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327 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 DOI httpdxdoiorg10156002238121Xcomunicacoesv26n1p327347 A EDUCAÇÃO FÍSICA NA ÁREA DA LINGUAGEM O IMPACTO DA BNCC NO CURRÍCULO ESCOLAR1 THE PHYSICAL EDUCATION INSIDE LANGUAGE AREA BNCC IMPACT IN THE SCHOLAR CURRICULUM LA EDUCACIÓN FÍSICA EN LA ÁREA DEL LENGUAJE LOS IMPACTOS DE BNCC EN EL CURRICULO ESCOLAR BarBara Cristina apareCida dos santos1 Fábio Tomio Fuzii1 Universidade Cruzeiro do Sul UNICSUL São PauloSP Brasil1 Resumo A Educação Física escolar do século XXI traz consigo resquícios do que fora no século passado quando chegou ao Brasil com influências europeias Mas visto as drásticas mudanças pelas quais a sociedade brasileira tem passado nas últimas décadas não só no contexto social mas também político e econômico a Educação Física buscou questionar o seu papel enquanto parte dessa sociedade pósmoderna e refletir sobre seu campo científi co buscando subsídios nas Ciências Humanas e se apropriando dos estudos culturais e da própria área da Linguagem Hoje mais democrática e contextualizada com a sociedade da qual faz parte a Educação Física vêse em um cenário turbulento no que tange à educação escolar Ao currículo escolar foi atribuída a Base Nacional Comum Curricular sendo obri gatória para a Educação Básica causando inúmeras transformações no sistema educacional e sendo seus efeitos fortemente debatidos O respectivo artigo procura situar a Educação Física dentro do cenário acadêmicocientífico especificamente a discussão a respeito do seu objeto de estudo e discutir o impacto da BNCC na área PalavRaschave eduCação FísiCa Linguagem CurríCuLo 1 Trabalho apresentado no V Colóquio Educação Física e Ciências Sociais em diálogo 328 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 abstRact In the 21st century the Physical Education remains last centurys characteris tics when arrived with european influences However considering the drastic changes that brazilian society had been suffered in the last decades not only in social but also politic and economic contexts the Physical Education questioned your function while part of this posmodern society and think over about your scientific field finding subsidies in Human Sciences appropriating Cultural Studies and Language area Nowadays more democratic and contextualized with the society of which it is belong the Physical Education finds itself in a turbulent scenario concerning the school education The school curriculum has been assigned the Base Nacional Comum Curricular it being required to basic education causing many transformations in educational system and it effects are intensely discussed The respective article try to situate Physical Education in the academicscientific scenario specifically the discussion about its object of study and to discuss the impact of BNCC in the area KeywoRds physiCaL eduCation Language CurriCuLum Resumen La Educación Física escolar del siglo XXI trae consigo restos de lo que fuera en el siglo pasado cuando llegó a Brasil con influencias europeas Pero visto los drásticos cambios por los que la sociedad brasileña ha pasado en las últimas décadas no sólo en el contexto social sino también político y económico la Educación Física buscó cuestionar su papel como parte de esa sociedad posmoderna y reflexionar sobre su campo científico buscando subsidios en las Ciencias Humanas y apropiarse de los estudios culturales y de la propia área del Lenguaje Hoy más democrática y contextualizada con la sociedad de la que forma parte la Educación Física se ve en un escenario turbulento en lo que se refiere a la educación escolar En el currículo escolar fue asignada la Base Nacional Común Curricu lar siendo obligatoria para la Educación Básica causando innumerables transformaciones en el sistema educativo y siendo sus efectos fuertemente debatidos El respectivo artículo busca situar la Educación Física dentro del escenario académicocientífico específicamen te la discusión sobre su objeto de estudio y discutir el impacto de la BNCC en el área PalabRas clave eduCaCión FísiCa Lenguaje CurriCuLo IntRodução Em seus primeiros passos e durante muitas décadas a Educação Física teve o alicerce de sua área acadêmica pautada nas Ciências Biológicas Trazida para o Brasil como mé todos ginásticos a Educação Física passou por várias transformações pelo fenômeno da esportivização da mecanização dos exercícios pela fragmentação do conhecimento pela psicobiologização até que a área passou a se questionar enquanto ciência e finalmente lan çou luz frente às Ciências Humanas e Sociais BRACHT 1999b Desse modo a Educação Física buscou subsídios na Antropologia Sociologia Estu dos Culturais e até na área da Linguagem Hoje compreendida como linguagem a Edu 329 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 cação Física escolar que abrange os esportes as lutas as ginásticas a dança os jogos e brincadeiras e também o lazer deixa sua antiga visão instrumental para trás e passa a levar em consideração o contexto social cultural e político na qual se insere fazendo reflexões sobre si própria e acerca do seu modo de ensino Inserida na escola a Educação Física além de ser influenciada pelas relações e discur sos que circulam no universo escolar é também fruto das relações de poder da sociedade mais ampla e por isso reflete em seu campo de estudo as transformações que ocorrem no contexto extraescolar Tendo em vista o contexto escolar e também o contexto para além dos muros da escola é certo que a sociedade brasileira passou por drásticas mudanças políticas que acabaram re fletindo no âmbito da educação Com o mandato da presidente Dilma Roussef interrompido o governo Temer tomou a frente política do país e aprovou novas medidas como a PEC 241 transformada em Emenda Constitucional 952016 referente ao congelamento dos gastos públicos que prevê graves cortes na área da saúde aposentadoria e também educação e a lei 13415 de 2017 que reformula o Ensino Médio BRASIL 2016b BRASIL 2017 Em consonância com essas novas medidas aprovadas está a homologação da terceira e última versão da Base Nacional Comum Curricular BNCC2 Esse documento de caráter normativo reestrutura o sistema de ensino em nível nacional Tendo em vista essas transformações causadas pelas novas medidas implementadas no sistema educacional a Educação Física que tem buscado discussões para abandonar seu viés exclusivamente instrumental e enviesada pelo caráter biológico para ser reconhecida na área da Linguagem e subsidiada pelas Ciências Humanas e Sociais também é parte dos processos de mudanças pelos quais a sociedade vem passando Assim o respectivo artigo tem o propósito de situar a Educação Física no contexto es colar com base na implementação da Base Nacional Comum Curricular e descrever como a BNCC pode impactar o currículo escolar contextualIzação hIstóRIca Introduzida na sociedade brasileira com viés biológico e raízes europeias a Educa ção Física se ancorava na educação do corpo pautada nos métodos ginásticos militaris tas e nos hábitos saudáveis que apoiados nas concepções médicas e militares da época nortearam a área enquanto seu caráter biológico embasada nos discursos higiênicos e eugênicos SOARES 2004 A concepção curricular dominante nesses primórdios baseavase na perspectiva higienista Nela a preocupação central abrangia hábitos de higiene e saúde valorizando a disciplina o desenvolvimento físico e moral tomando como base fundamental a prática de exercícios físicos A fim de concretizar seus objetivos 2 Para saber mais consulte o documento disponível em httpbasenacionalcomummecgovbr 330 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 formativos a ginástica escolar deveria ser simples de fácil execução sem gran des despesas NEIRA NUNES 2009 p 65 No final do século XVIII na Inglaterra o panorama econômico até então estabele cido passou por grandes transformações A chamada Revolução Industrial entrou em cena mudando os meios de produção e por conseguinte os pilares sociais Em uma nova era econômica era necessária uma remodelação política e social que atendesse às novas ne cessidades da sociedade Essa transformação difundiuse não só por toda a Europa mas também mundialmente e foi no início do século XX que a revolução da indústria afetou e transformou diretamente o Brasil Parafraseando Neira e Nunes 2009 a industrialização se consolidou na sociedade e a Educação Física também fez essa consolidação presente em seus discursos nas primeiras décadas do século XX Agora não eram mais necessários os corpos saudáveis e fortes preparados para servi ços duros e militares por intermédio do taylorismo e do fordismo concepções provindas que propuseram novos meios para a produção industrial a ideia de corpo mudou Era pre ciso um contingente de proletários capazes de passarem o dia todo a realizar movimentos repetitivos e fragmentados ou seja aquele trabalhador autônomo que produzia pouco em um dia mas detinha conhecimento acerca de todas as fases de sua produção fora descar tado No mundo industrializado cada trabalhador passou a conhecer apenas uma pequena parcela do todo de produção Por conseguinte os novos modos econômicos refletiram em toda a sociedade até nas propostas de ensino escolar nascera o tecnicismo Naquele contexto os docentes preocupavamse mais em garantir o controle e a obediência ao alunado enquanto os discentes elaboravam estratégias para so breviver aos ditames educacionais memorizavam caprichavam nas aparências dos exercícios mantinhamse em filas etc NEIRA NUNES 2009 p 72 Então os métodos ginásticos foram substituídos por exercícios mecânicos e repetiti vos que representando a fragmentação do todo induziam à meritocracia e à competitivi dade Denominouse o fenômeno de esportivização da Educação Física A pedagogia da EF incorporou sem necessidade de mudar seus princípios fundamentais essa nova técnica corporal o esporte BRACHT 1999a Isso significa que mesmo a Educação Física tendo passado pela esportivização a área continuou com seu viés biológico sem levar em consi deração a ancoragem social das práticas corporais e até mesmo o contexto sociopolítico Denotase claramente como a Educação Física se tornou uma peça fundamental das estratégias de intervenção sobre o corpo ou seja o esforço na disciplinarização no contro le dos indivíduos tendo no corpo um espaço de investimento de poder Tanto nos métodos ginásticos quanto em sua fase de esportivização a Educação Física reconhecia o corpo como algo biológico um alvo de intervenção para manutenção e reprodução da lógica da sociedade capitalista SOARES 2004 Apoiandose em conceitos psicobiológicos a Educação Física marcou sua especifici dade na escola como sendo uma disciplina para desenvolver aspectos motores biológicos 331 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 e psicológicos entretanto sua prática não conseguiu superar uma visão instrumental de Educação Física A partir da década de 1980 a Educação Física criticou sua função de buscar talentos esportivos e começou a se nutrir de conhecimentos de outras áreas para a elaboração de seus currículos SOARES et al 1992 KUNZ 1998 BETTI ZULIANI 2002 NEIRA NUNES 2008 Nesse itinerário de empenho por uma identidade em consonância com a função social da escola a Educação Física também buscou subsídios teóricos nas Ciências Humanas e Sociais principalmente na Pedagogia para pensar a sua prática pedagógica Essa relação ganhou corpo especificamente no âmbito escolar com a aproximação das análises críticas a respeito da função social da educação e particularmente da educação física NEIRA 2007 p 23 Fugindo dos parâmetros mecanicistas essa linha reflexiva da área procurou compre ender o movimento humano não como um produto de sínteses metabólicas ou como um conjunto de alavancas mas como uma ação que está carregada de gestualidade A partir de então no entendimento de Santin 1987 são quatro as concepções defini das sobre o movimento humano a primeira diz respeito à biomecânica nela o movimento humano busca sua eficiência motora regido pelas leis da física mecânica uma vez que o homem é compreendido como uma máquina viva a segunda concepção se baseia na fisiologia do exercício e entende o movimento humano como resultado da produção de energia pautada nos conceitos dos mecanismos metabólicos do organismo a terceira ainda se encontra fortemente presente em determinados currículos da Educação Física pois essa concepção de movimento humano se concentra na aprendizagem das habilidades motoras básicas e se estende à aprendizagem das habilidades motoras específicas enquanto objetivo da área a quarta e última tem como objeto de estudo da Educação Física a cultura corporal já que ao se movimentar o corpo carrega significados construídos culturalmente por indiví duos sociais que se movimentam intencionalmente Finalmente o corpo pode também ser entendido como forma de expressão O que o torna portador de significados e meio privilegiado para expressar senti mentos emoções e toda produção cultural de um determinado grupo social Nesse sentido o movimento humano é uma forma de linguagem e mais facil mente traduzida pelo termo gesto O gesto por sua vez é entendido como um movimento intencional significativo do ponto de vista sociocultural dado que se constrói na relação sujeitocultura e permite a comunicação entre os mem bros de um determinado grupo NEIRA NUNES 2007 p 3 Para esse entendimento fazse necessário ressaltar as contribuições de um livro inti tulado Metodologia do ensino de Educação Física publicado em 1992 por um grupo de professores Carmen Lúcia Soares Celi Taffarel Elizabeth Varjal Lino Castellani Filho Micheli Ortega Escobar e Valter Bracht que definiu a cultura corporal como objeto de conhecimento da Educação Física Sendo assim a cultura corporal passou a ser alvo de atenção da Educação Física que com um novo olhar para o seu campo científico buscou uma nova compreensão acerca de 332 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 suas práticas pedagógicas não mais enviesada pelo caráter biológico mas sim pautada na constituição da cultura dos sujeitos que é expressa por suas práticas de significação Por conseguinte a Educação Física ganhou uma nova inserção nos currículos escolares o per tencimento na área da linguagem o conceIto de lInguagem e a noção de cultuRa Para alguns autores como afirmam Santos Marcon e Trentin 2012 considerar a Educação Física como linguagem não é uma tarefa simples já que essa compreensão en volve conceitos inéditos e pouco transparentes Sendo assim para compreendermos a Edu cação Física como linguagem lançaremos luz sobre as concepções dos diferentes estudio sos da área da Linguagem para primeiro definirmos esse complexo fenômeno Segundo Fiorin 2015 as linguagens podem ser definidas como sistemas de signos usados para a comunicação sejam linguagens verbais escritas visuais como as pinturas ou sonoras como a música Para o autor a linguagem não nos permite somente nomear objetos mas é justamente a possibilidade de transformar o mundo real é a troca de experi ências de ideias de informações a linguagem é veículo da comunicação social Para Hjelmslev é graças à linguagem que o homem vai modelar seus pensamentos sua vida suas emoções e até seus desejos pois o homem não pode se separar da linguagem uma vez que essa o segue em todos os seus atos já que é a base última e mais profunda da sociedade humana HJELMSLEV 2006 p 1 O desenvolvimento da linguagem está tão inextricavelmente ligado ao da personali dade de cada indivíduo da terra da nação da humanidade da própria vida que é possível indagarse se ela não passa de um simples reflexo ou se ela não é tudo isso a própria fonte do desenvolvimento dessas coisas p 2 A sociedade apresenta diferentes modos de vida adotados pelos grupos humanos que a compõem a história de um povo suas crenças anseios vestimentas e também suas prá ticas corporais que são formas de linguagem estão carregadas de significados expressos na interação com o outro Dada a constatação de que não há linguagem sem sociedade e não há sociedade sem grupos culturais uma vez que linguagem e sociedade estão ligadas entre si de modo in questionável mais do que isso podemos afirmar que essa relação é a base da constituição do ser humano ALKIMIN 2006 p 23 é possível afirmar que a linguagem a sociedade e a cultura são componentes inextricáveis ao homem e relacionados entre si Assim como não há sociedade sem linguagem não há sociedade sem comu nicação Tudo o que se produz como linguagem ocorre em sociedade para ser comunicado e como tal constitui uma realidade material que se relaciona com o que lhe é exterior com o que existe independentemente da linguagem a linguagem é relativamente autônoma como expressão de emoções ideias propósitos no entanto ela é orientada pela visão de mundo pelas injunções da realidade social histórica e cultural de seu falante FIORIN 2015 p 11 333 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 Desse modo o fenômeno da linguagem não pode ser compreendido sem levar em consideração a compreensão de cultura pois esta interfere diretamente na visão de mundo e nas formas de relação dos sujeitos O conceito de cultura ganha novas possibilidades de significado na medida em que Cultura transmutase de um conceito impregnado de distinção hierarquia e eli tismos segregacionistas para um outro eixo de significados em que se abre um amplo leque de sentidos cambiantes e versáteis Cultura deixa gradativamente de ser domínio exclusivo da erudição da tradição literária e artística de pa drões estéticos elitizados e passa a contemplar também o gosto das multidões COSTA SILVEIRA SOMMER 2003 p 36 Nesse sentido a cultura não é um fenômeno homogêneo as culturas dos diversos gru pos sociais são diferentes e apresentam diferentes representações e significados para cada grupo da qual faz parte a cultura ganha diferentes interpretações É preciso antes de tudo compreender o fenômeno da cultura como heterogêneo Portanto cada sociedade cada grupo social distinto apresentará uma repercus são corporal igualmente distinta Isso faz com que cada cultura produza homens com hábitos corporais com tipo de movimentos característicos dessa cultura É como se uma marca fosse impressa pelo modo como se vive em outras pala vras pela cultura VAZ 2010 p 102 Como já mencionado a Educação Física abarca o conceito de cultura ao elaborar o termo cultura corporal Deste ponto em diante destacase a noção de cultura para a área Para Daolio 2004 apoiado nos estudos antropológicos de Clifford Geertz para am pliar os horizontes da Educação Física leva em consideração a dimensão cultural simbó lica dos sujeitos e assim o homem passa a ser compreendido como ser cultural contínuo construtor de cultura e esta por sua vez é relacionada aos aspectos corporais Ou seja para Daolio 2004 não pode haver uma visão de homem como ser estrita mente biológico pois o que lhe dá singularidade é a sua ação social que compartilha signos e significados para a construção de diferentes padrões culturais Por exemplo o voleibol é constituído por diversos símbolos porém podem ser atri buídos significados diferentes Sendo assim um grupo de idosos que praticam voleibol por socialização com os amigos ou um tempo de lazer atribui significados diferentes à prática para aqueles profissionais que têm na disputa esportiva a caracterização do seu trabalho Essa interpretação rompe com qualquer possibilidade de hereditariedade cultural e afirma que a cultura é preservada transmitida reproduzida pelos diversos grupos sociais Portanto o patrimônio cultural e histórico da Educação Física é subsidiado pela eficá cia simbólica de suas práticas corporais quando o aluno se apropria de uma prática corpo ral essa aprendizagem permite a aquisição de um universo de significados culturais que são construídos e legitimados na cultura a que pertencem e se passa a aceitar e a compreender certos valores específicos daquela determinada prática VELOZO 2010 334 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 Entretanto é com Soares et al 1992 com o mesmo livro supracitado Metodo logia do ensino de Educação Física que o termo cultura corporal de movimento ganha destaque na área sendo reconhecida como objeto de conhecimento Além disso insere a Educação Física na área da linguagem A Educação Física é uma disciplina que trata pedagogicamente na escola do conhecimento de uma área aqui denominada de cultura corporal Ela será con figurada com temas ou formas de atividades particularmente corporais jogo esporte ginástica dança ou outras que constituirão seu conteúdo O es tudo desse conhecimento visa apreender a expressão corporal como linguagem SOARES et al 1992 p 61 A Educação Física compreendida como linguagem rompe com as barreiras impostas pelo histórico da área pautado unicamente no caráter biológico e passa então a dar um en tendimento mais abrangente sobre o corpo Na relação entre Educação Física e Linguagem o corpo além de apresentar as questões biológicas e fisiológicas é um texto a ser lido e interpretado pois é também no corpo que o ser humano transparece sua identidade sua cultura suas marcas históricas suas crenças Com as práticas corporais não é diferente a partir do momento em que se desconstrói o daltonismo cultural as múltiplas culturas passam a ser encaradas não como melhores ou piores mas como diferentes E desse modo os corpos e os gestos manifestados por esses corpos passam a ser interpretados e ganham diferentes significados com base na cultura e na sociedade em que estão inseridos O corpo em movimento não diz respeito somente ao seu caráter biológico nem tam pouco pode significar o movimento como meio e único fim do ato de movimentarse pois ao dançar lutar jogar praticar esportes praticar ginástica essas práticas corporais ou formas de manifestações culturais são denominadas cultura corporal cultura corporal de movimento ou cultura de movimento NEIRA 2007 p 5 e estão carregadas de signifi cados além do que o corpo que é também uma construção cultural inserido na sociedade manifesta a sua própria linguagem carregada de intenções Ao se movimentar homens e mulheres expressam intencionalidades comuni cam e veiculam modos de ser pensar e agir característicos ou seja cultural mente impressos em seus corpos Qualquer corpo portanto é um suporte tex tual nele se inscrevem a história e trajetória dos homens e da cultura NEIRA NUNES 2007 p 6 Desse modo a linguagem corporal é carregada de significados culturais construídos so cialmente que permitem a compreensão de todo e qualquer movimento não apenas como ato mecânico mas sim como texto a ser lido ancorado no grupo ao qual esse corpo pertence Segundo Neira 2007 os textos produzidos pela linguagem corporal são formas de se comunicar com o mundo e portanto cada texto imprime uma linguagem específica a ser interpretada Ao jogar dançar e correr as crianças comunicam e transformam em lingua gem o movimento p 11 335 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 Foi por meio dessas concepções de movimento objeto da Educação Física compre ensão da sociedade linguagem e cultura que a área passou a fazer parte da linguagem em propostas oficiais de currículos da educação básica SÃO PAULO 2007 JUNDIAÍ 2016 SÃO PAULO 2016 SÃO PAULO 2017 SÃO PAULO 2018 Não se pode deixar de mencionar que o conceito de cultura e por conseguinte de lin guagem também sofrem influências dos Estudos Culturais pois além de rechaçar qualquer concepção elitista de cultura realçarão o aspecto político no entendimento de cultura Surgindo em meio a movimentos de contestação de grupos desprivilegiados da socie dade pelo impedimento da leitura da realidade pelos seus saberes em detrimento de uma vi são elitista os Estudos Culturais se engajam nas propostas de democratização das relações de poder e nas transformações sociais NEIRA NUNES 2009 Para Wortmann e Veiga Neto 2001 os Estudos Culturais imbuídos na Ciência e Educação não buscam definir seu objeto de estudo com concepções bem demarcadas mas sim situálo como campo de conhecimentos e práticas que se relacionam com outros cam pos de estudos examinando as práticas culturais e suas possibilidades de articulação co nhecimento e poder Nesse sentido os Estudos Culturais buscam a multidisciplinariedade uma vez que estu dam os fenômenos sociais e culturais trazendo para o diálogo diferentes questões de identi dade política poder alta e baixa cultura valorização e desvalorização ORTIZ 2004 Imbuídos de uma conotação política os Estudos Culturais entenderão que as socieda des capitalistas são lugares que produzem desigualdades no que se refere à etnia sexuali dade classes gerações entre outros HALL 1997 Assim existe uma disputa para fazer valer a interpretação das práticas culturais por diversos grupos Por exemplo no entendimento de alta cultura aqueles considerados cultos e baixa cultura os sem cultura incultos que precisam ser inculcados da cultura verdadeira são julgamentos estabelecidos pelos representantes da alta cultura ou seja foram os grupos com maior poder de legitimar determinada visão de grupo que se impuse ram sobre aqueles com menor força COSTA SILVEIRA SOMMER 2003 NEIRA NUNES 2009 Por isso que Neira e Nunes 2009 afirmam que a cultura se configura como um terreno de confronto entre diversas práticas de significação que buscam validação e reconhecimento Utilizando as contribuições de Hall 1997 que aponta a relação entre cultura e poder e uma disputa simbólica e discursiva na economia na regulação na produção de identida des e representações entre outras práticas sociais que é possível apontar que É na esfera cultural que se dá a luta pela significação na qual os grupos subor dinados procuram fazer frente à imposição de significados que sustentam os interesses dos grupos mais poderosos Nesse sentido os textos culturais são o próprio local onde o significado é negociado e fixado COSTA SILVEIRA SOMMER 2003 p 38 Por meio dos Estudos Culturais podemos olhar para a Educação Física e reconhecer um campo de constante disputa de significação e identidade para ora um sujeito saudável 336 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 ora um sujeito esportivamente habilidoso e ora um sujeito capaz de reconhecer a diversi dade cultural de movimento Sendo assim olhar para os currículos de Educação Física e as propostas curriculares oficiais da área e da educação denota que houve um intenso processo de disputa para le gitimar determinada visão de Educação Física Educação e das identidades que se querem produzir para um tipo de sociedade Olhar para o currículo também é uma questão de poder Assim privilegiar determinado tipo de conhecimento e não outro é uma operação de poder ou seja assumirdecidir uma identidade ou uma subjetividade entre as múltiplas possibilidades acaba configurando um exercício de poder Portanto aqueles que detêm o poder sobre a construção dos currículos afirmam sua autoridade por meio deles SILVA 2011 YOUNG 2014 a teoRIzação cuRRIculaR A compreensão do currículo pode nos levar a um entendimento de algo estático como uma ideia de uma cultura educacional fixa estável herdada que pretende proporcionar um conhecimento como um fato e informação legítimo para aqueles aprendizes em for mação Nessa linha há também uma interpretação de currículo como um documento legal que descreve o processo de ensino uma ordenação de disciplinas e recomendações didáti cas SILVA 2011 Entretanto ao abordar o currículo é necessário compreender que se trata de um arte fato cultural ou seja algo produzido pelo homem influenciado pelo contexto históricoso cial no momento de sua elaboração Ou seja não se trata de um objeto neutro que apenas retrata uma seleção dos melhores conhecimentos para ser abordado na escola Isso fica claro ao perceber que os estudos curriculares ganharam força no início do século XX no contexto de industrialização e urbanização relacionado ao intenso processo de massificação da escolarização A partir de então começouse a pensar em formatar o currículo para garantir a formação de um sujeito desejável às novas exigências sociais A intenção era introjetar identidades particulares nos estudantes que passavam pela experiên cia curricular NEIRA NUNES 2009 Por essa ideia que Silva 2011 afirma que o currículo é um documento de identidade e que produz subjetividades durante o processo educacional para nos tornar o que somos Por isso que o autor esclarece que o currículo está envolvido por questões de poder afinal selecionar os conhecimentos e formatar a experiência curricular para produção de deter minados sujeitos é uma questão de poder pois se privilegia determinado tipo de conheci mento e não outro e assume uma identidadesubjetividade a ser alcançada e descarta outras múltiplas possibilidades Para Saviani 2016 o conceito de currículo vai além das disciplinas que compõem um curso em se tratando da prática pedagógica o currículo é a própria escola em seu fun cionamento o que inclui o saber sistematizado mas além disso a forma de transmissão e de assimilação dos saberes e até os próprios saberes selecionados 337 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 Os currículos interferem na construção das identidades dos sujeitos presentes no âm bito escolar alunos professores e os demais profissionais pois são veiculadas visões de mundo de sociedade posições ideológicas que marcam os sujeitos ali presentes SILVA 2011 Neira e Nunes 2009 com um olhar advindo dos Estudos Culturais apontam que o currículo é um campo de luta em torno da significação e da identidade ou seja diferentes grupos tentam estabelecer no currículo sua hegemonia e projetar identidades desejáveis Veja que essa análise focaliza a questão do poder Em vista disso é possível indagar quem tem poder para definir quais os conhecimen tos que devem perpassar um currículo Afinal a escolha de determinado conhecimento é a negação de outro Ou que identidade se deseja projetar nos sujeitos por meio da experiên cia curricular Pois assumir determinada identidade é também negar a validade de outras identidades Com esse olhar do currículo enquanto um território de disputas por legitimação de determinados grupos podemos ver o constante debate não só pelos teóricos da área mas pela sociedade civil e pelo setor empresarial em torno da validação dos conhecimentos e práticas dentro das escolas nos jornais mídias sociais e na construção de propostas oficiais de ensino Esse foi o caso da construção da Base Nacional Comum3 VERDE 2015 É possível então afirmar que o currículo como centro de disputas veicula ideologias visões de mundo forma cidadãos e à medida que ensina certos conteúdos deixa de ensinar outros Desse modo vale refletir que o currículo da Base Nacional Comum Curricular obrigatório em todo o país também é composto por essas lutas dos diversos grupos que tentam legitimar suas visões de mundo e pelos diferentes setores da sociedade inseridos no meio educacional educação físIca no âmbIto legal Para compreendermos os motivos pelos quais se aprovou legalmente a construção da Base Nacional Comum Curricular e sua obrigatoriedade nos currículos escolares é antes necessário entender como a Educação Física se insere no sistema educacional brasileiro bem como entender os marcos legais que levaram à implementação da BNCC 3 Essas disputas por legitimação da visão de diferentes grupos fizeram parte da construção da BNCC Em 6 de março de 2018 ocorreu uma discussão nacional nomeada como Dia D e contou com a participação das secretarias municipais e estaduais bem como professores e integrantes da equipe escolar Porém isso só serviu para dar um ar democrático ao documento pois se sabe que a grande influência do BNCC parte de grupos empresariais Existe um movimento chamado Movimento pela Base Nacional Comum que conta com o apoio de instituições privadas e ONGs como a Fundação Lemann Fundação Roberto Marinho Instituto Ayrton Senna Instituto Natura Instituto Unibanco Itaú BBA entre outras Ver em httpmovi mentopelabaseorgbrquemsomos 338 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 É pela Lei 9131 novembro de 1995 e com base nos preceitos legais do artigo 2104 da Constituição Federal de 1988 que o Conselho Nacional de Educação CNE foi criado O Conselho Nacional de Educação bem como a LDB 9394 de 1996 determinados pela Constituição Federal já apontavam a necessidade de Diretrizes Curriculares Nacionais para nortear os currículos das escolas Desse modo através dos encaminhamentos da Constituição Federal da LDB e da criação do CNE os currículos e conteúdos mínimos propostos pelos Pa râmetros Curriculares Nacionais a organização do trabalho educativo nas es colas teriam seu referencial mediado pelas diretrizes curriculares LILIAN 2007 p 16 No que tange o âmbito legal a Educação Física deu seu primeiro passo para ser en tendida como uma disciplina escolar que possui uma proposta pedagógica e que deve ser articulada com o Projeto Político Pedagógico com a Lei de Diretrizes e Bases LDB nº 9394 de 1996 BRASIL 1996 Nesse momento a área não pode mais ser compreendida enquanto mera atividade e passou a ser encarada como componente curricular se igualan do às demais disciplinas A educação física integrada à proposta pedagógica da escola é componente curricular da Educação Básica ajustandose às faixas etárias e às condições da população escolar sendo facultativa nos cursos noturnos BRASIL 1996 Retirase com essa redação a camisa de força que a aprisionava nos limites próprios ao famigerado eixo paradigmático da aptidão física à medida que a vinculava tão somente à busca do desenvolvimento físico do aluno CASTELLANI FILHO 1998 p 18 Iniciando seus primeiros passos para ser desatrelada da aptidão física foi no do cumento oficial dos Parâmetros Curriculares Nacionais PCN BRASIL 1998 que a Educação Física foi reconhecida pela primeira vez como parte da área das linguagens e códigos que até então abrangia somente as disciplinas de Língua Portuguesa Língua Es trangeira Artes e Informática De acordo com Darido e Ladeira 2003 a proposta do documento supracitado era de prover formas de atuação para que os profissionais de Educação Física promovessem o desen volvimento dos alunos em sua totalidade Entretanto apesar de representar um avanço para a Educação Física escolar o documento foi fortemente criticado pela escassa democracia no momento de sua constituição e além disso a inserção da Educação Física no componente cur ricular das linguagens e códigos foi apenas superficialmente discutido e de forma acrítica por isso vimos um processo de questionamento de sua proposta tanto em termos legais quanto em relação às mudanças efetivas na prática pedagógica dos professores Recentemente a construção da Base Nacional Comum Curricular assim como os documentos anteriores a ela fizeram novas atribuições para o campo da Educação Física e por isso contamos com uma análise mais atenta para esse documento 4 Ver artigo 210 httpwwwsenadolegbratividadeconstcon1988con198812072016 art210asp 339 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 um olhaR cRítIco sobRe a bncc A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 22 Inciso XXIV delega à União o poder de legislar acerca das diretrizes e bases da educação nacional visto isso a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional BRASIL 1996 já previa a construção de uma base comum para a educação desde o ano de sua promulgação A Base Nacional Comum Curricular é um documento de caráter normativo cuja cons tituição teoricamente prevê equidade pluralidade superação de barreiras no ensino edu cacional brasileiro bem como um lugarcomum para que todos os estudantes em nível nacional tenham garantidos os seus direitos de acesso políticas de permanência e o de senvolvimento de suas competências e habilidades durante as etapas da Educação Básica A BNCC teve sua terceira e última versão homologada em 2017 pelo Conselho Na cional de Educação CNE e passa a ser obrigatória para a elaboração dos currículos esco lares de todo o país Mas antes dessa versão final ser elaborada o documento passou por duas versões anteriores que tiveram diferentes características nos processos de construção e contaram com diferentes críticas A primeira versão da BNCC recebeu fortes críticas tanto de conservadores que com preendiam o texto como aquém do ideal para transmissão de conhecimentos quanto de progressistas que esperavam um maior engajamento político do documento A segunda versão do documento publicada em abril de 2016 se mostrava mais democrática não só nas etapas de construção já que contou com milhões de sugestões e contribuições da socie dade brasileira pelo portal da BNCC e por outros veículos de comunicação mas também nos ideais e descrições realizados por todo o documento NEIRA JÚNIOR 2016 A segunda versão da BNCC colocava em questão os princípios éticos políticos e estéticos se mostrava em prol das discussões sobre diversidade pluralidade questão de gênero classe além disso revelava ser dever da educação formar sujeitos para uma so ciedade menos injusta menos desigual mais inclusiva e que reconhece as diferenças Já a versão final homologada além de fazer apenas uma alusão às questões supracitadas insere o desenvolvimento de competências no lugar dos direitos de aprendizagem e desenvolvi mento NEIRA 2017 Além disso a versão final homologada da Base Nacional Comum Curricular contém um enfoque cognitivista e instrumental de modo diferente do que propõe a inserção da Educação Física na área da Linguagem o que causa um retrocesso não só para a área da Educação Física mas também para a educação em geral já que há o esvaziamento críti co e democratizante para dar lugar a uma formação instrumental alinhada aos ditames do mercado NEIRA 2017 p 5 De acordo com Marsiglia et al 2017 foi a partir do golpe jurídicomidiáticoparla mentar de Estado que ocorreu uma significativa mudança nos cargos ocupados pelos res ponsáveis pela construção da Base Nacional Comum Curricular e essa mudança implicou graves consequências na elaboração do documento Com novos sujeitos envolvidos no âmbito educacional as reformas educacionais passaram a obedecer aos ditames do setor empresarial o que acarretou na 340 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 ausência de referência em relação aos conteúdos científicos artísticos e filosóficos e a ênfase em métodos procedimentos competências e habilida des voltadas para a adaptação do indivíduo aos interesses do grande capital Expressando a hegemonia da classe empresarial no processo de elaboração do documento MARSIGLIA et al 2017 p 109 O artigo 26 da LDB 939496 prevê uma base nacional comum para o ensino escolar contendo também uma parte diversificada a ser elaborada Essa parte diversificada é refor çada pelo Ministério da Educação na resolução nº 7 de 14 de dezembro de 20105 que fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental não é claro porém a que instância cabe a eleição dos conteúdos curriculares a partir das diretrizes propostas pela União através da LDB LIMA VERDE 2015 p 81 Assim os conteúdos curriculares e essa parte diversificada já prevista na LDB ficam à mercê da iniciativa privada como é o exemplo do movimento Todos pela Educação TPE6 que apesar de se afirmar como apartidário e plural é mantido por grandes empresas priva das e estas acabam fazendo parte do Fórum Nacional de Educação É necessário ressaltar que o Fórum Nacional de Educação criado pela Porta ria MEC nº 140710 legitimado pelo Plano Nacional de Educação Lei nº 1300514 é formado por 44 entidades representantes da sociedade civil e do poder público sendo algumas de suas cadeiras ocupadas por membros do Mo vimento Todos pela Educação LIMA VERDE 2015 p 86 Em sua versão final promulgada em 2017 a Base Nacional Comum Curricular passa a estipular competências para os estudantes desenvolverem no decorrer dos nove anos do ensino fundamental Ao longo da Educação Básica as aprendizagens essenciais definidas na BNCC devem concorrer para assegurar aos estudantes o desenvolvimento de dez com petências gerais que consubstanciam no âmbito pedagógico os direitos de aprendizagem e desenvolvimento BRASIL 2017 A educação deve de acordo com a Constituição Federal e LDB desenvolver a pes soa em sentido pleno desde o exercício da cidadania aprimoramento como ser humano até o preparo para o trabalho Mas essa finalidade do sistema educacional não poderá se concretizar Com currículos que pretendam conferir competências para a realização das tarefas de certo modo mecânicas e corriqueiras demandadas pela estrutura ocupacional concentrandose na questão da qualificação profissional e secun darizando o pleno desenvolvimento da pessoa e o preparo para o exercício da cidadania tal como se evidencia na proposta divulgada pelo MEC sobre a base nacional comum curricular SAVIANI 2016 p 82 5 Resolução nº 7 de 14 de dezembro de 2010 fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Funda mental de 9 nove anos Vide httpportalmecgovbrdmdocumentsrceb00710pdf 6 Empresas mantenedoras do TPE 2018 Vide httpswwwtodospelaeducacaoorgbrpagotodosbloco76 341 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 Como já descrito apesar de a promulgação da Base Nacional Comum Curricular estar prevista e já ser exigida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nas Diretrizes Curriculares Nacional e no próprio Plano Nacional de Educação o modo como se deu a transição da segunda para a terceira versão do documento representou um retrocesso para a educação E essa transição da segunda para a terceira versão do documento da BNCC foi reflexo dos processos políticos ocorridos na sociedade mais ampla Com a mudança do cargo à presidência muitos dos sujeitos que participaram da primeira e segunda versão da BNCC também foram substituídos o que acarretou na influência do setor empresarial na composição final do documento Especificamente para a Educação Física conforme também alertou Neira 2017 não há na versão final homologada os seguintes preceitos que constavam na segunda versão do documento Compreender e valorizar os diferentes sentidos e significados das brincadeiras e jogos populares do contexto comunitário e regional da cultura indígena e da afrobrasileira p 248 Contribuir no enfrentamento de situações de injustiça e preconceito geradas e ou presentes no contexto da prática esportiva com ênfase nas problemáticas de gênero e na produção de alternativas democráticas para sua superação p 392 Enfrentar com autonomia situações de injustiça e preconceito geradas eou presentes no contexto da prática esportiva e produzir alternativas para sua supe ração com especial atenção nas questões étnicoraciais e indígenas BRASIL 2016 p 398 grifos do autor E já na terceira versão da BNCC as práticas corporais são definidas com elementos comuns que retomam os antigos ideais de Educação Física já descritos no contexto histórico da área com base nos métodos higienistas e que também retomam conceitos cognitivistas Há três elementos fundamentais comuns às práticas corporais movimento cor poral como elemento essencial organização interna de maior ou menor grau pautada por uma lógica específica e produto cultural vinculado com o lazer entretenimento e ou o cuidado com o corpo e saúde BRASIL 2017 p 211 O apagamento dos preceitos já citados e que faziam parte da BNCC em processo de construção se somados às concepções acríticas da terceira versão da Base Nacional Comum Curricular e que retomam o caráter higienista e cognitivista da Educação Física representam não só um extremo retrocesso para a área mas também podem significar um perigo para o próprio campo da Educação Física como também um distanciamento da construção da área enquanto Linguagem 342 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 consIdeRações fInaIs É fato que a área da Educação Física se reformulou com o passar do tempo seus objetivos anteriormente pautados na disciplinarização dos corpos e nos hábitos de saúde deram lugar à cultura corporal Então conforme é perceptível nos documentos legais PCN e BNCC e em propostas oficiais de currículos de Educação Básica citando como exemplo os currículos da cidade de São Paulo já mencionados a Educação Física passou a questionar seu campo teórico e buscou refletir sobre a sociedade mais ampla com base nos Estudos Culturais nas Ciências Humanas ganhando sua inserção no componente das Linguagens BRASIL 1998 BRASIL 2017 SÃO PAULO 2007 SÃO PAULO 2016 SÃO PAULO 2017 SÃO PAULO 2018 Agora contextualizada com as questões políticas econômicas e sociais da sociedade brasileira a Educação Física procura refletir sobre os processos de transformação do âmbi to da educação escolar o que representa um grande avanço para a área Diante de tudo o que foi dito sobre teorização curricular concluise que ter um docu mento como a Base Nacional Comum Curricular sendo obrigatória em todo o país com a força de orientar os currículos de todas as escolas brasileiras partindo do princípio de ele ger os mesmos conteúdos para grupos muito distintos não condiz com a sociedade multi facetada tampouco com a pluralidade das culturas existentes em todo o território nacional Além disso no que diz respeito ao processo de construção da BNCC é possível notar um significativo rompimento entre a segunda e a terceira versão final publicada A segunda versão se mostrava muito mais aberta ao diálogo acessível aos profissionais da educação e à comunidade também continha um teor mais democrático no sentido de formação de cidadãos críticos e prontos para o exercício da cidadania Enquanto que o documento final publicado ocasionou o apagamento de muitas dessas contribuições e também retrocedeu a BNCC aos preceitos cognitivistas e instrumentais Outra observação facilmente realizada é a de que a versão final publicada da Base Nacional Comum Curricular apesar de teoricamente se dizer plural e afirmar a busca pela equidade e superação das injustiças sociais é um documento totalmente voltado para as instituições privadas para o desenvolvimento de competências para o setor empresarial o que além de distanciar os alunos de uma formação mais democrática acaba por representar um retrocesso para a educação Em suma é inegável que a Base Nacional Comum Curricular irá impactar os cur rículos escolares e com base no que foi apresentado é evidente que as consequências da apropriação obrigatória desse documento por parte de todos os sujeitos envolvidos no contexto educacional não agregarão contribuições críticas e de superação das injustiças sociais principalmente depois da drástica mudança da segunda para a terceira versão do documento pois apresenta retrocessos políticos e pedagógicos 343 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 RefeRêncIas ALKIMIN T M Sociolinguística Parte I In MUSSALIM F BENTES A C Introdu ção à Linguística domínios e fronteiras v 1 6 ed São Paulo Cortez 2006 p 2147 BETTI M ZULIANI L R Educação física escolar uma proposta de diretrizes peda gógicas Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte São Paulo ano 1 n 1 p 7381 2002 Disponível em httpeditorarevistasmackenziebrindexphpremefarticle view13631065 Acesso em 8 ago 2018 BRACHT V A constituição das teorias pedagógicas da educação física Cadernos Cedes Campinas ano XIX n 48 p 6988 ago 1999a Disponível em httpwwwscielobrpdf ccedesv19n48v1948a05pdf Acesso em 15 mar 2018 BRACHT V Educação Física e ciência cenas de um casamento infeliz Ijuí Unijuí 1999b BRASIL Texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988 Constituição da República Federativa do Brasil Disponível em wwwplanaltogovbrccivil03consti tuicaoconstituicaohtm Acesso em 11 set 2018 Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional Brasília DF 1996 Disponível em httpportalmecgovbrseespar quivospdflei9394ldbn1pdf Acesso em 10 set 2018 Secretaria de Educação Fundamental Parâmetros Curriculares Nacionais Edu cação Física 3º e 4º ciclos v 7 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Jundiaí SP Prefeitura Municipal de Jundiaí SP 2016 392p 345 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 KUNZ E Org Didática da educação física 1 Ijuí Ed Unijuí 1998 LIMA VERDE P Base Nacional Comum desconstrução de discursos hegemônicos sobre currículo mínimo Terceiro Incluído Goiânia v 5 n 1 p 7897 janjun 2015 Disponível em httpswwwrevistasufgbrteriarticleview3634818704 Acesso em 11 set 2018 MARSIGLIA A C G PINA L D MACHADO V O LIMA M A Base Nacional Comum Curricular um novo episódio de esvaziamento da escola no Brasil Germinal Marxismo e Educação em Debate Salvador v 9 n 1 p 107121 abr 2017 Disponível em httpsportalseerufbabrindexphprevistagerminalarticleview2183514343 Acesso em 11 set 2018 NEIRA M G Ensino de educação física São Paulo Thomson Learning 2007 Coleção idéias em ação coordenadora Anna Maria Pessoa de Carvalho Terceira versão da BNCC retrocesso político e pedagógico In CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE CONGRESSO INTERNACIONAL DE CIÊNCIAS DO ESPORTE XXVII 2017 Goiânia Anais Goiânia sn 2017 p 16 Disponível em httpwwwgpeffeuspbrtesesmarcos38pdf Acesso em 10 set 2018 NEIRA M G JÚNIOR M S A educação Física na BNCC procedimentos concep ções e efeitos Motrivivência Florianópolis v 28 n 48 p 188206 set 2016 Dis ponível em httpsperiodicosufscbrindexphpmotrivivenciaarticleview2175 80422016v28n48p18832570 Acesso em 15 ago 2018 NEIRA M G JÚNIOR W A ALMEIDA D F A primeira e segunda versões da BNCC construção intenções e condicionantes EccoS Rev Cient São Paulo n 41 p 3144 set dez 2016 Disponível em httpperiodicosuninovebrindexphpjournaleccospagearti cleopviewpath5B5D6807path5B5D3374 Acesso em 15 ago 2018 NEIRA M G NUNES M L F Educação Física currículo e cultura São Paulo Phorte 2009 Linguagem e cultura subsídios para uma reflexão sobre educação do corpo Ca ligrama v 3 n 3 p 116 setdez 2007 Disponível em httpwwwrevistasuspbrcali gramaarticleview6620168812 Acesso em 15 ago 2018 ORTIZ Renato Estudos Culturais Tempo Social USP jun 2004 SANTIN S Educação física uma abordagem filosófica da corporeidade Ijuí Unijuí 1987 346 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 SANTOS F MARCON D TRENTIN D T Inserção da Educação Física na área de Lin guagens Códigos e suas Tecnologias Motriz Rio Claro v 18 n 3 p 571580 julset 2012 Disponível em httpwwwscielobrpdfmotrizv18n3a17v18n3pdf Acesso em 7 ago 2018 SÃO PAULO Secretaria Municipal de Educação Diretoria de Orientação Técnica Orien tações curriculares e proposição de expectativas de aprendizagem para o Ensino Fun damental ciclo II Educação Física Secretaria Municipal São Paulo SMEDOT 2007 104p SÃO PAULO Secretaria Municipal de Educação Coordenadoria Pedagógica Divisão de Ensino Fundamental e Médio Direitos de aprendizagem dos ciclos interdisciplinar e autoral Educação Física São Paulo SMECOPED 2016 Coleção Componentes Curri culares em Diálogos Interdisciplinares a Caminho da Autoria 80p SÃO PAULO Secretaria Municipal de Educação Coordenadoria Pedagógica Currículo da Cidade Ensino Fundamental Educação Física São Paulo SMECOPED 2017 128p SÃO PAULO Secretaria Municipal de Educação Coordenadoria Pedagógica Orientações didáticas do currículo da cidade Educação Física São Paulo SMECOPED 2018 96p SAVIANI D Educação escolar currículo e sociedade o problema da Base Nacional Co mum Curricular Movimento v 3 n 4 p 5484 2016 Disponível em httpwwwrevis tamovimentouffbrindexphprevistamovimentoarticleview296301 Acesso em 22 jun 2018 SILVA T T Documentos de identidade uma introdução às teorias do currículo Belo Horizonte Autêntica 2011 SOARES C L Educação Física raízes européias e Brasil 3 ed Campinas SP Autores Associados 2004 SOARES C L et al Metodologia do ensino de Educação Física São Paulo Cortez 1992 VAZ A C Educação corpo e movimento Curitiba IESDE 2010 VELOZO E L A educação física e as práticas corporais entre a tradição e a modernidade In DAÓLIO J Educação física escolar olhares a partir da cultura Campinas SP Auto res Associados 2010 347 Comunicações Piracicaba v 26 n 1 p 327347 janabr 2019 WORTMANN M L C VEIGA NETO A Estudos culturais da ciência e educação Belo Horizonte Autêntica 2001 136p YOUNG M Teoria do currículo o que é e por que é importante Cadernos de Pesquisa São Paulo v 44 n 155 p 190202 janmar 2014 Artigo elaborado a partir da iniciação científica A Educação Física no campo da Lingua gem as concepções da área e a prática docente na escola orientador Me Fábio Tomio Fuzii mestre em Ciências da Motricidade Humana pela UNESPRio Claro e professor do curso de Educação Física da Universidade Cruzeiro do Sul Financiamento PIBIC Cruzeirodosul dados dos autoRes baRbaRa cRIstIna aPaRecIda dos santos Graduação em Licenciatura em Educação Física pela Universidade Cruzeiro do Sul Gra duanda em Bacharel em Educação Física pela mesma instituição Graduanda em Letras pela Universidade Federal de São Paulo São PauloSP Brasil barbaracontatouniversi tariohotmailcom fábIo tomIo fuzII Mestre em Ciências da Motricidade pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho UNESPRio Claro e graduado em Licenciatura em Educação Física pela mesma Instituição Professor do curso de Licenciatura e Bacharelado em Educação Física da Uni versidade Cruzeiro do Sul São PauloSP Brasil fabiofuziicruzeirodosuledubr Submetido em 29102018 Aceito em 442019