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P o r u m a H i s t ó r i a P R A Z E R O S A E C O N S E Q Ü E N T E Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky 0 PROBLEMA As grandes mudanças políticas e econômicas ocorridas no final cio século XX causaram muita perplexidade entre professores e estudan tes de História em geral criando em certos círculos atitudes de ceti cismo com relação ao próprio conhecimento histórico o valor do en sino de História nas escolas e seu potencial transformador Por outro lado diante da difusão das novas tecnologias globais uestionase e até duvidase da eficácia educacional dos livros consi derados com freqüência um meio de comunicação desinteressante e obsoleto 1 da utilidade dos professores como agentes de ensino tidos mino comunicadores inábeis e incompetentes e das propostas curri ulares ligadas às realidades nacional e local vistas como inadequadas ultrapassadas Procurando acompanhar as mudanças os novos tempos muitos 1 i i ilrssores acabam comprando a idéia de que tudo que não é muito veloz i i liato Na sala de aula o pensamento analítico é substituído por achis m i o s alunos trocam a investigação bibliográfica por informações super Ii tais tios sites de pesquisa pasteurizados vídeos são usados para subs 11111 i i e não complementar livros E o passado visto como algo passado Miiimto superado tem tanto interesse quanto o jornal do dia anterior 7 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a Em resposta às decepções com o socialismo seja o real seja o idealizado e ao avanço sem grandes obstáculos da ideologia neoliberal o desencanto com qualquer projeto ideológico que contemple um com prometimento com a diminuição das desigualdades sociais e os valores humanistas parece tomar conta de grande parte dos profissionais ocupa dos com o ensinoaprendizagem particularmente na área de História Nos meios mais inquietos dos anos 60 e 70 acreditavase que convicções políticas bastavam para fornecer todas as respostas e nortear as práticas de ensino Não havia por que perder tempo com investiga ções cansativas e análise de situações concretas pois em qualquer pe ríodo da História em qualquer latitude do planeta era possível iden tificar os bons e os maus quem era nosso e quem era deles Crítica e política stricto sensu valiam mais que o estudo Hoje tais posturas es tão superadas e temos consciência de que pagamos todos muito caro pela nossa leviandade o conteúdo da disciplina foi deixado de lado a erudição foi considerada coisa de esnobes e a leitura da História foi du ramente prejudicada por tal simplismo Hoje se sabe que estudar His tória interpretála ensinála não é tão fácil como parecia um mero instrumento de propaganda ideológica ou revolução Porém no lugar da utopia abandonada parece ter ficado um vazio Tudo bem acusamos a pancada que recebemos com o fim de cer tas utopias e a aparente vitória de um modelo de mundo voltado para o consumismo desenfreado a existência de uma única potência hegemô nica o comprometimento de modelos teóricos tidos como catecismo pa ra muitos Mas após o atordoamento inicial não podemos correr o pe rigo de junto com a água do banho jogar fora também o bebê abandonando juntamente com as utopias ultrapassadas o idealismo de educador e a utopia da mudança descartando toda leitura junto com os materiais didáticos ine ficazes e apostando todas as fichas na redenção dos computadores e audiovisuais de qualidade discutível atirando na mesma lata de lixo do conteúdo ensinado o dog matismo simplista do marxismo ortodoxo e a noção de processo histó rico ou a concepção de seres humanos como sujeitos da História 18 3a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y O grande desafio que se apresenta neste novo milênio é ade quar nosso olhar às exigências do mundo real sem sermos sugados pela onda neoliberal que parece estar empolgando corações e m en tes E preciso nesse momento mostrar que é possível desenvolver uma prática de ensino de História adequada aos novos tempos e alunos rica de conteúdo socialmente responsável e sem ingenuida de ou nostalgia Historiadorprofessor sem utopia é cronista e sem conteúdo nem cronista pode ser A PROPOSTA A favor do conhecimento humanista Ao mesmo tempo em que condenam no discurso o pragmatis mo e o materialismo dos novos tempos as escolas parecem ter esque cido sua parcela de responsabilidade na formação hum anista dos alu nos Como estabelecer contrapesos ao materialismo irresponsável da sociedade tendo como m eta apenas a preparação de máquinas de res ponder perguntas no vestibular Ao substituir aulas de História dras ticamente reduzidas em muitas escolas por disciplinas mais práticas e mais úteis como com putação ou gram ática norm ativa por exem plo abrese mão de um instrumento precioso para a formação inte gral do aluno Queiram ou não é impossível negar a importância sempre atual do ensino de História Nas palavras do historiador Eric Hobs bawm Ser membro da comunidade humana é situarse com relação a seu passado passado este que é uma dimensão permanente da consciência hum ana um componente inevitável das instituições valores e padrões da sociedade1 A História é referência E preciso portanto que seja bem ensinada Num momento em que relevantes mudanças vêm ocorrendo na área de História o historiador está sendo cada vez mais valorizado 19 I l r l Ò H I A N A S A L A D E A U L A as pesquisas dão conta de objetos cada vez mais amplos a informática e a internet facilitam imensamente a parte mecânica do trabalho de in vestigação profissionais são chamados para explicar o mundo na mí dia historiadores são convidados a trabalhar com planejamento urba no com projetos turísticos como consultores editoriais e empresariais certos livros de História tornamse bestsellers e novelas e filmes de época alcançam grande sucesso de público muitas escolas parecem caminhar na contramão da História em todos os sentidos A contramão é perceptível principalmente no ensino médio de certas escolas nas quais se percebe um perigoso movimento que no li mite tende a substituir o ensino de História por uma outra disciplina algo que com boa vontade poderíamos chamar de realidade mundial muitos professores abandonam tudo o que aconteceu antes do século XIX alegando não ser possível dar tudo daí terem que se concentrar no passado mais próximo em detrimento do remoto Claro que uma parte da responsabilidade disso cabe aos diretores aos pais e à sociedade de consumo que exercem pressões sobre o que deve ser dado ou não em sala de aula Não pouparíamos contudo muitos colegas que equi vocadamente em nome de um ensino crítico acabam alienando seus próprios alunos ao não lhes dar oportunidade de adquirir uma visão mais abrangente de História Assim nada de processo civilizatório na da de monoteísmo ético dos hebreus base do cristianismo nada de fi lósofos gregos base do pensamento ocidental nada de direito roma no base do nosso nada de Europa Medieval de Renascimento de Mercantilismo e descobrimentos nada de Bach e Mozart de Dante e Camões Parece que nos conformamos mesmo em abrir mão do co nhecimento e da formação em troca de míseras informações E mais grave desistimos de ao menos nos aproximar do pa trimônio cultural da humanidade E qual é o papel do professor senão estabelecer uma articulação entre o patrimônio cultural da humanida de e o universo cultural do aluno Ora a presença do homem civilizado neste planeta tem poucos milhares de anos e tem causado terríveis males destruímos sem dó a natureza submetemos os mais fracos matamos por atacado e a varejo deixamos um terço da população mundial com fome queimamos ín 20 3a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y dios e por aí afora Mas nossa presença não foi escrita apenas com san gue Escrevemos poesia sublime teatro envolvente e romances maravi lhosos Criamos deuses e categorias de pensamento complexos para compreender o que nos cerca O professor de História não pode ficar preso apenas a modos de produção e de opressão embora isso seja fun damental mas pode e deve mostrar que graças à cultura que nós membros da espécie humana produzimos temos tido talento para nos vestir mais adequadamente que os ursos construir casas melhores que o joãodebarro combater com mais eficiência que o tigre embora ca da um de nós seres humanos tenha vindo ao mundo desprovido de pêlos espessos bicos diligentes ou garras poderosas Cada estudante precisa se perceber de fato como sujeito histórico e isso só se conse gue quando ele se dá conta dos esforços que nossos antepassados fize ram para chegarmos ao estágio civilizatório no qual nos encontramos Para o mal mas também para o bem afinal de contas Humanizar o homem é percebêlo em sua organização social de produção mas tam bém no conteúdo específico dessa produção E para o momento espe cífico em que vivemos no começo do século XXI isso é particularmen te importante Para entender ainda melhor a importância das humanidades nos dias de hoje é preciso ter bem claro que devemos estar preparados para ocupar um espaço na sociedade globalizada sob o risco de sermos sufocados por ela A percepção do conjunto de movimentos que estão sendo executados no mundo exige por parte dos nossos jovens uma cultura que vá alem da técnica Portanto História neles No Brasil diante do panorama atual só uma educação de qua lidade que tenha o ser humano e suas realizações como eixo central pode nos fazer como nação dar o salto qualitativo a que tanto aspira mos por meio da qualificação de nossos jovens Um país cuja popula ção não sabe ler que quando sabe lê pouco e quando finalmente lê pouco entende segundo a constatação insuspeita de um órgão da pró pria ONU não tem muitas chances num mundo competitivo e exigen te de qualificação de sua força de trabalho Há mais a era de comuni cação e serviços cm que estamos prestes a viver tende a substituir a 21 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a força física pela sutileza e pela educação formal Os países que não agirem a favor da História ficarão fadados a distanciar cada vez mais daqueles outros ricos ou não que colocam a educação e a cultura incluindo a histórica como prioridade real O papel do professor de História E necessário portanto que o ensino de História seja revaloriza do e que os professores dessa disciplina conscientizemse de sua res ponsabilidade social perante os alunos preocupandose em ajudálos a compreender e esperamos a melhorar o mundo em que vivem Para isso é bom não confundir informação com educação Pa ra informar aí estão bem à mão jornais e revistas a televisão o cine ma e a internet Sem dúvida que a informação chega pela mídia mas só se transforma em conhecimento quando devidamente organizada E confundir informação com conhecimento tem sido um dos grandes problemas de nossa educação Exatamente porque a informação che ga aos borbotões por todos os sentidos é que se torna mais importan te o papel do bom professor Um professor mal preparado e desmotivado não consegue dar boas aulas nem com o melhor dos livros ao passo que um bom profes sor pode ate aproveitarse de um livro com falhas para corrigilas e de senvolver o velho e bom espírito crítico entre os seus alunos Mais do que o livro o professor precisa ter conteúdo Cultura Até um pouco de erudição não faz mal algum Sem estudar e saber a matéria não pode haver ensino É inadmissível um professor que qua se não lê Se o tempo é curto se as condições de trabalho são precárias se o salário é baixo se o Estado não cumpre a sua parte discutase tu do isso nas esferas competentes e lutese para melhorar a situação dos docentes em vez de usar isso tudo como desculpa para a falta de em penho pessoal em adquirir conhecimento entrar em contato com uma bibliografia atualizada conhecer novas linhas de pensamento e discu tir com os colegas estratégias para melhor operacionalizar nas salas de aula o patrimônio cultural e histórico 22 í a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y Afinal se o professor é o elemento que estabelece a intermedia ção entre o patrimônio cultural da humanidade e a cultura do educan do é necessário que ele conheça da melhor forma possível tanto um quanto outro O professor precisa conhecer as bases de nossa cultura as formas de organização das sociedades humanas a evolução das civi lizações as cidadesestado da Antigüidade a Revolução Francesa a es cravidão no Brasil o desenvolvimento do capitalismo os movimentos sociais as condições de vida das populações no passado sua cultura material e suas idéias a música de Beethoven o cinema de Charlie Chaplin a literatura de Machado de Assis e por aí afora Noutras pa lavras cada professor precisa necessariamente ter um conhecimento sólido do patrimônio cultural da humanidade Por outro lado isso não terá nenhum valor operacional se ele não conhecer o universo socio cultural específico do seu educando sua maneira de falar seus valores suas aspirações A partir desses dois universos culturais é que o profes sor realiza o seu trabalho em linguagem acessível aos alunos Digase de passagem que linguagem acessível não é sinônimo de banalização Valendose dessas considerações é preciso que o professor tenha claro o quê e como ensinar Pela volta do conteúdo nas aulas de História Opassado deve ser interrogado a partir de questões que nos in quietam no presente caso contrário estudálo fica sem sentido Por tanto as aulas de História serão muito melhores se conseguirem esta belecer um duplo compromisso com o passado e o presente Compromisso com o presente não significa contudo presentis mo vulgar ou seja tentar encontrar no passado justificativas para ati tudes valores e ideologias praticados no presente Hitler queria provar pelo passado a existência de uma pretensa raça ariana superior às de mais Significa tomar como referência questões sociais e culturais as sim como problemáticas humanas que fazem parte de nossa vida te mas como desigualdades sociais raciais sexuais diferenças culturais 23 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a problemas materiais e inquietações relacionadas a como interpretar o mundo lidar com a morte organizar a sociedade estabelecer limites sociais mudar esses limites contestar a ordem consolidar instituições preservar tradições realizar rupturas Compromisso com o passado não significa estudar o passado pelo passado apaixonarse pelo objeto de pesquisa por ser a nossa pes quisa sem pensar no que a humanidade pode ser beneficiada com is so Compromisso com o passado é pesquisar com seriedade basearse nos fatos históricos não distorcer o acontecido como se esse fosse uma massa amorfa à disposição da fantasia de seu manipulador Sem o res peito ao acontecido a História vira ficção Interpretar não pode ser con fundido com inventar E isso vale tanto para fatos como para processos Aqui mesmo no Brasil não inventaram um anacrônico modo de produção feudal pois segundo o modelo deveria haver algo entre o escravismo e o capitalismo Afirmações baseadas apenas em filiações ideológicas são no mí nimo desprezíveis podendo tornarse perigosas quando além de não verdadeiras acabam se tornando veículos do preconceito e da segrega ção É o caso de por exemplo verdades como os índios não são bons trabalhadores as mulheres são inferiores os jovens são sem pre revolucionários o Holocausto não ocorreu ou o Brasil é um país pacífico e assim por diante Além dessas questões estruturais há alguns vícios muito disse minados que contribuem para a queda da qualidade do ensino em ge ral mas que afetam de forma particular as aulas de História Um deles é o hábito freqüente em nossas universidades mas já popular em muitas escolas de ensino médio da crítica sem base Antes de entender um texto uma questão uma conjuntura profes sores e alunos já lançam a crítica Ela já está na ponta da língua ou seja precede a compreensão da complexidade do fenômeno históri co Tal autor Está superado dizem alunos e professores que nun ca se deram ao luxo de lêlos mas se permitem julgamentos definiti vos com base em algo ouvido em um corredor ou lido às pressas em 24 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y uma página de uma revista semanal de informações Defendemos pois a volta do conteúdo às salas de aula da seriedade E do ób vio a tentativa de interpretação deve necessariamente ser precedida pelo entendimento do texto Outra tendência é a supervalorização do desconstrutivismo Não que a desconstrução não tenha sido um avanço importante O en tendimento das motivações dos discursos e de seu papel instaurador a compreensão dos jogos de poder envolvidos na elaboração das versões em torno dos fatos históricos a análise dos discursos o desmonte dos argumentos podem ser perfeitamente utilizados como instrumento de análise histórica e ocupam hoje boa parte das pesquisas acadêmicas Porém como proposta de ensino o desconstrutivismo deve ser utiliza do com cautela mesmo que o professor tenha um grande domínio das versões e dos discursos em jogo e esteja familiarizado com as operações desconstrutivistas Só a desconstrução não basta além do vazio provo cado deixa um gostinho de insatisfação e niilismo no ar no limite supervaloriza o relativismo e tira o poder de ação das mãos dos sujei tos históricos é preciso que os alunos tenham acesso a algum conteú do histórico e que entendam sua contextualização Além de tudo um aviso aos desconstrutivistas pelo amor ao novo essa história de relati vismo está ficando fora de moda Um modo mais construtivo sem trocadilhos seria adotar co mo postura de ensino que se quer crítico a estratégia de abordar a His t tória a partir de questões temas e conceitos Quais seriam as questões relevantes que podem ser feitas ao presente e por extensão ao passa do Qual a relevância dos recortes temáticos tradicionais e novos feitos pela historiografia Quais os conceitos importantes a serem discutidos com os alunos Tendo respostas mais ou menos claras sobre esses as suntos o professor poderá despertar o interesse dos alunos demonstrando a atualidade de coisas tão cronologicamente remotas quanto a situação das mulheres na Idade M édia a insatisfação dos plebeus na Rom a Antiga ou as is pirações ambíguas dos burgueses no século XVIII capacitar os estudantes no sentido de perceberem a liisioiii 1 dade de conceitos como democracia cidadania beleza como jmii 25 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a que mudaram muito ao longo do tempo práticas como a manifesta ção de religiosidade afetividade e sexualidade idéias como a inferiori dade racial cultural e moral fazer com que os alunos não só reconheçam preconceitos mas compreendam seu desenvolvimento e mecanismos de atuação para poder criticálos com bases e argumentos mais sólidos2 demonstrar com clareza certos usos e abusos da História per petrados por grupos políticos nações e facções adversários de um es tado nacional são freqüentemente apresentados nos manuais escolares como inimigos da pátria revolucionários como traidores minorias co mo gente não patriota e assim por diante possibilitar a crítica a dogmatismos e verdades absolutas com base no reconhecimento da historicidade de situações e formas de pensamento talvez não seja o caso de entender as razões dos leões que devoravam cristãos nas arenas romanas mas pelo menos dos here ges que foram massacrados impiedosamente pela Igreja Católica E quais seriam as abordagens mais adequadas à prática de ensi no de História em sala de aula Uma questão de abordagem Tendo como paradigma o ensino de História simplificador e esquemático de algumas décadas atrás criouse um certo malestar com relação à História Social apoiada na concepção materialista da História Colocase no mesmo saco os vulgarizadores que buscavam o econômico em tudo e os historiadores do porte de um Eric Hobs bawm Ora é muito difícil fazer boa História sem ter noção de pro cesso a idéia do devir histórico a percepção dos modos de vida e da cultura material o conhecimento das relações sociais e a apreensão da complexa e imbricada dialética que se estabelece entre determinações históricas e ação humana Por outro lado não há porque não dar con ta dos novos objetos e abordagens que o método histórico incorporou nos últimos anos em que tendo como destaque o quadro cultural es 26 3a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y tudamse aspectos mais íntimos como a vida privada e as dimensões da experiência hum ana ligadas à sexualidade aos costumes aos afetos e às crenças Assim não vemos uma incompatibilidade entre a História So cial e a História das Mentalidades e do Cotidiano Na verdade as duas abordagens não apenas não se opõem necessariamente como se complementam A abordagem da corrente da História Social busca a percepção das relações sociais do papel histórico dos indivíduos e dos limites e possibilidades de cada contexto e processo histórico A das M entalidades privilegia cortes temáticos Freqüentemente a primeira busca a floresta a segunda a árvore uma o telescópio outra o microscópio Bem utilizados ambos os procedimentos são recomendáveis Se trabalhados de forma integrada chegase ao melhor dos mundos olhase a partir de diferentes pontos de vista Além disso por meio desses olhares poderá o professor reaproximar o aluno do estudo da História E quem sabe explorar muitas das possibilidades que o contato com nossa disciplina permite inclusive a de nos percebermos de fato como sujeitos da História por mais batida que a fórmula se apresente O potencial transformador do ensino de História Este é um assunto que provoca protestos indignados ou aplau sos emocionais mas quase sempre uma enorme dificuldade para o pro fessor situarse racionalmente Para uns a frase de Marx anunciando que não era mais hora de apenas entender o mundo mas de mudálo tem justificado arroubos de magógicos em sala de aula discursos políticos permeados de declarações devoto e até propaganda explícita para um ou outro candidato em perío dos préeleitorais Sob o pretexto de saber qual a mudança que o mundo deve merecer e fingindo acreditar que o potencial transformador do ensi no de História consiste em colocar no governo representantes dos parti dos que o mestre acredita que possam promover a transformação social tão sonhada o professor perde sua dignidade ao apresentarse como umi 27 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a espécie de cabo eleitoral privilegiado Privilegiado sim pois se aproveita da ascendência que tem sobre a turma de alunos e em vez de lhes dar ins trumentos para decidir sozinhos os pressiona para que aceitem sua ver dade constrangendo por outro lado aqueles que por uma razão ou ou tra não se curvam aos seus argumentos Não se trata de se despolitizar o discurso do professor uma vez que não há discurso apolítico mas de do tálo de equilíbrio e ponderação O conhecimento histórico por si pró prio carrega profundo potencial transformador dispensando interpreta ções apressadas feitas sob o impacto de circunstâncias acaloradas Nosso aluno cada aluno tem de se perceber como um ser social alguém que vive numa determinada época num determinado país ou re gião oriundo de determinada classe social contemporâneo de determina dos acontecimentos Ele precisa saber que não poderá nunca se tornar um guerreiro medieval ou um faraó egípcio Ele é um homem de seu tempo e isso é uma determinação histórica Porém dentro do seu tempo dentro das limitações que lhe são determinadas ele possui a liberdade de optar Sua vida é feita de escolhas que ele com grau maior ou menor de liberda de pode fazer como sujeito de sua própria história e por conseguinte da História Social do seu tempo Cabe ao professor utilizandose dos méto dos históricos descritos acima aproximar o aluno dos personagens concre tos da História sem idealização mostrando que gente como a gente vem fazendo História Quanto mais o aluno sentir a História como algo próxi mo dclc mais terá vontade de interagir com ela não como uma coisa ex terna distante mas como uma prática que ele se sentirá qualificado e in clinado a exercer O verdadeiro potencial transformador da História é a oportunidade que ela oferece de praticar a inclusão histórica O que ensinar do abstrato para exemplos concretos Vemos com freqüência professores preocupados em dar toda a matéria e frustrados com o fracasso diante dessa tarefa impossível Há es tudantes que saem do ensino médio sem nunca ter estudado em História nada que ocorreu depois de 1945 Outros ficam frustrados porque nada 28 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y sabem sobre as antigas civilizações apesar de conhecerem de cor o nome dos donatários das capitanias hereditárias do Brasil Colônia Como ele mentos complicadores temos os exames vestibulares ao final do ensino médio e exames nacionais ou estaduais a cada final de ano Professores que adotam livros didáticos sentemse obrigados a seguir de cabo a rabo seu conteúdo pressionados por diretores coordenadores e pais Com o número baixo de aulas de História oferecidas quaisquer assuntos e dis cussões que embora importantes atrasariam a matéria são deixados de lado O resultado de tudo isso é a transformação do conhecimento histó rico numa maçaroca de informações desconectadas ou articuladas à for ça mas sempre desinteressantes e freqüentemente inúteis A medida dis so é dada pela dificuldade que muitos professores têm em responder à mais banal e óbvia pergunta dos alunos Professor para que serve isso Como ninguém é uma enciclopédia a primeira coisa a fazer ao montarmos um curso é selecionar conteúdos O professor não deve ter dó de abandonar assuntos quando não conseguir uma resposta satisfatória à questão do porquê às vezes mos trase muito mais interessante pular algumas páginas do livro didáti co ou da História seja lá o que isso quer dizer e dedicar o tempo infelizmente cada vez mais curto das aulas a temas como a situação do índio no Brasil colonial ao invés de capitanias hereditárias e go vernadores gerais os movimentos sociais que ajudaram a derrubar a ditadura militar no Brasil ao invés de lista de presidentes da Repúbli ca e suas realizações os efeitos deletérios do nazismo ao invés de um histórico detalhado das batalhas da Segunda Guerra Mundial Outras vezes vale a pena dedicar um tempo maior à leitura cui dadosa de um determinado documento histórico tanto pelo seu signi ficado intrínseco como pela validade do próprio exercício de ler uma fonte primária o traquejo adquirido com tal exercício pode ser aplica do pelo aluno na leitura de vários outros textos e documentos que che carem às suas mãos E o que é válido A matéria escolar pode estar relacionada a vários recortes da I listória Entre outros citamos 29 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a 1 um acontecimento ou evento histórico a Revolução Fran cesa a Segunda Guerra Mundial a Proclamação da República 2 uma instituição social a escravidão no Brasil o imperialis mo o mundo globalizado 3 um processo de longa duração o desenvolvimento das pri meiras civilizações 4 uma interação de culturas o encontro entre europeus e in dígenas no tempo do descobrimento da América 5 um tema monográfico a mulher na Idade Média Todos esses recortes são válidos desde que façam sentido no programa específico de cada escola Seria até aconselhável que diferen tes recortes fossem utilizados o que permitiria ao aluno afastarse da visão monocromática dos materiais didáticos e incolor das pseudopes quisas eletrônicas Quanto aos assuntos é preciso que se encontre uma boa justificativa para incluílos no programa de curso Damos a seguir alguns exemplos e sugestões bem variados e potencialmente úteis além de muito atraentes 1 Revolução Russa Revolução Chinesa e Revolução Cubana As três revoluções são movimentos ocorridos no século XX com al gumas características comuns mudança de estrutura econômica e política em ritmo acelerado filiação marxistaleninista eliminação da propriedade particular de bens de produção etc apesar de suas particularidades e po dem ser estudadas juntas sob o título Revoluções do século XX Por que é um conteúdo importante a ser tratado em sala de au la Porque diz respeito a acontecimentos que marcaram o século XX com conseqüências e desdobramentos até os dias de hoje Também porque é um bom gancho para se apresentar e discutir a idéia da continuidade e da ruptura histórica a História é um processo mas que sofre rupturas Há fatos históricos que mudaram a ordem mundial os desenvolvimentos políticos sociais e culturais de países in 30 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y seridos no contexto mundial sem deixar de lado a discussão sempre relevante sobre o lugar dos sonhos de igualdade e justiça social nos co rações e mentes do tempo presente exemplos de revolta contra a ordem estabelecida e de tentati va de reconstrução social assim como dos problemas que impediram que os objetivos fossem alcançados 2 Escravidão no Brasil Esse assunto se justifica no currículo dos alunos ao contribuir para a compreensão das bases da sociedade brasileira a situação dos ne gros a origem de preconceitos raciais contra o trabalho braçal etc as relações sociais com base no entendimento de um fenômeno que marcou a sociedade brasileira com conseqüências até hoje Questões a serem tratadas o sistema escravista no contexto do capitalismo mercantil o tráfico negreiro a escravidão em terras brasileiras vida de escravo o cotidiano dos escravos no trabalho e na sen zala a sexualidade as revoltas e a resistência contra a escravidão exem plos de formas concretas de submissão e resistência O tema deve ser abordado de forma a aguçar o espírito crítico dos estudantes levandoos no final a entender e combater preconceitos dentro e fora da sala de aula O professor pode completar o trabalho de leitura sugerindo pesquisas atuais sobre o preconceito racial ou a si tuação dos negros no Brasil por exemplo 3 Primeiras civilizações homens préhistóricos mesopotâmicos egípcios e hebreus É muito importante estudar o assunto de forma a procurar compreender como se começou a construir o patrimônio cultural da humanidade do qual somos todos herdeiros permitindo que os alunos se percebam como seres históricos para cuja formação valores como monoteísmo ético dos hebreus organização das cidades mesopotâ inicas e relação entre religião e estado egípcios estão presentes Esse recorte da História permite também que se estude em sala de aula a diferença entre História Natural e História Social o animal 31 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a homem em sua relação com a natureza dos primitivos homo sapiens aos mesopotâmicos egípcios e hebreus Além disso partindo da Pré História focaliza o momento em que o homem em sua estreita re lação com a natureza se humaniza realiza importantes conquistas materiais passa a criar cultura e tornase civilizado O próprio estu do dos pitecantropídeos e homo sapiens das sociedades tribais aos po vos egípcios mesopotâmicos e hebreus pode ser uma forma de ques tionar os termos humano e civilizado Tendo em mente a necessidade de levar os alunos a compreender a questão da relação do homem com o meio ambiente e suas condições materiais de existência o professor pode abordar o tema das primeiras ci vilizações de modo a mostrar as diferentes maneiras em lidar com tais condições dos povos caçadores e coletores aos grandes construtores de diques e dominadores da força das águas como os mesopotâmicos Além disso pode ampliar o tema demonstrando os efeitos de condicionamen tos naturais em estruturas sociais modos de vida e organizações religiosas e políticas De maneira instigante é possível discutir os presentes da na tureza e as formas de sua apropriação pelo homem ao longo de sua aven tura na terra em milhares de anos desde sua constituição como tal Ensinar sobre as primeiras civilizações de maneira prazerosa e conseqüente também consiste em procurar abordar as transformações na qualidade de vida dos seres humanos ao longo do processo civiliza tório que conduziu nossos ancestrais à conquista da fala dos territó rios do fogo da agricultura da escrita ao controle e aproveitamento dós recursos naturais à criação das cidades e dos impérios ao desen volvimento de civilizações Por meio desse estudo os alunos poderão encontrar respostas a algumas das perplexidades que têm diante de si mesmos da História e da humanidade e adotar posturas mais colaborativas no processo de ensinoaprendizagem em seu conjunto 4 O Brasil nos primeiros tempos da colonização séculos XVI e XVII Uma das formas mais interessantes de abordar o tema é tomar por base a problemática da pluralidade cultural e do encontro de cul turas Assim é preciso destacar o patrimônio cultural dos primeiros 32 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y habitantes do Brasil que depois foi transformado nos primeiros tem pos da colonização portuguesa na América É importante também res saltar os usos e abusos do patrimônio natural e humano do Brasil na época colonial Assuntos interessantes relacionados o estilo de vida dos europeus e suas esperanças com relação ao Novo Mundo as compatibilidades e contradições entre interesses e visões de mundo de colonos mercadores e jesuítas a mentalidade dos portugueses jesuítas e colonos e sua rela ção com o meio ambiente as riquezas e os habitantes da América in cluindo os europeus que foram seduzidos pela qualidade da vida sel vagem dos índios e abandonaram antigos costumes as condições e a qualidade de vida dos índios vida material e pensamento Semelhanças e diferenças culturais entre povos indíge nas Suas relações com os bens materiais a propriedade privada e o tra balho Costumes incluindo banhos e festas Família sexualidade mulher criança Organização social fé leis e autoridade O papel das guerras nas sociedades indígenas armas táticas canibalismo o choque de culturas Transformações na qualidade de vida dos índios no encontro com colonos e jesuítas aprendizados cateque se resistência exploração sexual escravidão Práticas e costumes ree laborados no Novo Mundo Porser um tema com vasta documentação primária editada e pu blicada no Brasil pode ser também um ponto de partida para apresentar aos estudantes questões básicas relacionadas ao tratamento das fontes de pesquisa histórica ensinandoos na prática a fazer crítica de documentos e análise de discurso por exemplo cartas jesuíticas ou documentos deixa dos por viajantes e cronistas podem ser analisados em sala de aula levan dose em conta a posição social os interesses e as visões de mundo fa lalmente enviesadas e por vezes preconceituosas de seus autores Esse também é um tema que permite dar à questão do meio mibiente o destaque que merece Basta adotar uma postura diferen da de abordagens tradicionais que tratam dos primeiros tempos da conquista e colonização portuguesa como se a natureza fosse algo Ü F R R JB ib lio teca C e n jra í 33 RG 9 p X o W m AC i j f t Ê L H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a inexistente ou secundária É possível dedicar o tempo de algumas aulas às condições naturais às diferentes formas de europeus e ín dios conceberem e lidarem com o meio ambiente às dificuldades e às possibilidades oferecidas pelas riquezas naturais clima terra flo ra e fauna na época do descobrimento às opções de cada povo e ao encontro de culturas observações sobre heranças de antigos hábitos indígenas e europeus no trato com o meio ambiente que nos afe tam até hoje 5 Mulheres no Brasil colonial Um estudo monográfico das mulheres no Brasil colonial abor da a qualidade de vida de tais mulheres praticamente em toda sua ex tensão abrangendo manifestações femininas relativas à religiosidade maternidade sexualidade luta pela sobrevivência solidariedade saúde e trabalho Abrange grupos sociais distintos mas com várias experiên cias em comum como índias escravas pobres bruxas prostitutas religiosas senhoras brancas jovens e velhas apresentando aos estu dantes um quadro rico variado e complexo da condição feminina nos tempos coloniais abrindolhes também possibilidades para novas ma neiras de olhar a vida e a história das mulheres em geral O estudo do tema Mulheres no Brasil colonial ao tratar das vivências de nossas antepassadas de diferentes grupos sociais e trajetó rias seu cotidiano e as representações que delas se fizeram também é um exemplo de recorte monográfico interessante para a compreensão de aspectos importantes da disciplina histórica A estratégia consiste em caminhar do micro para o macro Ou seja a partir de um tema es pecífico como esse adotando é claro uma linguagem compatível com o nível dos estudantes o professor em sala de aula pode introduzir seus alunos na discussão de questões mais amplas pensadas pelos his toriadores tais como o imaginário social as representações as mentalidades moldan do atitudes e comportamentos e sendo por sua vez moldados por eles as diferenças socialmente construídas entre sexos as interações entre as categorias de classe e gênero 34 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y CONCLUSÃO Como se vê diferentes recortes da História permitem que o aluno abra enormes horizontes que podem acolher inicialmente sua curiosidade depois sua análise e finalmente sua identificação com essa gente como a gente que construiu o processo histórico do qual ele mesmo faz parte Acreditamos a tal ponto na capacidade de a História bem ensi nada desempenhar esse papel que questionamos certas facilitações que no limite levam à descontextualização dos acontecimentos como a tentativa de fazer uma História mal comparada ou de forçar uma transversalidade um pouco oblíqua A condição da mulher na Idade Média comparada com a das ocidentais ou das islâmicas dos dias de hoje perde o sentido se vista fora de seu tempo Da mesma forma identificar certos tipos de exploração de trabalho no capitalismo ao es cravismo qual O colonial O antigo O dos povos do deserto impe de que se tenha uma dimensão exata do caráter de cada tipo de relação de produção historicamente determinada O problema em termos do processo de ensinoaprendizagem é que o abandono da diacronia da idéia de processo pode transformar 0 conhecimento histórico numa sabedoria de almanaque mal digerida em que acontecimentos instituições e movimentos ocorrem do nada para o nada Será que é isso o que mais nos interessa com relação à dis ciplina História Misturar Galileu e Einstein ou Espártaco e Zumbi unidos por afgum tema transversal como se fossem contemporâ neos prontos a dialogar pode desistoricizar suas práticas e formas de pensamento se não estivermos muito atentos E finalmente mas não menos importante é preciso que se vol ic aos livros A moda atual de substituílos por pesquisas virtuais para lernálias tecnológicas e debates sem conteúdo está levando a um pro gressivo empobrecimento cultural de alunos e professores O pensamento crítico não se sustenta sem leitura vício silencioso lento e profundo Só depois de ter a mente e o espírito alimentados pela leitu 1 i c que ilustrações computadorizadas ou filmadas podem fazer algum ni ido Da mesma forma só se debatem idéias se antes as temos Do 35 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a contrario nossas classes se transformam em espaços de debates óbvios e inconseqüentes iguais àqueles de que a televisão está cheia Acreditar na História é apenas uma postura de fé Insuficiente portanto para um professor de quem se espera um envolvimento tal que o permita superar suas condições de trabalho eventualmente difí ceis assim como a desvalorização social de sua profissão Este artigo tem por objetivo abrir um debate franco e construtivo a fim de valori zar o ensino da História colaborar com o professor e propiciar ao alu no uma aprendizagem mais prazerosa e conseqüente Notas 1 Eric Hobsbawm O sentido do passado Sobre História São Paulo Cia das Letras 1998 2 Leia a respeito em Pinsky Jaime org 12 faces do preconceito São Paulo Contexto 1999 Sugestões de leitura para o trabalho em sala de aula D e l PRIORE Mary Mulheres no Brasil Colonial São Paulo Contexto 2000 D el P r io r e Mary org e PiNSKY Carla Bassanezi coord de texto História das mulheres no Brasil São Paulo Contexto 2002 Fa r ia Ricardo Moura As revoluções do século XX São Paulo Contexto 2002 F u n a r i Pedro Paulo e N o e l i Francisco Silva Préhistória no Brasil São Pau lo Contexto 2002 M e sg r a v is Laima e PlNSKY Carla Bassanezi O Brasil que os europeus encon traram 2a edição São Paulo Contexto 2002 PlNSKY Jaime Escravidão no Brasil São Paulo Contexto 2000 edição revista e atualizada As primeiras civilizações São Paulo Contexto 2001 nova edição PlNSKY Jaime org Ensino de História e criação do fato São Paulo Contexto 1986 36 E n s i n o d e H i s t ó r i a C O N T E Ú D O S E C O N C E I T O S B Á S I C O S H olien Gonçalves Bezerra A lei 939496 que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional em seu artigo 22 aponta o caminho a perseguir na educa ção básica desenvolver o educando assegurarlhe a formação co mum indispensável para o exercício da cidadania e fornecerlhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores Assim as dire trizes os princípios pedagógicos os valores a serem transmitidos as competências e capacidades visualizadas a seleção dos conteúdos das diversas áreas de conhecimento os conceitos fundamentais as estraté gias de trabalho e as propostas de intervenção do professor estão todas pautadas por esse princípio maior que vincula a educação à prática so cial do aluno ao mundo do trabalho à formação para a cidadania A tônica incide sobre o desenvolvimento da capacidade de aprender e de adquirir conhecimentos e habilidades e sobre a formação de valores Portanto os objetivos da escola básica segundo essa lei não se restrin gem à assimilação maior ou menor de conteúdos prefixados mas se comprometem a articular conhecimento competências e valores com a finalidade de capacitar os alunos a utilizaremse das informações pa ra a transformação de sua própria personalidade assim como para ituar de maneira efetiva na transformação da sociedade Tendo como referência essas observações mais gerais nos per guntamos como vincular a elas os conteúdos e os conceitos básicos pa 37 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a ra o ensino de História O que propor em nossa área para favorecer aprendizagens essenciais que auxiliem os alunos em sua formação de cidadãos autônomos críticos participativos que possam atuar na so ciedade com competência dignidade e responsabilidade SELEÇÃO E ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS É dever da escola e direito dos alunos do ensino fundamental e médio oferecer e trabalhar os conjuntos de conhecimentos que foram socialmente elaborados e que os estudiosos consideram necessários pa ra o exercício da cidadania No entanto as dificuldades acentuamse quando se trata de explicitar o que está sendo entendido como neces sário como aquilo que é comum a todos os alunos brasileiros Já é con senso que a escola não tem por finalidade apenas transmitir conheci mentos Passa a ser consenso também entre os profissionais da História ainda que com menor intensidade que os conteúdos a serem trabalhados em qualquer dos níveis de ensinopesquisa básico médio superior pósgraduado não é todo o conhecimento socialmente acu mulado e criticamente transmitido a respeito da trajetória da humani dade Forçosamente devem ser feitas escolhas e seleções Por outro la do em vista da diversidade dos enfoques teóricometodológicos que foram sendo construídos especialmente nas últimas décadas não é possível pensar em uma metodologia única para a pesquisa e para a ex posição dos resultados nem mesmo para a prática pedagógica do ensi no de História Seleção de conteúdos A necessária seleção de conteúdos faz parte de um conjunto for mado pela preocupação com o saber escolar com as capacidades e com as habilidades e não pode ser trabalhada independentemente Os con teúdos curriculares não são fim em si mesmos como vem sendo cons tantemente lembrado mas meios básicos para constituir competên 38 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a i ias cognitivas ou sociais priorizandoas sobre as informações Dire trizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio artigo quinto I São considerados meios para a aquisição de capacidades que auxiliem os alunos a produzir bens culturais sociais e econômicos e deles usufruir Nesse sentido os conteúdos ocupam papel central no processo de en sinoaprendizagem e sua seleção e escolha devem estar em consonân cia com as problemáticas sociais marcantes em cada momento históri co Além disso eles são concebidos não apenas como a organização dos fenômenos sociais historicamente situados na exposição de fatos e conceitos mas abrangem também os procedimentos os valores as normas e as atitudes Esse conjunto de especificidades explica a grande variedade de propostas curriculares desde as mais clássicas até as mais recentes ten tativas de inovações que despontam como promissoras possibilidades cie caminhar para melhorias cada vez mais substantivas Diversidade na apresentação dos conteúdos O exemplo clássico de organização dos conteúdos é o que se constituj a partir das temporalidades Preponderante ainda na maioria das escolas brasileiras o tempo considerado em sua dimensão crono lógica conjtinua sendo a medida utilizada para explicar a trajetória da Immanidade A periodização que se impôs desde o século XIX His lória Antiga Medieval Moderna e Contemporânea está presente cm grande parte dos livros didáticos retrocedese às origens estabele cendose trajetórias homogêneas do passado ao presente e a organiza çiío dos acontecimentos é feita com base na perspectiva da evolução O iue caracteriza a organização dos conteúdos nessa perspectiva é a li nearidade e a seqüencialidade Mais recentemente encontrase uma tentativa de superação da seqüencialidade e linearidade em obras que tomam como fio condutor da exposição a chamada História integrada cm que América e Brasil figuram juntamente com povos da PréHistó i ia assim como a presença da História da África 39 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a Há propostas diferenciadas em que os conteúdos são organiza dos tendo como referências temas selecionados ou eixos temáticos es perandose maior liberdade e criatividade dos professores A organiza ção dos conteúdos e sua seleção com base em uma concepção ampliada de currículo escolar foram assumidas de forma mais sistematizada e aprofundada nas propostas já amplamente conhecidas dos Parâme tros Curriculares Nacionais PCNs Notase ainda uma via intermediária mantémse a opção pela exposição cronológica dos eventos históricos consagrados pela historio grafia mas agora intercalada ou informada por exercícios e atividades chamadas estratégias por meio dos quais os alunos são levados a perce ber todos os meandros da construção do conhecimento histórico ins tados a envolverse nas problemáticas comuns ao presente e ao passado estudado e encorajados a assumir atitudes que levam ao posicionamen to como cidadãos Aproximamse assim as preocupações com a se qüencialidade dos conteúdos e as finalidades da educação na formação de indivíduos conscientes e críticos com autonomia intelectual Por fim a organização dos conteúdos em muitos casos é assu mida de forma responsável pelos professores tendo como referência suas experiências docentes ou as orientações dos órgãos responsáveis pelas políticas educacionais dos estados e dos municípios Cuidados especiais Seja qual for a proposta apresentada há cuidados especiais que merecem ser lembrados O primeiro se refere ao envolvimento do alu no com o objeto de estudo que está sendo trabalhado Na exposição factual e linear que supõe o aluno como receptáculo de ensinamentos além dos textos expositivos e detalhados estão presentes exercícios vol tados especificamente para o teste de compreensão e fixação de conteú dos A preocupação com o desenvolvimento de competências e habili dades não faz parte dos horizontes dessas propostas pedagógicas 40 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a Já as propostas curriculares que concebem o currículo e a edu cação dentro dos padrões mais atualizados constroem a trama exposi i iva procurando envolver o aluno por meio da problematização dos te mas de sua abordagem da relação necessária com o mundo cultural tio aluno as atividades constituem o cerne do trabalho pedagógico apresentado pensado sempre do ponto de vista da construção de um conhecimento escolar significativo A preocupação não é com a quan i idade dos conteúdos a serem apresentados ou com as lacunas de con icúdo de História que ficariam por ser preenchidas de acordo com a lista de assuntos que tradicionalmente fazem parte dos conteúdos a se rem transmitidos pela escola O que está em evidência é o modo de tra balhar historicamente os temasassuntosobjetos em pauta CONCEITOS FUNDAMENTAIS PARA O liNSINO DE HISTÓRIA NA ESCOLARIDADE BÁSICA Alguns conceitos fazem parte do arcabouço que foi se consti mindo através dos tempos pela prática dos historiadores Construiu m uma lógica da História que pode ser concebida como um conjun to de procedimentos e conceitos em torno dos quais devem girar as IHcocupaçÕes dos historiadores Independentemente das mais variadas i oncepçÕes de mundo posicionamentos ideológicos ou proposições de nrdem metodológica não há como não trabalhar com esses conceitos ii pelo menos com uma parte importante deles As propostas pedagó lu as sejam elas quais forem têm um compromisso implícito com es is práticas historiográficas ao produzirem o conhecimento histórico si o lar com suas especificidades e particularidades O que diferencia as livtrsas concepções de História é a forma como esses conceitos e pro ilimentos são entendidos e trabalhados Importa tentar perceber quais são os conceitos que são impres iiulfveis para que os alunos saídos da escola básica tenham uma for iii ii10 histórica que os auxilie em sua vivência como cidadãos A títu I dc sugestão e como início de discussão propõese uma reflexão 4 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a sobre alguns conceitos considerados fundamentais e sobre os desdobra mentos contidos em sua abrangência História O objetivo primeiro do conhecimento histórico é a compreen são dos processos e dos sujeitos históricos o desvendamento das rela ções que se estabelecem entre os grupos humanos em diferentes tem pos e espaços Os historiadores estão atentos às diferentes e múltiplas possibilidades e alternativas apresentadas nas sociedades tanto nas de hoje quanto nas do passado que emergiram da ação consciente ou in consciente dos homens procuram apontar para os desdobramentos que se impuseram com o desenrolar das ações desses sujeitos A aprendizagem de metodologias apropriadas para a construção do conhecimento histórico seja no âmbito da pesquisa científica seja no do saber histórico escolar tornase um mecanismo essencial para que o aluno possa apropriarse de um olhar consciente para sua pró pria sociedade e para si mesmo Ciente de que o conhecimento é provi sório o aluno terá condições de exercitar nos procedimentos próprios da História problematização das questões propostas delimitação do objeto exame do estado da questão busca de informações levanta mento e tratamento adequado das fontes percepção dos sujeitos histó ricos envolvidos indivíduos grupos sociais estratégias de verificação e comprovação de hipóteses organização dos dados coletados refina mento dos conceitos historicidade proposta de explicação para os fe nômenos estudados elaboração da exposição redação de textos Dada a complexidade do objeto de conhecimento é imprescindível que seja incentivada a prática interdisciplinar Faz parte da construção do conhecimento histórico no âmbito dos procedimentos que lhe são próprios a ampliação do conceito de fontes históricas que podem ser trabalhadas pelos alunos documentos oficiais textos de época e atuais mapas ilustrações gravuras imagens 42 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a de heróis de histórias em quadrinhos poemas letras de música litera mra manifestos relatos de viajantes panfletos caricaturas pinturas lotos rádio televisão etc O importante é que se alerte para a necessi dade de que as fontes recebam um tratamento adequado de acordo com sua natureza É preciso deixar claro porém que não é proposta do ensino bá sico a formação de pequenos historiadores O que importa é que a or ganização dos conteúdos e a articulação das estratégias para trabalhar com eles leve em conta esses procedimentos para a produção do conhe cimento histórico Com isso evitase passar para o educando a falsa sensação de que os conhecimentos históricos existem de forma acaba da e assim são transmitidos Processo histórico Para além da descrição factual e linear a História busca explicar iuito as uniformidades e as regularidades das formações sociais quan i as rupturas e diferenças que se constituem no embate das ações hu manas Na verdade o passado humano não é uma agregação de ações siparadas mas um conjunto de comportamentos intimamente interli gados que têm uma razão de ser ainda que na maioria das vezes im perceptível para nossos olhos O processo histórico constituise dessas pi ii icas ordenadas e estruturadas de maneiras racionais São os proble mas colocados constantemente na indeterminação do social que fazem que os homens se definam pelos caminhos possíveis e desenhem i is acontecimentos que passam a ser registrados Os registros ou as evi dencias da luta dos agentes históricos são o ponto de partida para en i udermos os processos históricos Devese ressaltar igualmente que o conceito de processo histó iii it supõe que sua enunciação resulta de uma construção cognitiva dos amliosos No entanto embora os processos não existiram exatamen ii i oino estão sendo descritos eles têm uma sedimentação na realidade 43 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a social Podese dizer que o status ontológico do passado garante a com preensibilidade do processo A dimensão de elaboração de construção cognitiva nos leva a entender a possibilidade das diversas interpreta ções do passado histórico dependentes de posicionamentos teóricos e metodológicos diferenciados Assim a História concebida como processo busca aprimorar o exercício da problemalizaçao da vida social como ponto dc partida pa ra a investigação produtiva e criativa buscando identificar as relações sociais de grupos locais regionais nacionais e de outros povos perce ber as diferenças e semelhanças os conflitoscontradições e as solida riedades igualdades e desigualdades existentes nas sociedades compa rar problemáticas atuais e de outros momentos posicionarse de forma crítica no seu presente e buscar as relações possíveis com o passado Nesse quadro conceituai de processo se dimensiona a com preensão do conceito de fato histórico de acontecimento que têm sua importância como ponto referencial das relações sociais no coti diano da História no entanto o sentido pleno dos acontecimentos em sua dimensão micro se resolve quando remetido aos processos que lhes emprestam as possibilidades explicativas Enfim o fato histórico toma sentido se considerado como constitutivo dos processos históri cos e nessa escala deve ser considerado Tempo temporalidades históricas A dimensão da temporalidade é considerada uma das catego rias centrais do conhecimento histórico Não se trata de insistir nas definições dos diversos significados de tempo mas de levar o aluno a perceber as diversas temporalidades no decorrer da História e ter cla ro sua importância nas formas de organização social e seus conflitos Sendo um produto cultural forjado pelas necessidades concretas das sociedades historicamente situadas o tempo representa um conjunto complexo de vivências humanas Daí a necessidade de relativizar as di 44 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a ferentes concepções de tempo e as periodizações propostas de situar os acontecimentos históricos nos seus respectivos tempos O conceito de tempo supõe também que se estabeleçam relações entre continui dade e ruptura permanências e mudançastransformações sucessão e simultaneidade o antesagoradepois Levanos a estar atentos e fazer ver a importância de se considerarem os diversificados ritmos do tem po histórico quando o situamos na duração dos fenômenos sociais e naturais E justamente a compreensão dos fenômenos sociais na dura ção temporal que permite o exercício explicativo das periodizações que são frutos de concepções de mundo de metodologias e até mes mo de ideologias diferenciadas As considerações sobre a riqueza e complexidade do conceito de tempo são imprescindíveis para que sejam evitados os anacronis mos não tão raros nas explicações históricas O anacronismo consis te em atribuir a determinadas sociedades do passado nossos próprios sentimentos ou razões e assim interpretar suas ações ou aplicar cri térios e conceitos que foram elaborados para uma determinada épo ca em circunstâncias específicas para outras épocas com caracterís icas diferentes Sujeito histórico é Perceber a complexidade das relações sociais presentes no coti diano e na organização social mais ampla implica indagar qual o lugar que o indivíduo ocupa na trama da História e como são construídas as identidades pessoais e as sociais em dimensão temporal O sujeito histórico que se configura na interrelação complexa duradoura e c ontraditória entre as identidades sociais e as pessoais é o verdadeiro construtor da História Assim é necessário acentuar que a trama da I Iistória não é o resultado apenas da ação de figuras de destaque con sagradas pelos interesses explicativos de grupos mas sim a construção conscienteinconsciente paulatina e imperceptível de todos os agentes sociais individuais ou coletivos 45 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a Conceber a História como o resultado de sujeitos históricos implica não atribuir o desenrolar do processo como sendo ação da vontade de instituições como o estado os países a escola etc ou re sultante do jogo de categorias de análise ou conceitos como siste mas capitalismo socialismo etc Perceber que a trama histórica não se localiza nas ações individuais mas no embate das relações sociais no tempo Cultura A ampliação do conceito de cultura fruto da aproximação en tre História e Antropologia enriquece o âmbito das análises cami nhando de forma positiva para a abertura do campo científico da His tória Cultural As representações sociais dão unidade a todas as manifestações da vida quer individual quer social Cultura não é ape nas o conjunto de manifestações artísticas Envolve as formas de orga nização do trabalho da casa da família do cotidiano das pessoas dos ritos das religiões das festas etc Assim o estudo das identidades so ciais no âmbito das representações culturais adquire significado e im portância para a caracterização de grupos sociais e de povos Historicidade dos conceitos Os conceitos históricos somente podem ser entendidos na sua historicidade Isso quer dizer que os conceitos criados para explicar certas realidades históricas têm seu significado voltado para essas rea lidades não sendo possível empregálos indistintamente para toda e qualquer situação semelhante Dessa forma os conceitos quando to mados em sua acepção mais ampla não podem ser utilizados como modelos mas apenas como indicadores de expectativas analíticas Ajudamnos e facilitam o trabalho a ser realizado no processo de co nhecimento na indagação das fontes e na compreensão de realidades históricas específicas 46 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a Registrese que é possível distinguir os conceitos na escala de sua compreensão entre aqueles que são mais abrangentes e os que se refe rem a realidades mais especificamente determinadas Quando o concei to tem uma compreensão geral que se aplica a realidades históricoso ciais semelhantes pode receber a denominação de categoria Por exemplo a categoria trabalho homem continente revolução etc Nesse sentido os conceitos ou categorias são abertos são vetores à es pera de concretizações com base na elaboração de conhecimentos espe cíficos de acordo com os procedimentos próprios da disciplina Histó ria No momento em que se atribui a essas categorias as determinações históricas e suas especificidades como trabalho assalariado trabalho servil trabalho escravo por exemplo já estamos lidando com conceitos que por sua vez poderão receber ainda mais especificações como tra balho servil na Germânia na Francônia e assim por diante a revolução socialista a revolução industrial etc Não há uma democracia consi derada em sua essência mas democracias na Grécia no século XIX a democracia liberal a socialista a atual brasileira etc Seriam então os conceitos propriamente ditos considerados como representações de um objeto ou fenômeno histórico por meio de suas características Para efeito dessa análise estamos empregando a denominação conceito na acepção mais ampla e abrangente Cidadania O conjunto de preocupações que informam o conhecimento histórico e suas relações com o ensino vivenciado na escola levam ao aprimoramento de atitudes e valores imprescindíveis para o exercício pleno da cidadania como exercício do conhecimento autônomo e crí tico valorização de si mesmo como sujeito responsável da História respeito às diferenças culturais étnicas religiosas políticas evitando qualquer tipo de discriminação busca de soluções possíveis para os problemas detectados em sua comunidade de forma individual e cole tiva atuação firme e consciente contra qualquer tipo de injustiça e 47 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a mentiras sociais valorização do patrimônio sociocultural próprio e de outros povos incentivando o respeito à diversidade valorização dos di reitos conquistados pela cidadania plena aí incluídos os corresponden tes deveres sejam dos indivíduos dos grupos e dos povos na busca da consolidação da democracia CONCLUSÃO Ao desenvolver a discussão sobre algumas das questões básicas que se colocam para o ensino de História optamos por sugerir uma sé rie de considerações a respeito de dois blocos de questões os conteú dos e os conceitos Com certeza não são questões consensuais entre historiadores e professores de História Não foi intenção definir con ceitos ou sugerir os conteúdos que os alunos deverão dominar no transcorrer da escolaridade básica Mas sim a de constatar aquilo que está mais consolidado na área tanto em relação à necessidade de se rea lizarem seleções de conteúdos o que já é feito de forma concreta e diversificada na prática da organização escolar quanto em relação às considerações sobre os conceitos mais usuais na área de História A partir dessas considerações é possível iniciar um debate construtivo pa ra corrigir confirmar ampliar e sugerir outras possibilidades 48
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P o r u m a H i s t ó r i a P R A Z E R O S A E C O N S E Q Ü E N T E Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky 0 PROBLEMA As grandes mudanças políticas e econômicas ocorridas no final cio século XX causaram muita perplexidade entre professores e estudan tes de História em geral criando em certos círculos atitudes de ceti cismo com relação ao próprio conhecimento histórico o valor do en sino de História nas escolas e seu potencial transformador Por outro lado diante da difusão das novas tecnologias globais uestionase e até duvidase da eficácia educacional dos livros consi derados com freqüência um meio de comunicação desinteressante e obsoleto 1 da utilidade dos professores como agentes de ensino tidos mino comunicadores inábeis e incompetentes e das propostas curri ulares ligadas às realidades nacional e local vistas como inadequadas ultrapassadas Procurando acompanhar as mudanças os novos tempos muitos 1 i i ilrssores acabam comprando a idéia de que tudo que não é muito veloz i i liato Na sala de aula o pensamento analítico é substituído por achis m i o s alunos trocam a investigação bibliográfica por informações super Ii tais tios sites de pesquisa pasteurizados vídeos são usados para subs 11111 i i e não complementar livros E o passado visto como algo passado Miiimto superado tem tanto interesse quanto o jornal do dia anterior 7 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a Em resposta às decepções com o socialismo seja o real seja o idealizado e ao avanço sem grandes obstáculos da ideologia neoliberal o desencanto com qualquer projeto ideológico que contemple um com prometimento com a diminuição das desigualdades sociais e os valores humanistas parece tomar conta de grande parte dos profissionais ocupa dos com o ensinoaprendizagem particularmente na área de História Nos meios mais inquietos dos anos 60 e 70 acreditavase que convicções políticas bastavam para fornecer todas as respostas e nortear as práticas de ensino Não havia por que perder tempo com investiga ções cansativas e análise de situações concretas pois em qualquer pe ríodo da História em qualquer latitude do planeta era possível iden tificar os bons e os maus quem era nosso e quem era deles Crítica e política stricto sensu valiam mais que o estudo Hoje tais posturas es tão superadas e temos consciência de que pagamos todos muito caro pela nossa leviandade o conteúdo da disciplina foi deixado de lado a erudição foi considerada coisa de esnobes e a leitura da História foi du ramente prejudicada por tal simplismo Hoje se sabe que estudar His tória interpretála ensinála não é tão fácil como parecia um mero instrumento de propaganda ideológica ou revolução Porém no lugar da utopia abandonada parece ter ficado um vazio Tudo bem acusamos a pancada que recebemos com o fim de cer tas utopias e a aparente vitória de um modelo de mundo voltado para o consumismo desenfreado a existência de uma única potência hegemô nica o comprometimento de modelos teóricos tidos como catecismo pa ra muitos Mas após o atordoamento inicial não podemos correr o pe rigo de junto com a água do banho jogar fora também o bebê abandonando juntamente com as utopias ultrapassadas o idealismo de educador e a utopia da mudança descartando toda leitura junto com os materiais didáticos ine ficazes e apostando todas as fichas na redenção dos computadores e audiovisuais de qualidade discutível atirando na mesma lata de lixo do conteúdo ensinado o dog matismo simplista do marxismo ortodoxo e a noção de processo histó rico ou a concepção de seres humanos como sujeitos da História 18 3a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y O grande desafio que se apresenta neste novo milênio é ade quar nosso olhar às exigências do mundo real sem sermos sugados pela onda neoliberal que parece estar empolgando corações e m en tes E preciso nesse momento mostrar que é possível desenvolver uma prática de ensino de História adequada aos novos tempos e alunos rica de conteúdo socialmente responsável e sem ingenuida de ou nostalgia Historiadorprofessor sem utopia é cronista e sem conteúdo nem cronista pode ser A PROPOSTA A favor do conhecimento humanista Ao mesmo tempo em que condenam no discurso o pragmatis mo e o materialismo dos novos tempos as escolas parecem ter esque cido sua parcela de responsabilidade na formação hum anista dos alu nos Como estabelecer contrapesos ao materialismo irresponsável da sociedade tendo como m eta apenas a preparação de máquinas de res ponder perguntas no vestibular Ao substituir aulas de História dras ticamente reduzidas em muitas escolas por disciplinas mais práticas e mais úteis como com putação ou gram ática norm ativa por exem plo abrese mão de um instrumento precioso para a formação inte gral do aluno Queiram ou não é impossível negar a importância sempre atual do ensino de História Nas palavras do historiador Eric Hobs bawm Ser membro da comunidade humana é situarse com relação a seu passado passado este que é uma dimensão permanente da consciência hum ana um componente inevitável das instituições valores e padrões da sociedade1 A História é referência E preciso portanto que seja bem ensinada Num momento em que relevantes mudanças vêm ocorrendo na área de História o historiador está sendo cada vez mais valorizado 19 I l r l Ò H I A N A S A L A D E A U L A as pesquisas dão conta de objetos cada vez mais amplos a informática e a internet facilitam imensamente a parte mecânica do trabalho de in vestigação profissionais são chamados para explicar o mundo na mí dia historiadores são convidados a trabalhar com planejamento urba no com projetos turísticos como consultores editoriais e empresariais certos livros de História tornamse bestsellers e novelas e filmes de época alcançam grande sucesso de público muitas escolas parecem caminhar na contramão da História em todos os sentidos A contramão é perceptível principalmente no ensino médio de certas escolas nas quais se percebe um perigoso movimento que no li mite tende a substituir o ensino de História por uma outra disciplina algo que com boa vontade poderíamos chamar de realidade mundial muitos professores abandonam tudo o que aconteceu antes do século XIX alegando não ser possível dar tudo daí terem que se concentrar no passado mais próximo em detrimento do remoto Claro que uma parte da responsabilidade disso cabe aos diretores aos pais e à sociedade de consumo que exercem pressões sobre o que deve ser dado ou não em sala de aula Não pouparíamos contudo muitos colegas que equi vocadamente em nome de um ensino crítico acabam alienando seus próprios alunos ao não lhes dar oportunidade de adquirir uma visão mais abrangente de História Assim nada de processo civilizatório na da de monoteísmo ético dos hebreus base do cristianismo nada de fi lósofos gregos base do pensamento ocidental nada de direito roma no base do nosso nada de Europa Medieval de Renascimento de Mercantilismo e descobrimentos nada de Bach e Mozart de Dante e Camões Parece que nos conformamos mesmo em abrir mão do co nhecimento e da formação em troca de míseras informações E mais grave desistimos de ao menos nos aproximar do pa trimônio cultural da humanidade E qual é o papel do professor senão estabelecer uma articulação entre o patrimônio cultural da humanida de e o universo cultural do aluno Ora a presença do homem civilizado neste planeta tem poucos milhares de anos e tem causado terríveis males destruímos sem dó a natureza submetemos os mais fracos matamos por atacado e a varejo deixamos um terço da população mundial com fome queimamos ín 20 3a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y dios e por aí afora Mas nossa presença não foi escrita apenas com san gue Escrevemos poesia sublime teatro envolvente e romances maravi lhosos Criamos deuses e categorias de pensamento complexos para compreender o que nos cerca O professor de História não pode ficar preso apenas a modos de produção e de opressão embora isso seja fun damental mas pode e deve mostrar que graças à cultura que nós membros da espécie humana produzimos temos tido talento para nos vestir mais adequadamente que os ursos construir casas melhores que o joãodebarro combater com mais eficiência que o tigre embora ca da um de nós seres humanos tenha vindo ao mundo desprovido de pêlos espessos bicos diligentes ou garras poderosas Cada estudante precisa se perceber de fato como sujeito histórico e isso só se conse gue quando ele se dá conta dos esforços que nossos antepassados fize ram para chegarmos ao estágio civilizatório no qual nos encontramos Para o mal mas também para o bem afinal de contas Humanizar o homem é percebêlo em sua organização social de produção mas tam bém no conteúdo específico dessa produção E para o momento espe cífico em que vivemos no começo do século XXI isso é particularmen te importante Para entender ainda melhor a importância das humanidades nos dias de hoje é preciso ter bem claro que devemos estar preparados para ocupar um espaço na sociedade globalizada sob o risco de sermos sufocados por ela A percepção do conjunto de movimentos que estão sendo executados no mundo exige por parte dos nossos jovens uma cultura que vá alem da técnica Portanto História neles No Brasil diante do panorama atual só uma educação de qua lidade que tenha o ser humano e suas realizações como eixo central pode nos fazer como nação dar o salto qualitativo a que tanto aspira mos por meio da qualificação de nossos jovens Um país cuja popula ção não sabe ler que quando sabe lê pouco e quando finalmente lê pouco entende segundo a constatação insuspeita de um órgão da pró pria ONU não tem muitas chances num mundo competitivo e exigen te de qualificação de sua força de trabalho Há mais a era de comuni cação e serviços cm que estamos prestes a viver tende a substituir a 21 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a força física pela sutileza e pela educação formal Os países que não agirem a favor da História ficarão fadados a distanciar cada vez mais daqueles outros ricos ou não que colocam a educação e a cultura incluindo a histórica como prioridade real O papel do professor de História E necessário portanto que o ensino de História seja revaloriza do e que os professores dessa disciplina conscientizemse de sua res ponsabilidade social perante os alunos preocupandose em ajudálos a compreender e esperamos a melhorar o mundo em que vivem Para isso é bom não confundir informação com educação Pa ra informar aí estão bem à mão jornais e revistas a televisão o cine ma e a internet Sem dúvida que a informação chega pela mídia mas só se transforma em conhecimento quando devidamente organizada E confundir informação com conhecimento tem sido um dos grandes problemas de nossa educação Exatamente porque a informação che ga aos borbotões por todos os sentidos é que se torna mais importan te o papel do bom professor Um professor mal preparado e desmotivado não consegue dar boas aulas nem com o melhor dos livros ao passo que um bom profes sor pode ate aproveitarse de um livro com falhas para corrigilas e de senvolver o velho e bom espírito crítico entre os seus alunos Mais do que o livro o professor precisa ter conteúdo Cultura Até um pouco de erudição não faz mal algum Sem estudar e saber a matéria não pode haver ensino É inadmissível um professor que qua se não lê Se o tempo é curto se as condições de trabalho são precárias se o salário é baixo se o Estado não cumpre a sua parte discutase tu do isso nas esferas competentes e lutese para melhorar a situação dos docentes em vez de usar isso tudo como desculpa para a falta de em penho pessoal em adquirir conhecimento entrar em contato com uma bibliografia atualizada conhecer novas linhas de pensamento e discu tir com os colegas estratégias para melhor operacionalizar nas salas de aula o patrimônio cultural e histórico 22 í a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y Afinal se o professor é o elemento que estabelece a intermedia ção entre o patrimônio cultural da humanidade e a cultura do educan do é necessário que ele conheça da melhor forma possível tanto um quanto outro O professor precisa conhecer as bases de nossa cultura as formas de organização das sociedades humanas a evolução das civi lizações as cidadesestado da Antigüidade a Revolução Francesa a es cravidão no Brasil o desenvolvimento do capitalismo os movimentos sociais as condições de vida das populações no passado sua cultura material e suas idéias a música de Beethoven o cinema de Charlie Chaplin a literatura de Machado de Assis e por aí afora Noutras pa lavras cada professor precisa necessariamente ter um conhecimento sólido do patrimônio cultural da humanidade Por outro lado isso não terá nenhum valor operacional se ele não conhecer o universo socio cultural específico do seu educando sua maneira de falar seus valores suas aspirações A partir desses dois universos culturais é que o profes sor realiza o seu trabalho em linguagem acessível aos alunos Digase de passagem que linguagem acessível não é sinônimo de banalização Valendose dessas considerações é preciso que o professor tenha claro o quê e como ensinar Pela volta do conteúdo nas aulas de História Opassado deve ser interrogado a partir de questões que nos in quietam no presente caso contrário estudálo fica sem sentido Por tanto as aulas de História serão muito melhores se conseguirem esta belecer um duplo compromisso com o passado e o presente Compromisso com o presente não significa contudo presentis mo vulgar ou seja tentar encontrar no passado justificativas para ati tudes valores e ideologias praticados no presente Hitler queria provar pelo passado a existência de uma pretensa raça ariana superior às de mais Significa tomar como referência questões sociais e culturais as sim como problemáticas humanas que fazem parte de nossa vida te mas como desigualdades sociais raciais sexuais diferenças culturais 23 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a problemas materiais e inquietações relacionadas a como interpretar o mundo lidar com a morte organizar a sociedade estabelecer limites sociais mudar esses limites contestar a ordem consolidar instituições preservar tradições realizar rupturas Compromisso com o passado não significa estudar o passado pelo passado apaixonarse pelo objeto de pesquisa por ser a nossa pes quisa sem pensar no que a humanidade pode ser beneficiada com is so Compromisso com o passado é pesquisar com seriedade basearse nos fatos históricos não distorcer o acontecido como se esse fosse uma massa amorfa à disposição da fantasia de seu manipulador Sem o res peito ao acontecido a História vira ficção Interpretar não pode ser con fundido com inventar E isso vale tanto para fatos como para processos Aqui mesmo no Brasil não inventaram um anacrônico modo de produção feudal pois segundo o modelo deveria haver algo entre o escravismo e o capitalismo Afirmações baseadas apenas em filiações ideológicas são no mí nimo desprezíveis podendo tornarse perigosas quando além de não verdadeiras acabam se tornando veículos do preconceito e da segrega ção É o caso de por exemplo verdades como os índios não são bons trabalhadores as mulheres são inferiores os jovens são sem pre revolucionários o Holocausto não ocorreu ou o Brasil é um país pacífico e assim por diante Além dessas questões estruturais há alguns vícios muito disse minados que contribuem para a queda da qualidade do ensino em ge ral mas que afetam de forma particular as aulas de História Um deles é o hábito freqüente em nossas universidades mas já popular em muitas escolas de ensino médio da crítica sem base Antes de entender um texto uma questão uma conjuntura profes sores e alunos já lançam a crítica Ela já está na ponta da língua ou seja precede a compreensão da complexidade do fenômeno históri co Tal autor Está superado dizem alunos e professores que nun ca se deram ao luxo de lêlos mas se permitem julgamentos definiti vos com base em algo ouvido em um corredor ou lido às pressas em 24 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y uma página de uma revista semanal de informações Defendemos pois a volta do conteúdo às salas de aula da seriedade E do ób vio a tentativa de interpretação deve necessariamente ser precedida pelo entendimento do texto Outra tendência é a supervalorização do desconstrutivismo Não que a desconstrução não tenha sido um avanço importante O en tendimento das motivações dos discursos e de seu papel instaurador a compreensão dos jogos de poder envolvidos na elaboração das versões em torno dos fatos históricos a análise dos discursos o desmonte dos argumentos podem ser perfeitamente utilizados como instrumento de análise histórica e ocupam hoje boa parte das pesquisas acadêmicas Porém como proposta de ensino o desconstrutivismo deve ser utiliza do com cautela mesmo que o professor tenha um grande domínio das versões e dos discursos em jogo e esteja familiarizado com as operações desconstrutivistas Só a desconstrução não basta além do vazio provo cado deixa um gostinho de insatisfação e niilismo no ar no limite supervaloriza o relativismo e tira o poder de ação das mãos dos sujei tos históricos é preciso que os alunos tenham acesso a algum conteú do histórico e que entendam sua contextualização Além de tudo um aviso aos desconstrutivistas pelo amor ao novo essa história de relati vismo está ficando fora de moda Um modo mais construtivo sem trocadilhos seria adotar co mo postura de ensino que se quer crítico a estratégia de abordar a His t tória a partir de questões temas e conceitos Quais seriam as questões relevantes que podem ser feitas ao presente e por extensão ao passa do Qual a relevância dos recortes temáticos tradicionais e novos feitos pela historiografia Quais os conceitos importantes a serem discutidos com os alunos Tendo respostas mais ou menos claras sobre esses as suntos o professor poderá despertar o interesse dos alunos demonstrando a atualidade de coisas tão cronologicamente remotas quanto a situação das mulheres na Idade M édia a insatisfação dos plebeus na Rom a Antiga ou as is pirações ambíguas dos burgueses no século XVIII capacitar os estudantes no sentido de perceberem a liisioiii 1 dade de conceitos como democracia cidadania beleza como jmii 25 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a que mudaram muito ao longo do tempo práticas como a manifesta ção de religiosidade afetividade e sexualidade idéias como a inferiori dade racial cultural e moral fazer com que os alunos não só reconheçam preconceitos mas compreendam seu desenvolvimento e mecanismos de atuação para poder criticálos com bases e argumentos mais sólidos2 demonstrar com clareza certos usos e abusos da História per petrados por grupos políticos nações e facções adversários de um es tado nacional são freqüentemente apresentados nos manuais escolares como inimigos da pátria revolucionários como traidores minorias co mo gente não patriota e assim por diante possibilitar a crítica a dogmatismos e verdades absolutas com base no reconhecimento da historicidade de situações e formas de pensamento talvez não seja o caso de entender as razões dos leões que devoravam cristãos nas arenas romanas mas pelo menos dos here ges que foram massacrados impiedosamente pela Igreja Católica E quais seriam as abordagens mais adequadas à prática de ensi no de História em sala de aula Uma questão de abordagem Tendo como paradigma o ensino de História simplificador e esquemático de algumas décadas atrás criouse um certo malestar com relação à História Social apoiada na concepção materialista da História Colocase no mesmo saco os vulgarizadores que buscavam o econômico em tudo e os historiadores do porte de um Eric Hobs bawm Ora é muito difícil fazer boa História sem ter noção de pro cesso a idéia do devir histórico a percepção dos modos de vida e da cultura material o conhecimento das relações sociais e a apreensão da complexa e imbricada dialética que se estabelece entre determinações históricas e ação humana Por outro lado não há porque não dar con ta dos novos objetos e abordagens que o método histórico incorporou nos últimos anos em que tendo como destaque o quadro cultural es 26 3a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y tudamse aspectos mais íntimos como a vida privada e as dimensões da experiência hum ana ligadas à sexualidade aos costumes aos afetos e às crenças Assim não vemos uma incompatibilidade entre a História So cial e a História das Mentalidades e do Cotidiano Na verdade as duas abordagens não apenas não se opõem necessariamente como se complementam A abordagem da corrente da História Social busca a percepção das relações sociais do papel histórico dos indivíduos e dos limites e possibilidades de cada contexto e processo histórico A das M entalidades privilegia cortes temáticos Freqüentemente a primeira busca a floresta a segunda a árvore uma o telescópio outra o microscópio Bem utilizados ambos os procedimentos são recomendáveis Se trabalhados de forma integrada chegase ao melhor dos mundos olhase a partir de diferentes pontos de vista Além disso por meio desses olhares poderá o professor reaproximar o aluno do estudo da História E quem sabe explorar muitas das possibilidades que o contato com nossa disciplina permite inclusive a de nos percebermos de fato como sujeitos da História por mais batida que a fórmula se apresente O potencial transformador do ensino de História Este é um assunto que provoca protestos indignados ou aplau sos emocionais mas quase sempre uma enorme dificuldade para o pro fessor situarse racionalmente Para uns a frase de Marx anunciando que não era mais hora de apenas entender o mundo mas de mudálo tem justificado arroubos de magógicos em sala de aula discursos políticos permeados de declarações devoto e até propaganda explícita para um ou outro candidato em perío dos préeleitorais Sob o pretexto de saber qual a mudança que o mundo deve merecer e fingindo acreditar que o potencial transformador do ensi no de História consiste em colocar no governo representantes dos parti dos que o mestre acredita que possam promover a transformação social tão sonhada o professor perde sua dignidade ao apresentarse como umi 27 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a espécie de cabo eleitoral privilegiado Privilegiado sim pois se aproveita da ascendência que tem sobre a turma de alunos e em vez de lhes dar ins trumentos para decidir sozinhos os pressiona para que aceitem sua ver dade constrangendo por outro lado aqueles que por uma razão ou ou tra não se curvam aos seus argumentos Não se trata de se despolitizar o discurso do professor uma vez que não há discurso apolítico mas de do tálo de equilíbrio e ponderação O conhecimento histórico por si pró prio carrega profundo potencial transformador dispensando interpreta ções apressadas feitas sob o impacto de circunstâncias acaloradas Nosso aluno cada aluno tem de se perceber como um ser social alguém que vive numa determinada época num determinado país ou re gião oriundo de determinada classe social contemporâneo de determina dos acontecimentos Ele precisa saber que não poderá nunca se tornar um guerreiro medieval ou um faraó egípcio Ele é um homem de seu tempo e isso é uma determinação histórica Porém dentro do seu tempo dentro das limitações que lhe são determinadas ele possui a liberdade de optar Sua vida é feita de escolhas que ele com grau maior ou menor de liberda de pode fazer como sujeito de sua própria história e por conseguinte da História Social do seu tempo Cabe ao professor utilizandose dos méto dos históricos descritos acima aproximar o aluno dos personagens concre tos da História sem idealização mostrando que gente como a gente vem fazendo História Quanto mais o aluno sentir a História como algo próxi mo dclc mais terá vontade de interagir com ela não como uma coisa ex terna distante mas como uma prática que ele se sentirá qualificado e in clinado a exercer O verdadeiro potencial transformador da História é a oportunidade que ela oferece de praticar a inclusão histórica O que ensinar do abstrato para exemplos concretos Vemos com freqüência professores preocupados em dar toda a matéria e frustrados com o fracasso diante dessa tarefa impossível Há es tudantes que saem do ensino médio sem nunca ter estudado em História nada que ocorreu depois de 1945 Outros ficam frustrados porque nada 28 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y sabem sobre as antigas civilizações apesar de conhecerem de cor o nome dos donatários das capitanias hereditárias do Brasil Colônia Como ele mentos complicadores temos os exames vestibulares ao final do ensino médio e exames nacionais ou estaduais a cada final de ano Professores que adotam livros didáticos sentemse obrigados a seguir de cabo a rabo seu conteúdo pressionados por diretores coordenadores e pais Com o número baixo de aulas de História oferecidas quaisquer assuntos e dis cussões que embora importantes atrasariam a matéria são deixados de lado O resultado de tudo isso é a transformação do conhecimento histó rico numa maçaroca de informações desconectadas ou articuladas à for ça mas sempre desinteressantes e freqüentemente inúteis A medida dis so é dada pela dificuldade que muitos professores têm em responder à mais banal e óbvia pergunta dos alunos Professor para que serve isso Como ninguém é uma enciclopédia a primeira coisa a fazer ao montarmos um curso é selecionar conteúdos O professor não deve ter dó de abandonar assuntos quando não conseguir uma resposta satisfatória à questão do porquê às vezes mos trase muito mais interessante pular algumas páginas do livro didáti co ou da História seja lá o que isso quer dizer e dedicar o tempo infelizmente cada vez mais curto das aulas a temas como a situação do índio no Brasil colonial ao invés de capitanias hereditárias e go vernadores gerais os movimentos sociais que ajudaram a derrubar a ditadura militar no Brasil ao invés de lista de presidentes da Repúbli ca e suas realizações os efeitos deletérios do nazismo ao invés de um histórico detalhado das batalhas da Segunda Guerra Mundial Outras vezes vale a pena dedicar um tempo maior à leitura cui dadosa de um determinado documento histórico tanto pelo seu signi ficado intrínseco como pela validade do próprio exercício de ler uma fonte primária o traquejo adquirido com tal exercício pode ser aplica do pelo aluno na leitura de vários outros textos e documentos que che carem às suas mãos E o que é válido A matéria escolar pode estar relacionada a vários recortes da I listória Entre outros citamos 29 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a 1 um acontecimento ou evento histórico a Revolução Fran cesa a Segunda Guerra Mundial a Proclamação da República 2 uma instituição social a escravidão no Brasil o imperialis mo o mundo globalizado 3 um processo de longa duração o desenvolvimento das pri meiras civilizações 4 uma interação de culturas o encontro entre europeus e in dígenas no tempo do descobrimento da América 5 um tema monográfico a mulher na Idade Média Todos esses recortes são válidos desde que façam sentido no programa específico de cada escola Seria até aconselhável que diferen tes recortes fossem utilizados o que permitiria ao aluno afastarse da visão monocromática dos materiais didáticos e incolor das pseudopes quisas eletrônicas Quanto aos assuntos é preciso que se encontre uma boa justificativa para incluílos no programa de curso Damos a seguir alguns exemplos e sugestões bem variados e potencialmente úteis além de muito atraentes 1 Revolução Russa Revolução Chinesa e Revolução Cubana As três revoluções são movimentos ocorridos no século XX com al gumas características comuns mudança de estrutura econômica e política em ritmo acelerado filiação marxistaleninista eliminação da propriedade particular de bens de produção etc apesar de suas particularidades e po dem ser estudadas juntas sob o título Revoluções do século XX Por que é um conteúdo importante a ser tratado em sala de au la Porque diz respeito a acontecimentos que marcaram o século XX com conseqüências e desdobramentos até os dias de hoje Também porque é um bom gancho para se apresentar e discutir a idéia da continuidade e da ruptura histórica a História é um processo mas que sofre rupturas Há fatos históricos que mudaram a ordem mundial os desenvolvimentos políticos sociais e culturais de países in 30 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y seridos no contexto mundial sem deixar de lado a discussão sempre relevante sobre o lugar dos sonhos de igualdade e justiça social nos co rações e mentes do tempo presente exemplos de revolta contra a ordem estabelecida e de tentati va de reconstrução social assim como dos problemas que impediram que os objetivos fossem alcançados 2 Escravidão no Brasil Esse assunto se justifica no currículo dos alunos ao contribuir para a compreensão das bases da sociedade brasileira a situação dos ne gros a origem de preconceitos raciais contra o trabalho braçal etc as relações sociais com base no entendimento de um fenômeno que marcou a sociedade brasileira com conseqüências até hoje Questões a serem tratadas o sistema escravista no contexto do capitalismo mercantil o tráfico negreiro a escravidão em terras brasileiras vida de escravo o cotidiano dos escravos no trabalho e na sen zala a sexualidade as revoltas e a resistência contra a escravidão exem plos de formas concretas de submissão e resistência O tema deve ser abordado de forma a aguçar o espírito crítico dos estudantes levandoos no final a entender e combater preconceitos dentro e fora da sala de aula O professor pode completar o trabalho de leitura sugerindo pesquisas atuais sobre o preconceito racial ou a si tuação dos negros no Brasil por exemplo 3 Primeiras civilizações homens préhistóricos mesopotâmicos egípcios e hebreus É muito importante estudar o assunto de forma a procurar compreender como se começou a construir o patrimônio cultural da humanidade do qual somos todos herdeiros permitindo que os alunos se percebam como seres históricos para cuja formação valores como monoteísmo ético dos hebreus organização das cidades mesopotâ inicas e relação entre religião e estado egípcios estão presentes Esse recorte da História permite também que se estude em sala de aula a diferença entre História Natural e História Social o animal 31 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a homem em sua relação com a natureza dos primitivos homo sapiens aos mesopotâmicos egípcios e hebreus Além disso partindo da Pré História focaliza o momento em que o homem em sua estreita re lação com a natureza se humaniza realiza importantes conquistas materiais passa a criar cultura e tornase civilizado O próprio estu do dos pitecantropídeos e homo sapiens das sociedades tribais aos po vos egípcios mesopotâmicos e hebreus pode ser uma forma de ques tionar os termos humano e civilizado Tendo em mente a necessidade de levar os alunos a compreender a questão da relação do homem com o meio ambiente e suas condições materiais de existência o professor pode abordar o tema das primeiras ci vilizações de modo a mostrar as diferentes maneiras em lidar com tais condições dos povos caçadores e coletores aos grandes construtores de diques e dominadores da força das águas como os mesopotâmicos Além disso pode ampliar o tema demonstrando os efeitos de condicionamen tos naturais em estruturas sociais modos de vida e organizações religiosas e políticas De maneira instigante é possível discutir os presentes da na tureza e as formas de sua apropriação pelo homem ao longo de sua aven tura na terra em milhares de anos desde sua constituição como tal Ensinar sobre as primeiras civilizações de maneira prazerosa e conseqüente também consiste em procurar abordar as transformações na qualidade de vida dos seres humanos ao longo do processo civiliza tório que conduziu nossos ancestrais à conquista da fala dos territó rios do fogo da agricultura da escrita ao controle e aproveitamento dós recursos naturais à criação das cidades e dos impérios ao desen volvimento de civilizações Por meio desse estudo os alunos poderão encontrar respostas a algumas das perplexidades que têm diante de si mesmos da História e da humanidade e adotar posturas mais colaborativas no processo de ensinoaprendizagem em seu conjunto 4 O Brasil nos primeiros tempos da colonização séculos XVI e XVII Uma das formas mais interessantes de abordar o tema é tomar por base a problemática da pluralidade cultural e do encontro de cul turas Assim é preciso destacar o patrimônio cultural dos primeiros 32 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y habitantes do Brasil que depois foi transformado nos primeiros tem pos da colonização portuguesa na América É importante também res saltar os usos e abusos do patrimônio natural e humano do Brasil na época colonial Assuntos interessantes relacionados o estilo de vida dos europeus e suas esperanças com relação ao Novo Mundo as compatibilidades e contradições entre interesses e visões de mundo de colonos mercadores e jesuítas a mentalidade dos portugueses jesuítas e colonos e sua rela ção com o meio ambiente as riquezas e os habitantes da América in cluindo os europeus que foram seduzidos pela qualidade da vida sel vagem dos índios e abandonaram antigos costumes as condições e a qualidade de vida dos índios vida material e pensamento Semelhanças e diferenças culturais entre povos indíge nas Suas relações com os bens materiais a propriedade privada e o tra balho Costumes incluindo banhos e festas Família sexualidade mulher criança Organização social fé leis e autoridade O papel das guerras nas sociedades indígenas armas táticas canibalismo o choque de culturas Transformações na qualidade de vida dos índios no encontro com colonos e jesuítas aprendizados cateque se resistência exploração sexual escravidão Práticas e costumes ree laborados no Novo Mundo Porser um tema com vasta documentação primária editada e pu blicada no Brasil pode ser também um ponto de partida para apresentar aos estudantes questões básicas relacionadas ao tratamento das fontes de pesquisa histórica ensinandoos na prática a fazer crítica de documentos e análise de discurso por exemplo cartas jesuíticas ou documentos deixa dos por viajantes e cronistas podem ser analisados em sala de aula levan dose em conta a posição social os interesses e as visões de mundo fa lalmente enviesadas e por vezes preconceituosas de seus autores Esse também é um tema que permite dar à questão do meio mibiente o destaque que merece Basta adotar uma postura diferen da de abordagens tradicionais que tratam dos primeiros tempos da conquista e colonização portuguesa como se a natureza fosse algo Ü F R R JB ib lio teca C e n jra í 33 RG 9 p X o W m AC i j f t Ê L H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a inexistente ou secundária É possível dedicar o tempo de algumas aulas às condições naturais às diferentes formas de europeus e ín dios conceberem e lidarem com o meio ambiente às dificuldades e às possibilidades oferecidas pelas riquezas naturais clima terra flo ra e fauna na época do descobrimento às opções de cada povo e ao encontro de culturas observações sobre heranças de antigos hábitos indígenas e europeus no trato com o meio ambiente que nos afe tam até hoje 5 Mulheres no Brasil colonial Um estudo monográfico das mulheres no Brasil colonial abor da a qualidade de vida de tais mulheres praticamente em toda sua ex tensão abrangendo manifestações femininas relativas à religiosidade maternidade sexualidade luta pela sobrevivência solidariedade saúde e trabalho Abrange grupos sociais distintos mas com várias experiên cias em comum como índias escravas pobres bruxas prostitutas religiosas senhoras brancas jovens e velhas apresentando aos estu dantes um quadro rico variado e complexo da condição feminina nos tempos coloniais abrindolhes também possibilidades para novas ma neiras de olhar a vida e a história das mulheres em geral O estudo do tema Mulheres no Brasil colonial ao tratar das vivências de nossas antepassadas de diferentes grupos sociais e trajetó rias seu cotidiano e as representações que delas se fizeram também é um exemplo de recorte monográfico interessante para a compreensão de aspectos importantes da disciplina histórica A estratégia consiste em caminhar do micro para o macro Ou seja a partir de um tema es pecífico como esse adotando é claro uma linguagem compatível com o nível dos estudantes o professor em sala de aula pode introduzir seus alunos na discussão de questões mais amplas pensadas pelos his toriadores tais como o imaginário social as representações as mentalidades moldan do atitudes e comportamentos e sendo por sua vez moldados por eles as diferenças socialmente construídas entre sexos as interações entre as categorias de classe e gênero 34 J a i m e P i n s k y e C a r l a B a s s a n e z i P i n s k y CONCLUSÃO Como se vê diferentes recortes da História permitem que o aluno abra enormes horizontes que podem acolher inicialmente sua curiosidade depois sua análise e finalmente sua identificação com essa gente como a gente que construiu o processo histórico do qual ele mesmo faz parte Acreditamos a tal ponto na capacidade de a História bem ensi nada desempenhar esse papel que questionamos certas facilitações que no limite levam à descontextualização dos acontecimentos como a tentativa de fazer uma História mal comparada ou de forçar uma transversalidade um pouco oblíqua A condição da mulher na Idade Média comparada com a das ocidentais ou das islâmicas dos dias de hoje perde o sentido se vista fora de seu tempo Da mesma forma identificar certos tipos de exploração de trabalho no capitalismo ao es cravismo qual O colonial O antigo O dos povos do deserto impe de que se tenha uma dimensão exata do caráter de cada tipo de relação de produção historicamente determinada O problema em termos do processo de ensinoaprendizagem é que o abandono da diacronia da idéia de processo pode transformar 0 conhecimento histórico numa sabedoria de almanaque mal digerida em que acontecimentos instituições e movimentos ocorrem do nada para o nada Será que é isso o que mais nos interessa com relação à dis ciplina História Misturar Galileu e Einstein ou Espártaco e Zumbi unidos por afgum tema transversal como se fossem contemporâ neos prontos a dialogar pode desistoricizar suas práticas e formas de pensamento se não estivermos muito atentos E finalmente mas não menos importante é preciso que se vol ic aos livros A moda atual de substituílos por pesquisas virtuais para lernálias tecnológicas e debates sem conteúdo está levando a um pro gressivo empobrecimento cultural de alunos e professores O pensamento crítico não se sustenta sem leitura vício silencioso lento e profundo Só depois de ter a mente e o espírito alimentados pela leitu 1 i c que ilustrações computadorizadas ou filmadas podem fazer algum ni ido Da mesma forma só se debatem idéias se antes as temos Do 35 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a contrario nossas classes se transformam em espaços de debates óbvios e inconseqüentes iguais àqueles de que a televisão está cheia Acreditar na História é apenas uma postura de fé Insuficiente portanto para um professor de quem se espera um envolvimento tal que o permita superar suas condições de trabalho eventualmente difí ceis assim como a desvalorização social de sua profissão Este artigo tem por objetivo abrir um debate franco e construtivo a fim de valori zar o ensino da História colaborar com o professor e propiciar ao alu no uma aprendizagem mais prazerosa e conseqüente Notas 1 Eric Hobsbawm O sentido do passado Sobre História São Paulo Cia das Letras 1998 2 Leia a respeito em Pinsky Jaime org 12 faces do preconceito São Paulo Contexto 1999 Sugestões de leitura para o trabalho em sala de aula D e l PRIORE Mary Mulheres no Brasil Colonial São Paulo Contexto 2000 D el P r io r e Mary org e PiNSKY Carla Bassanezi coord de texto História das mulheres no Brasil São Paulo Contexto 2002 Fa r ia Ricardo Moura As revoluções do século XX São Paulo Contexto 2002 F u n a r i Pedro Paulo e N o e l i Francisco Silva Préhistória no Brasil São Pau lo Contexto 2002 M e sg r a v is Laima e PlNSKY Carla Bassanezi O Brasil que os europeus encon traram 2a edição São Paulo Contexto 2002 PlNSKY Jaime Escravidão no Brasil São Paulo Contexto 2000 edição revista e atualizada As primeiras civilizações São Paulo Contexto 2001 nova edição PlNSKY Jaime org Ensino de História e criação do fato São Paulo Contexto 1986 36 E n s i n o d e H i s t ó r i a C O N T E Ú D O S E C O N C E I T O S B Á S I C O S H olien Gonçalves Bezerra A lei 939496 que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional em seu artigo 22 aponta o caminho a perseguir na educa ção básica desenvolver o educando assegurarlhe a formação co mum indispensável para o exercício da cidadania e fornecerlhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores Assim as dire trizes os princípios pedagógicos os valores a serem transmitidos as competências e capacidades visualizadas a seleção dos conteúdos das diversas áreas de conhecimento os conceitos fundamentais as estraté gias de trabalho e as propostas de intervenção do professor estão todas pautadas por esse princípio maior que vincula a educação à prática so cial do aluno ao mundo do trabalho à formação para a cidadania A tônica incide sobre o desenvolvimento da capacidade de aprender e de adquirir conhecimentos e habilidades e sobre a formação de valores Portanto os objetivos da escola básica segundo essa lei não se restrin gem à assimilação maior ou menor de conteúdos prefixados mas se comprometem a articular conhecimento competências e valores com a finalidade de capacitar os alunos a utilizaremse das informações pa ra a transformação de sua própria personalidade assim como para ituar de maneira efetiva na transformação da sociedade Tendo como referência essas observações mais gerais nos per guntamos como vincular a elas os conteúdos e os conceitos básicos pa 37 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a ra o ensino de História O que propor em nossa área para favorecer aprendizagens essenciais que auxiliem os alunos em sua formação de cidadãos autônomos críticos participativos que possam atuar na so ciedade com competência dignidade e responsabilidade SELEÇÃO E ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS É dever da escola e direito dos alunos do ensino fundamental e médio oferecer e trabalhar os conjuntos de conhecimentos que foram socialmente elaborados e que os estudiosos consideram necessários pa ra o exercício da cidadania No entanto as dificuldades acentuamse quando se trata de explicitar o que está sendo entendido como neces sário como aquilo que é comum a todos os alunos brasileiros Já é con senso que a escola não tem por finalidade apenas transmitir conheci mentos Passa a ser consenso também entre os profissionais da História ainda que com menor intensidade que os conteúdos a serem trabalhados em qualquer dos níveis de ensinopesquisa básico médio superior pósgraduado não é todo o conhecimento socialmente acu mulado e criticamente transmitido a respeito da trajetória da humani dade Forçosamente devem ser feitas escolhas e seleções Por outro la do em vista da diversidade dos enfoques teóricometodológicos que foram sendo construídos especialmente nas últimas décadas não é possível pensar em uma metodologia única para a pesquisa e para a ex posição dos resultados nem mesmo para a prática pedagógica do ensi no de História Seleção de conteúdos A necessária seleção de conteúdos faz parte de um conjunto for mado pela preocupação com o saber escolar com as capacidades e com as habilidades e não pode ser trabalhada independentemente Os con teúdos curriculares não são fim em si mesmos como vem sendo cons tantemente lembrado mas meios básicos para constituir competên 38 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a i ias cognitivas ou sociais priorizandoas sobre as informações Dire trizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio artigo quinto I São considerados meios para a aquisição de capacidades que auxiliem os alunos a produzir bens culturais sociais e econômicos e deles usufruir Nesse sentido os conteúdos ocupam papel central no processo de en sinoaprendizagem e sua seleção e escolha devem estar em consonân cia com as problemáticas sociais marcantes em cada momento históri co Além disso eles são concebidos não apenas como a organização dos fenômenos sociais historicamente situados na exposição de fatos e conceitos mas abrangem também os procedimentos os valores as normas e as atitudes Esse conjunto de especificidades explica a grande variedade de propostas curriculares desde as mais clássicas até as mais recentes ten tativas de inovações que despontam como promissoras possibilidades cie caminhar para melhorias cada vez mais substantivas Diversidade na apresentação dos conteúdos O exemplo clássico de organização dos conteúdos é o que se constituj a partir das temporalidades Preponderante ainda na maioria das escolas brasileiras o tempo considerado em sua dimensão crono lógica conjtinua sendo a medida utilizada para explicar a trajetória da Immanidade A periodização que se impôs desde o século XIX His lória Antiga Medieval Moderna e Contemporânea está presente cm grande parte dos livros didáticos retrocedese às origens estabele cendose trajetórias homogêneas do passado ao presente e a organiza çiío dos acontecimentos é feita com base na perspectiva da evolução O iue caracteriza a organização dos conteúdos nessa perspectiva é a li nearidade e a seqüencialidade Mais recentemente encontrase uma tentativa de superação da seqüencialidade e linearidade em obras que tomam como fio condutor da exposição a chamada História integrada cm que América e Brasil figuram juntamente com povos da PréHistó i ia assim como a presença da História da África 39 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a Há propostas diferenciadas em que os conteúdos são organiza dos tendo como referências temas selecionados ou eixos temáticos es perandose maior liberdade e criatividade dos professores A organiza ção dos conteúdos e sua seleção com base em uma concepção ampliada de currículo escolar foram assumidas de forma mais sistematizada e aprofundada nas propostas já amplamente conhecidas dos Parâme tros Curriculares Nacionais PCNs Notase ainda uma via intermediária mantémse a opção pela exposição cronológica dos eventos históricos consagrados pela historio grafia mas agora intercalada ou informada por exercícios e atividades chamadas estratégias por meio dos quais os alunos são levados a perce ber todos os meandros da construção do conhecimento histórico ins tados a envolverse nas problemáticas comuns ao presente e ao passado estudado e encorajados a assumir atitudes que levam ao posicionamen to como cidadãos Aproximamse assim as preocupações com a se qüencialidade dos conteúdos e as finalidades da educação na formação de indivíduos conscientes e críticos com autonomia intelectual Por fim a organização dos conteúdos em muitos casos é assu mida de forma responsável pelos professores tendo como referência suas experiências docentes ou as orientações dos órgãos responsáveis pelas políticas educacionais dos estados e dos municípios Cuidados especiais Seja qual for a proposta apresentada há cuidados especiais que merecem ser lembrados O primeiro se refere ao envolvimento do alu no com o objeto de estudo que está sendo trabalhado Na exposição factual e linear que supõe o aluno como receptáculo de ensinamentos além dos textos expositivos e detalhados estão presentes exercícios vol tados especificamente para o teste de compreensão e fixação de conteú dos A preocupação com o desenvolvimento de competências e habili dades não faz parte dos horizontes dessas propostas pedagógicas 40 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a Já as propostas curriculares que concebem o currículo e a edu cação dentro dos padrões mais atualizados constroem a trama exposi i iva procurando envolver o aluno por meio da problematização dos te mas de sua abordagem da relação necessária com o mundo cultural tio aluno as atividades constituem o cerne do trabalho pedagógico apresentado pensado sempre do ponto de vista da construção de um conhecimento escolar significativo A preocupação não é com a quan i idade dos conteúdos a serem apresentados ou com as lacunas de con icúdo de História que ficariam por ser preenchidas de acordo com a lista de assuntos que tradicionalmente fazem parte dos conteúdos a se rem transmitidos pela escola O que está em evidência é o modo de tra balhar historicamente os temasassuntosobjetos em pauta CONCEITOS FUNDAMENTAIS PARA O liNSINO DE HISTÓRIA NA ESCOLARIDADE BÁSICA Alguns conceitos fazem parte do arcabouço que foi se consti mindo através dos tempos pela prática dos historiadores Construiu m uma lógica da História que pode ser concebida como um conjun to de procedimentos e conceitos em torno dos quais devem girar as IHcocupaçÕes dos historiadores Independentemente das mais variadas i oncepçÕes de mundo posicionamentos ideológicos ou proposições de nrdem metodológica não há como não trabalhar com esses conceitos ii pelo menos com uma parte importante deles As propostas pedagó lu as sejam elas quais forem têm um compromisso implícito com es is práticas historiográficas ao produzirem o conhecimento histórico si o lar com suas especificidades e particularidades O que diferencia as livtrsas concepções de História é a forma como esses conceitos e pro ilimentos são entendidos e trabalhados Importa tentar perceber quais são os conceitos que são impres iiulfveis para que os alunos saídos da escola básica tenham uma for iii ii10 histórica que os auxilie em sua vivência como cidadãos A títu I dc sugestão e como início de discussão propõese uma reflexão 4 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a sobre alguns conceitos considerados fundamentais e sobre os desdobra mentos contidos em sua abrangência História O objetivo primeiro do conhecimento histórico é a compreen são dos processos e dos sujeitos históricos o desvendamento das rela ções que se estabelecem entre os grupos humanos em diferentes tem pos e espaços Os historiadores estão atentos às diferentes e múltiplas possibilidades e alternativas apresentadas nas sociedades tanto nas de hoje quanto nas do passado que emergiram da ação consciente ou in consciente dos homens procuram apontar para os desdobramentos que se impuseram com o desenrolar das ações desses sujeitos A aprendizagem de metodologias apropriadas para a construção do conhecimento histórico seja no âmbito da pesquisa científica seja no do saber histórico escolar tornase um mecanismo essencial para que o aluno possa apropriarse de um olhar consciente para sua pró pria sociedade e para si mesmo Ciente de que o conhecimento é provi sório o aluno terá condições de exercitar nos procedimentos próprios da História problematização das questões propostas delimitação do objeto exame do estado da questão busca de informações levanta mento e tratamento adequado das fontes percepção dos sujeitos histó ricos envolvidos indivíduos grupos sociais estratégias de verificação e comprovação de hipóteses organização dos dados coletados refina mento dos conceitos historicidade proposta de explicação para os fe nômenos estudados elaboração da exposição redação de textos Dada a complexidade do objeto de conhecimento é imprescindível que seja incentivada a prática interdisciplinar Faz parte da construção do conhecimento histórico no âmbito dos procedimentos que lhe são próprios a ampliação do conceito de fontes históricas que podem ser trabalhadas pelos alunos documentos oficiais textos de época e atuais mapas ilustrações gravuras imagens 42 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a de heróis de histórias em quadrinhos poemas letras de música litera mra manifestos relatos de viajantes panfletos caricaturas pinturas lotos rádio televisão etc O importante é que se alerte para a necessi dade de que as fontes recebam um tratamento adequado de acordo com sua natureza É preciso deixar claro porém que não é proposta do ensino bá sico a formação de pequenos historiadores O que importa é que a or ganização dos conteúdos e a articulação das estratégias para trabalhar com eles leve em conta esses procedimentos para a produção do conhe cimento histórico Com isso evitase passar para o educando a falsa sensação de que os conhecimentos históricos existem de forma acaba da e assim são transmitidos Processo histórico Para além da descrição factual e linear a História busca explicar iuito as uniformidades e as regularidades das formações sociais quan i as rupturas e diferenças que se constituem no embate das ações hu manas Na verdade o passado humano não é uma agregação de ações siparadas mas um conjunto de comportamentos intimamente interli gados que têm uma razão de ser ainda que na maioria das vezes im perceptível para nossos olhos O processo histórico constituise dessas pi ii icas ordenadas e estruturadas de maneiras racionais São os proble mas colocados constantemente na indeterminação do social que fazem que os homens se definam pelos caminhos possíveis e desenhem i is acontecimentos que passam a ser registrados Os registros ou as evi dencias da luta dos agentes históricos são o ponto de partida para en i udermos os processos históricos Devese ressaltar igualmente que o conceito de processo histó iii it supõe que sua enunciação resulta de uma construção cognitiva dos amliosos No entanto embora os processos não existiram exatamen ii i oino estão sendo descritos eles têm uma sedimentação na realidade 43 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a social Podese dizer que o status ontológico do passado garante a com preensibilidade do processo A dimensão de elaboração de construção cognitiva nos leva a entender a possibilidade das diversas interpreta ções do passado histórico dependentes de posicionamentos teóricos e metodológicos diferenciados Assim a História concebida como processo busca aprimorar o exercício da problemalizaçao da vida social como ponto dc partida pa ra a investigação produtiva e criativa buscando identificar as relações sociais de grupos locais regionais nacionais e de outros povos perce ber as diferenças e semelhanças os conflitoscontradições e as solida riedades igualdades e desigualdades existentes nas sociedades compa rar problemáticas atuais e de outros momentos posicionarse de forma crítica no seu presente e buscar as relações possíveis com o passado Nesse quadro conceituai de processo se dimensiona a com preensão do conceito de fato histórico de acontecimento que têm sua importância como ponto referencial das relações sociais no coti diano da História no entanto o sentido pleno dos acontecimentos em sua dimensão micro se resolve quando remetido aos processos que lhes emprestam as possibilidades explicativas Enfim o fato histórico toma sentido se considerado como constitutivo dos processos históri cos e nessa escala deve ser considerado Tempo temporalidades históricas A dimensão da temporalidade é considerada uma das catego rias centrais do conhecimento histórico Não se trata de insistir nas definições dos diversos significados de tempo mas de levar o aluno a perceber as diversas temporalidades no decorrer da História e ter cla ro sua importância nas formas de organização social e seus conflitos Sendo um produto cultural forjado pelas necessidades concretas das sociedades historicamente situadas o tempo representa um conjunto complexo de vivências humanas Daí a necessidade de relativizar as di 44 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a ferentes concepções de tempo e as periodizações propostas de situar os acontecimentos históricos nos seus respectivos tempos O conceito de tempo supõe também que se estabeleçam relações entre continui dade e ruptura permanências e mudançastransformações sucessão e simultaneidade o antesagoradepois Levanos a estar atentos e fazer ver a importância de se considerarem os diversificados ritmos do tem po histórico quando o situamos na duração dos fenômenos sociais e naturais E justamente a compreensão dos fenômenos sociais na dura ção temporal que permite o exercício explicativo das periodizações que são frutos de concepções de mundo de metodologias e até mes mo de ideologias diferenciadas As considerações sobre a riqueza e complexidade do conceito de tempo são imprescindíveis para que sejam evitados os anacronis mos não tão raros nas explicações históricas O anacronismo consis te em atribuir a determinadas sociedades do passado nossos próprios sentimentos ou razões e assim interpretar suas ações ou aplicar cri térios e conceitos que foram elaborados para uma determinada épo ca em circunstâncias específicas para outras épocas com caracterís icas diferentes Sujeito histórico é Perceber a complexidade das relações sociais presentes no coti diano e na organização social mais ampla implica indagar qual o lugar que o indivíduo ocupa na trama da História e como são construídas as identidades pessoais e as sociais em dimensão temporal O sujeito histórico que se configura na interrelação complexa duradoura e c ontraditória entre as identidades sociais e as pessoais é o verdadeiro construtor da História Assim é necessário acentuar que a trama da I Iistória não é o resultado apenas da ação de figuras de destaque con sagradas pelos interesses explicativos de grupos mas sim a construção conscienteinconsciente paulatina e imperceptível de todos os agentes sociais individuais ou coletivos 45 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a Conceber a História como o resultado de sujeitos históricos implica não atribuir o desenrolar do processo como sendo ação da vontade de instituições como o estado os países a escola etc ou re sultante do jogo de categorias de análise ou conceitos como siste mas capitalismo socialismo etc Perceber que a trama histórica não se localiza nas ações individuais mas no embate das relações sociais no tempo Cultura A ampliação do conceito de cultura fruto da aproximação en tre História e Antropologia enriquece o âmbito das análises cami nhando de forma positiva para a abertura do campo científico da His tória Cultural As representações sociais dão unidade a todas as manifestações da vida quer individual quer social Cultura não é ape nas o conjunto de manifestações artísticas Envolve as formas de orga nização do trabalho da casa da família do cotidiano das pessoas dos ritos das religiões das festas etc Assim o estudo das identidades so ciais no âmbito das representações culturais adquire significado e im portância para a caracterização de grupos sociais e de povos Historicidade dos conceitos Os conceitos históricos somente podem ser entendidos na sua historicidade Isso quer dizer que os conceitos criados para explicar certas realidades históricas têm seu significado voltado para essas rea lidades não sendo possível empregálos indistintamente para toda e qualquer situação semelhante Dessa forma os conceitos quando to mados em sua acepção mais ampla não podem ser utilizados como modelos mas apenas como indicadores de expectativas analíticas Ajudamnos e facilitam o trabalho a ser realizado no processo de co nhecimento na indagação das fontes e na compreensão de realidades históricas específicas 46 H o l i e n G o n ç a l v e s B e z e r r a Registrese que é possível distinguir os conceitos na escala de sua compreensão entre aqueles que são mais abrangentes e os que se refe rem a realidades mais especificamente determinadas Quando o concei to tem uma compreensão geral que se aplica a realidades históricoso ciais semelhantes pode receber a denominação de categoria Por exemplo a categoria trabalho homem continente revolução etc Nesse sentido os conceitos ou categorias são abertos são vetores à es pera de concretizações com base na elaboração de conhecimentos espe cíficos de acordo com os procedimentos próprios da disciplina Histó ria No momento em que se atribui a essas categorias as determinações históricas e suas especificidades como trabalho assalariado trabalho servil trabalho escravo por exemplo já estamos lidando com conceitos que por sua vez poderão receber ainda mais especificações como tra balho servil na Germânia na Francônia e assim por diante a revolução socialista a revolução industrial etc Não há uma democracia consi derada em sua essência mas democracias na Grécia no século XIX a democracia liberal a socialista a atual brasileira etc Seriam então os conceitos propriamente ditos considerados como representações de um objeto ou fenômeno histórico por meio de suas características Para efeito dessa análise estamos empregando a denominação conceito na acepção mais ampla e abrangente Cidadania O conjunto de preocupações que informam o conhecimento histórico e suas relações com o ensino vivenciado na escola levam ao aprimoramento de atitudes e valores imprescindíveis para o exercício pleno da cidadania como exercício do conhecimento autônomo e crí tico valorização de si mesmo como sujeito responsável da História respeito às diferenças culturais étnicas religiosas políticas evitando qualquer tipo de discriminação busca de soluções possíveis para os problemas detectados em sua comunidade de forma individual e cole tiva atuação firme e consciente contra qualquer tipo de injustiça e 47 H i s t ó r i a n a s a l a d e a u l a mentiras sociais valorização do patrimônio sociocultural próprio e de outros povos incentivando o respeito à diversidade valorização dos di reitos conquistados pela cidadania plena aí incluídos os corresponden tes deveres sejam dos indivíduos dos grupos e dos povos na busca da consolidação da democracia CONCLUSÃO Ao desenvolver a discussão sobre algumas das questões básicas que se colocam para o ensino de História optamos por sugerir uma sé rie de considerações a respeito de dois blocos de questões os conteú dos e os conceitos Com certeza não são questões consensuais entre historiadores e professores de História Não foi intenção definir con ceitos ou sugerir os conteúdos que os alunos deverão dominar no transcorrer da escolaridade básica Mas sim a de constatar aquilo que está mais consolidado na área tanto em relação à necessidade de se rea lizarem seleções de conteúdos o que já é feito de forma concreta e diversificada na prática da organização escolar quanto em relação às considerações sobre os conceitos mais usuais na área de História A partir dessas considerações é possível iniciar um debate construtivo pa ra corrigir confirmar ampliar e sugerir outras possibilidades 48