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Direito ·

Filosofia do Direito

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5 A Filosofia do Direito de Aristóteles Aristóteles representa o apogeu do pensamento filosófico grego e o mesmo se pode dizer para a filosofia do direito Após sua morte durante toda a Antiguidade e a Idade Média suas reflexões jusfilosóficas foram tidas como o mais alto patamar de ideias sobre o direito e o justo já construídas Discípulo de Platão Aristóteles 384322 aC estava também envolvido no ambiente filosófico que ensejou o socratismo e o platonismo ainda que a seu modo A acentuada tendência platônica a uma construção filosófica ideal passa a ser amenizada no pensamento de Aristóteles na medida em que a experiência é elemento fundamental de sua reflexão Filho de médico desde a infância em contato com a empiria dos casos clínicos Aristóteles construiu sua filosofia tendo por base as realidades que se apresentavam ao seu estudo Naquilo que tange à construção direta de uma filosofia política e do direito revolucionária que viesse a transformar a realidade Aristóteles é mais prudente que seu mestre Platão Este era filho de Atenas de velhas tradições políticas familiares Aristóteles era estrangeiro em Atenas portanto com participação muito limitada na vida política De fato ao contrário de Platão que analisava a situação social do seu tempo e estabelecia planos de transformação da realidade Aristóteles consolida as opiniões as possibilidades os fatos e as situações da realidade mas sem tomar partido maior dos caminhos de mudança ou de alteração do já dado Aristóteles mais ponderado e de maior contato com a realidade do que Platão é menos visionário que seu mestre No Liceu sua própria escola filosófica Aristóteles desenvolveu sua pesquisa por várias áreas do conhecimento Após o período discente na Academia de Platão e após a experiência de ter sido o professor de Alexandre o Grande na Macedônia sua terra natal Aristóteles na sua volta a Atenas organizou no Liceu uma série de reflexões em vários campos do saber Tal conhecimento que alcançou várias áreas consolidouse de modo bastante sistemático Aristóteles é mesmo considerado o maior sistematizador de toda a filosofia em sua história pelo caráter estruturado e lógico de seu pensamento Não só na filosofia geral Aristóteles brilhou Na lógica naquilo que hoje denominamos por ciências como a própria biologia botânica zoologia nas questões relacionadas a todos os campos das ciências humanas política sociologia ética Aristóteles representou o que houve de melhor no pensamento clássico Assim expõe Eduardo Bittar O sistema aristotélico é o sistema de um naturalista isto por se movimentarem em seu interior as cadeias discursivas todas as premissas e todos os silogismos em torno de alguns principiaconstantes em sua theoría bem como por descolaremse sobre uma base heuristicamente constituída toda a argumentação e toda a mensagem conceptual contidas nas obras do Corpus Não obstante detectaremse termos expressões trechos e passagens inteiras em total desconexão com a conjuntura geral de suas manifestações intelectuais ou mesmo em contradição com as próprias palavras do texto em que se inserem parece haver uma dimensão prétextual ou ainda subliminar que está a atestar o naturalismo aristotélico Seja pela intentio auctoris seja pela literalidade das expressões podese dessumir uma plataforma de valores básicos sobre a qual se desenvolveram demonstrações de cunho metafísico físico ético que no entanto não deixam de guardar apesar de constituírem ramos autônomos do saber íntima relação e coerência com as demais perspectivas teóricas exploradas pelo pensamento de Aristóteles1 O mesmo grande impacto se deu com a reflexão jurídica Aristóteles é o maior pensador das questões do direito e da justiça já havido até seu tempo e durante muitos tempos posteriores assim foi considerado Participou também ainda que de modo mais discreto que Platão da política e da confecção de muitas legislações em muitas pólis Aristóteles após o estudo sistemático de mais de uma centena de constituições conhecidas ao seu tempo escreveu um projeto de constituição para Atenas Sua grande reflexão sobre o direito está contida na obra Ética a Nicômaco que leva o nome de seu filho a quem dedica a obra Nesse texto que é talvez a maior expressão do pensamento jurídico em todo o passado as questões sobre o direito e o justo estão concentradas no seu Livro V Além da Ética a Nicômaco Aristóteles trata das questões jurídicas em outra obra de grande relevância A política Em outra obra a Retórica sua preocupação alcança também o direito na medida em que se refere à argumentação jurídica Mas em várias outras obras desde a sua juventude até sua maturidade Aristóteles também trata incidentalmente do direito A justiça e suas espécies A grande excepcionalidade da filosofia do direito de Aristóteles se revela pela sua sistematização filosófica da justiça As partes iniciais do Livro V daÉtica a Nicômaco estão voltadas a essa questão Logo de início Aristóteles separa dois grandes campos de compreensão sobre a justiça Ela pode ser tomada no sentido universal e no sentido particular Justiça universal e particular Na sua perspectiva universal a justiça é tomada num sentido lato Ela tanto é uma manifestação geral da virtude quanto uma apropriação do justo à lei que no geral é tida por justa O respeito à lei é a característica desse justo que é tomado no sentido lato Para Aristóteles diferentemente dos modernos a lei produzida na pólis a partir de um princípio ético é diretamente relacionada ao justo mas não por conta de sua forma ou seja não é justa somente porque é formalmente válida e sim em razão de seu conteúdo Para Aristóteles uma má lei não é lei Sendo a lei somente a lei justa a justiça tomada no seu sentido universal não deixa de ser também o cumprimento da lei Ainda enquanto justiça universal a justiça é a virtude que está em todas as demais virtudes A caridade ou a paciência por exemplo e todas as virtudes demandam um conteúdo específico que as tipifica Dizse que a caridade se tipifica num ato de dar Mas aquele que dá ao poderoso por medo de ser violentado e não dá ao necessitado por lhe ser superior em poder não é caridoso porque ao mero ato de dar deve se acrescer a justiça do ato O paciente com o chefe e impaciente com o subordinado também não tem essa virtude da paciência na medida em que esta presume o seu agir com justiça A caridade não é uma virtude em si própria sem que se lhe acresça a virtude da justiça O mesmo com a paciência Mas alguém pode ser justamente caridoso e impaciente A caridade presume justiça a paciência presume justiça mas a caridade não presume paciência A justiça está em todas as demais virtudes e por isso é a única virtude universal Mas ao mesmo tempo em que é virtude universal configurando todas as demais ela é também uma virtude em si mesma Somente ela tem um conteúdo específico que não demanda em acréscimo outra virtude Estudar o que vem a ser a justiça em si é tomála então no seu sentido particular Aristóteles dirá que tradicionalmente por justiça em sua apreensão específica e estrita considerase a ação de dar a cada um o que é seu sendo essa a regra de ouro sobre o justo A justiça assim compreende uma ação de distribuição que demanda uma qualidade de estabelecer o que é de cada qual Tal ideia de justiça particular será um dos momentos culminantes da reflexão aristotélica sobre o justo Aristóteles chama a atenção para duas grandes manifestações da justiça tomada no seu sentido estrito justiça distributiva e justiça corretiva que se subdivide em voluntária e involuntária O próprio Aristóteles as expõe na Ética a Nicômaco Uma das espécies de justiça em sentido estrito e do que é justo na acepção que lhe corresponde é a que se manifesta na distribuição de funções elevadas de governo ou de dinheiro ou das outras coisas que devem ser divididas entre os cidadãos que compartilham dos benefícios outorgados pela constituição da cidade pois em tais coisas uma pessoa pode ter uma participação desigual ou igual à de outra pessoa a outra espécie é a que desempenha uma função corretiva nas relações entre as pessoas Esta última se subdivide em duas algumas relações são voluntárias e outras são involuntárias são voluntárias a venda a compra o empréstimo a juros o penhor o empréstimo sem juros o depósito e a locação estas relações são chamadas voluntárias porque sua origem é voluntária das involuntárias algumas são subreptícias como o furto o adultério o envenenamento o lenocínio o desvio de escravos o assassínio traiçoeiro o falso testemunho e outras são violentas como o assalto a prisão o homicídio o roubo a mutilação a injúria e o ultraje2 Além da justiça distributiva e da justiça corretiva há um caso especial na justiça particular a reciprocidade Embora não diretamente elencada ao lado das duas subespécies anteriores ela não se confunde com nenhuma das duas constituindo pois uma previsão especial à parte Podese então entender graficamente o quadro da justiça em Aristóteles da seguinte forma Justiça distributiva Para Aristóteles a justiça distributiva trata da distribuição de riquezas benefícios e honrarias Apresentase como a mais alta ocupação da justiça e também a mais sensível A distribuição compreende sempre dois sujeitos em relação aos quais se avalia a justa distribuição dos bens e dois bens que serão divididos entre tais pessoas Assim sendo a distribuição compreende uma espécie de função matemática tal qual uma regra de três uma proporção geométrica A justa distribuição para Aristóteles é um justo meiotermo entre duas pessoas e duas coisas O critério fundamental para tal distribuição justa é omérito A justiça distributiva utiliza como parâmetro o dar a cada um de acordo com seu mérito ainda que Aristóteles reconheça que o critério do mérito possa ser variável Para o democrata dirá o mérito presume a condição livre para o oligarca o critério do mérito é a nobreza de nascimento A justiça da distribuição dos bens e honras de acordo com o mérito é uma proporção A proporcionalidade caracteriza o justo e a sua falta é o injusto Assim dirá Aristóteles sobre a justiça distributiva O justo portanto pressupõe no mínimo quatro elementos pois as pessoas para as quais ele é de fato justo são duas e as coisas nas quais ele se manifesta os objetos distribuídos são também duas O justo então é uma espécie do gênero proporcional a proporcionalidade não é uma propriedade apenas das quantidades numéricas e sim da quantidade em geral Com efeito a proporção é uma igualdade de razões envolvendo no mínimo quatro elementos o justo envolve também quatro elementos no mínimo e a razão entre um par de elementos é igual à razão existente entre o outro par pois há uma distinção equivalente entre as pessoas e as coisas3 Vislumbremos e entendamos por meio de exemplos a justiça distributiva Um professor quando aplica uma prova a uma turma de alunos será considerado justo em sua correção quando distribuir notas de acordo com uma proporção tendo por vista o mérito De uma prova com cinco questões valendo cada qual dois pontos o aluno que acerta quatro questões merece a nota oito O aluno que acerta duas questões merece a nota quatro Qualquer outra nota diferente dessa para cada um desses alunos rompe com a proporção entre seus méritos e suas notas e portanto a distribuição meritória de notas demonstra a justiça do professor Também na distribuição dos bens se poderia vislumbrar a justiça distributiva Se se considera que o trabalhador que produz 10 x por mês ganhe 20 y dirseá que o trabalhador que produzir 11 x por mês deverá ganhar por tal produção 22 y De acordo com o mérito de cada qual a proporção perfaz o justo Também na distribuição dos cargos e das funções isso se revela Ao cargo de presidente da república correspondem certas honrarias poderes e incumbências Ao cargo de vereador correspondem outras honrarias poderes e incumbências Poderseia demonstrar tal justiça distributiva graficamente do seguinte modo cinco questões corretas Nota 10 três questões corretas Nota 6 Em comparação à justiça corretiva a justiça distributiva é mais complexa porque envolve o arranjo dos bens e dos poderes na pólis A proporção que busca construir envolve dar aumentar diminuir portanto uma ação distributiva que invade a esfera de alguns para manter o mérito e a proporção na relação com os demais Justiça corretiva A justiça corretiva também chamada de diortótica por sua vez é bem menos complexa que a distributiva Tratase de uma proporção aritmética no dizer de Aristóteles Ao contrário da distribuição das honrarias bens e cargos de acordo com o mérito nessa vertente a justiça é tratada como uma reparação do quinhão que foi voluntária ou involuntariamente subtraído de alguém por outrem Por isso as questões de ordem penal são tratadas como justiça corretiva na medida daquilo que representou a perda e o ganho No caso penal mais do que a pena a justiça corretiva trata da reparação civil dos danos causados pelo crime Também no caso das transações entre sujeitos privados a justiça corretiva se apresenta Os contratos a troca a compraevenda e mesmo a responsabilidade civil podem ser pensados a partir da justiça corretiva À perda de alguém corresponde uma correção equivalente Assim sendo a justiça corretiva é uma proporção aritmética porque se trata apenas da devolução daquilo que foi acrescido a alguém A justiça distributiva em comparação é mais complexa por se tratar de uma proporção geométrica Se na justiça distributiva há uma proporção entre pessoas e coisas na justiça corretiva há apenas uma proporção entre coisas porque as pessoas são tomadas formalmente como iguais Com efeito é irrelevante se uma pessoa boa lesa uma pessoa má ou se uma pessoa má lesa uma pessoa boa ou se é uma pessoa boa ou má que comete adultério a lei contempla somente o aspecto distintivo da justiça e trata as partes como iguais perguntando somente se uma das partes cometeu e a outra sofreu a injustiça e se uma infligiu e a outra sofreu um dano Sendo portanto esta espécie de injustiça uma desigualdade o juiz tenta restabelecer a igualdade4 As duas espécies de justiça foram posteriormente incorporadas à noção comum do jurista como sendo a lógica do direito público e do direito privado A distribuição das riquezas dos bens dos cargos e do mérito seriam próprias do direito público as questões do cumprimento contratual ou do seu ressarcimento ou mesmo da retribuição penal envolveriam um cálculo entre particulares5 Reciprocidade Aristóteles no entanto chama a atenção para uma outra forma de justiça que ele não enquadra nem na justiça distributiva nem na corretiva e que denomina reciprocidade A sua aplicação mais importante se dá no caso da produção As trocas entre um sapateiro um pedreiro um médico e um fazendeiro para serem consideradas justas devem alcançar uma certa reciprocidade Não se pode imaginar que a produção de um sapato valha o mesmo que a construção de uma casa ou que a colheita de um quilo de determinada planta equivalha a uma certa cirurgia Aristóteles para isso aponta que o dinheiro faz o papel de uma equivalência universal entre produtos e serviços Ele possibilita a reciprocidade entre tais elementos Tem de haver então um padrão e este deve ser convencionado mediante acordo por isto ele se chama dinheiro é ele que torna todas as coisas comensuráveis já que todas as coisas podem ser medidas pelo dinheiro Seja A uma casa B dez minas e C um leito O termo A vale a metade de B se a casa vale cinco minas ou seja se ela é igual a cinco minas o leito C vale um décimo de B vêse claramente então quantos leitos equivalem a uma casa ou seja cinco É evidente que as permutas se efetuavam desta maneira antes de existir o dinheiro pois é indiferente permutarmos uma casa por cinco leitos ou pelo equivalente em dinheiro aos cinco leitos6 Tal forma de justiça muito sensível porque não diretamente atrelada a bens ou a correções mas à produção é a ligação mais profunda já feita até então na filosofia do direito entre direito e economia Aristóteles desponta assim como um crítico da justiça meramente formal ou matemática na medida em que é na realidade concreta da produção e da circulação dos bens e serviços que se estabelece o padrão da reciprocidade Do âmbito da justiça Na leitura das justiças distributiva e corretiva poderseia acreditar que a visão aristotélica da justiça como meiotermo como justa proporção se faria a partir de padrões matemáticos na medida das proporções aritmética e geométrica No entanto nas questões de maior fundo Aristóteles se encaminha para uma compreensão política do justo A reciprocidade revela tal atrelamento do direito à produção à economia a uma certa construção dos afazeres na pólis Por isso ao final das contas somente um mergulho nas condições sociais concretas há de revelar o justo para o pensamento aristotélico Isso se torna mais explícito quando Aristóteles trata do âmbito de aplicação dos tipos de justiça O justo se trata enquanto proporção matemática entre aqueles relativamente iguais No entanto entre os desiguais não se há de dizer de justiça Tal posição revela ao mesmo tempo o conservadorismo aristotélico e por avesso a sua potencial utilização crítica Para Aristóteles somente há de se falar da distribuição pelo mérito entre aqueles que possam ser considerados minimamente semelhantes Entre dessemelhantes os critérios de proporção aritmética e geométrica resultam em injustiça Diz Aristóteles Não devemos esquecer porém que o assunto de nossa investigação é ao mesmo tempo o justo no sentido irrestrito e o justo em sentido político Este último se apresenta entre as pessoas que vivem juntas com o objetivo de assegurar a autossuficiência do grupo pessoas livres e proporcionalmente ou aritmeticamente iguais Logo entre pessoas que não se enquadram nesta condição não há justiça política e sim a justiça em um sentido especial e por analogia A justiça do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho não são iguais à justiça política embora se lhe assemelhem na realidade não pode haver injustiça no sentido irrestrito em relação a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos até uma certa idade em que se tornam independentes são por assim dizer partes deste homem e ninguém faz mal a si mesmo por esta razão uma pessoa não pode ser injusta em relação a si mesma Logo não há justiça ou injustiça no sentido político em tais relações7 Como exemplo um professor ao aplicar a mesma prova à mesma turma e ao apurar as notas de acordo com o mérito em proporção geométrica é considerado justo Mas se ele aplica a mesma prova a alunos universitários e a alunos do préprimário ainda que se valha da proporção geométrica dando nota alta ao universitário e zero ao analfabeto sua nota não pode ser considerada justa porque um aluno ainda não alfabetizado não pode ser medido pelo mérito em comparação a um universitário Não se pode auferir o mérito de um universitário em comparação a alunos primários A justiça enquanto proporção somente se dá entre os semelhantes Aristóteles com isso afasta os escravos os filhos as mulheres do âmbito de aplicação do justo São do lar submissos ao senhor ao pai de família e portanto não estão na arena dos iguais A justiça se mede para Aristóteles entre os cidadãos da pólis Entre tais há de se falar na honra no mérito na justa distribuição Tal posição aristotélica é altamente conservadora Com isso afasta da comparação justamente a maioria da população grega de seu tempo O justo é somente uma medida da elite dos cidadãos dos poderosos Mas afastandose a aplicação que fazia ao seu tempo a ideia aristotélica revela por via reversa um grande potencial crítico Entre os desiguais a justiça não é matemática Não se pode auferir por mérito Assim sendo Aristóteles dá margem a construir a toda a maioria da sociedade uma outra manifestação de justiça ativa e transformadora que limite os excessos e que abrande as carências a fim de que posteriormente em uma situação de mínima igualdade se faça valer uma régua de justiça de tipo matemático Se a justiça se dá entre os iguais na pólis havendo desiguais podese pensar com Aristóteles e contra Aristóteles na revolução como forma de justiça corrigindo os extremos e consolidando uma sociedade de equilíbrio na distribuição de riquezas e situações meritórias O próprio Aristóteles deixa clara a necessidade da correção dos extremos A justiça é a observância do meiotermo mas não de maneira idêntica à observância de outras formas de excelência moral e sim porque ela se relaciona com o meiotermo enquanto a injustiça se relaciona com os extremos E a justiça é a qualidade que nos permite dizer que uma pessoa está predisposta a fazer por sua própria escolha aquilo que é justo e quando se trata de repartir alguma coisa entre si mesma e outra pessoa ou entre duas pessoas está disposta a não dar demais a si mesma e muito pouco à outra pessoa daquilo que é desejável e muito pouco a si mesma e demais à outra pessoa daquilo que é nocivo e sim dar a cada pessoa o que é proporcionalmente igual agindo de maneira idêntica em relação a duas outras pessoas A justiça por outro lado está relacionada identicamente com o injusto que é excesso e falta contrário à proporcionalidade do útil ou do nocivo Por esta razão a injustiça é excesso e falta no sentido de que ela leva ao excesso e à falta no caso da própria pessoa excesso do que é útil por natureza e falta do que é nocivo enquanto no caso de outras pessoas embora o resultado global seja semelhante ao do caso da própria pessoa a proporcionalidade pode ser violada em uma direção ou na outra No ato injusto ter muito pouco é ser tratado injustamente e ter demais é agir injustamente8 O quadro da justiça para Aristóteles é haurido das proporções da virtude do mérito e do meiotermo mas tem por pressuposto para sua consecução a própria concretude social e econômica da pólis Assim para Aristóteles o justo é imediatamente matemático e meritório mas mediatamente é político Podese fazer uma leitura de maneira mais profunda do pensamento de Aristóteles sobre a justiça reconhecendo que há uma condição social de justiça para que sejam aplicados os tipos específicos de justiça distributiva corretiva e o caso especial da reciprocidade Somente entre semelhantes é possível aplicar tais tipos específicos de justo A situação de justiça que dá condição a auferir o justo portanto tem que afastar os extremos Tais extremos são econômicos políticos culturais sociais Somente no meiotermo da situação social será possível então uma justiça específica de meiotermo É possível assim pensar nas condições sociais para o justo em Aristóteles representadas pelo gráfico carência meiotermo excesso Assim sendo somente se pode pensar em justiça num espaço sem carência e sem excesso Mas para Aristóteles esse espaço não é fixo É social histórico variável Exemplifiquemos Se alguém às margens do Rio Amazonas delibera por fazer em seu quintal um chafariz não faz um ato injusto porque a água que usa em abundância não representa a carência a alguém O arco do meiotermo da distribuição da água na Amazônia é largo Mas no deserto do Saara se um homem delibera por fazer um chafariz a água que utiliza para tal fim é um excesso na medida em que há carência de tal produto aos demais O arco do meiotermo da distribuição da água no Saara é estreito O justo para Aristóteles não é uma medida fixa do tipo x de água para cada ser humano em qualquer lugar a qualquer tempo É uma medida econômica histórica social e política Quando descobrirem meios hábeis de canalizar e distribuir a água do Amazonas para o deserto então a alta gastança de água na beira desse rio será injusta Para Aristóteles a justiça é uma manifestação da economia Claro está que Aristóteles mesmo tendo sido o que mais a fundo chegou ao entendimento econômico do justo no passado não alcançou uma compreensão avançada e crítica da relação entre justiça e economia Na verdade tendo mesmo atingido uma reflexão sobre o dinheiro enquanto referencial universal da produção Aristóteles estava limitado na sua visão econômica às próprias circunstâncias do modo de produção escravagista na medida em que diferentemente do capitalismo o escravagismo não universalizara o trabalho assalariado e o capital e portanto não tinha meios de fazer uma crítica profunda de todas as relações sociais subjacentes Karl Marx em sua obra máxime O capital percebeu a genialidade de Aristóteles ao atrelar uma visão do direito e da justiça à economia mas ao mesmo tempo apontou para as suas dificuldades na medida em que o trabalho antigo não era assalariado e o trabalhador não se prestava à medida de sua produção e seus ganhos pois não se apresentava como uma mercadoria tal qual outras para um mercado O trabalho escravo impunha uma compreensão ainda parcial do regime geral de trocas e valores que somente o capitalismo permitiu entender Diz Marx sobre Aristóteles As propriedades da forma de equivalente ficam ainda mais compreensíveis se voltarmos ao grande pesquisador que primeiro analisou a forma do valor além de muitas formas do pensamento da sociedade e da natureza Aristóteles O próprio Aristóteles nos diz assim o que o impede de prosseguir na análise a ausência do conceito de valor Que é o igual a substância comum que a casa representa perante a cama na expressão do valor da cama Tal coisa não pode em verdade existir diz Aristóteles Por quê A casa representa perante a cama uma coisa que a iguala à cama desde que represente o que é realmente igual em ambas o trabalho humano Aristóteles porém não podia descobrir partindo da forma do valor que todos os trabalhos são expressos na forma dos valores das mercadorias como um só e mesmo trabalho humano como trabalho de igual qualidade É que a sociedade grega repousava sobre a escravatura tendo por fundamento a desigualdade dos homens e de suas forças de trabalho Ao adquirir a ideia da igualdade humana a consistência de uma convicção popular é que se pode decifrar o segredo da expressão do valor a igualdade e a equivalência de todos os trabalhos por que são e enquanto são trabalho humano em geral E mais essa descoberta só é possível numa sociedade em que a forma mercadoria é a forma geral do produto do trabalho e em consequência a relação dos homens entre si como possuidores de mercadorias é a relação social dominante O gênio de Aristóteles resplandece justamente na sua descoberta da relação de igualdade existente na expressão do valor das mercadorias Somente as limitações históricas da sociedade em que viveu impediramno de descobrir em que consistia verdadeiramente essa relação de igualdade9 Sobre a relação do justo com a economia em Aristóteles expõe Tercio Sampaio Ferraz Júnior A análise do filósofo revela assim sua insuficiência básica a ausência de um conceito de valor Aristóteles não vê nas mercadorias algo como o trabalho humano que possa ser a substância comum entre elas Isso para ele é impossível realmente por natureza Por quê Porque a sociedade em que vivia o filósofo além de basearse no trabalho escravo tendo assim por base a desigualdade dos homens e de seu poder de trabalho não adquirira ainda a noção universal da igualdade humana o que é possível apenas às sociedades em que as relações dominantes entre os homens é a dos donos de mercadorias Aristóteles não tendo possibilidade de alcançar a noção de valortrabalho não podia estabelecer uma diferença entre valor de uso e valor de troca Isso não diminui o brilhantismo de seu gênio que lhe permitiu descobrir na expressão do valor das mercadorias uma relação de igualdade Apenas as condições da sociedade de seu tempo impediramno de ir ao que estava na base da própria igualdade10 Assim sendo ainda que limitado à esfera do modo de produção escravagista a compreensão do justo de Aristóteles beira em grande parte a apreensão universal da distribuição dos bens e trabalhos sua proporção mas faltoulhe a generalização crítica que só o capitalismo permitiria empreender É Marx quem na contemporaneidade alcança o âmago da justiça e da injustiça enquanto proporções no todo social Aristóteles teve que confinála apenas aos cidadãos livres e iguais entre si e dependentes do trabalho escravo cuja produção de riqueza não entra em conta em seu cenário sobre o justo Agentes e pacientes da justiça Para Aristóteles a justiça é uma ação Não se trata de uma virtude contemplativa A justiça não se revela em um mero conhecimento sobre o justo Acima de tudo o justo é um agir tal qual todas as demais virtudes No entanto esse agir não é simplesmente o produzir de um fato Considerase justo o ato que é feito deliberadamente com tal finalidade e injusto do mesmo modo o que é realizado com tal vontade A excelência moral virtude se relaciona com as emoções e ações e somente as emoções e ações voluntárias são louvadas e censuradas enquanto as involuntárias são perdoadas e às vezes inspiram piedade logo a distinção entre o voluntário e o involuntário parece necessária aos estudiosos da natureza da excelência moral e será útil também aos legisladores com vistas à atribuição de honrarias e à aplicação de punições11 A justiça assim sendo é uma virtude que se revela não apenas pela sua potencialidade mas sim pela sua concretude pela sua ação Um juiz que conheça o justo e não o aplica ao caso concreto não é justo Justo é o seu julgamento que determina que seja dado ao credor o que lhe é devido Tal disposição para o justo é o que faz com que a justiça não seja um rol de verdades preestabelecidas mas uma constante realização prudencial no caso concreto Nesse sentido trata Jeannette Antonios Maman A noção de justiça no pensamento grego em Platão e Aristóteles é definida brevemente na regra de ouro o seu a cada um que passa para o direito romano com Ulpiano Iustitia est constans er perpetua voluntas ius suum cuique tribuendi Daí deriva ser injustiça não dar a cada um o seu ou seja na base da injustiça encontrase a privação no patrimônio nas coisas corpóreas ou incorpóreas nos bens ou na pessoa de outrem portanto tudo muito concreto não há abstração na referência do seu12 O justo para Aristóteles não é uma medida contemplativa mas concreta e tal ação por sua vez não pode ser acidental mas sim deliberada Não se considera justo um juiz que por um acaso após uma noite de jogatinas e bêbado decidiu uma pena condenatória a um réu que foi se ver posteriormente era de fato culpado O acaso da sua ação justa não foi acompanhado de um ato voluntário que objetivasse a justiça Por isso não é o mero fato mas o fato e sua intenção que configuram o agir justo Não basta assim para a apreciação de um ato justo que ele exista por acaso Aristóteles chama a atenção para o seu caráter voluntário sistematizandoo Sendo os atos justos e injustos aqueles que descrevemos uma pessoa age injustamente ou justamente sempre que pratica tais atos voluntariamente quando os pratica involuntariamente ela não age injustamente ou justamente a não ser de maneira acidental O que determina se um ato é ou não é um ato de injustiça ou de justiça é sua voluntariedade ou involuntariedade quando ele é voluntário o agente é censurado e somente neste caso se trata de um ato de injustiça de tal forma que haverá atos que são injustos mas não chegam a ser atos de injustiça se a voluntariedade também não estiver presente Considero voluntária como já foi dito antes qualquer ação cuja prática depende do agente e que é praticada conscientemente ou seja sem que o agente ignore quem é a pessoa afetada por sua ação qual é o instrumento usado e qual é o fim a ser atingido por exemplo quem ela está golpeando com que objeto e para que fim além disso nenhuma destas ações deve ser praticada acidentalmente ou sob compulsão13 Para Aristóteles a coação e a ignorância não configuram a intenção de agir com justiça ou injustiça O desconhecimento ou as forças externas ao sujeito que pratica o ato ainda que levem a resultados que possam ser apreciáveis objetivamente como justos ou não por razão acidental não constituem atos de justiça exatamente por carência de ânimo para tal fim Alberto Alonso Muñoz expõe sobre Aristóteles Uma ação é voluntária de toda forma ao menos se o princípio da ação está no agente e se ele não age ignorando Mas a condição básica para que o agente possa agir diferentemente e ser portanto responsável por sua ação é que possua já plenamente desenvolvida a faculdade de deliberar Uma ação voluntária agora introduzindo as demais condições é aquela que resulta a partir de um estímulo da natureza própria do agente naquele momento que pode vir a ser mudada sem que esta fosse contradita por uma causalidade que anula estas condições ou por uma falha no sistema de informações do agente14 Por via reversa do mesmo modo que a apreciação do justo e do injusto se revelam a partir da intenção do agente Aristóteles se pergunta a respeito do paciente da justiça e da injustiça Aquele que é injustiçado assim o é porque os atos que geram tal situação foram feitos contra sua vontade Se o paciente da injustiça tivesse o ânimo de ser injustiçado a situação resultante seria injusta mas não se poderia dizer da ação que foi realizada como uma injustiça Além disso para Aristóteles aquele que distribuindo para si e para outro dá injustamente mais ao outro do que para si é magnânimo mas seu ato não deixa de ser injusto ainda que revestido dessa galhardia Aristóteles ainda se pergunta quanto aos agentes ou pacientes da justiça se alguém pode ser injusto consigo mesmo A sua resposta é negativa A justiça ou injustiça são relações com o outro e não consigo mesmo Porque de fato Aristóteles dirá não se pode roubar a si próprio nem cometer ou sofrer adultério mantendo relações sexuais com a própria esposa Somente em sentido lato e figurado podese dizer que os apetites paixões e fraquezas de um homem o fizeram cometer uma injustiça contra si mesmo Com efeito a justiça é a forma perfeita de excelência moral virtude porque ela é a prática efetiva da excelência moral perfeita Ela é perfeita porque as pessoas que possuem o sentimento de justiça podem praticála não somente em relação a si mesmas como também em relação ao próximo15 Para Aristóteles pois a justiça é bem para o outro e não para si próprio marcando o caráter político e não individualista como o será nos filósofos do direito modernos do justo A equidade A reflexão aristotélica sobre a justiça culmina no Livro V da Ética a Nicômaco com a exaltação da equidade Para Aristóteles acima da justiça da lei há a justiça do caso do bom julgamento de cada caso concreto e a essa adaptação do geral ao específico dá ele o nome de equidade O sentido aristotélico de respeito às leis é diferente de seu uso moderno O pensamento jurídico moderno e contemporâneo constituise num modelo exacerbado de juspositivismo A lei posta pelo Estado deve ser obedecida sem maiores discussões Para Aristóteles o sentido da lei é outro Na estrutura política dos gregos e em especial dos atenienses a lei era a manifestação básica da unificação da vontade dos cidadãos que ao tempo da democracia deliberavam coletivamente e de maneira direta em razão de suas intenções concretas Por isso para Aristóteles a lei é boa Seguila é fazer concretizar o interesse de todos da pólis Desrespeitála é fazer com que o interesse particular desarranje a organização política Aristóteles reconhece que no sentido geral a lei é justa No entanto há uma manifestação de justiça ainda mais alta que a lei a própria equidade Dirá Aristóteles que a equidade sendo justa não é distinta da própria lei sendo esta justa também Não perfazem duas espécies de justiça opostas mas pelo contrário são complementares O equitativo é justo não como negação da justiça da lei mas sim como corretivo da justiça legal Sendo a lei uma previsão ampla que alcança uma série de fatos e hipóteses a lei só pode tratar desses casos num nível amplo Mas há as especificidades de cada caso concreto Nessa casuística que em geral não consegue ser previamente regulada dada a generalidade da lei a equidade faz um papel de corrigir a omissão estendendo o justo até as minúcias Aristóteles compara o ofício do juiz na equidade àquele de quem julga conforme a Régua de Lesbos Nessa ilha do mundo grego os construtores se valiam de uma régua flexível que se adaptava à forma das pedras sem ser rígida Também a equidade demanda do jurista uma flexibilidade Não pode ser o homem justo um mero cumpridor cego das normas sem atentar para as especificidades de cada caso concreto Assim Aristóteles se refere sobre a equidade Agora podemos ver claramente a natureza do equitativo e perceber que ele é justo e melhor que uma simples espécie de justiça É igualmente óbvio diante disto o que vem a ser uma pessoa equitativa quem escolhe e pratica atos equitativos e não se atém intransigentemente aos seus direitos mas se contenta com receber menos do que lhe caberia embora a lei esteja do seu lado é uma pessoa equitativa e esta disposição é a equidade que é uma espécie de justiça e não uma disposição da alma diferente16 Na filosofia do direito de Aristóteles a justiça sendo coroada com a equidade revelase um humilde artesanato que abandona a pretensão a uma universalidade objetiva e fria A teoria do justo de Aristóteles não é uma compilação acabada de verdades Seu pensamento tateia sobre as hipóteses tem idas e vindas e acaba por reconhecer no justo uma humildade que há de penetrar no oculto de cada situação Ao contrário do pensamento jurídico moderno que é orgulhosamente juspositivista crente na absoluta necessidade e justiça da norma positiva estatal a justiça em Aristóteles é humana e deve se dobrar para compreender a fundo cada situação na qual é chamada a dar seu julgamento A reflexão sobre as leis e a equidade conduz à questão do direito naturalem Aristóteles Ao contrário das postulações medievais e modernas que se valem da expressão para designar outros conceitos muito distintos daqueles clássicos para Aristóteles o direito natural não é uma ideia universal formalizada nem é um catálogo do justo e do injusto Na própria raiz da palavra o direito natural é a apreensão da natureza das coisas O auscultar da natureza revela o justo isto é aquilo que lhe é mais apropriado Cada caso cada pessoa cada circunstância revelamse a partir de si próprios e de sua natureza própria Por isso mais alto que a lei é a equidade que coroa a justiça para Aristóteles Diz Aloysio Ferraz Pereira Esse direito é natural porque deriva da natureza complexa de Aristóteles que se não reduz ao determinismo à quantidade e à causalidade mecânica próprios do sentido que adquiriu a partir de Descartes Nessa natureza o direito que deriva dela tem um conteúdo material uma forma inteligível e um fim a que se refere além de uma causa eficiente É um direito vivo que por isso mesmo não sobreviveu à por assim dizer natureza morta da era cartesiana em que ainda vivemos E aquele fim se nos oferece na natureza mesma de resto desde sempre se nos mostrou através simplesmente da observação Esta aliás não se faz como um registro passivo A teoria do direito natural pode ser definida como um método experimental Antecipa se ao direito comparado e à sociologia Sujeito às coordenadas de tempo e espaço adaptase às circunstâncias de cada grupo social politicamente organizado Mas com a ajuda do direito natural nunca se descobrirá nem se há de jamais elaborar um código de leis imutáveis e definitivas17 Também ao contrário dos medievais e dos modernos para os quais as suas concepções de direito natural são contra as leis positivas a concepção jusnaturalista de Aristóteles não vê oposição entre esses dois conceitos O direito natural complementa o direito positivo18 Isso porque a natureza para Aristóteles não é de uma categoria distinta daquela da vida social As leis positivas são históricas variáveis mutáveis mas assim também o é a natureza Numa constante mímesis imitação de deus que é perfeito e não se move a natureza se move para se parecer com tal perfeição Assim sendo a própria justiça natural é mutável flexível e nisso não é distinta da lei positiva apenas lhe é complementar num nível superior O direito natural aristotélico não é um catálogo estabelecido de determinações do agir19 A régua de Lesbos como adaptação ao justo revela que o direito natural de Aristóteles não é um rol de normas mas sim um agir artesanal do qual se pode mesmo dizer artístico A definição dos romanos do direito como arte do justo reflete de modo sintético e poderoso o modo de pensar de Aristóteles A prudência O pensamento aristotélico é constituído a partir de um duplo enfrentamento A ciência para Aristóteles é uma demonstração cabal silogística em relação à qual não cabe refutação Mas a pesquisa sobre as questões concretas como a pesquisa do justo não se faz a partir de um procedimento formalista fechado20 É o olhar à realidade que forma a pesquisa a reflexão a comparação e a posterior extração das possibilidades Não uma abstração mas uma mirada ao concreto é o método por excelência de Aristóteles para a compreensão do direito e do justo Diz Oswaldo Porchat Pereira Com efeito ao contrário do que poderíamos esperar não é sob a forma de rígidas cadeias de silogismos demonstrativos deduzindo rigorosamente suas conclusões a partir de princípios assumidos no ponto de partida como verdades indubitáveis e por si mesmas conhecíveis que se apresentam ao leitor as mais importantes obras em que o filósofo desenvolve sua doutrina a Física os Tratados Do Céu Da Geração e Perecimento e Da Alma a Metafísica a Ética Nicomaqueia etc Mas já sabemos que tal fato em nada representa uma contradição ou ambiguidade qualquer da doutrina nem uma oposição que se poderia pretender natural entre a teoria ideal da ciência e sua prática efetiva tratase simplesmente como desde há muito vimos da distinção estabelecida e proclamada pelo filósofo entre ciência e pesquisa entre o saber alcançado e definitivamente estabelecido e o saber em constituição O que Aristóteles sempre ou quase sempre nos expõe são os meandros de sua investigação em marcha o lento tatear do trabalho preliminar de pesquisa que antecede à aquisição de cada uma daquelas premissas e que por isso mesmo prepara a emergência das condições de possibilidade do silogismo demonstrativo21 A mirada à realidade na filosofia de Aristóteles se revela então como a manifestação por excelência para a compreensão do direito e da ética O justo não pode ser pensado como uma sistematização de ideias abstratas extraídas de uma mente calculante que ignore a realidade Tal forma de pensar o justo foi típica dos modernos mas não dos clássicos Para Aristóteles a justiça se manifesta e se completa com a prudência Aphronêsis que se pode traduzir por prudência é um conceito que se verifica em muitas obras do pensamento aristotélico mas que apresenta um tratamento específico na própria Ética a Nicômaco A prudência é uma virtude prática Não se trata do cumprimento do dever pelo próprio dever como será o caso na modernidade com Kant para quem o imperativo do dever se apresenta como categórico sem possibilidade de flexibilização Para Aristóteles a virtude da prudência atenta para a possibilidade de sua concretização para suas implicações para a sua prática em face da realidade que se lhe apresenta A prudência para Aristóteles melhor se vê não como uma definição abstrata mas a partir do próprio agir dos homens prudentes Tal virtude que os teólogos medievais passarão a considerar uma virtude cardial ao lado da coragem da temperança e da própria justiça se revela como uma consecução em vista das circunstâncias Assim não é uma virtude absoluta inflexível mas está sim no mesmo contexto da própria equidade na medida da flexibilidade da sua mirada dos casos concretos e das situações específicas Embora a prudência seja distinta da arte porque tem em vista a ação estão ambas num campo similar que contrasta com o da técnica da ciência que trata de relações necessárias A prudência menos do que tratar do necessário trata do possível do provável Ao invés de se firmar na absoluta e sistemática lógica da razão a prudência trata do razoável O sentido da prudência assim sendo é o de uma certa humildade em face da realidade e das circunstâncias Sobre a prudência em Aristóteles diz Pierre Aubenque Partese do uso comum constatase que é chamado phronimos o homem capaz de deliberação lembrase que só se delibera sobre o contingente enquanto a ciência diz respeito ao necessário portanto a prudência não é ciência A prudência seria então arte Não pois a prudência visa à ação e a arte à produção logo a prudência não é arte Se pois a prudência não é nem ciência nem arte resta que seja uma disposição o que a distingue da ciência prática o que a distingue da arte Mas isso provaria no máximo que ela é uma virtude Para distinguila de outras virtudes em particular das virtudes morais é preciso acrescentar outra diferença específica enquanto a virtude moral é uma disposição prática que concerne à escolha a prudência é uma disposição prática que concerne à regra da escolha Não se trata da retidão da ação mas da correção do critério22 A atividade jurídica para Aristóteles revelase como uma espécie de busca humilde e artesanal do justo A prudência é uma virtude do bom em oposição ao excelente ou absolutamente correto A equidade que é melhor que a inflexibilidade da lei élhe semelhante em termos de renúncia à frieza da plena sistematização e da objetividade e também semelhante em termos de virtude que tem vista as circunstâncias e portanto a boa justeza ao caso Por isso o direito se tece a partir de referências não plenamente exatas Aristóteles não vê nisso um desmerecimento do agir jurídico ou da virtude da justiça mas sim apenas uma sua especificidade Sobre tal continua Aubenque A metafísica nos ensina malgrado ela mesma que o mundo sublunar é contingente isto é inacabado Mas os limites da metafísica são o começo da ética Se tudo fosse claro nada haveria a fazer e resta a fazer o que não se pode saber No entanto não se faria nada se não se soubesse de algum modo o que é preciso fazer A meio caminho de um saber absoluto que tornaria a ação inútil e de uma percepção caótica que tornaria a ação impossível a prudência aristotélica representa ao mesmo tempo que a reserva verecundia do saber a possibilidade e o risco da ação humana Ela é a primeira e última palavra deste humanismo trágico que convida o homem a desejar todo o possível mas somente o possível e deixar o resto aos deuses23 Justamente porque não se trata de um sistema dedutivo necessário e formalmente fechado para Aristóteles o agir do jurista é contingente dependente do melhor que o homem puder oferecer o que só vem a ressaltar sua virtude O pensamento político aristotélico As reflexões filosóficas de Aristóteles sobre o direito e o justo contidas fundamentalmente na Ética a Nicômaco complementamse com suas reflexões políticas tratadas em sua obra A política24 Para Aristóteles o fundamento último do justo é político na medida em que a ação dos homens em sociedade é que dá o fundamento do mérito e da igualdade O tratado da proporcionalidade sistematizado na Ética a Nicômaco dá as ferramentas para a manipulação do justo mas não o critério substancial e último do mérito É a vontade política que reduz ou aumenta desigualdades é a ação política que mantém níveis variados de distribuição de riquezas em uma determinada sociedade Para Aristóteles toda sua compreensão a respeito do justo tem por alicerce a perquirição a respeito das razões de ser da própria sociedade do Estado daquilo que entre os gregos levava o nome de pólis Essa unidade política social econômica cultural e afetiva é que dá sentido a toda a reflexão ética e sobre o justo de Aristóteles A política Para buscar entender o pensamento aristotélico sobre a política a sociedade ou aquilo que se possa chamar no sentido vago de Estado é preciso ter em conta que a sua visão é profundamente distinta daquela que é incorporada no pensamento moderno e contemporâneo Para nós o Estado é considerado uma entidade à parte da sociedade Há uma tensão entre os interesses do Estado chamados por nós de maneira estrita de interesses políticos e os interesses da sociedade Para Aristóteles não há oposição entre a organização política estatal e a própria vida social São uma mesma situação O mundo grego não conhecia um elemento estatal que fosse distinto da vida social de seus cidadãos A pólis como cidade era ao mesmo tempo aquilo que chamamos modernamente por sociedade e também aquilo que denominamos Estado Também não se pode vislumbrar no pensamento aristotélico a recorrente divisão moderna e contemporânea entre o interesse individual e o interesse político ou social Para nós há uma oposição entre o indivíduo e o todo Para Aristóteles há uma relação complementar entre tais elementos É pela harmonia que se relaciona o indivíduo com o todo social Assim sendo a vida social para Aristóteles não tem por razão simplesmente ser um agrupamento quantitativo que sirva a socorrer os indivíduos em suas necessidades A vida social tem uma razão mais profunda que é a própria felicidade da comunidade As sociedades visam a um certo bem que não é só o bem de cada indivíduo particularizado Ao contrário dos modernos que dizem que a vida social existe somente para o benefício de cada indivíduo Aristóteles dirá que a comunidade existe para o benefício social Assim em A política Assim o homem é um animal cívico político mais social do que as abelhas e os outros animais que vivem juntos O Estado ou sociedade política é até mesmo o primeiro objetivo a que se propôs a natureza O todo existe necessariamente antes da parte As sociedades domésticas e os indivíduos não são senão as partes integrantes da Cidade todos subordinados ao corpo inteiro todas distintas por seus poderes e suas funções e todas inúteis quando desarticuladas semelhantes às mãos e aos pés que uma vez separados do corpo só conservam o nome e a aparência sem a realidade como uma mão de pedra O mesmo ocorre com os membros da Cidade nenhum pode bastar se a si mesmo Aquele que não precisa dos outros homens ou que não pode resolverse a ficar com eles ou é um deus ou um bruto Assim a inclinação natural leva os homens a este gênero de sociedade25 O homem para Aristóteles não é um ser voltado ao seu interesse individual É um animal político zoon politikon Somente se é um deus ou seja que se baste a si mesmo ou um bruto é que não se volta ao bem de ser em sociedade A finalidade em comum liga os indivíduos em comunidade Há uma espécie de afecção geral de viver em comum que dá sentido à sociedade Tratase da noção aristotélica de amizade philia A amizade o bem querer recíproco é tanto fundamental nas relações intersubjetivas quanto na estruturação da vida social Aristóteles chega mesmo a fazer uma relação direta entre a amizade e a política e entre a amizade e a justiça A amizade parece também manter as cidades unidas e parece que os legisladores se preocupam mais com ela do que com a justiça efetivamente a concórdia parece assemelharse à amizade e eles procuram assegurála mais que tudo ao mesmo tempo que repelem tanto quanto possível o facciosismo que é a inimizade nas cidades Quando as pessoas são amigas não têm necessidade de justiça enquanto mesmo quando são justas elas necessitam da amizade considerase que a mais autêntica forma de justiça é uma disposição amistosa26 Há circunstâncias peculiares a cada sociedade razões acidentais de ser como o ânimo comercial guerreiro etc E além disso há algumas circunstâncias que são fundamentais à vida social como a amizade e a própria justiça na medida em que a justiça é uma virtude política bem para o outro Assim Eduardo Bittar e Guilherme de Almeida A amizade tanto quanto o justo se perfazem em comunidade se realizam e se praticam com o outro a noção de alteridade é precipuamente formativa da essência do significado de amizade e o mesmo ocorre com o justo Ao se mencionar amizade pressupõese o outro ao se mencionar justiça pressupõese também o outro Daí que o outro participa de toda forma de comunidade à qual o homem possa pertencer quais a dos familiares a dos companheiros de navegação a dos companheiros de armas Para cada forma de comunidade uma forma diferente de amizade bem como até por decorrência do tipo diverso de relação de confiança e interesse uma forma diferente de justiça A amizade na mesma medida da justiça varia conforme o tipo de comunidade à qual pertença o homem27 Para Aristóteles a vida social envolve essencialmente um sentimento de pertença em comum Diferentemente dos modernos que fazem do indivíduo atomizado o eixo da sociedade Aristóteles faz da sociedade o eixo do indivíduo A escravidão Além da pergunta sobre a forma da igualdade feita na Ética a Nicômaco ao tratar das várias espécies de justiça Aristóteles se pergunta sobre o conteúdo dessa igualdade Nas sociedades gregas e em específico em Atenas iguais eram apenas os cidadãos Uma série de outras classes grupos gêneros e estamentos estava fora dessa igualdade As justiças distributiva corretiva e a reciprocidade são medidas que valem somente entre os cidadãos Levantase assim logo de início o problema de pensar a justiça entre os cidadãos e os não cidadãos No modo de produção escravagista o abismo social existente entre os gregos conduz necessariamente à apreciação da relação da escravidão com a justiça No pensamento aristotélico o espaço da justiça se perfaz entre os cidadãos Isso não quer dizer que não haja relações chamadas de justas num sentido mais lato entre os cidadãos e os não cidadãos É que na verdade sendo pessoas desiguais estabelecemse entre elas relações de outro tipo como a proteção a subordinação o mando Aristóteles não alija o escravo de tratamentos que se possam chamar dignos Mas toda forma de relação entre senhor e escravo é considerada privada não envolvida no espaço público no qual se consolida a política e o justo As relações domésticas entre os gregos são tanto as do lar do marido para com a mulher do pai para com os filhos como do senhor para com o escravo Aristóteles dá nome a elas de poder marital poder paternal e poder despótico Sobre o despotismo do senhor para com o escravo distingue duas formas a servidão natural e a convencional haurida da lei ou da tradição de fazer da presa de guerra um escravo ainda que originalmente tal pessoa tenha sido livre Aristóteles considera natural que o escravo que nasceu sob tal condição assim se mantenha e pondera inconclusivamente quanto àquele que foi tornado escravo pela dívida ou pela guerra Numa palavra é naturalmente escravo aquele que tem tão pouca alma e poucos meios que resolve depender de outrem Tais são os que só têm instinto vale dizer que percebem muito bem a razão nos outros mas que não fazem por si mesmos uso dela Toda a diferença entre eles e os animais é que estes não participam de modo algum da razão nem mesmo têm o sentimento dela e só obedecem a suas sensações Ademais o uso dos escravos e dos animais é mais ou menos o mesmo e tiramse deles os mesmos serviços para as necessidades da vida O que convém ao todo convém também à parte o que convém à alma convém igualmente ao corpo Ora o escravo faz por assim dizer parte de seu senhor embora separado na existência é como um membro anexado a seu corpo Ambos têm o mesmo interesse e nada impede que estejam ligados pelo sentimento da amizade quando foi a conveniência natural que os reuniu As coisas são diferentes quando eles só estão reunidos pelo rigor da lei ou pela violência dos homens28 A teoria da escravidão de Aristóteles é abominável e absurda para a atualidade Ao seu tempo estava coadunada à sua perspectiva filosófica que mais se inclinava a explicar sua situação do que propriamente pensar para transformála Certamente é menos entusiasta da escravidão que seus contemporâneos não entoa cânticos em busca de uma sociedade escravocrata pensa que possa haver entre o senhor e o escravo relações de amizade mas considera a escravidão natural e portanto em tal tema não conseguiu romper os limites do próprio mundo de modo de produção escravagista em que vivia29 Os tipos de governo A reflexão aristotélica sobre o justo se completa com a questão dos tipos de governo Já que a justiça se perfaz socialmente na ação política e não é um mero resultado de uma medida cerebrina como entender os arranjos que formam o governo das sociedades Para Aristóteles embora seja uma sociedade de modo similar ao mando do senhor sobre os filhos a mulher e os escravos a política se faz entre os iguais Assim sendo não se pode imaginar que entre tais iguais haja interesses particulares que se sobreponham a todos os demais O governo é bom para Aristóteles quando ele busca a felicidade comum dos cidadãos Isso não quer dizer que todos devam necessariamente mandar ao mesmo tempo Há aptidões para o governo que não são comuns a todos e há sociedades que se arranjam segundo variados modos e propósitos Por isso o governo que é bom a todos não necessariamente é aquele cuja soberania é partilhada por todos O bom governo antes de ser necessariamente o que é governado por todos é o que alcança como resultado a felicidade de todos Valendose dos critérios da finalidade do poder político e do número de governantes Aristóteles sistematiza os possíveis tipos de governo suas virtudes e seus defeitos No que tange à extensão do governante isto é o seu tamanho ou número Aristóteles vislumbra três possíveis extensões o governo de um o governo de alguns ou o governo da maioria No que tange ao objetivo do poder político ele pode ser pensado como o interesse próprio desse grupo o interesse de um o interesse dos poucos ou o interesse dessa maioria ou o interesse de todos Sendo duas as possíveis finalidades do poder ou para seu grupo ou para todos e sendo três as possíveis extensões do poder um poucos ou a maioria resulta daí um quadro de seis possíveis tipos de governo Exercício do poder Um só Alguns A maioria No interesse de todos Monarquia Aristocracia República No interesse próprio Tirania Oligarquia Democracia Sobre os tipos de governo assim exprime Aristóteles O governo é o exercício do poder supremo do Estado Este poder só poderia estar ou nas mãos de um só ou da minoria ou da maioria das pessoas Quando o monarca a minoria ou a maioria não buscam uns ou outros senão a felicidade geral o governo é necessariamente justo Mas se ele visa ao interesse particular do príncipe ou dos outros chefes há um desvio O interesse deve ser comum a todos ou se não o for não são mais cidadãos Chamamos monarquia o Estado em que o governo que visa a este interesse comum pertence a um só aristocracia aquele em que ele é confiado a mais de um denominação tomada ou do fato de que as poucas pessoas a que o governo é confiado são escolhidas entre as mais honestas ou de que elas só têm em vista o maior bem do Estado e de seus membros república aquele em que a multidão governa para a utilidade pública este nome também é comum a todos os Estados Estas três formas podem degenerar a monarquia em tirania a aristocracia em oligarquia a república em democracia A tirania não é de fato senão a monarquia voltada para a utilidade do monarca a oligarquia para a utilidade dos ricos a democracia para a utilidade dos pobres Nenhuma das três se ocupa do interesse público30 Desses seis possíveis tipos de governo três são virtuosos e três são decaídos O governo virtuoso é o que almeja ao interesse de todos e não só do grupo soberano Por isso para Aristóteles mais importante do que o número dos que governam ou a sua extensão está a finalidade dos diferentes tipos de governo Os governos que se voltam meramente ao interesse daquela extensão que detém o poder são pervertidos Em face da tradição moderna e contemporânea também a tipologia aristotélica sobre os governos causa muita estranheza Sua posição a respeito da democracia e seu estereótipo se choca contra grande parte do melhor da tradição moderna e contemporânea A recusa em fazer um juízo de mérito sobre a extensão em si do poder soberano e só fazêlo no que tange àfinalidade é estranha à modernidade para a qual os polos se invertem Nas organizações políticas estatais típicas do capitalismo a forma tem mais valor que a finalidade Assim sendo para os modernos a democracia passa a ser boa porque todos votam ainda que ela seja em proveito da minoria detentora do poder econômico Na modernidade a preocupação sobre a extensão do poder governante chama mais a atenção do jurista do político e do cidadão do que a sua finalidade e os objetivos que persegue Na sociedade escravagista do passado na qual a extensão do poder era uma situação já limitada a uma minoria Aristóteles não conseguiu vislumbrar atenção especial ao aspecto extensivo do poder de novo excluindo mulheres e escravos por exemplo Mas ao mesmo tempo a concretude da finalidade do bem de todos é o contraste da filosofia do direito antiga às falsas preocupações formais e quantitativas do poder político moderno e contemporâneo31 1 BITTAR Eduardo C B Curso de filosofia aristotélica leitura e interpretação do pensamento aristotélico Barueri Manole 2003 p 136 2 ARISTÓTELES Ética a Nicômacos Brasília Ed UnB 1999 p 95 3 Ibid p 96 4 Ibid p 97 5 A divisão a que chegara o estudo de Aristóteles entre dois tipos de aplicação da justiça justiça distributiva e justiça comutativa decorrentes de métodos diferentes era de grande fecundidade Alguns autores veem nela a fonte da futura distinção entre direito público e direito privado Caso se aceite que o estado e o direito público são competentes para realizar o primeiro trabalho isto é a distribuição dos patrimônios podese constituir em seguida uma ciência autônoma para regular as comutações seria o direito privado que a ciência dos jurisconsultos teria desenvolvido a partir do princípio de igualdade simples ou aritmética De fato os juristas romanos exploraram metodicamente este último princípio teoria do enriquecimento sem causa mutuum preço justo damnum injuria datum condictiones sine causa VILLEY Michel A formação do pensamento jurídico moderno São Paulo Martins Fontes 2005 p 43 6 ARISTÓTELES Ética a Nicômacos op cit p 101 7 Ibid p 102 8 Ibid p 101 9 MARX Karl O capital Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2008 Livro I v 1 p 81 10 FERRAZ JR Tercio Sampaio Estudos de filosofia do direito São Paulo Atlas 2002 p 195 11 ARISTÓTELES Ética a Nicômacos op cit p 49 12 MAMAN Jeannette Antonios Fenomenologia existencial do direito São Paulo Quartier Latin 2003 p 73 13 ARISTÓTELES Ética a Nicômacos op cit p 104 14 MUÑOZ Alberto Alonso Liberdade e causalidade ação responsabilidade e metafísica em Aristóteles São Paulo Discurso Editorial 2002 p 144 e 413 15 ARISTÓTELES Ética a Nicômacos op cit p 93 16 Ibid p 110 17 PEREIRA História da filosofia do direito op cit p 81 18 A distinção que faz Aristóteles entre o direito natural e o direito positivo é segundo toda verossimilhança uma distinção no interior do direito positivo entre aquilo que é natural e aquilo que é legal isto é puramente convencional Talvez então não tenha cabimento examinar aqui a maneira pela qual o filósofo concebia as relações entre o direito positivo e alguma norma natural de direito nem de por isso supor como o faz a interpretação comum de origem tomista que Aristóteles considerava o direito positivo ou as leis positivas uma particularização necessária do direito natural ou da lei natural Essa suposição dificilmente pode extrair um argumento daquilo que o filósofo afirma em outro lugar sobre uma lei natural não escrita comum a todos os homens e ela parece conduzir definitivamente a um impasse Se pois como se imagina Aristóteles assimilava aqui o direito ou o justo natural a uma lei não escrita qualquer que o direito positivo particulariza como ele poderia sustentar que essa lei varia como o direito positivo BODÉÜS Richard Os fundamentos naturais do direito e a filosofia aristotélica In ZINGANO Marco Org Sobre a ética nicomaqueia de Aristóteles textos selecionados São Paulo Odysseus 2010 p 343 19 A Ética objetiva e realista de Aristóteles não estabelece normas abstratas para o Homem como acontece nas Éticas subjetivas modernas Pelo contrário a cerebração de Aristóteles capta katà physin o sentido da Justiça e da Equidade mas antes estuda analiticamente o modo exaustivo o significado do justo e analisa as situações do justo no homem ARAÚJO Wandyck Nóbrega de Fundamentos aristotélicos do direito natural Porto Alegre Sergio Fabris 1988 p 72 20 Aristóteles demonstrou aqui sua genialidade ímpar Em primeiro lugar era preciso determinar o que é um bom argumento Aristóteles dividiu essa questão em duas o que é um argumento válido e o que é um argumento cientificamente válido Para a primeira pergunta deu como resposta sua teoria silogística o primeiro estudo da Lógica e das inferências formais Um argumento científico segue a estrutura inferencial válida mas tem também premissas verdadeiras Ora sendo válido e construído com premissas verdadeiras a conclusão não pode ser falsa Porém como se assegurar da cientificidade do argumento Para responder a esse problema Aristóteles novamente dividiu a questão em duas partes Em primeiro lugar é preciso saber o que é a explicação científica Explicar cientificamente algo para Aristóteles consiste em dar a causa do objeto Um silogismo científico tem premissas adequadas à coisa na medida em que elas revelam a sua conexão de causalidade Isso leva a uma teoria geral das causas Em segundo lugar um silogismo científico precisa de garantias sobre a verdade de suas premissas Isso leva por sua vez a uma investigação sobre a natureza da verdade ZINGANO Marcos Platão e Aristóteles o fascínio da filosofia São Paulo Odysseus 2005 p 87 e 89 21 PEREIRA Oswaldo Porchat Ciência e dialética em Aristóteles São Paulo Ed Unesp 2001 p 374 22 AUBENQUE Pierre A prudência em Aristóteles São Paulo Discurso Editorial 2003 p 61 23 Ibid p 281 24 Farseia mister uma análise apropriada para determinar com maior precisão o lócusteórico científico da Política aristotélica No tratado homônimo não encontramos nenhuma reflexão metodológica especial certamente porque o início da Ética nicomaqueiaé pensado como a introdução metodológica geral à totalidade da Política A parte final daÉtica nicomaqueia que serve de transição para a Política retoma essa temática de forma patente GADAMER HansGeorg A ideia do bem entre Platão e Aristóteles São Paulo Martins Fontes 2009 p 163 25 ARISTÓTELES A política São Paulo Martins Fontes 2000 p 5 26 ARISTÓTELES Ética a Nicômacos op cit p 153 27 BITTAR Eduardo C B ALMEIDA Guilherme Assis de Curso de filosofia do direito São Paulo Atlas 2009 p 154 28 ARISTÓTELES A política op cit p 13 e 16 29 Francis Wolff tratando do tema da escravidão em Aristóteles chama a atenção para possíveis leituras filosóficas críticas do assunto como a kantiana e a marxista e expõe algumas opiniões contemporâneas diretamente ligadas a leituras do texto de Aristóteles Assim ao rejeitar as críticas mas também as defesas habituais da escravatura Aristóteles acaba por defender uma forma de escravatura que vai na contracorrente das práticas e das instituições do seu tempo A opinião de Goldschmidt unese à do historiador E Barker que observava A doutrina de Aristóteles pode nos parecer uma defesa da escravatura é muito possível que ela tenha surpreendido seus contemporâneos por ser também um ataque WOLFF Francis Aristóteles e a política São Paulo Discurso Editorial 1999 p 101 30 ARISTÓTELES A política op cit p 105 31 A finalidade é pois o verdadeiro motor do livro A Política É ela em particular que leva Aristóteles às suas soluções originais diante dos problemas políticos tradicionais Assim a justiça dos diferentes regimes depende menos da maneira pela qual o poder é distribuído nele que do fim com vistas ao qual ele é exercido o interesse geral É também o princípio de finalidade que explica a defesa muito insólita da soberania popular que se desenha ao longo dessas páginas Tudo acontece de fato como se ao arrepio das argumentações aristocrata e democrata Aristóteles esboçasse uma apologia aristocrática da democracia em vez de pretender como os democratas que é melhor que o povo governe ele mostra que o povo governa melhor Nesta medida a política aristotélica é democrata bem como o pensamento da democracia aristotélica independentemente daquilo que o próprio Aristóteles o aluno de Platão e o mestre de Alexandre pudesse pensar a respeito WOLFF Aristóteles e a política op cit p 149