clíni cos conhecer a doença sua história natural os tratamentos já realizados e qual a evolução esperada para aquele paciente naquele momento Se necessário for deve entrar em contato com as outras especialidades médicas que já trataram ou ainda estejam tratando o doente para discutir uma conduta específica A responsabilidade de propor tratamentos medicamentosos ou não que tragam alívio nos sintomas desconfortáveis é do médico Mas talvez a principal tarefa do médico em uma equipe de Cuidados Paliativos seja coordenar a comunicação entre os profissionais envolvidos o paciente e sua família que esperam ouvir do médico informações sobre diagnóstico e prognóstico da doença O profissional da medicina não deve passar para outros integrantes da equipe a responsabilidade de conversar sobre esses aspectos diretamente ligados ao doente e à doença É ainda muito importante que o médico se comunique de forma eficaz com a equipe para que todos os profissionais ao serem questionados pelo paciente e pela família tenham a mesma postura e falem a mesma língua Agindo dessa forma o médico vai funcionar como elemento facilitador para que toda a equipe trabalhe e ajude o paciente a exercer sua autonomia1 Com isso escolhas e decisões passam a ser partilhadas entre paciente família e equipe de Cuidados Paliativos Dessa forma todos se tornam corresponsáveis pela promoção de saúde e de vida cumprindo os propósitos de cuidar do paciente de forma integral individualizada com foco no seu bemestar e na sua qualidade de vida independen temente de quão avançado seja o estado de sua doença 215 Referências 1 PEDUZZI M Equipe multiprofissional de saúde a interface entre trabalho e interação 1998 254p Tese Doutorado Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas São Paulo 1998 2 PEDUZZI M Equipe multiprofissional de saúde conceito e tipologia Rev Saúde Pública v 35 n 1 p 1039 2001 3 SAAR S R C TREVISAM M A Papéis Profissionais de uma equipe de saúde visão de seus integrantes Rev Latinoam Enfermagem v 15 n 1 2007 216 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do enfermeiro na equipe de Cuidados Paliativos FláviA Firmino O processo do cuidar que está inserido na prática profissional do enfermeiro faz in terface com todos os membros da equipe de saúde com a família com a comunidade e também com o ambiente onde ele executa seu trabalho Ele está obrigatoriamente introduzido numa relação direta processual dialógica interativa e subjetiva inerente ao cuidado da vida humana1 A atuação desse profissional compreende tarefas e relações que vão desde a interação com cada cliente até articulações mais complexas com familiares equipe de saúde mul tiprofissional e institucional e permeia diferentes faces do processo de cuidado desde a entrada até a saída do paciente seja pela alta hospitalar seja pelo óbito Especificamente no âmbito dos Cuidados Paliativos o enfermeiro exerce seu papel desenvolvendo ações práticas e gerenciais em maior consonância com toda a equipe de saúde cujos profissionais nesse momento tão específico do tratamento terapêutico convergem seus discursos para a estrutura do cuidado ante a estrutura da cura Temse então um ambiente genuíno para a prática da enfermagem fundamental Tratase de uma abordagem de enfermagem generalizada numa prática médica cli nicamente especializada Nesse espaço clínico o enfermeiro deverá ocupar seu espaço profissional junto à equipe multiprofissional desenvolvendo as habilidades clínicas ine rentes ao controle dos sinais e sintomas e à comunicação genuína para agregar as ações dos diversos profissionais em função do benefício do paciente de sua família e também da instituição Por analogia inferese que o enfermeiro que atua ou atuará nessa área não precisará de maiores competências clínicas nem experiência em lidar com equipe multiprofissional De uma forma muito mais inconsciente do que consciente a desvalorização social do paciente dito terminal é transferida para a enfermeira que dele cuida2 No entanto no que diz respeito à sua competência clínica é necessário destacar a sapiência do enfermeiro no controle da dor visto ser esse um dos sintomas que mais impõem sofrimento aos pacientes dos Cuidados Paliativos Tratase de um desafio a ser vencido com esforços sinceros pois o déficit de conhecimento é realidade também jun to a outros profissionais da equipe de saúde Para esse verdadeiro problema que causa entraves na qualidade dos cuidados à saúde os programas de educação acadêmica e de técnicas médicas precisam unir forças para implementar o ensino e o ambiente em que as práticas da saúde são desenvolvidas O Conselho Internacional de Enfermagem CIE fundado em 1899 reconhece os Cui dados Paliativos como uma questão atual da saúde e da sociedade e também vê neles a importância do controle da dor pela enfermeira em conjunto com a necessidade de prover auxílio no controle dos demais sintomas e prestar apoios psicológico social e espiritual para os pacientes sob seus cuidados O CIE afirma que uma pronta avaliação a identificação e a gestão da dor e das 217 necessidades físicas sociais psicológicas espirituais e culturais podem diminuir o sofri mento e melhorar de fato a qualidade de vida dos pacientes de Cuidados Paliativos e de seus familiares3 Ações objetivas de cunho pragmático como domínio da técnica de hipodermóclise curativos nas lesões malignas cutâneas frequentemente ditas feridas tumorais téc nicas de comunicação terapêutica cuidados espirituais zelo pela manutenção do asseio e da higiene medidas de conforto e trabalho junto às famílias são requisitos fundamentais para a melhor atuação do enfermeiro em Cuidados Paliativos4 As habilidades dos enfermeiros deverão estar voltadas para a avaliação sistemática dos sinais e sintomas para o auxílio da equipe multiprofissional no estabelecimento de prioridades para cada cliente bem como para a própria equipe e para a instituição que abriga o atendimento designado como Cuidados Paliativos na interação da dinâmica familiar e especialmente no reforço das orientações feitas pelos demais profissionais da equipe de saúde de modo que os objetivos terapêuticos sejam alcançados Por isso é que as competências clínica e relacional do enfermeiro recebe destaque nos Cuidados Paliativos Adicionamente tanto para a equipe quanto para o paciente e para a instituição é necessário que o profissional tenha habilidades de comunicação posto que asseguram o melhor desenvolvimento de suas práticas clínicas Referências 1 BOURDIEU P Meditações pascalianas Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2001 2 CASTANHA M L A Invisibilidade da prática de cuidar do ser enfermeiro sob o olhar da equipe de saúde 2004 161f Dissertação Mestrado em Enfermagem Universidade Federal do Paraná Curitiba Paraná 3 CONSELHO INTERNACIONAL DE ENFERMEIRAS Genebra La enfermería importa Cuidados paliativos Página informativa ca2007 Disponível em httpwwwicnchmatterspalliativesppdf Acesso em 21 abr 2009 4 OCONNOR M ARANDA S Guia prático de cuidados paliativos em enfermagem São Paulo Andrei 2008 218 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do psicólogo na equipe de Cuidados Paliativos luAnA visCArdi nunes Introdução Este texto inserese num manual palavra que pertence à classe dos substantivos pequeno livro compêndio mas que passa a adjetivo quando se refere àquilo que é feito ou movido a mão A etimologia dessa palavra remete portanto ao fazer à atividade prática Assim a pergunta que sustenta a discussão que se fará neste texto é o que faz o psicólogo na equipe de Cuidados Paliativos Enfatizar a prática não implica oferecer receitas ou fórmulas prontas nem desbancar a teoria Ao contrário a atividade cotidiana lança indagações e desafios aos quais o psicólogo deve responder criativamente buscando fundamentar seu trabalho num refe rencial teórico consistente psicanálise psicologia analítica psicologia social análise do comportamento etc É no avanço articulado entre teoria e prática que se vai definindo sua identidade na equipe Trabalho em equipe Paralelamente é imprescindível conhecer os princípios dos Cuidados Paliativos O tra balho em equipe é um deles e pressupõe que o psicólogo desenvolva a habilidade de comunicarse com profissionais de outras áreas do conhecimento Parece consensual na bibliografia referente ao tema a ideia de que a interdisciplinaridade requer flexibili dade mas não o apagamento das especificidades Essas últimas são fundamentais para que necessidades distintas médicas sociais psicológicas espirituais etc do doente da família e da equipe possam ser reconhecidas e atendidas pela articulação entre ações de diferentes áreas Para se colocar em condição de participar de trocas efetivas com profissionais de outros saberes é necessário que o psicólogo procure ter clareza sobre as possibilidades e os limites do seu campo de trabalho evitando tomar para si modelos estranhos à sua prática o modelo médico ou o religioso por exemplo É desejável então que o psicólogo identifique o seu objeto de estudo e intervenção reconhecendo o campo epistemológico em que se situa sua prática Integração dos aspectos psicológicos ao tratamento do doente A noção de dor total desenvolvida na década de 1960 pela médica inglesa Cecily Saunders implica diretamente a ação do psicólogo visto que reconhece ao lado das razões orgânicas o fator emocional além do social e espiritual acrescentaria Saunders como aspecto envolvido na dor e em outros sintomas físicos É possível observar que de acordo com a disposição psicológica do doente as limi tações impostas por sintomas organicamente determinados podem ser incrementadas num caso e abrandadas em outros Talvez esse seja um ponto de partida para entender a 219 impressão frequente de quem trabalha com Cuidados Paliativos de que dentro de certos limites os pacientes escolhem a hora de sua morte A ideia de dor total reconhece en tão que não há um organismo biológico independente dos estados psíquicos Do ponto de vista da teoria psicanalítica a doença e todo o contexto que a envolve serão inevitavelmente interpretados pelo doente à luz de seu discurso isto é de seu sistema de afetos e crenças conscientes e inconscientes Considerando isso uma das atuações possíveis do psicólogo é a escuta clínica ao paciente a fim de ajudálo a reconhecer e transformar a forma de olhar que traz prejuízo e sofrimento Para tanto o ideal é que o acompanhamento psicológico se inicie o mais precocemente possível algo aliás que se ajusta aos princípios preconizados para o bom tratamento paliativo Lembremos que o atendimento em Cuidados Paliativos se dá em diferentes regimes enfermaria ambulatório hospedaria hospice interconsulta e visita domiciliar Assim é possível considerar que há casos em que o doente pode ser acompanhado pela equipe ao longo de muitos anos Vale mencionar que nem sempre há condições para que se realize o atendimento clinicopsicológico strictu senso com o doente seja pela existência de restrições físicas muito severas falta de demanda por esse tipo de intervenção ou qualquer outra con tingência Isso entretanto não necessariamente representa um limite para a ação do psicólogo É possível criar outros dispositivos de trabalho mais adequados à situação que se lhe apresenta O registro de narrativas ligadas à história de vida por exemplo cria um espaço de interlocução e confiança entre o doente e o psicólogo que pode propiciar o reconhecimento de que o primeiro tem ainda um papel social a desempenhar lembrar e contar A narrativa de episódios afetivamente relevantes para o paciente pode ajudar na reorganização de uma autoimagem vilipendiada pela doença pela internação hospitalar e pela proximidade da morte constituindose num modo indireto de elaboração da ex periência do morrer Atenção à família A experiência indica que a qualidade da relação entre o doente e seus cuidadores pode ser benéfica ou interferir negativamente nos processos de adoecimento morte e luto É por esse motivo que em Cuidados Paliativos a atenção à família do doente é outro aspecto norteador das ações da equipe Notese que a atenção à família requer do psicólogo a ca pacidade de manejar situações grupais Algumas vezes em nome de poupar o doente a família pode restringir e falsear a comu nicação acerca do diagnóstico e de suas perspectivas de tratamento algo que em Cuidados Paliativos é conhecido como conspiração de silêncio expressão que vem sendo revista devido à forte carga culpabilizadora contida na palavra conspiração Pois se por um lado oferecer informações ao paciente é importante por outro levar em conta os temores da fa mília de que tal comunicação seja feita é igualmente relevante Nesses casos é comum que a família fique ameaçada pela irrupção dessa temática e obstrua o canal de comunicação entre o médico e o doente Esse último por sua vez entrevê burburinhos além é claro de perceber as modificações em seu corpo e desempenho físico Mas fica só e restrito em suas possibilidades de tornar assimiláveis as experiências pelas quais está passando É por isso que o psicólogo estimula doente e família a pensar e falar livremente sobre sua situação Desse modo procura legitimar seu sofrimento e contribuir para a elabora ção das experiências de adoecimento processo de morte e luto 220 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Atenção à equipe Para identificar possíveis demandas de trabalho junto à equipe é fundamental que o psicólogo mantenha canais de comunicação formalizados eou informais sempre aber tos com os diferentes profissionais em interação no serviço auxiliares de enfermagem médicos enfermeiros assistente social capelão etc A prática permite identificar por exemplo a recorrência de algumas circunstâncias em que a intervenção do psicólogo é solicitada pela equipe o doente eou a família são agressivos não seguem as recomendações que lhes são feitas burlam as regras do servi ço acusam culpam negam a gravidade do estado de saúde do doente etc São situações que representam importante fonte de estresse para a equipe e que podem estar ligadas àquilo que em Cuidados Paliativos costuma ser chamado de síndrome de Burnout Cabe ao psicólogo ajudálos a compreender tais condutas como expressões do sofrimento do doente eou da família oferecendo um espaço de escuta em que os aspectos psíquicos da relação com o paciente e a família possam ser acolhidos e elaborados para uma meto dologia interessante de intervenção junto à equipe ver o modelo do Grupo Balint Desse modo diminuemse as possibilidades de que a equipe se coloque em posição de contra ataque sempre desfavorável ao cuidar Conclusão A experiência com situações de adoecimento e morte pode dependendo do contexto em que se dá ser favorecedora da aceitação de nossos limites ou ser importante fonte geradora de angústia e isso vale não só para o doente ou a família mas também para os profissionais incluído o psicólogo Trabalhando em Cuidados Paliativos o psicólogo poderá sentirse impelido a retro ceder entendendo que não há o que ele possa oferecer Em outros casos poderá desejar ocupar a posição de um protetor que restaura as seguranças perdidas Mas a situação ideal é aquela em que ele cria sentidos para a prática dentro dos limites e possibilidades de seu campo de conhecimento Nesse sentido a participação em espaços de interlocução sobre questões ligadas à atuação supervisão grupos de estudo psicoterapia publicações congressos etc pode ser ferramenta valiosa para que faça de seu trabalho em Cuidados Paliativos uma expe riência de crescimento pessoal e profissional Referências 1 GOLDGRUB F W O neurônio tagarela São Paulo Samizdat 2008 2 HATANAKA V M A Medicina paliativa conceito e filosofia No prelo 3 KÓVACS M J Educação para a morte temas e reflexões São Paulo Casa do Psicólogo FAPESP 2003 4 LABAKI M E P Morte São Paulo Casa do Psicólogo 2001 5 MACIEL M G Ética e cuidados paliativos na abordagem de doenças terminais A Terceira Idade n 38 6 MORETO M L T O que pode um analista no hospital São Paulo Casa do Psicólogo 2001 7 ROMANO B W org A prática da psicologia nos hospitais São Paulo Pioneira Thomson 2002 8 WORLD HEALTH ORGANIZATION Better palliative care for older people Geneva WHO 2004 Disponível em httpwwweurowhointdocumente82933pdf 221 Papel do assistente social na equipe de Cuidados Paliativos letíCiA AndrAde Introdução Em nosso entender cuidar paliativamente de alguém seja em hospitais ambulatório e enfermaria ou em domicílio requer prioritariamente um trabalho interdisciplinar que prima pela complementação dos saberes partilha de responsabilidades tarefas e cuidados e negação da simples sobreposição entre as áreas envolvidas O reconhecimento de que o cuidado ade quado requer o entendimento do homem como ser integral cujas demandas são diferenciadas específicas e que podem e devem ser solucionadas conjuntamente oferece às diferentes áreas do conhecimento oportunidade e necessidade de se perceberem incompletas A percepção das necessidades múltiplas do indivíduo em Cuidados Paliativos e a certeza de que somente uma área não oferecerá respostas necessárias fazem crescer e se consolidar a busca inegável por um trabalho efetivamente em equipe interdisciplinar3 4 Por isso o papel do assistente social nas equipes de atenção em Cuidados Paliativos orientase pela atuação junto a paciente familiares rede de suporte social instituição na qual o serviço encontrase organizado e diferentes áreas atuantes na equipe Em todas as instâncias o conhecimento prévio em consonância com uma proposta de ação adequada resultará em resultado satisfatório para todos os envolvidos na questão Paciente família e rede de suporte social No que se refere à perspectiva social buscase primeiramente conhecer família pa ciente e cuidadores É necessário traçar um perfil socioeconômico com informações que serão fundamentais na condução do caso Assim é importante reconhecer a família com quem manteremos contato como ela exatamente é família real e não como gostaríamos que fosse família ideal2 Nem sempre os vínculos foram formados de maneira satisfa tória nem sempre aquele que está morrendo é amado por todos nem sempre a família tem condições adequadas de cuidar financeiras emocionais eou organizacionais e nem sempre o paciente quer ser cuidado de forma segundo nossa avaliação necessária e ideal Conhecer e compreender essa família em seus limites e possibilidades é o primeiro passo para um atendimento adequado para tanto a escuta e o acolhimento são ações impres cindíveis assim como o reconhecimento do momento adequado para a abordagem Não ouviremos tudo em uma primeira entrevista e não perceberemos muito em uma primeira abordagem Por isso é fundamental que o profissional do serviço social saiba a maneira e o tempo certos de colher informações ou o momento adequado de só ouvir e acolher Com relação à avaliação socioeconômica algumas informações são fundamentais e devem ser obtidas na primeira abordagem composição familiar local de moradia renda religião formação profissão e situação empregatícia do paciente 222 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Esses dados embasarão o atendimento social pois nos darão parâmetros adequados sobre as necessidades vividas pelas famílias ou nos mostrarão seus mecanismos de enfre tamento dos limites e dessa forma podemos apontar um esquema composição familiar com quem o paciente reside e com quem poderá ou não contar no que se refere aos cuidados se a família é extensa nuclear ou monoparental5 e se tem outros indivíduos no mesmo núcleo familiar que demandam cuidados específicos crianças idosos dependentes ou outros doentes Esses dados nos oferecerão subsídios para auxiliar a família na busca de alternativas quando o cuidado não for suficiente para as necessidades do paciente local de moradia item também relacionado com a possibilidade de entendimento sobre a rede de suporte social Dependendo do local onde o indivíduo reside é necessário per ceber a precariedade ou suficiência das redes de suporte social assim como a facilidade ou dificuldade de comparecer às consultas ou demais procedimentos A ciência dessas dificuldades ou facilidades possibilita ao assistente social viabilizar e encaminhar ade quadamente para recursos da região providenciar a solicitação de transporte de outras instituições ou buscar assistência domiciliar da própria instituição ou do bairromunicípio onde o paciente reside conforme o grau de dificuldades apresentado pela família em comparecer aos retornos agendados ou em oferecer a atenção solicitada formação profissão e situação empregatícia do paciente essas informações são fundamen tais principalmente quando o paciente é o mantenedor da família A orientação e o encami nhamento adequados da questão oferecerão a garantia de sustento para o núcleo familiar renda familiar estreitamente relacionada com o item anterior embora nem sempre obtendo a importância devida na análise deve sempre ser conhecida para que a equipe tenha parâmetros reais para futuras solicitações Exigências além do que a família pode arcar relacionadas especificamente com custos costumam inviabilizar a atenção ao pa ciente e gerar situações de estresse desnecessários para os envolvidos religião aspecto cultural importantíssimo na avaliação social do paciente em Cuidados Paliativos A religião da família e do paciente traz subsídios para abordagens adequadas sobre morte cuidados ao final da vida rituais e diferentes necessidades relacionadas com crenças e significados pessoais Isso deve ser conhecido e compartilhado com a equipe para que na medida do possível os cuidados ao final da vida sejam ajustados ao que é significativo e simbólico para família e paciente rede de suporte social relacionase com entidades instituições grupos formais serviços ou pessoas parentes amigos vizinhos com que o paciente e seus familiares podem contar em casos de necessidade As redes de suporte são tão mais suficientes e eficazes quanto maior disponibilidade e segurança oferecem aos indivíduos que a elas recorrem tal efetividade não se relaciona com a renda dos envolvidos mas sim com vínculos estabelecidos e fortalecidos no decorrer do tempo1 Algumas instituições religiosas oferecem redes mais organizadas e eficazes principalmente em situações de doença ou fragilidade de seus membros Instituição Aqui nos referimos especificamente a cada instituição onde está vinculado o serviço de atenção em Cuidado Paliativo Faz parte da proposta de trabalho do assistente social Informações detalhadas e atualizadas direitos e formas de acesso constantes da parte 6 deste manual 223 conhecer a fundo a instituição na qual realiza sua ação Esse conhecimento oferecerá condições para o profissional se inteirar dos serviços disponíveis e dos canais de en caminhamento da clientela É necessário que o assistente social saiba criar a sua rede intrainstitucional no intuito de bem atender aos pacientes e na certeza de que um único serviço também não é capaz de solucionar todas as demandas dos que necessitam de cuidado mesmo estando esse inserido em uma grande instituição Conhecer as interfaces estabelecer parcerias saber os fluxos adequados de encaminhamento e agilizar a inserção do paciente nos serviços também é parte da atuação do assistente social nos grupos de Cuidados Paliativos Atuação junto à equipe É específico do assistente social o conhecimento e a abordagem sobre a realidade socioeconômica da família bem como sobre os aspectos culturais que compõem esse universo Assim a decodificação dessa realidade para a equipe de trabalho constituise em uma de suas principais atribuições Esse profissional tornase o interlocutor entre pacientefamília e equipe nas questões apontadas que são fundamentais para se alcançar os objetivos almejados em Cuidados Paliativos morte digna e cuidado aos que ficam Conclusão A atuação do assistente social em equipes de atenção paliativa pode ser resumida em conhecer paciente família e cuidadores nos aspectos socioeconômicos visando ao ofere cimento de informações e orientações legais burocráticas e de direitos imprescindíveis para o bom andamento do cuidado ao paciente e para a garantia de morte digna Cabe também a esse profissional avaliar a rede de suporte social dos envolvidos para junto a eles acionála em situações apropriadas conhecer e estabelecer uma rede intrainstitucio nal no intuito de garantir atendimento preciso ao paciente além de constituirse como interlocutor entre pacientefamília e equipe nas questões relacionadas com aspectos cul turais e sociais que envolvem o cuidado de forma geral Somase a isso a importância da escuta e da acolhida no momento tão especial que é o do enfrentamento de uma doença incurável e em fase final de vida Referências 1 BIFFI R G MAMEDE M V Suporte social na reabilitação da mulher mastectomizada o papel do parceiro sexual Rev Escola de Enfermagem USPEDUSP n 38 p 2629 2004 2 CARVALHO M C B Org A família contemporânea em debate São Paulo CortezEDUC 1995 3 JAPIASSU H Interdisciplinaridade e patologia do saber Rio de Janeiro Imago 1976 4 MARTINELLI M L et al Orgs O uno e o múltiplo nas relações entre as áreas do saber São Paulo Cortez EDUC 1995 5 VITALE M A F Famílias monoparentais indagações Rev Serviço Social Sociedade ano XXIII São Paulo Cortez n 71 p 4562 2002 224 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do farmacêutico clínico na equipe de Cuidados Paliativos solAnGe briColA O farmacêutico clínico conjuntamente com a equipe interdisciplinar busca trazer alívio e conforto voltados às demandas do tratamento farmacológico ao paciente sob Cuidados Paliativos A assistência farmacêutica em Cuidados Paliativos está principalmente focada em in formar sobre as disponibilidades dos medicamentos aos demais membros da equipe com relação às possibilidades farmacotécnicas e aos aspectos legais bem como aos pacientes e familiares quanto ao uso e ao armazenamento corretos dos medicamentos A terapêutica farmacológica deve ser monitorada de maneira preventiva com rela ção aos problemas relacionados com os medicamentos PRMs e por fim implementar a farmacoterapia por meio das preparações magistrais viabilizando a utilização de alguns medicamentos indisponíveis no mercado comercial O tratamento farmacológico do paciente em Cuidados Paliativos representa um braço das ações possíveis e indicadas em sinergia com outras medidas nãofarmacológicas atu ando conjuntamente com os esforços de todos os profissionais envolvidos com o trabalho referente aos cuidados no final da vida A necessidade da utilização dos medicamentos está fundamentalmente pautada no sofrimento físico dos doentes em decorrência da progressão da doença manifestada atra vés de distintas caracterizações da dor física levando ao comprometimento social emo cional e sobretudo limitando o indivíduo no exercício de suas atividades O uso de opioides constituise um instrumento de alívio e conforto aos pacientes nessa fase mas por vezes encontra barreiras com relação aos mitos que acometem profis sionais desde prescrição dispensação e administração até dúvidas que povoam paciente e família Atualmente os mitos referentes à morfina principalmente estão mais esclarecidos e dissipados no cenário brasileiro porque a informação com relação à necessidade do uso de horário e não de demanda bem como o esclarecimento com relação ao fato de que morfina não abrevia a vida não causa dependência física nem psíquica aos nossos pacientes vêm sendo trabalhados inclusive pelo profissional farmacêutico no ato da dispensação As classes terapêuticas envolvidas no tratamento da dor e dos sintomas em Cui dados Paliativos são diversas e os recursos medicamentosos estão disponíveis na rede pública pela da assistência farmacêutica em um programa denominado Medicamen tos Excepcionais O Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional PMDCE é uma das estratégias do Ministério da Saúde MS para efetivar o acesso da população brasileira a medicamentos e assistência farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde SUS na rede pública Apesar dos esforços públicos de liberação dos medicamentos imprescindíveis ao 225 tratamento da dor do câncer não encontramos ações condizentes com gravidade e necessidade dos pacientes que padecem com dor e demais sintomas Exemplos diários da penetração da farmacotécnica magistral nos cuidados mi nistrados a pacientes em fase final de vida não faltam Assim diante da angústia da equipe de saúde a fim de atender os pacientes que por exemplo utilizam uma sonda nasoenteral ou tenham perdido a via de acesso oral para uso dos medicamentos ou os que apresentem rebaixamento do nível de consciência resgatamos a prática de fazer segundo a arte FSA por meio da farmacotécnica artesanal Nos pacientes oncológicos com doença avançada a dor será experimentada em aproximadamente 60 a 90 e o alívio da dor é possível em aproximadamente 80 dos casos adotandose o princípio básico de administrar os medicamentos de acordo com a escada analgésica da Organização Mundial da Saúde OMS Recomendações peculiares como preferencialmente administrar os medicamen tos por via oral VO seguindo rigorosamente os intervalos entre as doses e particu larizando os medicamentos às necessidades individuais dos pacientes são premissas que norteiam a informação na elaboração do esquema terapêutico Para a promoção da adesão nos valemos de um instrumento denominado Tabela de Orientação Farmacêutica na qual são dispostos os medicamentos ao longo do dia respei tando as meiasvidas plasmáticas dos fármacos bem como hábitos de vida de paciente e familiares além de atuar de maneira próativa com relação ao risco de ocorrência de interações medicamentosas e reações adversas Quadro A complexidade de atenção aos pacientes em Cuidados Paliativos implica a organiza ção de uma equipe interdisciplinar alinhada e convergente a atender às necessidades do paciente e da família visando à qualidade de vida e à dignidade no processo da morte Cicely Saunders precursora da filosofia de Cuidados Paliativos sabiamente nos dei xou a seguinte mensagem Não se preocupar em proporcionar mais dias de vida e sim mais vida aos dias que se tem Referências 1 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO CÂNCER Cuidados paliativos Disponível em httpwwwabcancerorgbrsobrephpc8s59lang16 Acesso em 02 jun 2009 2 CORRER C J et al Riscos de problemas relacionados com medicamentos em pacientes de uma instituição geriátrica Revista Brasileira de Ciências Farmacêuticas 2007 v 43 n 1 3 LEE J MCPHERSON M L Outcomes of recommendations by hospice pharmacists American journal of healthsystem pharmacy 2006 v 63 p 22359 4 LYNN J ADAMSON D White paper Living well at the end of life Adapting health care to serious chronic illness in old age Santa Monica Rand Health 2003 5 PAIN IN PALLIATIVE CARE A REVIEW The Pharmaceutical Journal v 278 p 67982 2007 Disponível em httpwwwpjonlinecompdfcpdpj20070609palliativecare01pdf Acesso em 30 abr 2009 6 WORLD HEALTH ORGANIZATION WHO Definition of palliative care 2002 Disponível em http wwwwhointcancerpalliativedefinitionen Acesso em 30 jun 2009 226 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro Tabela de orientação farmacêutica Ambulatório de Cuidados Paliativos Como usar o seu medicamento WCA RGHC XXXXXXX Hora Quantidadeágua Café da manhã 6 h Omeprazol 2 mgml 10 ml 6 h Clorpromazina 4 5 gotas 6 h Morfina 1 mggota 15 gotas 6 h Escopolamina dipirona gotas 40 gotas Manhã 10 h Saliva artificial Instilar um contagotas em cada lado da boca 10 h Dexametasona 05 mg5 ml 20 ml 10 h Morfina 1 mggota 15 gotas 10 h PEG 250 ml Almoço 12 h Escopolamina dipirona gotas 40 gotas Tarde 14 h Morfina 1 mggota 15 gotas 14 h Clorpromazina 4 5 gotas 18 h Escopolamina dipirona gotas 40 gotas 18 h Morfina 1 mggota 15 gotas Ao deitar 22 h Escopolamina dipirona gotas 40 gotas 22 h Morfina 1 mggota 30 gotas 22 h Clorpromazina 4 5 gotas 22 h PEG 250 ml 22 h Saliva artificial Instilar um contagotas em cada lado da boca PEG diluir um envelope em um litro de água e ingerir 250 ml a cada horário Traga esta tabela em todo retorno médico Data 31012007 Farmacêutica responsável Dra Solange Brícola 227 Papel da nutricionista na equipe de Cuidados Paliativos AndréA Gislene do nAsCimento O ato de se alimentar é muito mais que um processo de fornecer calorias e nutrientes aos indivíduos está diretamente relacionado com os aspectos emocionais socioculturais religiosos e as experiências vividas ao longo da vida Os pacientes sob Cuidados Paliativos possuem menos apetite consomem os alimentos em menor quantidade têm menos sede e muitas vezes acabam recusando a alimentação em função de sintomas como dor náuseas vômitos obstipação diarreia entre outros Além disso sofrem perda do paladar e têm os processos de deglutição digestão absorção e excreção alterados Por esses motivos a família se preocupa pois o indivíduo começa a recusar os alimentos Devido à baixa ingestão de alimentos os pacientes podem apresentar perda de peso depleção dos tecidos magro e adiposo e síndrome anorexiacaquexia3 É muito difícil para os familiares entenderem que o doente está morrendo em função da doença de base e não pela falta de alimentação e hidratação Os objetivos do tratamento de vem ser a promoção da qualidade de vida o alívio do sofrimento e a minimização do estresse É fundamental que os desejos e as necessidades do paciente sejam atendidos Na nutrição em Cuidados Paliativos é importante respeitar os princípios da bioética dando autonomia ao indivíduo no que se refere a liberação suspensão ou nãoindicação da alimentação por via oral VO ou alternativa sonda ou ostomia evitandose muitas vezes o tratamento fútil e consequentemente reduzindo o seu sofrimento7 Segundo a American Dietic Association ADA a nutrição em Cuidados Paliativos deve oferecer conforto emocional prazer auxiliar na diminuição da ansiedade no aumento da autoestima e da independência permitir uma maior integridade e melhor comunicação com os seus familiares1 O nutricionista dentro de uma unidade de Cuidados Paliativos deve conhecer o prognóstico da doença e a expectativa de vida do indivíduo quais os sintomas apre sentados o grau de reversibilidade da desnutrição e dentro desses aspectos junto com paciente familiar e equipe discutir qual terapia nutricional é mais indicada avaliando os riscos e benefícios Antes de indicar a terapia o nutricionista deve realizar uma avaliação nutricional por meio de medidas antropométricas e exames clínicos e bioquímicos conhecer hábito alimentar preferências aversões alimentares e aspectos psicossociais relacionados com a alimentação do paciente para posteriormente realizar os diagnósticos nutricionais e estabelecer quais serão as condutas adotadas O objetivo da terapia nutricional vai variar de acordo com a fase de progressão da doença fase inicial manter ou recuperar o estado nutricional e evitar a progressão da doença fase terminal promover sensação de bemestar e conforto qualidade de vida e alívio dos sintomas9 228 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP A via de alimentação fisiológica é oral e sempre que possível deve ser privilegiada Caso o paciente não tenha condições de se alimentar por VO é necessário utilizar uma via alternativa de alimentação podendo ser por meio de sonda ou ostomia O importante é que o doente mantenha vínculo com o alimento aliviando os sintomas de fome e ansie dade e melhorando a qualidade de vida É muito importante que o paciente tenha suporte psicológico nessa fase7 Antes de indicar a via de alimentação o nutricionista precisa avaliar alguns aspectos como capacidade do indivíduo em se alimentar grau de desconforto causado tanto pela doença como pelo ato de se alimentar nível de consciência do paciente presença de dor e disfagia preferências e aversões alimentares do paciente adaptação da alimentação com relação a consistência temperatura e horários Dicas de nutrição em cuidados paliativos os pacientes devem consumir os alimentos de sua preferência e comer quando sentem vontade respeitar os desejos do indivíduo como não comer comer menos ou recusar a nu trição enteral ou parenteral dar tempo adequado para o paciente comer respeitando seu ritmo de ingestão oferecer alimentos em pequenas quantidades ouvir o paciente quanto à presença de sintomas relacionados com alimentação mudar a rotina alimentar oferecendo os alimentos quando o paciente estiver menos fatigado nauseado ou com menos dor combinar métodos diferentes de alimentação dieta oral e enteral dar preferência à VO oferecer utensílios adequados para facilitar a alimentação como colher copo ca nudo etc dar preferência a pratos coloridos e atraentes oferecer suplementos nutricionais na forma de mousse milk shake sopa etc junto com as preparações prestar atenção nos aspectos psicossociais que podem interferir na alimentação2 4 5 8 O nutricionista precisa ouvir o paciente respeitar seus desejos e suas necessidades no que se refere à alimentação respeitando a sua autonomia O mais importante é pro porcionar diminuição do seu sofrimento alívio dos sintomas e promover uma melhor qualidade de vida Referências 1 AMERICAN DIETITIC ASSOCIATION Position of the american dietitic association issues in feeding the terminally ill adult J Am Diet Assoc v 2 n 8 p 9961002 1992 2 CARVALHO R T TAQUEMORI L Y Nutrição e hidratação In OLIVEIRA R A coord Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 22157 3 CORRÊA P SHIBUYA E Administração da terapia nutricional em cuidados paliativos Rev Bras Cancerologia v 53 n 3 p 31723 2007 4 MACIEL M G S Definições e princípios In OLIVEIRA R A coord Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 1532 229 5 MELO D A Nutrição In OLIVEIRA R A coord Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 812 6 SHIBUYA E Cuidados paliativos em oncologia pediátrica Aspectos Nutricionais Disponível em httpwwwcuidadospaliativoscombrartigophpcdTexto307 Acesso em 17 jan 2008 7 SOCHACKI M et al A dor de não mais alimentar Rev Bras Nutr Clin v 23 n 1 p 7880 2008 8 TAQUEMORI L Y SERA C T N Interface intrínseca equipe multiprofissional In OLIVEIRA R A coord Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 557 9 VOGELZANG J L Quality endoflife care where does nutrition fit Home Health Nurse v 19 n 2 p1102 2001 230 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do fisioterapeuta na equipe de Cuidados Paliativos biAnCA Azoubel de AndrAde CelisA tiemi nAKAGAwA serA sAmirA AlenCAr YAsuKAwA A fisioterapia é uma ciência aplicada cujo objeto principal de estudo é o movi mento humano World Confederation for Physical Therapy WCPT Como processo terapêutico a fisioterapia lança mão de seus conhecimentos e recursos próprios com os quais considerando as condições sociais psíquicas e físicas iniciais do cliente busca promover aperfeiçoar ou adaptar principalmente as condições físicas do indivíduo numa relação terapêutica que envolve paciente terapeuta e recursos físicos e natu rais Quando falamos em Cuidado Paliativo é imprescindível a inclusão da família do seu meio ambiente e seus entornos social e espiritual nessa relação terapêutica O fisioterapeuta a partir de sua avaliação vai estabelecer um programa de tra tamento adequado com utilização de recursos técnicas e exercícios objetivando por meio de abordagem multiprofissional e interdisciplinar alívio de sofrimento dor e outros sintomas estressantes além de oferecer suporte para que os pacientes vivam o mais ativamente possível com impacto sobre a qualidade de vida com dignidade e conforto além de oferecer suporte para ajudar os familiares na assistência ao pa ciente no enfrentamento da doença e no luto Vale salientar a importância da multidisciplinaridade e da interdisciplinaridade diante das necessidades do paciente sob Cuidado Paliativo considerando que sintomas como dor e dispneia podem apresentar características complexas e incapacitantes e o sucesso terapêutico requer múltiplos esforços para a obtenção de bons resultados O programa de tratamento deve ser elaborado de acordo com os graus de depen dência e progressão do paciente Perracini8 divide o foco de atuação do fisioterapeu ta de acordo com a funcionalidade do paciente Pacientes totalmente dependentes Objetivos manter a amplitude de movimento aquisição de posturas confortá veis favorecendo respiração e outras funções fisiológicas propiciar a higienização e evitar complicações como úlceras por pressão edema em membros e dor Posicionamento e orientação quanto às mudanças de decúbito e transferências cama cadeira de rodas poltrona cadeira de banho mobilização global do paciente e orientação ao cuidador além de orientação postural prevenção do imobilismo e de suas consequências Prevenção quanto à instala ção de deformidades identificação dos meios de locomoção do paciente e promoção de mudanças ambientais necessárias e possíveis 231 priorização das condições ventilatórias do indivíduo por meio de treino e orientação de exercícios respiratórios manobras que favoreçam a retirada de secreções quando ne cessário assim como orientações quanto à aspiração traqueal e ao estímulo de tosse Pacientes dependentes porém com capacidade de deambulação Objetivo manutenção de suas capacidades de locomoção autocuidado e funcio nalidade Mudanças de decúbito com orientações quanto às transferências e posturas ado tadas adaptação a perdas funcionais com novas estratégias de movimentos facilitação e indicação de dispositivos de auxílio à marcha órteses e calçados ade quados treino de marcha em casa e em ambientes externos Adequação ambiental favore cendo fixação e aquisição de novos padrões motores mobilização global adequada de acordo com as condições clínicas exercícios de coordenação motora e equilíbrio exercícios respiratórios e treino de tosse Pacientes independentes porém vulneráveis Objetivo manutenção ou melhora de sua capacidade funcional Potencialização de mecanismos protetores como proteção mioarticular e faci litação de ganhos motores Monitoramento de déficits potenciais para perdas fun cionais como déficits sensoriais musculares e articulares treinos de marcha coordenação e equilíbrio Orientação postural cinesioterapia para ganhos de amplitude articular força e elasticidade nos movimentos de acordo com as condições clínicas Cinesioterapia respiratória treino em ambientes com demandas de requisitos motores compatíveis com a complexidade de tarefas que desempenham no seu diaadia melhoramanutenção de seu condicionamento físico tolerância aos esforços físicos adaptação de dispositivos de auxílio à marcha Identificação e eliminação de fatores de risco para quedas encaminhamento para centros de reabilitação ou ambulatórios de fisioterapia No controle da dor o fisioterapeuta pode utilizar terapias manuais eletroterapia como o Transcutaneous Electrical Nerve Stimulation TENS associado ou não a fármacos biofeedback termoterapia frio e calor exercícios e mobilizações posi cionamentos adequados e técnicas de relaxamento2 9 A massoterapia pode ser utilizada com o objetivo de induzir o relaxamento muscular e o alívio da dor reduzir o estresse os níveis de ansiedade e parte dos efeitos colaterais provoca dos pela medicação como náuseas e vômitos9 O benefício final é a melhora das qualidades de sono e vida A massagem além de sua indicação na melhora da dor é um recurso tera pêutico utilizado na intensificação do relacionamento favorece maior resistência contra as doenças estimula digestão e eliminação de gases e diminui cólicas devido ao relaxamento do trato gastrointestinal além de estimular respiração e circulação7 Em presença de dispneia ou desconforto respiratório utilizar técnicas que favoreçam a manutenção de vias aéreas pérvias e ventilação adequada além de relaxamento dos 232 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP músculos acessórios da respiração diminuindo o trabalho respiratório sempre que possí vel Associar a cinesioterapia respiratória à mobilização e ao alongamento dos músculos da caixa torácica com melhora de sua complacência em posturas adequadas que faci litem a ação dos músculos respiratórios por ex decúbito elevado favorecendo a ação do diafragma e até mesmo o uso de incentivadores respiratórios estimulando tanto a inspiração quanto a expiração e ventilação nãoinvasiva como auxiliares para melhora ventilatória10 O paciente pediátrico Ao prestar assistência ao paciente pediátrico devemos lembrar que além de pos suir características diferentes dos adultos a criança ainda se encontra em processos de aprendizagem e amadurecimentos físico emocional cognitivo social e espiritual o que influencia o surgimento de sintomas multidimensionais Muitas crianças são restringidas desnecessariamente ainda que sejam capazes de maiores graus de atividade e independência6 Elas são afastadas da convivência com outras crianças da mesma idade seja no ambiente escolar domiciliar ou social As mudanças de rotina e a inatividade refletem em suas condições musculoesquelé ticas É importante manter um mínimo de movimentação que evite o agravamento de sintomas desagradáveis como dor fraqueza falta de ar e indisposição1 gerando imobilismo acúmulo de secreção e tosse ineficaz A avaliação de sintomas é o primeiro passo para que se desenvolva um planeja mento terapêutico Há escalas bem descritas na literatura para avaliação de dor em pediatria que são adequadas para diferentes idades e níveis de compreensão Porém para os outros sintomas a avaliação é mais complexa sendo ainda mais difícil no caso de crianças préverbais e com atraso de desenvolvimento4 Antes da escolha de qualquer recurso é obrigatória a avaliação criteriosa das necessidades específicas de cada criança considerando faixa etária desenvolvimen to neuropsicomotor e condição clínica Permitir quando possível que a criança ou o adolescente participe da escolha da terapêutica adequada e que lhe pareça mais prazerosa fortalecerá sua autonomia O ato de brincar é um instrumento que fornece a experiência necessária para que a criança se desenvolva em todos os aspectos A utilização do lúdico como recurso terapêutico permite que a criança com deficiência tenha liberdade para criar diversas situações e realizar movimentos inesperados5 minimizando fatores estressantes A participação de familiares nos atendimentos deve ficar preferencialmente a critério da criança ou do adolescente Contudo devese incentivar a participação de membros da família nas atividades propostas nos cuidados e nas orientações favore cendo a convivência entre si e aproximandoos dos profissionais da equipe A assistência ao adolescente implica um grande desafio para a equipe de Cuidados Paliativos O grande foco nesse grupo deve ser a aquisição de sua máxima autonomia um processo que deve ter início o mais precocemente possível Se esse objetivo for alcançado até a terminalidade a equipe terá contribuído de forma importante na vida desse jovem3 É papel do fisioterapeuta instituir um plano de assistência que ajude o paciente a se desenvolver o mais ativamente possível facilitando a adaptação ao progressivo 233 desgaste físico e às suas implicações emocionais sociais e espirituais até a chegada de sua morte Referências 1 DALLANESE A P M SCHULTZ K Equipe interdisciplinar fisioterapia In CAMARGO B KURASHI MA A Y Cuidados paliativos em oncologia pediátrica o cuidar além do curar São Paulo Lemar 2007 p 619 2 DOYLE L MCCLURE J FISHER S The contribution of physiotherapy to palliative medicine In DOYLE D HANKS G CHERNY N CALMAN K Oxford Textbook of Palliative Medicine 3 ed Oxford University Press 2005 cap 15 p 10506 3 FREYER D R Care of the dying adolescent special considerations Pediatrics v 113 n 2 p 3818 2004 4 GOLDMAN A ABC of palliative care special problems of children BMJ v 316 p 4952 1998 5 LORENZINI M V Brincando a brincadeira com a criança deficiente novos rumos terapêuticos São Paulo Manole 2002 6 MARCUCCI F C I O papel da fisioterapia nos cuidados paliativos a pacientes com câncer Revista Brasileira de Cancerologia v 51 n 1 p 6777 2005 7 NIELSEN A L A massagem do bebê São Paulo Manole 1989 8 PERRACINI M R A interprofissionalidade e o contexto familiar o papel do fisioterapeuta In DUARTE Y A O DIOGO M J D Atendimento domiciliar um enfoque gerontológico Ed Atheneu 2000 cap 10 p 11743 9 SAMPAIO L R MOURA C V RESENDE M A Recursos fisioterapêuticos no controle da dor onco lógica Rev Bras Cancerologia v 51 n 4 p 33946 2005 10 SERA C T N MEIRELES M H C Sintomas respiratórios In Cuidado Paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 40921 234 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Papel do fonoaudiólogo na equipe de Cuidados Paliativos AdriAnA ColombAni Pinto Dentro da medicina paliativa os cuidados oferecidos são em geral para pacientes com câncer avançado e AIDS Entretanto essa atuação está se expandido para pacientes com doenças crônicas progressivas e neurodegenerativas como esclerose lateral amiotró fica mal de Parkinson doença de Alzheimer e outras demências A partir disso podemos perguntar Qual deve ser a conduta mais adequada para aque le paciente com tantas necessidades Até onde se deve ir Quando parar Algumas questões surgem diante desse quadro Qual a via de alimentação mais segu ra Será que o paciente está broncoaspirando Será que a consistência da alimentação é segura para permitir nutrição e hidratação suficientes sem oferecer complicações pulmo nares Quanto o paciente compreende e como se encontra seu nível de consciência Diante dessas perguntas a fonoaudiologia pode contribuir para melhorar a quali dade de vida do paciente e de seus familiares Isso é feito auxiliando o doente a atingir e manter os máximos potenciais físico psicológico social e espiritual sabendose das limitações impostas pela progressão da doença Observase que na fase avançada 60 dos pacientes com câncer apresentam alte rações orais como xerostomia boca seca sendo possível sugerir uso de salivas artificiais dieta baixa em açúcares uso diário de flúor para prevenção de cáries e chicletes sem açú car2 redução da higiene oral estomatites candidíase mucosites ulcerações halitoses alteração de paladar hipersalivação utilizando em muitos casos butilescopolamina gel para diminuir o acúmulo de sialorreia principalmente em laringe Esses sintomas são decorrentes de medicações quimioterapia radioterapia e quadros de imunodepressão Com o tempo podem ocorrer alterações de deglutição disfagia náuseas e vômitos odinofagia anorexia desidratação alteração do nível de consciência e alterações de comunicação7 Esses aspectos estão intimamente vinculados à fonoau diologia seja no início ou no fim da evolução da doença Dessa forma devese atuar garantindo o alívio do sintoma e dando suporte para pa ciente e familiares lembrandose das diretrizes dos Cuidados Paliativos Diante desses sintomas o profissional tem o papel de manter a deglutição segura e possível por via oral VO por meio de adequações de postura manobras garantir con sistência adequada do alimento uso de espessante para líquidos4 oferecendo pequenas quantidades várias vezes mas com qualidade garantindo a apresentação e o tamanho do prato para minimizar a sensação de fracasso em torno da alimentação Quadro 1 Quando a disfagia se intensifica evidenciando alguns sintomas Quadro 2 que tor nam a via oral insegura fazse necessário em muitos casos estabelecer uma via alterna tiva sonda nasoenteral gastrostomia ou jejunostomia É importante lembrar que todas as possibilidades têm o intuito de garantir o alívio dos sintomas aumentando o conforto a qualidade de vida e diminuindo o sofrimento a fim de proporcionar satisfação prazer e segurança para o paciente e seus familiares 235 A comunicação dos pacientes pode apresentarse alterada rebaixamento do nível de consciência efeitos colaterais das medicações alterações de mobilidade e tônus da muscu latura facial déficit de memória nível de atenção reduzido e uso de palavras incoerentes5 dificultando a relação pacienteequipe em muitas tomadas de atitude que são necessaria mente decididas pelo paciente6 Assim cabe ao profissional buscar alternativas de comunicação seja por meio de pranchas de comunicação gestos ou observação de manifestações corporais do paciente na tentativa de garantir na relação equipepacientefamília maior aproximação com paciente e familiares Devese respeitar acima de tudo desejos e autonomia do enfermo dentro do processo da terminalidade3 tentando suprir aflições sentimentos de impotên cia e angústia por parte dos familiares Em suma o processo de atuação deve ser individualizado e vinculado a um planeja mento de cuidados visando maximizar o conforto durante o processo da morte respei tando os desejos do paciente e dos familiares de forma tranquila segura e consensual juntamente com a equipe interdisciplinar Quadro 31 Quadro 1 Deglutição assistida Rotina Pequenas porções Feche os lábios Mastigue Aguarde Engula Aguarde Quadro 2 Avaliação da disfagia Informação fornecida Interpretação possível Paciente inclina a cabeça para baixo durante a deglutição Reflexo de deglutição lento ou fechamento da laringe insuficiente Paciente atira a cabeça para trás durante a deglutição Problema com fase oral da deglutição geralmente devido a problemas de movimentação da língua Dificuldade em iniciar deglutição com sólidos Controle deficiente da língua Dificuldade com líquidos Controle deficiente da língua reflexo de deglutição reduzido ou ausente obstrução severa descoordenação muscular paralisação ou fixação do palato mole Sensação de comida parada globus faríngeos Obstrução o paciente pode localizar precisamente o local obstruído Regurgitação nasal frequente Disfunção palatal Falta de consciência de onde o alimento está durante a deglutição Perda de sensibilidade 236 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 3 Etapas para alimentação segura assistida Etapa 1 Postura Certifiquese de que você está sentado confortavelmente e com a cabeça reta Etapa 2 Relaxe Certifiquese de que você está calmo antes de comer e beber Etapa 3 Não fale Permaneça quieto antes e enquanto come e bebe Etapa 4 Boceje Antes da refeição se sentir a garganta rígida boceje para relaxar Etapa 5 Textura Procure evitar a mistura de sólido com líquido Etapa 6 Programese Não tenha pressa sempre pare a alimentação quando ficar cansado Faça pequenas e regulares refeições e não apenas uma grande Etapa 7 Sentese Permaneça sentado pelo menos meia hora após comer e beber Etapa 8 Ao final Após a refeição beba pequenas doses de água para limpar a boca Tussa para garantir que a garganta está limpa Fonte Oxford Nextbook Textbook of Palliative Medicine Referência 1 CARVALHO R T TAQUEMORI L Y Nutrição e hidratação cuidado paliativo Cremesp p 221 57 2008 2 FORMIGA F et al Xerostomia em el paciente anciano Revista muitidisciplinar de gerontologia v 13 n 1 p 248 2003 3 KOSEKI N M BRUERA E Decisão médica ética em casos de pacientes terminais Revista Brasileira de cancerologia v 42 n 1 p 1529 1996 4 LOGEMANN J A Swallowing problems associated with degenerative disease In Evolution and treatment of swallowing disorderss1se p 32943 1998 5 MAC DONALD A ARMSTRONG L The contribution of speech and language therapy to palliative medicine In DOYLE D et al Oxford textbook palliative medicine 3 ed Oxford UK Oxford University Press 2004 cap 155 section 15 p 105763 6 SALT N DAVIES WILKINSON S The contribution of speech and language therapy to palliative care European Journal of Palliative Care v 6 p 1269 1999 7 WATSON M S Oxford Handbook of palliative care Gastrointestinal symptoms cap 6b p 237 82 2005 237 Papel do terapeuta ocupacional na equipe de Cuidados Paliativos mAriliA bense othero Terapia Ocupacional é um campo de conhecimento e de intervenção em saúde em edu cação e na esfera social que reúne tecnologias orientadas para a emancipação e autonomia de pessoas que por diversas razões ligadas a problemáticas específicas físicas mentais sen soriais sociais apresentam temporária ou definitivamente limitações funcionais eou dificuldades na inserção e participação na vida social Universidade de São Paulo USP De acordo com Ferrari2 é por meio da ação que o indivíduo explora domina e transforma a si e o mundo que o cerca Dessa forma ele se relaciona realizase cria descobre aprende ou seja constrói sua própria história A vida é um grande conjunto de ações e fazeres dependente da história dos sujeitos e de seus meios social e cultural Entretanto a doença e a internação trazem muitas rupturas dor e outros sintomas po dem aparecer e as atividades do cotidiano são interrompidas Limitações também estão presentes e consequentemente o tratamento passa a ocupar grande parte da rotina e das preocupações tanto para os pacientes como para seus familiares Porém mesmo nesse contexto de limitações inerentes ao processo de adoecimento e segundo os princípios dos Cuidados Paliativos3 devese prover um sistema de apoio e ajuda para que o paciente viva tão ativamente quanto possível até sua morte Assim a intervenção em terapia ocupacional é fundamental pois ainda que o co tidiano esteja muito limitado sem a possibilidade de escolhas eou fazeres a vida não pode perder seu sentido Em toda a sua atuação o terapeuta ocupacional busca criar possibilidades de ampliação da autonomia e das possibilidades do fazer compreen dendo as atividades como possibilitadoras de experiências de potência permitindo o resgate de capacidades remanescentes bem como a criação de projetos a serem rea lizados Toda intervenção está voltada para a permanência de atividades significativas no cotidiano do paciente e de sua família O cuidado a famílias e cuidadores é parte integrante e fundamental na assistência terapêutica ocupacional O principal objetivo é orientar o cuidador acerca dos estímulos positivos ao paciente e treinálo para que seja um facilitador da independência nas ati vidades da vida diária AVDs A escuta e o acolhimento a demandas próprias do familiar também têm espaço na intervenção terapêutica ocupacional O Quadro apresenta os principais objetivos da terapia ocupacional descritos de maneira resumida Em sua prática o terapeuta ocupacional tem como recurso terapêutico as ativi dades sejam elas artísticas expressivas manuais de lazer autocuidado entre outras Segundo Castro et al1 elas são recursos que proporcionam a conexão entre o sujeito e seu meio permitindo ampliar o viver e tornálo mais intenso são enriquecedoras permitem reestruturar e integrar diferentes experiências intensificando o sentimento de vida e potência 238 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP É importante ressaltar que na fase final de vida o terapeuta ocupacional acompa nha o paciente há mudança no foco tendo na organização da rotina e na diminuição dos estímulos um modo de propiciar conforto Em alguns casos é possível manter suas atividades significativas a partir de recursos como música e leitura trazendo melhor acolhimento e conforto ao paciente No acompanhamento familiar podese ajudar nas despedidas na expressão de sentimentos e emoções e na abertura de novos canais de comunicação por meio de atividades O acompanhamento pósóbito é parte integrante da assistência terapêutica ocupacional especialmente por ligações telefônicas ou visi tas de luto em conjunto com outras áreas Portanto a atuação em terapia ocupacional nos Cuidados Paliativos é importante possibilitando a construção de brechas de vida potência criação e singularidade em um cotidiano por vezes empobrecido e limitado pela doença A vida não pode perder seus sentido e significado até o último momento e devese promover de fato a digni dade ao paciente fora de possibilidade de cura Somente com um trabalho em equipe é possível oferecer assistência de qualidade de maneira que pacientes e familiares sejam acolhidos e cuidados Referências 1 CASTRO E D LIMA E M F A BRUNELLO M I B Atividades humanas e terapia ocupacional In DE CARLO M M R P BARTALOTTI C C Terapia ocupacional no Brasil Fundamentos e perspectivas São Paulo Plexus 2001 p 4159 2 FERRARI M A C Lazer e ocupação do tempo livre na terceira idade In NETTO M P org Geron tologia A velhice e o envelhecimento em visão globalizada São Paulo Atheneu 2005 p 98105 3 MCCOUCHLAN M A necessidade de cuidados paliativos In PESSINI L BERTACHINI L Humani zação e cuidados paliativos São Paulo Edições Loyola 2004 p 167180 Quadro Terapia ocupacional objetivos em Cuidados Paliativos Manutenção das atividades significativas para o doente e sua família Promoção de estímulos sensoriais e cognitivos para enriquecimento do cotidiano Orientação e realização de medidas de conforto e controle de outros sintomas Adaptação e treino de AVDs para autonomia e independência Criação de possibilidades de comunicação expressão e exercício da criatividade Criação de espaços de convivência e interação pautados nas potencialidades dos sujeitos Apoio escuta e orientação ao familiar eou cuidador AVDs atividades da vida diária 239 Papel do assistente espiritual na equipe de Cuidados Paliativos elenY vAssão de PAulA AitKen A morte alcança todo ser vivente mas nunca estamos preparados para aceitála Criados para a vida alimentamos a esperança de perpetuála Por essa razão é tão difícil lidar com pacientes em processo de morte Mesmo sendo quase uma rotina no hospital nunca nos acostumaremos com ela O sofrimento e a proximidade da morte fazemnos reavaliar a vida enfocando nossas mentes em seus valores essenciais Valeu a pena Qual foi o meu saldo Estou deixando sau dades O que realizei deu sentido à minha vida e à de outros Para onde irei depois da morte Que legado estou deixando Quando Deus é conhecido pessoalmente fazendonos sentir Seu amor misericórdia e graça sendo parte de cada detalhe de nossos dias a vida não acaba com a morte a esperança vai além dignidade qualidade de vida utilidade paz e alegria permanecem até mesmo à sombra da morte Com a introdução do conceito de Cuidados Paliativos princípios claros publicados pela Organização Mundial da Saúde OMS em 1990 e reafirmados em 2002 vieram reger as suas atividades O cuidado espiritual atende a cada um deles ajudando a promover o alívio da dor e de outros sintomas estressantes reafirmando a vida e vendo a morte como processo natural integrando aspectos psicossociais e espirituais ao cuidado oferecendo um sistema de suporte para auxiliar o paciente a viver tão ativamente quanto possível até a morte e amparando a família durante todo o processo da doença Para que haja condições de oferecer este cuidado integral ao enfermo e a sua família tornase muito importante a intervenção do capelão e de sua equipe de capelania também chamados de assistentes espirituais Em 2005 o Comitê das Organizações de Acreditação dos Cuidados em Saúde JCAHO notando que os valores espirituais dos pacientes afetavam a maneira como respondiam ao tratamento incluiu uma norma de acreditação requerendo das instituições de saúde que tra tassem das necessidades espirituais dos doentes Quando se fala sobre religião e espiritualidade podese pensar na religião como associada a comunidades religiosas organizadas artefatos e escrituras com regras e mandamentos ofi ciais treinados cerimônias e dogmas A espiritualidade tende a ser experimentada como algo mais caloroso e espontâneo e está associada a amor inspiração integralidade profundidade e mistério sendo mais de caráter pessoal Crenças religiosas estão relacionadas com melhores saúde e qualidade de vida Estudos científicos1 2 têm identificado uma relação contrária entre depressão e religiosidade Esses estudos afirmam também que ter uma religião eou pertencer a um grupo religioso melhora o suporte social e a saúde física diminuindo os gastos com a enfermidade Para o cuidado inte gral de paciente e sua família tanto uma coisa como a outra são necessárias o atendimento espiritual individual e diário trará ao enfermo e a seus queridos ouvidos atentos condições para reflexões profundas sobre questões existenciais confrontos e desafios quanto a pro pósito de vida perdão acerto de contas vida eterna qualidade e utilidade de vida 240 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Apoiado na fé em Deus e no suporte da comunidade religiosa o paciente experi mentará maior bemestar senso de pertencer ser amado ter dignidade e paz além da certeza de que será acompanhado até o fim de seus dias O fato de saber que sua família continuará recebendo suporte conforto no luto e amparos social emocional e espiritual ajudará o enfermo a ter paz Oferecer o atendimento espiritual como parte do serviço de saúde é permitir ao be neficiado expressar seus sentimentos e emoções conversando abertamente sobre a morte e o morrer e ajudandoo a participar de todas as decisões referentes a seu tratamento e aos desejos finais O Cuidado Paliativo reconhece que as curas espiritual e emocional podem ocorrer mesmo quando a física eou a recuperação se tornam impossíveis Muitas pessoas gra vemente enfermas ou em fase terminal falam sobre terem descoberto uma riqueza e o preenchimento do vazio de sua vida que elas nunca haviam encontrado antes A equipe de saúde também será muito beneficiada ao receber o suporte do capelão em situações de estresse pessoal ou na perda de seus pacientes Mesmo em seu trabalho diário encontrará mais segurança na tomada de decisões em questões de bioética envol vendo dilemas de fim de vida de seus pacientes Referências 1 KOENIG H LEWIS G The healing connection Nashville Word Publishing 2000 2 KOENIG H G MD The healing power of faith New York Touchstone 2001 241 Papel do dentista na equipe de Cuidados Paliativos sumAtrA melo dA CostA PereirA JAles José tAdeu tesseroli de siQueirA Introdução O Cuidado Paliativo em odontologia pode ser definido como o manejo de pacientes com doenças progressivas ou avançadas devido ao comprometimento da cavidade oral pela doença ou seu tratamento direta ou indiretamente Nesses casos o foco do cuidado é melhorar a qualidade de vida8 A condição mais frequente que afeta profundamente as funções orais é o câncer de cabeça e pescoço principalmente em estágios avançados Esse tipo de câncer além de despertar a percepção de morte também traz o risco de sequelas funcionais e estéticas Ademais da dor a autoimagem a socialização e a habilidade de realizar funções rotineiras como mastigar engolir e respirar podem piorar devido ao tumor ou ao seu tratamento7 A despeito dos avanços essa é uma área que carece de atenção de modo a conjugar a necessidade desses doentes por problemas decorrentes do tumor com a possibilida de de doenças odontológicas corriqueiras muitas delas infecciosas que comprometem mais ainda sua precária condição de saúde Figura 1 Nesse cenário a participação do cirurgiãodentista contribui para o diagnóstico e os tratamentos em sua área mas tam bém para a realização de Cuidados Paliativos orais que possam beneficiar esses doentes Orientar doentes e cuidadores e discutir esses aspectos com a equipe multiprofissional ajuda sua integração nesse importante segmento da área da saúde4 XEROSTOMIA Cárie Candidíase Dor Halitose Dor Disfagia Dor Sangramento Sangramento Desnutrição Dor Lesão oral Dor Úlcera Prótese desadaptada Doença periodontal Disgeusia Figura 1 Relação dos problemas mais frequentes que afetam a cavidade oral dos doentes em Cuidados Paliativos 242 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Nem sempre os pacientes se queixam espontaneamente de seus problemas e desconfortos com a boca por acreditarem serem próprios de sua doença principalmente no câncer avança do de boca ou por estarem mental ou fisicamente inaptos a fazêlo Portanto eles devem ser questionados e avaliados regularmente também quanto a tais aspectos de saúde6 Cuidados Paliativos orais Pacientes em Cuidados Paliativos apresentam sérias restrições funcionais e gran de comprometimento das funções orais particularmente quando a doença atinge a cavidade oral como no câncer de cabeça e pescoço Nessa condição os sintomas habituais agravamse e nem sempre são curáveis necessitando de atenção e cui dados especiais Os sintomas orais mais frequentes são dor sangramento trismo feridas abertas infecções oportunistas disfagia xerostomia desnutrição desidrata ção anorexia caquexia e desfiguração As secreções em doentes traqueostomizados também comprometem a comunicação verbal causam disfunção oral e sofrimento3 Dor ulceração sangramento e trismo são os mais importantes sintomas em casos de câncer oral avançado2 O tratamento inadequado ou a sua ausência resulta em desconforto e prejuízos nutricionais comprometendo mais ainda a qualidade de vida desses doentes5 O cirurgiãodentista contribui fornecendo intervenções próprias de sua área de atua ção profissional além de cuidados de suporte que assegurem uma boca mais saudável livre de infecção e dor As complicações do câncer de boca e de seu tratamento já são bem conhecidas entretanto em pacientes sob Cuidados Paliativos elas podem tomar dimensões exageradas Diagnóstico de afecções ou doenças odontológicas associadas A existência de enfermidades orais como raízes dentárias infectadas ou doença perio dontal deve ser detectada pois contribui para agravar o estado de saúde Para minimizar as complicações orais a prioridade é a higiene oral minimamente de modo a manter a saúde oral reduzir a irritação e o dano tecidual e promover mais conforto1 Deve ser ava liada a capacidade que o paciente possui de se cuidar a fim de se desenvolverem alter nativas para melhorar a escovação dos dentes incluindo indicações específicas de escova dental pastas e colutórios que deveriam ser fornecidas ao paciente e a seu cuidador3 Escovas de dente extramacias são mais suaves aos tecidos orais que as convencionais e devem ser usadas em associação aos cremes dentais sem laurilsulfato de sódio para não estimular ou exacerbar a descamação da mucosa oral A solução de clorexidina a 012 pode ser utilizada por doentes com comprometi mento médico predispostos a infecções orais pacientes com longa estadia em hospitais idosos ou pacientes elegíveis para Cuidados Paliativos com o objetivo de prevenir infec ções orais e sistêmicas Os pacientes devem ser orientados a remover suas próteses à noite e deixálas em solução antisséptica como clorexidina a 012 por 30 minutos ou solução com cloro a 2 5 ml ou uma colher de chá de alvejante em 250 ml de água3 243 A presença de xerostomia e a perda do volume facial podem causar diminuição da retenção da prótese Está indicada nesse caso a aplicação de adesivos na superfície da prótese bem como lubrificantes à base de água ex KY gel a fim de proporcionar efetiva adesão da prótese à mucosa oral Protocolo para Cuidados Paliativos orais Depois de uma minuciosa avaliação do doente devese aplicar uma sequência de cuidados que melhorem preventiva ou curativamente sua condição de saúde Nas Figuras 2 3 e 4 uma sugestão de protocolo para Cuidados Paliativos orais Protocolo sugerido para Cuidados Paliativos orais Orientação de higiene oral Pacientes e cuidadores Mecânica e medicamentosa Próteses dentárias Medicações tópicas antissépticas Gaze e ataduras Soluções e pomadas anestésicas Limpeza e proteção de feridas intra e extraorais Controle da dor em feridas intra e extraorais Figura 2 Esquema da sequência de cuidados orais preventivos curativos e paliativos em pacientes sob Cuidados Paliativos Protocolo sugerido para Cuidados Paliativos orais Infecções oportunistas candidíase oral Antifúngicos sob a forma de bochechos Higiene das próteses dentárias Hidratante oral Saliva artificial Evitar alimentos cítricos condimentados e quentes para proteção da mucosa oral xerostômicaulcerada Xerostomia Orientação dietética Figura 3 Esquema da sequência de cuidados orais preventivos curativos e paliativos em pacientes sob Cuidados Paliativos 244 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Conclusão Quanto à boca vários avanços permitiram a melhora da qualidade de vida O tratamento sintomático da dor e os cuidados locais como higiene oral e limpeza de feridas contribuem para a redução de dor desconforto e infecções oportunistas Em casos de extrema morbida de como a mucosite oral o laser terapêutico parece eficaz na prevenção de lesões e dimi nuição da dor dos pacientes Hidratantes orais reduzem o desconforto da hipossalivação Essa é uma área especializada que envolve oncologia e dor e que ainda é carente de cirur giõesdentistas com formação em dor orofacial e experiência com pacientes oncológicos mas que está gradativamente despertando a consciência da necessidade de integração a equipes multidisciplinares especializadas incluindo os Cuidados Paliativos Esperase que no futuro essa integração beneficie os doentes com novas terapêuticas e que cuidados que aliviem seu sofri mento sejam estendidos de modo padronizado a todos os que deles necessitarem Referências 1 EPSTEIN J B et al Quality of life and oral function following radiotherapy for head and neck cancer Head Neck v 21 p 111 1999 2 NARAYANAN R S NAIR M K PADMANABHAN T K Palliation of pain in advanced oral cancer Headache v 28 p 2589 1988 3 PAUNOVICH E D et al The role of dentistry in palliative care of the head and neck cancer patient Tex Dent J v 117 n 6 p 3645 2000 4 SIQUEIRA J T T et al Dor orofacial e cuidados paliativos orais em doentes com câncer Prática Hospitalar v 62 p 12733 2009 5 SWEENEY M P BAGG J Oral care for hospice patients with advanced cancer Dent Update v 22 p 4247 1995 6 SWEENEY M P BAGG J The mouth and palliative care Am J Hosp Palliat Care v 17 n 2 p 11824 2000 7 VILLARET D B WEYMULLER E A Pain caused by cancer of the head and neck In LOESER J D et al eds Bonicas management of pain 3 ed New York Lippincott Williams Wilkins 2001 p 94865 8 WISEMAN M A Palliative care dentistry Gerodontology v 17 n 1 p 4951 2000 Protocolo sugerido para Cuidados Paliativos orais Focos infecciosos Doença periodontal e cárie Alisamento de superfícies dentárias pontiagudas Prótese traumática ajuste Reembasamento com adesivos e condicionadores teciduais Traumatismo mucoso Prótese desadaptada Figura 4 Esquema da sequência de cuidados orais preventivos curativos e paliativos em pacientes sob Cuidados Paliativos 245 Ação prática do profissional de Cuidados Paliativos no domicílio JulietA FriPP Internação domiciliar diagnóstico situacional A internação domiciliar compreende o conjunto de atividades prestadas no domi cílio a indivíduos clinicamente estáveis que exijam intensidade de cuidados de menor complexidade que no ambiente hospitalar1 Ela está inserida no contexto da atenção domiciliar que inclui também a assistência domiciliária Em abril de 2002 foi sancionada pelo Ministério da Saúde MS a Lei no 10424 como subsistema da Lei no 8080 que es tabelece no âmbito do Sistema Único de Saúde SUS assistência e internação domiciliar Esta lei inclui procedimentos médicos de enfermagem fisioterapêuticos psicológicos e de assistência social necessários ao cuidado integral dos usuários em seu domicílio por equipe exclusiva para este fim28 O crescimento do atendimento domiciliar no Brasil é recente e tal modalidade de prestação de serviços ocorre tanto no setor privado quanto no público fazendo parte da pauta de discussão das políticas de saúde que pressionadas pelos altos cus tos das internações hospitalares buscam saídas para melhor utilização dos recursos financeiros15 A internação domiciliar proporciona assistência humanizada e integral contribuindo para a otimização dos leitos hospitalares reintegra o paciente em seus núcleos familiar e de apoio por meio de maior aproximação da equipe de saúde com a família e promovendo educação em saúde Com relação ao idoso a internação domiciliar preserva ao máximo sua autonomia buscando a recuperação de sua independência funcional13 Os indivíduos em situação de fragilidade nos momentos de adoecimento buscam a atenção hospitalar para reduzirem o seu sofrimento e o hospital responde a certo grupo de problemas oferecendo tecnologias que permitem garantir o acolhimento necessário à demanda Por outro lado existem riscos desnecessários inerentes ao ambiente hospi talar que precisam ser evitados Nesse sentido inúmeras instituições de saúde buscam a construção e a operação de práticas voltadas a uma assistência com intensidades variá veis de cuidados tendo como característica comum realizar a intervenção terapêutica no interior do domicílio do usuário14 A internação domiciliar pode servir de elo entre o nível hospitalar e a atenção bá sica fortalecendo o sistema e particularmente as estratégias de saúde da família re conhecendo as competências de cada instância O estabelecimento de responsabilidade compartilhada entre níveis distintos da rede de serviços de saúde tornase imprescin dível a fim de garantir a continuidade indispensável ao atendimento das necessidades de grupos vulneráveis como os portadores de incapacidade funcional em processos de adoecimento27 A atenção referente aos Cuidados Paliativos requer coordenação entre os sistemas de saúde principalmente de internação hospitalar em que se encontra a maioria dos pacientes com neoplasias em estágio avançado e o sistema de atenção domiciliar 246 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP permitindo assim a continuidade dos cuidados e mantendo o acolhimento de pacientes e familiares em ambiente domiciliar16 A atenção domiciliar vem demonstrando potencial de se concretizar como modali dade substitutiva de cuidado envolvendo todo o contexto domiciliar do usuário possi bilitando a produção de um cuidado mais próximo individualizado e menos tecnicista do que no hospital Não se trata de uma desospitalização irresponsável e prematura mas da possibilidade de reestruturar o modo de operar o cuidado no espaço físico e nas estratégias de cuidado17 A busca de autonomia para andar a própria vida deve servir de guia central para qualquer projeto de internação domiciliar evitando restrições da autonomia asseguran do processos de ganho contínuo dos usuários em ambiente favorável e com equipe de profissionais comprometida com a busca de alívio de sintomas e resultando na maior independência dos pacientes em seu próprio território26 Cuidados Paliativos no domicílio uma estratégia de cuidado integral O envelhecimento da população resulta no aumento da incidência e prevalência de enfermidades debilitantes progressivas Entre essas enfermidades as causas neurodege nerativas e as neoplasias ocupam lugar de destaque sendo responsáveis pelo elevado grau de sofrimento dos pacientes e de seus familiares Essa situação se verifica espe cialmente na fase terminal dessas doenças A maioria dos pacientes com enfermidades em fase terminal deseja morrer em seu próprio domicílio e não dispensa uma atenção adequada para o controle de sintomas2 Na primeira definição da Organização Mundial da Saúde OMS para Cuidados Pa liativos esses eram categorizados como o último estágio de cuidado sendo os cuidados oferecidos por uma equipe interdisciplinar e voltados para pacientes com doença em fase avançada ativa em progressão cujo prognóstico é reservado e o foco da atenção é a qua lidade de vida8 A seguir a OMS considerando que os Cuidados Paliativos podem e devem ser oferecidos o mais cedo possível no curso de qualquer doença crônica potencialmente fatal definiuos como uma abordagem que melhora a qualidade de vida de pacientes e suas famílias na presença de problemas associados a doenças que ameaçam a vida me diante prevenção e alívio de sofrimento pela detecção precoce e por tratamento de dor ou outros problemas físicos psicológicos sociais e espirituais estendendose inclusive à fase de luto36 Atualmente os Cuidados Paliativos são considerados a quarta diretriz estabele cida pela OMS para o tratamento do câncer associados a prevenção diagnóstico e tratamento35 A conjugação de Cuidados Paliativos com internação domiciliar é uma tarefa que re quer vocação de serviço organização de sistema de saúde e conhecimentos científicos Os pacientes escolhem o domicílio como lugar preferencial para receber os cuidados quando não existe mais possibilidade de cura da sua doença14 A internação domiciliar oferece vantagens não somente aos pacientes mas também à família e ao sistema de saúde mediante a redução de custos Em geral os pacientes quando questionados referem que receberam assistência satisfatória no hospital mas que preferiam receber tratamento no domicílio pelo conforto e pela rede familiar mais abrangente 247 A equipe interdisciplinar é fundamental para garantir o sucesso de cuidados e aco lhimento dos usuários e seus familiares tendo cada profissional o seu papel Médicos enfermeiros assistentes sociais psicólogos fisioterapeutas nutricionistas assistentes espirituais entre outros compartilham diariamente as necessidades manifestadas pelos usuários em situação de terminalidade em ambiente domiciliar atuando com o objetivo de aliviarlhes os sofrimentos físico emocional social e espiritual Os Cuidados Paliativos e as relações desenvolvidas em domicílio configuramse como o melhor exemplo de tecnologia leve tecnologias de relações com produção de vínculo autonomia acolhimento cumplicidade associada a técnicas que visam alívio de sofri mento de pacientes e familiares longe da tecnologia dura equipamentos tecnológicos do tipo máquinas normas estruturas organizacionais comuns no ambiente hospitalar26 A assistência paliativa em casa requer que o paciente permita e participe dos cui dados com apoio da família A comunicação contínua entre paciente família e equipe facilita a realização dos cuidados sem objetivo de cura e sim de conforto e alívio de sofrimento11 Um estudo romeno descreve as atividades e intervenções para pacientes com câncer avançado tratados em domicílio por equipe de Cuidados Paliativos e analisa as mudanças que ocorreram nos sintomas físicos principalmente na dor O número de sintomas físicos reduziu consideravelmente após a inclusão dos pacientes no programa de Cuidados Palia tivos particularmente daqueles com condição socioeconômica menos favorável9 Em ensaio clínico randomizado realizado na Noruega foram incluídos 434 pacientes com doença maligna incurável e com sobrevida de três a nove meses sendo os grupos divididos de forma aleatória O grupo de intervenção foi aquele que recebeu Cuidados Paliativos por equipe especializada Os resultados encontrados com relação ao local da morte demonstraram que 25 dos pacientes do grupo de intervenção morreram em casa enquanto somente 15 do grupocontrole morreram em domicílio p 005 O estudo concluiu que os Cuidados Paliativos favorecem o óbito dos pacientes em casa reduzindo as internações hospitalares desnecessárias21 Outro estudo randomizado realizado na Califórnia EUA buscou avaliar satisfação quanto aos cuidados utilização de serviços médicos local da morte e custos dos cui dados em saúde sendo que no grupo de intervenção os pacientes receberam Cuidados Paliativos em domicílio e no grupocontrole tratamento tradicional Os participantes do estudo foram indivíduos com doenças terminais n 298 e sobrevida de cerca de um ano ou menos O grupo de intervenção relatou maior satisfação com relação aos cuidados p 005 teve mais probabilidade de morrer em casa p 0001 e era menos propenso a buscar atendimento em serviços de emergência p 001 ou internação hospitalar p 0001 Os custos foram relativamente mais baixos na prestação de cuidados com relação ao grupocontrole p 003 O estudo demonstra fortes indícios da necessidade de ampliar o olhar e a assistência à saúde dos pacientes em situação de terminalidade5 Os cuidados contínuos em domicílio vêm de encontro e favorecem os princípios dos Cuidados Paliativos que afirmam a vida reconhecem a morte como um processo natural sem antecipála ou retardála providenciam alívio da dor e de outros sintomas físicos integram os aspectos psicológicos espirituais e sociais do cuidado ao paciente oferecem um sistema de suporte para ajudálos a viver o mais ativamente possível e oferecem su porte para auxiliar a família a cooperar durante a doença e trabalhar o luto e a perda10 248 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Cuidador de indivíduos em situação de terminalidade As doenças sem possibilidade de cura em estágio avançado têm grande impac to na vida do paciente e de seu entorno modificando a estrutura e a dinâmica da família envolvida com aproximação ou afastamento de seus membros em especial quando há sobrecarga na família como costuma ocorrer com a intensificação dos sintomas e o avanço da doença13 O cuidador pelo longo tempo de exposição no curso de uma doença sem pos sibilidade de cura manifesta desgaste físico e sobrecarga emocional O cuidador informal em geral familiar apresenta além das sobrecargas objetiva e subjetiva alterações na qualidade de vida Em estudo transversal realizado com pacientes internadas com câncer de mama ou ginecológico sem possibilidade de cura foram avaliadas as situações de depressão e ansiedade em seus cuidadores O estudo apli cou a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão HAD instrumento validado e que apresenta boa sensibilidade apesar de sua baixa especificidade para pacientes com dor crônica Os resultados demonstraram a presença de depressão em 74 e ansiedade em 53 dos cuidadores6 e levaram à conclusão de que o processo de cuidar de um indivíduo em fase terminal gera conflitos emocionais intensos e sugere que outras variáveis associadas ao impacto mental do cuidar necessitam ser investigadas32 Durante a trajetória da doença os comportamentos físico e emocional do cuidador vão sendo afetados principalmente quando o número de sintomas do paciente aumenta exigindo maior dedicação o que determina falta de tempo para descanso ou outras atividades sociais aspectos associados a isolamento social e depressão Em estudo randomizado realizado em Michigan EUA foi avaliada depressão em cuidadores de pacientes com câncer sendo o grupo de intervenção n 118 aquele em que os cuidadores receberam acompanhamento e apoio sistemático de enfermagem para facilitar os cuidados aos pacientes O grupocontrole n 119 não recebeu tal suporte durante o processo de cuida dos O estudo concluiu depois de 20 semanas que a intervenção de enfermagem clínica isolada não tem efeito benéfico sobre os cuidadores com depressão e que devido à complexidade apresentada sugere que sejam realizados mais estudos para avaliar outras formas de apoio ao contexto do cuidador e do paciente com câncer24 Equipe de atenção domiciliar e Cuidados Paliativos bem preparada oferece condições para o alívio de sobrecarga dos cuidadores estabelecendo cumplicida de e vínculos muitas vezes ausentes em ambiente hospitalar Essa relação pode ser decisiva para que tais situações sejam enfrentadas da melhor maneira possí vel tanto pelo paciente quanto pelo cuidador8 Experiência de um serviço Em abril de 2005 implantamos no Hospital Escola e Fundação de Apoio Uni versitário da Universidade Federal de Pelotas UFPel o Programa de Internação Domiciliar Interdisciplinar PIDI para pacientes oncológicos sob Cuidados Paliati 249 vos complementando assim a atenção integral aos indivíduos que necessitavam de cuidado continuado em ambiente domiciliar evitando as internações hospitalares de repetição e também reduzindo o afastamento dos seus familiares na fase final da vida O reconhecimento local das ações desenvolvidas pelo PIDI é evidente com grande satisfação dos pacientes e dos familiares assistidos pelo programa Durante o período de quatro anos cerca de 400 pacientes foram assistidos pelo programa e cerca de 70 evoluíram para óbito A equipe de profissionais do programa observa uma relação de cumplicidade com os pacientes e seus familiares mantendo os cui dados durante todo o processo de adoecimento terminal31 A comunicação tem sido essencial para garantir o êxito na terapêutica dos pa cientes muitas vezes fragilizados juntamente com seus familiares pela doença e por experiências frustradas com profissionais e serviços a que foram expostos em seus tratamentos anteriores12 30 Objetivos do PIDI oncológico Complementar o Serviço de Oncologia da UFPel oferecendo tratamento de Cuidados Paliativos aos pacientes com câncer com e sem indicação de quimiotera pia ou radioterapia e que possam receber cuidados em ambiente domiciliar humanizar os cuidados dos pacientes com câncer incluindo a família no pro cesso de cuidador do paciente fazendoa dessa forma participar ativamente do tratamento em casa possibilitar a ampliação de leitos em ambiente domiciliar evitando que os pacientes precisem procurar o prontosocorro quando apresentarem intercorrências clínicas inerentes ao tratamento do câncer servir como referência para o encaminhamento de pacientes com câncer sob Cuidados Paliativos que estão internados na rede hospitalar do município incluir ensino pesquisa e extensão no processo de cuidados domiciliares aos pacientes oncológicos trabalhar na perspectiva da interdisciplinaridade incluindo profissionais médi cos enfermeiros técnicos de enfermagem nutricionistas assistentes sociais psicó logos fisioterapeutas assistentes espirituais entre outros proporcionar alívio de sintomas físicos emocionais sociais e espirituais dos pacientes em fase de Cuidados Paliativos capacitar os familiares e oferecer ao grupo de cuidadores suporte para situa ções de sobrecarga nos cuidados com apoio interdisciplinar no luto2230 Instrumentos e escalas de avaliação validados passíveis de aplicação em ambiente domiciliar Palliative prognostic score PaP Score Tabela estima a sobrevida no período de 30 dias a partir das avaliações clínica e laboratorial18 25 pacientes com probabilidade reduzida de sobreviver mais de 30 dias se beneficiam com os cuidados em ambiente domiciliar por equipe interdisciplinar escala aplicada por profissional médico 250 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Tabela PaP Score Variável Pontos Dispneia Presente 1 Ausente 0 Anorexia Presente 15 Ausente 0 Estimativa clínica 12 0 1112 2 910 25 78 25 56 45 34 6 12 85 Índice de Karnofsky 30 0 1020 25 Leucócitos totais por mm3 8500 0 85011000 05 11000 15 Porcentagem de linfócitos 12 25 12199 1 20 0 Grupos de risco Total de pontos A probabilidade de sobreviver 30 dias 70 055 B probabilidade de sobreviver 30 dias 3070 5611 C probabilidade de sobreviver 30 dias 30 111175 Escala de Avaliação Funcional de Karnofsky18 29 Quadro 1 Permite conhecer a capacidade do paciente para poder realizar atividades cotidianas 251 elemento preditor independente de mortalidade em patologias oncológicas e não oncológicas útil para a tomada de decisões clínicas e para valorizar o impacto de um tratamento e a progressão da doença escore 50 ou inferior indica elevado risco de morte durante os seis meses seguintes escala aplicada por profissional médico ou enfermeiro Sistema Avaliação de Sintomas de Edmonton ESAS Quadro 2 Lista 10 escalas numéricas que avaliam a intensidade dos sintomas pontuação de 0 a 10 pedese que o paciente selecione o número que melhor indi que a intensidade de cada sintoma sendo zero o mínimo sintoma e 10 o máximo aplicabilidade em período de tempo determinado de acordo com a rotina do serviço ou segundo a condição do paciente diária dias intercalados semanal escala aplicada por profissional médico ou enfermeiro4 8 19 29 33 Quadro 1 Escala de Avaliação Funcional de Karnofsky Graduação Significado 100 Normal ausência de queixas sem evidências de doença 90 Capaz de realizar atividades normais com sinais e sintomas mínimos da doença 80 Atividade normal com esforço e alguns sinais ou sintomas da doença Incapacidade para grande esforço físico mas consegue deambular 70 Não requer assistência para cuidados pessoais mas é incapaz de realizar atividades normais como tarefas caseiras e trabalhos ativos 60 Requer assistência ocasional mas consegue realizar a maioria dos seus cuidados pessoais 50 Requer considerável assistência e frequentes cuidados médicos 40 Incapacitado requer cuidados pessoais e assistência Autocuidado limitado Permanece mais de 50 do horário vígil sentado ou deitado 30 Severamente incapacitado com necessidade de tratamento de suporte permanente embora a morte não seja iminente 20 Paciente muito doente completamente incapaz com necessidade de tratamento de suporte permanente confinado ao leito 10 Moribundo processo de morte progredindo rapidamente 252 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Avaliação socioeconômica Instrumento que permite traçar o perfil socioeconômico de pacientes e seu núcleo familiar para realizar os cuidados em ambiente domiciliar existe a necessidade de condições mínimas no domicílio como água potável energia elétrica e um leito para o paciente A presença de um cuidador responsável também é imprescindível inclui as seguintes informações cor escolaridade renda familiar cômodos da casa quantidade de pessoas que residem no domicílio condição profissional do paciente atual e passada qual o serviço de saúde que procura quando necessita de atendimento médico cuidador principal aplicada por profissional assistente social Genograma O genograma Figura é uma representação gráfica da família e tem sido utilizado em diversos contextos pode ser aplicado em Cuidados Paliativos pois possibilita identificar a rede fami liar cultural e social mais ampliada dos pacientes podendo dessa forma desfazer ou amenizar conflitos que estejam causando sofrimentos social emocional ou espiritual principalmente em situações de terminalidade23 os cuidados em ambiente domiciliar facilitam a coleta das informações para a cons trução do genograma À medida que confiança e cumplicidade com a equipe interdisci plinar se fortalecem a comunicação acontece resultando num gráfico bastante rico e facilitador para a abordagem dinâmica do núcleo familiar o genograma pode ser construído em softwares específicos pelos quais as informa ções do paciente são inseridas no sistema gerando o gráfico final com ilustrações de cada situação referida como por exemplo relações de proximidade conflitos distanciamen tos uso de drogas nascimentos doenças e óbitos etc escala aplicada por profissional médico enfermeiro assistente social ou psicólogo as simbologias do genograma são inúmeras sempre relacionando o paciente com a família e suas redes34 Quadro 2 Sistema Avaliação de Sintomas de Edmonton Mínimo sintoma Intensidade Máximo sintoma Sem dor 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima dor Sem cansaço 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máximo cansaço Sem náuseas 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima náusea Sem depressão 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima depressão Sem ansiedade 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima ansiedade Sem sonolência 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima sonolência Bom apetite 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Sem apetite Máximo bemestar 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máximo malestar Sem dispneia 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima dispneia Sem insônia 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Máxima dificuldade para dormir 253 Escala de Zarit reduzida Quadro 3 avaliação da claudicação familiar em Cuidados Paliativos sendo definida como a situação de incapacidade dos elementos de uma família em oferecer uma resposta ade quada às múltiplas necessidades e solicitações do doente A escala de Zarit reduzida em Cuidados Paliativos é útil fácil rápida e confiável apresentando sensibilidade e especifi cidade elevadas para medir a claudicação familiar20 instrumento utilizado para avaliar a sobrecarga do cuidador principal apresenta sete perguntas relacionando aspectos físicos e emocionais do cuidador associados a sua rotina diária com o paciente classifica a sobrecarga do cuidador em leve moderada e grave escala aplicada por profissional assistente social ou psicólogo Homem Abuso de álcool ou drogas Morte X Morando junto Casamento Nascimento de uma criança morta Aborto espontâneo Aborto induzido Gestação Filho adotivo Distante Muito estreito Coalizão Harmônico Vulnerável Triangulação Conflituoso Rompimento Aliança Fundido e conflitual Relacionamentos Filhos ordem de nascimento com o mais velho à esquerda Gêmeos idênticos Gêmeos fraternos Divórcio Separação conjugal Mulher Sexo indefinido Pessoaíndice Figura Exemplos de simbologias do genograma 254 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 3 Escala de Zarit reduzida 1 Sente que por causa do tempo que utiliza com o seu familiardoente já não tem tempo suficiente para você mesmo Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 2 Sentese estressadoangustiado por ter que cuidar do seu familiardoente e ao mesmo tempo ser responsável por outras tarefas p ex cuidar de outros familiares ter de trabalhar Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 3 Acha que a situação atual afeta a sua relação com amigos ou outros elementos da família de forma negativa Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 4 Sentese exausto quando tem de estar junto do seu familiardoente Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 5 Sente que sua saúde tem sido afetada por ter de cuidar do seu familiardoente Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 6 Sente que tem perdido o controle da sua vida desde que a doença do seu familiar doente se manifestou Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 7 No geral sentese muito sobrecarregado por ter de cuidar do seu familiardoente Nunca 1 Quase nunca 2 Às vezes 3 Frequentemente 4 Quase sempre 5 Sobrecarga leve até 14 pontos sobrecarga moderada 1521 pontos sobrecarga grave acima de 22 pontos Hipodermóclise e Cuidados Paliativos em domicílio Consiste na administração de fluidos pela via subcutânea SC3 tem grande aplicabilidade em pacientes internados em domicílio pois permite o envolvimento mais seguro do cuidador capacitado em situações nas quais existe a neces sidade de administrar medicamentos injetáveis em curtos intervalos de tempo via alternativa para pacientes com dificuldade de manter acesso venoso permanen te e que necessitam receber drogas injetáveis7 255 garante a manutenção da hidratação em pacientes impedidos de recebêla por via oral VO quando ainda não foi estabelecida uma via enteral mais segura possibilita uma via segura para pacientes com necessidade de analgesia intermiten te principalmente com drogas opioides garante a continuidade de tratamento em domicílio quando há necessidade de administrar antibióticos injetáveis técnica utilizar cateter agulhado escalpe 21G ou 25G ou nãoagulhado 18G e 24G Após os cuidados de assepsia introduzir a agulha na pele em ângulo de 30 a 45 graus em direção centrípeta com o bisel voltado para cima velocidade de infusão a hidratação pode ser em bolo de 500 ml em 20 minutos repetindo até três vezes em 24 horas Em infusão contínua o volume diário não poderá ultrapassar 3000 ml Administração de volume em período noturno é mais confortável garantindo mais autonomia dos pacientes durante o dia zonas de punção regiões deltóidea infraclavicular abdominal e face lateral da coxa drogas administráveis por via SC29 As drogas e suas respectivas indicações encontramse no Quadro 4 Quadro 4 Fármacos e suas indicações Fármaco Indicações Morfina Dor dispneia Tramadol Dor Escopolamina Estertores premortem sialorreia secreções respiratórias obstrução intestinal Midazolam Convulsões sedação paliativa Metoclopamida Náuseas e vômitos Haloperidol Náuseas e vômitos por opioides vômitos em obstrução intestinal delirium Levomepromazina Ansiedade agitação Dexametazona Múltiplas indicações em CP Octreotida Obstrução intestinal Ceftriaxona cefepima ampicilina Infecção Furosemida ICC anasarca IRA CP Cuidados Paliativos ICC insuficiência cardíaca congestiva IRA infecção respiratória aguda Conclusão Internação domiciliar e Cuidados Paliativos com enfoque interdisciplinar obedecen do aos conceitos validados de melhor qualidade de vida aos pacientes e a seus familia res caracterizamse como excelentes estruturas para prestar acolhimento integral em situações de terminalidade oferecendo suporte humanizado com alívio facilitado dos sintomas físicos emocionais sociais e espirituais em ambiente domiciliar Escalas de ava 256 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP liação de sintomas em Cuidados Paliativos são perfeitamente aplicáveis em domicílio facilitando sua pronta resolução pela equipe interdisciplinar sempre com apoio do cui dador principal Referências 1 ANVISA Agência nacional de Vigilância Sanitária Resolução de Diretoria Colegiada 11 ed Brasília Ministério da Saúde 2006 2 BENÍTEZ DEL ROSARIO M A MARTÍN A S Cuidados paliativos y atención primaria aspectos de organización Berlim Springer 2000 3 BRUERA E et al Hypodermoclysis for the administration of fluids and narcotics analgesics in patients with advanced cancer J Pain Symptom Manage v 5 n 218 p 21820 1990 4 BRUERA E et al The Edmonton Symptom Assessment System ESAS a simple method for the assessment of palliative care patients J Palliat Care v 7 n 2 p 69 1991 5 BRUMLEY R et al Increased satisfaction with care and lower costs results of a randomized trial of inhome palliative care J Am Geriatr Soc v 55 n 7 p 9931000 2007 6 CASTRO M M C et al Validade da Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão em pacientes com dor crônica Revista Brasileira de Anestesiologia v 56 n 5 p 4707 2006 7 COYLE N CHERNY N PORTENOY R Subcutaneous opioid infusion at home Oncology v 8 p 217 1994 8 DOYLE D et al eds Oxford textbook of palliative medicine Oxford New York 2004 9 DUMITRESCU L HEUVELOLAROIU M HEUVEL W J Changes in symptoms and pain intensity of cancer patients after enrollment in palliative care at home J Pain Symptom Manage v 34 n 5 p 48896 2007 10 DUNLOP R Hospital based palliative care teams Oxford University Press In Cancer palliative care London SpringerVerlag 1998 p 2 11 ECHEVERRI T A El cuidado paliativo en casa al paciente terminal MEDUNAB v 4 n 10 p 111 2001 12 FINLAY I et al Palliative care in hospital hospice at home results from a systematic review European Society for Medical Oncology v 13 n 4 p 25764 2002 13 FLORIANI C A SCHRAMM F R Atendimento domiciliar ao idoso problema ou solução Cad Saúde Pública v 20 n 4 p 98694 2004 14 FLORIANI C A SCHRAMM F R Desafios morais e operacionais da inclusão dos cuidados paliativos na rede de atenção básica Cad Saúde Pública v 23 n 9 p 207280 2007 15 FLORIANI C A Cuidados do idoso com câncer avançado uma abordagem bioética In Escola Nacional de Saúde Pública Rio de Janeiro FIOCRUZ 2004 p 136 16 FORNELLS H A Cuidados paliativos en el domicilio Acta Bioethica v 6 n 1 p 6375 2000 17 FREIRE H M F Residência terapêutica inventando novos lugares para se viver Micropolítica do Trabalho e o Cuidado em Saúde Rio de Janeiro Universidade Federal do Rio de Janeiro 2006 18 GLARE P CHRISTAKIS N A Prognosis in advanced cancer Oxford Oxford University Press 2008 p 439 19 GLARE P VIRIK K JONES M A systematic review of physicians survival predictions in terminally ill cancer patients BMJ v 327 n 26 2003 20 GORT A et al Escala de Zarit reducida en cuidados paliativos Medicina Clínica v 124 v 17 p 6513 2005 21 JORDHOY M S et al A palliative care intervention and death at home a cluster randomised trial Lancet v 356 n 9233 p 88893 2000 22 KIRK P KIRK I KRISTJANSON L What do patients receiving palliative care for cancer and their families want to be told A Canadian and Australian qualitative study BMJ v 328 n 7452 p 1343 2004 23 KRUGER L WERLANG B O genograma como recurso no espaço conversacional terapêutico Aval Psicol v 7 n 3 p 41526 2008 24 KURTZ M E et al A randomized controlled trial of a patientcaregiver symptom control intervention effects on depressive symptomatology of caregivers of cancer patients J Pain Symptom Manage v 30 p 11222 2007 257 25 MALTONI M et al Successful validation of the palliative prognostic score in terminally ill cancer patients Journal of Pain and Symptom Management v 17 n 4 p 2407 1999 26 MERHY E E Saúde a cartografia do trabalho vivo Rio de Janeiro Hucitec 2002 v 1 27 MINISTÉRIO DA SAÚDE Portaria nº 2529 institui a internação domiciliar no âmbito do SUS Ministério da Saúde 2006 28 MINISTÉRIO DA SAÚDE Lei nº 10424 do subsistema de atendimento e internação domiciliar complemento da Lei nº 8080 Brasília Ministério da Saúde 2002 29 MINISTERIO DE SANIDAD Y CONSUMO Guía de práctica clínica sobre cuidados paliativos anexos 2008 VitoriaGasteiz Servicio Central de Publicaciones del Gobierno Vasco 30 PARKER S et al A Systematic review of prognosticendoflife communication with adults in the advanced stages of a lifelimiting illness patientcaregiver preferences for the content style and timing of information Journal of Pain and Symptom Management v 34 n 1 p 8193 2007 31 PIDI Programa de Internação Domiciliar Interdisciplinar para pacientes oncológicos Internação domiciliar e cuidados paliativos 2009 Disponível em httpwwwfaucombrpidi Acesso em maio 2009 32 REZENDE V L et al Depressão e ansiedade nos cuidadores de mulheres em fase terminal de câncer de mama e ginecológico Rev Bras Ginecol Obstet v 27 p 73743 2005 33 VIGNAROLI E et al The Edmonton Symptom Assessment System as a screening tool for depression and anxiety Journal of Palliative Medicine v 9 n 2 p 296303 2006 34 WENDT N CREPALDI M A Utilização do genograma como instrumento de coleta de dados na pesquisa qualitativa Psicologia Reflexão e Crítica v 21 n 2 p 30210 35 WHO World health Organization Cancer control knowledge into action WHO Guide for Effective Programmes Geneva WHO 2007 36 WHO World Health Organization National Cancer control Programmes policies and managerial guidelines world 2002 258 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Cuidados com feridas e curativos renAto rodriGues CAmArão Introdução A abordagem da ferida oncológica pelo profissional da saúde pode seguir duas linhas de ação A primeira é a abordagem da lesão oncológica como um ente clínico isolado que exi ge por suas características e seu prognóstico ímpares uma série de condutas e protocolos bem definidos Essas condutas frequentemente diferem das ações preconizadas para todos os outros tipos de ferida E elas devem estar bastante claras para todos os profissionais dire tamente envolvidos no tratamento das lesões de modo que os mesmos ofereçam cuidados que deem respostas prontas efetivas e que atendam as necessidades do doente A segunda linha de ação é aquela que satisfaz mais plenamente os princípios gerais dos Cuidados Paliativos Não se trata da abordagem focada na ferida oncológica mas na pessoa portadora da lesão E essa abordagem compreende as dimensões física psicológi ca social e espiritual Entre outros estados associados à presença da ferida oncológica a pessoa portadora geralmente apresenta sensação de mutilação rejeição de si mesma perda da autonomia e da autoestima medo tendência à automutilação déficit de autocuidado perda da es perança diminuição da libido por fatores sistêmicos e por déficit de informação3 7 9 A ferida determina discriminação e rejeição social desde o âmbito familiar até as atividades produtivas humilhação pena medo nojo desagrado Os pacientes sentemse podres por dentro3 o que os afasta das outras pessoas para não se exporem a comen tários desagradáveis ou temendo rejeição O aparecimento da ferida oncológica também tem repercussões no âmbito familiar É importante ao profissional da saúde considerar que no câncer em seu curso avançado normalmente ocorre a transferência dos cuidados para a família Esse aumento da so brecarga tem consequências físicas psíquicas sociais e econômicas para cada familiar Geralmente a atividade profissional do cuidador fica em segundo plano levando ao de semprego e à desestruturação financeira da família13 21 Realizar os curativos em domicílio é considerado uma das principais dificuldades en contradas pelos cuidadores12 Depois de analisar esses diferentes aspectos inserindo paciente família e sociedade profissionais instituições e serviços num funcionamento dinâmico eficaz e justo é possí vel vislumbrar uma resolubilidade maior ao problema da ferida oncológica Conceito As feridas oncológicas são formadas pela infiltração das células malignas do tumor nas estruturas da pele Ocorre quebra da integridade do tegumento em decorrência da proliferação celular descontrolada que o processo de oncogênese induz levando à forma ção de uma ferida evolutivamente exofítica1517 259 Podem ocorrer por extensão do tumor primário ou ainda por uma metástase im plantação acidental de células na pele durante um procedimento cirúrgico ou diagnósti co ou invasão de linfonodos próximos ao tumor primário6 O termo ferida oncológica não é consensual na literatura Encontramse ainda outros nomes como lesões tumorais úlceras neoplásicas feridas malignas e lesões neoplásicas6 Classificação As feridas oncológicas se classificam quanto à localização e à topografia quanto à origem primária originase no local do tumor primário metastática tem como origem um local de metástase quanto à aparência fungosa aparência fungosa semelhante à couveflor ulcerativa forma crateras fungosa maligna ulcerativa apresenta ambos os aspectos quanto ao estadiamento Quadro 1 Características As principais características e sintomas locais da ferida são1618 progressão rápida e inviabilidade de cicatrização hemorragias odor fétido exsudato abundante alto risco para infecção alto risco para miíase presença de necrose tecidual dor prurido agressão do tecido saudável perilesional Condutas Alguns tratamentos nãoespecíficos são sugeridos para o controle das feridas oncológicas radioterapia destrói células tumorais diminui o tamanho da lesão o exsudato e o sangramento4 18 quimioterapia reduz o tumor e melhora a dor hormonoterapia diminui a maior parte dos sintomas quando indicada laser reduz a dor e a necrose tissular 260 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 1 Estadiamento de feridas oncológicas segundo HaisfieldWolfe e BaxendaleCox 199917 Estádio 1 Pele íntegra Tecido de coloração avermelhada eou violácea Nódulo visível e delimitado Encontrase em estado assintomático Estádio 1N Feridas fechadas ou com abertura superficial por orifícios de drenagem de secreção límpida amarelada ou de aspecto purulento Tecido avermelhado ou violáceo lesão seca ou úmida Pode haver dor e prurido Não apresenta odor e configurase sem tunelizações eou formação de crateras Estádio 2 Feridas abertas envolvendo derme e epiderme Ulcerações superficiais podendo apresentarse friáveis sensíveis à manipulação com secreção ausente lesões secas ou em pouca quantidade lesões úmidas Intenso processo inflamatório ao redor em que o tecido exibe coloração vermelha eou violácea e o leito da ferida configurase com áreas secas e úmidas Pode haver dor e odor Não formam tunelizações pois não ultrapassam o tecido subcutâneo Estádio 3 Feridas que envolvem derme epiderme e subcutâneo Têm profundidade regular mas com saliências e formação irregular São friáveis com áreas de ulcerações e tecido necrótico liquefeito ou sólido e aderido Fétidas secretivas já com aspecto vegetativo mas que não ultrapassam o subcutâneo Podem apresentar lesões satélites em risco de ruptura iminente Tecido de coloração avermelhada violácea O leito da lesão é predominantemente de coloração amarelada Estádio 4 Feridas invadindo profundas estruturas anatômicas Com profundidade expressiva por vezes não se visualizam seus limites Têm secreção abundante odor fétido e dor O tecido ao redor exibe coloração avermelhada violácea O leito da lesão é predominantemente de coloração amarelada No entanto a terapia tópica específica é a que traz melhores resultados no manejo da úlcera neoplásica A ferida oncológica é uma entidade clínica dinâmica e por esse motivo exige avalia ção diária e preparo adequado da equipe para identificar os sinais presentes ou potenciais de complicação O paciente a família e os cuidadores devem ser treinados a identificar essas situações e reportálas aos profissionais da saúde A conduta terapêutica deve ser ajustada às características da lesão obedecendo aos princípios de cuidados com feridas A meta principal dessas condutas deixa de ser a ci catrização que é improvável e passa a focar a o conforto do paciente com relação à ferida b a prevenção e o controle dos sintomas locais As condutas serão adequadas aos principais sintomas conforme descrito a seguir 261 Hemorragias Estão relacionadas com o crescimento da rede neovascular na região do tumor associada muitas vezes à presença de tecido friável o que favorece o rompimento de vasos Os sangramentos podem ser espontâneos ou causados por atividades e procedimen tos como ações de vida diária banho cuidados pessoais movimentação no leito deam bulação movimentos bruscos radioterapia local compressão mecânica traumatismos utilização ou retirada dos curativos de forma inadequada abrasão durante a técnica de curativo ou a realização de desbridamento Os principais sítios de sangramento são feridas cutâneas notadamente lesões de cabeça e pescoço cavidade oral úterovagina sangramentos gástricos Prevenção4 5 17 18 Manter o meio úmido evitando a aderência de gazes ao sítio ou à superfície e às bordas da lesão Para isso podese utilizar gaze embebida em soro fisiológico ou gaze com petrolato Contraindicase o uso de óleos essenciais como por exemplo os triglicérides de cadeia média TCM devido à sua propriedade de estimular a neoangiogênese retirar coberturas de curativo cuidadosamente Na ausência de sangramento ativo inspecionálas buscando sinais de sangramentos anteriores evitar a abrasão do leito da ferida quando potencialmente sangrante durante o procedimento de curativo na medida do possível manter o local da ferida livre de compressões mecânicas restringir os desbridamentos àqueles casos em que o benefício ao paciente seja maior que o risco de hemorragia e apenas quando houver recursos disponíveis para controlála Tratamento18 19 Avaliar intensidade origem e causa do sangramento aplicar pressão diretamente sobre os vasos sangrantes com o amparo de gazes ou compressas a aplicação tópica de soro fisiológico gelado realiza hemostasia principalmente em pequenos sangramentos considerar a aplicação tópica de adrenalina pela sua ação vasoconstritora aplicar gel de alginato de cálcio com carboximetilcelulose na lesão com gazes esté reis ou placa de alginato de cálcio Depois da aplicação o curativo com alginato de cálcio deve ser mantido no local por no mínimo 24 horas a não ser que haja necessidade de outra intervenção no local Devese evitar o contato do alginato de cálcio com as bordas da lesão devido ao risco de maceração da pele íntegra avaliar a possibilidade de iniciar antifibrinolítico sistêmico intervenção cirúrgica sutura cauterização ou radioterapia hemostática em casos de sangramento intenso em hemorragias grandes ou frequentes considerar a coleta de exames laboratoriais com vistas a hemotransfusões 262 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Em caso de sangramento de lesões intravaginais18 realizar irrigação intravaginal com soro fisiológico gelado Utilizar sonda de nela ton no 12 lubrificada com lidocaína gel e introduzida com cuidado para não aumentar o sangramento em caso de refratariedade à irrigação vaginal com soro gelado utilizar duas ampo las de adrenalina diluídas em um frasco de 250 ml de soro fisiológico gelado e realizar irrigação vaginal com essa solução considerar a possibilidade de tratamento antifibrinolítico sistêmico Odor fétido É considerado o sintoma mais castigador das feridas oncológicas em decorrência da sensação de enojamento imputada ao paciente17 Ocorre devido à colonização bacteria na principalmente de anaeróbias no sítio da ferida As principais causas são a presença de necrose exsudato abundante associado a curativos de baixa absorção oclusão dos vasos sanguíneos locais e a consequente redução de oxigênio Prevenção Controlar o exsudato considerar o riscobenefício de desbridamento Tratamento8 17 18 A conduta é eleita mantida ou alterada depois da quantificação do odor Quadro 2 A avaliação deve ser realizada diariamente Devemse sempre levar em conta os rela tos e as queixas do paciente da família e dos cuidadores No caso de internação em en fermarias conjuntas mais de um paciente por enfermaria o relato dos outros pacientes e acompanhantes também é importante Quadro 2 Classificação de odor18 Grau I O odor fétido é sentido apenas ao se abrir o curativo Grau II O odor fétido é sentido ao se aproximar do paciente sem abrir o curativo Grau III O odor fétido é sentido no ambiente sem abrir o curativo e caracteristicamente forte eou nauseante O Quadro 3 traz a conduta para controle do odor conforme o grau É importante cobrir o curativo primário com gaze embebida em petrolato instalar curativo secundário com coxins ou gazes a depender da quantidade de exsudato e ocluir completamente com fita adesiva microporosa ou equivalente Recomendase observar o padrão alimentar do paciente e elaborar um plano de cui dados que evite a troca de curativos próximo aos horários das refeições 263 Feridas oncológicas de cavidade oral e necrose de base de língua Prevenção ou odor grau I orientar o paciente a fazer bochecho com solução de bicarbonato de sódio no mí nimo três vezes por dia na ausência da solução de bicarbonato usar a metronidazol solução injetável diluída em solução fisiológica na proporção 11 b metronidazol comprimido de 250 mg macerado e diluído em 50 ml de solução fisiológica orientando o bochecho dessa solução no mínimo três vezes por dia Odor graus II e III ou pacientes que não conseguem fazer bochecho utilizar metronidazol comprimido 250 mg preparar uma solução com um comprimido macerado a cada 50 ml de solução fisiológica adicionar a cada 50 ml de solução uma a duas colheres de sopa de sulfadiazina de prata meia colher de óleo mineral misturar até formar uma papa Aplicar com uma espátula sobre a ferida Para assegurar e melhorar o conforto devemse tomar medidas que incluam o controle de odor ambiental principalmente se houver odor grau III Entre esses cui dados estão o aporte e a circulação de ar seja por janelas ou sistema de condicio namento de ar Quadro 3 Controle do odor conforme o grau Odor grau I19 Proceder à limpeza com solução fisiológica a 09 Deixar gazes embebidas em hidróxido de alumínio ou metronidazol gel no leito da ferida Odor grau II Proceder à limpeza com solução fisiológica a 09 Irrigar a ferida com solução de metronidazol Podemse usar a solução injetável diluída em solução fisiológica na proporção 11 b comprimido de 250 mg macerado e diluído em 50 ml de solução fisiológica Verificar presença de tecido necrótico endurecido Se houver realizar escarotomia Ocluir a ferida com curativo industrializado de carvão ativado Na ausência ou impossibilidade do uso de carvão ativado aplicar metronidazol comprimido de 250 mg macerado ou gel a 08 sobre a ferida Na ausência de qualquer um desses anteriores instalar gazes embebidas em solução injetável de metronidazol diluída em soro fisiológico na proporção 11 Odor grau III Considerar emergência dermatológica Seguir os passos conforme odor grau II Associar o uso de metronidazol sistêmico ao tratamento local 264 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Exsudato A monitoração do exsudato diminui o odor aumenta o conforto e melhora a autoestima do paciente O controle da infecção local e da quantidade de tecido necrótico pode diminuir o exsudato da ferida em alguns casos Tratamento17 18 Aplicar curativos absortivos conforme a quantidade de exsudato Indicase gel de alginato de cálcio com carboximetilcelulose ou a placa seca de alginato de cál cio no leito da lesão Devese evitar o contato do alginato de cálcio com as bordas íntegras da ferida cobrir com gazes ou coxins curativo secundário manter a placa de alginato na lesão por no máximo 24 horas trocar o curativo secundário sempre que necessário na ausência de qualquer apresentação de alginato de cálcio utilizar coberturas primária e secundária com gazes ou coxins trocandoos sempre que se mostrarem saturados de secreção é importante avaliar aumento na frequência de trocas Devese ter cuidado com sangramento nesses casos em caso de secreção purulenta em grande quantidade principalmente quando associada a odor fétido considerar a utilização de antibiótico sistêmico de acordo com os protocolos institucionais e com as indicações para odor grau III Miíase É uma dermatozoonose causada pela presença de larvas de insetos mais co mumente moscas em órgãos e tecidos humanos5 17 18 Pode ser classificada pela localização em cutânea subcutânea e cavitária6 Prevenção Controle ambiental utilização de sistemas de condicionamento de ar instala ção de telas protetoras em portas e janelas nos locais de exposição ao ar ambiente protocolos e ações adequados de limpeza e higiene da unidade controle do odor e do exsudato da ferida na presença de ostomias orientar a proteção do orifício com gaze ou outro tecido fino ou com bolsas apropriadas para esse fim no caso de risco de exposição aos insetos Tratamento5 17 18 Utilizar antiparasitário por via oral VO Recomendase ivermectina 6 mg um comprimido por VO30 kg de peso em dose única limpeza rigorosa da ferida retirada mecânica das larvas quando possível Atenção ao risco de sangramento 265 troca de curativos com maior frequência até que haja controle de odor e ex sudato e a certeza de que todas as larvas foram eliminadas detectar possível infecção secundária e necessidade de antibioticoterapia sistêmica Dor A dor pode estar localizada na própria ferida oncológica ou aparecer em decorrên cia dessa Está relacionada com os seguintes fatores21 infiltração do tumor em áreas inervadas compressão de tecidos e nervos devido ao crescimento do tumor necrose tecidual localizada como resultado da invasão tumoral exposição de terminações nervosas no local da lesão procedimentos invasivos de diagnóstico e tratamento realização de técnicas de curativo inadequadas instalação de curativos compressivos ou inadequados no local complicações ocasionadas pelo próprio tratamento como infecções e inflamação tecidual incapacidade de movimento ou alinhamento corporal inadequado determinados pela presença da ferida oncológica Há alguns desafios no controle da dor Um deles é sua própria natureza complexa e pluricausal e suas expressões1 4 13 O outro é o convívio cotidiano e passivo dos profis sionais da saúde com a dor do outro13 19 A dor terá tratamento adequado apenas quando for prioridade13 Prevenção e tratamento17 18 Monitorar a dor Recomendase a escala visual analógica EVA realizar analgesia prévia ao procedimento de curativos 30 minutos em analgesia VO ou subcutânea SC 5 minutos para a via endovenosa EV início imediato para a via tópica irrigar o curativo com soro fisiológico a 09 antes da retirada do mesmo Remo vêlo delicadamente com atenção às expressões de dor do paciente empregar técnica cautelosa sem abrasão mecânica do leito ulcerado considerar a necessidade de aplicação de gel anestésico sobre o leito da ferida Recomendase lidocaína gel a 4 utilizar coberturas que mantenham a umidade no leito da ferida comunicar e discutir com a equipe os casos de sofrimento álgico que fogem ao controle da conduta preconizada Prurido Algumas classificações e escalas de dor consideram o relato de prurido um grau de dor A dor e o prurido na ferida oncológica possuem várias causas em comum Em alguns casos a falta de proteção à pele íntegra perilesional pode levar a irritação e consequente prurido5 17 18 266 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Prevenção e trAtAmento18 19 Investigar alergias prévias do paciente pesquisar se a causa do prurido é decorrente de alergia aos produtos utilizados no curativo ou à fita adesiva Nesse último caso utilizar fita hipoalergênica micro porosa2 10 11 14 controlar o exsudato que é potencialmente agressivo à pele íntegra considerar o uso de dexametasona pomada a 01 no local referido ou a necessi dade de terapia sistêmica nos casos mais persistentes Necrose tecidual O desbridamento da ferida oncológica deve ser considerado com muito bom senso e essa possibilidade deve passar por rigorosa análise de cada caso pela equipe inter disciplinar Levamse em consideração a extensão da área a ser desbridada a presença de infecções locais a vascularização e neovascularização do local os riscos para o paciente cujo principal é o sangramento durante ou após o procedimento e os benefí cios diminuição de volume de feridas fungosas controle de odor refratário às terapias padronizadas17 18 A presença de necrose tecidual é um fenômeno comum na ferida oncológica sendo discutível se há alguma forma de prevenila Tratamento17 18 Proceder ao desbridamento enzimático primeiramente e se necessário ao cirúrgico posteriormente Para se realizar o desbridamento enzimático é necessário determinar a área de necrose a ser desbridada em relação à área total da ferida limpar a ferida com soro fisiológico a 09 em jato de alta pressão se houver área de necrose seca proceder à escarificação da mesma pela técnica de quadriculação aplicar hidrogel sobre a área de necrose com o auxílio de gazes O hidrogel facilitará o desbridamento autolítico no local na ausência de hidrogel utilizar papaína gel ou creme diretamente sobre o leito da ferida A concentração da papaína será proporcional à área de necrose a ser retirada Quadro 4 cobrir usando gazes ou coxins O processo de desbridamento enzimático exige acompanhamento atencioso e inspe ção frequente por parte da equipe Deve ser interrompido sempre que houver qualquer sinal de hemorragia na lesão Quadro 4 Concentração de papaína com relação à área de necrose18 Papaína a 10 a 12 Necrose na maior parte da lesão Papaína a 6 Necrose em 50 da lesão Papaína a 2 Necrose na menor parte da lesão 267 Cuidados com a pele perilesional18 19 A pele perilesional deve ser inspecionada diariamente a cada troca de curativos2 10 11 14 17 limpa com soro fisiológico e seca cuidadosamente sem abrasões Em seguida usase um dos produtos a seguir dependendo da extensão de pele a ser protegi da das condições da ferida e da disponibilidade desses produtos Hidrocoloide em placa ou gel podese usar curativo transparente para fixar a placa aplicar o gel com o auxílio de gazes Trocar diariamente pois seca mais rápido Triglicérides de cadeia média aplicar gazes embebidas em TCM com cuidado para que o mínimo do produto es corra para o leito da ferida Vitamina A aplicar a vitamina A de forma semelhante ao TCM a vitamina A estimula a reepitelização rápida devendo portanto ser usada com parcimônia Creme de sulfato de zinco aplicar em toda a borda da perilesão Não oferece riscos se cair no leito da ferida Além dos cuidados já propostos devese fazer o controle da infecção e do exsudato posto que interferem diretamente sobre a pele íntegra Nas feridas ou fístulas cutâneas altamente exsudativas considerar o uso de bolsas coletoras6 17 Referências 1 ARANTES A C L Q A terapêutica da dor intratável no câncer terminal Revista Einstein São Paulo Hospital Israelita Albert Einstein 2005 2 BORGES E L et al Feridas como tratar Belo Horizonte Coopmed Editora Médica 2001 3 BRAGANÇA A T N M O acolhimento como promoção da saúde entre pacientes com câncer 2006 Dissertação Mestrado Universidade Federal do Rio Grande do Norte Rio Grande do Norte 2006 4 BRASIL Ministério da Saúde Instituto Nacional de Câncer Cuidados paliativos oncológicos con trole da dor Rio de Janeiro INCA 2001 5 CANDIDO L C Nova abordagem no tratamento de feridas São Paulo Editora SENACSP 2001 6 CREMESP Cuidado paliativo Coordenação institucional de Reinaldo Ayer de Oliveira São Paulo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo 2008 7 FEIJÓ A M et al Mudanças relacionadas à sexualidade nos pacientes oncológicos submetidos ao tratamento radioterápico Projeto de Pesquisa Rio Grande do Sul Universidade Federal de Pelotas 2007 8 FIRMINO F et al O controle do odor em feridas tumorais através do uso de metronidazol Revista Prática Hospitalar v IV n 24 p 303 2002 9 GUTIÉRRES M G R et al Natureza e classificação das intervenções de enfermagem em ambulató rio de quimioterapia de adultos Revista LatinoAmericana de Enfermagem v 8 n 3 p 339 2000 10 HESS C T Tratamento de feridas e úlceras Rio de Janeiro Reichmann Affonso Ed 2002 11 JORGE S A et al Abordagem multiprofissional no tratamento de feridas São Paulo Atheneu 2003 12 KALINKE L P et al As dificuldades apresentadas por cuidadores familiares de pacientes oncológi cos em cuidados domiciliares uma visão da enfermagem Paraná Universidade de Tuiuti 2006 268 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP 13 LEÃO E R CHAVES L D Dor quinto sinal vital 2 ed Rio de Janeiro Martinari 2007 14 MANUAL DE TRATAMENTO DE FERIDAS Universidade Estadual de Campinas UNICAMP Hospital das Clínicas Grupo de Estudos de Feridas 1999 15 OTTO S E Oncologia Rio de Janeiro Reichmann Affonso 2002 16 POLETTI N A A et al Feridas malignas uma revisão de literatura Revista Brasileira de Cancero logia n 48 n 3 p 4117 2002 17 PROTOCOLO DE ENFERMAGEM PARA O ATENDIMENTO DE FERIDAS TUMORAIS MALIGNAS CUTÂ NEAS Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal Gerência de Atenção Domiciliar Núcleo Regional de Atenção Domiciliar de Sobradinho NRAD Equipe de Cuidados Paliativos BrasíliaDF 2009 18 PROTOCOLO MULTIDISCIPLINAR DE TRATAMENTO DE FERIDAS E ESTOMIAS DO HOSPITAL DE APOIO DE BRASÍLIA Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal Hospital de Apoio de Brasília Nú cleo de Enfermagem Comissão de Educação Permanente do Núcleo de Enfermagem BrasíliaDF 2007 19 SILVA L M H ZAGO M M F O cuidado do paciente oncológico com dor crônica na ótica do enfermeiro Revista LatinoAmericana de Enfermagem v 9 n 4 2001 20 STERN T A SEKERES M A Facing cancer a complete guide for people with cancer their families and careguivers New York McGrawHill Companies 2004 21 TULLI A C P PINHEIRO C S C TEIXEIRA S Z Dor oncológica os cuidados de enfermagem Revista da Sociedade Brasileira de Cancerologia v 7 n 1 1999 269 Cuidado com ostomias AnAliCe Assis CunhA As palavras ostomia ostoma estoma e estomia de origem grega significam boca ou abertura e são utilizadas para indicar a exteriorização de qualquer víscera oca do corpo por meio de ato cirúrgico ou seja a abertura que passa ter contato com meio externo Segundo a Associação Brasileira de Ostomizados ABRASO estimase que no Brasil há cerca de 50 mil ostomizados e 10 mil inscritos no Programa de Ostomizados do Siste ma Único de Saúde SUS As causa que levam à realização de uma ostomia são neoplasias traumas abdominais doenças inflamatórias doenças congênitas Dependendo da etiologia da doença o cirurgião indica a realização de uma ostomia temporária ou definitiva A realização desse procedimento acarreta uma série de mudan ças na vida diária do paciente e da família sendo necessário um cuidado de enferma gem O paciente terá de conviver com a mudança fisiológica e todas as implicações decor rentes dessa alteração Principais cuidados no préoperatório apoio psicológico demarcação preparação da área para cirurgia conhecimento da indicação do dispositivo realização de teste de sensibilidade com o dispositivo indicado Pósoperatório imediato visualizar efluentes não exercer pressão abdominal primeira troca deve ser realizada pela equipe de enfermagem com higiene criteriosa realizar o corte do dispositivo bolsa coletora do tamanho exato do estoma Tipos de ostomias Alimentação Gastrostomia procedimento cirúrgico ou percutâneo que consiste na confecção de uma fístula entre o estômago e o exterior através da parede abdominal com colocação de um cateter 270 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP jejunostomia inserção de um cateter com 20 a 30cm no duodenojejuno com finalidade descompressiva ou para alimentação sendo a indicação mais usada Eliminação Colostomia procedimento que promove desvio do trânsito intestinal mediante a construção de um ânus artificial na parede abdominal permitindo a eliminação de fezes e gazes ileostomia esteriorização do íleo terminal geralmente no quadrante inferior di reito do abdome para desvio do trânsito intestinal ou como porção terminal do tubo digestivo urostomia intervenção cirúrgica que consiste em desviar o curso normal da via urinária Figura 1 Ostoma intestinal1 Figura 2 Ostoma intestinal1 271 Cuidados com o estoma Observar cor vermelhovivo brilho umidade presença de muco tamanho e forma fazer a higiene do estoma durante o banho com água e sabão sem esfregálo Nunca usar substâncias agressivas à pele como álcool mertiolate benzina colônia pomadas ou cremes benjoim pois podem favorecer o ressecamento da pele e o processo alérgico tomar cuidado com insetos que podem ter acesso ao estoma evitar roupas apertadas e com elástico caso ocorra alguma alteração procurar serviço médico sugerir que regularmente se esvazie e se limpe a bolsa para maiores segurança e conforto nos momentos mais íntimos Independentemente de ser definitivo ou temporário esse procedimento acarreta mudanças na vida do paciente e na imagem corporal sendo necessária a intervenção da equipe de enfermagem O enfermeiro deverá fornecer informações que facilitem a adaptação à nova con dição de vida estimular o autocuidado e ser o elo de informação entre o ostomizado e a família ou cuidador facilitando assim reabilitação valores pessoais e autoestima do paciente O profissional de enfermagem deve trabalhar também crenças medos e tabus pro duzindo a manutenção dos convívios profissional social e familiar e acompanhando a adaptação à nova condição de vida do doente Complicações em ostomias Hérnia abaulamento ao redor do estoma isquemia e necrose alteração da cor do estoma resultante da circulação sanguí nea deficiente sangramento ou hemorragia pouco frequente pode decorrer de hemostasia ina dequada tanto na parede abdominal como na mucosa da alça intestinal edema complicação comum pode ser considerado pelo trauma cirúrgico ou ma nuseio da alça intestinal no trajeto aberto da parede abdominal estenose estreitamento do estoma produzido por circulação sanguínea deficien te ou má cicatrização prolapso exteriorização ou protusão de segmento da alça intestinal que desliza na parede abdominal ocorrendo falha na sua fixação Objetivos da intervenção da enfermagem Garantir o tratamento do ostomizado e de sua família ajudálo no processo de adaptação escolher e ajustar dispositivos de modo individualizado evitando expor o cliente e a família instruir o ostomizado sobre a utilização do material ou dieta promover autoestima e autocuidado para facilitar a reabilitação promover a participação ativa da família em todo processo desde o diagnóstico 272 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Figura 3 Aspectos importantes a considerar na orientação do paciente ostomizado Os cuidados de enfermagem ao ostomizado quando iniciados nos momentos do diag nóstico e da indicação cirúrgica tendem a minimizar o sofrimento e facilitar a reabilita ção do paciente O enfermeiro deve ter uma visão holística de forma a criar capacidade para que o paciente desfrute de uma qualidade de vida igual ou melhor à de antes do estoma Existem três elementos fundamentais no cuidar de pacientes ostomizados ter conhecimento teórico sobre doença tratamentos e seus efeitos empatia e autoconhecimento habilidade prática e experiência no cuidado Autoestima e autocuidado facilitam a reabilitação do paciente Figura 3 troCA do disPositivo Limpar bem a pele periestoma retirando o resíduo medir o tamanho do estoma A placa que é colada no abdome pode ser recortada e como possui marcação de fábrica permite escolher qual o tamanho compatível com o orifício do estoma cortar o dispositivo sem deixar pele exposta sempre três milímetros maior que o estoma aderir o dispositivo à pele a primeira troca deve ser realizada por um profissional de enfermagem e assistida por um cuidador ou familiar para esclarecer todas as dúvidas incentivar o autocuidado além do apoio emocional orientar a família a retirar os dispositivos vidA soCiAl e FAmiliAr seXuAlidAde AsPeCto FísiCo ensino 273 Figura 4 Bolsa coletora adequadamente posicionada e fixada mate rial distribuído pelo SUS permitindo a drenagem de resíduos SUS Sistema Único de Saúde Referências 1 FIGURAS E IMAGENS SOBRE ESTOMAS Assistência em estomaterapia do Hospital do Servidor Público Estadual 2 GEOVANINI T OLIVEIRA JR A G Manual de curativos 2 ed rev e ampl São Paulo Corpus 2008 3 ORIENTAÇÕES SOBRE OSTOMIAS Disponível em httpwwwabrasoorgbrsite 4 ORIENTAÇÕES SOBRE OSTOMIAS Disponível em httpwwwincagovbrpublicaçõesostomiaspdf Acesso em 2009 5 SANTOS V L C G CESARETTI I U R Assistência em estomaterapiacuidando do ostomizado São Paulo Atheneu 2001 p 11332 6 SIMÕES I Cuidados de enfermagem ao doente ostomizado Revista Referência São Paulo n 9 nov 2002 274 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Higiene e conforto ivAnYse PereirA Introdução Falar sobre higiene em Cuidado Paliativo pode parecer redundante quando pensamos num contexto hospitalar No entanto se partirmos do princípio de que Cuidado Paliativo é uma filosofia de atendimento muito mais do que o espaço físico que nos cerca a hi giene parecerá ter pertinência para ser abordada num capítulo que se propõe a abordar o conforto do paciente A palavra higiene originase do grego hugieinós que ajuda a manter a saúde En tendese por higiene um conjunto de práticas de limpeza tanto com o corpo quanto com o ambiente em que se vive Durante séculos as normas de asseio inexistiram Foram neces sárias epidemias e consequentes perdas humanas para que boas práticas higiênicas fossem incorporadas ao cotidiano da humanidade Silva 2004 Ainda hoje há sociedades que vivem em condições precárias de salubridade e com grandes problemas de saúde pública Em Cuidados Paliativos a tônica não é diferente quando se fala em higiene O que muda nessa modalidade de atendimento é que os padrões higiênicos preconizados em saúde pública devem ser adaptados ao conjunto de valores socioculturais do paciente Com a adequação dos conceitos de higiene do científico e contemporâneo com o indivi dual e cultural surge o conforto do paciente A equipe que assiste o paciente e sua família deverá realizar análise sistemática e contínua do plano de cuidados objetivando sempre um planejamento assistencial viável inclusive economicamente Com o declínio clínico eou psicológico dos pacientes os cuidados voltados para hi giene e conforto físico vão obtendo dimensões cada vez maiores em consequência da per da de autonomia e dificuldade do autocuidado Essa realidade faz com que os pacientes sob Cuidados Paliativos tenham grande demanda por ajuda seja ela parcial ou integral para a manutenção de higiene corpórea integridade da pele asseio pessoal estética necessária para assegurar a sua dignidade e manutenção de seus papéis sociais ante si mesmo e a família Lembrar que essa dignidade deve ser estendida também ao preparo do seu corpo depois do óbito As práticas que usualmente têm mais impacto na higiene e no conforto físico dos pacientes estão apresentadas no Quadro Higiene do ambiente Como higiene do ambiente entendese um conjunto de práticas que faça a manuten ção da ventilação do ambiente sua iluminação adequada e a limpeza do espaço físico sem desvinculálo da identidade do paciente Os apontamentos descritos aqui podem ser 275 Quadro Práticas mais comuns para higiene e conforto Higiene do ambiente Banho de aspersão de chuveiro Banho no leito Higiene do couro cabeludo Higienes oral e íntima Adequação da cama e sua arrumação Troca de fraldas Tricotomia facial Massagem de conforto Mudança de decúbito Readequação do vestuário adaptados desde para instituições hospitalares com enfermaria de Cuidados Paliativos até hospedarias e domicílios no entanto é importante lembrar que higiene do ambiente abrange todos os espaços por onde o paciente circula O conjunto de práticas objetivando a redução do número de infecções hospitalares ou comunitárias não é fator secundário na execução da assistência ao paciente sob Cuidado Paliativo O espaço físico onde o pacien te está acomodado deve favorecer conforto acolhimento e proteção de riscos externos à sua condição clínica atual Em uma instituição hospitalar a flexibilidade nos horários de visitas a companhia permanente no quarto com entrada de crianças e um espaço no qual as famílias possam relacionarse umas com as outras são medidas importantes para que o Cuidado Paliativo aconteça de fato O maior desafio das instituições hospitalares talvez seja criar normas que possibilitem a entrada de pertences pessoais e adaptações no quarto de acordo com os desejos do paciente pois há barreiras legais a serem transpostas A permissão para a colocação de plantas fotografias e objetos pessoais de decoração são medidas possíveis e com implicações pequenas no controle das infecções hospitalares A liberação de animais para visitação hospitalar é outra medida de conforto que também poderia ser oferecida aos pacientes em Cuidados Paliativos no entanto ainda carece de regulamentação e reflexão dos profissionais da saúde sobre o assunto no Brasil Nos EUA a entrada de animais de estimação nos hospitais e hospices segue um protocolo específico produzido pela American Veterinary Medical Association AVMA4 Animais saudáveis vacinados e bemcuidados não necessariamente transmitem doenças Com bom senso e algumas precauções os benefícios das atividades e terapias com animais de estimação geralmente superam os riscos especialmente entre crianças e idosos No domicílio a higiene do ambiente deve partir do valor cultural familiar e da agre gação de novas práticas orientadas pelo enfermeiro que assiste o paciente sob Cuidado Paliativo Reconhecer e entender as limitações da família não nos exime de promover uma mudança comportamental no núcleo familiar e em suas práticas de limpeza Caberão aos profissionais as orientações sobre remoção da poeira com pano úmido e limpeza da cama 276 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP e dos utensílios utilizados com o paciente Fazer junto com o cuidador familiar mostra que a mudança é possível Desde 2004 a Joint Comission on Accreditation of Healthcare Organizations JCAHO tem em seus protocolos de controle de qualidade um programa de vigilância em infec ção para o atendimento domiciliário e hospice4 No estado de São Paulo a Associação Paulista de Estudos e Controle de Infecção Hospitalar APECIH publicou em 2004 um livro com orientações de prevenção e controle de infecções em assistência domiciliária instituições de longa permanência e outras modalidades de atendimento à saúde2 Em bora a modalidade hospice não tenha sido citada as orientações para instituições de longa permanência são passíveis de adequação e utilização nesse modelo2 Uma supervisão adequada dessa prática é demonstrada na Figura 1 Instituição Animais possui Domicílio tem contato com o paciente são vacinados Ventilação possui janelas elas se abrem facilmente Visita hospitalar foi liberado Iluminação o paciente fecha os olhos para enxergar a luz incide diretamente sobre o paciente Piso possui tacos soltos É encerado é passível de limpeza com água e sabão Limpeza quem executa realizada diariamente remove pó de móveis e utensílios Banho de aspersão A execução do banho de aspersão demanda que o paciente tenha grau de sustentação corpórea condizente com as estruturas físicas do ambiente Por exemplo barras de sus tentação tapetes antiderrapantes suporte para frascos de soros entre outros acessórios que possam facilitar a permanência do paciente sob o chuveiro em posição ortostática O banho de aspersão também possibilita que a higienização do couro cabeludo seja realiza da com mais praticidade e conforto para o paciente Enquanto o banho no leito pode representar a oficialização do declínio das funções cognitivas ou funcionais do paciente o de aspersão pode ser considerado por muitos pacientes uma prova de autonomia e enfrentamento da progressão das doenças dege nerativas Ele também pode ser um marcador do nível de independência do paciente Dependendo do estágio de reconhecimento e enfrentamento da doença ele poderá ser relutante ao banho no leito e optar pelo de aspersão em posição ortostática ainda que seja desprovido de condições físicas que assegurem a execução dessa técnica Embora seja difícil para uma unidade de internação separar os pacientes segundo critérios de demanda de cuidados não é boa prática deixar pacientes sob Cuidados Palia Figura 1 277 tivos dependentes junto daqueles mais independentes para as atividades de vida diária invariavelmente um padrão de comparação se estabelece e os sentimentos de impotência e tristeza aumentam gradativamente Para a realização do banho de aspersão há que se ter a garantia de segurança da in tegridade física do paciente Por isso é necessário checar a existência de barras de apoio e se no piso do banheiro existem falhas descolamentos e superfícies cortantes Os banhos de aspersão em posição ortostática com auxílio de uma ou duas pessoas ou com o uso de chuveirinho ou em cadeira higiênica são opções muito utilizadas para os pacientes sob Cuidados Paliativos As cadeiras higiênicas apresentam vários modelos e preços Um modelo acessível é o com adaptador universal para os diversos assentos de vaso sanitário Sempre que possível opte por um assento almofadado para prevenção de dor no momento do banho Pacien tes emagrecidos têm mais dificuldade para adaptarse aos assentos de polipropileno com consequente dor e pontos de pressão na região trocantérica portanto vale a pena improvisar com cadeiras de marfinite fazendo furos na base para o escoamento da água inclusive Nos idosos por terem a pele mais fina mais permeável e com menos pelos portanto menos protegida contra infecções o cuidado com a temperatura da água e o uso de hi dratantes depois do banho são fundamentais A secagem dos pés após o banho dificulta a proliferação de fungos e bactérias causadores de odores desagradáveis e infecções O banho antes de ser uma prática higiênica deve ser prazeroso relaxante e revigo rante Num banho de aspersão no qual o paciente se desgasta sofre com dores e sola vancos vale refletir sobre a possibilidade de realizálo no leito Afinal Cuidado Paliativo é conforto Banho no leito Habitualmente indicado para o paciente acamado muitas vezes tornase uma prática também utilizada para aqueles com sensação de extrema fadiga eou quadro de depressão O medo de deambular o esforço desencadeador de dor e o isolamento social também são situações em que o banho no leito tem indicação Em casa o banho no leito muitas vezes é a única prática higiênica possível Banheiros compartilhados e distantes da cama bem como o seu difícil acesso ainda são realidades da prática assistencial E se considerarmos que nas construções atuais o espaço é cada vez mais otimizado o cuidador tem dificuldades para transitar com a cadeira higiênica pelos cômodos da casa Por esse motivo os profissionais da saúde deveriam ter menos restrição eou resistência à execução do banho no leito nos pacientes sob Cuidados Paliativos Conversar sobre o assunto com paciente e cuidador costuma eliminar problemas e possíveis medos O paciente tem o direito de escolher a melhor prática para si O profis sional da saúde tem a obrigação de prestar as informações necessárias para uma escolha com melhores benefícios A oferta de uma cadeira higiênica a garantia de um suporte de oxigênio ou mesmo a presença de um familiar junto no banho além do incentivo ao banho de aspersão chuveiro podem auxiliar o paciente na sua tomada de decisão O banho no leito até pela sua adaptação ao mobiliário consome mais tempo em sua execução No entanto pequenos detalhes fazem a diferença na extensão do procedimen 278 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP to como a avaliação da necessidade de mais de uma pessoa para realizálo e a organiza ção do material água quente sabonete toalhas etc previamente ao procedimento Os pacientes queixamse do procedimento quando existe manipulação prolongada de seu corpo quando a água esfria e no modo como são tocados durante o processo desenca deando dor no momento e perdurando por horas Bordim e Fonseca1 verificaram que o banho no leito no paciente inconsciente ou seja com dependência total dos profissionais de enfermagem gastou o tempo médio de 50 minutos quando realizado somente por um profissional Quando porém contase com dois profissionais este tempo médio foi reduzido para 14 minutos Embora o foco do trabalho citado seja economia de tempo em Cuidado Paliativo ter duas pessoas realizando o banho é importante para minimizar o desconforto do paciente Em nossa experiência quanto mais os minutos finais se aproximam mais suavidade se faz necessária durante todo e qualquer procedimento Na dependência do quadro clínico que se apresenta procedimentos simples como movimentar as articulações para a higie nização do corpo podem tornarse demorados em função do tempo do paciente e não da execução da técnica De modo geral não se indica o uso de sabonetes perfumados talcos e óleos perfuma dos pois podem causar alergia especialmente em pacientes que evoluem com quadro de caquexia No entanto se para o paciente utilizálos for importante melhor negociar o uso e observar Uma maneira de preservar a hidratação natural da pele durante o banho é acrescentar óleo de girassol ou de canola ricos em ácidos graxos essenciais AGE insa turados à água de enxágue que é facilmente encontrado em supermercados tem baixo custo e é inodoro No mercado há grande oferta de AGEs insaturados com complementa ção de vitaminas Esse seguimento em franca expansão ainda tem um custo considerável e que onera o orçamento das famílias com pacientes acamados no domicílio Higiene do couro cabeludo A higiene do couro cabeludo promove maior conforto ao paciente e previne o acúmulo de escamas seborreicas muito comuns quando se está acamado por tempo prolongado Figura 2 279 Para o paciente acamado sem possibilidade de ser levado para o banho de asper são a higiene deve ser realizada duas vezes por semana e sempre com dois cuidadores para agilizar o procedimento A lavagem frequente do couro cabeludo ajuda a evitar a ocorrência de piolhos principalmente nos pacientes que moram em casas adaptadas sem saneamento básico e espaço reduzido O exame do couro cabeludo pacientes acamados podem desenvolver úlceras por pressão no couro cabeludo e a indicação de produtos especiais para tratamento de alterações do tecido epitelial são questões que não devem passar despercebidas pela equipe multiprofissional Existem dispositivos próprios para o procedimento no leito com um mínimo de manipulação No entanto são dispositivos que ainda têm custo elevado para uma parcela significativa da população brasileira Os membros da equipe deverão orientar a adaptação do leito para o apoio de uma bacia plástica para o escoamento da água morna utilizada no procedimento A higiene do couro cabeludo exige treinamento do cuidador para que seja realiza da no leito O quarto deve estar fechado a temperatura do ambiente compatível com a corporal e a circulação de ar contida Higiene oral Comer é uma maneira de se conectar à vida Então cuidar da higiene oral é fun damental é pelo paladar que se inicia essa conexão Pacientes com dentes devem uti lizar escova com cerdas macias e preferencialmente pequena ou infantil A indicação do tamanho da escova justificase pelo fato de que nem sempre o paciente consegue expandir a musculatura facial permitindo a higiene completa dos dentes molares Escovas menores permitem maior alcance dentário sem muito esforço do paciente Na presença de dentes amolecidos ou sangramento gengival oriente o cuidador a Figura 3 280 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP realizar a higiene delicadamente e sem pressa A contenção de sangramentos pode ser feita com o uso de água gelada e compressa de gaze embebida em soro fisiológico SF a 09 gelado Pacientes que não se alimentam por via oral também devem ter a higiene oral realizada quatro vezes ao dia Na ausência de dentes uma gaze embebida em água bicarbonatada a 10 e enrolada no dedo indicador deve ser utilizada para a higiene da gengiva e da língua de maneira suave Higiene íntima A limpeza adequada das regiões genital e anal contribui para a prevenção de corri mentos e vulvovaginites Nos pacientes acamados especialmente do sexo feminino devi do à proximidade entre o ânus a vagina e a uretra a troca de fraldas deve ser frequente e a higienização da genitália seguir os seguintes passos afaste com os dedos polegar e indicador os grandes lábios e proceda à limpeza da vulva e do períneo obedecendo ao sentido vaginaânus Isso previne problemas decorrentes do contato com fezes urina e outros irritantes que podem provocar infecção Para os pacientes acamados do sexo masculino a higiene íntima deve contemplar tração do prepúcio higiene local com água e sabonete e redução da membrana a fim de evitar a balanopostite No uso de fraldas descartáveis devese realizar a troca a cada seis hora no máximo para prevenir as der matites por fralda também conhecidas por dermatite de contato3 As de algodão embora mais trabalhosas para limpar absorvem melhor a transpiração com consequente redução das dermatites Arrumação da cama Pacientes mais dependentes devem ter sobre o colchão normal um que favoreça maior circulação sanguínea e consequente prevenção de úlceras por pressão No mer cado há uma variedade de colchões que oferece boa relação entre conforto e prevenção de úlceras por pressão no entanto há que se ter claro que o paciente é o usuário e ele é quem deve determinar se lhe é confortável ou não Um colchão de última geração e com múltiplos benefícios tecnicamente descritos nem sempre é a melhor escolha Com o paciente sob Cuidado Paliativo a prioridade deve ser o conforto o que necessariamente não está relacionado com melhor tecnologia reparadora De modo geral os colchões terapêuticos de espuma lacunar ou perfilada mais conhe cidos como colchão caixa de ovos são mais acessíveis por conta do custo relativamente baixo e pela facilidade em encontrálos em casas de colchões e hipermercados Outro benefício é a lavagem da espuma caso algum acidente ocorra com o paciente e é impor tante que os profissionais da saúde saibam orientar a limpeza Esses colchões têm prazo de validade de seis meses de uso Os lençóis devem estar perfeitamente esticados sobre a cama livres de pregas e rugas que machucam a pele além de ser trocados quando estiverem molhados Sem pre que possível manter lençóis de algodão para melhor absorção da umidade Se o paciente recebe sua alimentação no leito eleve a cabeceira e ao final inspecione a 281 cama para remover quaisquer resíduos de alimento que eventualmente tenham caído durante a refeição Qualquer sinal de hiperemia na pele deve merecer maior atenção Proteja a re gião avermelhada com hidratantes faça massagens que irão ativar a circulação e se possível exponha a região ao calor A higiene rigorosa da pele é a maior arma que se tem para se prevenir ou deter a evolução de uma escara Por isso em caso de pequena lesão aberta essa deve ser lavada com água e sabão e não sofrer pressão de nenhuma espécie Readequação do vestuário As roupas devem ser confortáveis simples de se vestir e adequadas ao clima e aos desejos do paciente Sempre que possível dê preferência aos tecidos de algodão por se rem macios e permitirem melhor movimentação Resíduos de produtos químicos usados na lavagem das roupas podem ser causa de irritações na pele O uso de tecidos sintéticos e inflamáveis e de colchetes correntes e alfinetes deve ser abolido evitando com isso possíveis acidentes e traumatismos É importante também que para o paciente impossibilitado de manifestar sua sensi bilidade à temperatura externa o profissional esteja atento para a colocação ou retirada de agasalhos orientando o cuidador familiar para que também esteja atento a essas necessidades no domicílio É importante que os cuidadores mantenham a calma no auxílio do vestuário Pa cientes sob Cuidado Paliativo se cansam com facilidade e por isso mesmo é importante manter vestimentas simples com aberturas laterais ou frontais e uso de velcro para fechamento Quanto a pacientes limitados a cadeiras de rodas ou poltronas optar por roupas confortáveis largas especialmente nos quadris Para aqueles com lesões extensas de pele independentemente da causa as orientações dizem respeito a adaptações de roupas e camisolas as mangas podem sem desmembradas do corpo da roupa e adaptadas ao corpo do paciente por meio dos dispositivos anteriormente citados Mudanças de decúbito De maneira ideal a mudança de decúbito deve ser realizada pelo menos a cada duas horas No entanto a mobilização no leito na fase final de vida deve ser criteriosa observe as condições do colchão no qual o paciente repousa Como elemento nor teador para maior conforto do paciente ouça o que ele próprio pensa sobre a sua aco modação avalie a dor para a execução de movimentos simples Se com movimentos simples houver dor escolha outras maneiras de prevenção de maiores agravos observe se os lençóis estão esticados e se não há excesso de cobertores na cama verifique a pele do paciente sua hidratação e quais os pontos de pressão use co xins apoios macios e hidrocoloides ver capítulo sobre feridas para proteger as áreas com risco aumentado para abertura de lesões Pacientes com lesões ósseas por exemplo não serão mobilizados com essa frequência 282 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP para o Cuidado Paliativo no domicílio orientase o cuidador a fazer uma tabela com horários para as mudanças de decúbito em associação a uma escala de avaliação de dor O objetivo é sempre conciliar formas de prevenção de maiores agravos com o máximo conforto do paciente incluindo aí a ausência de dor Considerações finais A reflexão para os cuidados de higiene e conforto no Cuidado Paliativo deve partir de que planejamento do cuidar passa sempre pela questão do tempo do indivíduo e suas possibilidades de futuro O tempo do nosso paciente é certamente diferente daquele de quem dele cuida O desconforto e a dor no cuidado geralmente são entendidos como uma ponte para melhora e recuperação breve E quando se fala em melhora geralmente a ideia remetida é a perspectiva de cura No entanto para o paciente sob Cuidado Palia tivo fora de possibilidade de cura mas com a realidade de viver intensamente o que o tempo lhe concede geralmente a barganha não vale a pena Cabe à equipe estabelecer um canal de comunicação com o paciente mantendo bom vínculo de confiança para o estabelecimento de práticas de conforto medidas reais e concretas O mais importante é não conformarse com o cuidado básico é necessária a reavaliação diária e constante para que o conforto impere Lembrar que no cuidado não cabe culpa e se ela surgir há que se ter uma reflexão da prática assistencial e uma escuta mais atenta para valores e desejos do paciente Planejar para o outro o que o profissional deseja para si não pode ser a regra e se houver regra essa deve ser sempre a de respeitar o que o paciente deseja o que ele julga melhor para si Um paciente nunca é igual ao outro ainda que a manifestação da doença seja igual para a maioria Enxergar a singularidade de cada paciente é o que nos guia para o seu conforto Referências 1 BORDIM L C FONSECA A Mensuração do tempo gasto para a realização dos cuidados de enfermagem no departamento de clínica cirúrgica de um hospital privado 2005 2 COUTINHO A P et al coords Prevenção e controle de infecções associadas à assistência médica extrahospitalar ambulatórios serviços diagnósticos assistência domiciliar e serviços de longa permanência São Paulo Associação Paulista de Estudos e Controle de Infecção Hospitalar 2004 3 HASHIMOTO M R K Estudo retrospectivo das condutas de enfermagem para assaduras na região abrangida pelas fraldas de recémnascidos 1997 Dissertação Mestrado Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo São Paulo 1997 4 RHINEHART E MCGOLDRICK M Infection control in home care and hospice 2 ed London Jones and Bartlett Publishers International 2006 283 Providências práticas para toda a família letíCiA AndrAde Introdução Em Cuidados Paliativos pressupõese que no final da vida equipe e família já tenham estabelecido um vínculo adequado e que os dois lados já tenham ciência das possibilida des e dos próprios limites Porém esse vínculo nem sempre é possível apenas se efetiva quando há tempo hábil espaço e interesse de ambas as partes Muito se fala de vínculos entre paciente e família ou entre paciente e cuidador mas pouco da necessidade de con fiança mútua entre pacientefamília e equipe de cuidados O reconhecimento de limites e possibilidades de cuidado e atenção de todos os envol vidos na questão paciente família e equipe é o ponto crucial para que a assistência pro posta surta o efeito desejado Afinal esse reconhecimento traz a tranquilidade necessária para a equipe atuar adequadamente não exigindo e solicitando demais ou de menos da família e do paciente sem ir além do que cada um pode oferecer A justa medida deve ser buscada e pode ser obtida visto que em nenhum momento o cuidar pode representar uma imposição e o ser cuidado deve ser sempre uma possibilidade e não uma tortura No que se refere à equipe é imprescindível a clareza com relação ao que o serviço se compromete a oferecer Dessa forma é extremamente importante a abordagem junto à família sobre o tipo de atenção dispensada horário de funcionamento o que se espera do cuidador familiar critérios de dispensação de medicamentos frequência das consultas ou visitas domiciliares etc O reconhecimento de limites e possibilidades o controle adequado da dor e do des conforto a ciência do diagnóstico a possibilidade de optar pelo local de sua própria morte se assim desejar e o tempo para realização dos últimos desejos e resolução de pendências legais podem garantir a tão almejada qualidade de vida nos momentos finais e uma morte digna Os estágios ou fases pelos quais supostamente passam os pacientes em processo de finalização de vida tão bem exposto nos primeiros estudos sobre o tema por Klüber Ross3 ainda nos oferecem nos dias atuais parâmetros para melhor cuidado e atenção aos pacientes A surpresa a negação a barganha a revolta e a aceitação são ainda passíveis de serem reconhecidas nos pacientes e no nosso entender nas famílias destes Não é necessário dizer que não há passagem obrigatória pelas fases citadas mas a importância do conhecimento das mesmas se dá no intuito de compreendêlas para melhor atender paciente e família já que nem sempre o desconhecimento a respeito da doença é uma realidade Em algumas situações estamos lidando com a negação e nem sempre a busca de uma segunda opinião ou o nãocrédito com relação ao que é explicado pela equipe revela uma família difícil ou nãoaderente mas traduz a surpresa pelo diag nóstico e pelas afirmações de que o tratamento curativo não é mais possível A nãoacei tação do tratamento proposto e a recusa de medicação e medidas de conforto que tanto angustiam familiares e equipe podem ser apenas revolta pela finalização da vida pela impossibilidade de cura e pela inexistência de tanto tempo de vida como cada um gosta 284 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP ria de determinar E finalmente a tristeza o recolhimento em si mesmo a necessidade que alguns pacientes apresentam de ficarem sozinhos em silêncio de não participarem das atividades em família e de estarem mais consigo mesmos não necessariamente se caracterizam como sinais de depressão mas sim de aceitação da situação que vivenciam e de desligamento progressivo da vida Com esse entendimento não há por que esperar ou incentivar uma participação mais ativa do paciente na rotina da casa e nas conversas familiares pois é possível que não haja mais esse interesse não há por que cobrar uma adesão cega ao tratamento Em algumas situações outras dores trazem preocupações ainda maiores do que as físicas e não há motivo para se falar tanto e tantas vezes sobre diagnóstico e prognóstico pois família e paciente já o sabem e às vezes já não querem mais ouvir sobre o assunto É imprescindível lutar contra a conspiração do silêncio atitude que nega ao paciente e às vezes à família a ciência do diagnóstico mas também é necessário reconhecer quando parar de abordar o assunto É preciso perceber quando o excesso de detalhes e informações e a insistência no processo de finalização de vida passam a ser uma verdadeira tortura para quem ouve em vez de fonte de conhecimento e preparo para família e paciente Atualmente a conspiração do silêncio vem sendo substituída pelo que denominamos de ditadura da verdade atitude marcada pela insistência dos profissionais em abordarem centenas de vezes junto a familiares e pacientes a proximidade da morte como se eles não soubessem o que os aguarda Cada família e paciente devem ser vistos como únicos e ter suas necessidades atendi das da forma mais adequada possível mesmo quando essas não são condizentes com as da equipe de atendimento A grande preocupação e o foco do assistente social em Cuidados Paliativos nessa fase final de vida podem ser resumidos em garantia da qualidade de vida nos momentos finais morte digna para o paciente e auxílio na manutenção do equilíbrio possível para a família Tal equilíbrio familiar referese ao respeito a tudo o que já foi mencionado e também ao trabalho efetivo junto às famílias de não somente entendêlas mas e principalmente de junto a elas propor alternativas que amenizem o sofrimento e a preocupação enfrentados Pendências e providências legais As orientações e providências tomadas junto ao paciente estão obviamente rela cionadas com o grau de consciência e o poder de decisão mantidos por ele Se cons ciente e lúcido o paciente deve ser ouvido a respeito de últimos desejos pendências e providências cuja resolução depende de sua vontade e anuência Testamentos re gistros de filhos regularização de uniões obtenção de tutelas e curatelas demandam tempo e profissionais tecnicamente preparados para orientações seguras e adequadas Tais providências devem ser tomadas junto ao paciente e seu familiar mais próximo e legalmente autorizadas evitandose que essas situações que porventura não sejam adequadamente resolvidas possam trazer preocupações e dificuldades nos momentos finais Cabe ao assistente social propiciar essa abordagem a fim de que o paciente seja orientado na busca do profissional indicado 285 São necessários cuidados especiais no que se refere a situações de famílias mo noparentais famílias compostas por um único indivíduo adulto acompanhado de seus filhos menores7 quando é o adulto que está sob Cuidados Paliativos a guarda dos filhos deve ser adequadamente trabalhada e decidida ouvindose o paciente em questão O Conselho Tutelar da região e a Vara da Infância devem ser acionados em casos de conflito pela guarda ou inexistência de responsável Estresse do cuidador familiar ou informal Denominamos cuidador4 6 aquele familiar ou responsável pelo cuidado ao pa ciente sendo o principal responsável por receber orientações e esclarecimentos da equipe assim como se constituindo em elo entre paciente e equipe para algumas demandas Em nossa prática cotidiana percebemos que o cuidador principal2 geral mente é o mais envolvido no cuidado por isso o mais sujeito a estresse e sobrecarga Por esse motivo reafirmamos sempre a necessidade quando possível da divisão de tarefas e responsabilidades entre os familiares mais próximos evitandose assim a sobrecarga de apenas um indivíduo Se para o paciente os cuidados com o controle da dor do desconforto e demais sintomas são sempre presentes nem sempre nos atentamos para algumas situações que parecem simples mas causam grande estresse para a família Essas situações que podem ser senão evitadas contornadas pela atuação dos profissionais referemse a falta de sono do paciente à noite delírios desinformação sobre diagnóstico pre conceito com relação ao uso de determinados medicamentos e conflitos familiares anteriores à doença que só tendem a ser exacerbados em situações de estresse No trabalho cotidiano com pacientes sob Cuidados Paliativos e suas respectivas famílias é quase rotina o relato de que os pacientes não dormem durante a noite solicitam a presença do cuidador o tempo todo e parecem ter medo de permanecer sozinhos considerando que alguns até relatam tal dificuldade Como parece ser uma ocorrência que não diz respeito à equipe mas sim somente à rotina da residência nem sempre atentamos para o fato de que o descanso do cuidador é imprescindível para a manutenção da saúde física e mental e para a garantia do cuidado adequado ao paciente Se não há possibilidade ou interesse de divisão de tarefas o fato de o paciente não dormir à noite seja pelos efeitos colaterais da medicação pela forma como esta está distribuída nos horários noturnos ou por medo representa também a impossibilidade de descanso para o familiar que no decorrer do dia terá a seu cargo todas as tarefas que lhe competem e à noite será novamente impedido de descansar Essa rotina em pouquíssimo tempo leva à exaustão do cuidador e à impossibilidade de manutenção dos cuidados adequados Reunião familiar É sempre indicada a realização de uma reunião de família com o objetivo de cla rificar os demais membros sobre a proximidade da morte e de uniformizar as infor mações geralmente centralizadas no cuidador principal Essa prática quase sempre traz tranquilidade para o indivíduo que passa a não se ver como único detentor de informações e angustiado pela cobrança dos demais familiares pela cura que não 286 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP vem A realização dessa reunião deve ser uma prática adotada pelas equipes de aten ção em Cuidados Paliativos principalmente nos âmbitos hospitalar ambulatorial e de enfermaria onde geralmente a presença de somente um ou dois familiares mais próximos ao paciente é possível o que invariavelmente impossibilita a participação de outros interessados No domicílio é mais comum principalmente nos dias finais a presença de mais pessoas que se envolvem no cuidado estando mais esclarecidas sobre o processo de doença ou de morte pelo qual passa o paciente As situações em que há mais de uma família envolvida nos casos de uniões ante riores o cuidado na abordagem é imprescindível Nem sempre as separações ocorre ram de forma consensual e há casos em que a mágoa ainda permanece em ambos os lados Quando é desejo do paciente rever antigos companheiros ou filhos distantes pela separação anterior tal providência deve ser tomada em consonância com a família atual do contrário essa atitude poderá exacerbar conflitos antigos ou fazer surgir novas mágoas Como já afirmado cabe à equipe o auxílio na manutenção do equilíbrio familiar na perspectiva de que este se mantenha após o falecimento do paciente Ocorrência da morte no domicílio Se o foco é sempre a manutenção da qualidade de vida nos momentos finais morte digna e garantia do equilíbrio familiar possível a morte no domicílio do pa ciente sob Cuidados Paliativos hoje representa grande ponto de discussão Nem todo paciente tem condições de falecer em casa nem todos optam por isso e nem todas as famílias podem aceitar tal desenlace Se por um lado morrer no do micílio pode trazer conforto para o paciente por estar em um ambiente que lhe é fa miliar respeitando seus desejos e estando próximo da família por outro pode causar extrema angústia para os familiares que estarão mais perto por trazer a sensação de impotência ou de não ter feito o suficiente podendo acarretar complicações no processo de luto dos envolvidos1 Além disso o significado de morte o quadro clínico do paciente a organização da família e as questões burocráticas devem ser bem avaliados pela equipe em conjunto com a família A agonia respiratória a dispneia a possibilidade de sangramento e a dor incontrolável são sempre fatores que inviabilizam a morte em casa por causarem demasiado sofrimento para paciente e familiares Quanto ao paciente estar em casa pode proporcionar sofrimento maior do que o esperado e passível de ser controlado no ambiente hospitalar e com relação à família a sensação de não ter evitado a dor ou de ter sido responsável por tamanha agonia é a causa do sofrimento Mesmo que tudo tenha sido minuciosamente explicado a razão nesse momento não se sobrepõe à emoção de se presenciar tamanha dor Por esse motivo essa si tuação não deve ser imposta com a justificativa de que era um desejo do paciente se esse desejo não for extensivo à família e se as situações citadas não forem ade quadamente abordadas a ocorrência da morte em casa constituirseá em violência para paciente e família e a nosso ver irresponsabilidade da equipe Além disso as questões burocráticas que se apresentam devem ser antecipada mente solucionadas a família deve ter informações precisas sobre o que fazer logo 287 após o óbito a quem recorrer para a obtenção da declaração de óbito e os procedi mentos de praxe própria equipe médico da família ou na impossibilidade desses comunicar à delegacia mais próxima do bairro serviços funerários disponíveis na re gião documentos exigidos e todas as demais questões burocráticas que nem sempre são explicadas e que trazem tantos transtornos quando não encaminhadas da forma adequada Sugerese que o assistente social atuante na equipe elabore uma cartilha de orientações com as informações necessárias a ser distribuída na reunião de família ou em intervenções próximas ao falecimento do paciente Nessa cartilha é importante constar as informações apresentadas no Quadro Quadro Sugestão de informações que devem constar na cartilha de orientações sobre o óbito Observações Documentos do paciente a serem apresentados na ocorrência do óbito para a obtenção do atestado de óbito Cédula de identidade RG CPF certidão de nascimento ou casamento e comprovante de residência para que o endereço seja obtido de forma precisa O atestado de óbito deve ser fornecido pelo médico que vinha prestando assistência ao paciente desde que não haja suspeita de morte violenta ou inesperada5 No caso de impossibilidade outras alternativas devem ser criadas conjuntamente entre equipe e família Documentos a serem apresentados no serviço funerário Além dos documentos acima acrescidos do atestado de óbito cartão do INSS aposentadoria ou pensão e documentos comprobatórios de posse de túmulo se houver Lembrar que o familiar que irá providenciar a documentação e a compra do serviço para o sepultamento também deve estar de posse de sua documentação pessoal com foto cédula de identidade Serviço funerário Endereços e telefones das agências funerárias da região ou do município com horário de funcionamento Atentar para o fato de que nem todas as agências atendem 24 horas e acrescentar informações de como realizar o sepultamento gratuito para os casos em que haja essa necessidade lembrandose sempre de que tal prerrogativa é um direito garantido por lei RG registro geral CPF cadastro de pessoa física INSS Instituto Nacional do Seguro Social 288 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Representações e significado da morte Diante do exposto cabe aos profissionais entender e respeitar o significado da morte para paciente e família questões religiosas devem ser sempre abordadas e crenças que em uma análise superficial parecem sem sentido consideradas pela equipe na avaliação sobre o local onde ocorrerá o óbito Por exemplo resguardados os devidos cuidados e preparos indicase o domicílio como local mais indicado para o óbito nas situações em que a religião professada pelo paciente regulamenta que somente um membro designado pelo grupo religioso poderá tocar no corpo após o fa lecimento Já nos casos em que se espera que não haja a ocorrência de autópsia para preservação do corpo e tanto a equipe quanto a família não conseguirão garantir o fornecimento do atestado de óbito o mais indicado é que o paciente faleça durante uma internação programada em que a equipe tenha ciência do caso e possa auxiliar adequadamente nesses momentos finais Nas situações em que apesar de todo o trabalho realizado pela equipe o núcleo familiar não consegue perceber a morte daquele indivíduo como uma ocorrência na tural mas a vivencia como uma situação extremamente traumática não há por que incentivar o óbito no domicílio mesmo que seja esse o desejo do paciente Devese abordar tal assunto demonstrando o quanto essa ocorrência pode ser traumática para esses familiares e o quanto isso pode representar um processo de luto compli cado para os que ficam Há que se respeitar a autonomia do paciente mas essa au tonomia é sempre relativa e partilhada quando se vive em família e principalmente quando se vive uma situação de dependência de outrem como nos casos de doenças em fase final de cuidados Deve existir um cuidado especial por parte da equipe nas situações em que há envolvimento de crianças e caso seja um dos pais que está sob Cuidados Paliativos É um direito de o indivíduo deixar ou recusar a participação de seus filhos em seu processo de morte Muitos adultos ainda optam por seus filhos pequenos não esta rem próximos quando ocorrer o óbito não com o intuito de negar a morte mas de não forçálos a presenciar esse desenlace Essa participação nunca deve ser motivo de insistência da equipe com a justificativa de que é necessária a naturalização da morte paciente e família são autônomos para decidir o que querem para si e para seus filhos e devem ter o direito de até o final definir qual a imagem que querem que seus filhos mantenham de si próprios Conclusão Com as informações e orientações apresentadas é necessário que o assistente social tenha disponibilidade de oferecer sempre apoio e escuta Tempo disponível e espaços adequado físico e emocional devem fazer parte da rotina desse profissional que atende em Cuidados Paliativos Em algumas ocasiões só é necessário estarmos junto da família ouvir entender e esperar não há mais o que ser dito quando tudo já foi explicado não há mais o que cobrar quando tudo já está sendo feito E é essa a abordagem mais difícil a necessidade que temos de nos mostrar ativos em inter venções e atividade constantes faznos esquecer de que às vezes só é necessário estarmos presentes e o não fazer já é por si só uma ação 289 Referências 1 COLIN M P Luto estudos sobre a perda na vida adulta São Paulo Summus Editorial 1998 2 DUARTE Y A O DIOGO M J D Atendimento domiciliar um enfoque gerontológico São Paulo Atheneu 2000 3 KLUBERROSS E Sobre a morte e o morrer São Paulo Martins Fontes 1969 4 LAHAN C F ANDRADE L O cuidador In JACOB FILHO W Avaliação global do idoso São Paulo Atheneu 2005 p 17180 5 LAURENTI R MELLO J HELENA P O atestado de óbito São Paulo Centro Brasileiro de Classificação de Doenças Ministério da Saúde Secretaria de Vigilância em Saúde 1996 6 SANTOS S M A Idosos família e cultura um estudo sobre a construção do papel do cuidador Campinas Alínea 2003 7 VITALE M A F Famílias monoparentais indagações In Rev Serviço Social e Sociedade São Paulo Cortez XXIII n 71 p 4562 2002 290 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP As últimas 48 horas de vida Ariel de FreitAs Quintão AmériCo Como é morrer a gente entra em coma Dói como são as últimas horas Introdução Muitas questões envolvem os últimos momentos de vida As incertezas são a abso luta verdade dos momentos que cercam a morte Detalhes pequenos são questionados ora devido ao humano desejo de controle ora por questões espirituais ora por questões desconhecidas da nossa consciência Ter controle da situação reduz a possibilidade de variação o medo e a ansiedade Questões pessoais antigas são redimensionadas e podem se dissolver pela proximidade do fim esperado As últimas horas costumam ser inundadas de tristeza melancolia e saudade Desejos de paz boa partida e boa hora Assim como o nascimento o momento da morte é único e sozinho Cuidadores e fa miliares o descrevem de forma sucinta como um momento de muito sofrimento mesmo quando os sintomas estão bem controlados A conceituação precisa do início das últimas horas não é exata na literatura Entre tanto essa definição transcende a necessidade real que é a identificação desse momento cercado de sintomas exacerbados e que exige alteração do planejamento de tratamento e cuidado contínuo As últimas horas do paciente em fase final de vida são a continuidade da evolução progressiva de sinais e sintomas Entretanto devemos estar preparados para o apareci mento de novas causas de sofrimento tanto para o paciente quanto para a sua família O uso de recursos terapêuticos de forma fútil ou obstinada repetição de exames uso de respiradores infusão de medicamentos vasoativos e outros procedimentos essenciais à manutenção de funções vitais deve ser evitado pois seus efeitos são nocivos e os benefí cios são menores Submete as pessoas a mais dor e sofrimento do que sua própria doença lhe provocaria Isso acontece nos ambientes em que não se aceita a morte como evento natural e esperado ou onde os profissionais têm medo de infundada responsabilização civil ou criminal2 O uso desmedido desses recursos pode resultar num número crescente de pessoas completamente dependentes do suporte hospitalar de última geração sem possibilidade de contato com sua família e sem individualidade como em situações de internação em centros de terapia intensiva A morte não deve ser antecipada nem adiada12 Esses fatos vitimam qualquer sistema de saúde com custos elevados e sofrimento da equipe Esta ao final de tudo experimenta grande frustração por não poder alcançar o objetivo que lhe parece único o da imortalidade 291 Cuidados Paliativos das últimas horas Compreendem o conjunto de condutas e cuidados com o paciente que se encontra em rá pido declínio funcional por causa irreversível nos seus momentos finais O objetivo que deve mos ter nessa fase é promover o controle dos sintomas de forma completa prevenir os agravos das últimas horas de vida suavizar a agonia final além de evitar tratamentos que possam ser considerados fúteis nessa fase Devemse evitar investigações clínicas e procedimentos que não se prestem exclusivamente a melhor compreensão e manejo dos sintomas Reconhecer o processo de morte é uma das tarefas mais difíceis no campo da medi cina É perceber que a partir de um determinado momento da evolução de um doente as disfunções são irreversíveis e todo tratamento que tenta o prolongamento da vida implica prolongamento do sofrimento As atitudes recomendadas são preservar a vida sem tornar o tratamento mais sofrido que a própria doença e atender prioritariamente às necessidades do doente em termos de alívio de sintomas12 O quadro clínico do doente Quadro 1 deve ser reavaliado se possível duas ou mais vezes ao dia Novas decisões devem ser consideradas sempre que necessário Nas últimas horas o paciente se torna progressivamente mais ausente da vida Não consegue mais se comunicar alimentarse ou movimentarse Até mesmo a ex pressão facial muitas vezes sugestiva de dor ou sofrimento tornase difícil de ser inter pretada Os familiares percebem a gravidade e irreversibilidade do quadro Quando esse momento é calmo tanto pelos cuidados ao paciente quanto pela resposta do mesmo aos tratamentos a espiritualidade da família pode transformar o momento de partida Então a morte acontece com serenidade Quadro 1 Quadro clínico das últimas horas Fase final últimas 48 horas Anorexia e nenhuma ingestão de líquidos Imobilidade Alteração cognitiva e sonolência eou delirium Mioclônus Dor Colapso periférico falências funcionais Ronco final Internar OU tratar em casa com consentimento ÓBITO Principais sinais sintomas e tratamento das últimas horas da vida Quando todos os sintomas que serão apresentados se exacerbam e começa a emergir quadro de morte próxima e irreversível a sobrevida média do doente é de horas a dias 292 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Esse quadro é chamado de últimas 48 horas processo ativo de morte agonia terminal ou simplesmente agonia2 Os sintomas mais indicativos dessa fase e sua conduta são descritos a seguir Anorexia Nas últimas 48 horas as atividades metabólicas estão diminuídas ocasionando uma anorexia fisiológica O doente pode não ter nenhuma ingesta de alimentos e a aceitação de líquidos se torna progressivamente mais difícil Forçar a alimentação por meio do uso de sondas enterais pode ser considerado um procedimento iatrogênico na medida em que provoca desconforto físico tanto pela presença da sonda em si como por novos sintomas que podem surgir como náuseas vômitos risco elevado de aspiração brônquica sensa ção de plenitude e desconforto abdominal A falta completa de aceitação de líquidos nas últimas horas é bem tolerada pelo paciente CondutA A hidratação artificial nessa fase deve ser cuidadosa para evitar acúmulos e edemas desnecessários assim como quadros de congestão pulmonar e desconforto respiratório A via subcutânea SC pode ser a melhor escolha principalmente em ambiente domiciliar Suporta um volume de até 1500 ml diários de soluções isotônicas num mesmo ponto de infusão4 Hidratar os lábios com gaze molhada ou cubos de gelo pode ser confortante1 Imobilidade Característica muito comum aos doentes em final de vida O doente não consegue mais se movimentar Contudo devese movimentálo cuidadosamente a fim de evitar desconfortos CondutA A equipe e os cuidadores domiciliares devem ser muito bem treinados para rea lização da movimentação passiva do doente e auxílio ativo nas transferências as quais devem ser evitadas por serem muito desconfortáveis e dolorosas nessa fase Familiares devem ser orientados quanto à limitação desse momento Insistências e tentativas desnecessárias devem ser evitadas Ordens explícitas sobre prevenção de úlceras de pressão mobilização cuidados com pele e mucosas mobilização passiva não devem faltar às prescrições Familiares devem ser estimulados a tocar no paciente como forma de expressar carinho conversar ainda que o mesmo não esboce respostas e evitar conversas desagradáveis no ambiente Devese manter o quarto o mais calmo possível estendendose também às atitudes de todos os membros da equipe de saúde Todas as alterações de condutas intercorrências e impressões do caso devem ser anotadas no prontuário Sonolência No final o doente dorme praticamente todo o tempo embora continue sendo desper tável em alguns raros momentos Pode se comunicar precariamente abre os olhos com muita dificuldade e momentaneamente retornando ao sono a seguir 293 CondutA Esse sintoma é esperado nas últimas horas e não justifica redução ou suspensão das doses de sedativos Entretanto a avaliação dos medicamentos deve ser considerada se a sonolência surgir concomitante ao início do uso dos medicamentos Alterações da cognição Sintoma frequente na maioria dos pacientes variando em intensidade Nessa fase a memória e o raciocínio se deterioram As respostas são demoradas e por vezes inade quadas ou inexistentes Em alguns momentos podem surgir visões alucinações e expe riências sensoriais diferentes O doente fala com pessoas que não vemos comunicase com parentes mortos há muito tempo sinais que podem ser avaliados do ponto de vista místico por familiares Seu olhar se torna fixo e muito profundo Nas últimas horas podem surgir quadro de delirium e agitação motora ou simplesmente um rebaixamento progressivo do nível da consciência caracterizando um semicoma e coma que antecedem a morte O delirium terminal frequente em 80 dos pacientes com câncer avançado na última semana é sinal de deterioração funcional significativa e indica a proxi midade da morte O delirium da fase final pode estar relacionado com vários fatores como hipóxia variações tóxicometabólicas como uremia encefalopatia hepática infecções desi dratação acúmulo de medicamentos como os opioides anticolinérgicos e diazepínicos3 CondutA Alterações da cognição e pequenas alucinações devem ser toleradas Intervenções medicamentosas são recomendadas quando o delirium se torna agitado e representa ameaça ao conforto e à segurança do doente São elas instituir uma hidratação de até 1000 mldia pode prevenir a instalação do quadro Podese optar em fazêla no período noturno reavaliar e ajustar dose dos opioides em torno de 20 a 30 abaixo da dose an terior nos casos de oligúriaanúria dando preferência às infusões contínuas ou opioides de curta ação utilizar medicamentos que devem ser ajustados de acordo com a necessidade Neu rolépticos em baixas doses são suficientes para controlar o delirium4 na maioria dos casos podendo a dose ser ajustada de acordo com a demanda individual Quadro 2 Os medicamentos podem ser usados por via parenteral contínua controlada por bomba de infusão isoladamente ou associados a outros fármacos As constantes reavaliações pos sibilitarão a titulação das doses adequadas Quadro 2 Neurolépticos mais usados1 3 Medicação Forma de administração Considerações Haloperidol 1 mg via oralsubcutânea a cada 6 ou 8 horas 2 mg subcutânea Em caso de urgência Clorpromazina 125 mg a cada 12 horas 294 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 3 Medicação Forma de administração Considerações Midazolam A partir de 1 mghora Infusão contínua 5 a 75 mg bolo SC ou EV No momento da crise Clonazepam 1 a 3 mg VO gotas 2 ou 3xdia Dose tetodia 20 mg Fenitoína 300 mgdia EV Se já em uso anteriormente SC subcutânea EV endovenosa VO via oral Associar medicamentos A conjugação de delirium mais agitação pode requerer a associação de um ansiolítico de curta ação em pequenas doses ou infusão contínua O medicamento mais usado é o midazolam por infusão contínua de 05 até 6 mghora ou SC em bolo de 25 a 5 mg inicialmente3 6 Mioclônus Os abalos musculares involuntários são frequentes e indicativos de neurotoxicidade Podem ser secundários a medicamentos distúrbios metabólicos uremia hipóxia de sidratação ou por edema do sistema nervoso central SNC no caso de tumores e me tástases centrais São precursores de convulsões e devem ser controlados o mais rápido possível No domicílio o cuidador deve ser minuciosamente orientado para reconhecer o sintoma e comunicarse rapidamente com a equipe assistente1 6 CondutA Nessas condições a prevenção é fundamental e são utilizados anticonvulsivantes como apresentado no Quadro 3 Exacerbação da dor e da dispneia Sintomas que estavam sendo razoavelmente controlados podem se exacerbar nos últimos dias de vida e tornaremse refratários à terapêutica habitual O tratamento de sintomas como dor e dispneia deve ser mantido até o final da vida mesmo quando se instala um coma e não se conhece mais a dimensão do sintoma A dor é um sintoma pre ponderante entre pacientes em Cuidados Paliativos mas dificilmente surge nessa última fase se já não existisse previamente A suspensão abrupta de sedativos e opioides pode levar à abstinência física e provocar desconforto desnecessário ao doente Entretanto a suspensão de fármacos coadjuvantes como antidepressivos pode ser necessária a fim de evitar efeitos adversos exacerbados e dificuldade de controle dos efeitos colaterais6 CondutA Para o controle da dispneia afastadas as possíveis causas reversíveis como derrames pleurais infecções respiratórias ou desconforto causado por ascite por exemplo o medi camento de escolha é a morfina em baixas doses associada ou não a benzodiazepínicos como o midazolam ambos em infusão contínua e parenteral A dose inicial da morfina 295 para alívio da dispneia em doentes em final de vida é de 10 mg24 horas No caso do midazolam podese iniciar com infusão de 05 mghora a 1 mghora Quanto aos broncodilatadores só devem ser indicados nos casos de comprovado broncoespasmo Os corticoides como hidrocortizona 300 a 500 mg IV podem ser usa dos no broncoespasmo e também nas condições em que seu uso como antiinflamatório pode ajudar a reduzir um edema peritumoral que provoca dispneia como nas linfangi tes pulmonares compressões de veia cava superior compressões de traqueia por tumo res extrínsecos4 8 A eficácia dos corticoides é variável e seu emprego deve ser seguido por avaliação contínua e descontinuado se ineficaz6 O excesso de secreção brônquica pode ser aliviado pelo uso de anticolinérgicos como indicado a seguir na conduta para ronco Para controle do quadro álgico os analgésicos usados anteriormente devem ser mantidos em doses equipotentes procedendose aos ajustes necessários para a via de administração escolhida A via endovenosa EV só deve ser utilizada para as infusões contínuas A via SC porém pode ser usada para infusão contínua ou intermitente de opioides O controle do quadro álgico pode ser mantido por meio de opioides O mais usado é a morfina que permite ampla utilização devido ao fato de colaborar para o controle de outros sintomas dispneia fadiga e tosse além da facilidade de adminis tração por várias vias e ausência de dose teto3 O uso do fentanil transdérmico também deve ser considerado em relação à facilidade de administração e sua potência Colapso periférico As perdas de função orgânica que se desencadeiam nesse processo levam ao colapso periférico caracterizado por palidez cutânea extremidades frias pele marmórea e cia nose periférica São comuns as alterações de padrão respiratório com irregularidades no ritmo e períodos cada vez mais prolongados de apneia CondutA As vias de administração de medicamentos necessitam ser reavaliadas e adaptadas a cada caso Os acessos venosos periféricos tornamse difíceis e as repetidas tentativas de punção podem ser bastante dolorosas Acessos venosos centrais não devem ser instalados nessa fase pelo alto risco que representam e por não se encontrar justificativa diante do quadro clínico instalado É de grande valor nessa fase o manejo adequado da hipodermóclise7 ou acesso subcu tâneo Por meio da instalação de um pequeno scalp do tipo buterfly de calibre 25 ou 27 no tecido celular subcutâneo preferencialmente abdominal podese proceder à hidratação do doente e administrar fármacos diversos A maioria dos medicamentos essenciais ao controle de sintomas nessa fase pode ser administrada por via SC com boa efetividade e sem efeitos colaterais indesejáveis Quadro 4 Ronco É evento comum à maioria dos doentes e caracterizase por uma respiração rui dosa plena de secreções Tem como causa a incapacidade de deglutir saliva e outras 296 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP secreções É um dos sintomas que mais incomodam os acompanhantes e a família provocando sensação de sofrimento CondutA O ronco deve ser prevenido ou minimizado O emprego de anticolinérgicos em doses generosas como a hioscina 10 a 20 mg a cada 4 ou 6 horas é suficiente para atenuar o sintoma Devem ser evitadas as repetidas aspirações de vias aéreas pelo desconforto que causam ao doente Na escolha de outros medicamentos nessa fase considerar aqueles de maior efeito anticolinérgico Por exemplo na hora de optar por um neuroléptico a clorpromazina é mais eficiente para diminuir secreções que o haloperidol e pode ser melhor indicada nas últimas horas de vida Momento da morte As últimas incursões respiratórias podem ser longas e suspirosas ou muito superfi ciais e pausadas A cessação da respiração normalmente precede a parada dos batimen tos cardíacos Após a morte ocorre o relaxamento da expressão facial CondutA O apoio e algum preparo espiritual tornamse essenciais nesse momento Não devem ser confundidos com os rituais religiosos A religião do doente deve ser sempre respeitada e jamais o doente pode ser pressionado no final da vida a aceitar qualquer tipo de preceito religioso novo Devemse evitar atribuições de possíveis culpas temores divinos ou qualquer outra si tuação que possa induzir medo no paciente9 A assistência espiritual deve ser essencialmente amorosa livre simples como um toque ou olhar Escutar é mais importante que se fazer ouvir transmitir ao outro a presença de um acolhimento constante e sincero é essencial Considerações Nas últimas horas caracterizase uma agonia final Todos os sintomas devem ser minuciosamente tratados e antevistos sempre que possível A prevenção é a melhor medida Além da terapêutica específica medidas de conforto bem como de apoios espiritual e familiar são fundamentais nessa fase A terapêutica dirigida a pacientes em final de vida tem que seguir a lógica da racio nalidade terapêutica de forma muito cuidadosa A maioria dos medicamentos usados para o tratamento de doenças crônicas como hipertensão e diabetes podem ser sus pensos quando o paciente entra em perfil de últimas 48 horas para evitar interações medicamentosas indesejáveis Os sintomas desconfortáveis são prioridades absolutas e muitas vezes a terapêutica se dirige exclusivamente a eles11 O uso de profiláticos con tra tromboses antidepressivos diuréticos protetores gástricos a menos que se esteja em corticoterapia também não se justificam nessa fase É importante que o paciente se sinta acolhido em seu ambiente com presença contínua de alguém querido ao seu lado suficientemente capaz de cuidar de deta 297 lhes do conforto e ao mesmo tempo permitir partida serena e digna O ambiente do quarto deve ser individualizado arejado e agradável respeitando al guns hábitos do doente e de sua família Luzes fortes conversas indesejáveis e desres peitosas devem ser evitadas Em ambiente domiciliar pode ser importante que a família esteja orientada e tenha à disposição pelo menos uma dose de medicamentos como haloperidol morfina ou midazolam Quadro 4 Drogas que podem ser usadas por via subcutânea Grupo farmacológico Medicamentos Hidratantes Solução glicosada a 5 Solução glicosada 5 com eletrólitos Solução fisiológica a 09 Solução de Ringer Analgésicos opiodes Tramadol Sulfato de morfina Metadona Antieméticos Metoclopramida Ondansetron Dimenidrinato Anticolinérgicos Hioscina Esteroides Dexametasona uso isolado devido ao risco de precipitação Diurético Furosemida Antitérmicos Dipirona uso isolado Protetores gástricos Ranitidina Omeprazol administração lenta e diluída Antiinflamatórios Diclofenaco uso diluído Ketorolaco Neurolépticos Haloperidol Clorpromazina uso diluído Sedativos Midazolam Clonazepam Fenobarbital uso isolado Fonte Maciel 2006 298 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Conclusão Os cuidados dirigidos aos últimos momentos de vida requerem trabalho em equipe de forma sincronizada e detalhada respeitando a racionalidade terapêutica e as singularidades de cada paciente e sua família Medo tristeza saudade e angústia de familiares e membros da equipe não devem ser desconsiderados ou tratados apenas com medicamentos A decisão sobre o local da morte seja em hospital ou em domicílio deve ser feita em conjunto com a família previamente discutida com a equipe e consideradas as condições e recursos de apoio como estrutura domiciliar familiar e do cuidador O auxílio de um assistente espiritual pode ser importante para o conforto da família respeitando os preceitos religiosos as crenças e a história de vida do doente Ainda que várias questões sobre o processo de morte sejam desconhecidas muitos sintomas desconfortáveis podem ser controlados com carinho interesse e técnicas médi cocientíficas Cabe a nós perceber o doente como pessoa humana diante da sua maior limitação o fim da vida Esse confronto pelo qual todos nós passaremos requer humani dade carinho e amor Também exige de nós profissionais em Cuidados Paliativos o má ximo possível de conhecimento acerca desse momento e a legítima habilidade de tornálo mais sereno É fundamental que o paciente se sinta seguro e acolhido em seu ambiente com a presença contínua de alguém querido a seu lado Alguém amoroso o suficiente para cuidar dos detalhes do seu conforto e ao mesmo tempo ter o desapego de permitir uma partida serena e digna Maria Goretti S Maciel Referências 1 ADAM J ABC of palliative care the last 48 hours BMJ London British Medical Association 1997 v 315 p 16003 2 BARBOSA A NETO I G Manual de cuidados paliativos Lisboa Faculdade de Medicina de Lisboa 2006 3 BONICA J J The management of pain 2 ed London 1990 v 2 4 BREITBART W COLEN K Delirium in the terminally ill In CHOCHINOV H M BREITBART W Handbook of psychiatry in palliative medicine Oxford Oxford University Press 2000 p 7590 5 DOYLE D WOODRUFF R The IAHPC manual of palliative care 2 ed London IAHPC Press 2004 6 DOYLE D GEOFFREY H Palliative medicine Oxford Oxford University Press 2005 7 FAINSINGER et al The use of hypodermoclysis for rehydration in terminally ill cancer patients Journal of Pain and Symptom Management v 9 p 298302 1994 8 HOLLANDFREI Cancer Medicine 6 American Cancer Society BC Becker Inc Hamilton London 2003 p 110121 9 PIMENTA C A M Dor e cuidados paliativos Enfermagem medicina e psicologia São Paulo Manole 2003 10 TORRES J H R Deixar morrer é matar Revista do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo ed 43 2008 11 TWYCROSS R LITCHER I 1998 The terminal phase In DOYLE D HANKS G W C MACDONALD N Oxford Textbook of Palliative Medicine 3 ed Oxford Oxford University Press 2005 p 459587 12 WORLD HEALTH ORGANIZATION Câncer pain relief and palliative care report Genebra WHO 1990 13 WORLD HEALTH ORGANIZATION National cancer control programmes policies and managerial guidelines 2 ed Geneva WHO 2002 299 Suporte a paciente e família na fase final da doença ivone biAnChini de oliveirA Paralelamente a toda a angústia gerada pela incerteza e por outros sentimentos que existem quando se tem um familiar gravemente enfermo com uma doença irreversível e em fase final há outras questões que também trazem preocupações São demandas de ordem prática que exigem providências orientações e encaminhamentos a fim de contri buir para a organização da família frente à difícil situação que se avizinha Faz parte também desse trabalho a preocupação com provisão de recursos financeiros que deem conta de suprir as necessidades do paciente nessa fase e garantir futuramente a manutenção de seus familiares Na prática diária o profissional precisa ter discernimento para decidir o melhor mo mento de tomar providências e também percepção de que algumas propostas evidenciam às vezes contundentemente a fase em que o paciente se encontra Isso pode ser muito problemático nos casos em que a família não está preparada para a ocorrência da morte muitas vezes voltandose contra a equipe que assiste o paciente Se não houver habilidade para condução ou seja percepção de que se deve tratar de cada assunto a seu tempo as medidas que poderiam ser de grande auxílio e benefício poderão trazer mais transtornos Um exemplo disso é a possibilidade de propiciar a quebra da confiança truncando a relação entre profissionais paciente e familiares Evidentemente a percepção desse tempo que norteará as ações só pode ocorrer quando há participação efetiva dos profissionais envolvidos agindo conjuntamente e si nalizando o momento adequado para cada abordagem Optouse por dividir o foco da atenção em dois momentos para melhor organizar ações e intervenções A identificação desses momentos depende do estágio de evolução da doença Primeiro momento regularização de documentos afastamento do trabalho e benefícios O primeiro momento é quando o paciente tem o seu quadro agravado e necessita afastarse do trabalho esteja ele parcialmente dependente de cuidados eou sem pers pectiva de recuperação A reorganização da família vai requerer um aporte financeiro para o enfrentamento pois além de cuidados serão necessários aquisição de medica mentos material para curativos ou fraldas dieta ou suplemento industrializado para alimentação e contratação de uma pessoa para auxiliar nos cuidados Há às vezes necessidade de adquirir ou alugar cama hospitalar cadeira de rodas e de banho apa relho para inalação aspirador e outros equipamentos a fim de propiciar mais conforto ao paciente 300 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Dependendo da evolução da doença esse período pode ser curto mas nem por isso menos dispendioso daí a necessidade imprescindível de orientações que permitam à fa mília lançar mão de todas as alternativas possíveis para amenizar essas preocupações Documentação e regularização de estado civil É importante orientar paciente e família quanto à necessidade de a documentação pessoal do paciente estar corretamente regularizada Caso haja alguma pendência quanto à exatidão de dados ou divergência entre documentos devese providenciar a retificação Isso evita futuros problemas com a concessão de benefícios inventário etc Devese atentar para a mudança do estado civil na documentação pois é comum ca sarse e não providenciar essa alteração assim como se separar e não averbar os termos do divórcio na certidão de casamento inclusive com a determinação de pensão alimen tícia É importante também regularização de estado civil celebração de casamento ou declaração de união estável em cartório Para a comprovação da condição de companheira por exemplo a previdência exige três provas plenas É necessária a orientação sobre a existência dessas provas e sobre como reunir os documentos comprobatórios referentes à convivência sob o mesmo teto conta bancária conjunta beneficiário em seguro de vida ou seguro saúde bens adquiridos conjuntamente comprovante de residência no mesmo endereço filhos em comum e de claração firmada em cartório ou pelo próprio paciente a respeito da vida em comum O reconhecimento de filhos poderá ser feito por escritura pública ou escrito particular a ser arquivado em cartório conforme dispõe o Código Civil4 em seu art 1609 lembran do sempre da importância dessas providências para a proteção da família Portanto casarse quando possível ou registrar em cartório a declaração de união estável é recomendável para se evitar transtornos futuros assim como o reconhecimento dos filhos para não deixálos em desamparo Em alguns casos demorase tanto para tomar essas providências que com o agravamento do estado do paciente isso já não é possível quer pelo tempo exíguo ou pela impossibilidade de o paciente manifestar sua vontade Documentação de representação civil Prevendose dificuldades futuras o paciente pode nomear entre os familiares um que o represente Para isso é necessária procuração para fins definidos ou não Caso o paciente já não tenha mais condição em função de comprometimentos cog nitivos poderá ser interditado nomeandose um curador Isso visa evitar transtornos com por exemplo recebimento do benefício previdenciário e permite movimentar a conta bancária evitandose dificuldades com a própria manutenção dos cuidados e o sustento da família Lembramos que a realização de procuração é um procedimento simples pois requer somente que a pessoa manifeste a sua vontade podendo ir ao cartório ou o tabe lião ir até sua casa ou ao hospital para lavrar o documento Outro procedimento possível é a curatela que exige tempo um pouco maior e é feito no judiciário com a assessoria de um advogado Para filhos menores de pacientes viúvos ou solteiros já com a ausência de um dos pais é recomendável pensar em quem será o 301 responsável por eles quando o paciente falecer Se for possível o paciente poderá mani festar essa vontade para facilitar o processo de tutela Abrir uma conta conjunta bancária com um familiar normalmente o cônjuge quando o paciente está lúcido é uma forma rápida de facilitar a movimentação bancária garan tindo a manutenção da família Documentação e regularização de bens É também de grande importância que se regularizem imóveis com escrituras não registradas em cartório prestações vencidas de financiamento condomínios atrasados etc No caso do financiamento da casa própria são de suma importância regularização do imóvel assim como documentação pessoal do mutuário e seus dependentes pois na aposentadoria por invalidez ou no caso de falecimento quitase a dívida do financiamen to Contudo é necessário que a situação dos herdeiros esteja regular Quando há intenção de deixar testamento ou doações é necessária agilidade nessas providências para tornar a vida da família um pouco mais fácil após o falecimento Documentação de seguro Familiares normalmente não tocam em assuntos que possam parecer ao paciente que eles preveem seu falecimento Assim por se tratar de um assunto complicado para a família deixase de verificar quais são os beneficiários constantes em apólices de seguro É mais comum principalmente em seguro feito há muito tempo quando o paciente era ainda solteiro e tinha os pais como beneficiários que por ocasião do casamento e nascimento dos filhos tenha deixado de fazer a alteração da apólice na seguradora Para essa abordagem é recomendável que se perceba o momento oportuno e se eleja a pessoa da família com maior habilidade para conduzir um assunto tão delicado Essa incumbência pode ser também do assistente social que o atende desde que as condições sejam propícias PISPASEP e FGTS1 7 Uma vez regularizada a documentação é importante identificar quais alternativas irão viabilizar os recursos a que paciente e família têm direito Se o paciente foi inscrito no PIS até 04 de outubro de1988 mesmo que no momento esteja desempregado ele pode sacar a cota do Plano de Integração SocialPrograma de Formação do Patrimônio do Ser vidor Público PISPASEP conforme dispõem as Resoluções nos 1 de 151096 neoplasia maligna e 2 de 17121992 vírus da imunodeficiência humana HIV Quanto ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço FGTS tratandose de HIV o saque tem como base a Lei n 767088 e a neoplasia maligna a Lei nº 892294 que permite levantar o total existen te na conta vinculada inclusive os saldos dos planos econômicos É importante lembrar que há possibilidade de saque do PIS e do FGTS pelo titular das contas Quadros 1 e 2 caso um de seus familiares adoeça e esteja nas condições anteriormente citadas Afastamento do trabalho As orientações quanto à necessidade de justificar a ausência no trabalho por meio de relatórios médicos e realização de perícia para embasar afastamento são pontos comuns 302 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Quadro 1 Para efetuar o saque do PISPASEP é necessário estar munido de Documentação pessoal do titular Comprovante de inscrição PISPASEP Carteira de trabalho Cédula de identidade RG CPF Documentação pessoal do dependente Cédula de identidade RG Certidão de casamento ou nascimento Documentação médica comprobatória Atestado médico em papel timbrado contendo Diagnóstico expresso da doença CID Estágio clínico atual da doença Menção à Resolução n 0196 do Conselho Diretor do Fundo de Participação do PISPASEP Carimbo que identifique nome e número do CRM do médico Mencionar no relatório médico Paciente encontrase sintomático para a doença classificada na CID PISPASEP Plano de Integração SocialPrograma de Formação do Patrimônio do Servidor Público RG registro geral CPF cadastro de pessoa física CID Classificação Internacional de Doenças CRM Conselho Regional de Medicina Quadro 2 Para efetuar o saque do FGTS é necessário estar munido de Documentação pessoal do titular Carteira de trabalho original e fotocópia Comprovante de inscrição PISPASEP Cédula de identidade RG CPF Documentação pessoal do dependente Cédula de identidade RG Certidão de casamento ou nascimento Documentação médica comprobatória Atestado médico em papel timbrado contendo Diagnóstico expresso da doença CID Menção à Lei n 8922 de 250794 Estágio clínico atual da doença e do paciente Carimbo legível do médico com o número do CRM Mencionar no relatório médico Paciente encontrase sintomático para a doença classificada no CID FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Serviço PISPASEP Plano de Integração SocialPrograma de Formação do Patrimônio do Servidor Público RG registro geral CPF cadastro de pessoa física CID Classificação Internacional de Doenças CRM Conselho Regional de Medicina 303 independente de instituições ou empresas Com relação à concessão de benefícios a nor matização no caso das instituições públicas depende de cada estatuto Os empregados de empresa inclusive os domésticos e contribuintes individuais são filiados ao Regime Geral da Previdência Social RGPS Neste texto nos deteremos nas orientações específicas para o afastamento do traba lho pela Previdência Social8 Auxíliodoença O paciente que contribui para a Previdência Social filiado ao RGPS estando incapaz para o trabalho por mais de 15 dias tem direito de solicitar auxíliodoença após 12 con tribuições Essa carência8 pode ser dispensada se o paciente for portador de alguma das seguin tes doenças doença profissional esclerose múltipla neoplasia maligna tuberculose ativa hanseníase distúrbio mental cegueira paralisia irreversível e incapacitante cardiopatia grave doença de Parkinson espondiloartrose anquilosante artrose aguda nas vértebras nefropatia grave doença de Paget inflamação deformante dos ossos em estágio avançado AIDS contaminação por radiação com base em conclusão da medicina especializada hepatopatia grave Dispensase a carência mas permanece a obrigatoriedade de estar vinculado à pre vidência Poderá ainda pedir benefício o paciente que estiver em período de graça ou seja tempo durante o qual o segurado está sem contribuir mas que mantém a qualidade de segurado por ter contribuído por menos de 10 anos durante 12 meses e para os que contribuíram por mais de 10 anos 24 meses Em ambos os casos acrescentamse mais 12 meses ao período de graça se houve o registro do desemprego no Ministério do Trabalho Esse registro normalmente se dá pela solicitação do segurodesemprego O paciente pode estar há a algum tempo sem emprego sem contribuição e com seu período de graça esgotado porém se a doença teve início quando ele ainda se encontrava na condição de segurado existe possibilidade de solicitar auxíliodoença retroativo Evidentemente haverá exigências de documentação da época como rela tórios médicos declaração de internação hospitalar exames etc Quando isso ocorre o auxílio é somente da data do início da doença o que possibilita a concessão do benefício porém sem retroação do pagamento 304 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP É sempre bom reforçar que o pedido do auxíliodoença deve ser feito dentro de 30 dias da data do afastamento Se isso não ocorreu o início do auxíliodoença é conside rado a partir da data do protocolo Daí a importância de o profissional ter esse conheci mento e reforçar ao paciente ou a seus familiares sobre a necessidade de solicitar a quem presta assistência relatórios tanto para os empregadores visando ao abono dos primeiros 15 dias como para a perícia da Previdência Social Se há dúvidas sobre a concessão do benefício devese procurar uma agência do Instituto Nacional de Seguro Social INSS Não é necessário intermediário e o próprio paciente ou familiar pode agendar a perícia pelo telefone 135 É importante ter em mãos cédula de identidade cadastro de pessoa física CPF PIS carteira profissional carnês comprovante de endereço e anotações corretas do dia local e horário da perícia Quando do comparecimento à perícia acrescentar aos docu mentos os relatórios médicos com validade por 30 dias e os resultados de exames Se o paciente estiver internado ou sem condições de comparecer à agência do INSS podese solicitar perícia hospitalar ou domiciliar o auxíliodoença é um benefício temporário8 devendo o segurado submeterse periodicamente à perícia e em todas elas comprovar doença e tratamento por meio de relatórios médicos e exames Aposentadoria por invalidez O auxíliodoença se converte em aposentadoria por invalidez quando a perícia médica da previdência8 conclui que a doença é irreversível com incapacidade definitiva Isso pode ser imediato dependendo do estado do paciente ou poste rior a um período com o benefício de auxíliodoença Pode ainda ser constatado que o paciente é também dependente para as atividades diárias concedendo a aposentadoria já acrescida de 25 correspondente ao benefício de assistência permanente Esse benefício só cabe aos aposentados por invalidez e poderá ser solicitado quando o paciente que já se encontrava por algum tempo aposentado tem seu estado de saúde agravado tornandose dependente dos cuidados de ter ceiros Solicitase na agência em que foi concedida a aposentadoria A aposentadoria por invalidez permite o saque do PIS e do FGTS caso não tenha ocorrido anteriormente e a quitação do financiamento da casa própria Quanto a seguros pessoais é preciso verificar se a invalidez faz parte dos sinis tros contemplados nas cláusulas do contrato inclusive o seguro em grupo de empresa Amparo assistencial Lei Orgânica da Assistência Social Ao paciente que não possui fonte de renda e se encontra totalmente dependente é possível solicitar o amparo assistencial3 previsto na Lei Orgânica da Assistência Social LOAS Lei nº 874293 no valor de um salário mínimo Para obtenção desse benefício a renda familiar per capita deve ser menor que 14 do salário mínimo O paciente deverá passar por perícia médica por isso a necessidade de se elaborar relatório médico atestando o estágio da doença e a condição de dependência Embora seja um benefício assistencial sua concessão é feita pelo INSS que conta com infraestrutura e rede bancária para viabilizálo Assim para solicitar informações ou agendar perícia usase o mesmo número de telefone 135 305 Este benefício também cabe aos idosos maiores de 65 anos6 em igual condição econômi ca ou seja renda per capita menor que 14 do salário mínimo É importante lembrar que esse benefício não se transforma em pensão sendo extinto com o falecimento do paciente Segundo momento reorganização familiar após o óbito Em um segundo momento após o falecimento do paciente e depois de um período normalmente difícil a família procura novamente se reorganizar agora em um novo for mato revendo todos os aspectos inclusive o financeiro pois a preocupação real passa a ser a manutenção da família O conforto e a atenção dados aos familiares passa por essa compreensão e há de se achar uma forma de ajudálos efetivamente Uma abordagem cuidadosa respeitando o período de luto mas não se excedendo nesse tempo procura orientar sobre providências a serem tomadas principalmente aquelas nas quais os prazos se expiram pensão inventário documentação do financiamento da casa própria e seguro de vida É preciso inventariar as fontes dos recursos possíveis identificando as alternativas que redundarão em renda de forma a normalizar o mais breve possível a rotina e o coti diano da família Seguro de vida em grupo ou individual Cabe às pessoas que o paciente designou como beneficiárias Se entre elas houver menores o valor do prêmio que lhes cabe deverá ser depositado em caderneta de poupança e só poderá ser retirado com alvará judicial sob assessoria de um advogado O menor pode ser representado por um dos pais um tutor natural ou na falta desse um tutor nomeado Pensão por morte É o benefício pago aos dependentes habilitados após a morte do paciente que man tinha sua qualidade de segurado como contribuinte da Previdência Social8 ou se encon Quadro 3 Documentação necessária para recebimento do amparo assistencial quando inválido Cédula de identidade RG CPF Carteira de trabalho Comprovante de residência Relatório médico Resultados de exames Requerimento de solicitação do benefício Declaração do requerente ou de seu representante Fonte wwwprevidênciagovbr RG registro geral CPF cadastro de pessoa física 306 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP trava em gozo de benefício Para sua solicitação não é necessária carência mas se exige vinculação à previdência Normalmente é conversão de benefício que o paciente já estava recebendo Os dependentes habilitados são aqueles considerados pela Previdência Social cônjuge companheirao e filhos menores de 21 anos não emancipados ou inválidos Esses são chamados de preferenciais e têm sua dependência econômica presumida Há porém exigência de comprovação da condição de companheirao o que já foi mencio nado anteriormente Cabe aqui lembrar que a exesposa tem direito à pensão por morte desde que conste o direito à pensão alimentícia na averbação da separação em certidão de casamento Em tal situação a pensão é rateada entre a exesposa e a companheira assim como filhos de outras uniões desde que menores ou inválidos O prazo para ser requerida a pensão é de 30 dias depois do qual o início do benefício passa a ser a partir da data do protocolo por isso a importância de agendar pelo telefone 135 da Previdência Social o mais rápido possível sendo a forma mais simples de contato inclusive para tirar dúvidas É preciso comparecer no dia na hora e no local onde deverá ser entregue a documentação necessária para a concessão da pensão Os filhos menores serão representados por mãe ou pai tutores naturais ou quem detiver guarda e tutela posteriormente2 Quadro 4 Documentação necessária para recebimento de pensão por morte cópias e originais Documento de identificação do segurado Título de eleitor Certidões de nascimento ou casamento Cédula de identidade RG CPF Carteira de trabalho ou outro documento que comprove a atividade Inscrição no PISPASEP Carnês de recolhimento quando for contribuinte individual Certidão de óbito Comprovante de residência RG registro geral CPF cadastro de pessoa física PISPASEP Plano de Integração SocialPrograma de Formação do Patrimônio do Servidor Público No caso de companheira acrescentar as provas plenas exigidas pelo INSS ver item sobre regularização civil Filhos inválidos deverão submeterse à perícia médica Na ausência dos dependentes considerados preferenciais outros que dependem eco nomicamente do paciente como pais irmãos menores ou inválidos terão de provar essa dependência quando da solicitação da pensão É importante lembrar que o direito à pen são não prescreve porém o pagamento não retroage daí reforçar mais uma vez a impor tância de se protocolar o benefício o mais rápido possível A pensão tem o mesmo valor da aposentadoria do segurado falecido se o segurado ainda não estiver aposentado calculase uma aposentadoria por invalidez com início na data do óbito 307 caso o viúvo ou a viúva volte a se casar não perde o direito à pensão caso o dependente já seja pensionista poderá optar pela pensão de maior valor5 Quadro 5 Documentação necessária dos dependentes para recebimento da pen são por morte cópias e originais Cédula de identidade RG CPF Certidão de casamento Certidão de nascimento dos filhos menores ou inválidos Comprovante de residência RG registro geral CPF cadastro de pessoa física A pensão permite o saque de PIS e FGTS pelos dependentes por meio da certidão de dependentes que acompanha a carta de concessão da pensão emitida pelo INSS Permite também o recebimento de saldo de rescisão do contrato de trabalho do falecido Se hou ver dependentes menores todas as importâncias que a eles couberem são depositadas numa caderneta de poupança da Caixa Econômica Federal CEF Esses valores só podem ser liberados por meio de alvará judicial com assessoria de advogado Caso não haja dependentes com direito a pensão o INSS pode emitir uma certidão de inexistência de dependentes para fundamentar alvará judicial que irá liberar as impor tâncias para os familiares por ordem de sucessão Conclusão A Legislação é ampla e não seria possível colocála na íntegra mesmo porque a in tenção não é substituir os profissionais que dela têm competência como os advogados que devem sempre ser solicitados quando a situação exigir A intenção na verdade é contribuir para que o assunto seja conhecido possibilitar que o profissional que atende ao paciente e à família nessa condição reconheça quando e como encaminhar tais ques tões de forma adequada evitando perda de tempo precioso para as resoluções que dizem respeito à manutenção da família Referências 1 BARBOSA A Câncer direito e cidadania Como a lei pode beneficiar os pacientes e seus familiares São Paulo Arx 2003 2 BRASIL Lei n 8069 de 13 de julho de 1990 Estatuto da criança e do adolescente Disponível em httpwwwcresssporgbrindexaspfuseactionlegregidsubsecao9 Acesso em 16 jun 2009 3 BRASIL Lei n 8742 de 7 de dezembro de 1993 Lei orgânica da assistência social LOAS Dispõe sobre a organização da assistência social e dá outras providências Disponível em httpwwwcresssp orgbrindexaspfuseactionlegregidsubsecao9 Acesso em 16 jun 2009 4 BRASIL Código Civil Rio de Janeiro editora Escala 2007 308 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP 5 DIVISÃO DE SERVIÇO SOCIAL DO ICHCFMUSP Cartilha de Atualização de Previdência Social São Paulo 2008 6 ESTATUTO DO IDOSO Lei n 10741 São Paulo editora Saraiva 2006 7 HOSPITAL DO CÂNCER A C CAMARGO Câncer Direitos do Paciente manual de orientação sobre legislação e benefícios 8 TUDO O QUE VOCÊ QUER SABER SOBRE A PREVIDÊNCIA SOCIAL Brasília Ministério da Previdência e Assistência Social 2002 309 Aspectos particulares e ritos de passagem nas diferentes religiões luis Alberto sAPoretti Alini mAriA orAthes Ponte silvA Importância da abordagem religiosa e espiritual em Cuidados Paliativos Muitas pessoas encontram em suas crenças religiosas a ajuda para entender sofri mento significação e incerteza de sua vida As religiões procuram de algum modo miti gar a agonia de nossa finitude e nosso sofrimento Deus segundo a formulação de várias culturas não apenas suaviza a dor da mortalidade por meio da vida eterna como também alivia um isolamento temível oferecendo Sua presença eterna e providenciando um pro jeto claro para que a vida seja significativa Não há mais dúvida quanto à importância dos aspectos religiosos e espirituais no cuidado dos pacientes embora ainda haja muitos questionamentos a respeito de como acessar a dimensão espiritual do ser humano e quanto a em que consiste o bom cuida do espiritual19 34 Noventa e cinco por cento dos americanos creem em alguma força superior12 21 e 93 gostariam que seus médicos abordassem essas questões se ficassem gravemente enfermos6 32 No Brasil a maioria da população apresenta crenças religio soespirituais e as considera uma questão muito importante4 Entre os idosos a quase totalidade acredita em Deus e 95 consideram a religião importante9 Estudos com pacientes internados demonstram que 77 gostariam que seus valores espirituais fossem considerados pelos seus médicos e 48 que seus médicos rezassem com eles15 Con traditoriamente a maior parte dos pacientes disse que seus médicos jamais abordaram o tema15 Parece que o envolvimento religioso positivo e espiritual está associado a uma vida mais longa e saudável20 e a um sistema imunológico mais eficaz16 Outros estudos também demonstram que o estresse religioso negativo pode piorar o estado de saúde17 A atenção aos aspectos espirituais em Cuidados Paliativos tem tanta relevância que alguns autores ousam colocála como maior indicador de boa assistência ao paciente no final da vida34 Diante do desafio de cuidar do paciente no final da vida de maneira tão completa devemos expandir nossa compreensão do ser humano para além de sua dimensão bio lógica Na Figura podemos visualizar a representação esquemática das dimensões do ser humano29Tratase apenas de uma representação didática das diferentes facetas do homem uma vez que é totalmente impossível analisar uma sem a interferência da outra A dimensão física ϕ representa nossa biologia nosso corpo e os sofrimentos com ele relacionados como dor dispneia náuseas vômitos astenia caquexia confusão mental depressão ansiedade etc Exponho aqui os distúrbios mentais como diagnósticos médicos que fazem grande interface com a próxima esfera a psíquica ψ Nessa esfera encontram 310 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP se nossos medos raivas mágoas alegrias e tristezas os quais têm suas particularidades no paciente terminal Nas esferas social e cultural δ estão nossa etnia nacionalidade religião escolaridade classe social e os sofrimentos peculiares de cada uma Existem reli giões e etnias que lidam melhor com a morte outras não A família γ como menor núcleo de subsistência do paciente relacionase com a questão financeira e suas atribulações A esfera existencial ε engloba todas as outras dando significado e questionamentos a cada uma delas Para cada um de nós família dinheiro cultura corpo emoções e sentimentos são expressões de nós mesmos com maior ou menor importância e diferentes significa dos Por fim a dimensão espiritual ζ engloba a relação do indivíduo com o transcendente αω sendo necessário diferenciála das questões existenciais e religiosas Alguns autores consideram a dimensão existencial sinônimo da espiritual o que é uma verdade apenas em parte Todas as coisas que dão significado à vida de uma pessoa família trabalho religião etc podem apresentar clara relação com o transcendente Deus o metafísico o sobrenatural ou o sagrado A profissão pode ser por exemplo a manifestação desse sagrado na Terra Chamamos essa dimensão entre o existencial e o transcendente de espiritual A religião instituída por exemplo pertence às dimensões cultural e social e pode ser considerada espiritual se realmente relaciona o indivíduo com o seu sagrado ou transcendente Cada religião expressa o espiritual de um povo conforme suas caracterís ticas sociais e culturais Figura Dimensões do ser humano ϕ física ψ psíquica γ familiarfinanceira δ sociocultural ε existencial ζ espiritual e αω transcendente A dimensão espiritual relaciona o existencial com o transcendente seja ele Deus natureza sobrenatural ou sagrado30 311 O sofrimento humano pode nascer em qualquer dessas dimensões e é integrado pelos significado e sentido a ele associados O sofrimento espiritual se alicerça na violação da essência do eu o que se caracteriza frequentemente pela perda de sentido e identidade assim como do prazer de viver seguido então pelo desejo de abreviar a vida13 19 33 O sofrimento religioso se caracteriza pela dor moral conduzida pela quebra de dogmas e preceitos daquela religião13 Embora alguns autores vejam a distinção entre religiosidade e espiritualidade como desnecessária a espiritualidade movese para além da ciência e da religião instituída Ela é considerada mais primordial mais pura e mais diretamente relacionada com a alma em sua relação com o divino Já a religião é uma forma secun dária dogmática e frequentemente distorcida por forças socioeconômicas culturais e políticas32 Como abordar as questões relativas a religiosidade e espiritualidade Entre as dificuldades para abordar a questão espiritual no final da vida estão o próprio desconhecimento da equipe a respeito da sua espiritualidadereligiosidade e a ignorância do paciente com relação à sua finitude25 Apesar de a maioria dos pacientes desejar saber a respeito da gravidade de seu prognóstico a maior parte dos médicos não é favorável a fazêlo17 Dados brasileiros demonstram que a maioria expressiva dos pacientes idosos 83 gostaria de saber caso tivessem uma doença terminal e 77 de participar das decisões médicas quando perto da morte9 Não é possível abordar as questões espirituais sem uma real percepção da morte A morte é a última crise a ser enfrentada e a última oportunidade para o crescimento espiritual sendo seu grande desafio manter íntegra a identidade da pessoa diante da possibilidade da desintegração13 Ao se avaliar a história religiosaespiritual devese identificar sua importância na vida do paciente e de sua família assim como isso pode ser incluído nos cuidados do pa ciente Puchalski e Maugans sugerem uma abordagem inicial por meio das siglas FICA25 e SPIRIT18 como mostram os Quadros 1 e 2 Quadro 1 FICA Puchalski Faith fé Você se considera uma pessoa religiosa ou espiritualizada Tem alguma fé Se não o que dá sentido à sua vida Importance importância A fé é importante em sua vida Quanto Community comunidade Você é membro de alguma igreja ou comunidade espiritual Address abordagem Como nós equipe podemos abordar e incluir essa questão no seu atendimento Na busca pelo alívio do sofrimento e pela morte digna e pacífica a equipe deve ter como objetivo no domínio religioso que o paciente esteja em paz com o Criador receba o perdão Dele e os ritos adequados da sua tradição durante e após a morte Do ponto de 312 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP vista espiritual devemse buscar o sentimento de continuidadetranscendência a síntese de sabedoria e a percepção do legado espiritual Entre os aspectos a serem levantados durante a anamnese religiosaespiritual estão possíveis conflitos com o Criador religiosos familiares pendências com relação a ritos sacramentos obrigações e promessas perda do significado maior da existência Quadro 2 SPIRIT Maugans Spiritual belief system crença religiosa Qual é sua religião Personal spirituality espiritualidade pessoal Descreva as crenças e práticas de sua religião ou sistema espiritual que você aceita ou não Integration within spiritual community afiliação a comunidades espirituais ou religiosas Você pertence a alguma igreja algum templo ou outra forma de comunidade espiritual Que importância você dá a isso Ritualized practices and restrictions rituais e restrições Quais são as práticas específicas de sua religião ou comunidade espiritual ex meditação ou reza Quais os significados e restrições dessas práticas Implications for medical care implicações médicas Qual desses aspectos espirituaisreligiosos você gostaria que eu estivesse atento Os ritos de passagem São celebrações que marcam mudanças na condição do indivíduo As principais tran sições marcadas por esses ritos são nascimento entrada na idade adulta casamento e morte Sempre que a força de um ato é maior em seu significado simbólico do que no seu resultado prático estamos falando de um gesto ritual Os ritos constituem uma sequên cia de gestos que visam estabelecer uma conexão entre as realidades relativa do mundo consciente e absoluta ou imaterial do inconsciente coletivo3 O mundo moderno é carente de rituais claros de passagem o que frequentemente causa dificuldade na identificação de um momento para outro da vida Muitos rituais cumprem apenas uma função social o que não auxilia as pessoas a realmente transcen derem seu sofrimento A tendência hoje é fazer tudo depressa o mais indolor possível reduzindose a simbologia ao mínimo necessário7 ou melhor ao mínimo suportável Características gerais dos ritos mortuários nas diferentes religiões Os ritos mortuários se confundem com a própria história da humanidade Cinco mil anos antes de nossa era os homens neolíticos já realizavam ritos fúnebres e incinera vam seus mortos Todos os povos cada um ao seu modo e de acordo com sua cultura ritualiza a morte e crê num tipo de existência pósmorte Embora nossas culturas 313 sejam tão diversas podemos notar como tais ritos e visões do além se assemelham de forma impressionante Todas as culturas pretendem comunicar ao inconsciente uma mensagem Assim rito mortuário pretende mostrar um caminho uma realidade sim bólica a qual o inconsciente reconhece e valida Um ato que torna real o imaginário e conduz ao transcendente O rito tranquiliza pois se situa fora do tempo Os atos de preparar o corpo banhálo ungilo e vestilo reafirmam ao falecido sua condição de pessoa e prolongam sua permanência com os que ficam retardando a separação A vigília as orações e o fato de o morto dever estar sempre acompanhado garantem sua presença nesse mundo assegurando sua identidade até a hora de sua partida para o além3 Chega a hora da partida a natureza reclama o corpo Ele deve ser entregue Àquele que o criou Cada povo segundo suas tradições encontra um modo de entregar a ma téria à natureza e o espírito ao Criador Alguns buscam o suave curso das águas o corpo é colocado em uma balsa ou liber to livre no mar para encontrarse com o berço da vida as águas do liquido amniótico É uma súplica para que o espírito encontre seu novo caminho e renasça em outro local outro ventre aqui ou no imaterial A balsa se afasta e com ela afastase a morte Pode mos retornar à vida o falecido já tem seu caminho no além Sob a terra a grande estrutura que sustenta a vida repousamos enfim nosso últi mo sono Buscamos a profundidade da mãe terra como crianças se enroscando em seu travesseiro A terra nos acolhe acolhe a todos O corpo é coberto cada nova porção de terra afastanos da morte esconde nossa fragilidade apaga nossa mortalidade A terra encobre o falecido como se nada tivesse ocorrido Do pó ao pó nada apenas uma porção de pó Em breve novas vidas lá surgirão na eterna transformação que a terra propõe O fogo princípio transformador e destruidor por excelência liberta e purifica seja dos micróbios seja dos fantasmas que assombram a vida A fumaça ascende aos céus o que é imaterial retorna ao mundo dos espíritos O que é denso permanece na terra o pó A Deus o que é de Deus a César o que é de César Além de garantir ao falecido seu caminho no plano imaterial os ritos pretendem dar aos entes que ficam o conforto e a possibilidade de vivenciar a morte numa dimensão transcendente Os ritos mortuários nas diferentes religiões Cristianismo11 26 Na visão do cristianismo a morte é o despertar para a vida eterna é a ressurreição que leva à abertura da consciência para se alcançar uma realidade mais ampla e infinita A morte é considerada um momento de passagem isto é a pessoa passa de uma vida fini ta para a vida eterna Nessa visão é preciso considerar o conceito da alma que é imortal A morte é apenas a separação do corpo físico da alma Há uma aceitação do mistério da morte para encontrar uma nova vida totalmente com Cristo Os rituais de morte e luto no cristianismo têm similaridades incluindo unção velório enterro e orações cultos e missas A fé cristã tem certas orações canções e rituais que 314 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP são realizadas em volta da cama da pessoa que está morrendo Para os cristãos católicos os sacramentos são um sinal da presença de Deus Normalmente a unção dos enfermos acontece após a absolvição dos pecados A unção se destina a dar aos doentes força espi ritual e consolo durante a enfermidade Após a morte o corpo do cristão é velado no ce mitério em casa ou na igreja Durante o velório podemse entoar cantos religiosos fazer orações e celebrar missa Ao padre cabe efetuar a encomendação do corpo com leituras de textos sagrados do Novo Testamento Sete dias depois do enterro é celebrada uma missa pela alma do falecido na qual se reúnem parentes e amigos Os católicos adotam o 2 de novembro como dia de finados para reverenciar os mortos mas nada impede que parentes e amigos visitem os túmulos em qualquer outra data podendo acender velas levar flores e rezar pela alma do falecido É importante ressaltar que segundo o Papa João Paulo II a renúncia a meios extraor dinários ou desproporcionais não equivale ao suicídio ou a eutanásia exprime antes a aceitação da condição humana diante da morte Assim como é lícito o uso de narcóticos para supressão da dor e da consciência desde que o paciente não tenha deveres morais e religiosos a serem cumpridos Pio XII 195723 O próprio Papa optou no final de sua existência por permanecer em seus aposentos e não ter sua vida estendida por outros recursos Infelizmente como em todas as reli giões as angústias pessoais com relação à morte são passionalmente misturadas aos desígnios do Criador e ao desconhecimento a respeito da premissas de cada religião levando pessoas a opiniões e atitudes extremadas e fora dos princípios daquela reli gião23 A crença em milagres e na imoralidade do deixar morrer levam frequentemen te pacientes com câncer avançado a serem submetidos a terapias de suporte em unida des de terapia intensiva UTIs e reanimações cardiopulmonares desnecessárias25 Budismo8 27 No budismo a morte é parte natural da vida que todos terão de enfrentar um dia Por meio da meditação os budistas se preparam para a morte que possibilita a compreensão de que tudo é transitório e interligado Segundo Dalai Lama se quisermos morrer bem devemos aprender a viver bem se esperamos morrer em paz devemos cultivar a paz em nossa mente e nosso modo de vida O budismo crê na reencarnação conceito segundo o qual após a morte a pessoa renasce A maioria dos budistas adota a cremação No budismo tibetano quando alguém morre a família chora a perda e começa a preparar o funeral Os lamas locais ou monges se posicionam ao lado do corpo a fim de lerem o Livro Tibetano dos Mortos que é uma descrição precisa do que cada um enfrentará na outra vida uma experiência que os tibetanos chamam de bardo As palavras são destinadas a guiar o morto ao mundo do além Depois de dias de orações ao lado do morto o corpo está preparado para o funeral No Tibete o corpo deverá voltar à posição fetal ser envolvido em panos e levado a um local distante ficando como oferenda aos abutres Pode parecer triste e mórbido do ponto de vista ocidental mas os tibetanos acreditam que o corpo sem vida é totalmente inútil a menos que ele ofereça um último presente à terra servir de alimento para outros seres viventes Esse é o fim do corpo mas não da alma Durante 49 dias o espírito vagaria no além até a reencarnação Do ponto de vista do budismo tibetano a verdadeira ex periência da morte é muito importante Embora como e onde renascer sejam condições 315 que em geral dependam de forças cármicas o estado de espírito no momento da morte pode influir na qualidade do próximo renascimento Assim o modo como se morre é fun damental para um renascimento auspicioso Desse modo vemos que frequentemente os adeptos do budismo aceitam a possibilidade da morte de modo mais tranquilo e desejam respeito e paz nessa hora Espiritismo14 Segundo o espiritismo assim que ocorre a morte a alma regressa ao mundo dos espí ritos de onde tinha saído momentaneamente para mais uma encarnação A reencarnação é necessária para a purificação da alma que busca a perfeição A morte é um instante em meio a um caminho infinito É uma transição e não um ponto final Segundo a doutrina espírita de Allan Kardec só existe a morte do corpo físico enquanto o espírito imortal retorna a sua verdadeira vida que é a espiritual A doutrina espírita acaba com o conceito da morte como algo mórbido e finito a partir do momento que a encara como processo de renovação e reconstrução para outra etapa O velório é dirigido ao espírito do falecido e são realizadas preces na intenção da alma criandose um clima de vibração positiva em favor do espírito desencarnado inclu sive utilizando música Os espíritas não adotam o uso de velas nem a prática do luto Após o enterro eles não preveem cerimônia alguma Sempre que desejam e de acordo com o foro íntimo de cada um fazem preces para pedir boas vibrações para os desencarnados Segundo O Livro dos Espíritos a visita ao túmulo é uma maneira de mostrar que se pensa no espírito ausente é a imagem A prece é que santifica o ato da lembrança pouco im porta o lugar quando se ora com o coração Judaísmo2 10 O judaísmo crê que a morte é o fim do corpo material A verdadeira pessoa que é a alma é eterna A própria morte é considerada uma parte da criação No pensamento judaico vida e morte formam um todo sendo aspectos diferentes da mesma realidade complementares uma da outra A morte não significa a extinção do ser mas o começo de uma nova fase Não há para o judaísmo motivos para o prolongamento artificial da vida ou para deixar a pessoa em sofrimento exceto por desejo do próprio doente31 Assim o uso de analgésicos para alívio da dor e até mesmo a sedação para conforto são estratégias pos síveis desde que com a concordância do pacientefamília Prolongar a agonia por meio de recursos artificiais também não é justificado no entanto a suspensão de medidas já estabelecidas que causem a morte não é considerada adequada31 O enterro ocorre logo após a morte Adiar o sepultamento é visto como um desres peito para com o morto e uma interferência nos planos do Criador exceto no Shabat e no Yom Kipur A cremação não é permitida e o corpo do falecido é lavado vestido com uma roupa branca e colocado num caixão de madeira simples Os homens são enterrados com seu xale de oração Não se usam flores nem música na cerimônia O rabino faz um discurso em memória do morto e os filhos homens ou o parente mais próximo do sexo masculino recitam cantos de louvor a Deus o kadish Após o funeral a família fica de luto por uma semana shivá abstendose de quaisquer atividades profissionais ou de 316 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP lazer Parentes e amigos fazem visitas de condolências à casa dos enlutados e três vezes por dia de manhã à tarde e à noite realizamse serviços religiosos A noção de vida após a morte é uma declaração da crença na vinda do Messias que ressuscitará fisicamente os mortos Por este motivo o judaísmo proíbe a mutilação do cadáver A instituição da shivá tem como finalidade dar à família folgas psicológicas e espi rituais para continuar a vida depois da perda de um ente querido O enlutado não está só muito pelo contrário ele faz parte da comunidade dos enlutados de Sion É essa consciência de grupo que lhe dá conforto já que recebe apoio e consolo de familiares e amigos durante esses dias o que lhe permite emergir fortalecido preparado para enfren tar as vicissitudes da vida e pronto para reassumir suas responsabilidades perante o seu povo No aniversário de falecimento yahrzeit costumase visitar o túmulo do falecido e mantémse uma vela acesa durante 24 horas Os filhos recitam o kadish na véspera à noite e no próprio dia do yahrzeit de manhã e à tarde Algumas pessoas jejuam no dia do yahrzeit de um parente chegado em sinal de pesar Os chassidim entretanto conside ram o yahrzeit uma ocasião de júbilo com base no conceito místico de que a cada ano que passa a alma do falecido ascende a um nível espiritual mais alto A comunidade judaica conta em vários estados brasileiros com a Chevra Kadisha uma entidade que providencia os cuidados com o corpo e organiza o funeral de acordo com a tradição Islamismo11 26 O islamismo deixa claro aos muçulmanos que a morte e a vida são presentes de Deus Desde a infância é passada a noção de que tudo que começa tem um fim Estimulam a usar este mundo sabiamente e a fazer o bem para prepararse para a vida que está por vir Os muçulmanos acreditam no dia do juízo final na vida após a morte e em que o praticante da religião receberá sua recompensa ou punição pelo que fez na Terra A morte humana é o ingresso para a vida eterna num outro mundo Morrer não significa término da existência mas o começo da eternidade Sendo a morte e a vida presentes de Deus devem ser respeitadas como tais O sofrimento humano deve ser aliviado a eutanásia não é permitida e o uso de suporte artificial de vida deve ser desencorajado pela equipe médica Cuidados especiais devem ser tomados com o corpo em especial das mulheres O uso de sedativos e opioides para fins médicos é permitido sendo necessária uma explicação clara a respeito dos objetivos A sedação para conforto pode prejudicar as práticas religiosas e assim só será aceita se realmente essencial para alívio do paciente1 31 Constatado o óbito devemse tirar os adornos anéis brincos aliança relógio corren tes etc e posicionar o corpo olhando em direção à Meca No cemitério o corpo é retirado do caixão e despido para que se realizem três banhos Preces com a intenção de purificação serão recitadas e então uma mortalha feita de tecido branco 100 natural cobrirá o corpo Por considerar a morte uma coisa natural não há ritual de luto A primeira noite é vista como a mais difícil para o falecido então se deve orar na intenção de sua alma Nos segundo e sétimo dias missas são celebradas na mesquita sendo também costume celebrar nos 30o 40o e 60o dias bem como uma vez por ano Visitas ao cemitério são importantes para não se esquecer do falecido O islamismo 317 prega que os falecidos só conseguem um vínculo com esse mundo pelas obras de caridade que fizeram em benefício dos outros e por intermédio de seus filhos orando por eles Tradições afrobrasileiras28 Nas tradições afrobrasileiras as percepções da natureza e do mundo espiritual estão integradas e seus ritos são de acordo com essa perspectiva Ao contrário de tradições judaicocristãs não há uma separação nítida entre a vida e a morte o céu e a terra o material e o imaterial o homem e a natureza o bem e o mal Tudo se encontra unido pela enorme teia da vida No candomblé morrer é passar para outra dimensão e permanecer junto com os es píritos orixás e guias A morte é bem vista para os idosos pois completaram seu destino e podem seguir seu caminho no òrun plano espiritual ou imaterial livres das amarras terrenas e adquirindo poderes que podem auxiliar seus descendentes na Terra Já a morte de um jovem é vista como uma tragédia Prematura é entendida como uma consequência de infração grave contra os orixás ou uma inobservância de suas obrigações com a co munidade as quais os ancestrais resolvem disciplinar Os ritos fúnebres na tradição iorubá visam preparar a passagem do morto do àiyé mundo material para o òrun mundo do além assim como restabelecer as relações sociais e espirituais causadas pela ausência do falecido Quanto maior a posição social e religiosa do indivíduo maiores serão os vínculos a serem cortados e os esforços para o reequilíbrio Nada deve reter o morto no àiyé O falecido após receber seus rituais passa a ser um ancestral e poderá ser invocado como égún Esse ritual o àsèsè ocorre por sete dias após a morte A umbanda cujo nome deriva do termo quimbundo angolense quer dizer feiti ceiro xamã ou curandeiro O termo umbanda u mbanda significa arte mágica da cura ou simplesmente magia É uma religião essencialmente brasileira fruto da união entre candomblé práticas ameríndias catolicismo popular e conceitos espíritas kardecistas Segundo a umbanda após a morte o ser desencarnado será encaminhado para uma esfera espiritual condizente com seus atos e vibração emocional acumulada durante a passagem no corpo físico existindo a possibilidade da continuidade da vida no mundo espiritual ou na reencarnação A umbanda reconhece também as forças naturais na forma dos orixás do culto africano que frequentemente são sincretizado com santos católicos O funeral umbandista é dividido em duas partes purificação do corpo e do espírito que acontece somente com a presença do sacerdote um ajudante e um parente e a cerimô nia social para encomenda do espírito realizada no velório e no túmulo Esse ritual não deve ser envolvido de tristeza e sim de alegria pois o desencarnado está retornando para o plano eterno fora das ilusões e poderá retomar sua evolução de forma consciente se assim estiver preparado Finalizando Longe de querer esgotar o tema este capítulo apenas abre as portas do tema àqueles que cuidam do ser humano no final da vida Muitas são as religiões não descritas aqui 318 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP maiores ainda as subdivisões e fragmentações de todas elas No entanto podemos per ceber que em todas há relação de aceitação da morte e continuidade da existência junto ao Criador A natureza religiosa e espiritual do ser humano é uma área ainda pouco abordada pe los profissionais da saúde e tornase vital nos cuidados com aqueles que estão partindo Conhecer nossas próprias questões sobre finitude religião e espiritualidade é o ponto de partida para auxiliarmos melhor nossos pacientes A equipe deve ser treinada para aceitar os diferentes valores religiosos e espirituais não impondo conceitos próprios mas respeitando e incentivando a participação do pa ciente em sua prática A abordagem das questões espirituais e religiosas dos pacientes deve ocorrer no início do acompanhamento para que as medidas necessárias sejam tomadas em direção à reso lução de possíveis demandas de paciente família e equipe Referências 1 ALSHAHRI M Z ALKHENAIZAN A palliative care for muslim patients J Support Oncol v 3 p 4326 2005 2 ASSOCIAÇÃO CEMITÉRIO ISRAELITA DE SÃO PAULO Chevra Kadisha ACISP Dis ponível em httpwwwchevrakadishaorgbr ou httpwwwchevrakadishacombr Acesso em 20 maio 2009 3 BAYARD J P Sentido oculto dos ritos mortuários São Paulo Ed Paulus 1996 4 DATAFOLHA Disponível em httpdatafolhafolhauolcombrpodossiesindex shtml Acesso em 5 maio 2007 5 DEL GIGLIO A Cuidados com o paciente terminal com câncer segundo a tradição judaica Rev Bras de Cancerologia v 4 n 15 p 69 2001 6 EHMAN J et al Do patients want physicians to inquire about their spiritual or religious beliefs if they become gravely ill Arch Intern Med v 159 p 18036 1999 7 ELABORAÇÃO DO LUTO EXIGE RITOS DE PASSAGEM Jornal de psicologia v 19 n 130 2001 Disponível em httpwwwcrpsporgbr Acesso em 25 maio 2009 8 EWANSWENTZ W Y O livro tibetano dos mortos Editora Pensamento 2000 9 GIL L A J CURIATI J A E SAPORETTI L A Influência da qualidade de vida nas expectativas e nas decisões de fim de vida em idosos Monografia de conclusão do curso de 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689714 2004 27 RINPOCHE S O livro tibetano do viver e do morrer São Paulo Editora Palas Athena 1999 28 SAPORETTI L A SCARTEZINI S N Ritos de passagem e visão pósmorte nas tradições afrobrasileiras candomblé e umbanda In SANTOS F S org Arte de morrer visões plurais no prelo 29 SAPORETTI L A SILVA A M O P Finitude apectos éticos religiosos e espirituais In Geriatria e gerontologia básicas no prelo 30 SAPORETTI L A Espiritualidade em cuidados paliativos Cuidado paliativo Conse lho Regional de Medicina do Estado de São Paulo 2008 31 Shahid A Information for health care providers when dealing with a muslim pa tient Medical Ethics Committee Disponível em httpwwwislamusacome40html Acesso em 20 jun 2009 32 STEINHAUSER K E et al Are you at peace One item to probe spiritual concerns at the end of life Arch Intern Med v 166 p 1015 2006 33 WASNER M et al Effects of spiritual care training for palliative care professionals Palliative Medicine v 19 p 99104 2005 34 WILLIAMS A L Perspectives on spirituality at the end of life a metasummary Palliative and Supportive Care v 4 p 40717 2006 Sites de interesse Associação Cemitério Israelita de São Paulo Chevra Kadisha ACISP http wwwchevrakadishaorgbr ou httpwwwchevrakadishacombr 320 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Centro de Dharma da Paz Shi De Choe Tsog httpwwwcentrodedharmacom brindexphp Federação Espírita Brasileira httpwwwfebnetorgbr Sociedade Beneficente Muçulmana do Rio de Janeiro httpwwwsbmrjorgbr Templo Guaracy do Brasil httpwwwtemploguaracyorgbr Vaticano httpwwwvaticanvaphomepohtm 321 Assistência ao luto deborA Genezini Se perdem gestos cartas de amor malas parentes Se perdem vozes cidades países amigos Romances perdidos objetos perdidos histórias se perdem Se perde o que fomos e o que queríamos ser Se perde o momento Mas não existe perda existe movimento Bruna Lombardi 2006 Perdas Ao longo do ciclo vital nos deparamos com inúmeras perdas A definição de perda nos dicionários populares referese à privação de algo que possuíamos Podemos passar por perdas saindo ilesos da vivência no entanto algumas delas nos são caras e significativas mobilizando sentimentos conflitantes e dolorosos Quando falamos em perdas não nos referimos necessariamente à morte mas perdas psíquicas físicas materiais entre outras Autores como Fonseca e Parkes4 11 citam outros tipos de experiências que envolvem perdas como a separação entre as pessoas vivas a doença como parte da pessoa que morre o próprio desenvolvimento humano como for mas de evolução e morte a morte psíquica as amputações a perda de uma casa entre outras tantas possibilidades Desde o nascimento somos treinados por meio da vivência de perdas e mortes sim bólicas a nos aproximarmos da noção de finitude No entanto o condicionamento pelo nãoperder é imperativo não podemos perder a hora o controle da nossa rotina e não admitimos sequer deixar de ganhar uma competição Sabemos da vulnerabilidade humana e que existe adoecimento e fragilidade mas no íntimo vivemos com a ilusão de que isso só ocorre a nossa distância Contudo somos forçados a olhar para o que temíamos quando nós algum familiar ou um amigo querido adoece No caso do acometimento por uma doença que ameace a continuidade da vida não perdemos só a saúde e a ilusão de imortalidadeonipotência mas também papéis ante riormente exercidos nos contextos profissional social afetivo e econômico De acordo com Kovacs8 as perdas e suas elaborações fazem parte do cotidiano já que ocorrem em todos os momentos do desenvolvimento humano e embora sejam expe riências universais são vividas de forma particular por cada indivíduo Neste texto especificamente será abordada a atenção às situações de perdas por doença e morte e seus desdobramentos no cotidiano de pacientes familiares e profis sionais da saúde 322 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Adoecimento e morte anunciada A partir do diagnóstico de uma doença potencialmente mortal seguido pela evolução da enfermidade paciente e família deparamse com rupturas limitações e privações A rotina anteriormente vivida é alterada e situações pouco familiares como exames medi cações e procedimentos ganham espaço Ao longo das hospitalizações e dos tratamentos os membros que assumem os cuidados principais do doente necessitam conciliar papéis antigos ao novo papel de cuidador vivenciando portanto não só sentimentos geradores de sofrimento frente às perdas relacionadas com o ente querido como também às suas próprias Os arranjos familiares dos séculos XX e XXI sugerem escassez na rede de suporte familiarsocial uma vez que as famílias tornaramse menos numerosas as residências ficaram menores e as mulheres e os jovens passaram a trabalhar fora de casa Como con sequência a situação comum é que apenas um componente da família assuma o cuidado principal acarretando intensas sobrecargas física e emocional Sentimentos ambíguos podem permear a vivência ou seja além de compaixão soli dariedade e pesar os familiares podem também sentir raiva e desejo de breve retorno à sua rotina de atividades Com a piora clínica do doente a ambiguidade de sentimentos pode tornarse ainda mais evidente O aumento das reais possibilidades de sofrimento e dor do paciente pode suscitar em muitos familiares o desejo de que tal sofrimento se finde ou em oposição a isso o apego a uma ilusão fervorosa de cura e melhora mesmo que isso fuja totalmente das possibilidades viáveis Diante da ambiguidade posturas de superproteção ou afastamento podem surgir Carter e McGoldrick3 destacam que uma reação que ocorre na família quando da perda de um de seus elementos é com relação ao seu movimento que pode ser de aproximação centrípeto ou de afastamento centrífugo entre seus membros Com a evolução da doença caso o doente apresentese debilitado física e emocio nalmente pode haver a necessidade de os familiares assumirem a responsabilidade pela tomada de decisões e fazer valer a autonomia do paciente pelo que compartilharam de sua biografia até o momento atual Essa é uma das mais árduas tarefas para o sistema familiar que compreende um de seus membros gravemente enfermo Decidir por alguém mesmo que tal decisão esteja pautada no desejo do paciente reforça ao familiar uma representação de falta do ente querido Há uma representação de morte em vida Nesses casos o luto antecipatório que será definido em breve neste texto é vivenciado Pacientes afásicos comatosos demenciados grandes sequelados neurológicos extre mamente debilitados pela doença e incapacitados de exprimir decisões segundo Boss1 entram na caracterização da perda ambígua uma vez que estão vivos mas psicologica e socialmente ausentes Tal ausências podem desencadear a antecipação do processo de luto O familiar vivencia um estranhamento de si e do ente amado O ato de cuidar visando ao conforto e à qualidade de vida de acordo com o que permitir a situação estreita e in timiza o contato com o doente Isso possibilita ressignificações desse vínculo e faz muitas vezes com que as experiências sejam as mais intensas em comparação às de toda vida Porém as alterações físicas a evolução da doença e a possibilidade de morte representam um choque de realidade ao familiar que ora está intimamente e intensamente próximo 323 ao doente ora tem que iniciar a aceitação de que essa pessoa em algum momento não estará mais com ele Iniciase o que muitos autores chamam de vivência ou elaboração do luto antecipatório a exemplo de Fonseca4 que consiste na vivência de conjunto de sentimentos relacionados com a dor da notícia da existência de uma doença em estágio avançado ou da perda iminente de algum membro do sistema familiar Podese ter tal experiência nas esferas cognitiva emocional e comportamental Segundo Rando in Franco12 o processo de luto é iniciado a partir do momento em que é recebido o diagnóstico de uma doença potencialmente mortal pelas perdas concre tas ou simbólicas que essa doença possa trazer para a pessoa e sua família Para Lindermann10 a ameaça de morte ou separação pode por si própria iniciar uma reação de luto Pesquisadores sugerem que as intervenções realizadas durante o luto an tecipatório podem prevenir o desenvolvimento de problemas no luto pósmorte4 Aos profissionais de saúde que acompanharem o paciente na fase final de vida por tanto durante a vivência do luto antecipatório é importante levar em consideração a in tensidade do valor afetivo do mesmo para cada familiar Esse dado auxilia na compreensão das reações psíquicas e comportamentais e no entendimento de que há um tempo interno para aceitação e elaboração da perda peculiar a cada membro da família Na mesma proporção é necessário que também seja dada atenção aos profissionais de saúde envolvidos nos cuidados ao paciente uma vez que juntamente vivenciam o luto antecipatório Processo do luto Para o profissional que trabalha em contextos de perdas e morte é imprescindível o conhecimento a respeito da definição de luto e das reações comuns suscitadas por ele uma vez que esse evento causará muitas mudanças de comportamento nos familiares e no próprio doente Bromberg2 aponta o luto como um conjunto de reações a uma perda significativa e pon tua que nenhum é igual ao outro pois não existem relações significativas idênticas Engel apud Worden17 pontua que a perda de uma pessoa amada é psicologicamente traumática na mesma medida em que sofrer uma queimadura grave é fisiologicamente traumático Ele refere que o luto representa uma saída do estado de saúde e bemestar e assim como a cura é necessária no campo fisiológico um período de tempo é necessário para que o enlutado retorne ao estado similar de equilíbrio Worden17 lista categorias no processo de luto normal dividindoas em sentimentos tristeza raiva culpa ansiedade solidão fadiga desamparo choque anseio emancipação alívio e estarrecimento sensações físicas vazio no estômago aperto no peito nó na garganta hiper sensibilidade ao barulho sensação de despersonalização falta de ar respiração curta fraqueza muscular falta de energia e boca seca cognições descrença confusão preocupação sensação de presença e alucinações comportamentos distúrbios de sono distúrbios do apetite comportamento aé reo isolamento social sonhos com a pessoa que morreu evitar lembranças do falecido procurar e chamar pela pessoa suspiros hiperatividade choro visitar lugares e carregar objetos que lembrem o falecido 324 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Seguindo a linha de sintomas físicos e psíquicos vale destacar a necessidade de cau tela quanto ao diagnóstico de depressão da pessoa enlutada Tristeza não é depressão Depressão reativa é esperada mas a intensidade e a duração se exacerbadas podem indicar patologia A medicação pode inibir ou adiar reações necessárias para a resolução do processo de luto Para fins didáticos apresentamos as fases do luto descritas por Bromberg2 uma vez que o conhecimento dessas fases fornece bases para lidar produtivamente com os recursos disponíveis respeitando as defesas necessárias a cada uma das fases É fundamental res saltar que as fases não ocorrem de maneira rígida e não constituem regra necessária no processo de luto uma vez que existem a individualidade e a subjetividade do enlutado entorpecimento reação inicial à perda por morte em que ocorre choque entor pecimento e descrença A duração pode ser de poucas horas ou de muitos dias A pessoa recentemente enlutada se sente aturdida atordoada desamparada imobilizada e perdida Há também possíveis evidências de sintomas somáticos como respiração curta e suspi rante rigidez no pescoço e sensação de vazio no estômago A negação inicial da perda pode ser uma forma de defesa contra um evento de tão difícil aceitação estando também presente nessa fase a tentativa de automaticamente continuar vivendo como antes anseio e protesto fase de emoções fortes com muito sofrimento psicológico e agitação física À medida que se desenvolve a consciência da perda há muito anseio de reencontrar a pessoa morta com crises de profunda dor e espasmos incontroláveis de choro Apesar da consciência da perda irreversível o desejo de recuperar a pessoa às vezes é insuperável Há momentos em que o indivíduo tem a viva sensação da presença do falecido Aquilo que não tem relação com o morto tem pouco significado A pessoa se mostra afastada e introvertida Também é comum que o enlutado sinta muita raiva às vezes dirigida contra si mesmo na forma de acusações com sentimentos de culpa por pequenas omissões e cuidados que possam ter acontecido Às vezes a culpa é dirigida contra outras pessoas principalmente aquelas que oferecerem ajuda e consolo ao enlu tado que também pode dirigir a raiva ao próprio morto por têlo abandonado A pessoa enlutada vivencia inquietude como em busca do morto principal característica dessa fase e mostrase obsessivamente preocupada com lembranças pensamentos e objetos do falecido Ocorrem também sentimentos contrários ou incompatíveis como esperança e desapontamento desespero nessa fase o enlutado deixa de procurar pela pessoa perdida e reco nhece a imutabilidade da perda O enlutado duvida de que qualquer coisa que valha a pena na vida possa ser preservada assim podem surgir apatia e depressão O processo de superação é lento e doloroso É comum que ocorram afastamento das pessoas e das atividades falta de interesse e inabilidade para se concentrar em funções rotineiras ou para iniciar atividades Os sintomas somáticos persistem incluindo falta de sono perdas de apetite peso e distúrbios gastrointestinais recuperação e restituição a depressão e a desesperança começam a se entrelaçar com frequência cada vez maior a sentimentos mais positivos e menos devastadores A pessoa enlutada pode aceitar as mudanças em si e na situação Vem daí uma nova iden tidade que lhe permite desistir da ideia de recuperar a pessoa morta Dáse o retorno da independência e da iniciativa Mesmo com o processo de recuperação ainda em anda mento é comum a volta de sintomas que haviam cedido particularmente em datas que ativam lembranças como dias de nascimento morte e casamento 325 A descrição das fases permite inclusive a identificação de alterações nãoadaptativas frente ao processo de luto ao que é chamado luto complicado sendo muito útil o enca minhamento ao profissional especializado para acompanhamentos médico e psicológico Vale ressaltar novamente que o luto é um processo individual e subjetivo e que não existe uma regra rígida quando pensamos nas fases e no enfrentamento do mesmo Elizabeth Kübler Ross14 descreve as fases de enfrentamento do luto como negação revol ta barganha depressão e aceitação mas nem todo processo de enlutamento e resolução do luto compõe todas as etapas que são válidas como um norte para os profissionais que assistem pacientes e familiares em situações de doença e morte Rando13 também é outro autor que dividide as fases do luto em reconhecer a perda reagir à separação expressividade emocional recordar e reexperienciar a pessoa perdidarelacionamento objetos fotos abandonar velhos apegoselaboração reajustar para se mover adaptativamente ao novo sem esquecer o velho reinvestir Worden17 refere que considerando o luto um processo é adequado observálo em termos de estágio embora nem todos os enlutados passem por estágios em série O autor reforça que há risco de ignorar o individual e pensar de maneira literal especialmente na interpretação de profissionais novatos Segundo Walsh16 o campo da saúde mental ainda prioriza a atenção individual nos processos de luto não valorizando o impacto da perda na família como um sistema intera cional No entanto entendese que para haver um prognóstico favorável ao enfrentamento individual é necessário que se levem em consideração os processos familiares que acompa nham os efeitos imediatos e a longo prazo da morte e as cadeias transgeracionais Walsh16 estudou os efeitos da morte de um membro da família e aponta como re sultados o aumento da vulnerabilidade à doença e a morte prematura de membros so breviventes Atenção a detalhes e comunicação Em Cuidados Paliativos a comunicação é um dos principais aspectos determinantes de sucesso ou insucesso na construção de vínculo e condução do caso A comunicação é vital no curso do processo da perda Embora existam particulari dades de cada núcleo familiar quanto a cultura crença valores modo de expressão de sentimentos e dúvidas é fato que a comunicação clara facilita a adaptação A comunicação deve seguir o pressuposto da verdade lenta e progressivamente su portável O tempo necessário para que essa comunicação seja suportável só pode ser de terminado a partir da vinculação empática e do conhecimento de alguns dados familiares e individuais A boa comunicação deve ter início desde o diagnóstico e ser clara em cada etapa do processo de doença e evolução para a morte Existem algumas variáveis que podem agir como facilitadores ou afetar adversamente nos processos de luto das famílias Franco5 descreve fatores que podem interferir signifi cativamente no processo de morte e luto 326 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP natureza e significados relacionados com a perda qualidade da relação que se finda papel que a pessoa à morte ocupa no sistema familiarsocial recursos de enfrentamento do enlutado experiências prévias com morte e perda fundamentos culturais e religiosos do enlutado idade do enlutado e da pessoa à morte questões nãoresolvidas entre a pessoa à morte e o enlutado percepção individual sobre o quanto foi realizado em vida perdas secundárias circunstâncias da terminalidade Todos esses fatores oferecem ao profissional possibilidades de compreensão da dinâ mica e relação do núcleo de cuidados e facilitam o estabelecimento do ritmo e tempo da comunicação Situações de crise tendem a exacerbar padrões de relacionamento tanto positivos quanto negativos Esse dado deve ser considerado pelo profissional O padrão de comunicação da família deve receber uma atenção especial por parte da avaliação da equipe de cuidados Comunicação bloqueada permeada de segredos mitos e tabus influencia na forma com que as informações circulam dentro do sistema familiar levando a malentendidos e interferindo muitas vezes no processo de elaboração da per da Quando o profissional não está atento a esses padrões de comunicação pode acabar fazendo alianças com familiares acobertando mentiras ou sustentando silêncios prejudi ciais Segundo Carter e McGoldrick3 os terapeutas como também as equipes de saúde devem ser modelos para as famílias informando de forma factual e clara considerações sobre a morte para que assim não haja má interpretação dos consulentes e se evite a transmissão de informações distorcidas a outros membros da família A proximidade com a morte mesmo que não seja anunciada pelo médico e pela equi pe muitas vezes é clara para o doente que chega mesmo a verbalizálo gerando senti mentos de desconforto tanto para a família como para a equipe Embora a eficiência da comunicação durante todo o processo de tratamento da doença até o desfecho da morte dependa da clareza com que informações e sentimentos são expressos não exime de sofrimento para quem ouve e sente que o fim está próximo A equipe de cuidados que acompanha a família também pode ajudála a seguir em frente esclarecendo possíveis reações normais de luto Não são raros os relatos de fami liares que dizem abertamente mas eu não tenho direito de estar sorrindo sendo que eu perdi a pessoa mais importante da minha vida Autorizar a família a seguir em frente por meio de uma conversa acolhedora e franca pode desmistificar possíveis inadequações em termos de comportamentos esperados diante do luto como culpa e autorreprovação Com relação às famílias com crianças pequenas é importante segundo Walsh16 auxiliálas a abordarem a questão da morte do familiar ao invés de manteremse os véus do segredo As informações deverão ser abordadas levando em consideração as aptidões cognitivas para compreensão do fenômeno da morte conforme a idade não as sobre carregando nem as superprotegendo Grupos de irmãos geralmente são negligenciados afetivamente quando os pais estão enlutados uma vez que não estão disponíveis em recursos internos para acolher as crianças Dessa forma é importante que o profissional de saúde auxilie a identificar quem é a rede de apoio com que a família poderá contar e aponte para os membros do sistema familiar a possibilidade de acionar a rede para dar 327 conta dos cuidados básicos como quem ficará com as crianças durante as providências de funeral por exemplo A dificuldade dos pais em acolher crianças e adolescentes sobreviventes pode de sencadear nestes culpa e persecutoriedade o que só amplifica sofrimento e conflitos de toda a família As intervenções terapêutica e educativa são necessárias no luto Idosos também costumam ser excluídos de alguns passos do processo da perda pois são subestimados pela representação de fragilidade do velho o que é bastante negativo e provoca a sensação de falta de lugar ser um peso e de que ele é quem devia ter morrido Intervenções junto ao enlutado Existem alguns princípios apontados por Worden17 referentes às tarefas que os mem bros da família vivenciam durante o processo de luto A primeira diz respeito à necessi dade de tornarse mais ciente de que a perda realmente ocorreu pois geralmente há a sensação de irrealidade e de que tudo permanece igual O segundo princípio consiste em auxiliar as pessoas que sobrevivem à morte a iden tificar e expressar seus sentimentos mais comuns nesse tipo de situação como raiva culpa ansiedade desamparo e tristeza A maior parte dos enlutados procura ajuda para eliminar esses sentimentos e de forma recorrente por meio de medicação o que não é absolutamente benéfico já que não soluciona a fonte do problema Para isso é importan te estimular os sobreviventes a falarem sobre os sentimentos evocados pela morte bem como descrevêla como aconteceu quem lhe contou o que sentiu onde estava quando ficou sabendo etc O papel do terapeuta consiste em ajudar as pessoas a entenderem seus sentimentos aceitálos e na maior parte das vezes desmistificar muitos deles uma vez que por meio da terapia podemos revisitar com o paciente várias cenas vividas e entender que não há culpados O terceiro princípio baseiase em ajudar o paciente a viver sem a pessoa falecida fa cilitando a sua habilidade em tomar decisões de forma independente Worden17 descreve como ajustarse a um ambiente onde está faltando a pessoa que faleceu Já o quarto princípio está relacionado com o fornecimento de tempo para o luto pois a família geralmente tem dificuldades em entender e aceitar essa necessidade e elucidá la facilita o processo de elaboração é como autorizar as famílias a se permitirem esperar o tempo necessário para que as coisas se encaixem no seu lugar Outro ponto importante é identificar para as famílias o comportamento dito normal do luto salvo que o curso do luto seja complicado uma vez que frente a uma perda importante principalmente de um filho muitas pessoas têm a sensação de que estão enlouquecendo ou vão enlouquecer Clarificar reações normais desse processo traz maior segurança e noção de realidade às famílias e pode ser tarefa de um aconselhamento de luto Ainda com relação ao quarto princípio Worden17 diz que a tarefa do profissional não é a de ajudar o enlutado a desistir de sua relação com a pessoa que faleceu mas a de ajudálo a encontrar um local adequado para o falecido em sua vida emocional Ao longo de tarefas estratégias e recursos como linguagem evocativa utilização de simbolismos e analogias escrita desenho encenação reestruturação cognitiva evocação de memórias e imaginação dirigida podem ser utilizados seguidos por resultados bastante positivos 328 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Outras intervenções relevantes no pósmorte Com relação aos procedimentos pósmorte é interessante que a equipe de cuidados possa encorajar a família a planejar e participar de rituais memoriais funerais visitas ao túmulo etc O ritual funerário de acordo com Walsh e McGoldrick15 tem o objetivo de colocar o ente querido em contato íntimo com os familiares e amigos sobreviventes oferecendo possibilidades de despedida e de encerramento da relação para que possam então seguir em frente com suas vidas O objetivo do funeral é atingido quando ele pos sibilita que as pessoas envolvidas na perda estejam no melhor contato funcional possível umas com as outras e com o fato da morte A intervenção da equipe de saúde responsável pelos cuidados pósmorte com a família sobrevivente poderá ser um telefonema de condolências aproveitando para oferecer um momento de acolhida podendo ser dentro ou fora do ambiente hospitalar Para as famílias esse é um momento que favorece o fechamento de um ciclo com posto muitas vezes por desgaste de energia psíquica e de longo tempo de suas vidas carecendo de um ritual de passagem para o retorno à vida social O envio de uma carta de condolências em torno de 15 dias após a morte também costuma ser bem recebido pelos familiares As equipes de saúde que trabalham amparadas na filosofia dos Cuidados Paliativos têm a possibilidade de encerrar suas intervenções no acompanhamento do processo de luto de familiares tanto em atendimento individual como em grupo sempre que possí vel e necessário O tempo de duração da prestação desses serviços é variável e está in timamente relacionado com a disponibilidade da equipe em conjunção com a demanda do enlutado Poderão ser feitos encaminhamentos para serviços especializados quando não for possível o acompanhamento a longo prazo Os objetivos específicos do trabalho do profissional no processo de luto familiar são correspondentes às quatro tarefas descritas por Worden17 aumentar a realidade da perda ajudar a pessoa a lidar com afetos manifestos e latentes ajudar a pessoa a su perar obstáculos para se reajustar depois da morte e encorajar a pessoa a dizer adeus adequado e sentir conforto ao reinvestir novamente na vida Um fator que auxilia os profissionais de saúde a manejar com a dor das famílias é reconhecer a importância da espiritualidade para a manutenção da saúde mental em momentos de intensa dor Conforme Walsh16 a capacidade de fundamentarse dentro do sistema de crenças espirituais da família proporciona significado consolo e conforto podendo promover a aceitação tão necessária nessa fase do ciclo vital Se gundo Franco6 a fé é um instrumento importante para o restabelecimento daquele que enfrenta o processo do luto pois traz a possibilidade de aproximação com o sagrado confortando e atenuando os sentimentos de desamparo Diante desse aspecto é relevante que o profissional esteja atento à existência de alguma religiosidade na família incentivando a busca de amparo nessas crenças que antes da perda eram fonte de acalento caso a pessoa verbalize tal importância Também poderá caber aos profissionais de saúde incentivar o engajamento da pessoa enlutada e do sistema familiar em redes potencialmente sustentadoras que segundo Walsh16 podem ser grupos religiosos sociais e comunitários A falta de conexões comunitárias torna a dor mais difícil de suportar e dentro da própria co munidade pode haver pessoas passando pelo mesmo pesar do processo de luto 329 Frente a tudo isso o papel mais importante do profissional de saúde é a estimulação das competências familiares para que o próprio sistema familiar seja capaz de promover a reestruturação tanto individual como familiar Assim a família poderá lançar mão de recursos próprios para enfrentar do processo do luto não sendo necessária a intervenção sistemática Quando os desafios são identificados e trabalhados de forma adequada tendem a promover adaptação imediata e também a longo prazo dos membros da família tendo como resultado o fortalecimento desse grupo como uma unidade funcional É necessário um investimento no compartilhamento da experiência da morte e posteriormente em uma reorganização da sistemática familiar sem a pessoa que morreu para que se possa pensar em reinvestimentos em outros relacionamentos e em outras realizações na vida Kovacs7 acrescenta que o luto mal elaborado está se tornando um problema de saúde pública É grande o número de pessoas doentes em função da excessiva carga de sofri mento sem possibilidade de elaboração fenômeno que também acomete os profissionais de saúde que são cuidadores do sofrimento alheio não tendo muitas vezes espaço para cuidar de sua própria dor Também está em risco o profissional de saúde que não reconhe ce seu limite ao lidar com as perdas no ambiente de trabalho e na vida pessoal tampouco busca uma rede de apoio para lidar com suas perdas tanto reais como simbólicas e tem grandes chances de adoecer tanto psíquica como fisicamente Finalizando O que se observa é que o ser humano não é preparado para a finitude Fomos introdu zidos ao universo da celebração dos nascimentos mas não da morte Os rituais de perda e morte da cultura ocidental elucidam o quanto é sofrida a vivência da morte A morte do outro nos impõe o confronto com nossa vida e nossa própria morte e isso gera descon forto ansiedade e sofrimento Somos forçados a olhar atentamente para a qualidade da nossa vida e de nossas relações uma vez que a morte é a fase final do ciclo vital Os Cuidados Paliativos representam nesse sentido o resgate do valioso cuidar abrin do espaço para o viver e o morrer com paciente e familiares considerados agentes ativos no processo junto à equipe de saúde Nesse cenário é possível legitimar os desafios ine rentes à fase final de vida à morte e ao luto Sendo o luto a última etapa da intervenção da equipe surge a dúvida a respeito de quando ele termina Não há resposta pronta Parkes11 diz que o processo de luto está terminado quando uma pessoa completa a fase final do luto de restituição em que uma pessoa pode reinvestir suas emoções na vida e no viver Worden17 explica que o luto está terminado quando suas respectivas tarefas são completadas Completa ainda com o fato de que uma pessoa ao ser capaz de pensar em quem faleceu sem dor está dando um sinal de reação de luto terminado Existe sempre uma sensação de tristeza quando se pensa em alguém que se amou e se perdeu mas é um tipo diferente de tristeza sem a presença de manifestações físicas como o choro intenso O recolhimento é um movimento essencial para a reorganização dos sentimentos que se confundem diante de uma perda significativa É necessário um tempo para organizar um espaço para a dor como também outros espaços para significar e resignificar essa perda Reflexões sobre que parte do enlutado foi ferida e perdida junto com a pessoa que 330 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP morreu e sobre os caminhos possíveis de trilhar sem a pessoa amada revelam que a morte gera uma crise nos sistemas individual e familiar sendo necessária uma reorganização Não existe amor sem perda E não existe a superação da perda sem alguma experiên cia de luto Não ser capaz de vivenciála é ser incapaz de entrar no grande ciclo da vida humana de morte e renascimento ser incapaz isto é de viver novamente Referências 1 BOSS P A perda ambígua In WALSH MCGOLDRICK Morte na família sobrevivendo às perdas Porto Alegre Artmed 1998 2 BROMBERG M H P F A psicoterapia em situações de perdas e luto Campinas Editorial Psy II 2000 3 CARTER B MCGOLDRICK M As mudanças no ciclo de vida familiar uma estrutura para a terapia familiar Tradução de M A V Veronese 2 ed Porto Alegre Artes Médicas 1995 4 FONSECA J P Luto antecipatório Campinas Editora Livro Pleno 2004 5 FRANCO M H P Luto em cuidados paliativos In Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 6 FRANCO M H P Nada sobre mim sem mim estudos sobre a vida e morte Campinas Editora Livro Pleno 2005 7 KOVACS M J Educação para a morte temas e reflexões São Paulo FAPESP e Casa do Psicólogo 2003 8 KOVACS M J Morte e desenvolvimento humano São Paulo Casa do Psicólogo 1992 9 LINDER Morte na família sobrevivendo às perdas Tradução de C O Dornelles In WALSH F MCGOLDRICK M Porto Alegre Artes Médicas 1998 10 LINDERMANN E Symptomatology and management of acute grief American Journal of Psychiatry 1944 11 PARKES C M Luto estudos sobre a perda na vida adulta São Paulo Summus 1998 12 RANDO Luto em cuidados paliativos In FRANCO M H P Cuidado paliativo São Paulo CREMESP 2008 13 RANDO T A Treatment of complicated mourning Illinois Research Press 1993 14 ROSS E K Sobre a morte e o morrer 8 ed São Paulo Martins Fontes 2005 15 WALSH F MCGOLDRICK M Morte na família sobrevivendo às perdas C O Dornelles Trans Porto Alegre Artes Médicas 1998 16 WALSH F Fortalecendo a resiliência familiar São Paulo Roca 2005 17 WORDEN W W Terapia do luto um manual para o profissional de saúde mental 2 ed Porto Alegre Artes Médicas 1998 331 Anexo Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico Alteração de sonovigília insônia ocorre em 29 a 59 dos casos de câncer avançado Dor noturna Depressãoansie dade Maior inatividade durante o dia Cochiladas diurnas Efeito colateral de medicações Álcool e cafeína Técnicas de relaxa mento Ouvir os medos do paciente Diminuir as cochila das diurnas Incentivar exer cícios e atividades moderadas durante o dia Evitar álcool e cafeína Tratar eficazmente a dor Benzodiazepínicos lorazepam 12 mg 1 2xdia ou midazolam 1530 mg Clorpromazina em doses baixas Levomepromazina 46 gotasnoite Rever horário e administração de esteroides Se delírio associado haldol 255 mg noite Anorexia caquexia tratamento polêmico Progressão da doença Alteração do paladar Vômitos Dor intensa dispneia ou depressão Boca seca Dieta fracionada em pequenas quantidades várias vezes ao dia Dietas coloridas com levantamento prévio do antigo cardápio alimentar anamnese alimentar Se indicada dieta por SNE em posição gástrica ou gastrostomia Esteroides prednisona 515 mg dia ou dexametasona 24 mg de 88 h Megestrol 1601600 mgdia Suplementação vitamínica Antidepressivos tricíclicos ISRS etc sn dose usual Uso experimental ômega 3 canabinoides pentoxifilina GH talidomida 332 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Astenia Progressão da doença Anemia Dor Depressão Insônia Infecções crônicas e agudas Má absorção Apoio emocional Conservar energia Períodos de descanso mais frequentes Se indicado uso de equipamentos como andador e cadeira de rodas Tratar as causas específicas Transfusão sanguínea para conforto conforme o caso Considerar uso de estimulantes do SNC metilfenidato Ritalina 520 mgdia Boca seca Efeito colateral de medicação Desidratação Respirar de boca aberta Candidíase oral Vômitos anorexia Depressão ansiedade Oferecer frequentes goles de água ou outro líquido Umedecer os lábios Oferecer líquidos cítricos e gelados sucos gelatina iogurte Oferecer pedacinhos de gelo Rever medicação anticolinérgica hioscina morfina atropina amitriptilina e diuréticos Saliva artificial se disponível Tratar candidíase nistatina oral fluconazol se for o caso Broncorreia hipersecreção Hipersecreção pela doença de base DPOC ICC anasarca Incapacidade de tossir ou deglutir secreção Posicionamento em decúbito lateral Estado de hipo hidratação Se indicada aspiração de vias aéreas com sonda Tratar infecção se presente ou se indicado Diuréticos para diminuir edemas Drogas anticolinérgicas ver em sororoca Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 333 Confusão mental demência ou delírio Encefalopatia metástases cerebrais Causas metabólicas desidratação e distúrbios eletrolíticos Efeito colateral de drogas anticolinérgicas e da morfina Manter o paciente num ambiente seguro e familiar Remover objetos perigosos Usar frases simples Diminuir sons televisão rádio Medicação deve ser supervisionada Corrigir os distúrbios hidroeletrolíticos rever medicações Tranquilizante diazepam 255 mg 12xdia ou midazolam 15 mgnoite Haloperidol 510 mg25 mg no idoso se paranoia ou dificuldade em dormir à noite Convulsões 10 dos pacientes na fase terminal podem apresentar convulsões Hipertensão intracraniana Tumor ou metástase em SNC Pósneurocirurgia Distúrbios hidroeletrolíticos Na Ca Mg glicose Abstinência de anticonvulsivantes Explicar em linguagem simples o que é convulsão e suas causas Exame neurológico e FO Se tumor dexametasona 4 mg de 66 h Corrigir distúrbios hidroeletrolíticos Drogas benzodiazepínicos anticonvulsivantes doses habituais Manter anticonvulsivantes VR ou midazolam 510 mg SC ou fenobarbital SC deve ser diluído 110 Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 334 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Constipação Inatividade fraqueza Menor ingestão alimentar e de líquidos Obstrução intestinal pelo tumor Hipercalcemia Confusão mental e depressão Efeito colateral de medicações Encorajar atividade física se possível Oferecer mais água Dieta rica em fibras Chá de sene Movimentar os membros inferiores Realizar massagem abdominal no sentido horário Rever medicação codeína dose morfina antidepressivos tricíclicos Óleo mineral 1 medida 2xdia Bisacodil 510 mg até 2xdia Lactulose 10 ml 2xdia máximo de 30 ml 3xdia Outros laxativos orais Enteroclismas sn Delírio mais de 40 dos pacientes apresentarão confusão mental ou delírio na fase final de vida Fase terminal da doença Alterações do nível de consciência Encefalopatia metabólica Distúrbios hidroeletrolíticos Na Ca glicose Infecção Efeito colateral da morfina Suportes emocional e psicológico Presença de familiares Presença de calendário e relógio Ambiente tranquilo Música suave Corrigir os distúrbios hidroeletrolíticos se cabível Neurolépticos em geral olanzapina risperidona e quetiapina Haloperidol é a droga de escolha 510 mg25 mg no idoso até de 88 h Benzodiazepínicos midazolam 15 mgnoite lorazepam 12 mgdia diazepam 255 mg 12xdia Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 335 Depressão Percepção da fase terminal da doença Sensação de inutilidade Sofrimento contínuo Dor não adequadamente controlada Suportes emocional e psicológico Presença de familiares Seguimento com psicologiapsiquiatria Antidepressivos várias classes doses usuais e crescentes Diarreia Medicação laxativa em excesso Abstinência de opioides Antibióticos antiácidos Infusão rápida da dieta por SNE Gastroparesia DM hipertireoidismo doença inflamatória intestinal etc Aumentar a ingestão de líquidos água reidratantes orais energéticos esportivos oferecer líquidos em pequenas porções várias vezes ao dia Manter dieta porém SEM fibras Infundir dieta por SNE mais lentamente Rever medicação opioide Drogas constipantes se não for diarreia infecciosa como codeína 1030 mg 66 h VO ou loperamida 4 mg VO dose única Antiespasmódicos sn Disfunção urinária a prioridade é melhorar o desconforto da retenção urinária Progressão da doença Alterações do nível de consciência Efeito colateral de medicações Dispositivo urinário nãoinvasivo Uripen bolsa coletora ou garrafa plástica homens Uso de comadre mulheres Uso de fraldas descartáveis Prevenção de dermatite Se incontinência introduzir sn anticolinérgicos antidepressivos tricíclicos Se retenção rever medicação constipante codeína morfina antidepressivos tricíclicos Antibióticos se infecção de trato urinário Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 336 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Dispneia causas multifatoriais avaliar sempre a causa base Linfangite carcinomatosa metástases pulmonares Ansiedade ou pânico Progressão da doença pulmonar de base Infecção pulmonar Derrame pericárdico com tamponamento Acidose metabólica com falência de múltiplos órgãos Atmosfera muito seca Derrame pleural Anemia Reposicionar o paciente na cama ou cadeira Elevar o decúbito Abrir janelas Ventilar o paciente Oferecer água Fazer exercícios respiratórios Oxigênio suplementar CPAP O2 contínuo Corticoides nas linfangites compressões tumorais Broncodilatadores sn Se hipersecreção hioscina 10 mg VO 88 h Se tosse seca codeína 510 mg 66 h Se indicada toracocentese de alívio Morfina iniciar com 255 mg 44 h VO ou 2 mg 44 SC Sedação paliativa se dispneia incontrolável midazolam associado a morfina como primeira opção Mioclonias Efeito colateral de medicações metoclopramida opioides dose alta neurolépticos Abstinência de álcool benzodiazepínicos barbitúricos anticonvulsivantes Por hipóxia do SNC Explicar em linguagem simples o que é mioclonia e suas causas Rever medicações Rever dose de opioides Sedar com midazolam 510 mg SC de hora em hora até cessarem as mioclonias depois 2030 mgdia Alternativas diazepam 1020 mg VR de hora em hora Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 337 Náuseas e vômitos não administrar gastrocinéticos se vômitos por obstrução TGI Obstrução intestinal Dismotilidade gástrica Efeito colateral de medicações Efeitos da QT Distúrbios metabólicos hipercalcemia uremia infecção Dieta fracionada e em pequenas porções Alimentos e líquidos frios e azedos gelatina sorvetes sorbets pedaços de gelo musses Técnicas de relaxamento Higiene oral pré e pósprandial Antieméticos metoclopramida 1030 mg 8844 h ou dramamine Outras drogas haloperidol 12 mgdia clorpromazina 2550 mg a cada 612 h diazepam 5 mg Ondansetrona 48 mg de 88 h se pósQT Via de administração SC preferencial ou supositórios Prurido Pele seca Alergia Dermatites Infecção fúngica ou escabiose Hidratação da pele óleo com ácido graxo essencial girassol ou canola Banho água não muito quente Checar medicação alimentos Tratar dermatites Antihistamínicos corticoides sn Tratar infecção fungoparasita Ronco da morte sororoca em inglês death rattle Ocorre em 25 a 92 na fase final de vida Secreção acumulada na garganta por não conseguir deglutir geralmente paciente já inconsciente ou quase inconsciente Explicar o significado do ruído à famíliacuidador Eventualmente aspiração de VAS procedimento que pode impressionar muito Hioscina homatropina ou escopolamina 30 gotas na boca até de 66 h ou 1 ampola de Buscopan SC de 66 ou até de 44 h Atropina colírio a 1 VO 23 gotas 13 mg a cada 68 h cuidado com taquicardia Se disponível adesivo de escopolamina Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico 338 Manual de Cuidados Paliativos da ANCP Soluços checar a causa Dispepsia Tumor ou metástase do SNC Irritação do nervo vagofrênico Efeito colateral de medicações corticoides BCC anticonvulsivantes Dieta fracionada e líquidos frios Esfregar com gaze o céu da boca Xilocaína gel uma colher de sopa de açúcar diluído em um pouco de suco de limão ou laranja Checar medicação Se distensão abdominal dimeticona 3060 gotas na boca Tratar dispepsia Metoclopramida 1020 mg VO ou SC 3 a 4xdia ou haloperidol 125 mg 13xdia Baclofeno 10 mg VO a cada 812 h Sudorese checar a causa Febre infecção Por tumor geralmente associado a linfoma de Hodgkins tumores malignos eou metástase hepática Distúrbio hormonal Medicações Suspensão abrupta de opioides Secar sudorese com tecido absorvente Diminuir a temperatura do ambiente Propiciar fluxo de ar no ambiente Evitar alimentos quentes eou picantes Tratar a causa da febre infecção Descontinuar antipiréticos Diminuir sudorese paraneoplásica naproxeno 250375 mg 2xdia cimetidina 400800 mg 23xdia propranolol 1020 mg 23xdia olanzapina 5 mgdia estudos com talidomida 100 mgnoite Trocar antidepressivos por venfalaxina 37575 mgdia VO Considerar rodízio de opioides Autoria da Dra Celia Maria Kira SNE sonda nasoenteral GH hormônio de crescimento SNC sistema nervoso central DPOC doença pulmonar obstrutiva crônica ICC insuficiência cardíaca congestiva FO fundo de olho TGI trato gastrointestinal VR via retal SC subcutâneo DM diabetes mellitus VO via oral CPAP sistema de pressão positiva contínua das vias aéreas QT quimioterapia sn se necessário VAS vias aéreas superiores BCC bloqueador do canal de cálcio Quadrosíntese dos principais sintomas que não a dor presentes na fase final de vida e as condutas sugeridas a serem implementadas Sintomas Causas principais Tratamento não farmacológico Tratamento farmacológico Referências 1 DOYLE D et al Oxford textbook of palliative medicine 3 ed 2005 2 GUIA FARMACOGERIÁTRICA Disponível em httpwwwsemeresdocsFarmacogeriatricapdf 3 INCA Cuidados paliativos oncológicos controle de sintomas Disponível em httpwwwincagov brrbcn48v02pdfcondutas3pdf 4 SYMPTOMS AND SYMPTOMS MANAGEMENT FORUM IN ENCICLOPEDIA OF DEATH AND DYING SYVI Disponível em httpwwwdeathreferencecomSySiSymptomsandSymptomManagementhtml 5 WHO Paliative care symptom management and endoflife care 2004 Disponível em httpwww whoint3by5publicationsdocumentsengenericpalliativecare082004pdf