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Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 httpdxdoiorg1015902175623646058 329 A Didática Hoje reinventando caminhos Vera Maria Ferrão CandauI Adélia Maria Nehme Simão e KoffI IPontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro PUCRio Rio de JaneiroRJ Brasil RESUMO A Didática Hoje reinventando caminhos Tratase de refletir acerca de caminhos possíveis para reinventar a escola e a Didática tendo presente estudo de caso realizado em uma escola particular do município do Rio de Janeiro e que optando por desenvolver seu trabalho centrado em projetos e orientado por uma perspectiva intercultural crítica promo veu uma ampla reorganização de tempos e espaços ofício de alunoa e de professora conhecimentos currículos práticas para aprendizagem e ava liação ritos estratégias de gestão entre outras dimensões que entendemos configuram o formato escolar São reflexões que longe de esgotar a temáti ca ou serem prescritivas têm como objetivo oferecer contribuição para os avanços do conhecimento no campo Palavraschave Educação Intercultural Reinvenção da Didática Traba lho Centrado em Projetos ABSTRACT Didactics Nowadays reinventing ways This article aims at reflecting on possible ways to reinvent school and Didactics This is a case study at a private school in the city of Rio de Janeiro which option was to de velop a projectcentered work oriented by a critical intercultural perspec tive It promoted a wide reorganization concerning time and space stu dents and teachers roles knowledge curricula learning and evaluation practice rites management strategies and other aspects that we under stand as part of the school format These reflections neither aim to exhaust the theme nor to be prescriptive The goal is to offer a contribution for ad vancements in the field Keywords Intercultural Education Reinventing Didactics ProjectCen tered Work Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 330 A Didática Hoje Introdução A Didática constitui um campo do conhecimento pedagógico que possui um longo recorrido histórico De Comênio 15921670 e sua Di dática Magna 1631 a obra considerada referência fundacional da re flexão sistemática sobre as questões didáticas muitas foram as contri buições discussões e diferentes correntes e tendências do pensamento filosófico sociológico e educacional que contribuíram para o seu de senvolvimento É possível afirmar que a Didática sempre interagiu com os dife rentes momentos históricos com as diversas visões que seus autores tinhamtêm do papel social da educação e da escola No que diz respeito a nosso país a produção da área especial mente a partir dos últimos trinta anos tem sido ampla plural e criati va Certamente a década de 80 significou um marco muito importante para este campo de conhecimento e criou uma convergência em torno da perspectiva crítica sem que este fato significasse uma homogenei zação de enfoques e preocupações Maria Rita Sales Neto de Oliveira integrante da mesa redonda no X Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino ENDIPE reali zado no Rio de Janeiro em 2000 dedicada à análise dos então pratica mente 20 anos de realização dos ENDIPEs afirma em relação à década dos 80 Podese constatar então o fato de que para além das di ferentes posições sobre o objeto de estudo da área o que existe é um grande consenso Ele se refere à luta em defesa da legitimidade do saber didáticopedagógico enquanto constituindo um campo de conhecimento e enquanto conteúdo do currículo da formação do educador no con texto da luta pela especificidade e importância do papel dos processos da educação e do ensino no movimento de recuperação e democratização da escola pública e na transformação social Oliveira 2000 p 164165 Dos anos 90 até hoje periodicamente atores fundamentais do campo da Didática realizaram balanços críticos e reflexões sobre o de senvolvimento do mesmo Alguns deles foram Pimenta 2000 Pimenta et al 2013 Libâneo 2000 Libâneo 2008 Candau 2008 André 2008 Gatti 2008 Marcondes e Leite 2011 entre outros Diferentes leituras Enfoques variados Ênfases diferenciadas Certamente estes trabalhos evidenciam a riqueza da pesquisa e refle xão em Didática nos últimos anos Partindo do reconhecimento da significativa produção do campo gostaríamos de assinalar que nos últimos anos emergem buscas para ressignificar o conhecimento sobre Didática no sentido de construir abordagens e perspectivas que ofereçam elementos para se enfrentar Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 Candau Koff 331 os desafios atuais da educação escolar É o que vimos identificando nas pesquisas que realizamos através do grupo que coordenamos assim como das discussões que temos presenciado eou das quais temos par ticipado em distintos espaços acadêmicos sobre a atual configuração do campo da Didática É nesta perspectiva que se situa o presente trabalho que visa con tribuir para uma reconfiguração da Didática no momento atual Pre tendemos discutir as possibilidades e dificuldades da articulação entre metodologia de projetos e educação intercultural tendo por referência uma experiência desenvolvida no ensino fundamental Está estrutura do em dois momentos a análise de alguns desafios que a educação es colar hoje apresenta para a Didática e uma abordagem que acreditamos oferecer um caminho inspirador para a construção de uma Didática que favoreça a reinvenção da escola e das práticas pedagógicas o diálo go entre a perspectiva intercultural crítica e a metodologia de projetos A Didática e a Educação Escolar Hoje Muitas são as discussões atuais sobre o sentido da escolarização os desafios que enfrentam os sistemas de ensino a problemática coti diana da educação escolar particularmente o Ensino Fundamental e Médio Basta ler os jornais diários de ampla circulação eou assistir os jornais televisivos para constatar a pluralidade de questões que atra vessam hoje a dinâmica escolar A escola está na ordem do dia univer salização da escolarização qualidade da educação projetos politico pedagógicos dinâmica interna das escolas concepções curriculares relações com a comunidade função social da escola gestão educacio nal sistemas de medição no plano internacional e nacional formação e condições de trabalho de professoresas manifestações de violência e bullying na escola entre outras Junto às condições de trabalho precárias que a grande maioria dosas professoresas vive é possível detectar um crescente malestar entre os profissionais da educação Insegurança e stress parecem cada vez mais acompanhar o dia a dia dos docentes Sua autoridade inte lectual e preparação profissional são frequentemente questionadas O impacto das tecnologias da informação e da comunicação sobre os processos de ensinoaprendizagem obriga a buscar novas estratégias pedagógicas Os sujeitos da educação crianças e adolescentes apresen tam configurações identitárias e subjetividades fluidas que escapam à compreensão dos educadoresas Diante deste quadro muitosas eva dem da profissão e procuram caminhos mais tranquilos e seguros de exercício profissional Tendo presente esta realidade sombria é possível detectar diferentes modos de abordála Destacaremos dois que nos pa recem especialmente presentes na nossa realidade O primeiro está configurado por considerar os problemas que afetam as escolas como disfunções que podem ser resolvidas com a Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 332 A Didática Hoje implementação de estratégias de gestão mais eficientes e sistemas de avaliação controle e monitoramento A lógica da produtividade é consi derada fundamental e a avaliação de resultados tanto do desempenho de alunosas quanto de professoresas e escolas se impõe Assistimos nos últimos anos a afirmação desta perspectiva que inspira e estrutura muitas das políticas públicas na área de educação No entanto é possível também situar a crise da educação esco lar em um nível mais profundo e radical A posição de François Dubet 2011 nos parece que é representativa desta posição com a qual nos identificamos Em todos os lugares e não somente na escola o progra ma institucional republicano declina E essa mutação é muito mais ampla que a simples confrontação da escola com novos alunos e com os problemas engendrados por novas demandas É também porque se trata de uma mu tação radical a identidade dos atores da escola fica forte mente perturbada para além dos problemas específicos com os quais eles se deparam A escola foi um programa institucional moderno mas um programa institucional apesar de tudo Hoje somos ain da mais modernos as contradições desse programa ex plodem não apenas sob o efeito de uma ameaça externa mas de causas endógenas inscritas no germe da própria modernidade Dubet 2011 p 299 Para esta segunda posição é o próprio formato escolar marcado pela lógica da modernidade que está em questão Este desafio ques tiona os conhecimentos e as pesquisas vigentes no âmbito da educa ção e nos obriga a investir numa compreensão mais aprofundada da realidade das escolas e do trabalho docente hoje A buscar caminhos de promover processos de ensinoaprendizagem mais significativos e produtores de criatividade e à construção de sujeitos plenos tanto no âmbito pessoal como social A construir uma educação escolar capaz de dar resposta aos desafios da contemporaneidade Neste sentido con sideramos importante reinventar o campo da Didática e consideramos que um dos caminhos nesta direção é o diálogo com a perspectiva in tercultural crítica e a metodologia de projetos Desenvolvendo o Estudo breves considerações metodológicas Antes de apresentar nossas reflexões acerca do movimento reali zado por uma escola particular situada na Zona Sul do Rio de Janeiro no sentido de sua reestruturação e reorganização e que consideramos ser uma experiência relevante para nos ajudar a pensar e conceber a reinvenção da escola e do campo da Didática acreditamos ser necessá rio fazer alguns apontamentos mesmo que breves sobre a metodolo gia de investigação que utilizamos Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 Candau Koff 333 Para começar podemos dizer que foi um estudo de natureza qua litativa de inspiração etnográfica buscando conhecer e compreender com maior profundidade a experiência em pauta identificada pela pró pria equipe da escola como uma experiência inovadora e tocada por muitos desafios Quando chegamos à escola objeto de nosso estudo sua equipe estava desenvolvendo sistemáticas reflexões planejamentos e avalia ções quer dizer estava mergulhada em um intenso trabalho de nature za políticopedagógica com o objetivo de conceber planejar realizar avaliar e recriar formas alternativas de lidar com o seu currículo e a sua prática didática em todas as suas dimensões buscando implementar no Ensino Fundamental do 6º ao 9º ano um trabalho centrado em projetos E foi nessa mesma escola que realizamos uma pesquisa de natu reza etnográfica procurando olhar ouvir e escrever Oliveira 1998 tudo o que nela acontecia principalmente no que se referia às ações do 6º ano e assim construir uma descrição e análise bastante ampla e den sa de modo a construir conhecimentos sobre o que estava acontecendo naquela escola e ao mesmo tempo encontrar pistas que nos orientas sem no sentido da reinvenção do campo da Didática E para fazer isso além de termos feito uma intensa e sistemáti ca observação participante das reuniões pedagógicas dosas profes soresas do 6º ano e das atividades vividas pelosas alunosas deste mesmo ano nos diferentes espaços escolares foram 250 horas de ob servação de manter sempre atualizado o nosso diário de campo com muitas anotações entabular várias conversas informais realizamos entrevistas individuais com a diretora geral da escola 1 com osas co ordenadoresas 4 e com osas professoresas 11 realizamos também entrevistas coletivas com osas alunosas 22 bem como a análise da documentação pedagógica disponível Todo o nosso esforço foi no sen tido não apenas de realizar uma descrição densa Ryler apud Geertz 1978 mas também de promover uma articulação entre esse modo de fazer e a teoria que o estava orientando Vale observar que estamos cientes de que nosso trabalho é uma interpretação possível a nossa interpretação algo modelado algo construído fabricado Geertz 1978 sobre o nosso objeto de estudo Re conhecemos que o que realizamos é portanto fruto do nosso olhar do nosso ouvir e do nosso escrever Em outras palavras é fruto de nossas buscas de uma interpretação antropológica de uma leitura possível da experiência em pauta Geertz 1978 p 13 embora tenhamos procurado estar sempre atentas ao ponto de vista dosas protagonistas e analisá lo segundo uma perspectiva relacional nos termos dos próprios sujei tos que circulavam na escola Vale registrar que o motivo de ter centrado a nossa pesquisa nas turmas do 6º ano do Ensino Fundamental está relacionado a alguns as Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 334 A Didática Hoje pectos que consideramos relevantes 1 o fato da experiência ter sido implantada progressivamente começando por essas turmas o que sig nifica que este era o ano que mais tempo tinha de vivência na expe riência em pauta1 2 o fato deste segmento contar portanto com uma equipe de professoresas que tinha mais tempo de reflexão em torno do trabalho por eou com projetos 3 mas ao mesmo tempo ser o ano onde osas alunosas experimentavam trabalhar com projetos pela pri meira vez exigindo um constante repensar da proposta em função dos novos grupos que se formavam 4 a importância de poder acompanhar de modo longitudinal e abrangente o desenvolvimento do projetos e desse modo analisar as suas diferentes dimensões e as configurações que assumiam ao longo de sua realização bem como as relações que com ele eram estabelecidas por seussuas protagonistas e 5 a não via bilidade de fazer um amplo e profundo mergulho o que entendemos ser uma exigência de um estudo de caráter etnográfico em todos os anos já que para fazer isso seria preciso ter uma disponibilidade ainda muito maior de tempo pessoal e mesmo institucional para realizar todas as observações e entrevistas necessárias Vale por em destaque também as principais questões que orien taram o nosso estudopesquisa 1 que significados os projetos imple mentados pela escola têm para os diferentes sujeitos neles envolvidos Melhor dizendo quais os sentidos atribuídos aos projetos pelos diver sos sujeitos que dele participam eou o constroem 2 quais os limites e os alcances desses projetos enquanto uma alternativa didática inova dora para lidar com diferentes saberes conhecimentos e culturas que circulam na escola inclusive para viabilizála como um lugar de cru zamento desses mesmos saberes conhecimentos e culturas segundo esses mesmos sujeitos 3 Que potencial têm os projetos de trabalho enquanto possibilidade de vivência de uma educação intercultural crí tica Muitos foram os nossos achados todavia o que apresentamos a seguir é um breve recorte de todo o nosso material O que apresentamos aqui serve ao nosso propósito ou seja refletir sobre as possibilidades de reinventar a escola e o campo da Didática tendo presente a perspectiva intercultural crítica e a metodologia de projetos A Educação Intercultural Crítica e o Trabalho Centrado em Projetos construindo caminhos para a reinvenção da escola Cabe começar esse item reiterando nossa compreensão de que a educação escolar ainda tem um papel relevante na formação das crian ças dosas adolescentes e dosas jovens mas que no entanto é neces sário buscar novos caminhos eou alternativas que possam ser mobi lizadas e apropriadas na perspectiva da reinvenção dessa escola que entendemos precisa ser mais plural democrática capaz de responder Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 Candau Koff 335 aos desafios de nossa contemporaneidade e de formar cidadãos e ci dadãs sujeitos da construção de um mundo menos dogmático e mais solidário Por sua vez ressaltamos que para nós a reinvenção da escola pressupõe entre outros aspectos colocar em debate o modo de viver o currículo eou a prática educativa refletindo e discutindo portanto o que entendemos são os seus modos de organizar tempos e espaços relações papéis de seus diferentes sujeitos e atores saberes e conhe cimentos métodos técnicas e recursos linguagens planejamento e avaliação E embora reconheçamos que não é suficiente promover transformações de caráter teóricometodológico para mudar a escola consideramos que esse é um aspecto significativo para construir uma outra escola e portanto uma outra educação desde que tais mudanças sejam contextualizadas histórica e culturalmente e estejam orientadas por princípios claramente formulados e que expressem respostas às questões que educação queremos construir Que sujeitosatores de sejamos ajudar a formar Ou em outras palavras que prática escolar desejamos realizar a serviço de quem e do quê A Educação Intercultural Crítica alguns apontamentos Desde 1996 vimos desenvolvendo estudos e pesquisas sobre mul ticulturalismo e interculturalidade e suas relações com os processos educativos Durante estes anos realizamos um amplo levantamento bi bliográfico da produção sobre esta temática tanto como contexto esta dunidense quanto no europeu e latinoamericano publicado em dife rentes livros e artigos No contexto do presente trabalho consideramos importante destacar o caráter polissêmico dos termos multiculturalis mo e interculturalidade Fleury 2003 a centralidade que as questões suscitadas pelos processos imigratórios tem tido nos estudos recen tes realizados no contexto europeu e norteamericano assim como a originalidade vitalidade e pluralidade da produção latinoamericana LopezHurtado Quiroz 2007 p 15 Esta parte da abordagem que situa a interculturalidade no horizonte da própria construção histórica das identidades latinoamericanas e dos processos de reconhecimentone gação que afetam os diferentes sujeitos étnicos e socioculturais que as constituem No XII Congresso da Association pour la Recherche Interculturel le ARIC realizado em Florianópolis em 2009 Catherine Walsh profes sora da Universidad Andina Simon Bolívar sede do Equador e espe cialista no tema em sua palestra de abertura do evento distinguiu três concepções principais de educação intercultural A primeira intitulou de relacional e referese basicamente ao contacto e intercâmbio entre culturas e sujeitos socioculturais entre suas distintas práticas saberes valores e tradições Esta concepção tende a reduzir as relações intercul turais ao âmbito das relações interpessoais e minimiza os conflitos e as Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 336 A Didática Hoje relações de poder No que diz respeito às outras duas posições tendo como referência Fidel Tubino 2005 filósofo peruano a referida autora descreveu e discutiu a interculturalidade funcional e a crítica No que diz respeito à interculturalidade funcional afirma que está orientada a diminuir as áreas de tensão e conflito entre os diversos grupos e movi mentos sociais sem afetar a estrutura e as relações de poder vigentes No entanto colocar estas relações em questão é exatamente o foco da perspectiva da interculturalidade crítica Tratase de questionar as di ferenças e desigualdades construídas ao longo da história entre diferen tes grupos socioculturais étnicoraciais de gênero orientação sexual entre outros Partese da afirmação de que a interculturalidade aponta à construção de sociedades que assumam as diferenças como constitu tivas da democracia e sejam capazes de construir relações novas verda deiramente igualitárias entre pessoas e grupos de diferentes referentes socioculturais Nossa proposta é que a reinvenção da escola esteja orientada pelos princípios de uma Educação Intercultural Crítica e consequentemente esses princípios devem impregnar toda a escolaprocessos afetando portanto todas as suas dimensões e ações Para nós isso significa dizer que consideramos fundamental Conceber os processos educacionais como historicamen te situados articular a educação com outros processos sociais trabalhar sistematicamente a relação teoriaprá tica favorecer processos de construção de sujeitos autô nomos competentes solidários capazes de ser sujeitos de direito no plano pessoal e coletivo capazes de construir histórias e apostar em um mundo e em uma sociedade di ferentes de utilizar metodologias ativas participativas personalizadas e multidimensionais articuladoras das dimensões cognitiva afetiva lúdica cultural social eco nômica e política da educação Candau 2003 p 60 Mas significa também Promover uma educação para o reconhecimento do ou tro para o diálogo entre diferentes grupos sociais e cul turais Uma educação para a negociação cultural que enfrenta os conflitos provocados pela assimetria de poder entre os diferentes grupos socioculturais em nossa socie dade e é capaz de favorecer a construção de um projeto comum pelo qual as diferenças são dialeticamente inte gradas Candau 2009 p 59 Nossa aposta implica portanto conceber e realizar processos de ensinoaprendizagem orientados no sentido de valorizar a construção da autonomia doa alunoa reconhecendooa sujeito da construção de sua história particular e da história em geral ampliar eou reforçar os mecanismos para o seu autoconhecimento valorizando processos de construção de identidades reconhecer e valorizar os diferentes sujei Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 Candau Koff 337 tos socioculturais presentes na escola e consequentemente fazer dia logar os diferentes grupos culturais que nela circulam empoderar esses diferentes sujeitos e os grupos culturais a que pertencem valorizando sua autoestima trabalhar os conflitos que emergem das eou nas rela ções interpessoais apostando no potencial dos mecanismos de nego ciação e na construção coletiva de normasregras eou códigos de con vivência reconhecer valorizar fazer dialogar eou articular diferentes saberes incorporando diversas narrativas e linguagens valorizar e empregar procedimentos metodológicos diversificados dando ênfase ao diálogo à participação e à produção coletiva eou colaborativa sem deixar de valorizar a experiência e a produção de cada umuma E ain da conceber e realizar processos de ensinoaprendizagem contextua lizados tendo presente que os contextos são multiculturais Processos de ensinoaprendizagem que portanto afirmam incorporam e se enri quecem com as diferenças culturais sem negar a busca pela igualdade de direitos E que também buscam promover o diálogo entre as práticas vividas na escola e as demais práticas sociais Koff 2011 Para nós apostar na ideia da reinvenção da escola orientada pelos princípios de uma Educação Intercultural Crítica significa reconhecer que a escola tem papel relevante na perspectiva da afirmação da justiça social cognitiva e cultural assim como da construção de relações igualitárias entre os diferentes grupos socioculturais e da democrati zação da sociedade por meio de políticas que articulam os diretos da igualdade e da diferença O Trabalho Centrado em Projetos para além de um recurso metodológico Pretendemos neste item fazer breves considerações que tratam de alguns aspectos do trabalho centrado em projetos como um cami nho possível para conceber e fazer acontecer a escola na direção aqui sugerida Mas antes mesmo de avançar nossas reflexões precisamos fazer dois registros O primeiro registro diz respeito ao fato de que entendemos a atual proposta de trabalhar por e com projetos como uma releitura do método de projetos concebido pelo educador norte americano William Kilpa trick 1918 Fundamentada nos estudos de John Dewey acerca de uma escola ativa sua proposta tem como preocupação central os interes ses doa alunoa na perspectiva despertar nelea a vontade de saber Kilpatrick e seu método tornaramse conhecidos no Brasil a partir do Movimento da Escola Nova que em confronto com os princípios e mé todos da pedagogia tradicional propôs a adoção de métodos mais ati vos buscando principalmente superar uma perspectiva centrada na transmissão de conhecimentos pelosas professoresas para incentivar a participação eou a atividade intensa dosas alunosas na construção do conhecimento Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 338 A Didática Hoje Vale sublinhar todavia que entendemos que trabalhar por e com projetos tal como está proposto pelos autores mais contemporâneos por exemplo Hernández Ventura 1998 Hernandez et al 2000 Alva rez et al 2004 tem como princípio superar a dimensão técnica tão pre sente quando se trata de um método sugerindo uma nova postura no sentido de se repensar a escola o seu currículo a sua prática pedagógi ca e consequentemente o processo de ensinoaprendizagem O segundo registro é que não temos a intenção de entender o tra balho centrado em projetos como única alternativa ou que há uma só maneira de conceber e fazer acontecer os projetos Nossas considera ções estão pautadas na observação análise e interpretação da experi ência que foi objeto do nosso estudo E nesse caso reconhecemos que a opção de trabalhar por eou com projetos abrangendo a reorganização da escola como um todo e apoiada pelos princípios da perspectiva inter cultural crítica concebidos e construídos de forma compartilhada por todos os envolvidos direção equipe técnica professoresas alunosas e suas famílias pode contribuir para fazer a escola avançar no sentido de cada vez mais responder aos seus desafios Organizar o currículo a prática didática e o conhecimento esco lar bem como os tempos os espaços os ritos as estratégias de gestão e outros aspectos que envolvem a dinâmica do funcionamento da escola tendo por orientação o trabalho centrado em projetos parece ser muito mais do que adotar uma metodologia diferente ou específica Trabalhar por eou com projetos na escola implica principalmente em adotar ou tra concepção do que sejam os processos de ensinar e de aprender E nesse caso um aspecto relevante é a ideia de que oa alunoa aprende fazendo conexões entre os saberes e os conhecimentos que elea já tem e aqueles que ainda precisa construir Quer dizer elea não aprende por acumulação eou por meio da simples transmissão de informações mas sim e principalmente fazendo relações entre diferentes informações saberes e conhecimentos disponíveis em diversas fontes elea mesmo pode ser uma dessas fontes e a partir daí então tem possibilidade de construir novos conhecimentos Tratase de um enfoque globalizador e relacional E embora tal enfoque possa inspirar diferentes formatos e con sequentemente diferentes maneiras de organizar os conhecimentos escolares segundo Hernández e Ventura 1998 p 61 o trabalho cen trado em projetos possibilita e até mesmo favorece que a abordagem globalizadora e relacional seja adotada na medida em que os projetos de trabalho implicam considerar que tais conhecimentos não se ordenam de uma forma rígida nem em função de algumas referências disciplinares préestabelecidas ou de uma homogeneização dos alunos No que tange à proposta que analisamos foi possível registrar um esforço significativo no sentido de dar um tratamento mais globaliza do ou seja menos fragmentado e mais articulado integrado e inter Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 Candau Koff 339 disciplinar dos saberes e conhecimentos com frequência osas profes soresas sublinhavam é necessário fazer sempre links entre tudo o que estamos trabalhando permitindo que oa alunoa fizesse diferentes conexões entre o que estava estudandopesquisando e também entre seus estudos e pesquisas e o que elea sabia eou conhecia Hernández e Ventura 1998 destacam que os projetos de trabalho favorecem apren dizagens mais significativas na medida em que estimulam essas co nexões E afirmam que quanto mais possibilidades eou oportunida des oa alunoa tiver para fazêlas mais favorável será a sua atitude em relação aos saberesconhecimentos à sua disponibilidade e interesse para aprender e nesse sentido maiores serão as suas possibilidades de realizar aprendizagens significativas Para Hernández e Ventura 1998 p 63 globalização e signi ficatividade são dois aspectos essenciais que se plasmam nos projetos Eles destacam que as informações necessárias para construir os projetos não estão determinadas de antemão nem dependem do edu cador ou do livrotexto estão sim em função do que cada aluno já sabe e da informação com a qual se possa relacionar dentro e fora da escola Hernández Ventura 1998 p 64 Ou seja para Hernández e Ventura 1998 o trabalho centrado em projetos implica o protagonismo dosas alunosas desde a seleção dos temas eou dos assuntos eou das ques tões que serão objetos de seus estudos incentivando o diálogo com o que elesas já trazem de suas próprias vivências Entendemos que as sim concebidos os projetos de trabalho favorecem a circulação eou construção de saberes conhecimentos e culturas sem hierarquizálos respondendo desse modo a um dos princípios que consideramos fun damental para a vivência de uma perspectiva intercultural crítica No entanto esta não é uma questão fácil tanto a definição dos temas dos projetos quanto a dinâmica do seu desenvolvimento Assistimos in tensas discussões entre os educadores em que era possível identificar posições que se orientavam por uma perspectiva crítica e intercultural procurando situar os temas num contexto social amplo favorecendo a identificação dos diversos atores nele presentes assim como valori zando os diversos e plurais saberes Outros adotavam uma perspectiva mais centrada nos conteúdos curriculares estabelecidos tendo dificul dades em desnaturalizar estes saberes e incorporar também outros socialmente produzidos Esta foi uma tensão recorrente em inúmeros momentos Segundo Fernando Hernandez 1998 há algumas etapas que de um modo geral caracterizam o trabalho centrado em projetos O primeiro passo é o da definição do eixo tema problema conceito ou questão ou ainda conjunto de questões interrelacionadas que se quer investigar lembrando que o importante é que o eixo seja definido pelosas alunosas de acordo com os seus interesses prioridades eou curiosidades podendo contar entretanto com a parceria dosas profes soresas Em seguida é necessário definir múltiplas fontes e diferentes Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 340 A Didática Hoje procedimentos para buscar essas informações bem como estabelecer os critérios que vão ajudar a categorizar e interpretálas No meio do ca minho podem surgir novas perguntas e novos traçados ou desvios são feitos Novas relações são então estabelecidas Na verdade uma rede de achados vai sendo tecida e sistematizada pelosas alunosas procuran do sempre dialogar com suas experiências e saberes No final elesas devem expressar suas descobertas de diferentes maneiras conceben do elaborando eou criando diferentes produtos relatórios dossiês textos em prosa ou verso desenhos programas para Rádio TV ou WEB painéis exposições dramatizações utilizando portanto diferentes linguagens e construindo diferentes narrativas No caso da escola objeto de nosso estudo por exemplo constata mos que osas alunosas apresentavam suas demandas temáticas qua se sempre uma extensa listagem que eram então categorizadas e orga nizadas em um mapa conceitual detalhadas em um índice de assuntos correlacionados e traduzidas em desafiosmetas a serem alcançadas sempre com a colaboração dosas professoresas Tal colaboração era justificada na medida em que as crianças lembramos que nosso es tudo estava centrado no sexto ano portanto com alunosas entre 10 e 11 anos estavam em processo de aprendizagem da própria sistemática do trabalho centrado em projetos Percorrendo passo a passo os ca minhos traçados para dar conta dos seus desafios eou de suas metas osas alunosas iam realizando aprendizagens e construindo conheci mentos Entendemos portanto que a experiência que analisamos pode ser compreendida como uma experiência que abre caminho para reposi cionar o conhecimento escolar e a própria função da escola na medida em que procurava favorecer a busca das informações disponíveis em vários meios eou linguagens bem como a sua transformação em co nhecimentos na perspectiva de ajudar osas alunosas a uma melhor inserção crítica no mundo em que vivem Uma proposta que valoriza a ideia de que é oa alunoa quem constrói conhecimentos a partir das relações que elea estabelece com o outro e com diferentes tipos de ex periências e que portanto pressupõe uma outra concepção de socieda de como expressaram váriosas professoresas E nesse sentido pode ser compreendida como uma proposta que além de ser Um guia aberto à intervenção educativa inclui as apren dizagens que os alunos efetuam à margem das intenções do corpo docente quer seja pelas relações de comunicação estabelecidas com seus pares com os professores e os adul tos quer seja pelo acesso a uma maior variedade de recur sos livros filmes laboratórios oficinas visitas excursões etc que lhes proporcionam possibilidades que não pode mos prever totalmente Torres Santomé 1998 p 2829 A afirmação do protagonismo dosas alunosas e o trabalho cole tivo é um componente fundamental do trabalho com projetos mas para Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 Candau Koff 341 que possa situarse na perspectiva da interculturalidade crítica é impor tante favorecer continuamente as relações e trabalho conjunto entre su jeitos diferentes e procurar que os temas desenvolvidos sejam contextua lizados tendose presente as relações sociais e seus conflitos Constatamos também que o trabalho por eou com projetos po tencializava dinâmicas voltadas para o aprender a aprender valorizan do oa alunoa enquanto sujeitoator ou seja enquanto protagonista desse processo favorecendo aprendizagens mais significativas para elea O tempo todo oa alunoa era estimulado a pensar e decidir sobre o percurso que ia realizar para fazer suas aprendizagens Elea fazia isso individualmente ou de forma coletiva ou seja contando com o apoio de outrosas alunosas ou com a ajuda dosas professoresas Entende mos portanto que trabalhar por eou com projetos implica reinventar o ofício de alunoa e o doa professora rompendo com a fórmula mais clássica professora ensina e alunoa aprende ou não No entanto isto nem sempre acontecia Como já afirmamos vá rias tensões se faziam presentes entre os professoresas no que diz res peito a favorecer o diálogo com os diferentes o trabalho coletivo e a contextualização Alguns professoresas já tinham estas preocupações internalizadas mas outros tendiam a estruturar demasiado as ativida des deixar fluir processos autorreferenciados e fundamentalmente in dividuais assim como resistiam a desconstruir o papel tradicional doa professora como possuidor de um conhecimento que deve ser transmi tido aos alunosas Por sua vez na escola objeto de nosso estudo foi possível cons tatar que o trabalho centrado em projetos favorecia o empoderamento doa alunoa uma vez que como protagonista de muitas estratégias eou atividades que eram desenvolvidas elea ia conquistando sua autono mia para aprender e para agir em diferentes situações desenvolvendo sua competência como pesquisadora críticoa e sua criatividade Favo recia também em consonância com a perspectiva intercultural crítica a valorização da sua identidade cultural na medida em que elea em função das diversas oportunidades que lhe eram dadas podia se ex pressar partilhar seus saberes e produzir conhecimentos a partir in clusive de seu pertencimento cultural Além disso identificamos que os projetos estimulavam osas alunosas a aprenderem a trabalhar de modo mais solidário e colaborativo já que as estratégias de trabalho em pequenos grupos eram frequentemente mobilizadas Outro aspecto importante que merece registro é que na escola que analisamos para dar vida aos projetos eram utilizadas estratégias atividades procedimentos didáticos e recursos muito diversificados in cluindo os tecnológicos e bastante lúdicos várias vezes sugeridos eou construídos pelosas própriosas alunosas garantindo desse modo uma dinâmica que parecia dar conta da agitação própria das crianças e dosas adolescentes eles pareciam se divertir enquanto aprendiam Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 342 A Didática Hoje além de criar oportunidade de aprendizagens respeitando e contem plando a pluralidade de características socioculturais dessas crianças e adolescentes o que parecia mobilizálosas e mantêlosas bastante interessadosas em aprender Por sua vez com frequência e em função dos objetivos do proje to que estavam realizando osas alunosas eram estimuladosas a de senvolver atividades contando com a participação de convidados que eram chamados para partilhar suas experiências vividas em outras ins tâncias eou grupos culturais Já em outras ocasiões eram levados para realizar atividades em outros lugares para além dos muros da escola Estratégias que entendemos favoreciam uma maior aproximação entre a escola e outras instâncias ou espaços de aprendizagem e consequen temente a vivência de uma pluralidade de experiências criando inclu sive oportunidades de diálogo com diferentes grupos culturais Con sideramos este um aspecto de especial importância para a perspectiva da educação intercultural ampliar o horizonte da escola favorecer a interação com distintos grupos socioculturais reconhecer os diversos atores sociais e as relações e conflitos existentes entre eles Cabe aqui esclarecer que a escola organizava seu trabalho divi dindo o seu tempo em dois momentos articulados o primeiro com cerca de 2h denominado de trabalho pessoal bastante flexível onde uma professora independente de sua área eou formação específica tendo presente o tema e as questões formuladas estimulava e orientava oa alunoa na realização de suas pesquisas na organização e processa mento das informações coletadas e na elaboração de suas sínteses Já o segundo momento chamado de estudo específico das disciplinas era dedicado ao aprofundamento dos achados obtidos no momento ante rior sendo que agora osas professoresas contribuíam com os conhe cimentos específicos de sua área de formação Observamos que todo o esforço feito era no sentido de articular e integrar esses diferentes mo mentos buscando fazer links entre os saberes e conhecimentos neles trabalhados e flexibilizar as fronteiras disciplinares Tal organização temporal expressava a dificuldade de romper definitivamente com a organização curricular disciplinar e as tensões existentes entre o professorado em relação a este tema mas já aponta va uma possibilidade bastante produtiva desse rompimento na medida em que os temas trabalhados nos projetos tinham o propósito não só de gerar os estudos as pesquisas bem como a construção de saberes e de conhecimentos mas principalmente permitir que esses saberes e conhecimentos fossem tratados em uma perspectiva mais integrada e globalizadora fazendo portanto mais sentido para osas alunosas Também merece destaque o papel dos diferentes espaços escola res utilizados no trabalho por eou com projetos na escola aonde realiza mos a nossa pesquisa Um papel que segundo entendemos contribuía para favorecer aprendizagens significativas respeitando valorizando e fazendo dialogar as diferentes identidades culturais dosas alunosas Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 Candau Koff 343 na medida em que eram espaços que acolhiam e estimulavam a produ ção das crianças e dosas adolescentes nos seus próprios termos Suas linguagens eou narrativas encontravam nos diferentes espaços que eram utilizados para dar vida aos projetos de trabalho inúmeras possi bilidades de expressão Durante a realização das atividades diversos e diferentes am bientes que integravam a arquitetura escolar eram utilizados como lu gar de aprendizagem sugerindo a valorização de um conceito de sala de aula que vai muito além dos espaços convencionais a ela destinados seja pela presença de vários lugares que podiam ser usados pelos alunos para brincar jogar e praticar esportes mas também para estudar fazer pesquisas realizar experimentos produzir e criar seja pela adoção de um mobiliário que favorecia a prática de atividades coletivas as mesas e as cadeiras por exemplo foram desenhadas para favorecer o trabalho em pequenos grupos seja pela possibilidade até mesmo de usar o chão do corredor como uma imensa mesa para realização de trabalhos cole tivos seja pela presença de múltiplos equipamentos eou recursos didá ticos do livro aos recursos de computação e multimídia que estimula vam e davam suporte à realização das várias atividades previstas pelo projeto tais como pesquisas em livros e computadores experimentos em laboratórios produção de audiovisuais realização de exposições exibição de peças de teatro exibição e debate em torno de filmes exi bidos na própria escola A ruptura com o ensino frontal e a promoção da diferenciação pedagógica constituem elementos significativos para a promoção de uma educação intercultural Aqui também nem sempre era fácil promover este ambiente alguns professoresas consideravam que faltava ordem disciplina não valorizando a dinâmica que se pro movia Cumpre ressaltar que constatamos também a presença nos di ferentes ambientes de muitos painéis relacionados aos temas eou aos assuntos das pesquisas estudos e atividades em andamento além de vários cartazes associados a campanhas de mobilização eou conscien tização quase sempre voltados para questões eou situações que esta vam na ordem do dia Acreditamos que é possível dizer que esses painéis e cartazes ao lado da configuração e apropriação dos espaços arquitetônicos eou ambientes escolares e seus equipamentos eou recursos compunham um cenário bastante plural diversificado e em constante movimento que pode ser compreendido como um programa educador que incor pora eou responde aos padrões culturais e pedagógicos presentes na escola Escolano 2001 e que nesse sentido contribuía para reforçar as pectos valorizados pelo trabalho centrado em projetos e na perspectiva intercultural crítica como por exemplo o trabalho coletivo que esti mulava o diálogo com o outro a produção dosas própriosas alunosas utilizando diferentes linguagens e narrativas a circulação de diferentes saberes e conhecimentos promovida pela vivência de uma gama plural Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 344 A Didática Hoje de atividades e o diálogo com questões que fazem parte do cotidiano eou da realidade que ultrapassa os muros escolares dialoga com ou tras práticas socioculturais na direção de uma formação comprometi da com a transformação da sociedade Tendo presente toda essa reconfiguração do formato escolar ge rada pela opção de se trabalhar por eou com projetos iluminada pela perspectiva intercultural crítica não poderíamos deixar de apontar um aspecto fundamental que observamos na dinâmica da escola aqui re tratada e que muitas vezes é responsável pelo engessamento eou pela colocação de limites quando desejamos propor uma reinvenção da es cola e da Didática em uma perspectiva intercultural crítica Estamos nos referindo à avaliação da aprendizagem que também mereceu aten ção e sobre a qual incidiram transformações geradas pela opção de tra balhar por eou com projetos Nesse caso consideramos importante sublinhar que eram utili zadas diferentes estratégias eou procedimentos de avaliação da apren dizagem abrangendo tanto o momento do trabalho pessoal como o dos estudos específicos das disciplinas e que podem ser assim siste matizados o processo eou sistema de avaliação da aprendizagem era bimestral incluindo 1 autoavaliação individual e às vezes coletivas registrada em fichas específicas peloa próprioa alunoa 2 avaliação feita peloa professora do processo vivido pelosas estudantes levan do em conta o resultado do desempenho em cerca de quatro ou cin co atividades realizadas no momento do trabalho pessoal incluindo a qualidade do texto do relatóriosíntese além de aspectos relacionados à organização cooperação participação e respeito às diferenças 3 ava liação feita peloa docente do produto considerando outros exercícios e provas realizados pelosas alunosas Um processo eou sistema que parecia portanto ser abrangente e diversificado buscando superar um conceito mais restrito de avaliação ou seja mais centrada em produto ou apenas em provas embora elas valessem mais pontos para favorecer uma avaliação da aprendiza gem mais compatível com os princípios e práticas que eram valorizados no desenvolvimento dos projetos de trabalho Portanto um processo eou sistema de avaliação da aprendizagem que parecia procurar fugir de uma avaliação meramente classificatória eou seletiva para ser um processo que também valorizava uma avaliação mais formativa mes mo considerando que os resultados das provas tivessem maior peso Em outras palavras embora os aspectos relacionados à aprendizagem de conteúdosconhecimentos fossem priorizados constatamos que ques tões como a aprendizagem de habilidades bem como o desenvolvimen to de valores de atitudes frente aosàs colegas aosàs professoresas e ao trabalho a prática da autoavaliação os mecanismos adotados para aprender a aprender também eram objeto de observação e análise para compor o quadro da avaliação dosas alunosas Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 Candau Koff 345 Mesmo assim observamos que essa era uma prática que suscita va resistências o que dificultava poder avançar ainda mais buscando por exemplo 1 diminuir o peso das provas mais vinculadas ao mo mento do estudo específico das disciplinas e paralelamente aperfeiço ar a avaliação das aprendizagens acerca de conceitos e conhecimentos feitas durante o momento do trabalho pessoal 2 promover constante realimentação ou reorientação dosas alunosas a partir dos resulta dos que elesas tinham alcançado de modo que durante o processo de aprendizagem elesas pudessem rever corrigir e alterar tais resultados 3 favorecer processos de avaliação interpares e coletiva 4 procurar criar menos hierarquias entre as avaliações do domínio cognitivo e aquelas voltadas à construção de habilidades e atitudes 5 criar meca nismos para ampliar a percepção quanto à qualidade dos textossínte ses elaborados pelosas alunosas 6 fazer do momento de socialização dos dados eou das informações pesquisadas um momento efetivo de troca e aprendizagem 7 aperfeiçoar os critérios de análise das ativi dades realizadas pelasos criançasadolescentes Mesmo apresentando limites e resistências é possível dizer que o processo eou sistema de avaliação da aprendizagem concebido e vi vido naquela escola parecia estar criando mais oportunidades no sen tido dosas estudantes assumirem maior responsabilidade sobre suas aprendizagens Hargreaves 2002 e dosas professoresas ampliarem o diálogo com asos criançasadolescentes construindo e reconstruindo com elesas esse processo de aprendizagem O que entendemos é co erente com a orientação de que no trabalho centrado em projetos arti culado com a perspectiva da interculturalidade crítica osas alunosas individual e grupalmente devem ser protagonistas na maior parte do processo inclusive durante os momentos de avaliação A Título de Conclusão Tendo presente os resultados de o estudo de caso que realizamos é possível afirmar que o trabalho com projetos articulado à perspecti va intercultural crítica é possível e favorece processos de reinvenção da escola colocando em questão o formato escolar dominante No entanto não se trata de um processo fácil Se o trabalho centrado em projetos articulado com a perspectiva da educação intercultural rompe com as formas mais usuais de organizar os espaços e os tempos escolares as informações os saberes e os conhecimentos bem como as relações en tre os diferentes sujeitos as práticas escolares e as leituras da realidade em que estamos imersos suscita também resistências e conflitos Prin cipalmente porque desconstrói o formato escolar vigente e as concep ções de professora alunoa conhecimento vigentes fortemente arrai gadas nos professores e professoras e nos atreveríamos a afirmar na sociedade e mesmo reforçadas pelas políticas públicas Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 346 A Didática Hoje A educação intercultural crítica vem se afirmando entre nós No entanto tem apresentado grandes desafios na sua incorporação à di nâmica escolar Acreditamos que a articulação com a metodologia de projetos oferece um caminho promissor para o seu desenvolvimento Reinventar a escola reinventando seu modo de ser e agir tendo como alternativa o trabalho centrado em projetos configurados segun do os princípios da perspectiva intercultural crítica parece ser não só uma possibilidade mesmo que sua implementação exija superar con flitos romper com rotinas já cristalizadas se envolver com ações coo perativas realizar muitas pesquisas estar disposto a aprender de for ma solidária e pleno compromisso e engajamento profissional como também um caminho viável e promissor para a reinvenção da Didática como campo teóricoprático do conhecimento pedagógico Recebido em 30 de março de 2014 Aprovado em 04 de janeiro de 2015 Nota 1 É importante lembrar aqui que a escola começou a conceber planejar e discutir a reorganização de seu formato escolar na perspectiva desenvolver trabalhos centrados em projetos em 2002 sendo eles desenvolvidos já desde o primeiro semestre de 2003 Referências ÁLVAREZ Manuel et al O Projeto Educativo da Escola Porto Alegre ARTMED Editora 2004 ANDRÉ Marli Tendências da Pesquisa e do Conhecimento Didático no Início dos Anos 2000 In ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICAS DE EN SINO 14 2008 Porto Alegre Anais Porto Alegre PUCRS 2008 P 487499 CANDAU Vera Maria Pedagogias Críticas ontem e hoje Revista Novamerica Rio de Janeiro n 97 p 5861 mar 2003 CANDAU Vera Maria Memórias Diálogos e Buscas aprendendo e ensinando didática Revista Educação São Leopoldo v 12 p 174181 2008 CANDAU Vera Maria Educação Escolar e Culturas multiculturalismo univer salismo e currículo In CANDAU Vera Maria Org Didática questões contem porâneas Rio de Janeiro Forma Ação 2009 P 4760 COMÊNIO João Amos Didática Magna 4 ed São Paulo Martins Fontes 2011 DUBET François Mutações Cruzadas a cidadania e a escola Revista Brasileira de Educação Rio de Janeiro v 16 n 47 p 289322 maioago 2011 ESCOLANO Agustín Arquitetura como Programa Espaçoescola e currículo In FRAGO Antonio Viñao ESCOLANO Agustín Currículo Espaço e Subjetivi dade a arquitetura como programa 2 ed Rio de Janeiro DPA 2001 P 1957 FLEURY Reinaldo Matias Intercultura e Educação Revista Brasileira de Edu cação Rio de Janeiro n 23 p 1635 maioago 2003 Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 Candau Koff 347 GATTI Bernadete A Pesquisa e a Didática In ENCONTRO NACIONAL DE DI DÁTICA E PRÁTICAS DE ENSINO 14 2008 Porto Alegre Anais Porto Alegre PUCRS 2008 P 6776 GEERTZ Clifford Uma Descrição Densa por uma teoria interpretativa da cul tura In GEERTZ Clifford A Interpretação das Culturas Rio de Janeiro Zahar 1978 P 321 HARGREAVES Andy et al Aprendendo a Mudar o ensino para além dos conte údos e da padronização Porto Alegre Artmed 2002 HERNÁNDEZ Fernando Transgressão e Mudança na Educação os projetos de trabalho Porto Alegre Artmed 1998 HERNÁNDEZ Fernando et al Aprendendo com as Inovações na Escola Porto Alegre Artes Médicas Sul 2000 HERNÁNDEZ Fernando VENTURA Montserrat A Organização do Currículo por Projetos de Trabalho o conhecimento é um caleidoscópio Porto Alegre Artes Médicas 1998 KILPATRICK William H The Project Method the use of the purposeful act in education process Teachers College Record New York v 19 n 4 p 319335 1918 Disponível em httpwwwtcrecordorgContentaspContentlD3606 Acesso em 04 fev 2015 KOFF Adélia Maria Nehme Simão e Uma Agenda para a Didática Hoje atua lizando possíveis prioridades In LIBÂNEO José Carlos SUANNO Marilza Vanessa Rosa Org Didática e Escola em uma Sociedade Complexa Goiânia Centro de Estudos e Pesquisas em Didática 2011 P 133153 LIBÂNEO José Carlos Produção de Saberes na Escola suspeitas e apostas In CANDAU Vera Maria et al Org Didática Currículo e Saberes Escolares Rio de Janeiro DPA 2000 P 1145 LIBÂNEO José Carlos O Campo Teórico e Profissional da Didática Hoje entre Ítaca e o canto das sereias In ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTI CAS DE ENSINO 14 2008 Porto Alegre Anais Porto Alegre PUCRS 2008 P 234252 LOPEZHURTADO QUIROZ Luis Enrique Trece claves para Entender la Inter culturalidad en la Educación Latinoamericana In PRATS Enric Coord Mul ticulturalismo y Educación para la Equidad Barcelona OctaedroOEI 2007 P 1344 MARCONDES Maria Inês LEITE Miriam Soares A Pesquisa Contemporânea em Didática contribuições para a prática pedagógica Educação em Revista Belo Horizonte v 27 p 205334 2011 OLIVEIRA Maria Rita Neto Sales 20 anos de ENDIPE In CANDAU Vera Maria et al Didática Currículo e Saberes Escolares Rio de Janeiro DPA 2000 P 161176 OLIVEIRA Roberto Cardoso de O Trabalho do Antropólogo olhar ouvir e es crever In OLIVEIRA Roberto Cardoso de O Trabalho do Antropólogo São Paulo UNESPParalelo 15 1998 P 1735 PIMENTA Selma A Pesquisa em Didática 19961999 In CANDAU Vera Ma ria et al Org Didática Currículo e Saberes Escolares Rio de Janeiro DPA 2000 P 78106 PIMENTA Selma et al A Construção da Didática no GT Didáticaanálise de seus Referenciais Revista Brasileira de Educação Rio de Janeiro v 18 n 52 p 143162 janmar 2013 Educação Realidade Porto Alegre v 40 n 2 p 329348 abrjun 2015 348 A Didática Hoje TORRES SANTOMÉ Jurjo Globalização e Interdisciplinaridade o currículo integrado Porto Alegre Editora Artes Médica Sul 1998 TUBINO Fidel La Interculturalidad Crítica como Proyecto Éticopolítico In EN CUENTRO CONTINENTAL DE EDUCADORES AGUSTINOS 2005 Lima Dispo nível em httpoalavillanovaeducongresoseducaciónlimaponen02html Acesso em 15 out 2009 WALSH Catherine Interculturalidad y decolonialidad perspectivas críticas y políticas In CONGRESO DA ASSOCIATION POUR LA RECHERCHE INTER CULTURELLE 12 2009 Florianópolis Florianópolis UFSC 2009 P 123 Mi meo Vera Maria Ferrão Candau tem doutorado e pósdoutorado em Educação pela Universidade Complutense de Madrid É Professora Emérita do De partamento de Educação da PUCRio Coordena o Grupo de Estudos sobre Cotidiano Educação e Culturas GECEC desde 1996 Pesquisadora 1A do CNPq Email vmfcpucriobr Adélia Maria Nehme Simão e Koff tem doutorado em Educação pela Pon tifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Pesquisadora associada do Grupo de Estudos sobre Cotidiano Educação e Cultura GECEC do Depar tamento de Educação da PUCRio É coordenadora editorial da Revista No vamerica Email nehmecentroincombr