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Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 11 SOBRE AS ORIGENS E O DESENVOLVIMENTO DO ESTADO MODERNO NO OCIDENTE Modesto Florenzano I Na Introdução à sua A ética protestante e o espírito do capitalismo Max Weber também incluiu o Estado ao lado do capitalismo e daqueles fenômenos culturais que por serem encontra diços em outros espaços e tempos não podem ser conside rados como uma criação exclusiva da Civilização Ocidental Mas Weber procurou justamente demonstrar que somente na Civilização Ocidental teve lugar o desenvolvimento de um capitalismo racional de fenômenos culturais dotados de universalidade em seu valor e signifi cado e o desen volvimento de um Estado como uma entidade política com uma Constituição racionalmente redigida um Direi to racionalmente ordenado e uma administração orientada por regras racionais as leis e administrado por funcioná rios especializados1 Este texto originalmente intitulado O Estado moderno origens componentes es senciais e evolução foi apresentado como prova de erudição no concurso de profes sor titular de História Moderna que teve lugar em junho de 2006 na FFLCHUSP 1 Citações extraídas da edição da Livraria Pioneira Editora p 1 e 4 Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 12 Dessa descrição de Weber seguese que o Estado toma do em sentido estrito como entidade política dotado de todos aqueles atributos acima lembrados não se encontra plenamente desenvolvido nem mesmo no Ocidente antes do século XVIII mas tomado em sentido lato como enti dade de poder eou dominação encontrase em muitos outros lugares e épocas Assim dirseia que para a institui ção Estado vale mais ainda aquilo que K Marx e Weber de perspectivas opostas disseram do capital e do capitalis mo em geral ou seja e respectivamente que é antediluvia no e pode ser encontrado em todas as sociedades em que existe dinheiro Marx sem esquecer F Engels diria que assim é porque todas as sociedades excluindo as chamadas sociedades pri mitivas se dividem em classes tornando o Estado necessário para permitir a exploraçãodominação de uma classe sobre outras de modo que luta de classes e Estado formam um par historicamente inseparável que somente sairá de cena conjunta e defi nitivamente com o fi m da história Sobre as sociedades sem Estado o antropólogo fran cês já falecido Pierre Clastres com base em suas pesqui sas sobre os índios guaranis da América do Sul e em sua leitura do Discurso da servidão voluntária escrito no sécu lo XVI por Etienne de la Boétie avançou em 1974 uma tese especulativa com sabor anarquista e que ao mesmo tempo faz lembrar o Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens de J J Rousseau Segundo Clastres as sociedades primitivas tanto as extintas quanto as sobreviventes teriam permanecido nessa condição por opção por terem se recusado a criar deliberadamente o Estado e tudo o que de inominável este acarreta De onde seguese que a sua invenção foi nas palavras desse antro pólogo o momento histórico do nascimento da História essa ruptura fatal que jamais deveria terse produzido o acontecimento irracional que nós modernos nomeamos Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 13 de modo semelhante o nascimento do Estado2 Se a tese de Clastres é fantasiosa o discurso de La Boétie é ingênuo não permitindo avançar no conhecimento da política e do Estado daí porque depois de um pequeno e passageiro furor causado por sua reedição furor que salvo engano fi cou restrito à França e ao Brasil o discurso de La Boétie recaiu no limbo que o acompanha desde sempre Começamos essa exposição sobre o Estado moderno citando Weber e Marx tendo em vista que as suas teorias sociais estão entre as mais abrangentes entre as que mais marcaram o pensamento e a historiografi a do século XX e entre as mais contrastantes Com efeito por um lado MarxEngels e os marxistas levados por sua visão negativa do poder instituído preocuparamse sobretudo em exami nar o caráter classista do Estado em minimizar sua autono mia com relação às classes sociais em denunciar portanto sua suposta neutralidade Aí reside sem dúvida sua grande contribuição como se pode ver nos escritos dos dois fun dadores do materialismo histórico sobre as Revoluções de 1848 na França e na Alemanha e nos trabalhos de dois mar xistas do século XX o russo Boris Porchnev sobre o abso lutismo francês e o inglês Perry Anderson sobre o absolu tismo em geral3 Mas aí reside igualmente seu ponto fraco sua subestimação das formas do Estado em particular do Estado constitucional ou de direito que os marxistas desig nam pejorativamente de Estado burguês de seu funciona mento complexo consagrando valores e práticas de civili 2 O artigo de Pierre Clastres intitulado Liberdade Mau Encontro Inominável está incluído na edição brasileira do livro de Etienne de la Boétie Discurso da servi dão voluntária a citação encontrase na p 111 3 Marx escreveu dois textos sobre a França antes e durante 1848 Luta de Classes na França e O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte Engels por sua vez escreveu sobre a Alemanha no mesmo período Revolução e ContraRevolução na Alemanha o livro do historiador russo Boris Porchnev sobre a França intitulase na edição francesa de 1972 Les soulèvements populaires en France au XVIIe siècle a edição original em russo é de 1948 e o de Perry Anderson Linhagens do Estado absolutista que é de 1974 tem tradução em português seja em Portugal seja no Brasil Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 14 zação cujo abandono não é menos que desastroso como mostraram as experiências totalitárias do século passado Nesse sentido vejase a seguinte frase do historiador mar xista inglês Christopher Hill A monarquia absolutista foi uma forma de monarquia feudal diferente da monarquia de suserania feudal que a precedera mas a classe domi nante permaneceu a mesma tal como uma república uma monarquia constitucional e uma ditadura fascista podem ser todas formas de dominação da burguesia Essa frase escrita em 1953 e reproduzida cerca de vinte anos depois e sem nenhum reparo por outro marxista P Anderson em seu livro Linhagens do Estado absolutista prestase admiravel mente à crítica segundo a qual o marxismo quando menos incorreu no pecado de não ter dado a devida importância ao que chama depreciativamente de liberdades formais jogando fora assim a criança junto com a água do banho Por outro lado Weber enfatizando justamente a dimensão institucional do Estado as formas e modalida des do poder instituído e de seus mecanismos de buro cratização deixounos ao contrário do marxismo uma elaborada teoria do Estado em particular e do poder em geral contribuindo como nenhum outro teórico para o avanço da ciência política no século passado daí por que Norberto Bobbio o tratou como o último grande clássico do pensamento político Weber contudo não obstante seu esforço para construir uma teoria do Estado a mais objetiva possível não deixou nunca de cultuar valores políticos que privilegiaram a unidade estatal nacional a consciência daquela unidade coletiva que é o povo ou a nação Como se pode ver pela seguinte afi rmação extra ída de uma sua aula inaugural proferida em 1895 e inti tulada Der Nationalstaat und die Volkswirtschaftspolitik O Estado nacional e a economia política Aos nossos descendentes não devemos legar paz e felicidade huma na mas a luta eterna pela preservação e educação de nos Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 15 so caráter nacional Os interesses políticos do poder da nação são quando estão envolvidos os interesses fi nais e decisivos 4 Tendo em vista essa valorização do Estado nacional não seria errado considerar Weber como herdeiro e como continuador do fi lósofo G W F Hegel e do historiador L von Ranke espécies de pais espirituais de toda a moderna historiografi a liberalconservadora alemã que glorifi ca o Estado concebendoo como manifestação do universal racional contendo nas palavras de Hegel em si e para si a totalidade ética a realização da liberdade e como manifestação daquilo que Ranke defi niu como a essência espiritual própria de cada Estado nacional Como bem observou Nicola Matteucci em Lo Stato moderno foi somen te no século XIX por meio da cultura alemã que o termo Estado adquiriu a sua centralidade Antes de Hegel nas palavras de Matteucci quando se quer indicar o momen to vertical do poder falase de governo de rei de assem bléia sempre entendidos porém como estruturas a serviço da comunidade da republica Também Hobbes mesmo que teórico do absolutismo não utiliza o termo State pre ferindo o de CommonWealth Até o fi nal do século XVIII não há um clássico do pensamento político que traga no frontispício o termo Estado o qual falta como verbete também na Enciclopédia de Diderot e dAlembert5 II Como quer que seja a questão da origem e do desenvolvi mento do Estado moderno na Europa Ocidental foi tratada pela historiografi a do século XIX e da primeira metade do século XX de tal maneira que acabou por se confundir por um lado com a questão da formação do sentimento nacional 4 A citação foi extraída da Introdução de German history organizado por Hans Kohn p 17 5 Nicola Matteucci p 26 e 27 Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 16 e da nacionalidade e por outro lado simultaneamente com a questão do próprio advento da modernidade aparecendo o Estado como portador e realizador de ambas6 Por sua vez como esse Estado nacional em praticamente todos os lugares onde se confi gurou plenamente o fez sob forma monárquica e absolutista monarquia e absolutismo remetem na ponta ascendente de sua trajetória histórica à sua relação com o feudalismo e o fi m da Idade Média e na ponta descendente à sua relação com o capitalismo e o inicio da Idade Contem porânea ou fi m da Primeira Idade Moderna Por tudo isso não surpreende a ausência de consenso entre os historiadores sobre o Estado moderno ou o que dá no mesmo sobre a monarquia nacional absolutista inclusive na historiografi a atual sobretudo quando se trata da Euro pa em geral e não de um país em particular Essa ausência de consenso se manifesta com relação quer ao momento do aparecimento do Estado moderno quer ao nome que a ele se deve dar quer ainda ao porquê do seu aparecimento Sobre o momento do surgimento do Estado moderno a maioria dos historiadores atuais considera que isso ocorreu em meados do século XVI dividindose a minoria restante entre os que retardam para o XVII a sua ocorrência e os que a antecipam para o século XV atribuindo aos Estados italianos do quattrocento o mérito da primazia7 Com relação ao nome 6 Na Introdução ao primeiro volume The Renaissance 14931520 da New Cam bridge modern history 1964 o historiador Denys Hay afi rma Por volta de 1900 a opinião comum sobre a fratura entre o mundo moderno e o medieval se havia transformado em dogma pedagógico férreo e em todos os países ocidentais os historiadores haviam encontrado uma data cômoda à qual podiam adaptar as ca tegorias historiográfi cas aceitas universalmente Para a França a invasão da Itália 1494 para a Espanha a união das coroas 1479 para a Inglaterra a instauração dos Tudor 1485 para a Alemanha quando Carlos V assume o Império 1519 constituíram linhas de demarcação plausíveis e aceitas sem difi culdade 7 Que fi que claro contudo que nem todos dentro dessa minoria de historiadores atuais que antecipam o surgimento do Estado para o século XV consideram que o seu aparecimento tenha se dado primeiramente na Itália Como se pode ver pelo livro LÉtat Moderne Genèse bilans et perspectives Actes du Colloque tenu au CNRS à Paris les 1920 septembre 1989 org por Jean Philippe Genet no qual afi rmase na página Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 17 a ser dado a esse tipo de Estado destaquese o fato de que enquanto alguns historiadores falam simplesmente em Esta do ou monarquia moderna vista já como absolutista outros como é o caso sobretudo dos historiadores alemães e sobre tudo a partir de Otto von Gierke e Weber falam em Ständesta at isto é em Estados ou monarquias de estados que também podemos traduzir por Estado corporativo ou de ordens que teria sido dominante na Europa entre os séculos XIV e XVI quando os reis governam com o apoio mas também com a resistência desses órgãos representativos das diversas ordens ou camadas sociais do reino cuja origem é obscura e cujos nomes variam de um lugar para o outro Cortes em Portu gal e na Espanha Estados Gerais na França Parlamento na Inglaterra etc Dissemos apoio e resistência tendo em vista que como bem lembrou Bobbio o contraste entre os esta dos e o príncipe especialmente para estabelecer quem tem o direito de imposição fi scal constitui grande parte da história e do desenvolvimento do Estado moderno8 362 que o Estado moderno nasceu entre 1280 e 1360 quando confrontados com guerras incessantes os reis e os príncipes do Ocidente mas não se afi rma em nenhum lugar que isso tenha acontecido na Itália Também em dois outros livros franceses mas não de historiadores que tratam do aparecimento do Estado não se reconhece à Península italiana nenhuma primazia nesse sentido Penser lÉtat de Philippe Braud e Les deux États Pouvoir et société em Occident et em terre dIslam de Bertrand Badie Por outro lado o historiador Alterto Tenenti em Stato unidea una lógica Dal comune italiano allassolutismo francese embora enfatize o estado de maturidade e de complexa articulação da linguagem e de consciência política p 92 no quattrocento italiano e no caso francês nesse mesmo século uma reali dade qualifi cável como Estado moderno não pode ser facilmente encontrada na França do fi nal do quattrocento p 236 não esposa a tese da primazia italiana 8 Em suma confi gurandose como uma espécie de forma intermediária entre o Estado feudal e o Estado absoluto o Ständestaat na precisa formulação de Bobbio distinguese do primeiro por uma gradual institucionalização dos contrapoderes e também pela transformação das relações de pessoa a pessoa próprias do sistema feudal em relações de instituições de um lado as assembléias de estamento de outro o rei com o seu aparato de funcionários que onde conseguem afi rmarse dão origem ao Estado burocrático característico da monarquia absoluta Distin guese do segundo pela presença de uma contraposição de poderes em contínuo confl ito entre si que o advento da monarquia absoluta tende a suprimir Nor berto Bobbio 1987 p 114115 Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 18 Contudo é sobre o porquê do aparecimento do Esta do absolutista que na historiografi a dos últimos cinqüen ta anos prosperaram as posições mais contrastantes com interpretações que atribuem um papel determinante ou à guerra ou à religião ou ainda à luta de classes ou por últi mo em uma espécie de volta completa à própria política toutcourt 9 Na historiografi a do Estado moderno dos últi mos cinqüenta anos um lugar de destaque merece ser dado a dois artigos o primeiro escrito a duas mãos pelo histo riador francês Roland Mousnier e pelo historiador alemão Fritz Hartung e intitulado Quelques problemes concer nant la monarchie absolue e o segundo pelo historiador italiano Federico Chabod intitulado Y atil un État de la Renaissance10 Apresentados respectivamente em 1955 e 1956 esses dois artigos são parte da profunda renovação que nessa déca da se fez sentir não apenas no terreno do Estado mas em todos os demais grandes temas da chamada história moder na Com efeito é na década de 1950 que se assiste a muitas e signifi cativas novidades nesse canteiro Para lembrar as mais conspícuas a polêmica sobre a transição feudalismocapita lismo a polêmica sobre a crise geral do século XVII o início 9 Como podemos constatar pelas afi rmações de J Vicens Vives em texto de 1960 O Estado do Renascimento surge no Ocidente Europeu como conseqüência do confl ito internacional que opunha as monarquias umas às outras p 209 De G Oistreich em texto de 1969 A formação e expansão do absolutismo resultou das guerras confessionais européias ou pelo menos desenvolveuse no ambiente por elas criado p 191 De P Anderson em texto de 1976 As monarquias da Renascença foram antes e acima de tudo instrumentos modernizados para a ma nutenção da dominação da nobreza sobre as massas rurais E de N Matteucci em texto de 1997 Se o Estado é um fenômeno eminentemente político políticas são as causas do seu desenvolvimento ele cresce não por ser dominado por uma ratio interna ou por ser guiado por um projeto consciente de uma classe e sim para dar respostas precisas a problemas políticos precisos 10 O artigo de Mousnier e Hartung foi originariamente apresentado no X Congresso internacional de História em Florença em 1955 e publicado nas Relazioni do mes mo ano p 355 e o artigo de Chabod no Colóquio sobre o Renascimento havido em Paris em 1956 na Sorbonne e reproduzido em Escritos sobre el Renacimiento Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 19 do revisionismo tanto na historiografi a da Revolução ingle sa de 1640 quanto da francesa de 1789 o aparecimento de livros extraordinários que renovaram profundamente nos so conhecimento do Renascimento e do humanismo como o do historiador da arte Erwin Panofsky e sobretudo o do historiador do humanismo fl orentino Hans Baron que irá servir de fundamento para a constituição de um novo para digma interpretativo hoje em plena moda chamado huma nismo cívico ou republicanismo clássico11 Coincidentemente nessa mesma década de 1950 O Anti go Regime e a Revolução de Aléxis de Tocqueville e A Cultura do Renascimento na Itália de Jacob Burckhardt chegavam ao centenário aliás o livro de Tocqueville comemora agora o sesquicentenário e o de Burckhardt o fará daqui a quatro anos É impossível exagerar a importância dessas duas obras primas sobretudo em se tratando da história moderna como um todo Pois basta lembrar que se deve a esses dois livros a constituição dos dois objetos históricos que emolduram a his tória moderna ou seja o Renascimento e o Antigo Regime Voltemos ao artigo de Mousnier e Hartung que acabou por se tornar uma espécie de referência obrigatória para todos os estudiosos do tema do absolutismo Nesse texto os dois autores além de considerar vários fatores para a emer gência desse tipo de monarquia com destaque para a luta de classes também chamaram a atenção para o fato que em teoria a monarquia era absoluta desde a Idade Média e para o fato que quando ela se tornou absoluta também na prática a partir da Idade Moderna seu poder efetivo e seu alcance foram limitados tanto pelo respeito aos costumes fundamen tais do reino quanto pela precariedade dos meios técnicos existentes à sua disposição 11 O livro de Erwin Panofsky Renascimento e renascimentos na arte ocidental tem prefá cio do autor datado de 1957 mas na edição portuguesa da Editorial Presença de Lisboa consta como data do copyright o ano de 1960 o livro de Hans Baron The crisis of the early Italian Renaissance é de 1955 Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 20 Esses dois historiadores à luz da experiência histórica pro porcionada pelos fenômenos políticos da primeira metade do século XX com o formidável aumento do poder estatal tanto sob forma constitucional quanto ditatorial haviamse dado conta de que era chegada a hora de nuançar a visão transmi tida pelo século XIX muito marcada pelo liberalismo de um absolutismo monárquico como um poder despótico ilimitado é preciso lembrar que o nome absolutismo tal como ocorreu com o nome mercantilismo é posterior ao próprio fenôme no tendo sido uma criação de seus críticos liberais Com isso podese dizer que os estudiosos do absolutismo ao longo de boa parte do século XX acabaram por explorar os dois lados o lado forte e o fraco dessa forma histórica de poder que se desenvolveu na Europa na Idade Moderna Entre os que deram ênfase ao aspecto forte e inovador do absolutismo ao seu poder disciplinador mas enfatizan do seu papel civilizador portanto positivo é obrigatório lembrar o nome do sociólogo Norbert Elias com o seu livro extraordinário e pioneiro O processo civilizador cuja primeira edição é de 1939 assim como de um ponto de vista crítico negativo é obrigatório lembrar o nome do fi lósofo Michel Foucault com seus trabalhos igualmente pioneiros de des vendamento e denúncia do poder sobre todos os corpos sociais e individuais E entre os que dão ênfase ao aspec to limitado e não moderno do absolutismo menciono um livro recentíssimo de vários autores Lo Stato moderno in Euro pa no qual se afi rma que a realidade institucional do Esta do absolutista continua a compartilhar ao longo de todo o curso do antigo regime pelo menos dois traços profun dos da confi guração medieval do poder a saber o caráter compósito e pluralista dos corpos políticos e a préexistên cia do direito com relação ao poder12 12 Maurizio Fioravanti é o organizador do volume Lo Stato moderno in Europa Istitu zioni e diritto a citação foi retirada do capítulo 3 Giustizia e amministrazione de Luca Mannori e Bernardo Sordi p 6364 Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 21 III No capítulo primeiro de seu célebre livro A cultura do Renas cimento na Itália capítulo intitulado signifi cativamente de O Estado como obra de arte J Burckhardt deixounos uma descrição insuperável do cenário político italiano renascen tista quando a olhos vistos repúblicas e principados passa vam por signifi cativas modifi cações alguns aumentando de tamanho outros encolhendo e até mesmo desaparecendo quando se inovava na arte de governar e desenvolviamse instituições estatais muito diferentes das existentes no res tante da Europa na mesma época Para expressar em uma outra fórmula a transformação em curso na esfera estatal dirseia que na Itália primeiro e na Europa Ocidental logo a seguir o Estado estava deixando de ser um poder orgânico tipicamente feudal para começar a ser um podermáquina tipicamente moderno Não precisamos citar diretamente do livro de Burck hardt nenhuma das várias passagens que podem ser toma das como exemplifi cação do que vem a ser o Estado como obra de arte porque o artigo de Chabod há pouco lem brado começa justamente com o seguinte parágrafo Faz quase um século em seu Kultur der Renaissance 1860 Jacob Burckhardt falava do Estado italiano do Renasci mento como de um Estado já moderno e o batizava o Estado obra de arte Vale dizer o Estado criado pela von tade fria precisa e clarividente de um príncipe que tal como um artista cria sua obra calculando todos os meios para que dê bons resultados13 Notese que o artigo de Chabod na versão italiana publicada em 1956 um ano depois da francesa saiu com o título signifi cativo de Alle origini dello Stato moderno explicitando assim sua tese que reiterava e desenvolvia a famosa e histórica inter pretação de Burckhardt 13 Chabod p 523 Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 22 De acordo com Chabod na Itália do quattrocento e início do cinquecento as inovações que ocorrem na arte da guerra nos procedimentos burocráticos e nas atividades diplomáti cas foram de tal monta que delas surgiu uma nova estrutu ra estatal Certamente que podemos encontrar em pratica mente todos os Estados da Idade Média exércitos funcioná rios e atividades diplomáticas mas em nenhum deles esses três componentes ou aparatos do poder estatal apresentam as dimensões quantitativas e técnicoformais a consistência e o caráter permanente e profi ssional digamos assim que irão adquirir a seguir Vejamos para fi car em apenas um exemplo o que se passou com a diplomacia permanente Seu advento nas palavras de Chabod foi equivalente a uma profunda muta ção na estrutura interna do Estado e na sua maneira de atu ar Comparese nesse sentido a frase do famoso ministro de Luís XIII Richelieu negociar sem pausa aberta e secre tamente em todo lugar que pressupõe uma diplomacia permanente com a seguinte frase do rei Luís XI proferida aproximadamente um século e meio antes ao ser informa do pessoalmente por Alberico Maletta que ele Maletta fora enviado como embaixador por Francesco Sforza de Milão para que permanecesse junto à corte francesa por tempo indeterminado Quero que escreva ao seu Senhor que o costume na França não é similar ao da Itália porque entre nós manter continuamente um embaixador parece uma coi sa suspeita e não de todo agradável ao passo que entre vós é o contrário Assim escrevalhe que não é necessário nem para ele nem para mim que mande outros agora e quando acontecer alguma coisa que mande a Manuelo tratase de Emanuele de Jacopo ou outrem como lhe aprouver mas que venham e voltem e não permaneçam aqui parados14 Il 14 A frase de Richelieu está citada no artigo de Chabod e o documento que contém o pronunciamento do rei Luís XI foi retirado de Giuseppe Galasso p 8 Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 23 va sans dire que essa declaração serve para provar no século XV tanto a existência de uma diplomacia permanente na Itália quanto a sua ausência na França Tendo em vista como se sabe desde Hobbes que o Esta do funciona como uma máquina e se aceitamos a idéia de que ele é algo externo ao tecido social as inovações que ocor rem nos seus aparatos e na técnica de governar podem por tanto ser facilmente imitadas e importadas Daí a existência nas palavras de Matteucci desse processo de difusão das ino vações dos países mais avançados no desenvolvimento políti co para os menos avançados E quando Matteucci sustenta que os paradigmas ou modelos são a Inglaterra e a França é o caso de acrescentarmos que antes desses dois países se tornarem paradigmas também os principais Estados da Itália e até mesmo o da Espanha exerceram esse papel Como mostrou o historiador inglês John Elliott em seu pequeno mas extraordinário livro A Europa Dividida 1559 1598 ao afi rmar De todas as monarquias européias a da Espanha desenvolvera a monarquia governamental mais ela borada de meados do século XVI Foi aparentemente depois de um dos secretários de Henrique II rei de França ter observado os seus colegas espanhóis em funções durante as negociações de CateauCambrésis 1559 que o título de secretário de Estado começou a ser usado em França Mas em geral dirseia que problemas do mesmo tipo conduziam os Estados da Europa ocidental a soluções semelhantes e que mais não era preciso do que uma rápida olhadela por sobre o ombro ao que se fazia em outros locais15 Mas já Burckhardt um século antes de Elliott ao tra tar do envolvimento militar da Espanha e da França na Península itálica observava Ambas haviam começado a igualarse aos Estados italianos centralizados e mesmo a imitálos mas em proporções colossais E ao descrever 15 J Elliott p 5960 Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 24 esses Estados italianos Burckhardt destacava e até mesmo exaltava os de Veneza e de Florença por seu dinamismo econômico e riqueza por suas sofi sticadas culturas e regi mes políticos republicanos altamente complexos e con trastantes entre si e dos quais tanto os cidadãos venezianos quanto os fl orentinos tanto se orgulhavam Sobre Veneza com sua estabilidade política a mais permanente e longe va jamais alcançada por um Estado no Ocidente em todos os tempos daí o apelido de la Sereníssima e o chamado mito di Venezia Burckhardt observou que se por um lado foi a primeira a apresentar por completo uma porção sig nifi cativa do moderno aparelho estatal por outro revela va um certo atraso no plano cultural E sobre Florença verdadeiro laboratório político onde todas as constituições foram experimentadas ele afi rmou A mais elevada cons ciência política a maior riqueza em modalidade de desen volvimento humano encontramse reunidas na história de Florença que nesse sentido por certo merece o título de primeiro Estado moderno do mundo16 Dentre os autores venezianos e fl orentinos da época do Renascimento que trataram do passado de suas respectivas repúblicas enfatizando a estabilidade política de uma e a instabilidade de outra um lugar inigualável é ocupado por Maquiavel com sua História de Florença publicada em 1532 e por Gasparo Contarini com seu Dos magistrados e da República dos vênetos De Magistratibus et Republica Venetorum publicado em 1543 Como se pode ver pelas seguintes passagens de uma e outra obra e se jamais de república alguma as divisões foram notáveis as de Florença foram notabilíssimas porque 16 Do livro de Burckhardt há três edições em português uma de Portugal da Edi torial Presença Lisboa e duas do Brasil uma da Universidade de Brasília e outra da Cia das Letras as citações foram extraídas desta última edição de 1991 Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 25 a maior parte das outras repúblicas das quais se teve alguma notícia contentouse com uma divisão com a qual segundo os incidentes ora melhoraram ora arruinaram suas cidades mas Florença não contente com uma teve muitas em Florença de início dividiramse os nobres depois os nobres e o povo e por último o povo e a plebe e muitas vezes ocorreu que uma dessas partes que se tornara superior dividiuse em duas delas nasceram tantas mortes tantos exílios tantas destruições de famílias quantas jamais nasceram em alguma cidade de que se tenha memória E verdadeiramente segundo juízo meu parece que nenhum outro exemplo demonstre tanto a pujança de nossa cidade quanto o demonstram essas divisões que teriam tido força para anular qualquer grande e potente cidade17 Houve em Atenas Lacedemônia e Roma em diversas épocas diversos homens excepcionalmente virtuosos de méritos excelentes e de uma piedade singular para com as suas respectivas pátrias mas em tão pequeno número que estando dominados pela multidão não foram capazes de bem aproveitar seus talentos Mas nossos ancestrais dos quais recebemos uma república tão fl orescente uniram se todos num comum desejo de estabilidade de honrar e engrandecer seu país sem nenhuma consideração para com a sua glória ou interesse privado Com esta virtude de espírito superior nossos antepassados criaram e instalaram esta república na memória humana quem quiser compará la com as mais nobres repúblicas antigas difi cilmente encontrará uma que seja de igual valor ouso mesmo afi rmar ao contrário que nos discursos desses grandes fi lósofos da Antiguidade que conceberam e forjaram repúblicas segundo os desejos do espírito não se encontra nenhuma tão bem concebida e organizada18 17 História de Florença p 1920 18 A citação do livro de Contarini foi extraída de J G A Pocock p 325 Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 26 Os dois textos além de formar um contraponto perfei to servem de desmentido a quem queira deduzir da leitura de Maquiavel que sem luta de classes e confl ito político uma república não pode atingir glória e grandeza e da lei tura de Contarini o inverso isto é que somente com esta bilidade social e harmonia política uma república atinge glória e grandeza Como quer que seja o fato é que a Itália era na época do Renascimento na feliz expressão de um estudioso atual não uma nação mas uma nação de nações Uma nação de nações que na segunda metade do quattrocento vivenciou uma espécie de pioneiro equilíbrio de poder entre os prin cipais Estados Pois entre todos eles não havia nenhum que pudesse levar a cabo um processo de unifi cação política da Península itálica Não havia nenhum com uma formação social semelhante àquela que existia nos outros países da Europa e que permitiu o aparecimento de uma monarquia absoluta de um Estado resultante de uma articulação entre nobreza fundiária e monarquia dinástica cuja autoridade agia no ápice da pirâmide de poder mas não na base na estrutura dos direitos senhoriais Havia dois Estados da Península com semelhantes carac terísticas o Reino de Nápoles e o Ducado piemontês Mas o primeiro já era velho sem ter sido jovem digamos assim isto é destituído de dinamismo interno e o segundo do qual sairá a unifi cação do século XIX apenas começará a existir como um Estado efetivamente independente a partir de 1559 ou seja quando a Itália já havia caído sob domínio estrangeiro Por sua vez a Igreja de Roma que antes da eclo são da Reforma parecia constituir de acordo com Burckhar dt uma espécie anômala de Estado absoluto era de acordo com o que Maquiavel afi rma nos Discorsi sulla prima deca di Tito Livio fraca para poder realizar tal tarefa mas sufi cien temente forte para impedir que outrem na Itália a levasse a cabo Dos três Estados restantes importantes Milão Veneza Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 27 e Florença nenhum mesmo quando dispôs de força expan siva pôde eou desejou ir além de um aumento territorial limitado e da subjugação de seus rivais mais próximos Se até mesmo Cavour e o Piemonte em pleno século XIX que é dominado pela questão nacional e pelo naciona lismo somente concebiam e pretendiam a unifi cação até o centro da Península pelo menos até que Garibaldi criando um fato consumado não os forçasse a incluir todo o sul o que dizer dos estadistas e Estados italianos do Renascimento Como imaginar que até mesmo os humanistas cívicos que como Maquiavel faziam apelo a um príncipe que libertasse a Itália dos bárbaros do norte pudessem conceber e aceitar a península itálica constituída por um único Estado Estamos como se vê diante da importante questão de saber se nessa época na Itália em particular e na Europa em geral já existe um patriotismo ou sentimento nacional como em geral acreditava a historiografi a do século XIX e das pri meiras décadas do XX com algumas notáveis exceções A res posta evidentemente é não pois sustentar o contrário é cair em um anacronismo ingênuo como foi o caso do historiador Mousnier acima lembrado ao falar de um forte patriotismo francês nessa época no seu conhecido volume Os séculos XVI e XVII da coleção História Geral das Civilizações Sobre os humanistas europeus sobretudo franceses e alemães aqui diremos apenas que se eles também parecem fazer apelo a um patriotismo ou sentimento nacional cons tituem como Chabod bem viu vozes isoladas as quais na ausência de um contexto favorável não podiam gerar ener gia e movimento ideológico porque a verdade é que no século XVI o único sentimento ou força ideológica capaz de mobilizar os homens e as mulheres de todas as classes era a religião Tanto é assim que nos dois primeiros países em que de fato patriotismo e sentimento nacional emer gem identifi cados Inglaterra e Holanda foi a religião que tornou isso possível Registrese que foi entre os resistentes Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 28 holandeses ao domínio espanhol na segunda metade do século XVI que o termo patriota passou a ter pela primeira vez o sentido político moderno que é o atual Voltemos à Itália onde existia sem dúvida um forte e ardente patriotismo mas um patriotismo de caráter parti cularista e municipalista não nacional O que signifi ca que quando Maquiavel e outros humanistas falavam em Itália faziamno com um espírito ou sentido retóricocultural que não implicava nenhuma unidade política Compreendere mos melhor esse sentimento se o compararmos não com o presente como fez a historiografi a do século XIX que nele quis ver anacronicamente uma primeira manifestação da nacionalidade italiana mas se o compararmos com o passa do mais precisamente com a Grécia antiga Pois assim como um cidadão de Atenas sentiase ao mesmo tempo um patriota ateniense e um grego também um cidadão de Florença sen tiase ao mesmo tempo um patriota fl orentino e um italiano É preciso insistir no fato de que quando Maquia vel afi rma no último capítulo de O Príncipe que a Itália anseia por um príncipe que a liberte do domínio estran geiro isso não signifi ca que ele está advogando por uma unidade política da Itália mas simplesmente por uma Itália concebida como aquilo que os gregos designavam uma koinonía ou seja uma comunidade de póleis19 O mes mo se pode dizer de Francesco Guicciardini compatriota de Maquiavel um pouco mais jovem mas seu conhecido e como ele político e historiador Em sua Storia dItalia 19 E quando o mesmo Maquiavel diz em uma carta amar a sua cidade mais do que a própria alma e na sua História de Florença que os cidadãos fl orentinos ao pega rem em armas contra o Papa preferiram a grandeza da cidade à salvação de suas almas está apenas dizendo a verdade para escândalo dos cristãos preocupados com a salvação de suas almas e admiração de estudiosos como Weber Ou seja Ma quiavel está dizendo que o amor à pátria deve estar acima de todas as coisas e que para o bem do Estado fl orentino vale tudo inclusive aliarse aos estrangeiros para lutar contra a rival Veneza a quem devotava um ódio quase tão intenso quanto o seu amor por Florença e contra o Papa mesmo incorrendo em excomunhão Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 29 Guicciardini faz a seguinte afi rmação em forma de per gunta Quem não sabe o que é a Itália E de tudo o que passa a dizer a seguir não há nada que indique a presen ça de qualquer coisa que cheire a um sentimento nacio nal Assim se entre os intelectuais italianos de todos os tempos intelectuais que o historiador Giuliano Procac ci defi niu como esses eternos protagonistas da história italiana os nomes de Maquiavel e Guicciardini ocupam um lugar inigualável isto não nos deve fazer esquecer que eles foram patriotas fl orentinos em primeiro lugar e antes de tudo o mais20 Se os Estados da Europa do Renascimento quiseram e puderam imitar ou copiar os Estados italianos o inverso não poderia absolutamente ter acontecido uma vez que o dina mismo e a força das monarquias européias decorriam como já mencionamos de seu tecido social e um tecido social não podia então como não pode hoje notese ser copiado nem imitado De resto e objetivamente se nenhum dentre todos os Estados italianos podia sequer sonhar em se lançar à con quista de qualquer território ao norte dos Alpes entre os demais Estados europeus havia dois que ambicionavam con quistar a Península itálica e dispunham de força para fazelo a Espanha e a França Iniciadas em 1494 as guerras da Itália opondo os exércitos espanhóis aos franceses antes mesmo de terminarem em 1559 com os Tratados de Cateau Cam bresis marcaram já na década de 1520 o fi m da autonomia política dos Estados italianos com poucas exceções sendo a República de Veneza a mais notável e o início da secular dominação espanhola primeiro e austríaca depois 20 Sobre a história da Itália Antonio Gramsci observou É já difícil fazer o senso comum entender que uma Itália como aquela que se formou em 1870 jamais exis tira antes e não podia existir o senso comum é levado a crer que aquilo que hoje existe sempre existiu e que a Itália sempre existiu como nação unitária mas foi sufocada por forças estrangeiras etc O Risorgimento Notas sobre a história da Itália p 246 Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 30 IV Uma espécie de contraprova de que na Itália o Estado moderno apenas começou mas não se efetivou terminando o processo nas palavras de P Anderson em um beco sem saída em um impasse histórico pode ser colhida no plano lingüísticoconceitual na maneira como os pensadores políti cos peninsulares usaram o termo Estado Por um lado foram eles os primeiros a empregar a palavra em sentido moder no isto é da maneira que nós o fazemos como por exem plo Maquiavel na abertura de O Príncipe Todos os Estados todos os domínios que tem havido e que há sobre os homens foram e são repúblicas ou principados ou quando no capí tulo 9 diz que o Estado tem necessidade de seus cidadãos Mas por outro lado o próprio Maquiavel considerado consensualmente como o pensador político mais vigoroso e agudo do Renascimento italiano também usa o termo Esta do de maneira que revela a não distinção entre governo e Estado ao se referir por exemplo a um príncipe que dese ja manter o Estado o que equivale a dizer a um príncipe que conserva sua posição e seu elenco de poderes como bem notou Skinner em seu conhecido livro As fundações do pensamento político moderno De acordo com Skinner a idéia mais abstrata tipicamente moderna do Estado enquanto uma forma de poder público separada do governante e dos governados constituindo a suprema autoridade política no interior de um território defi nido21 esta idéia tem que esperar por mais de meio século e por outros contextos his tóricos o da França na segunda metade do século XVI e o da Inglaterra na primeira metade do seguinte Em outros termos tem que esperar pelas obras de Jean Bodin e Tho mas Hobbes que juntamente com Maquiavel constituem a tríade fundadora tanto do conceito de Estado moderno em particular quanto do pensamento político moderno em 21 Quentin Skinner p 621 Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 31 geral Pois não seria exagero dizer que dos escritos desses três pensadores saíram as matrizes dos três grandes discur sos políticos que dominaram todo o período da história moderna no Ocidente o discurso do próprio absolutismo que é o do establishment e os discursos do individualismo possessivo e do republicanismo clássico ou humanismo cívi co que são de oposição Atentemos para os respectivos momentos e contextos em que surgem as obras daqueles dois pensadores Os seis livros da República de Bodin são de 1576 quando a Fran ça está mergulhada nas guerras de religião e o Leviatã de Hobbes de 1651 quando a Inglaterra acaba de sair da guerra civil É consenso entre os estudiosos do pensamen to político que no livro de Bodin aparece formulada pela primeira vez e da maneira mais completa a teoria do absolutismo monárquico fundamentada no conceito de soberania que ele foi o primeiro a elaborar ou seja que a autoridade tem de ser absoluta22 e que no livro de Hobbes temos isso também e muito mais do que isso ou seja uma teoria radicalmente nova da sociedade e da polí tica o chamado contratualismo ou jusnaturalismo Tendo em vista esses respectivos panos de fundo não surpreen de que tanto Bodin quanto Hobbes fossem visceralmente contrários a qualquer tipo de governo misto o qual impli ca necessariamente aquilo que para eles constituía o pior dos males a divisão da soberania Na França as guerras de religião de imediato inter romperam o desenvolvimento do absolutismo e até mesmo ameaçaram a própria sobrevivência da unidade política do país mas logo a seguir facilitaram a sua consolidação tor 22 A forma e o estado de uma república dependem dos que têm a soberania nessa única frase de Bodin do livro IV de Os seis livros da Republica vêse que o autor continua a usar estado com um sentido não moderno utilizando o termo república para indicar o Estado ao mesmo tempo em que apresenta o moderno conceito de soberania Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 32 nandoo o mais acabado e completo de todos uma espécie de paradigma de modelo a ser copiado e imitado Com efei to nenhuma outra monarquia européia desenvolveu como a francesa os ingredientes essenciais do poder absoluto uma ampla e ilimitada autonomia fi nanceira fundada na liberda de de tributar os camponeses e de vender cargos um pode roso exército permanente o maior da Europa em número de efetivos militares uma burocracia também a maior da Europa e a mais complexa a ponto de ter dado origem ain da que temporariamente a uma nova e distinta classe social a nobreza de toga que ao se tornar vitalícia e hereditária obrigou o Estado na época de Richelieu a criar como bem demonstrou Tocqueville em O antigo regime e a revolução uma outra burocracia informal e cujos funcionários podiam ser demitidos ad nutum vale dizer à simples ordem de seus res pectivos superiores e last but not least uma Igreja nacional que tendo em vista a experiência das guerras religiosas não poderia admitir ou tolerar outras confi ssões daí a fórmula une foy une loy un roy daí também a revogação por Luís XIV do Edito de Nantes em 1685 Já na Inglaterra a questão religiosa interferiu de manei ra inversa à da França na evolução do Estado Foi o desen cadeamento da Reforma por Henrique VIII nos primeiros anos da década de 1530 com a criação da Igreja Anglicana que propiciou a este rei completar a obra de consolidação do poder monárquico Mas a maneira como esta obra foi iniciada por Henrique VIII e continuada por Elisabeth I os dois reis mais absolutos e também no caso sobretudo da segunda entre os mais populares de toda a monarquia inglesa ou seja com o apoio e fortalecimento do Parlamen to a quem reconheceram a iniciativa e a última palavra em matéria de legislação fi scal e religiosa e com o apoio e for talecimento da gentry a quem entregaram a incumbência de exercer sem remuneração o poder local levou ao parado xo que consistiu na criação entre todos os países europeus Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 33 do Estado mais centralizado no vértice do poder e do mais descentralizado na sua base Em outros termos na Ingla terra como agudamente assinalou o historiador Lawrence Stone em As causas da Revolução Inglesa 15291642 o desen volvimento do poder estatal sob a dinastia Tudor não se rea lizou como em geral ocorreu no continente às expensas do poder local mas caminhou pari passo com este Na Ingla terra como mais tarde nos Estados Unidos a centralização política não levou como ocorreu na França à centralização administrativa De sorte que em 1603 quando a dinastia Stuart assu miu o trono da Inglaterra deparouse com um Estado absolutista manquée pois carecia parcial ou totalmente daqueles aparatos de poder sem os quais o absolutismo não pode se efetivar autonomia fi nanceira burocracia permanente remunerada pelo Estado e dele dependente exército permanente e Igreja nacional A tentativa de Car los I de implementar entre 1629 e 1640 com sua thorough system precisamente todos esses instrumentos do Estado absoluto como haviam conseguido ou estavam conse guindo as monarquias do continente terminou em um desastre com uma espécie de greve geral dos contribuin tes com o país ocupado por um exército escocês e com os puritanos em revolta Não precisamos entrar aqui na narrativa dos aconteci mentos que constituem a Revolução inglesa de 1640 e seus desdobramentos fundamentais isto é Guerra Civil Experi ência Republicana Restauração e fi nalmente encerrando todo o processo Revolução Gloriosa de 16881689 Basta para o nosso argumento salientar que quando o confl ito políticoreligioso entre o rei e o parlamento explodiu o Estado inglês já estava plenamente constituído bem como estava plenamente cristalizada uma identidade um sen timento nacional inglês ao contrário do que ocorreu na França quando o país mergulhou nas guerras de religião Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 34 Por outro lado todo esse processo histórico inglês que culmina na criação de uma monarquia limitada ou consti tucional se explicado à maneira tocquevilliana implicaria sustentar que assim como na França a Revolução de 1789 completou a obra de centralização do poder iniciada pelo Antigo Regime marcando pois não uma ruptura mas uma continuidade com o passado também na Inglaterra as duas revoluções do século XVII representaram uma conti nuidade ao completarem a obra de selfgovernment iniciada paradoxalmente insistase por Henrique VIII Contudo também é possível sustentar contra a interpretação de Toc queville e a favor da interpretação que dá ênfase à ruptura revolucionária que assim como na França foi a Revolução de 1789 que criou e assegurou a liberdade e os direitos de todos os franceses a mesma coisa aconteceu na Inglaterra graças às duas revoluções a de 1640 e a de 1688 E não gra ças a uma suposta continuidade progressiva e milagrosa de uma antiga constituição como insistem em nos fazer crer os conservadores de ontem e de hoje23 Em outros termos se na Inglaterra acabou por no fi nal das contas vingar um tipo de Estado monárquico descen tralizado e baseado numa forma de governo misto expres so na fórmula king in parliament fórmula que antes da Revo lução de 1640 era interpretada de uma maneira pela Coroa e de outra pelo Parlamento pois esses dois poderes dispu tavam a soberania e depois de 1689 passou a ser interpreta da de uma única maneira isto é a que consagrava o poder 23 O grande historiador liberal inglês da primeira metade do século passado Ge orge Macaulay Trevelyan assim ponderou em sua A shortened history of England a respeito dessa questão crucial Era então impossível ao poder parlamentar ga nhar raízes na Inglaterra por menos do que esse cisma nacional e apelo à força É uma interrogação que nenhuma pesquisa ou especulação por mais profunda pode resolver Os homens eram o que eram imunes à infl uência da sabedoria tardia da posteridade e assim agiram Se um melhor processo poderia ou não ter levado ao mesmo fi m foi à ponta de espada que o Parlamento realmente conquis tou o direito a sobreviver como força dominante da Constituição inglesa Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 35 do Parlamento na França acabou por no fi nal das contas vingar um tipo de Estado republicano centralizado e base ado em um soberano único como no Antigo Regime mas diferentemente do Antigo Regime em um soberano único coletivo vale dizer os representantes da nação A esta altura é hora de começarmos a concluir e o faremos pondo em comparação as trajetórias históricas de dois pequenos Estados tardomedievais da Península itálica Florença e Veneza com a de dois grandes Estados modernos da Europa Ocidental França e Inglaterra Sal tou aos olhos dos modernos a semelhança entre Veneza e Inglaterra como se pode ver pelos não poucos autores que se deixaram fascinar pelo mito di Venezia como foi o caso do republicano inglês do século XVII James Harring ton Ora o mito di Venezia consistia precisamente na crença de que os venezianos tinham desenvolvido nas palavras do historiador John G A Pocock a complexa e fascinan te maquinaria de operações para nomear eleger e sortear as magistraturas que os visitantes da república se deleita vam em observar e descrever Ainda nas palavras desse autor retiradas de seu livro maravilhoso The Machiavellian Moment os venezianos tinham por assim dizer mecaniza do a virtù Não menos do que a imagem de uma per feição de equilíbrio polibiano a crença de que os venezia nos tinham alcançado essa mecanização era um elemento poderoso do mito di Venezia24 24 Pocock 1975 315 Compreendese assim que com base no paralelo entre Vene za e a Inglaterra se tornasse irresistível pensar que o segredo de suas extraordinárias trajetórias históricas tenha derivado da estabilidade e superioridade de seus regimes políticos baseados ambos na excelência dos seus governos mistos Harrington que era um republicano entusiasta do governo misto e cujo livro A República de Oce ana saiu apenas quatro anos depois do Leviatã queria ao contrário de Hobbes justamente dividir o poder e para assegurar que isso acontecesse sugeriu que se adotasse em política o mesmo procedimento adotado na estória das duas jovens que para dividir o pudim em duas partes iguais decidem que quem corta não escolhe e quem escolhe não corta assim também com o poder ou seja os que executam as leis não podem fazêlas e os que as fazem não podem executálas Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 36 Mas salvo engano não há registro de autores que tenham visto eou tentado estabelecer qualquer semelhan ça entre Florença e França Contudo gostaria de sugerir que esse paralelo também pode ser feito a despeito do fato de que Florença no seu momento de glória e grandeza ter sido uma república de governo misto e a França ao contrá rio nunca ter conhecido essa forma de governo mesmo nos seus vários momentos de glória e grandeza Contudo tendo em vista que a França entre os séculos XVI e XIX tal como Florença entre os séculos XIII e XVI foi um laboratório político onde todas as constituições foram experimentadas então poderíamos sustentar o paralelo afi rmando que tam bém a França tal como Florença deve sua extraordinária trajetória histórica precisamente à divisão políticoideológi ca entre as classes e ao confl ito de classes Como aliás já haviam percebido os historiadores france ses da primeira metade do século XIX Por exemplo François Guizot quando afi rmava em 1828 que A Europa moderna nasceu da luta das diversas classes da sociedade Em outros lugares esta luta conduziu a resultados bem diferentes Na Europa Nnenhuma das classes pôde vencer nem se sujeitar às outras a luta ao invés de tornarse um princípio de imobilidade foi a causa do progresso As relações das diversas classes entre si a necessidade em que se encontravam de se enfrentar e de ceder alternadamente a diversidade de interes ses de suas paixões a necessidade de se vencer sem poder che gar até o fi m disto saiu talvez o mais enérgico o mais fecundo princípio de desenvolvimento da civilização européia25 É evi dente que Guizot está generalizando para toda a Europa uma situação que foi sobretudo típica da França moderna Como quer que seja o fato é que assim como não hou ve na época medieval e início da moderna nenhum Estado 25 A citação de Guizot foi extraída de Formação do Terceiro Estado As comunas 2003 4142 Modesto Florenzano Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 37 que experimentou como Florença uma tão intensa pro longada e variada divisão e luta de classes também não há posteriormente nenhum Estado que tenha experimentado como a França uma mais intensa prolongada e variada divisão e luta de classes Pois com efeito em que outro país se assiste como na França considerandose o longo perío do que vai das guerras de religião na segunda metade do século XVI à Comuna de Paris em 1870 a uma tal luta de classes envolvendo simultaneamente camponeses contra nobres trabalhadores urbanos contra burgueses burgueses contra nobres nobres contra nobres burgueses contra bur gueses e por último e mais importante proletários contra burgueses Assim do absolutismo francês que socialmente falando parecia nas palavras do historiador Robert Man drou uma espécie de vulcão de múltiplas crateras26 não seria exagero dizer paradoxalmente que nasceu da luta de classes viveu da luta de classes e morreu da luta de classes Do Estado moderno da geração nas palavras de Hobbes daquele grande Leviatã ou antes daquele Deus Mortal ao qual devemos abaixo do Deus Imortal nossa paz e defesa ousaria dizer concluindo que os italianos o cria ram os franceses e ingleses o desenvolveram e aos alemães restou o consolo de o interpretarem Modesto Florenzano é professor do Departamento de História da Faculdade de Filosofi a Letras e Ciências Humanas da USP Referências bibliográfi cas ANDERSON Perry 1984 Linhagens do Estado absolutista Porto Editora Afrontamento BADIE Bertrand 1997 Les deux États Pouvoir et société en Occident et en terre dIslam Paris Seuil BARON Hans 1955 The crisis of the early Italian Renaissance civic humanism 26 Mandrou p 26 Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente Lua Nova São Paulo 71 1139 2007 38 and republican liberty in an age of classicism and tirany Princeton NJ Prin ceton University Press BOBBIO Norberto 1987 Estado governo sociedade Para uma teoria geral da política Rio de Janeiro Paz e Terra BOÉTIE Etienne de la 1986 Discurso da servidão voluntária São Paulo Bra siliense BODIN Jean 1986 Les six livres de la République Paris Fayard BRAUD Philippe1997 Penser lÉtat Paris Seuil BURCKHARDT Jacob 1991 A cultura do Renascimento na Itália São Paulo Cia das Letras CHABOD Federico 1990 Escritos sobre el Renacimiento México Fondo de Cultura 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Resumos Abstracts PARTE I ESTADO E SOCIEDADE PARTE I ESTADO E SOCIEDADE SOBRE AS ORIGENS E O DESENVOLVIMENTO DO ESTADO MODERNO NO OCIDENTE MODESTO FLORENZANO O texto discute o problema da formação do Estado moder no no Ocidente e está organizado em quatro partes Primei ramente abordase o Estado em termos teóricos e gerais e de um ponto de vista que concerne mais às Ciências Sociais do que à História A segunda parte de caráter essencial mente historiográfi co mostra como o Estado absolutista foi interpretado pelos historiadores Na terceira e quarta par tes examinase a origem do Estado moderno na Itália par ticularmente em Veneza e Florença e seu desenvolvimento na França e Inglaterra O texto estabelece também parale los entre os Estados mencionados PalavrasChave Estado moderno Medievo Estado absolutista Monarquia República ON THE ORIGINS AND DEVELOPMENT OF THE WESTERN MODERN STATE This paper is organized in four parts In the fi rst the State is focused in theoretical and general levels treated mainly from a sociological and not historical point of view The second part is essentially historiographical and presents the several explanations proposed by the historians about the absolutist State The third and fourth parts discuss the origins of Modern State in Italy specially Venice and Florence and its development in France and England The paper points out to parallels between those four States Keywords Modern state Medieval history Absolutist State Monarchy Republic