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58 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 pm i Pernambuco 1817 encruzilhada de desencontros do Império lusobrasileiro LUIZ CARLOS VILLALTA Notas sobre as idéias de pátria país e nação LUIZ CARLOS VILLALTA é professor da Universidade Federal de Minas Gerais REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 pmio59 i ér 1817 DO REINO UNIDO A PERNAMBUCO DO RIO AO RECIFE Março de 1817 No Rio de Janeiro Dom João VI ainda não aclamado rei era o soberano de fato do Reino Unido de Portugal Brasil e Algarves Estabelecido na porção mais rica de seus domínios o monarca português dava demons trações de que viera mesmo para edificar na América um novo império afastando a idéia de retorno a Lisboa e ele vando em 1815 o Brasil à condição de Reino Unido a Portugal e Algarves com o que se assistiu a um fervor de patriotismo imperial 1 O Brasil deixara de ser na prá tica colônia em janeiro de 1808 quando da passagem de D João pela Bahia e da abertura dos portos seguida da insta lação da Corte no Rio de Janeiro em fevereiro do mesmo ano e da autorização para a instalação de manufaturas de providências visando à dinamização das atividades agrícolas e pecuárias e de uma série de medidas pelas quais se cria vam na cidade do Rio de Janeiro órgãos superiores da administração régia se dinamizavam sua vida cultural e a aformoseavam fazendo da América o eixo das preocupa ções da monarquia Em torno do rei nobres burocratas comerciantes de grosso trato grandes proprietários mi litares vindos de Portugal ou naturais do Brasil estabeleci dos no CentroSul constituíam uma rede de interesses comuns definiam afinidades alianças interiorizando a metrópole com o que de um lado afastavamse das for ças colonialistas estabelecidas na pátriamãe e de outro subjugavam política e economicamente as demais regiões do continente do Brasil convertidas em neocolônias agora do Rio de Janeiro 2 Falecida Dona Maria I Dom João preparava a sua aclamação como rei seria o primeiro mo narca português a ser coroado em território americano 3 Agradeço a Íris Kantor Regina Horta Duarte e Cristina Isabel Campolina de Sá pelas sugestões e críticas Por motivo editorial as notas se encontram no final deste artigo REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 60 participar do processo de produção ou mi gravam para centros urbanos em ambos os casos vivendo em condições precárias muito suscetíveis a catástrofes naturais como as secas e constituindo uma popula ção marginal sensível a manifestações de rebeldia de qualquer ordem Leite 1984 pp 225 Março de 1817 Ainda Em Pernam buco desde 1804 era governador Caetano Pinto de Miranda Montenegro figura con trovertida Para alguns era digno da qua dra que dizia Caetano no nome Pinto na falta de coragem Monte na altura e Negro nas ações Quintas 1985 p 214 Para outros seria um governador tolerante li beral civil jurisconsulto posição essa em parte assentada no fato de as câmaras do Recife e de outras localidades manifesta remse a favor da sua permanência à frente do governo antes de concluirse seu pri meiro ano de gestão posição ratificada por figuras importantes do cenário político lo cal Lima 1996 pp 4989 Francisco Muniz Tavares personagem que se envol veu na Revolução Pernambucana de 1817 referendou essa avaliação classificandoo como varão probo iluminado e prudente e acrescentando que ao contrário de seus predecessores e de outros governadores de capitanias reconhecia limites à sua autori dade Tavares 1917 p LXXVIII A ori gem das avaliações negativas sobre Monte negro talvez esteja no fato de o mesmo ter como diretrizes a ampliação da arrecada ção fiscal para manter a Corte e a conquis ta da Guiana Francesa que consumia re cursos e homens Quintas 1985 pp 214 5 Outro senão sobre sua atuação estava nos atrasos do pagamento dos militares segundo Hipólito José da Costa devido aos tributos excessivos decorrentes da conquis ta da Banda Oriental do Rio da Prata e de acordo com o conde de Palmela por ser econômico em excesso o que causava descontentamentos na tropa regular Lima 1996 pp 4968 Em Pernambuco ade mais o monopólio comercial da Compa nhia de Comércio de Pernambuco e Paraíba extinta em 1780 foi sucedido pelo mono pólio de muitos na medida em que mer Enquanto esse fidelíssimo monarca reina va o mercado brasileiro dava mostras de maior integração o que tinha efeitos sobre as identidades políticas em constituição Esse mercado além disso disputado pelos Esta dos Unidos França e Inglaterra 4 embora contasse com a presença de representantes comerciais norteamericanos nos principais portos da colônia era presa da Inglaterra que vencia a competição beneficiada por uma sucessão de situações o contrabando a abertura dos portos em 1808 e o Tratado de Comércio de 1810 que legalizava as rela ções comerciais diretas da Inglaterra com o Brasil e concedialhe vantagens aduaneiras Março de 1817 No Nordeste os efeitos da recessão eram agravados pela seca ocor rida no ano anterior que diminuíra a pro dução dos setores de abastecimento e da agroexportação tendo essa última caído a níveis inferiores aos anos 180507 Os gran des proprietários ligados à exportação os quais já se debatiam com as conseqüências da valorização das terras decorrente da expansão algodoeira que levava à disputa pelas terras de segunda categoria viam com o quadro de recessão aumentar sua insta bilidade antigos proprietários sem recur sos foram obrigados a dispor de parte ou do todo das terras e ainda dos escravos Lei te 1984 p 17 A preeminência reforçada da agroexportação por seu turno juntamen te com a seca tinha efeitos mais negativos ainda para a produção voltada para o abas tecimento indo na contramão do cresci mento da demanda de gêneros de subsis tência sobretudo na capital de Pernambu co a qual nessas condições tinha que ser satisfeita por meio da importação de gêne ros alimentícios de outras capitanias que se encontravam encarecidos por causa da Guerra no Uruguai Em função disso tudo havia carestia de mantimentos principal mente da farinha e também do feijão com fome para os setores populares Lima 1996 pp 4967 O potencial de conflitos acen tuavase ademais por causa da situação daqueles que haviam perdido recentemen te suas propriedades no campo ou que já se encontravam há muito na categoria de despossuídos eles eram requisitados para REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 61 cadores portugueses dominavam o comér cio mesmo após a abertura dos portos em 1808 Tavares 1917 p CLXV Leite 1984 p 18 Mota 1972 p 22 Os grandes pro prietários rurais aflitos com as dívidas pendentes com a Companhia de Comércio extinta eram penalizados pelo monopólio dos comerciantes portugueses que impu nham preços altos aos produtos que aque les importavam incluindose aí a própria mãodeobra isto é os escravos africanos e inversamente preços baixos aos gêne ros que exportavam Nessas condições os grandes proprietários encontravamse em uma situação de dependência em relação aos comerciantes portugueses e aos atraves sadores Nas tropas igualmente havia ten sões a separar brasileiros e portugueses Portugueses e brasileiros disputavam os postos mais elevados da hierarquia militar A legislação estabelecida com a chegada da Corte favorecia as tropas de linha em detrimento das milícias no que se refere à obtenção de patentes para novos postos sendo que as tropas de linha geralmente identificavamse com os portugueses e as tropas auxiliares com os nascidos no Bra sil Leite 1984 pp 301 Nas tropas auxi liares havia atritos entre brancos e homens de cor pois os primeiros comandavam os regimentos de negros e pardos Nesse con texto deuse a emergência de uma luso fobia de sentimentos e ações contra os portugueses acusados de monopolizar os melhores empregos civis e militares os maiores proventos e tudo mais de bom na terra invejados pelos bens que possuíam pelo envolvimento no comércio Lima 1996 p 498 Toda essa situação trazia também tensões latentes entre os des possuídos no campo e na cidade e os indi víduos das classes proprietárias brasilei ros e portugueses ainda que os últimos fossem convertidos em bodes expiató rios engendrava ainda tensões entre homens brancos e homens de cor Em meio a tantos conflitos Pernambuco assistia à circulação de livros e idéias que incitavam à sedição da França as idéias de Condorcet Mably Raynal Rousseau Volney Voltaire etc e as constituições revolucionárias de 1791 1793 e 1795 que eram pregadas em praça pública em Recife dos EUA a Constituição Mota 1972 pp 312 As idéias de revolta eram reforçadas pelos exemplos de movimentos bemsuce didos ocorridos em outras terras se a inde pendência das colônias inglesas da América do Norte estimulava os grandes proprietá rios e a Revolução Francesa era admirada pelos setores menos aristocráticos o Haiti entusiasmava os envolvidos diretamente no mundo do trabalho Mota 1972 pp 301 Tavares 1917 p LXXXV Quintas 1985 p 216 Os pernambucanos ainda esta vam atentos aos acontecimentos das ex colônias espanholas acompanhando com particular empenho os progressos dos in surgentes espanhóis que fermentavam os espíritos conforme relatou o capitão Hareng de passagem por Recife em 1816 Mota 1972 pp 3343 Para essa fermen tação é preciso dizer havia contribuições locais a influência doutrinária do padre Ma nuel Arruda Câmara 17521811 doutor em medicina por Montpellier com passa gem anterior pela Universidade de Coim bra Médico estabelecido em Pernambuco desde 1796 Arruda Câmara desenvolvera pesquisas no domínio das ciências naturais e defendera idéias como a igualdade de oportunidade para os homens de cor Com a monarquia ou sem ela deve a gente de cor ingresso na prosperidade do Brasil e o panamericanismo sejam unidos com esses nossos irmãos da América Inglesa e Espanhola porque tempo virá de sermos todos um e quando não for assim susten tem uns aos outros Cartalegado 1810 apud Barreto 1985 p 208 Por fim a ma çonaria 5 e as academias 6 em sua ação eram afetadas e ao mesmo tempo acentua vam a fermentação revolucionária 7 1817 Império lusobrasileiro Reino Unido de Portugal Brasil e Algarves Rio de Janeiro Nordeste Pernambuco este artigo centrase nos dois últimos territó rios voltandose especificamente para o es tudo da denominada Revolução Pernam bucana Movimento que exprimiu a fermen tação revolucionária existente no Nordeste próximo ao final da segunda década do REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 62 século XIX e ao mesmo tempo levou ao adiamento da aclamação de ElRei Dom João VI constituiu uma encruzilhada de desencontros ponto de confluência de contradições entre as partes e os atores do Império lusobrasileiro sediado no Rio de Janeiro ponto ademais que indicava caminhos e perigos diversos para essas mesmas terras e gentes abrindo perspecti vas distintas de devir para o Brasil ou para os Brasis 8 A revolução protagoni zada pelos pernambucanos de fato cons tituise como um movimento de grande im portância no processo de emancipação política do Brasil foi a mais ousada e ra dical tentativa de enfrentamento até então vivido pela monarquia portuguesa em toda sua história Bernardes 2001 p 163 Anunciou percepções essenciais num pro cesso de independência de colônias situa ção da América Portuguesa naquele mo mento particularmente do Nordeste o an tagonismo entre colonizados e colonizador personificado nas figuras do brasileiro e do português e a oposição entre Colônia e Metrópole 9 Somou a isso a repulsa à administração monárquica que presidia o empreendimento colonial da metrópole interiorizada delineando uma identidade por meio de uma rejeição dupla ao ele mento reinol e à Coroa Ao mesmo tempo os pernambucanos agiram como forças cen trífugas regionalizantes que hostilizavam a hegemonia do CentroSul sobre o restan te das possessões americanas de ElRei embaralhando a dicotomia brasileirospor tugueses e os esforços desenvolvidos pelo monarca com vista a romper com a des centralização políticoadministrativa que imperara em todo o período colonial passo essencial para a preservação do Império lusobrasileiro então sediado na América 10 Contudo os pernambucanos revolu cionários deixavam a porta aberta para a incorporação à República por eles instituí da do conjunto dos brasileiros e de parcela dos portugueses vendose como parte de uns e outros devotando evidente hostilida de em relação aos últimos ocultada e nega da por motivos estratégicos e exigindo apenas de ambos portugueses e brasilei ros a adesão à causa republicana antitirânica anticolonial defensora da pro priedade e da escravidão Essa situação à primeira vista pode parecer paradoxal porém um olhar mais cuidadoso levará a uma avaliação divergente ela é óbvia pois nessa época os colonos reconheciamse como paulistas baianos mineiros pernambucanos e entendiam ao mesmo tempo que ser paulista pernambucano ou bahiense significava ser português ainda que se tratasse de uma forma diferenciada de sêlo isto é ser português da América Jancsó Pimenta 2000 pp 1367 As últimas bandeiras dos revolucioná rios pernambucanos a manutenção da es cravidão e da propriedade cumpre adian tar viramse ameaçadas no curso do pró prio movimento por eles protagonizados e mais tarde tornaramse elementos que aju daram a cimentar a unidade das classes proprietárias do Brasil em torno do projeto imperial liderado por D Pedro I calando as forças centrífugas Como assinala Maria Odila Leite Silva Dias a semente da na cionalidade brasileira nada teria de re volucionário a monarquia a continuidade da ordem existente eram as grandes preo cupações dos homens que forjaram a tran sição para o império A insegurança social cimentaria a união das classes domi nantes nativas com a vontade de ser brasi leiros dos portugueses imigrados que vie ram fundar um novo império nos trópicos Dias 1982 p 180 A República Pernambucana realizou durante meros 74 dias uma possibilidade de independência que fragmentava a Amé rica Portuguesa possibilidade essa aborta da anteriormente com o êxito da repressão contra as Inconfidências de Minas em 1789 e da Bahia em 1798 movimentos que por sua vez traziam projetos diferentes de Bra sil ou melhor de Minas e Bahia Por essas razões neste artigo querse também anali sar as identidades que sustentavam de um lado a revolução de Pernambuco e de outro a reação monárquica querse defi nir as idéias de pátria país e nação bem como as apropriações feitas da história por ambos os lados em conflito Não constitui REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 63 meu objetivo adianto confrontar o sucedi do aqui com o que ocorria mais ou menos à mesma época na Europa e em outras partes da América para o que remeto os leitores aos trabalhos de István Jancsó e João Paulo Pimenta 2000 e sobretudo de Márcia Berbel 2001 com os quais procuro mo destamente dialogar Da última retiro a constatação de que o próprio conceito de nação no período em exame encontravase indefinido no Brasil e no mundo sendo essa indefinição a referência para os atores polí ticos de então malgrado o desenvolvimento da idéia de nação como unificador da co munidade imaginada como soberana a par tir do século XVIII esse entendimento só foi consagrado ao final do século XIX con vivendo com a idéia de nação como o con junto de súditos de um mesmo rei concep ção que se associava a uma idéia de sobera nia calcada nos direitos das dinastias Anderson 1989 Berbel 2001 p 1 11 Devolhe ainda a percepção de que no Brasil do período nem sempre se usava a palavra nação sendo mais freqüentes os termos patriota e pátria palavra que no entan to ao longo da história assumiu significa dos bem diferentes sendo extremamente politizada pela Revolução Francesa a partir da associação com a defesa do que era públi co e com uma série de valores que consagra vam a liberdade política dentro do Império português no início do século XIX segun do a autora correspondia ao local de nasci mento e mais precisamente na perspectiva dos governos reformistas ilustrados ibéri cos implicava um incentivo à fidelidade ao soberano Berbel 2001 p 23 Disso decorreu por um lado que a defesa da Pátria valores morais e políticos tenha se confundido com a defesa do Estado e se distanciado da defesa da nação comunida de política imaginada como soberana e por outro lado que a defesa da Pátria tam bém se distanciasse e por vezes tenha se oposto da defesa da pátria o local de nas cimento Hobsbawn 2002 p 28 Berbel 2001 p 4 Em relação a István Jancsó e João P Pimenta registro o débito referente ao entendimento de que na passagem do século XVIII para o século XIX a percep ção de crise não se deu de modo uniforme com o que das diferentes percepções resul taram múltiplos projetos políticos cada qual expondo com maior ou menor nitidez o esboço da comunidade humana cujo futuro projetavam correspondendo a distintas definições de Estado cidadania condições de inclusão e exclusão padrões de lealda de e critérios de adesão Jancsó Pimenta 2000 p 136 1817 foi um dos momentos de explicitação dessa diversidade DE PERNAMBUCO 1817 A MINAS 178889 E BAHIA 179398 VOLTA AO PASSADO A Inconfidência de Minas foi uma cons piração abortada protagonizada por pes soas cujas origens se circunscreviam às elites os condenados por Dona Maria I que não se enquadram nesse perfil não tiveram nenhuma expressão nas discussões de que se constituiu o movimento enquanto em solo soteropolitano assistiuse à gestação de um projeto de revolução que articulava de modo fluido e ainda hoje difícil de precisar as elites locais e os indivíduos egressos da escravidão ou que ainda se en contravam no estado de cativos Se a In confidência Mineira pode ser associada às rebeliões ocorridas anteriormente na capi tania de Minas Gerais e ao mesmo tempo à independência dos Estados Unidos e à Restauração Portuguesa de 1640 na Bahia a fonte de inquietação e inspiração foi a Revolução Francesa Villalta 2000a pp 31920 12 Enquanto em Minas Gerais as Luzes conjugaramse com tradições his tóricoculturais lusobrasileiras com des taque para as teorias corporativas de poder da Segunda Escolástica 13 e para os es critos do padre Antônio Vieira e ainda para livros de história da Restauração Portuguesa de 1640 14 na Bahia as idéias ilustradas imperaram ainda que se conjugando com elementos místicos e ocultistas de prove niência francesa 15 No que se refere à REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 64 influência das Luzes elemento comum às Inconfidências em Minas sobressaiu a Histoire Philosophique et Politique des Etablissements et du Commerce des Européens dans les Deux Indes do padre Raynal 16 já na Bahia prevaleceu a ver tente vulgarizada do pensamento ilustra do isto é das Luzes Aplicadas e Repensa das no Calor da Ação em meio ao clima revolucionário francês tiveram uma reper cussão sem par O Orador dos Estados Gerais de 1789 17 e Fala de Boissy dAnglas 30 de janeiro de 1795 18 As diferenças entre os projetos de am bos os movimentos podem ser percebidas facilmente pelo exame de como compre endiam liberdade pátria e nação Ti radentes resumiu com perfeição o que os mineiros tomavam por liberdade ao afir mar que os mazombos isto é os naturais da colônia também tinham valimento e sa biam governar e que dando a sua terra tan tos haveres se achavam pobres por lhe ti rarem tudo para fora mas que a haviam de pôr em liberdade que só esperavam se botasse a derrama pois que a terra não podia pagar e que tudo ia para o Reino Adim 1980 vol 1 p 124 Nessa afirmação vê se primeiramente uma percepção econô mica aquela segundo a qual a terra com portava tantos haveres sendo portanto compreendida como potencialmente rica A isso misturase uma crítica velada se não ao sistema colonial ao menos à políti ca tributária da metrópole em relação à colônia os mazombos seriam pobres por lhe tirarem tudo para fora ou seja devido ao fato de a riqueza ser drenada para o Reino sendo a derrama algo impossível de pagar Essas idéias complementavamse com a crença na capacidade de governar dos mazombos e por fim com o anúncio de um movimento político pelo qual a terra seria posta em liberdade sendo essa conquista associada à decretação da derrama medida que demarcava um arrocho tributário o que conforme o alferes e outros conjurados dis seram várias vezes acirraria os ânimos das gentes colocandoas ao lado de uma sedi ção A liberdade surgia portanto de uma análise e uma compreensão que transita vam do econômico para o político confun dese com uma ruptura política que seria desencadeada tendo como estopim um ar rocho tributário ruptura esta ainda cujo conteúdo não é declarado mas que clara mente anuncia o fim da pobreza a realiza ção de um potencial de riqueza Já os contornos da idéia de nação em estreita conexão com a de liberdade entre os inconfidentes de Minas podem ser ava liados a partir da denúncia de Basílio de Brito Malheiros do Lago Lago afirmou que conheci desde que vim para a América nos nacionais dela interno desejo de se sacudi rem fora da obediência que devem prestar os seus legítimos Soberanos mas antes pa Praefectura Paranambuca pars Borealis 1647 de Frans Post REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 64 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 65 tenteiam uma interior vontade de fazerem do Brasil uma república livre assim como fizeram os Americanos ingleses Adim 1980 vol 1 p 97 grifos meus Nacionais nesse caso significa na turais nascidos em Resta saber se o sig nificado de república corresponde à for ma de governo republicano distinta da mo narquia de que eram exemplos Veneza e Holanda Mello 1995 p 279 ou confor me estabeleceram Maquiavel e depois Montesquieu esse último incluindo a divi são dos poderes em Executivo Legislativo e Judiciário ou ainda como se experi mentava então nas colônias inglesas re cémindependentes aliando república a democracia representativa Ou por fim a uma vertente bem distinta que reporta a Cícero em que república corresponde a toda forma de governo fundada no interesse comum em conformidade com uma lei comum único direito pelo qual uma comu nidade afirma a sua justiça distinta da anar quia e dos governos injustos Matteucci 1997 pp 11079 compreensão em cir culação na cultura letrada portuguesa 19 O mesmo Basílio na sua denúncia repor tase a um relato que lhe foi feito pelo ca pitão Vicente Vieira da Mota que via as Minas em muita desordem e que todos os nacionais delas se queriam ver livres e que ele era amigo do cônego Luís Vieira mas que lhe ouvia falar umas tais cousas que se fosse o Rei lhe mandava cortar a cabeça Adim 1980 vol 1 p 100 Nacionais novamente aparece como sinônimo de na turais de sendo aplicável à capitania de Minas ao contrário do que ocorre com a primeira referência que tem como alvo o conjunto da América Portuguesa Idêntico sentido encontrase no trecho da mesma denúncia agora envolvendo mais diretamen te a pessoa do cônego Luís Vieira da Silva Segundo Malheiros o cônego de Mariana não encobre a paixão que tem de ver o Brasil feito uma república abonou o Tira dentes de um homem animoso e que se houvesse muitos como ele que o Brasil era uma república florente que um príncipe europeu não podia ter nada com a América que é um país livre e que ElRei de Portu gal nada gastou nesta conquista que os na cionais já tiraram dos holandeses fazendo a guerra à sua custa sem ElRei contribuir com dinheiro algum para ela depois disto os franceses tomaram o Rio de Janeiro 20 que os habitadores da cidade lha compra ram com o seu dinheiro e ultimamente con cluiu que esta terra não pode estar muito tempo sujeita a ElRei de Portugal porque os nacionais dela querem também fazer corpo de república e outras coisas seme lhantes que todas se encaminham ao fim da liberdade Que se quer fazer revolta é sem dúvida a forma como a têm traçado não a sei Adim 1980 vol 1 p 102 Panorama de Pernambuco de Friederich Salathé sculpt e Johann Steinmann 18261832 Fragmento REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 65 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 66 Se o termo nacionais claramente pode ser substituído por naturais da América em todas as situações referentes aos pro nunciamentos atribuídos ao cônego de Ma riana cumpre notar ademais que esse sig nificado é construído por meio de uma di cotomia reiterada nos três exemplos na cionais x ElRei na guerra contra os ho landeses habitadores da cidade do Rio de Janeiro x ElRei na compra da liberda de da mesma aos franceses que a toma ram e por fim nacionais x ElRei na ambição dos primeiros de fazer corpo de república Logo por um lado nas partes Pernambuco e Rio de Janeiro parece manifestarse uma mesma dicotomia e uma mesma naturalidade americana e por ou tro se não se pode garantir que o significa do de república fosse o de forma de go verno republicana com certeza o termo re metia a um governo instituído como ex pressão do interesse comum oposto ao governo injusto que colidia com aquele interesse 21 Essa idéia de governo perpassa as dife rentes propostas que os inconfidentes de Minas fizeram a respeito da forma de go verno da república a ser instituída nos li mites da capitania de Minas Gerais ou na melhor das hipóteses abrangendo as capi tanias de São Paulo e Rio de Janeiro a república como fizeram os americanos ingleses por várias vezes mencionada nos Autos de Devassa um Império lusobrasi leiro com sede na América sonhado pelo cônego Luís Vieira da Silva e aventado por Inácio José de Alvarenga Peixoto ou mes mo um mero rearranjo nas relações entre Minas e a Coroa mediadas por um gover no da capitania que não afrontasse o inte resse comum o que se pode entrever na leitura das Cartas Chilenas de Tomás Antônio Gonzaga Liberdade nação re pública ademais acompanhavamse da defesa de princípios e medidas como o li vre comércio a abolição da escravidão para mulatos e crioulos apenas com o objetivo de impedir que os cativos se aliassem à repressão a instalação de manufaturas a livre extração dos diamantes a mudança da capital de Minas para São João del Rei a criação de uma universidade em Vila Rica dentre outras Na Bahia nos anos 179398 o projeto dos inconfidentes foi bem distinto ainda que seja bastante difícil precisar seus con tornos É certo que houve o afastamento das elites temerosas em relação à perda de controle das camadas populares e sobretu do prisioneiras de preconceitos sobre a capacidade de pessoas de baixaralé pro moverem um levante À época o governa dor da Bahia Dom Fernando José de Por tugal advogava uma concepção de nação profundamente influenciada pelo pensa mento do conde de Linhares Dom Rodrigo de Souza Coutinho para o qual a nação portuguesa era una e indivisível nos qua tro continentes em que habitava sob a tu tela da monarquia de Bragança Assim o governador da Bahia atrelava a nação ao Estado de que é fundamento o monarca A identidade nacional remetia ao Estado e por meio desse à monarquia dos Bragança a nação portanto compreende os vassalos de ElRei Jancsó Pimenta 2000 p 145 Em oposição a essa concepção os inconfi dentes baianos entendiam que o fundamento da nação é a vontade dos povos e não o papel coesivo do trono Nos panfletos afi xados nas ruas de Salvador em agosto de 1798 o baiense tornavase nação na medi da em que por meio de um pacto político instituísse um Estado que lhe desse forma Se o Estado dá forma à nação ele não pode ser instituído senão por uma revolução que expresse um novo pacto político Em 1798 na Bahia colocavamse dessa forma frente a frente a monarquia absoluta e uma comunidade que afirmava ter configuração específica o povo baiense instituidor po tencial de um novo Estado que viria a ser nacional mediante um pacto de cidadãos aquele que lançaria fora os despóticos ti ranos e faria dos baianos felizes sobera nos nas suas terras Jancsó Pimenta 2000 p 147 A pátria no entanto para fiéis vassalos e baienses é a Bahia uma pátria que ainda não engendrou um patrio tismo político a ela referido e em cujo in terior identidades políticas distintas coe xistiam e se confrontavam na gestação his REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 67 tórica de alternativas de futuro cujas for mas apenas esboçavam Jancsó Pimen ta 2000 p 148 Se os novos Estado e nação sonhados pelos baianos eram os reversos da tirania eram república nos moldes mais antigos tal como pensavam os inconfidentes de Minas Gerais eram mais claramente repú blica no sentido que emergiu com a Inde pendência dos EUA aparecendo como uma forma de governo específica em que se vislumbra uma democracia tratavase nos termos dos baianos de uma república democrática Nos pasquinsboletins vêemse máximas contra a monarquia ab solutista portuguesa qualificada como péssimo jugo reinável da Europa IBDS 1931 vol 1 p 7 que traziam implícitos o reconhecimento do princípio segundo o qual todos os homens livres seriam cida dãos e também a idéia de nação como sinô nimo de Estado instaurado pela soberania popular Não continham entretanto uma rejeição à nação portuguesa o alvo era o trono o despotismo o rei tirano a subordinação a Lisboa Jancsó Pimenta 2000 pp 1459 Nos pasquins contudo havia idéias contra o jugo colonial e defen diase o livre comércio a elevação dos soldos e o apoio externo para o extermínio do péssimo jugo reinável da Europa As liberdades portanto atingiam dois pilares básicos do Antigo Regime o absolutismo e o sistema colonial visto que este tinha no monopólio comercial um de seus alicerces Na república democrática almejada pe los baianos os acessos e lugares repre sentativos seriam comuns sem diferen ça de cor nem de condição onde eles ocu pariam os primeiros ministérios vivendo debaixo duma geral abundância e conten tamento IBDS 1931 vol 2 p 170 Na revolução preconizada pelos pasquins e pelo discurso preponderante entre os con jurados frisese não se colocava a aboli ção Segundo Lucas Dantas a revolução envolveria uma guerra no interior da socie dade baiana e instituiria uma sociedade fundada na igualdade jurídica entre os indivíduos de cores diferentes um governo democrático estabelecido nos limites da capitania da Bahia e exercido por homens capazes e de maior juízo não importando de que nação fosse que aqui pode ser com preendida quem sabe como naturalidade nos mesmos termos que em Minas ou como naturalidade vincada a Estado isto é reme tendo a uma naturalidade que se dá sob o domínio de um Estado instituído A demo cracia assim fundavase na crença de que havia pessoas mais e menos preparadas para o governo devendo apenas os mais capazes governar a nação do governante não seria critério de inclusão ou exclusão para sua escolha IBDS 1931 vol 1 p 262 Pernambuco 1817 depois de passar por Minas e Bahia retorno à encruzilhada Para Carlos Guilherme Mota tratouse de um movimento escravocrata descolonizador aristocrático mas que trouxe em seu de senrolar uma contradição isto é uma ver tente antiaristocrática Assim de um lado foi uma revolução dos oligarcas proprietá rios brancos e escravocratas e de outro uma revolução cuja meta a alcançar era um sistema nivelador propugnando idéias como a igualdade racial e social pon do em risco as estruturas do regime político e social Mota 1972 pp 1434 por isso ao invés do termo revolução Mota pre fere insurreição A tensão e a incompati bilidade latente entre essas duas vertentes são visíveis num episódio que ocorreu quan do os rebeldes se encontravam presos epi sódio esse que constitui um emblema das contradições que emergiram no desenrolar do próprio movimento e que se desnuda ram sob o efeito da repressão O capitão Boaventura Ferraz ao ser encarregado da alimentação dos 103 prisioneiros ligados ao movimento de 1817 que se encontra vam em Salvador solicitoulhes por meio de um bilhete que se dividissem em clas ses enviandolhes uma lista com as ne cessárias declarações para melhorar a ali mentação Enviado o bilhete para o capi tãomor de Olinda Francisco de Paula Cavalcanti e o seu irmão Luís Francisco senhores de engenho Antônio Carlos con vocou um conselho para deliberar sobre o assunto tendo o mesmo deliberado que a palavra Classe equivalia a Jerarchia REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 68 apud Mota 1972 p 136 Na definição da hierarquia os detentos usaram como bali za a divisão social que foi fixada pelas Cortes de Lamego clero nobreza e povo Os detentos foram divididos em três clas ses segundo um critério militar na 1a clas se figuravam os detentores das patentes de major para cima nas tropas de 1a 2a e 3a linhas somandose a esses os desembar gadores magistrados letrados cônegos e vigários na 2a classe enquadravamse os que se encontravam nos postos de cadete a capitão nas tropas de todas as linhas os clérigos simples os magistrados nãoletra dos e oficiais da fazenda por fim na última classe ficavam todos os que não cabiam nas duas primeiras Mota 1972 p 137 Seguindo esses critérios o conselho encon trou dificuldades para classificar os dois cunhados do Morgado do Cabo que nunca haviam participado nas tropas militares sendo o impasse resolvido pela manipula ção das classes a favor dos implicados ambos foram promovidos a major sem designação de linha Ao mesmo tempo o uso de critérios aristocratizantes e racistas pelo conselho fez com que dois oficiais superiores do Regimento Henrique Dias que reunia homens de cor fossem joga dos na 3a classe Esse episódio que causou estupor ao capitão Boaventura anos mais tarde em 1835 ele manifestou sua indig nação com o orgulho aristocrático dos já exprisioneiros pernambucanos mostra que a hierarquia social existente fora da prisão foi trazida para seu interior Mota 1972 pp 1378 Demonstra além disso como os agentes de 1817 eram prisioneiros de um ideal aristocrático A República Pernambucana portanto se concretizou as possibilidades de frag mentação contidas nos movimentos abor tados de Minas 178889 e Bahia 1793 98 conteve em si as tendências elididas no primeiro e para desencanto das elites locais afirmadas no último a participa ção dos despossuídos no jogo político e além disso esbarrou também no problema da escravidão ou melhor de sua abolição defendida com restrições e por motivos estratégicos em Minas esquecida na Bahia exceto em vozes dissonantes Fundou ade mais a República como forma de gover no aventada de modo fugidio pelos minei Rua da Cruz de F Krauss sculpt e Emil Bauch delsd REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 68 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 69 ros sonhada com mais precisão pelos baianos em teoria emanava da vontade do povo na verdade fora fruto do exercício da vontade de poucos Como reconhece Francisco Muniz Tavares embora em um Estado que aspira a ser livre os Gover nantes devam ser eleitos ou pelo povo ou pelos seus representantes munidos do poder especial e o procedimento contrá rio degenere em tirania que cedo ou tar de é esmagada a escolha do novo gover no foi feita por poucos Isso ocorreu entre tanto porque na marcha variável dos acon tecimentos há circunstâncias tão imperio sas que forçam o homem mais escrupulo so a curvarse por um momento e saltar por cima dos princípios da sua convicção a salvação da pátria em extremo perigo atra vessa a ordem dos processos legais Como além disso a escolha recaiu sobre pessoas distintas e o governo intitulavase provisó rio tal procedimento não causou desagra do geral Tavares 1917 p CVII Não se pense porém que na categoria povo es tava compreendida toda a população livre masculina e muito menos obviamente incluídos os escravos e as mulheres O ide al dos revolucionários assentavase numa idéia de cidadania que se restringia à parte dos homens livres pois como esclarece o exrevolucionário Muniz Tavares nas repúblicas bem constituídas o direito de votar é inerente a cada um cidadão e que se a lei o restringe privando os proletários e criminosos é com o louvável fim de esti mular os homens ao trabalho à economia e virtudes Tavares 1917 p CXXX DA FERMENTAÇÃO EMERGE O MOVIMENTO DA CRONOLOGIA E FATOS ÀS IDÉIAS A análise das idéias de pátria país e nação na perspectiva dos revolucionários de 1871 e na visão das forças realistas que os combateram em defesa do Reino Unido de Portugal Brasil e Algarves exige um breve resumo de um lado sobre as especi ficidades da identidade pernambucana e de outro sobre a eclosão do movimento de 1817 seus participantes e impasses funda mentais A identidade pernambucana marcava se pela presença de um imaginário especí fico de cunho aristocrático relacionado à luta contra os holandeses e às próprias re lações da capitania com a Coroa os comer ciantes e os governadores por ela nomea dos Enclausuradas num círculo endogâ mico 22 que valorizava o nome o san gue as famílias de que se compunha a aris tocracia pernambucana ou açucarocracia como quer Evaldo Cabral de Mello de senvolveram forte coesão interna aguçada pela autosegregação que viveram entre a ocupação holandesa e a segunda década do século XVIII e pelo controle de institui ções e cargos do poder local como as Câ maras e os postos de comando das tropas de segunda linha as milícias e algumas vezes da própria tropa regular Mello 1995 p 311 A aristocracia estabeleceu relações tensas com os envolvidos no co mércio do Recife controlado por comerci antes reinóis o que não excluiu a possibi lidade de estabelecimento de convivência entre aqueles mazombos e os mascates por amizade ou cálculo até mesmo porque concebiam uma relação de complemen taridade entre engenho e loja Mello 1995 p 295 o grande problema estava no compartilhar com eles os postos de mando o que não agradava à aristocracia Se em 1666 os aristocratas depuseram o governa dor Jerônimo de Mendonça Furtado o Xumbergas em 1710 intentaram fazer o mesmo com Castro e Caldas fiandose em ambos os casos nas teorias corporativas de poder já comentadas aqui O último foi por eles qualificado como tirano inimigo da nobreza e perseguidor do clero francófilo e traidor Mello 1995 p 259 eles ademais defendiam a natureza contratual das relações entre Pernambuco e a Coroa julgando que essa última desde a restauração pernambucana até o governo de Castro Caldas havia violado sistemati camente os compromissos assumidos REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 70 Mello 1995 p 283 Propugnavam que o governo devia ser entregue aquela re pública o que significava naquele con texto a escolha de um governador favorá vel aos aristocratas uma velha aspiração local Mello 1995 p 271 Construíram a utopia de instaurar em Pernambuco um regime republicano oligárquico como ha via em Veneza e na Holanda Mello 1995 p 279 Embalava os aristocratas a idéia de que a Coroa devialhes a restauração da capitania em 1654 idéia como se salien tou aqui cujas linhas mais gerais fizeram se presentes também na leitura da história feita pelos inconfidentes de Minas Gerais de 1789 Entre os aristocratas de Pernambu co porém o senso de identidade que se formara não presumia rompimento ou distanciamento em relação às tradições da monarquia portuguesa apenas exigia de acordo com a lógica que lhe era própria o reconhecimento da dignidade e do lugar que os aristocratas julgavam merecer ain da que à custa de atos de aparente infideli dade Neves 1999 p 457 Cultivavam além disso os valores nobiliárquicos do Antigo Regime disputando entre si as marcas de distinção como a nobilitação por meio de comendas da Ordem de Cristo e a aquisição de postos na administração e temiam a divulgação das manchas de infâ mia como a falta de pureza de sangue in centivando as intrigas e as cabalas que a ampla rede de comissários do Santo Ofício na capitania tendia a amplificar Neves 1999 p 458 Mello 1989 p 281 Em 1801 Pernambuco assistiu à deno minada Inconfidência dos Suassuna uma suposta conspiração cujo objetivo seria formar em Pernambuco uma república sob a proteção de Napoleão mas que ao que parece não constituía nenhuma conspira ção expressando apenas a inquietação po lítica então existente com as transforma ções que se processavam no cenário euro peu e com medidas tomadas pelo governo local Envolveu Francisco de Paula Caval cante de Albuquerque do Engenho Suas suna e seu irmão José Francisco de Paula Cavalcante de Albuquerque que se encon trava em Lisboa do qual o primeiro rece bera cartas supostamente sediciosas A bio grafia dos mesmos indica que estavam in tegrados ao mundo de convenções sociais e culturais de sua época e inseridos nas redes de poder de então que ligavam Pernambuco a Portugal Em 1804 Fran cisco de Paula tornouse capitão de orde nanças da freguesia de Jaboatão e cavalei ro da Ordem de Cristo no ano seguinte assumiu o cargo de capitãomor de Olinda em 1808 recebeu o título de fidalgo cava leiro da Casa Real Em 1817 José irmão de Francisco foi nomeado governador de Moçambique posto em que morreu Na devassa para investigar a Inconfidência nada de sério foi descoberto Barreto 1985 p 201 Neves 1999 pp 4778 Quintas 1985 pp 2101 Mas em 1818 pelo envol vimento dos Suassuna no movimento de 1817 o desembargador João Osório de Castro Souza Falcão escrivão da alçada encarregado de investigar a revolução de 1817 afirmou que uma carta referente à Inconfidência dos Suassuna teria sido quei mada pelo escrivão que fora subornado O padre Dias Martins fez afirmação de teor semelhante dizendo que rios de dinheiro teriam restituído os réus à liberdade Ma chado 1917 pp XXIIXXIII Quintas 1985 pp 2123 Próximo a 1817 em casas de particula res academias sociedades secretas e ma çonaria realizaramse reuniões e encon tros de pessoas com ânimo de se revolta rem contra o governo tendo o governador Miranda Montenegro recebido denúncias a respeito envolvendo a identificação não apenas de lideranças como também dos pla nos revolucionários Tavares 1917 p LXXXV Quintas 1985 p 217 Mota 1972 p 49 Inicialmente o governador Montenegro nada fez não só desculpando os ciúmes patrióticos e econômicos dos pernambucanos como sendo descuidado com a segurança pública no Recife tendo ele próprio sido assaltado Lima 1996 p 499 Machado 1917 p XXXVII No dia 1o de março de 1817 porém uma denúncia de conspiração feita pelo dr José da Cruz Ferreira ouvidor da comarca do Sertão que fora informado por Manuel de Carva REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 71 lho Medeiros negociante confirmada por várias pessoas fez o governador Monte negro mudar de postura No dia 4 de março de 1817 o governador comunicou uma ordem do dia para as tropas conclamando as à obediência à monarquia e à harmonia entre brasileiros e portugueses No dia 5 de março de 1817 Miranda Montenegro dirigiu uma proclamação à população lou vando a elevação do Brasil à categoria de Reino Unido dizendo que todos eram vassalos do mesmo soberano Machado 1917 pp LXLXX LXXXVI Tavares 1917 p LXXXVII Quintas 1985 p 217 Aos 6 de março porém o governador foi mais além realizando um Conselho de Guerra tendo este último ordenado a pri são dos acusados como líderes da subleva ção Se na prisão de líderes civis não houve resistências na tentativa de detenção de militares na Fortaleza das Cinco Pontas o resultado foi outro o capitão José de Bar ros Lima o Leão Coroado resistiu as sassinando o brigadeiro português Barbo sa de Castro e depois outro oficial envia do pelo governador o tenentecoronel Ale xandre Tomás também foi morto Com isso desencadeouse uma insubordinação geral nas fileiras do regimento de artilha ria ao qual vieram se somar as milícias chegando a um total de 2500 a 3000 ho mens rebeldes Tavares 1917 pp LXXXIXXCIV A eclosão do levante marcada inicial mente para 16 de março de 1817 com isso foi antecipada para 6 de março cabendo o comando a Domingos José Martins nego ciante Antônio Carlos de Andrada ex magistrado em Santos ouvidor em Olinda irmão de José Bonifácio de Andrada e Sil va e do padre João Ribeiro Lima 1996 p 499 Mota 1972 p 51 Quintas 1985 p 218 Na cidade uma multidão reuniuse havendo uma pregação a favor da revolta com o uso de expressões como Viva a Independência Viva a liberdade dos filhos da pátria Morram os europeus Os revoltosos promoveram a libertação de detidos políticos e criminosos comuns ao que se seguiram ataques de libertados das cadeias de mulatos e de negros livres e escravos aos que tentavam fugir do Recife Cuidaram ademais da organização da defesa fortalezas e outros pontos de resis tência e da cavalaria Em meio a isso o governador refugiouse na fortaleza do Brum e logo depois intimado à rendição pelos revoltosos capitulou abdicando de sua autoridade e embarcando para o Rio de Janeiro Já os comerciantes portugueses abandonaram a cidade do Recife fugindo para a Bahia informando os fatos ao conde dos Arcos governador da Bahia entre 1810 17 Tavares 1917 p XCIVXCV e CIII Aos 7 de março de 1817 instalouse o Governo Provisório constituído por cinco membros nos moldes do Diretório da Fran ça em 1795 Manuel Correia de Andrade representando a Agricultura Domingos José Martins representando o comércio José Luís de Mendonça representando a Magistratura Domingos Teotônio Jorge representando as Forças Armadas e o pa dre Miguelinho como secretário Formou se também um Conselho de Estado sendo nomeados para o mesmo o dicionarista e grande proprietário Antônio de Morais Sil va que recusou a indicação José Pereira Caldas o deão Bernardo Luís Ferreira Por tugal o grande comerciante Gervásio Pi res Ferreira e Antônio Carlos Ribeiro de Andrada ouvidor de Olinda O Governo Provisório assim constituído era heterogê neo reunia moderados como o represen tante da Magistratura a radicais como o representante do Comércio e o mulato Pedro Pedroso defensor do haitismo Mota 1972 p 52 O novo governo promulgou uma Lei Orgânica enviada a todas as câmaras das comarcas de Pernambuco que fixava a tese da soberania popular determinava o regi me republicano de governo seguia como princípios a liberdade de consciência de imprensa a tolerância das religiões ado tando porém a religião católica como a religião do Estado Quintas 1985 p 219 Mota 1972 p 54 Convocou uma Assem bléia Constituinte expressando no decre to de convocação da mesma provavelmente datado de 29 de março de 1817 e de autoria de Antônio Carlos de Andrada alguns dos REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 72 princípios básicos do liberalismo e conse qüentemente a instauração de fundamen tos e normas de poder opostos ao Antigo Regime soberania popular afirmação dos direitos individuais face ao Estado e na base de tudo a idéia de pacto social cujos sacrifícios têm por finalidade a segurança dos indivíduos Bernardes 2001 p 165 Dentre as principais medidas tomadas seja pelo seu significado simbólico seja pelo que representavam em termos de sa tisfação de interesses contrariados pelo go verno do Reino Unido podem ser destaca das a adoção dos termos patriota e vós como forma de tratamento entre os patrio tas e de uma bandeira o aumento dos sol dos dos oficiais e soldados no triplo ou no quádruplo a abolição de vários impostos a permissão aos particulares para organi zarem companhias de cavalaria a facilita ção do pagamento das dívidas junto à ex tinta Companhia de Comércio de Pernam buco e Paraíba a proclamação da invio labilidade de qualquer espécie de proprie dade inclusive de escravos a anulação dos processos civis e criminais e o seqües tro das propriedades dos negociantes que fugiram por causa da revolução Amaro Go mes Coutinho liderou a extensão das medi das revolucionárias à capitania da Paraíba que constituiu um governo provisório Tavares 1917 pp CXVIICXIX Quin tas 1985 pp 21920 Mota 1972 pp 54 6 Lima 1996 p 504 De Pernambuco foram enviados emissários ao Rio Grande do Norte Ceará e Bahia com a expectativa de conquistar seu apoio à revolução con seguindose a adesão do Rio Grande do Norte e de localidades do Ceará Bernardes 2001 p 164 Inicialmente o horizonte territorial dos revolucionários restringia se à capitania de Pernambuco incluindo se a então comarca de Alagoas porém com a adesão da Paraíba do Rio Grande do Norte e do Ceará emergiu a já frágil idéia de uma ação e governo comum a todos Bernardes 2001 p 171 A heterogeneidade do governo revelou se na divisão de seus membros e apoiadores em relação ao futuro do trabalho escravo e à participação dos cativos na luta contra os realistas Domingos José Martins represen tante do Comércio abolicionista era defen sor do uso de cativos na guerra Já Francisco de Paula aristocrata rural era contrário a essas medidas temendo a repetição do Haiti Essa cisão da camada proprietária em rela ção à questão escrava enfraqueceu a repú blica e fortaleceu os realistas contrarevo lucionários O governo provisório procu rou minimizar a cisão com uma proclama ção em defesa de uma abolição lenta regu lar e legal No entanto isso não conseguiu ao que parece conter nem os temores dos aristocratas nem as insolências dos ho mens de cor Nas ruas relatou um português em carta à sua comadre não se viam brancos e os patriotas negros e mestiços abordavam com insolência os europeus pedindolhes fumo A canalha e a ralé de todas as cores pilhavam as propriedades dos senhores de engenho Mota 1972 pp 59 85 e 98100 Lima 1996 p 501 Enfraquecido por essa divisão o gover no teve que enfrentar o bloqueio do porto do Recife e os ataques terrestres vindos do interior o que tornou a situação da cidade muito difícil Na realidade antes da chega da das forças da Bahia a república já esta va derrotada militarmente defrontandose com a luta civil travada por realistas e pa triotas Entre 19 e 20 de maio de 1817 cerca de 6000 patriotas incluindo escravos e libertos deslocaramse do Recife para Olinda carregando bagagens artilharia e cofre militar deixando Recife deserta Os revolucionários em meio às dificuldades organizaram a ditadura comandada por Domingos Teotônio Jorge o representante da Forças Armadas Lima 1996 p 512 Quintas 1985 p 221 Mota 1972 p 58 A ditadura negociou a rendição não aceita por todos os revoltosos que resistiram no interior No dia 20 de maio as bandeiras reais voltaram a ser arvoradas no Recife abandonado pelos remanescentes do exér cito patriota Bernardes 2001 p 162 Nos documentos do governo provisó rio de Pernambuco e do governo provisó rio da Paraíba bem como nos emanados das forças realistas primeiramente fica visível a tensão existente entre brasileiros REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 73 e portugueses entre os nascidos no Brasil e os nascidos em Portugal entre os ameri canos e os europeus Isso se verifica mui tas vezes pela negação da existência de animosidades O governo provisório bus cou amenizálas ou evidenciar medidas que definiam a igualdade entre os dois sujeitos mencionados Fêlo por motivos estratégi cos para garantir a sobrevivência da repú blica Assim na Paraíba o governo provi sório reconhecia que uma revolução só pelo nome é uma fatalidade funesta sempre trazendo consigo rios de sangue mas salientava que a revolução da cara Paraíba não perdeu uma só gota de sangue de seus amados filhos são seus filhos to dos brasileiros e europeus que habitam o seu solo criador DH 1953 p 31 grifo meu Portanto na revolução da Paraíba não se derramara o sangue de seus filhos sendo subentendidos nessa categoria bra sileiros e europeus que habitavam aquela província formulação que escamoteia du plamente a cisão entre brasileiros e portu gueses não só a revolução não teria exter minado os últimos nem os primeiros como esses podiam ser vistos como filhos da Paraíba O ódio ao europeu no entanto era compartilhado por proprietários e pe los cabras rebeldes elementos nãopro prietários Para os proprietários líderes revolucionários esse ódio ancoravase nos direitos de propriedade que vinham dos sucessos da restauração passada sobre os holandeses Mota 1972 p 144 confun dindose portanto com propriedade e ao mesmo tempo legitimandose por uma certa leitura da história passada Em meio à tensão entre brasileiros e portugueses novas identidades começavam a forjarse ameaçando estilhaçar a unida de da nação portuguesa A identidade bra sileira no entanto ainda não estava clara mente delineada e distinta da portuguesa Acreditavase numa filiação comum que vai dos lusos aos pernambucanos passan do pelos portugueses e brasileiros Todos esses sujeitos compunham uma mesma árvore com um tronco comum portanto dos quais seriam galhos Na Proclamação do Governo Provisório aos Habitantes de Pernambuco de 9 de março de 1817 por exemplo os revolucionários apresentavam o movimento pernambucano como uma reação a um governo tirânico e ao espírito do despotismo e do mau conselheiro que em meio ao ciúme e rivalidade entre os filhos do Brasil e da Europa tentara usar Brasilia Qua Parte Paret Belgis Amsterdam 1647 de Geogr Marggraf del e Johanes Blaeus ed REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 73 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 74 das medidas mais violentas contra pa triotas honrados e beneméritos da Pátria leiase os acusados de voltarse contra o governo O governo provisório ainda se gundo a Proclamação seria uma reação à anarquia que sucedera à partida do go vernador Caetano Pinto Montenegro ocul tandose com essa afirmação que uma re belião armada o depusera vindo a procla mar o fim da distinção entre os brasileiros e europeus A Proclamação encerrava com uma exortação A pátria é a nossa mãe comum vós sois seus filhos sois des cendentes dos valorosos lusos sois portu gueses sois americanos sois brasileiros sois pernambucanos DH 1953 pp 14 6 Se a menção ao tronco comum que unia dos lusos aos pernambucanos dos antigos habitantes da província romana da Lusitânia aos pernambucanos de inícios do século XIX procurava amenizar as difi culdades oriundas da fuga dos portugueses de nascimento de Pernambuco levando consigo cabedais eou criando dificulda des econômicas e políticas para o governo provisório tendo portanto um caráter es tratégico 23 se tal menção pelo que pro cura negar revela a existência de conflitos e discórdias a separarem pernambucanos brasileiros dos portugueseseuropeus não pode haver dúvida que demonstra a unida de dos laços ainda existentes entre eles A ruptura plena não se confirmara ainda Em prol da unidade houve insistentes apelos por parte do governo provisório o que pa rece sugerir reconheçase que as diver gências entre os povos dos dois lados do Atlântico atingiam um nível agudo O go verno do bispado de Pernambuco em pro clamação feita aos 8 de março de 1817 realizou um esforço no sentido de superar as diferenças lembrando às ovelhas Pernambucanas que uma fatal indisposi ção entre brasileiros e europeus nascia do esquecimento da Caridade o mais im portante fundamento da Santa Religião Cristã DH 1953 p 9 Afirmava ser a mesma indisposição um boato uma vez Engenho de Açúcar de Johann Moritz Rugendas 4a div pl 9 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 74 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 75 que primeiramente a espécie branca exis tente neste Bispado de Pernambuco é toda européia ou descende de europeus e em segundo lugar que os brasileiros têm muito amor aferro e respeito aos seus pro genitores acrescentando ainda que por natureza são dóceis sensíveis e extrema mente hospitaleiros sendo que estas be las qualidades não podem gerar ódios con tra os homens só pela diferença de natalí cio DH 1953 p 9 Apelavase portanto à unidade entre europeus e brasileiros uma unidade que era da espécie branca o que leva à suposição de que havia um inimigo oculto que seriam os nãobrancos Entre as próprias forças que se aliaram à contrarevolução em 1817 a palavra na ção parecia assumir uma conotação que apontava para essa unidade Segundo um informante partidário da contrarevolução a nação seriam o Reino Unido e as colô nias cujo bem ele desejava defendendo para tanto o envio dos desajustados em relação à estrutura de produção para ou tras zonas do sistema nomeadamente Mon tevidéu onde o Reino Unido participava de conflito de dimensão internacional Mota 1972 p 120 No Ceará a Câmara de Fortaleza aos 6 de abril de 1817 mani festava fidelidade a ElRei Nosso Augusto Soberano e Senhor e a toda a Augusta Casa de Bragança prometendo auxílio às for ças realistas até ser derramada a última gota de nosso sangue pela Religião pelo Rei e pela nação do Reino Unido de Por tugal e do Brasil e Algarves DH 1953 p 85 e por conseguinte identificando a Na ção ao Reino Unido e ao trono Dois dias depois ao pronunciarse contra a Revolu ção Pernambucana identificava novamen te a nação à Nação do Reino Unido aquela que compreendia as gentes dos dois lados do Atlântico sob o domínio da dinastia de Bragança DH 1953 pp 935 Patriotis mo correspondia à fidelidade a essa na ção algo que a unia O movimento de Pernambuco por sua vez era classificado como Revolução sendolhe associadas palavras negativas traição e perfídia e contrapostos termos revestidos de positividade tais como fidelidade vassalagem obediência lei reli Venda em Recife de John Moritz Rugendas 1835 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 75 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 76 gião elementos correlatos das noções de patriotismo e de nação Dãose vi vas por fim ao Rei do Reino Unido sau dação em que se vê que não se trata mais do Rei de Portugal DH 1953 p 95 e que por conseguinte explicita os parâmetros e condicionamentos do patriotismo a nação compreende sujeitos que habitando partes diferentes de um mesmo reino Europa e América Portugal e Brasil eram todos eles vassalos de igual forma da família de Bragança sem distinção ou hierarquia Havia portanto em circulação as identi dades de brasileiro português e súdito do Reino Unido para os revolucionários iden tidades que vinham de um tronco em co mum mas que se encontravam em choque para os realistas identidades sem quais quer incompatibilidades Na perspectiva dos revolucionários a soberania popular contrapunhase à tirania os revoltosos afirmaram insistentemente o princípio da soberania popular e em opo sição a ela combateram a tirania o despo tismo que gerava o direito de insurgência A soberania popular nos termos dos revo lucionários no entanto implicava como já se salientou uma cidadania restrita com partilhada por parcela da sociedade da qual se excluíam os escravos e os proletários Num documento dirigido às autoridades inglesas de 12 de março de 1817 explica se o movimento pernambucano como rea ção a um governo tirânico como derruba da do podre edifício do seu governo No documento citado afirmase com efeito que o povo pernambucano não podia já sofrer as contínuas opressões que o gover no português cada dia acumulava a dis córdia assim não se dava entre brasileiros e portugueses mas entre o povo pernambucano e o governo português Nesse sentido esclareciase que esse go verno opressor tentara desunir os portu gueses europeus e naturais de Pernam buco Logo a desunião não surgia da di vergência de interesses existentes entre portugueses europeus e portugueses de Pernambuco sendo isso sim semeada pelo governo Concluíase então com um pedido que não era senão de endosso ao movimento Millord um povo oprimido tem direito à compaixão do soberano da nação a mais respeitável do mundo DH 1953 p 21 Elevando o tom o governo da Paraíba denunciava que a causa da nossa Pátria encontravase sobretiranizada pela má ad ministração do Governo a que estava sujei ta estava ademais no maior perigo pelo desamparo desse governo DH 1953 p 24 Em documento datado de 17 de março de 1817 o governo provisório da Paraíba também investia contra a tirania contra a qual dizia terem chegado ao Tribunal Su premo da Justiça Eterna os clamores ain da que surdos dos habitantes da Paraíba DH 1953 p 30 A tirania era representa da pelo Ministério do Rio de Janeiro em razão do qual os paraibanos iam passando de vexação em vexação que não entendia as suas queixas ou que tornava tão dispendiosas as diligências para serem aten didas que era um novo diabólico canal da extinção da nossa sustância DH 1953 pp 301 Em outros documentos o gover no da Paraíba cola a tirania ao governo do Rei de Portugal sendo que em um deles se explicita o propósito de banilo da me mória de banir absolutamente das nossas idéias o império do despotismo e tirania até os seus últimos vestígios a saber in sígnias armas e decorações DH 1953 p 34 Tratavase portanto de uma medida que visava ao apagamento do passado Tirania é o termo que aparece também no documento denominado Preciso re digido por José Luís de Mendonça no ím peto de mostrarse digno da confiança dos revolucionários pernambucanos abalada por demonstração anterior de moderação ele propugnara até mesmo que se evitasse o combate ao monarca motivo pelo qual quase foi morto por Pedro Pedroso Radi cal por estratégia de seu autor o Preciso conclamava Viva a pátria vivam os Pa triotas e acabe para sempre a tirania Real Afirmava que o sistema de administração deposto cuidava de sustentar as vaidades de uma Corte insolente sobre toda a sorte de opressão de nossos legítimos direitos e ainda que o mesmo procurava caluniar REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 77 agora a nossa honra com o negro labéu de traidores aos nossos mesmos amigos pa rentes e compatriotas naturais de Portugal apud Tavares 1917 p CXI grifos meus A revolução enfim justificavase pela ti rania representada pelo governo ora con cebido como português ora como do Rio de Janeiro um governo que não atendia nem escutava as províncias um governo que classificava os revolucionários como traidores Tratavase de qualquer forma em todos os últimos documentos examina dos da colisão do povo soberano de Pernambuco e da Paraíba com a Coroa e por conseguinte com a interiorização da metrópole de que ele era representante Os pernambucanos porém tinham em mira os brasileiros Os habitantes de Per nambuco em armas no comando da revo lução pensavam nos brasileiros ao mes mo tempo em que falavam de si mesmos pernambucanos Os pernambucanos tinham em mira o Brasil sonhavam com a adesão das demais províncias à sua causa sobre tudo as províncias do Norte Na proclama ção do governo de Pernambuco ao povo com efeito aludese à difusão de algumas sementes de um malentendido ciúme e ri validade entre os filhos do Brasil e de Portugal habitantes desta Capital desde a época em que os encadeamentos dos su cessos da Europa entraram a dar ao conti nente do Brasil aquela consideração de que era digno e para o que não concorreram nem podiam concorrer os Brasileiros DH 1953 p 14 Explicase ademais que o monarca escapando às tropas inimigas que invadiam o Reino foi acolhido no Brasil e teve saciada sua fome pelos pernambucanos ainda quando se encontrava ao mar o Príncipe de Portugal sacudido da sua capi tal pelos ventos impetuosos de uma inva são inimiga saindo faminto dentre os seus Lusitanos veio achar abrigo no franco e generoso continente do Brasil e matar a fome e a sede na altura de Pernambuco pela quase Divina providência e liberalida de dos seus habitantes DH 1953 p 14 Lançase a partir disso uma interrogação e dáse uma resposta que se expõem a tensão entre filhos do Brasil e filhos de Portugal expressam igualmente a percep ção de um todo ao qual a Revolução Pernambucana se dirige o país o con tinente do Brasil Que culpa tiveram os Brasileiros de que o mesmo príncipe Re gente sensível à gratidão quisesse honrar a terra que o acolhera com a sua residência estabelecendo a sua Corte e elevála à ca tegoria de Reino Aquelas sementes de dis córdia desgraçadamente frutificaram em um país que a natureza amiga dotou de uma fertilidade ilimitada e geral DH 1953 p 14 Por mais que a interiorização da metrópole pudesse opor o Norte ao Sul a identidade do inimigo na perspectiva dos pernambucanos colavase à Coroa e a seus agentes portugueses por mais que uma e outros sejam aparentemente poupados na Proclamação Para Muniz Tavares os pernambucanos confiavam na ressonância de sua causa no Brasil Sabendo a tendên cia universal do Brasil à mesma causa per suadiamse aqueles Patriotas que era che gada a hora em que o Rei de Portugal jul garseia muito feliz em poder partir são e salvo para o seu antigo reino Tavares 1917 p CXVII Por esse motivo o gover no provisório desmobilizou as tropas vin das do interior para a defesa do Recife co metendo um erro estratégico pelo qual pa garia caro mais tarde A palavra pátria tinha um conteúdo às vezes quase abstrato ou no mínimo significados diferentes que não se contra dizem mas se somam indo do lugar do nascimento eou habitação à entidade re sultante da vontade popular reunindo ter ritório povo e organização política Po dia significar o local de nascimento eou moradia com os afetos e as redes de socia bilidade nele estabelecidos sendo um exemplo desse entendimento as palavras de Cristóvão Cavalcante revolucionário pernambucano oriundo de baixos estratos sociais homem branco e pobre que vivia sob o peso da estrutura escravocrata que o marginalizava Ele dizia que preferia viver em Maceió sua terra sua pátria onde o viver é barato porque para negociar em Pernambuco era preciso dinheiro e ele não tinha apud Mota 1972 p 87 Pátria REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 78 portanto era a terra onde ele habitava eou nascera compreendendo igualmente as relações econômicas e sociais que lhe ga rantiam a sobrevivência A pátria podia alar garse incluindo a província mormente dotada de governo soberano Foi assim que se pronunciou o governo provisório da Paraíba ao conceder ao patriota José Antô nio Vila Seca o posto de coronel avaliando essa nomeação como algo a favor da nos sa Causa Comum à Independência da nos sa Pátria termo este que parece poder ser substituído por Paraíba revolucionária juntando portanto território povo e go verno DH 1953 p 53 Pátria portanto não se restringia ao território tanto assim que em Pernambuco Afonso Honorato Bastos escreveu Agora só se trata nesta terra de servir à Pátria e nada mais DH 1953 p 101 Se a pátria como se nota não se resume à terra abrangendo o que os homens estruturam sobre a mesma o conceito des liza para a idéia de povo soberano e em seguida de governo que surge como mani festação da mesma soberania e podería mos acrescentar de Estado em construção que seria abortada povo soberano um povo imbuído de uma vontade da sobera nia que o leva a constituir um governo instaurando uma nova ordem política um novo Estado aberto a brasileiros e portu gueses desde que republicanos e antiti rânicos antimonarquistas enfim pátria confundindose com o próprio governo Estado que emanava da vontade popular A pátria como a vontade popular ultrajada sublinhese aparece na proclamação do vigáriogeral do bispado de Pernambuco Bernardo Luiz Ferreira Portugal de 11 de março de 1817 ao explicar a morte do bri gadeiro Barbosa de Castro por José de Barros Lima e do tenentecoronel Alexan dre Tomás pelo regimento de artilharia ponto de partida da eclosão do levante afirma que dois dos mais pacatos pernam bucanos deram a morte a dois infames caluniadores procurando apoio em seus irmãos segurandolhes que a pátria era atraiçoada e que o governo que protegia a injustiça e negra calúnia aterrado pelo grito de sua consciência fugiu espavorido DH 1953 pp 178 Completa a narrati va ainda dizendo que os europeus em um instante conheceram a perfídia e sem inter valo protegeram a causa da pátria e formaram uma mesma família e a sobera nia do povo se reintegrou nos seus direi tos logo sendo nomeados seus represen tantes isto é o governo provisório DH 1953 p 18 Aqui evidenciase que a pá tria é a vontade popular traída por um go verno tirânico que semeava injustiças e inverdades sendo aquela vontade popular compartilhada pelos europeus catego ria que compreende o português de nasci mento e os pernambucanosbrasileiros si nônimo de branco daquele que tem ascen dência européia ambos membros de uma mesma família na oposição ao despotis mo Esse entendimento pode ser confirma do pelo trecho subseqüente do documento em que se diz que o governo eclesiástico procurava confirmar o recíproco amor entre brasileiros e europeus Na Paraíba identificavase com todas as letras a pátria ao governo provisório emble ma de um Estado em construção por meio do uso da fórmula a pátria é o governo revolu cionário ou literalmente este governo é a vossa pátria DH 1953 p 62 No mesmo texto estabelecese uma associação entre pátriabem comum e governo provisório ao justificarse a medida pela qual se determi nou a transferência do gado para o sertão com o fim de deixar mais terras para a produ ção agrícola causa comum distinta dos inte resses particulares representados pela cria ção do gado O estado atual da guerra obrigounos imediatamente a adotar a reso lução de segurar os gados no interior do país é disto que resulta libertar a agricultura Heia patriotas entrai nos vossos verdadeiros inte resses nos interesses da Pátria em comum DH 1953 p 62 grifos meus Se a pátria é o oposto do despotismo o que se encontra sintetizado numa palavra de ordem dirigida pelo cidadão Costa ao cidadão Freire escrita em Santa Ana aos 14 de março de 1817 Viva a Pátria e morra o Despotismo DH 1953 p 25 o povo como mostra Carlos Guilherme REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 79 Mota já não era concebido como simples componente de uma sociedade de ordens isto é como Terceiro Estado Na Lei Orgâ nica o povo não mais constituía um blo co monolítico Era o povo de todas as clas ses que se convocava a 29 de março de 1817 Antônio Carlos remetia o projeto da Lei Orgânica a cada Câmara que deveria por sua vez fazer concorrer o povo quase todo pois lhe interessa conhecer o como hão de ser governados segundo o An drada Mota 1972 p 107 Isso no en tanto destaquese não eliminava a perma nência daquele ideal aristocrático mencio nado anteriormente A pátria é também aquela unidade aquele tronco comum que unia europeus e brasileiros sem que se es tabelecesse qualquer dependência entre essa unidade e o trono sendo que essas duas idéias encontramse sintetizadas nas pala vras finais da Proclamação do Governo Provisório que repito a seguir A pátria é a nossa mãe comum vós sois seus filhos sois descendentes dos valorosos lusos sois portugueses sois americanos sois brasi leiros sois pernambucanos Carlos Guilherme Mota considera que pátria e propriedade eram idéias interliga das ligada à noção de propriedade estava a noção de pátria e na Paraíba como em outras regiões nordestinas será do antago nismo básico entre portugueses e patrio tas que emergirão as novas formas de pen samento Mota 1972 p 96 Por isso nos termos do artigo 6o do decreto de 9 de abril de 1817 do governo provisório da Paraíba explicitavase que Todas as proprieda des dos vassalos do governo português que forem achados nesta província da Paraíba devem ser embargadas para segurança das propriedades dos nossos patriotas que ha jam de ser embargadas pelo governo portu guês DH 1953 p 98 Mota a partir disso conclui que as propriedades dos vassalos ficavam contrapostas às proprie dades dos patriotas Mota 1972 p 96 A associação entre a revolução e a pro priedade aparece também no documento Preciso embora assuma nesse caso um caráter coletivo público o território da província de Pernambuco como proprieda de de seus habitantes Segundo o Preci so assim o governo provisório procla mara não haver mais daqui por diante di ferença entre nós de Brasileiros a Europeus mas deverem ser tidos em uma só e a mes ma herança que é a propriedade geral de toda esta Província apud Tavares 1917 pp CXIICXIII As disputas pela proprie dade da terra tornaramse objeto de atua ção governamental o que se não demons tra uma clara associação entre pátria e pro priedade indica que o governo que se pro clamava emblema da pátria quando não o seu sinônimo tomava a questão da proprie dade no centro de suas preocupações mes mo num momento em que a ação militar necessariamente era prioritária O governo provisório da Paraíba assim aos 29 de março de 1817 voltandose contra a per turbação que causa aos proprietários de terra as imensas intermináveis disputas e questões ora judiciais ora extraju diciais determina que cada proprietário e possuidor de terras muito exatamente se contenha na posse em que estava até o dia 13 da independência de nossa Província sem passar ao terreno da posse de seu vizi nho frisando seu compromisso com a inviolável segurança da propriedade e paz dos proprietários DH 1953 p 67 No dia 1o de abril de 1817 o mesmo governo fixava punições para os que violavam o direito de propriedade DH 1953 pp 81 2 oito dias depois determinava punições específicas para aqueles que comprassem de escravo alheio algodão ou qualquer outro gênero de lavoura ainda que o tenha de sua cultura sem licença por escrito de seu senhor visto que escravos estavam a furtar seus senhores DH 1953 p 96 O patriotismo também era advogado pela contrarevolução Na Ordem do Dia de Caetano Pinto Montenegro de 4 de março de 1817 o governador demonstra va primeiramente perceber a cisão exis tente na nação portuguesa entre os que nasciam no Brasil e os que nasciam em Portugal Montenegro no entanto chama va a atenção para o fato de ambos serem Portugueses e ao mesmo tempo vassalos da mesma monarquia concidadãos do REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 80 mesmo Reino Unido com o que revelava que a unidade entre os que estavam dos dois lados do Atlântico passava pela sujei ção a um mesmo rei e pela participação de um mesmo corpo político o Reino Unido do qual os vassalos eram concidadãos A ordem reproduzia as idéias de D Rodrigo de Souza Coutinho sobre os portugueses dos quatro cantos do mundo e terminava apelando em favor da harmonia e do amor e fidelidade ao rei O Ilmo e Exmo Sr General constando lhe no dia 01 do corrente de março que nesta Villa entre os nascidos em Portugal e nascidos no Brasil há presentemente alguns partidos fomentados talvez por homens malvados com a louca esperança de tirarem alguma vantagem das desgraças alheias sem se lembrarem que todos somos Portugue ses todos vassalos do mesmo Soberano todos concidadãos do mesmo reino unido e que nesta feliz união igualando e ligando com os mesmos laços sociais os de um e outro continente só deve dividir e separar aos que fomentam tão perniciosas rivalida des Desejando S Excelência que sentimen tos e idéias tão erradas e tão fora do tempo não contaminem a tropa manda recomen dar aos Senhores oficiais e a todos que tem a honra de servir debaixo das Bandeiras de S Majestade Fidelíssima que guardando a subordinação estabelecida pelas leis milita res vivam entre si na melhor harmonia e amizade não tratem nem tenham socieda de com estes homens empestados que pre tendem enganálos com falsas sugestões e que se persuadam sem a menor hesitação que o lugar em que cada um nasce não lhe dá merecimento algum senão o amor a fi delidade ao Soberano o patriotismo e ob servância das leis o exato cumprimento do que deve a Deus a si mesmos e aos outros os talentos e conhecimentos as nobres qua lidades que distinguem os homens embora nascessem eles na Europa na América na África ou Ásia Ordena outrossim que esta se dê por cópia e seja lida nas Companhias até que fiquem todos inteirados das verda des que nela se contém apud Tavares 1917 pp LXXXVILXXXVII A Câmara de Fortaleza Ceará partidá ria da contrarevolução em documento de 6 de abril de 1817 oferece outro exemplo de associação entre pátria e monarquia fazendoo de modo mais explícito com o uso da expressão Fidelidade Amor e Pa triotismo pela Real Família de Bragança apud Mota 1972 pp 107 e 193 Patrio tismo ganhava assim entre os camarários de Fortaleza conotação bem diferente da quela observada entre os patriotas pernam bucanos era sinônimo de fidelidade à fa mília real aliás em contraposição ao pa triotismo dos revolucionários expressão da soberania popular que se antagonizava com o poder monárquico concebido como tirânico e por conseguinte se materializa va no governo provisório inaugurando a edificação de um novo Estado O termo país compreendia circuns crições geográficas diferentes Ora é o Bra sil remetendo ao mesmo tempo ao gover no do Rio de Janeiro ora é a província ora é o Reino Unido Na proclamação ao povo feita pelo governo provisório de Pernam buco assim afirmase por um lado a ir mandade de brasileiros e europeus e por outro lado que ambos habitam o mes mo país professando a mesma religião Brasileiros e europeus todos se conhe cem irmãos descendentes da mesma ori gem habitantes do mesmo País professo res da mesma Religião apud Tavares 1917 p CIX A associação entre país e o governo do Reino Unido por sua vez faz se presente no Ultimatum dado ao gover nador Caetano Pinto de Miranda pelos pa triotas de Pernambuco datado de 7 de março de 1817 e assinado por Domingos Teotônio Jorge pelo padre João Ribeiro Pessoa e por Domingos José Martins Tavares 1917 p CICII depois de enaltecerem as as qua lidades pacíficas de S Excelência os pa triotas prometem segurança ao governador e aos seus acompanhantes desde que fos sem aceitas algumas condições dentre as quais que a tropa do País que se acha na fortaleza do Brum saia com as suas armas para unirse ao corpo apud Tavares 1917 p C Em oposição às tropas do país dizse no Ultimatum que um cor REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 81 po de tropas Patriotas entrará sucessiva mente na dita fortaleza para tomar posse dela em nome da Pátria e este corpo irá encarregado da proteção da pessoa de S Excelência e seus acompanhantes apud Tavares 1917 p CI No documento já citado emanado do governo provisório da Paraíba encontrase a identificação do país à província uso este que como pudemos mostrar faziase também em Minas Ge rais O estado atual da guerra obri gounos imediatamente a adotar a resolu ção de segurar os gados no interior do país DH 1953 p 62 O emprego dos termos pátria e na ção freqüentemente envolve apelos à his tória pregressa A história é usada para cindir ou unir sendo apropriada pelos ato res políticos em estreita ligação com a idéia que apresentam de pátria e nação Os per nambucanos cindem não a pátria posto que ela é a encarnação da vontade popular confundindose nesse sentido com o go verno provisório mas a relação entre a pátria e a monarquia minando portanto o Estado português o Reino Unido E a his tória serve justamente para operar essa ci são entre Estadotrono e pátria e para si multaneamente apresentar o governo pro visório como o reencontro da pátria consi go mesma A história funciona como um espelho de duas faces idênticas numa face a pátriagoverno provisório o presente noutra o passado mais distante de glórias lutas e bravuras da pátria momento em que se fez valer sua soberania diante do invasor holandês não obstante isso se dar a servi ço de um tirano Nesse espelho de duas faces a monarquia aparece como a som bra inscrita já naquele passado da tirania apresentase portanto como antigo cati veiro que embaça a imagem da pátria Reintegrando numa mesma unidade povo e governo com a necessária eliminação do tronoEstado que a conspurca o governo provisório usa o passado para legitimarse e por sua vez diz fazer jus àquele mesmo passado recuperando a herança por ele legada de luta glória e bravura maculada pela monarquia Isso tudo se vê no docu mento que o governo provisório dirigiu aos patriotas pernambucanos aos 15 de março de 1817 conclamandoos a escutar as vozes da Pátria que fala ao vosso cora ção e a engajarse na luta para consumar a grande obra da nossa independência Salientase no documento referido que os grilhões do nosso antigo cativeiro estão quebrados nós somos já livres e metidos de posse de nossos legítimos direitos soci ais ao chamálos a participar da luta lem bralhes a guerra vitoriosa contra os holan deses no século XVII Filhos da Pátria herdeiros naturais da bravura e da glória dos Vieiras e dos Vidais dos Dias e Camarões vinde sem perda de tempo alistarvos debaixo das bandeiras da nossa liberdade Pais e mães de famílias lançai mão da ocasião que se vos oferece de aproveitar os brios de vossos filhos mandaios para o campo da honra e vós os vereis brevemente coroados pelas mãos da pátria dos mesmos louros que ganharam os heróis de Tabocas de Guararapes DH 1953 pp 278 Dirigese também aos patriotas uma advertência no sentido de que não deson rassem aquele passado de feitos dos avós malgrado essas glórias tenham sido em serviço de um tirano Mocidade de Pernambuco não dege nereis do caráter de vossos avós se eles ficaram tão famosos e honrados na me mória dos séculos pelos feitos que obra ram em serviço de um tirano quanto mais o sereis vós seguindo o seu exemplo na defesa de uma causa em que só se trata de nos dar a todos um novo ser a alta digni dade de um povo livre Correi portanto a escrever os vossos nomes no quadro dos defensores da pátria tomando cada um aquela arma que melhor se acomodar à sua inclinação DH 1953 p 28 O reencontro da pátria consigo mesma portanto era uma obra inconclusa e exigia o engajamento dos patriotas Só assim acrescenta o documento mereceriam ter lugar distinto na História do Universo sob REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 82 a observação de todas as nações DH 1953 p 28 O engajamento na luta ao lado do governo provisório enfim garantiria o futuro da pátria no curso da história e ao mesmo tempo a inscrição dos nomes dos patriotas nas páginas da História do Uni verso A mesma retórica fezse presente na Paraíba ampliandose porém o universo das imagens passadas que pelo espelho duplo da história iluminam o presente e definem o futuro da construção do devir à própria memória que se terá deles O go verno paraibano conclamava aos 22 de março de 1817 Mocidade Paraibana correi voai às Ban deiras da Liberdade do Patriotismo e do Heroísmo Alistaivos e deixai vossos no mes nas páginas das histórias futuras com o distintivo de vosso esforço Vejam as Na ções do Universo que os netos dos Vieiras dos Negreiros dos Henriques Dias e dos Camarões imitam um dia os heróis da Grécia e Roma O Novo Mundo sabe criar novos heróis DH 1953 p 49 A história mestra da vida além dos heróis do passado da América Portuguesa oferecia outros exemplos a serem segui dos os heróis da Grécia e Roma Pela ação revolucionária do presente neste Novo Mundo português ademais a his tória criaria novos heróis Esse discurso é muito similar ao presente na Revolta da Nobreza em 1710 e na Inconfidência Mi neira tendo em comum com eles uma opo sição não entre nascidos em Portugal e nascidos no Brasil mas entre povo e rei sociedade ou parte dela e Estado ou a cabeça dele Da rejeição à Coroa porém deslizavase para um campo muito próxi mo do anticolonialismo usandose uma retórica similar aos discursos de Tiradentes nos quais o alferes se apropriava de modo inventivo de um sermão do padre Antônio Vieira proferido aos 2 de julho de 1640 em homenagem ao marquês de Montalvão D Jorge Mascarenhas que então chegava à Bahia como vicerei Todo esse engenho reafirmava a situação de despotismo 24 Na mensagem que Miguel Joaquim César e o padre José Martiniano Pereira de Alencar levaram ao Ceará assim faziase referên cia às opressões que vinham sofrendo desde muito tempo por parte da Coroa portuguesa e aos bens que adviriam de não serem mais governados por ladrões que vinham chupar a nossa substância Leite 1984 p 53 A contrarevolução significativamen te apropriavase dos mesmos fatos inver tendo porém os sinais Na primeira Pro clamação aos Habitantes de Pernambuco feita aos 21 de março de 1817 o conde dos Arcos governador da Bahia afirma cons tar que o Teatro onde brilhava a fidelidade de Fernandes Vieira Camizão sic Hen rique Dias e outros cujos nomes tem es crito na mesma linha dos heróis está mu dado em covil de monstros infiéis e revoltosos considera que ao contrário dis so a divisa dos baianos é Fidelidade ao mais querido dos reis e que cada sol dado da Bahia será um Cipião ao lado dos pernambucanos assim que tiver ordem para vingar a afronta perpetrada contra o soberano DH 1953 p 40 A revolução sendo uma traição na perspectiva do con de dos Arcos nega as ações heróicas do passado conspurcao com a infidelidade sendo seu reverso o soldado baiano fiel à monarquia A fidelidade é a liga passado presente é a imagem que se encontra no espelho de duas faces enquanto a sombra encontrase na traição revolucionária A posição anticolonial ao que tudo in dica assumiu um papel secundário nos discursos dos revolucionários Embora pre sente nas mentes e nas práticas dos atores políticos o alvo principal dos discursos parecia ser o governo monárquico e por isso na perspectiva dos revoltosos o antípoda da pátria era o despotismo daí falarem em contraposição em escutar as vozes da pátria DH 1953 p 27 Há con tudo ambigüidades nos discursos nas quais se insinua o viés anticolonial do movimen to Entre os pernambucanos os trezentos anos de despotismo eram trezentos anos de monarquia tirânica em favor da qual luta ram os valorosos da pátria todavia esses REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 83 mesmos trezentos anos correspondiam ao colonialismo perspectiva essa endossada pelo Governo do Bispado de Per nambuco Com a aprovação do governo pro visório o governo diocesano em procla mação de 8 de março de 1817 por meio da qual explicava a insurgência militar afir mou nossas ovelhas habitantes do Recife conduzidas pela mão do Onipotente vie ram em socorro de seus irmãos e que em um instante e sem anteriores medidas e disposições se despedaçaram as cadeias que ha trezentos anos arrastamos DH 1953 p 10 Tirania e colonialismo ao que tudo indica confundiamse Acontece que o colonialismo acabara ao menos o estrita mente português mas a metrópole interio rizavase a hegemonia dos interesses de comerciantes e burocratas enraizados no CentroSul subordinava e espoliava as ca pitanias do Norte ainda que isso não fosse explicitado senão como domínio do rei por tuguês domiciliado na América Essa am bigüidade de não ser mais colônia propria mente de Portugal mas de parcela da me trópole interiorizada embaralhava a situa ção O governo provisório da Paraíba che gou bem perto de explicitála Se na já citada proclamação de 17 de março de 1817 dizia que a tirania não escutava os cla mores do povo da Paraíba que as queixas desse não eram atendidas no Ministério do Rio de Janeiro ou para seu atendimen to demandavam dispendiosas as diligên cias por meio da qual se tinha um novo diabólico canal da extinção da nossa subs tância DH 1953 p 31 o tenentecoro nelcomandante Estevão José Carneiro da Cunha e o coronel Amaro Gomes Coutinho por sua vez exortavam os soldados cida dãos e povo da província da Paraíba aos 13 de março de 1817 à união dos patriotas em defesa da Pátria e a um Governo Provi sório pedindolhes em nome desse últi mo vos convencerá bem depressa de ser chegado o momento em que a Providência guardava para vos tirar do jugo em que desde os vossos primeiros avós tendes ja zido e a passos largos se ia aumentando DH 1953 p 23 Vista do Largo do Palácio no dia da Aclamação de Dom João VI de J B Debret c 18181831 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 84 EPÍLOGO Derrotada a Revolução Pernambucana sufocada a República que cindia o Brasil e de resto o Império português o Estado monárquico lusitano abandonavase a en cruzilhada dos desencontros do Império lusobrasileiro temporariamente é bem verdade retomaramse os preparativos para a aclamação de Dom João VI como monar ca do Reino Unido de Portugal Brasil e Algarves realizada em 1818 Com isso ce lebravase a idéia de pátria colada à monar quia confundindose pátria e Estado elidindo uma nação no sentido de comuni dade imaginada como soberana embrio nária na pátria sonhada pelos patriotas pernambucanos reiteravase pelo contrá rio a idéia de nação como o conjunto de súditos de um mesmo rei A Revolução Liberal do Porto de 1820 entretanto traria nova turbulência para as relações do soberano com seu império americano e sobretudo para a unidade dos portugueses das quatro partes do mundo sob a sombra do Reino Unido A encruzi lhada dos desencontros seria retomada agora com novas direções A partir da Re volução do Porto as elites provinciais do Reino Unido passaram a identificar clara mente dois centros do poder o Rio de Janeiro a sede do governo absolutista e Portugal onde se encontravam as cortes que no primeiro momento apresentavam se como liberais constitucionais em oposi ção ao rei absolutista Carvalho 1998 pp 3334 As províncias uma a uma esco lheram ficar do lado das cortes e não da Coroa Para a imprensa panfletária portu guesa o Rio de Janeiro era a sede da reação e do absolutismo monárquico podendose imaginar que o mesmo se dava no Brasil Em Pernambuco o desejo por maior autonomia e até sepa ração já era antigo entre muitos letrados e liberais mais exaltados Mas isso não sig nificava aderir ao Rio de Janeiro Muito pelo contrário Veio de lá a repressão a 1817 quando as tropas fiéis à Sua Majestade fidelíssima chegaram ao cúmulo de execu tar até padres Depois de tudo entre os áulicos de Pedro continuava atuante Caetano Pinto de Miranda Montenegro o governador de posto naquela rebelião o qual seria nomea do para a pasta da Fazenda em janeiro de 1822 Carvalho 1998 pp 3334 A Revolução Liberal paulatinamente angariou a simpatia das províncias do Bra sil mas as cortes constituintes de Lisboa engendraram uma nova situação alimen taram de um lado a unidade entre as partes da América e de outro a oposição delas à exmetrópole que queria voltar a ocupar a posição metropolitana Na verdade a Revo lução do Porto como ensina Sérgio Buarque de Holanda teve duas faces foi um movi mento antiabsolutista mas ao mesmo tem po um movimento antibrasileiro o que se explicitou nas cortes constituintes de Lis boa A centralização política que as cortes propunham chamar de volta à Lisboa fruto necessário do próprio radicalismo dos vito riosos soou no Rio de Janeiro como des potismo até mesmo para os liberais Pare cialhes um retrocesso restauração do esta tuto colonial Essa nova situação levou a uma aliança entre os inimigos das cortes mal grado as divergências ideológicopolíticas existentes entre eles adeptos do absolutis mo na Europa juntamse aos secessionistas do Novo Mundo Esse processo de ruptura todavia não foi linear De um lado setores das elites coloniais que nutriam o desejo de manter uma aliança política com a metrópole po sição essa adotada por José Bonifácio e pelo grupo palaciano procuraram manter a uni dade até o último momento Por outro lado as dimensões continentais do Brasil im pediam uma imediata unidade de propósi tos das diversas lideranças locais haven do como já se salientou da parte das pro víncias do Nordeste o ressentimento seja pela situação de neocolônias seja pela re pressão de que foi vítima a República Per nambucana A unidade do Brasil contra Portugal teve que ser construída processo que comportou instabilidade ressentimen tos e rancores e não se pode esquecer o REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 85 uso das armas contra Portugal e contra o que soava como secessão Nessa constru ção de um lado pesaram os propósitos colonialistas das cortes e de outro os te mores de ameaças à ordem social que depois de 1790 ficaram estreitamente as sociadas ao republicanismo e tenderam a produzir uma maior coalizão dentro da eli te especialmente entre a dos proprietários de terra Maxwell 2000 p 189 O fan tasma da ameaça à ordem social exorci zado pelos mineiros em 1789 dado o elitismo do movimento fator de recuo das elites baianas em relação à sedição de 1798 e experiência vivenciada em Pernambuco em 1817 afloraria novamente nos idos de 1822 Embora não tenha calado a secessão ajudou a pavimentar o êxito de um projeto que representava a continuidade renovada do Império lusobrasileiro contra o qual os pernambucanos se voltaram o Império do Brasil sob a hegemonia do CentroSul O desenrolar do processo de Independência no Brasil por fim a partir de 1822 impli cou uma associação estreita entre a idéia liberal e a idéia nacional agora sim opon do brasileiros a portugueses Com isso a presença dos portugueses passou a ser malvista sendo encarada por muitos como perigo mortal para a liberdade perigo esse visto por alguns na própria pessoa do impe rador poupada e exaltada a partir de en tão enquanto reiterava a emancipação do Brasil A vinculação entre o imperador e a Independência por sua vez justificou a mudança de posições de um revolucioná rio pernambucano de 1817 Antônio Carlos de Andrada e Silva De liberal republicano e secessionista em 1817 ele se transfor mou em monarquista constitucional em 1822 afirmando Um brasileiro liberal podia crer em 1817 ser necessário aderir a republicanos e hoje adotar as instituições monárquicas Em 1817 a casa reinante enganada pelo ódio português acabrunhou o Brasil era pois óbvio lançarmonos nas formas republicanas que só então nos pro metiam emancipação Hoje graças à Provi dência S A R conhece os seus verdadeiros interesses e está convencido que a emanci pação do Brasil é o passo preliminar da sua prosperidade e da glória de seu reinado e tem desta maneira ajuntando em torno de si os verdadeiros patriotas apud Neves 2004 p 377 Fincavamse enfim as bases de um novo Estado uma nova Pátria no sentido de valores morais e políticos que confirmavam a emancipação da comunida de política do Brasil cuja consolidação envolveu a passagem por novas encruzilha das de desencontros e secessão além desses desafios o Império do Brasil enfrentou a tarefa de construir a nação brasileira apenas esboçada nos idos de 1822 25 NOTAS 1 Esse surto patriótico imperial todavia difundiuse de modo diferenciado no tempo e no espaço Se imediatamente após a chegada parecer terse difundido por toda a América passados alguns anos concentrouse nas capitanias do CentroSul Evaldo Cabral de Mello a partir de John Armitage afirma que um notável descompasso prevaleceu no período joanino e ao tempo da Independência entre as aspirações políticas do Norte e do Sul da América portuguesa Se a elevação do Brasil a reino fora suficiente para contentar o Sul não bastou para evitar a revolução republicana de 1817 Mello 2003 p 10 Sobre a utopia da criação no Brasil de um grande império português ver Lyra 1994 pp 10790 2 A expressão interiorização da metrópole é usada por Maria Odila Leite Silva Dias Segundo essa historiadora a transferência da Corte provocou o enraizamento de interesses portugueses e sobretudo o processo de interiorização da metrópole no CentroSul da Colônia Dias 1972 p 165 nessa região fixaramse novos capitais e interesses portugueses associados às classes dominantes nativas e também polarizadas em torno da luta pela afirmação de um poder executivo central que queriam fortalecer contra as manifestações de insubordinação das classes menos favorecidas muitas vezes identificadas com nativismos facciosos ou com forças regionalistas hostis umas às outras e por vezes à nova corte como seria o caso do Nordeste na revolução de 1817 e na Confederação do Equador Dias 1972 p 179 Ao dedicarse à consolidação de um império do Brasil Dias 1972 p 169 a monarquia ao mesmo tempo em que fincava raízes e articulava grupos e interesses no CentroSul do Brasil criava uma situação que gerava tensões e latentes possibilidades de insurgência no próprio Portugal e no norte da América Portuguesa Essa nova configuração política o novo império português Metrópole interiorizada no CentroSul implicava o controle e a exploração das outras colônias do continente como a Bahia e o Nordeste Dias 1972 p 173 Às capitanias parecia a mesma coisa dirigirse ao Rio de Janeiro do que a Lisboa 3 A presença do monarca português no Rio de Janeiro foi um fator diferencial no desenrolar do processo de Independência da América Portuguesa em relação às demais colônias européias do Novo Mundo Teve impactos porém distintos conforme a região e mesmo contraditórios quando se pensa nas percepções que os atores políticos construíram à época Francisco Muniz Tavares homem que se engajou na Revolução Pernambucana de 1817 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 86 sublinha o efeito negativo para o êxito da Revolução Pernambucana de 1817 da desconsideração dessa presença diferencial do monarca Acreditava que no caso do Brasil seria preciso considerar a existência da monarquia ocupada por um Rei naturalmente bom ou seja a presença do trono mudava os parâmetros do jogo político a ser desenvolvido no Brasil existia um trono e ocupado por um Rei naturalmente bom circunstância que muito diversificava a posição respectiva Tavares 1917 p LXXXV Kenneth Maxwell defende posição semelhante pois considera que o sistema da monarquia centralizada havia estabelecido uma forte presença institucional desde 1808 e esse fator foi crítico para determinar o sucesso de D Pedro na proteção de seu novo império aos desafios republicanos Maxwell 2000 p 189 Sérgio Buarque de Holanda explicanos que a vinda da Corte para o Rio de Janeiro afagou a vaidade brasileira pondo a nu porém a debilidade de um domínio que a simples distância aureolara na colônia de formidável prestígio Holanda 1985 p 11 István Jancsó e João P Pimenta 2000 p 153 avaliam que algo muito maior que vaidade se desenvolveu na percepção das elites locais da América Portuguesa na nova situação ampliarseia a sua participação na gestão da coisa pública com a maior proximidade do centro de poder o que no plano das identidades coletivas traduziuse no reforço de sua adesão à portuguesa engendrando um surto de patriotismo imperial Ampliouse grandemente o número de personagens que formavam a sociedade política na América Portuguesa se confrontado o quadro emergente do 1808 com aquele prevalecente anteriormente a essa data Jancsó Pimenta 2000 p 149 4 Se tomarmos mercado como trocas regulares entre compradores e vendedores de uma economia determinada ou como a instituição que os coloca em contato recíproco conforme afirma Cláudia Chaves 2001 p 52 existe mercado no Brasil colonial desde o século XVI pois desde essa época existem trocas entre pequenos agricultores e os donos de engenhos a produção de alimentos para mercados coloniais era um desdobramento da produção destinada ao consumo da unidade produtiva Tratavase de mercados locais isolados e não regulamentados exceto para a comercialização em vilas e arraiais próximos para o que existiam as posturas estabelecidas pelas Câmaras Chaves 2001 p 52 Depois de 1780 observamse segundo a mesma autora importantes traços de integração mas ainda profundamente marcados pela política de fragmentação colonialista na qual se incentivava a correspondência direta das capitanias com a metrópole e não a integração delas Chaves 2001 p 77 João Luís Fragoso concebe a existência de um mercado restrito característico das economias nãocapitalistas com uma incipiente divisão do trabalho um precário índice de circulação de mercadorias e baixa liquidez em parte relacionada com o frágil índice de circulação de numerário Fragoso 1998 pp 181 e 184 Na última etapa do período colonial toda a crescente complexidade da vida econômica no continente do Brasil interligando mercados regionais crescentemente dinâmicos outrora com ligação mais rarefeita gerava possibilidades de integração novas abrangências em meio à diversidade Na esteira da rota das mercadorias em meio a transformações no lócus da realização das mercadorias coloniais o mercado africano e o mercado europeu ambos abalados pela desordem revolucionária do final do século XVIII politizavamse as identidades coletivas regionais Jancsó Pimenta 2000 pp 1423 Isso tudo conduzia à percepção por parte dos homens de outrora da perda de operacionalidade das formas consagradas de reiteração da vida social instaurando uma situação de crise definida por uma generalização da busca de alternativas para a aludida perda de operacionalidade Jancsó Pimenta 2000 pp 1423 5 Segundo Ricardo Mário Gonçalves 1994 p 505 a maçonaria é uma sociedade de pensamento convívio fraterno e filantropia de caráter internacional restrita ao sexo masculino mais discreta do que secreta fundada na Inglaterra em 1717 tomando por modelo as agremiações medievais de pedreiros Distinguiase das outras sociedades de pensamento surgidas no século XVIII por difundir um corpo doutrinário que misturava influências diversas como os Mistérios da Antigüidade Pagã o Pitagorismo a Cabala o Hermetismo etc transmitidos aos membros por ritos iniciáticos símbolos e instruções Gonçalves 1994 p 505 A maçonaria agiu como foco de veiculação de idéias do Iluminismo e Liberalismo tendo reunido elementos de diferentes estratos das elites passando por cima das diferenças donos de manufaturas homens de ciência e intelectuais locais Outram 1995 p 25 Nos países latinos pela perseguição que sofreu da Igreja Católica a partir de 1738 a maçonaria assumiu uma feição secreta anticlerical Fez se presente em Portugal desde cerca de 1740 havendo nas lojas portuguesas a presença de várias pessoas nascidas no Brasil Malgrado a existência de proibição de qualquer tipo de associação voluntária no Brasil antes da chegada da família real em 1808 Neves 2003 p 34 a primeira loja maçônica aqui estabelecida data de 1797 a Cavaleiro da Luz fundada na Bahia a que se seguiu a criação de várias lojas no Rio e na Bahia reprimidas em 1806 pelo conde dos Arcos Gonçalves 1994 p 506 Há hipóteses de que a Inconfidência Mineira de 178889 tenha sido um movimento ligado à maçonaria Leite 1991 p 22 Após 1808 a loja do Grande Oriente foi o veículo de difusão das idéias maçônicas tendo exercido junto com as sociedades secretas importante papel na Independência do Brasil Neves 2003 p 34 Segundo Francisco Muniz Tavares a Grande Oriente ou Governo Supremo da Sociedade sediavase na Bahia residência do maior número dos sócios que tinham sido iniciados e elevados aos altos graus na Europa O temor de comprometimento e a crassa ignorância restringia a aquisição de adeptos em todas as províncias fora a de Pernambuco que já em 1816 contava debaixo da direção de uma Grande Loja provincial quatro lojas regulares compostas de pessoas distintas por ciência e virtudes A tolerância de Caetano Pinto concorria para esse extraordinário progresso Tavares 1917 p LXXXV Em relação à maçonaria contudo é importante que o historiador evite cercar seu objeto de imaginários poderes e assumir a visão dos homens de Estado de outrora que viam no complô dos malvados pedreiros livres a origem da desinquietação dos povos e da perda da tradicional lealdade e submissão ao monarca Bernardes 2001 p 139 6 Núcleos secretos com fins emancipacionistas e anticolonialistas mas que não apresentavam os vínculos internacionais nem todas as características doutrinárias das organizações maçônicas e não permitiam acesso aos europeus É difícil precisar se tais núcleos não eram maçônicos devido ao caráter secreto dos mesmos Barreto 1985 pp 192200 7 Em 1798 fundouse o Areópago de Itambé por Arruda Câmara em 1802 a Academia de Suassuna depois com as Academias do Paraíso de Antônio Carlos de Andrada e Silva a Escola Secreta de Vicente Ferreira dos Guimarães Peixoto do Cabo e do Paraíso surgiram também as Lojas Patriotismo Pernambuco do Oriente e Pernambuco do Ocidente Barreto 1985 p 200 Machado 1917 pp XXIIIXXV Tavares 1917 p LXXXV Há interpretações que associam diretamente a Revolução de 1817 à maçonaria que certamente estava por trás de um movimento ocorrido no mesmo ano no Porto liderado por Gomes Freire de Andrade grãomestre maçônico 8 No Vocabulário Portuguez Latino Áulico Anatômico Architetonico de Raphael Bluteau publicado em 1716 há um verbete para Brasil Grande Região da América Meridional descoberta por Pedro Álvares Cabral Tem o Brasil o princypio de sua parte marítima da foz do Rio do Maranhão em cuja fronte que fica ao Norte tem sua mayor latitude em dous graus da Equinocial dahi se vai estreitando e dilatando com differentes giros em forma quasi triangullar por mais de mil légoas das costa até rematar quase em ponta no Cabo de S Maria boca do Rio da Prata em 45o ao meyo dia Divide se o Brasil em 14 Capitanias ou Províncias a saber Tamaraca que he a mais antiga de todas Bahia donde reside o Governador Pernambuco Para Maranhão Ciara Rio Grande Paraíba Seregipe os Ilheos Porto Seguro Espírito Santo Rio de Janeiro S Vicente No tempo da dominação de Castella reconquistarão os Portuguezes com muita gloria com grande beneficio de sua Pátria este Estado Bluteau 1716 p 186 Se nesse verbete chamam atenção as imprecisões relativas à administração e à geografia do Brasil fica visível ao mesmo tempo que nenhuma referência há a aspectos que ultrapassem a percepção de grandeza da terra Significativamente no mesmo dicionário não há verbete para o termo brasileiro A historiografia nas últimas décadas vem enfatizando o caráter impreciso quase etéreo da idéia de Brasil existente no período colonial A idéia de Brasil nunca foi única segundo Stuart Schwartz significou coisas diferentes para pessoas diferentes devendo o termo ser reinterpretado para refletir as diferenças e discrepâncias entre pessoas de extrações e posições sociais distintas como idéia o Brasil foi freqüentemente mais um projeto do que uma realidade às vezes geográfica às vezes nacional ou até social constituíramse vários projetos de Brasil projetos em disputa e distintos sobre o que o Brasil deveria ser ou representar Schwartz 2000 p 105 A idéia de Brasil colonial com a qual geralmente temos lidado originase de um setor específico da população de onde saíram os escritos que utilizamos um pequeno contingente da elite alfabetizada quase sempre homens a grande maioria deles educados em Portugal onde inclusive publicam seus trabalhos escritos que ademais foram produzidos sob a vigilância da Igreja e do Estado publicados na metrópole e para um público metropolitano obviamente passando por um filtro e portanto não podendo ser considerados representativos do desenvolvimento de uma consciência de sua própria classe e muito menos da massa dos habitantes iletrados da colônia especialmente aqueles de REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 87 origem africana indígena e mestiça Schwartz 2000 p 106 Laura de Mello e Souza ao analisar um parecer de Antonio Rodrigues da Costa letrado poliglota diplomata historiador conselheiro do Conselho Ultramarino de 1709 a 1732 quando morreu no exercício do cargo como seu presidente conclui que a unidade do Brasil foi percebida inicialmente de fora Para o conselheiro Rodrigues da Costa mais precisamente a unidade era dada pelas revoltas e considerava que se devia castigar os rebeldes da guerra dos emboabas para apagar este incêndio que poderá abrasar não só aquele largo distrito das minas e perderse o inestimável tesouro delas mas perder as capitanias do Rio de Janeiro e pôr em perigo todo o Estado do Brasil apud Souza 2001 pp 123 De meados do século XVIII aos inícios do XIX o Brasil aos olhos dos estrangeiros que o estudavam eou visitavam era de um continente designação genérica de uma realidade na qual não viam unidade e no caso de alguns sublinhavam a diversidade Ver por exemplo Raynal 1820 tomo 5 p 4 9 Segundo Ilmar Rohloff de Mattos 1999 p 18 o processo de emancipação política foi lento não linear envolvendo como condições subjetivas a distinção entre mazombos e reinóis e a constatação do antagonismo entre os interesses dos habitantes da Colônia e da Metrópole 10 Segundo Sérgio Buarque de Holanda na América Portuguesa a existência de forças centrífugas remonta às origens da colonização não tendo sido superadas com a transferência da Corte A corte lisboeta desenvolvera antes disso esforços centralizadores que apenas parcialmente foram bem sucedidos O estabelecimento do governo geral da Bahia foi embargado por um dos donatários e os governadores das capitanias ao longo do período colonial resistiram ao menos passivamente aos governadoresgerais e aos vicereis Os governadores das capitanias estabeleciam comunicações diretas com a metrópole não obstante a presença dos governos gerais Podese supor mesmo que houve um caráter proposital nessa situação o fortalecimento das administrações locais prevenia a possibilidade de tendências secessionistas que poderiam advir de uma centralização política na Bahia ou no Rio de Janeiro O título de vicerei assim possuía um caráter meramente honorífico Isso não se alterou radicalmente com a vinda da Corte nem mesmo com a elevação do Brasil à condição de Reino pois a unidade então constituída era uma espécie de federação base pouco sólida Holanda 1985 pp 9 e 157 Caio Prado Jr também analisa a descentralização administrativa que marcou o período colonial Para ele a distância de Lisboa dava grandes poderes aos governadores das capitanias aos olhos da administração metropolitana inexistiria uma idéia de unidade da colônia Prado Jr 1976 pp 3034 A unidade existia na geografia e no consenso de todos aparecia nos títulos honoríficos de vicerei do Brasil e no de príncipe do Brasil e também no chamado Estado do Brasil o qual porém reunia nominalmente apenas as capitanias meridionais em oposição ao Estado do Pará e Maranhão que juntava nominalmente estas capitanias e mais as subalternas do Piauí e São José do Rio Negro Prado Jr 1976 p 304 11 Francesco Rossolillo rejeita a concepção usual de nação como um grupo de pessoas unidas por laços naturais e eternos ou pelo menos existentes ab immemorabili e que por causa desses laços se torna a base necessária para a organização do poder sob a forma do Estado nacional Rossolillo entende que é muito difícil definir a natureza desses laços raça Pessoa coletiva composta por grupos possuidores de características comuns como língua costumes religião etc ou mesmo definida em função de uma vontade de viver juntos Na realidade há nações que são plurilingües como a Suíça lá se falam francês alemão e italiano que o monolingüismo de determinadas nações como a França ou a Itália não é algo original mas fruto da imposição do poder político os costumes de regiões próximas habitadas por nações diferentes são muitas vezes mais similares do que os de regiões distantes entre si habitadas por uma mesma nação Por essas razões Rossolillo e outros cientistas políticos defendem a idéia de que a nação é uma construção ideológica imaginária de uma certa unidade feita pelas classes dominantes e pelos Estados que lhes servem a Nação não passa de uma entidade ideológica isto é do reflexo na mente dos indivíduos de uma situação de poder surgida com a Revolução Francesa a Nação é a ideologia de um determinado tipo de Estado a que se dirige concretamente o sentimento de fidelidade que a idéia de nação suscita e mantém Unidade imaginária resultante da ação do Estado seus fundamentos variam conforme a história dos Estados e os interesses desses diferentes conforme o momento quando os franceses disputavam a região da Alsácia com os alemães região em que se falava o alemão e onde os costumes eram similares aos desse povo diziam que a nação era o grupo dos que querem viver juntos enquanto os alemães afirmavam que o fundamento da nação era a comunhão da língua e de costumes Rossolillo 1997 pp 7959 12 Sobre as Inconfidências de Minas e da Bahia ver Furtado 2002 Maxwell Silva 1986 Maxwell 1985 Maxwell 1989 Mota 1979 Jancsó 1997 pp 387437 Jancsó 2001 pp 36187 Jancsó 1996 Reis 1985 Tavares 1975 e Tavares 1959 13 Segundo tais teorias de poder embora fosse oriundo de Deus não transitava diretamente para o rei passando ao contrário pela mediação da comunidade cujo bemestar deveria ser objeto de cuidado do soberano Caso o governante se tornasse um tirano pela comunidade teria legitimidade para insurgirse ainda que em relação a isso alguns teóricos fossem bastante cautelosos descrevendo os modos apropriados de fazêlo Na Ibéria tais concepções predominaram até meados do século XVII impregnando a doutrinação política até o século XVIII constituindose como as premissas do pensamento político lusobrasileiro e hispanoamericano Skinner 1996 pp 417 e 4504 Morse 1995 pp 2829 64 72 e 923 Torgal 1981 vol 1 pp 110 e 245 Xavier 1998 Macedo 1981 pp 767 14 Com relação à Inconfidência Mineira a influência mais perceptível de Antônio Vieira foi o sermão feito na Bahia aos 2 de julho de 1640 em homenagem ao marquês de Montalvão D Jorge de Mascarenhas primeiro vicerei do Brasil Sobre esse Sermão ver Vieira 1938 pp 1568 Dos livros de história de Portugal são influências presumidas História de Portugal Restaurado de D Luís de Menezes conde da Ericeira Histoire des Révolutions de Portugal do Abbé Vertot Histoire Générale de Portugal de Nicolas de La Clède e História Genealógica da Casa Real Portuguesa de D Antônio Caetano de Souza 15 Os textos místicos encontrados pela devassa na Bahia são Aviso de Petesburgo Fevereiro de 1796 e Les Ruines ou Méditation sur les Révolutions des Empires de Volnay este último extraído do capítulo XXII intitulado Origem da Idéia de Deus Mattoso 1969 pp 1224 e 139 16 Obra publicada inicialmente em 1770 analisa a colonização européia nas duas Índias e narra a Independência das Treze Colônias Inglesas da América do Norte contém uma parte o tomo 5 inteiramente dedicada à América Portuguesa Esse tomo e a narrativa sobre a Independência dos Estados Unidos foram editados em português recentemente GuillaumeThomas François Raynal A Revolução da América trad de Regina Clara Simões Lopes Rio de Janeiro Arquivo Nacional 1993 e idem O Estabelecimento dos Portugueses no Brasil trad Mônica F Campos de Almeida e Flávia Roncari Gomes Rio de JaneiroBrasília Editora UnBArquivo Nacional 1998 17 Texto de grande êxito internacional encontrado praticamente entre todos os participantes do movimento baiano contém idéias frontalmente contrárias ao absolutismo de Luís XVI e aos abusos e privilégios de sua Corte Sobre o mesmo ver Neves 1989 pp 1215 Mattoso 1969 e Mattoso 1990 pp 34156 18 Texto elaborado pelo conde de mesmo nome tinha por objetivo desarticular a coligação formada contra a França apresentando para tanto a Rússia e a Inglaterra como as duas grandes inimigas dos países europeus secundadas pela Áustria e conclamando esses últimos a se unirem com a França cujo governo por ser plenipotenciário e nomeado pela totalidade do povo francês para fazer a paz poderia por isso mesmo assegurála de forma muito mais sólida Discurso de Boissy DAnglas in Mattoso 1969 pp 1224 e 129 19 Disso é exemplo o conde da Ericeira em sua obra História do Portugal Restaurado Referindose a um pronunciamento de elrei Dom João IV Ericeira relata que o soberano restaurador dissera que as normas de sucessão que excluíam os estrangeiros da ascensão ao trono português estabelecidas pelas Cortes de Lamego realizadas lendariamente em 1145 mostravam que se instituíam Príncipes para a República e não República para os Príncipes porque a sucessão dos Reis só devia atender à sua conservação e liberdade Ericeira 1945 vol 1 p 37 Na República portuguesa portanto não concebida como forma de governo republicana o príncipe tinha poderes limitados pelo interesse comum da conservação e liberdade dessa mesma república não podendo fazer tudo o que quisesse como defendia Maquiavel REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 88 20 O cônego Vieira ao que tudo indica referese à invasão ocorrida em 1711 No dia 12 de setembro desse ano uma esquadra francesa comandada por DuguayTrouin entrou na baía de Guanabara tendo os regimentos as milícias e os moradores no dia 21 do mesmo mês abandonado a cidade do Rio de Janeiro incentivados pelo governador Castro Morais Os invasores encontraram a cidade deserta e a saquearam sem contudo achar ouro e então ameaçaram destruíla O governador para impedir que isso acontecesse negociou um resgate no valor de 610 mil cruzados em sua maior parte pagos com os quintos régios embora tenham sido feitas contribuições dos moradores mais abastados Souza Bicalho 2000 pp 526 21 Cumpre sublinhar que a expressão fazer corpo de república guarda bastante semelhança com formar república expressão usada no já citado História do Portugal Restaurado e que parece indicar forma de governo republicana Na passagem em que o conde da Ericeira narra o diálogo travado entre Antônio Pais e o duque de Bragança futuro d João IV disse Antônio Pais ao Duque que antes que passasse mais adiante se servisse o tirar de uma dúvida a qual era que se acaso os portugueses formassem República que partido havia de seguir se o de Portugal se o de Castela Respondeulhe o Duque que sempre estivera deliberado a se não apartar do comum consentimento do reino e qualquer perigo a que se arriscasse por defesa da pátria teria por muito suave Ericeira 1945 vol 1 p 110 grifo meu Sabese que no referido episódio os nobres portugueses procuraram vencer as hesitações do duque de Bragança em assumir o trono e pôrse à frente do movimento contra a Espanha usando a ameaça de reconquistar a Independência portuguesa sob a forma republicana Mello 1995 p 280 22 Evaldo Cabral de Mello considera que em Pernambuco ao contrário do que se pode imaginar a endogamia constituía uma irracionalidade em termos econômicos pois num quadro de retração e estagnação da economia açucareira que se estenderia de meados do século XVI até o último quartel do século XVIII prestavase apenas a dividir a pobreza Mello 1989 pp 2401 A endogamia seria ainda segundo o mesmo historiador no período holandês o meio pelo qual os pernambucanos exprimiram a rejeição lusobrasileira aos valores culturais dos invasores calvinistas depois a discriminação contra os reinóis de camadas subalternas preconceitos de classe e pruridos linhagísticos Mello 1989 p 240 23 Segundo Muniz Tavares a Proclamação ao Povo fora escrita pelo padre Miguel Joaquim de Almeida e Castro o qual com a mesma aborria os movimentos precipitados desejava a revolução não a provocava queria uma república mas quando fossem dispostos os elementos quando os meios de sustentar se proporcionassem à dificuldade da empresa Não se esquecia da antipatia dos Portugueses contra os Brasileiros mas refletindo a Pátria precisava de braços e que com uma violenta expulsão muito se perderia em capitais imaginando vencer a dureza com a generosidade de propósito tratou de acarinhálos Tavares 1917 pp CIXCX 24 O padre Vieira no sermão citado falava em tributos que tiravam para Portugal o que dava o Brasil e em ministrosgovernadores que de três em três anos desembarcavam na Colônia e que como nuvens chupavam a riqueza desse carreandoa para Lisboa e Madri Os ministros seriam como as nuvens sorvendo por oculto segredo da natureza grande quantidade de água indo chover depois de bem carregadas a cinqüenta léguas Os ministros que vinham ao Brasil e as partes ultramarinas ademais não faziam mais que chupar adquirir ajuntar encherse por meios ocultos mais sabidos e ao cabo de três ou quatro anos em vez de fertilizarem a nossa terra com água que era nossa iam chover a Lisboa esperdiçar a Madrid motivo pelo qual nada lhe luzia ao Brasil por mais que desse Essa água retirada do Brasil frisese não era tirada da abundância do mar mas das lágrimas do miserável Vieira 1938 pp 1567 Finalizando Vieira propunha a Restauração do Brasil desta vez se há de restaurar o Brasil em outros termos tudo o que der a Bahia para a Bahia há de ser tudo o que se tirar do Brasil com o Brasil se há de gastar Vieira 1938 p 158 Tiradentes repetia os mesmos elementos falava em governadores em período de três anos em riqueza chupada Falava ainda em restaurar Substituía apenas nuvens por esponja cujo formato aliás lembra o de uma nuvem acrescentava quadrilha e criados aos governadores e ainda pensava numa riqueza que seria natural se não houvesse a espoliação colônia juntando as críticas de Viera à administração portuguesa à censura do padre Raynal à colonização mercantilista Villalta 2000 pp 635 25 O Império nascente do Brasil teve que se defrontar com a heterogeneidade que o caracterizava José Bonifácio assim se pronunciava sobre esse desafio É da maior necessidade ir acabando tanta heterogeneidade física e civil cuidemos pois desde já em combinar sabiamente elementos discordes e contrários e em amalgamar tantos metais diversos para que saia um Todo homogêneo e compacto que se não esfarele ao pequeno toque de qualquer nova convulsão política José Bonifácio de Andrada e Silva Representação à Assembléia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil sobre a Escravatura apud Jancsó Pimenta 2000 p 173 BIBLIOGRAFIA ADIM Autos de Devassa da Inconfidência Mineira 2a ed BrasíliaBelo Horizonte Câmara dos DeputadosImprensa Oficial de Minas Gerais 1980 ALEXANDRE Valentim Os Sentidos do Império Questão Nacional e Questão Colonial na Crise do Antigo Regime Português Porto Edições Afrontamento 1993 ANDERSON Benedict Nação e Consciência Nacional São Paulo Ática 1989 BARRETO Célia de Barros Ação das Sociedades Secretas in Sérgio Buarque de Holanda org História Geral da Civilização Brasileira 7a ed São Paulo Difel 1985 Tomo 2 Vol 1 pp 191206 BERBEL Márcia Pátria e Patriotas em Pernambuco 18171822 2001 datiloscrito BERNARDES Denis Antônio de Mendonça O Patriotismo Constitucional Pernambuco 18201822 Tese de doutorado São Paulo FFLCHUSP 2001 BLUTEAU Raphael Vocabulário Portuguez Latino Áulico Anatômico Architetonico Lisboa Officina de Paschoal Silva 1716 CARVALHO Marcus J M de Cavalcantis e Cavalgados a Formação das Alianças Políticas em Pernambuco 1817 1824 in Revista Brasileira de História 1836 São Paulo 1998 pp 33165 CHAVES Cláudia Maria das Graças Melhoramentos no Brasil Integração e Mercado na América Portuguesa 1780 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 89 1822 Tese de doutoramento Niterói UFF 2001 pp 79141 COSTA Emília Viotti da Introdução ao Estudo da Emancipação Política in Carlos Guilherme Mota org Brasil em Perspectiva 11a ed São Paulo Difel 1980 pp 64125 CUNHA Pedro Octávio Carneiro da A Fundação de um Império Liberal in Sérgio Buarque de Holanda org História Geral da Civilização Brasileira 7a ed São Paulo Difel 1985 tomo 2 vol 1 pp 13578 DH Documentos Históricos A Revolução de 1817 Rio de Janeiro Biblioteca Nacional 1953 vol CI DIAS Maria Odila Leite da Silva A Interiorização da Metrópole 18081853 in Carlos Guilherme Mota org 1822 Dimensões São Paulo Perspectiva 1982 pp 16084 ERICEIRA Conde da D Luís de Menezes História de Portugal Restaurado Ed anotada e prefaciada por António Álvaro Dória Lisboa Livraria Civilização Editora 1945 4 vols FAORO Raymundo Os Donos do Poder Formação do Patronato Político Brasileiro Rio de Janeiro Editora Globo 2000 vol 1 FURTADO João Pinto O Manto de Penélope História Mito e Memória da Inconfidência Mineira de 17889 São Paulo Companhia das Letras 2002 pp 76128 GONÇALVES Ricardo Mário Maçonaria in Maria Beatriz Nizza da Silva Dicionário da História da Colonização Portuguesa no Brasil Lisboa Verbo 1994 pp 5057 HOBSBAWN Eric J Nações e Nacionalismo desde 1789 3a ed Rio de Janeiro Paz e terra 2002 HOLANDA Sérgio Buarque A Herança Colonial sua Desagregação in História Geral da Civilização Brasileira 7a ed São Paulo Difel 1985 tomo 2 vol 1 pp 939 IBDS A Inconfidência da Bahia Devassas e Seqüestros Separata de Anais da Biblioteca Nacional Rio de Janeiro Biblioteca Nacional 1931 2 vol JANCSÓ István PIMENTA João Paulo G Peças de um Mosaico ou Apontamentos para o Estudo da Emergência da Identidade Nacional Brasileira in Carlos Guilherme Mota org Viagem Incompleta 15002000 a Experiência Brasileira Formação Histórias São Paulo Editora SenacSão Paulo 2000 pp 12775 JANCSÓ István A Sedução da Liberdade Cotidiano e Contestação Política no final do século XVIII in Laura de Mello e Souza org História da Vida Privada no Brasil Cotidiano e Vida Privada na América Portuguesa São Paulo Companhia das Letras 1997 p 387437 Bahia 1798 a Hipótese de Auxílio Francês ou a Cor dos Gatos in Júnia Ferreira Furtado org Diálogos Oceânicos Minas Gerais e as Novas Abordagens para uma História do Império Ultramarino Português Belo Horizonte UFMG 2001 pp 36187 LACOMBE Américo Jacobina A Conjuração do Rio de Janeiro in Sérgio Buarque de Holanda org História Geral da Civilização Brasileira 7a ed São Paulo Difel 1985 tomo 1 vol 2 pp 40610 LEITE Glacyra L A Insurreição Pernambucana de 1817 São Paulo Brasiliense 1984 LEITE Paulo Gomes A Maçonaria o Iluminismo e a Inconfidência Mineira in Revista Minas Gerais 33 Belo Horizonte jan1991 pp 1823 LIMA Oliveira D João VI no Brasil 3a ed Rio de Janeiro Topbooks 1996 LYRA Maria de Lourdes Viana A Utopia do Poderoso Império Rio de Janeiro Sette Letras 1994 MACEDO Jorge Borges de Formas e Premissas do Pensamento Lusobrasileiro do Século XVIII in Revista da Biblioteca Nacional 1 1 Lisboa 1981 pp 7484 MACHADO M L M Introdução in Francisco Muniz Tavares História da Revolução Pernambucana de 1817 Ed revista e anotada por Oliveira Lima Recife Imprensa Industrial 1917 pp ILXX MATTEUCCI Nicola Republica in Norberto Bobbio Nicola Mateucci Gianfranco Pasquino Dicionário de Política Brasília UnB 1997 vol 2 pp 11079 MATTOS Ilmar Rohloff de O Tempo Saquarema a Formação do Estado Imperial 4a ed Rio de Janeiro Access 1999 MATTOSO Katia de Queirós Presença Francesa no Movimento Democrático Baiano de 1798 Salvador Itapuã Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Bahia 1969 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 90 Bahia 1798 os Panfletos Revolucionários Proposta de uma Nova Leitura in Osvaldo Coggiola A Revolução Francesa e seu Impacto na América Latina São PauloBrasília CNPqEduspNovastela 1990 pp 34156 MAXWELL Kenneth SILVA Maria Beatriz Nizza da A Política in Maria Beatriz Nizza da Silva coord O Império LusoBrasileiro 17501822 Lisboa Editorial Estampa 1986 pp 333441 MAXWELL Kenneth A Devassa da Devassa Inconfidência Mineira BrasilPortugal Rio de Janeiro Paz e Terra 1977 caps 3 4 5 e 6 pp 84204 Conjuração Mineira Novos Aspectos in Estudos Avançados 3 6 São Paulo maiago1989 pp 223 Marquês de Pombal Paradoxo do Iluminismo Rio de Janeiro Paz e Terra 1996 Por que o Brasil Foi Diferente O Contexto da Independência in Carlos Guilherme Mota org Viagem Incompleta 15002000 a Experiência Brasileira Formação Histórias São Paulo Editora SenacSão Paulo 2000 pp 17795 MOTA Carlos Guilherme Nordeste 1817 Estruturas e Argumentos São Paulo Perspectiva 1972 MELLO Evaldo Cabral de A Fronda dos Mazombos Nobres Contra Mascates Pernambuco 16661715 São Paulo Companhia das Letras 1995a O Nome e o Sangue uma Fraude Genealógica em Pernambuco Colonial São Paulo Companhia das Letras 1995b O Jogo da Independência in Folha de S Paulo São Paulo 2332003 pp 101 MORSE Richard M O Espelho de Próspero Cultura e Idéias nas Américas Trad de Paulo Neves São Paulo Companhia das Letras 1995 MOTA Carlos Guilherme org Brasil em Perspectiva 11a ed São Paulo Difel 1980 MOTA Carlos Guilherme org 1822 Dimensões São Paulo Perspectiva 1982 pp 16084 MOTA Carlos Guilherme orgViagem Incompleta 15002000 a Experiência Brasileira Formação Histórias São Paulo Editora SenacSão Paulo 2000 pp 12775 MOTT Luiz A Revolução dos Negros do Haiti e o Brasil in Escravidão Homossexualidade e Demonologia São Paulo Ícone 1988 pp 1148 NEVES Guilherme Pereira das Bahia 1798 uma Leitura Colonial da Revolução Francesa a Propósito da Tradução Portuguesa de um Texto de JeanLouis Carra in Acervo Revista do Arquivo Nacional Rio de Janeiro 4 1 jan jun1989 pp 121125 Do Império LusoBrasileiro ao Império do Brasil in Ler História 2728 Lisboa 1995 pp 75102 A Suposta Conspiração de 1801 em Pernambuco Idéias Ilustradas ou Conflitos Tradicionais in Revista Portuguesa de História 33 Coimbra 1999 pp 43981 NEVES Lúcia Maria Bastos Pereira das MACHADO Humberto Fernandes Portugueses ou Brasileiros in O Império do Brasil Rio de Janeiro Nova Fronteira 1999 pp 65120 NEVES Lúcia Maria Bastos Pereira das Corcundas e Constitucionais a Cultura Política da Independência 1820 1822 Rio de Janeiro FaperjRevan 2003 NORTON Luís A Corte de Portugal no Brasil São PauloBrasília NacionalINL 1979 NOVAIS Fernando Antônio MOTA Carlos Guilherme A Independência Política do Brasil 2a ed São Paulo Hucitec 1996 NOVAIS Fernando Antônio Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial 17771808 2a ed São Paulo Hucitec 1981 caps III e IV pp 10316 e 21398 OLIVEIRA Cecília Helena de Salles O Espetáculo do Ipiranga Reflexões sobre o Imaginário da Independência in Anais do Museu Paulista N Ser 3 São Paulo jandez 1995 OUTRAM Dorinda The Enlightenment Cambridge Cambridge University Press 1995 PRADO JR Caio Sentido da Colonização in Formação do Brasil Contemporâneo Colônia São Paulo Brasiliense 1976 QUINTAS Amaro A Agitação Republicana no Nordeste in Sérgio Buarque Holanda org História Geral da Civilização Brasileira 7a ed São Paulo Difel 1985 tomo 2 vol 1 pp 20726 RAYNAL G T Histoire Philosiphique et Politique des Établissemens et du Commerce des Européens dans les Deux REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 91 Indes Nouvelle Édition Corrigée et Augmentée daprès les Manuscrits Autographs de lAuteur par M Peuchet Paris Amable Costes et Cie 1820 tomo 5 código 1975 estante 18 A Revolução da América Trad de Regina Clara Simões Lopes Rio de Janeiro Arquivo Nacional 1993 O Estabelecimento dos Portugueses no Brasil Trad Mônica F Campos de Almeida e Flávia Roncari Gomes Rio de JaneiroBrasília Arquivo NacionalEditora UnB 1998 REIS Arthur César Ferreira A Inconfidência Baiana in Sérgio Buarque Holanda org História Geral da Civilização Brasileira 7a ed São Paulo Difel 1985 tomo 1 vol 2 pp 4117 ROSSOLILLO Francesco Nação in Norberto Bobbio Nicola Mateucci Gianfranco Pasquino Dicionário de Política 9a ed Brasília UnB 1997 vol I SCHWARCZ Lilia Moritz AZEVEDO Paulo César de COSTA Ângela Marques da A Longa Viagem da Biblioteca dos Reis do Terremoto de Lisboa à Independência do Brasil São Paulo Companhia das Letras 2002 pp 287342 SCHWARTZ Stuart B Gente da Terra Braziliense da Nasção Pensando o Brasil a Construção de um Povo in Carlos Guilherme Mota org Viagem Incompleta 15002000 a Experiência Brasileira Formação Histórias São Paulo Editora SenacSão Paulo 2000 pp 10325 SKINNER Quentin As Fundações do Pensamento Político Moderno Trad de Renato Janine Ribeiro e Laura Teixeira Motta São Paulo Companhia das Letras 1996 SOUZA Laura de Mello e A Conjuntura Crítica no Mundo Lusobrasileiro de Inícios do Século XVIII datiloscrito BICALHO Maria Fernanda Baptista 16801620 O Império deste Mundo São Paulo Companhia das Letras 2000 TAVARES Francisco Muniz História da Revolução Pernambucana de 1817 Ed revista e anotada por Oliveira Lima Recife Imprensa Industrial 1917 TORGAL Luís Reis Ideologia Política e Teoria do Estado na Restauração Coimbra Biblioteca Geral da Universidade 1981 2 vol VIEIRA Padre Antônio Por Brasil e Portugal São Paulo Nacional 1938 VILLALTA Luiz Carlos 17891808 o Império LusoBrasileiro e os Brasis São Paulo Companhia das Letras 2000a O Reformismo Ilustrado a Revolução e o Império LusoBrasileiro in 17891808 o Império Luso Brasileiro e os Brasis São Paulo Companhia das Letras 2000b pp 1736 Liberdades Imaginárias in Adauto Novais org O Avesso da Liberdade São Paulo Companhia das Letras 2002 pp 31941 XAVIER Ângela Barreto El Rei Aonde Póde Não Aonde Quér Razões da Política no Portugal Seiscentista Lisboa Colibri 1998
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58 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 pm i Pernambuco 1817 encruzilhada de desencontros do Império lusobrasileiro LUIZ CARLOS VILLALTA Notas sobre as idéias de pátria país e nação LUIZ CARLOS VILLALTA é professor da Universidade Federal de Minas Gerais REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 pmio59 i ér 1817 DO REINO UNIDO A PERNAMBUCO DO RIO AO RECIFE Março de 1817 No Rio de Janeiro Dom João VI ainda não aclamado rei era o soberano de fato do Reino Unido de Portugal Brasil e Algarves Estabelecido na porção mais rica de seus domínios o monarca português dava demons trações de que viera mesmo para edificar na América um novo império afastando a idéia de retorno a Lisboa e ele vando em 1815 o Brasil à condição de Reino Unido a Portugal e Algarves com o que se assistiu a um fervor de patriotismo imperial 1 O Brasil deixara de ser na prá tica colônia em janeiro de 1808 quando da passagem de D João pela Bahia e da abertura dos portos seguida da insta lação da Corte no Rio de Janeiro em fevereiro do mesmo ano e da autorização para a instalação de manufaturas de providências visando à dinamização das atividades agrícolas e pecuárias e de uma série de medidas pelas quais se cria vam na cidade do Rio de Janeiro órgãos superiores da administração régia se dinamizavam sua vida cultural e a aformoseavam fazendo da América o eixo das preocupa ções da monarquia Em torno do rei nobres burocratas comerciantes de grosso trato grandes proprietários mi litares vindos de Portugal ou naturais do Brasil estabeleci dos no CentroSul constituíam uma rede de interesses comuns definiam afinidades alianças interiorizando a metrópole com o que de um lado afastavamse das for ças colonialistas estabelecidas na pátriamãe e de outro subjugavam política e economicamente as demais regiões do continente do Brasil convertidas em neocolônias agora do Rio de Janeiro 2 Falecida Dona Maria I Dom João preparava a sua aclamação como rei seria o primeiro mo narca português a ser coroado em território americano 3 Agradeço a Íris Kantor Regina Horta Duarte e Cristina Isabel Campolina de Sá pelas sugestões e críticas Por motivo editorial as notas se encontram no final deste artigo REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 60 participar do processo de produção ou mi gravam para centros urbanos em ambos os casos vivendo em condições precárias muito suscetíveis a catástrofes naturais como as secas e constituindo uma popula ção marginal sensível a manifestações de rebeldia de qualquer ordem Leite 1984 pp 225 Março de 1817 Ainda Em Pernam buco desde 1804 era governador Caetano Pinto de Miranda Montenegro figura con trovertida Para alguns era digno da qua dra que dizia Caetano no nome Pinto na falta de coragem Monte na altura e Negro nas ações Quintas 1985 p 214 Para outros seria um governador tolerante li beral civil jurisconsulto posição essa em parte assentada no fato de as câmaras do Recife e de outras localidades manifesta remse a favor da sua permanência à frente do governo antes de concluirse seu pri meiro ano de gestão posição ratificada por figuras importantes do cenário político lo cal Lima 1996 pp 4989 Francisco Muniz Tavares personagem que se envol veu na Revolução Pernambucana de 1817 referendou essa avaliação classificandoo como varão probo iluminado e prudente e acrescentando que ao contrário de seus predecessores e de outros governadores de capitanias reconhecia limites à sua autori dade Tavares 1917 p LXXVIII A ori gem das avaliações negativas sobre Monte negro talvez esteja no fato de o mesmo ter como diretrizes a ampliação da arrecada ção fiscal para manter a Corte e a conquis ta da Guiana Francesa que consumia re cursos e homens Quintas 1985 pp 214 5 Outro senão sobre sua atuação estava nos atrasos do pagamento dos militares segundo Hipólito José da Costa devido aos tributos excessivos decorrentes da conquis ta da Banda Oriental do Rio da Prata e de acordo com o conde de Palmela por ser econômico em excesso o que causava descontentamentos na tropa regular Lima 1996 pp 4968 Em Pernambuco ade mais o monopólio comercial da Compa nhia de Comércio de Pernambuco e Paraíba extinta em 1780 foi sucedido pelo mono pólio de muitos na medida em que mer Enquanto esse fidelíssimo monarca reina va o mercado brasileiro dava mostras de maior integração o que tinha efeitos sobre as identidades políticas em constituição Esse mercado além disso disputado pelos Esta dos Unidos França e Inglaterra 4 embora contasse com a presença de representantes comerciais norteamericanos nos principais portos da colônia era presa da Inglaterra que vencia a competição beneficiada por uma sucessão de situações o contrabando a abertura dos portos em 1808 e o Tratado de Comércio de 1810 que legalizava as rela ções comerciais diretas da Inglaterra com o Brasil e concedialhe vantagens aduaneiras Março de 1817 No Nordeste os efeitos da recessão eram agravados pela seca ocor rida no ano anterior que diminuíra a pro dução dos setores de abastecimento e da agroexportação tendo essa última caído a níveis inferiores aos anos 180507 Os gran des proprietários ligados à exportação os quais já se debatiam com as conseqüências da valorização das terras decorrente da expansão algodoeira que levava à disputa pelas terras de segunda categoria viam com o quadro de recessão aumentar sua insta bilidade antigos proprietários sem recur sos foram obrigados a dispor de parte ou do todo das terras e ainda dos escravos Lei te 1984 p 17 A preeminência reforçada da agroexportação por seu turno juntamen te com a seca tinha efeitos mais negativos ainda para a produção voltada para o abas tecimento indo na contramão do cresci mento da demanda de gêneros de subsis tência sobretudo na capital de Pernambu co a qual nessas condições tinha que ser satisfeita por meio da importação de gêne ros alimentícios de outras capitanias que se encontravam encarecidos por causa da Guerra no Uruguai Em função disso tudo havia carestia de mantimentos principal mente da farinha e também do feijão com fome para os setores populares Lima 1996 pp 4967 O potencial de conflitos acen tuavase ademais por causa da situação daqueles que haviam perdido recentemen te suas propriedades no campo ou que já se encontravam há muito na categoria de despossuídos eles eram requisitados para REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 61 cadores portugueses dominavam o comér cio mesmo após a abertura dos portos em 1808 Tavares 1917 p CLXV Leite 1984 p 18 Mota 1972 p 22 Os grandes pro prietários rurais aflitos com as dívidas pendentes com a Companhia de Comércio extinta eram penalizados pelo monopólio dos comerciantes portugueses que impu nham preços altos aos produtos que aque les importavam incluindose aí a própria mãodeobra isto é os escravos africanos e inversamente preços baixos aos gêne ros que exportavam Nessas condições os grandes proprietários encontravamse em uma situação de dependência em relação aos comerciantes portugueses e aos atraves sadores Nas tropas igualmente havia ten sões a separar brasileiros e portugueses Portugueses e brasileiros disputavam os postos mais elevados da hierarquia militar A legislação estabelecida com a chegada da Corte favorecia as tropas de linha em detrimento das milícias no que se refere à obtenção de patentes para novos postos sendo que as tropas de linha geralmente identificavamse com os portugueses e as tropas auxiliares com os nascidos no Bra sil Leite 1984 pp 301 Nas tropas auxi liares havia atritos entre brancos e homens de cor pois os primeiros comandavam os regimentos de negros e pardos Nesse con texto deuse a emergência de uma luso fobia de sentimentos e ações contra os portugueses acusados de monopolizar os melhores empregos civis e militares os maiores proventos e tudo mais de bom na terra invejados pelos bens que possuíam pelo envolvimento no comércio Lima 1996 p 498 Toda essa situação trazia também tensões latentes entre os des possuídos no campo e na cidade e os indi víduos das classes proprietárias brasilei ros e portugueses ainda que os últimos fossem convertidos em bodes expiató rios engendrava ainda tensões entre homens brancos e homens de cor Em meio a tantos conflitos Pernambuco assistia à circulação de livros e idéias que incitavam à sedição da França as idéias de Condorcet Mably Raynal Rousseau Volney Voltaire etc e as constituições revolucionárias de 1791 1793 e 1795 que eram pregadas em praça pública em Recife dos EUA a Constituição Mota 1972 pp 312 As idéias de revolta eram reforçadas pelos exemplos de movimentos bemsuce didos ocorridos em outras terras se a inde pendência das colônias inglesas da América do Norte estimulava os grandes proprietá rios e a Revolução Francesa era admirada pelos setores menos aristocráticos o Haiti entusiasmava os envolvidos diretamente no mundo do trabalho Mota 1972 pp 301 Tavares 1917 p LXXXV Quintas 1985 p 216 Os pernambucanos ainda esta vam atentos aos acontecimentos das ex colônias espanholas acompanhando com particular empenho os progressos dos in surgentes espanhóis que fermentavam os espíritos conforme relatou o capitão Hareng de passagem por Recife em 1816 Mota 1972 pp 3343 Para essa fermen tação é preciso dizer havia contribuições locais a influência doutrinária do padre Ma nuel Arruda Câmara 17521811 doutor em medicina por Montpellier com passa gem anterior pela Universidade de Coim bra Médico estabelecido em Pernambuco desde 1796 Arruda Câmara desenvolvera pesquisas no domínio das ciências naturais e defendera idéias como a igualdade de oportunidade para os homens de cor Com a monarquia ou sem ela deve a gente de cor ingresso na prosperidade do Brasil e o panamericanismo sejam unidos com esses nossos irmãos da América Inglesa e Espanhola porque tempo virá de sermos todos um e quando não for assim susten tem uns aos outros Cartalegado 1810 apud Barreto 1985 p 208 Por fim a ma çonaria 5 e as academias 6 em sua ação eram afetadas e ao mesmo tempo acentua vam a fermentação revolucionária 7 1817 Império lusobrasileiro Reino Unido de Portugal Brasil e Algarves Rio de Janeiro Nordeste Pernambuco este artigo centrase nos dois últimos territó rios voltandose especificamente para o es tudo da denominada Revolução Pernam bucana Movimento que exprimiu a fermen tação revolucionária existente no Nordeste próximo ao final da segunda década do REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 62 século XIX e ao mesmo tempo levou ao adiamento da aclamação de ElRei Dom João VI constituiu uma encruzilhada de desencontros ponto de confluência de contradições entre as partes e os atores do Império lusobrasileiro sediado no Rio de Janeiro ponto ademais que indicava caminhos e perigos diversos para essas mesmas terras e gentes abrindo perspecti vas distintas de devir para o Brasil ou para os Brasis 8 A revolução protagoni zada pelos pernambucanos de fato cons tituise como um movimento de grande im portância no processo de emancipação política do Brasil foi a mais ousada e ra dical tentativa de enfrentamento até então vivido pela monarquia portuguesa em toda sua história Bernardes 2001 p 163 Anunciou percepções essenciais num pro cesso de independência de colônias situa ção da América Portuguesa naquele mo mento particularmente do Nordeste o an tagonismo entre colonizados e colonizador personificado nas figuras do brasileiro e do português e a oposição entre Colônia e Metrópole 9 Somou a isso a repulsa à administração monárquica que presidia o empreendimento colonial da metrópole interiorizada delineando uma identidade por meio de uma rejeição dupla ao ele mento reinol e à Coroa Ao mesmo tempo os pernambucanos agiram como forças cen trífugas regionalizantes que hostilizavam a hegemonia do CentroSul sobre o restan te das possessões americanas de ElRei embaralhando a dicotomia brasileirospor tugueses e os esforços desenvolvidos pelo monarca com vista a romper com a des centralização políticoadministrativa que imperara em todo o período colonial passo essencial para a preservação do Império lusobrasileiro então sediado na América 10 Contudo os pernambucanos revolu cionários deixavam a porta aberta para a incorporação à República por eles instituí da do conjunto dos brasileiros e de parcela dos portugueses vendose como parte de uns e outros devotando evidente hostilida de em relação aos últimos ocultada e nega da por motivos estratégicos e exigindo apenas de ambos portugueses e brasilei ros a adesão à causa republicana antitirânica anticolonial defensora da pro priedade e da escravidão Essa situação à primeira vista pode parecer paradoxal porém um olhar mais cuidadoso levará a uma avaliação divergente ela é óbvia pois nessa época os colonos reconheciamse como paulistas baianos mineiros pernambucanos e entendiam ao mesmo tempo que ser paulista pernambucano ou bahiense significava ser português ainda que se tratasse de uma forma diferenciada de sêlo isto é ser português da América Jancsó Pimenta 2000 pp 1367 As últimas bandeiras dos revolucioná rios pernambucanos a manutenção da es cravidão e da propriedade cumpre adian tar viramse ameaçadas no curso do pró prio movimento por eles protagonizados e mais tarde tornaramse elementos que aju daram a cimentar a unidade das classes proprietárias do Brasil em torno do projeto imperial liderado por D Pedro I calando as forças centrífugas Como assinala Maria Odila Leite Silva Dias a semente da na cionalidade brasileira nada teria de re volucionário a monarquia a continuidade da ordem existente eram as grandes preo cupações dos homens que forjaram a tran sição para o império A insegurança social cimentaria a união das classes domi nantes nativas com a vontade de ser brasi leiros dos portugueses imigrados que vie ram fundar um novo império nos trópicos Dias 1982 p 180 A República Pernambucana realizou durante meros 74 dias uma possibilidade de independência que fragmentava a Amé rica Portuguesa possibilidade essa aborta da anteriormente com o êxito da repressão contra as Inconfidências de Minas em 1789 e da Bahia em 1798 movimentos que por sua vez traziam projetos diferentes de Bra sil ou melhor de Minas e Bahia Por essas razões neste artigo querse também anali sar as identidades que sustentavam de um lado a revolução de Pernambuco e de outro a reação monárquica querse defi nir as idéias de pátria país e nação bem como as apropriações feitas da história por ambos os lados em conflito Não constitui REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 63 meu objetivo adianto confrontar o sucedi do aqui com o que ocorria mais ou menos à mesma época na Europa e em outras partes da América para o que remeto os leitores aos trabalhos de István Jancsó e João Paulo Pimenta 2000 e sobretudo de Márcia Berbel 2001 com os quais procuro mo destamente dialogar Da última retiro a constatação de que o próprio conceito de nação no período em exame encontravase indefinido no Brasil e no mundo sendo essa indefinição a referência para os atores polí ticos de então malgrado o desenvolvimento da idéia de nação como unificador da co munidade imaginada como soberana a par tir do século XVIII esse entendimento só foi consagrado ao final do século XIX con vivendo com a idéia de nação como o con junto de súditos de um mesmo rei concep ção que se associava a uma idéia de sobera nia calcada nos direitos das dinastias Anderson 1989 Berbel 2001 p 1 11 Devolhe ainda a percepção de que no Brasil do período nem sempre se usava a palavra nação sendo mais freqüentes os termos patriota e pátria palavra que no entan to ao longo da história assumiu significa dos bem diferentes sendo extremamente politizada pela Revolução Francesa a partir da associação com a defesa do que era públi co e com uma série de valores que consagra vam a liberdade política dentro do Império português no início do século XIX segun do a autora correspondia ao local de nasci mento e mais precisamente na perspectiva dos governos reformistas ilustrados ibéri cos implicava um incentivo à fidelidade ao soberano Berbel 2001 p 23 Disso decorreu por um lado que a defesa da Pátria valores morais e políticos tenha se confundido com a defesa do Estado e se distanciado da defesa da nação comunida de política imaginada como soberana e por outro lado que a defesa da Pátria tam bém se distanciasse e por vezes tenha se oposto da defesa da pátria o local de nas cimento Hobsbawn 2002 p 28 Berbel 2001 p 4 Em relação a István Jancsó e João P Pimenta registro o débito referente ao entendimento de que na passagem do século XVIII para o século XIX a percep ção de crise não se deu de modo uniforme com o que das diferentes percepções resul taram múltiplos projetos políticos cada qual expondo com maior ou menor nitidez o esboço da comunidade humana cujo futuro projetavam correspondendo a distintas definições de Estado cidadania condições de inclusão e exclusão padrões de lealda de e critérios de adesão Jancsó Pimenta 2000 p 136 1817 foi um dos momentos de explicitação dessa diversidade DE PERNAMBUCO 1817 A MINAS 178889 E BAHIA 179398 VOLTA AO PASSADO A Inconfidência de Minas foi uma cons piração abortada protagonizada por pes soas cujas origens se circunscreviam às elites os condenados por Dona Maria I que não se enquadram nesse perfil não tiveram nenhuma expressão nas discussões de que se constituiu o movimento enquanto em solo soteropolitano assistiuse à gestação de um projeto de revolução que articulava de modo fluido e ainda hoje difícil de precisar as elites locais e os indivíduos egressos da escravidão ou que ainda se en contravam no estado de cativos Se a In confidência Mineira pode ser associada às rebeliões ocorridas anteriormente na capi tania de Minas Gerais e ao mesmo tempo à independência dos Estados Unidos e à Restauração Portuguesa de 1640 na Bahia a fonte de inquietação e inspiração foi a Revolução Francesa Villalta 2000a pp 31920 12 Enquanto em Minas Gerais as Luzes conjugaramse com tradições his tóricoculturais lusobrasileiras com des taque para as teorias corporativas de poder da Segunda Escolástica 13 e para os es critos do padre Antônio Vieira e ainda para livros de história da Restauração Portuguesa de 1640 14 na Bahia as idéias ilustradas imperaram ainda que se conjugando com elementos místicos e ocultistas de prove niência francesa 15 No que se refere à REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 64 influência das Luzes elemento comum às Inconfidências em Minas sobressaiu a Histoire Philosophique et Politique des Etablissements et du Commerce des Européens dans les Deux Indes do padre Raynal 16 já na Bahia prevaleceu a ver tente vulgarizada do pensamento ilustra do isto é das Luzes Aplicadas e Repensa das no Calor da Ação em meio ao clima revolucionário francês tiveram uma reper cussão sem par O Orador dos Estados Gerais de 1789 17 e Fala de Boissy dAnglas 30 de janeiro de 1795 18 As diferenças entre os projetos de am bos os movimentos podem ser percebidas facilmente pelo exame de como compre endiam liberdade pátria e nação Ti radentes resumiu com perfeição o que os mineiros tomavam por liberdade ao afir mar que os mazombos isto é os naturais da colônia também tinham valimento e sa biam governar e que dando a sua terra tan tos haveres se achavam pobres por lhe ti rarem tudo para fora mas que a haviam de pôr em liberdade que só esperavam se botasse a derrama pois que a terra não podia pagar e que tudo ia para o Reino Adim 1980 vol 1 p 124 Nessa afirmação vê se primeiramente uma percepção econô mica aquela segundo a qual a terra com portava tantos haveres sendo portanto compreendida como potencialmente rica A isso misturase uma crítica velada se não ao sistema colonial ao menos à políti ca tributária da metrópole em relação à colônia os mazombos seriam pobres por lhe tirarem tudo para fora ou seja devido ao fato de a riqueza ser drenada para o Reino sendo a derrama algo impossível de pagar Essas idéias complementavamse com a crença na capacidade de governar dos mazombos e por fim com o anúncio de um movimento político pelo qual a terra seria posta em liberdade sendo essa conquista associada à decretação da derrama medida que demarcava um arrocho tributário o que conforme o alferes e outros conjurados dis seram várias vezes acirraria os ânimos das gentes colocandoas ao lado de uma sedi ção A liberdade surgia portanto de uma análise e uma compreensão que transita vam do econômico para o político confun dese com uma ruptura política que seria desencadeada tendo como estopim um ar rocho tributário ruptura esta ainda cujo conteúdo não é declarado mas que clara mente anuncia o fim da pobreza a realiza ção de um potencial de riqueza Já os contornos da idéia de nação em estreita conexão com a de liberdade entre os inconfidentes de Minas podem ser ava liados a partir da denúncia de Basílio de Brito Malheiros do Lago Lago afirmou que conheci desde que vim para a América nos nacionais dela interno desejo de se sacudi rem fora da obediência que devem prestar os seus legítimos Soberanos mas antes pa Praefectura Paranambuca pars Borealis 1647 de Frans Post REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 64 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 65 tenteiam uma interior vontade de fazerem do Brasil uma república livre assim como fizeram os Americanos ingleses Adim 1980 vol 1 p 97 grifos meus Nacionais nesse caso significa na turais nascidos em Resta saber se o sig nificado de república corresponde à for ma de governo republicano distinta da mo narquia de que eram exemplos Veneza e Holanda Mello 1995 p 279 ou confor me estabeleceram Maquiavel e depois Montesquieu esse último incluindo a divi são dos poderes em Executivo Legislativo e Judiciário ou ainda como se experi mentava então nas colônias inglesas re cémindependentes aliando república a democracia representativa Ou por fim a uma vertente bem distinta que reporta a Cícero em que república corresponde a toda forma de governo fundada no interesse comum em conformidade com uma lei comum único direito pelo qual uma comu nidade afirma a sua justiça distinta da anar quia e dos governos injustos Matteucci 1997 pp 11079 compreensão em cir culação na cultura letrada portuguesa 19 O mesmo Basílio na sua denúncia repor tase a um relato que lhe foi feito pelo ca pitão Vicente Vieira da Mota que via as Minas em muita desordem e que todos os nacionais delas se queriam ver livres e que ele era amigo do cônego Luís Vieira mas que lhe ouvia falar umas tais cousas que se fosse o Rei lhe mandava cortar a cabeça Adim 1980 vol 1 p 100 Nacionais novamente aparece como sinônimo de na turais de sendo aplicável à capitania de Minas ao contrário do que ocorre com a primeira referência que tem como alvo o conjunto da América Portuguesa Idêntico sentido encontrase no trecho da mesma denúncia agora envolvendo mais diretamen te a pessoa do cônego Luís Vieira da Silva Segundo Malheiros o cônego de Mariana não encobre a paixão que tem de ver o Brasil feito uma república abonou o Tira dentes de um homem animoso e que se houvesse muitos como ele que o Brasil era uma república florente que um príncipe europeu não podia ter nada com a América que é um país livre e que ElRei de Portu gal nada gastou nesta conquista que os na cionais já tiraram dos holandeses fazendo a guerra à sua custa sem ElRei contribuir com dinheiro algum para ela depois disto os franceses tomaram o Rio de Janeiro 20 que os habitadores da cidade lha compra ram com o seu dinheiro e ultimamente con cluiu que esta terra não pode estar muito tempo sujeita a ElRei de Portugal porque os nacionais dela querem também fazer corpo de república e outras coisas seme lhantes que todas se encaminham ao fim da liberdade Que se quer fazer revolta é sem dúvida a forma como a têm traçado não a sei Adim 1980 vol 1 p 102 Panorama de Pernambuco de Friederich Salathé sculpt e Johann Steinmann 18261832 Fragmento REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 65 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 66 Se o termo nacionais claramente pode ser substituído por naturais da América em todas as situações referentes aos pro nunciamentos atribuídos ao cônego de Ma riana cumpre notar ademais que esse sig nificado é construído por meio de uma di cotomia reiterada nos três exemplos na cionais x ElRei na guerra contra os ho landeses habitadores da cidade do Rio de Janeiro x ElRei na compra da liberda de da mesma aos franceses que a toma ram e por fim nacionais x ElRei na ambição dos primeiros de fazer corpo de república Logo por um lado nas partes Pernambuco e Rio de Janeiro parece manifestarse uma mesma dicotomia e uma mesma naturalidade americana e por ou tro se não se pode garantir que o significa do de república fosse o de forma de go verno republicana com certeza o termo re metia a um governo instituído como ex pressão do interesse comum oposto ao governo injusto que colidia com aquele interesse 21 Essa idéia de governo perpassa as dife rentes propostas que os inconfidentes de Minas fizeram a respeito da forma de go verno da república a ser instituída nos li mites da capitania de Minas Gerais ou na melhor das hipóteses abrangendo as capi tanias de São Paulo e Rio de Janeiro a república como fizeram os americanos ingleses por várias vezes mencionada nos Autos de Devassa um Império lusobrasi leiro com sede na América sonhado pelo cônego Luís Vieira da Silva e aventado por Inácio José de Alvarenga Peixoto ou mes mo um mero rearranjo nas relações entre Minas e a Coroa mediadas por um gover no da capitania que não afrontasse o inte resse comum o que se pode entrever na leitura das Cartas Chilenas de Tomás Antônio Gonzaga Liberdade nação re pública ademais acompanhavamse da defesa de princípios e medidas como o li vre comércio a abolição da escravidão para mulatos e crioulos apenas com o objetivo de impedir que os cativos se aliassem à repressão a instalação de manufaturas a livre extração dos diamantes a mudança da capital de Minas para São João del Rei a criação de uma universidade em Vila Rica dentre outras Na Bahia nos anos 179398 o projeto dos inconfidentes foi bem distinto ainda que seja bastante difícil precisar seus con tornos É certo que houve o afastamento das elites temerosas em relação à perda de controle das camadas populares e sobretu do prisioneiras de preconceitos sobre a capacidade de pessoas de baixaralé pro moverem um levante À época o governa dor da Bahia Dom Fernando José de Por tugal advogava uma concepção de nação profundamente influenciada pelo pensa mento do conde de Linhares Dom Rodrigo de Souza Coutinho para o qual a nação portuguesa era una e indivisível nos qua tro continentes em que habitava sob a tu tela da monarquia de Bragança Assim o governador da Bahia atrelava a nação ao Estado de que é fundamento o monarca A identidade nacional remetia ao Estado e por meio desse à monarquia dos Bragança a nação portanto compreende os vassalos de ElRei Jancsó Pimenta 2000 p 145 Em oposição a essa concepção os inconfi dentes baianos entendiam que o fundamento da nação é a vontade dos povos e não o papel coesivo do trono Nos panfletos afi xados nas ruas de Salvador em agosto de 1798 o baiense tornavase nação na medi da em que por meio de um pacto político instituísse um Estado que lhe desse forma Se o Estado dá forma à nação ele não pode ser instituído senão por uma revolução que expresse um novo pacto político Em 1798 na Bahia colocavamse dessa forma frente a frente a monarquia absoluta e uma comunidade que afirmava ter configuração específica o povo baiense instituidor po tencial de um novo Estado que viria a ser nacional mediante um pacto de cidadãos aquele que lançaria fora os despóticos ti ranos e faria dos baianos felizes sobera nos nas suas terras Jancsó Pimenta 2000 p 147 A pátria no entanto para fiéis vassalos e baienses é a Bahia uma pátria que ainda não engendrou um patrio tismo político a ela referido e em cujo in terior identidades políticas distintas coe xistiam e se confrontavam na gestação his REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 67 tórica de alternativas de futuro cujas for mas apenas esboçavam Jancsó Pimen ta 2000 p 148 Se os novos Estado e nação sonhados pelos baianos eram os reversos da tirania eram república nos moldes mais antigos tal como pensavam os inconfidentes de Minas Gerais eram mais claramente repú blica no sentido que emergiu com a Inde pendência dos EUA aparecendo como uma forma de governo específica em que se vislumbra uma democracia tratavase nos termos dos baianos de uma república democrática Nos pasquinsboletins vêemse máximas contra a monarquia ab solutista portuguesa qualificada como péssimo jugo reinável da Europa IBDS 1931 vol 1 p 7 que traziam implícitos o reconhecimento do princípio segundo o qual todos os homens livres seriam cida dãos e também a idéia de nação como sinô nimo de Estado instaurado pela soberania popular Não continham entretanto uma rejeição à nação portuguesa o alvo era o trono o despotismo o rei tirano a subordinação a Lisboa Jancsó Pimenta 2000 pp 1459 Nos pasquins contudo havia idéias contra o jugo colonial e defen diase o livre comércio a elevação dos soldos e o apoio externo para o extermínio do péssimo jugo reinável da Europa As liberdades portanto atingiam dois pilares básicos do Antigo Regime o absolutismo e o sistema colonial visto que este tinha no monopólio comercial um de seus alicerces Na república democrática almejada pe los baianos os acessos e lugares repre sentativos seriam comuns sem diferen ça de cor nem de condição onde eles ocu pariam os primeiros ministérios vivendo debaixo duma geral abundância e conten tamento IBDS 1931 vol 2 p 170 Na revolução preconizada pelos pasquins e pelo discurso preponderante entre os con jurados frisese não se colocava a aboli ção Segundo Lucas Dantas a revolução envolveria uma guerra no interior da socie dade baiana e instituiria uma sociedade fundada na igualdade jurídica entre os indivíduos de cores diferentes um governo democrático estabelecido nos limites da capitania da Bahia e exercido por homens capazes e de maior juízo não importando de que nação fosse que aqui pode ser com preendida quem sabe como naturalidade nos mesmos termos que em Minas ou como naturalidade vincada a Estado isto é reme tendo a uma naturalidade que se dá sob o domínio de um Estado instituído A demo cracia assim fundavase na crença de que havia pessoas mais e menos preparadas para o governo devendo apenas os mais capazes governar a nação do governante não seria critério de inclusão ou exclusão para sua escolha IBDS 1931 vol 1 p 262 Pernambuco 1817 depois de passar por Minas e Bahia retorno à encruzilhada Para Carlos Guilherme Mota tratouse de um movimento escravocrata descolonizador aristocrático mas que trouxe em seu de senrolar uma contradição isto é uma ver tente antiaristocrática Assim de um lado foi uma revolução dos oligarcas proprietá rios brancos e escravocratas e de outro uma revolução cuja meta a alcançar era um sistema nivelador propugnando idéias como a igualdade racial e social pon do em risco as estruturas do regime político e social Mota 1972 pp 1434 por isso ao invés do termo revolução Mota pre fere insurreição A tensão e a incompati bilidade latente entre essas duas vertentes são visíveis num episódio que ocorreu quan do os rebeldes se encontravam presos epi sódio esse que constitui um emblema das contradições que emergiram no desenrolar do próprio movimento e que se desnuda ram sob o efeito da repressão O capitão Boaventura Ferraz ao ser encarregado da alimentação dos 103 prisioneiros ligados ao movimento de 1817 que se encontra vam em Salvador solicitoulhes por meio de um bilhete que se dividissem em clas ses enviandolhes uma lista com as ne cessárias declarações para melhorar a ali mentação Enviado o bilhete para o capi tãomor de Olinda Francisco de Paula Cavalcanti e o seu irmão Luís Francisco senhores de engenho Antônio Carlos con vocou um conselho para deliberar sobre o assunto tendo o mesmo deliberado que a palavra Classe equivalia a Jerarchia REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 68 apud Mota 1972 p 136 Na definição da hierarquia os detentos usaram como bali za a divisão social que foi fixada pelas Cortes de Lamego clero nobreza e povo Os detentos foram divididos em três clas ses segundo um critério militar na 1a clas se figuravam os detentores das patentes de major para cima nas tropas de 1a 2a e 3a linhas somandose a esses os desembar gadores magistrados letrados cônegos e vigários na 2a classe enquadravamse os que se encontravam nos postos de cadete a capitão nas tropas de todas as linhas os clérigos simples os magistrados nãoletra dos e oficiais da fazenda por fim na última classe ficavam todos os que não cabiam nas duas primeiras Mota 1972 p 137 Seguindo esses critérios o conselho encon trou dificuldades para classificar os dois cunhados do Morgado do Cabo que nunca haviam participado nas tropas militares sendo o impasse resolvido pela manipula ção das classes a favor dos implicados ambos foram promovidos a major sem designação de linha Ao mesmo tempo o uso de critérios aristocratizantes e racistas pelo conselho fez com que dois oficiais superiores do Regimento Henrique Dias que reunia homens de cor fossem joga dos na 3a classe Esse episódio que causou estupor ao capitão Boaventura anos mais tarde em 1835 ele manifestou sua indig nação com o orgulho aristocrático dos já exprisioneiros pernambucanos mostra que a hierarquia social existente fora da prisão foi trazida para seu interior Mota 1972 pp 1378 Demonstra além disso como os agentes de 1817 eram prisioneiros de um ideal aristocrático A República Pernambucana portanto se concretizou as possibilidades de frag mentação contidas nos movimentos abor tados de Minas 178889 e Bahia 1793 98 conteve em si as tendências elididas no primeiro e para desencanto das elites locais afirmadas no último a participa ção dos despossuídos no jogo político e além disso esbarrou também no problema da escravidão ou melhor de sua abolição defendida com restrições e por motivos estratégicos em Minas esquecida na Bahia exceto em vozes dissonantes Fundou ade mais a República como forma de gover no aventada de modo fugidio pelos minei Rua da Cruz de F Krauss sculpt e Emil Bauch delsd REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 68 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 69 ros sonhada com mais precisão pelos baianos em teoria emanava da vontade do povo na verdade fora fruto do exercício da vontade de poucos Como reconhece Francisco Muniz Tavares embora em um Estado que aspira a ser livre os Gover nantes devam ser eleitos ou pelo povo ou pelos seus representantes munidos do poder especial e o procedimento contrá rio degenere em tirania que cedo ou tar de é esmagada a escolha do novo gover no foi feita por poucos Isso ocorreu entre tanto porque na marcha variável dos acon tecimentos há circunstâncias tão imperio sas que forçam o homem mais escrupulo so a curvarse por um momento e saltar por cima dos princípios da sua convicção a salvação da pátria em extremo perigo atra vessa a ordem dos processos legais Como além disso a escolha recaiu sobre pessoas distintas e o governo intitulavase provisó rio tal procedimento não causou desagra do geral Tavares 1917 p CVII Não se pense porém que na categoria povo es tava compreendida toda a população livre masculina e muito menos obviamente incluídos os escravos e as mulheres O ide al dos revolucionários assentavase numa idéia de cidadania que se restringia à parte dos homens livres pois como esclarece o exrevolucionário Muniz Tavares nas repúblicas bem constituídas o direito de votar é inerente a cada um cidadão e que se a lei o restringe privando os proletários e criminosos é com o louvável fim de esti mular os homens ao trabalho à economia e virtudes Tavares 1917 p CXXX DA FERMENTAÇÃO EMERGE O MOVIMENTO DA CRONOLOGIA E FATOS ÀS IDÉIAS A análise das idéias de pátria país e nação na perspectiva dos revolucionários de 1871 e na visão das forças realistas que os combateram em defesa do Reino Unido de Portugal Brasil e Algarves exige um breve resumo de um lado sobre as especi ficidades da identidade pernambucana e de outro sobre a eclosão do movimento de 1817 seus participantes e impasses funda mentais A identidade pernambucana marcava se pela presença de um imaginário especí fico de cunho aristocrático relacionado à luta contra os holandeses e às próprias re lações da capitania com a Coroa os comer ciantes e os governadores por ela nomea dos Enclausuradas num círculo endogâ mico 22 que valorizava o nome o san gue as famílias de que se compunha a aris tocracia pernambucana ou açucarocracia como quer Evaldo Cabral de Mello de senvolveram forte coesão interna aguçada pela autosegregação que viveram entre a ocupação holandesa e a segunda década do século XVIII e pelo controle de institui ções e cargos do poder local como as Câ maras e os postos de comando das tropas de segunda linha as milícias e algumas vezes da própria tropa regular Mello 1995 p 311 A aristocracia estabeleceu relações tensas com os envolvidos no co mércio do Recife controlado por comerci antes reinóis o que não excluiu a possibi lidade de estabelecimento de convivência entre aqueles mazombos e os mascates por amizade ou cálculo até mesmo porque concebiam uma relação de complemen taridade entre engenho e loja Mello 1995 p 295 o grande problema estava no compartilhar com eles os postos de mando o que não agradava à aristocracia Se em 1666 os aristocratas depuseram o governa dor Jerônimo de Mendonça Furtado o Xumbergas em 1710 intentaram fazer o mesmo com Castro e Caldas fiandose em ambos os casos nas teorias corporativas de poder já comentadas aqui O último foi por eles qualificado como tirano inimigo da nobreza e perseguidor do clero francófilo e traidor Mello 1995 p 259 eles ademais defendiam a natureza contratual das relações entre Pernambuco e a Coroa julgando que essa última desde a restauração pernambucana até o governo de Castro Caldas havia violado sistemati camente os compromissos assumidos REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 70 Mello 1995 p 283 Propugnavam que o governo devia ser entregue aquela re pública o que significava naquele con texto a escolha de um governador favorá vel aos aristocratas uma velha aspiração local Mello 1995 p 271 Construíram a utopia de instaurar em Pernambuco um regime republicano oligárquico como ha via em Veneza e na Holanda Mello 1995 p 279 Embalava os aristocratas a idéia de que a Coroa devialhes a restauração da capitania em 1654 idéia como se salien tou aqui cujas linhas mais gerais fizeram se presentes também na leitura da história feita pelos inconfidentes de Minas Gerais de 1789 Entre os aristocratas de Pernambu co porém o senso de identidade que se formara não presumia rompimento ou distanciamento em relação às tradições da monarquia portuguesa apenas exigia de acordo com a lógica que lhe era própria o reconhecimento da dignidade e do lugar que os aristocratas julgavam merecer ain da que à custa de atos de aparente infideli dade Neves 1999 p 457 Cultivavam além disso os valores nobiliárquicos do Antigo Regime disputando entre si as marcas de distinção como a nobilitação por meio de comendas da Ordem de Cristo e a aquisição de postos na administração e temiam a divulgação das manchas de infâ mia como a falta de pureza de sangue in centivando as intrigas e as cabalas que a ampla rede de comissários do Santo Ofício na capitania tendia a amplificar Neves 1999 p 458 Mello 1989 p 281 Em 1801 Pernambuco assistiu à deno minada Inconfidência dos Suassuna uma suposta conspiração cujo objetivo seria formar em Pernambuco uma república sob a proteção de Napoleão mas que ao que parece não constituía nenhuma conspira ção expressando apenas a inquietação po lítica então existente com as transforma ções que se processavam no cenário euro peu e com medidas tomadas pelo governo local Envolveu Francisco de Paula Caval cante de Albuquerque do Engenho Suas suna e seu irmão José Francisco de Paula Cavalcante de Albuquerque que se encon trava em Lisboa do qual o primeiro rece bera cartas supostamente sediciosas A bio grafia dos mesmos indica que estavam in tegrados ao mundo de convenções sociais e culturais de sua época e inseridos nas redes de poder de então que ligavam Pernambuco a Portugal Em 1804 Fran cisco de Paula tornouse capitão de orde nanças da freguesia de Jaboatão e cavalei ro da Ordem de Cristo no ano seguinte assumiu o cargo de capitãomor de Olinda em 1808 recebeu o título de fidalgo cava leiro da Casa Real Em 1817 José irmão de Francisco foi nomeado governador de Moçambique posto em que morreu Na devassa para investigar a Inconfidência nada de sério foi descoberto Barreto 1985 p 201 Neves 1999 pp 4778 Quintas 1985 pp 2101 Mas em 1818 pelo envol vimento dos Suassuna no movimento de 1817 o desembargador João Osório de Castro Souza Falcão escrivão da alçada encarregado de investigar a revolução de 1817 afirmou que uma carta referente à Inconfidência dos Suassuna teria sido quei mada pelo escrivão que fora subornado O padre Dias Martins fez afirmação de teor semelhante dizendo que rios de dinheiro teriam restituído os réus à liberdade Ma chado 1917 pp XXIIXXIII Quintas 1985 pp 2123 Próximo a 1817 em casas de particula res academias sociedades secretas e ma çonaria realizaramse reuniões e encon tros de pessoas com ânimo de se revolta rem contra o governo tendo o governador Miranda Montenegro recebido denúncias a respeito envolvendo a identificação não apenas de lideranças como também dos pla nos revolucionários Tavares 1917 p LXXXV Quintas 1985 p 217 Mota 1972 p 49 Inicialmente o governador Montenegro nada fez não só desculpando os ciúmes patrióticos e econômicos dos pernambucanos como sendo descuidado com a segurança pública no Recife tendo ele próprio sido assaltado Lima 1996 p 499 Machado 1917 p XXXVII No dia 1o de março de 1817 porém uma denúncia de conspiração feita pelo dr José da Cruz Ferreira ouvidor da comarca do Sertão que fora informado por Manuel de Carva REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 71 lho Medeiros negociante confirmada por várias pessoas fez o governador Monte negro mudar de postura No dia 4 de março de 1817 o governador comunicou uma ordem do dia para as tropas conclamando as à obediência à monarquia e à harmonia entre brasileiros e portugueses No dia 5 de março de 1817 Miranda Montenegro dirigiu uma proclamação à população lou vando a elevação do Brasil à categoria de Reino Unido dizendo que todos eram vassalos do mesmo soberano Machado 1917 pp LXLXX LXXXVI Tavares 1917 p LXXXVII Quintas 1985 p 217 Aos 6 de março porém o governador foi mais além realizando um Conselho de Guerra tendo este último ordenado a pri são dos acusados como líderes da subleva ção Se na prisão de líderes civis não houve resistências na tentativa de detenção de militares na Fortaleza das Cinco Pontas o resultado foi outro o capitão José de Bar ros Lima o Leão Coroado resistiu as sassinando o brigadeiro português Barbo sa de Castro e depois outro oficial envia do pelo governador o tenentecoronel Ale xandre Tomás também foi morto Com isso desencadeouse uma insubordinação geral nas fileiras do regimento de artilha ria ao qual vieram se somar as milícias chegando a um total de 2500 a 3000 ho mens rebeldes Tavares 1917 pp LXXXIXXCIV A eclosão do levante marcada inicial mente para 16 de março de 1817 com isso foi antecipada para 6 de março cabendo o comando a Domingos José Martins nego ciante Antônio Carlos de Andrada ex magistrado em Santos ouvidor em Olinda irmão de José Bonifácio de Andrada e Sil va e do padre João Ribeiro Lima 1996 p 499 Mota 1972 p 51 Quintas 1985 p 218 Na cidade uma multidão reuniuse havendo uma pregação a favor da revolta com o uso de expressões como Viva a Independência Viva a liberdade dos filhos da pátria Morram os europeus Os revoltosos promoveram a libertação de detidos políticos e criminosos comuns ao que se seguiram ataques de libertados das cadeias de mulatos e de negros livres e escravos aos que tentavam fugir do Recife Cuidaram ademais da organização da defesa fortalezas e outros pontos de resis tência e da cavalaria Em meio a isso o governador refugiouse na fortaleza do Brum e logo depois intimado à rendição pelos revoltosos capitulou abdicando de sua autoridade e embarcando para o Rio de Janeiro Já os comerciantes portugueses abandonaram a cidade do Recife fugindo para a Bahia informando os fatos ao conde dos Arcos governador da Bahia entre 1810 17 Tavares 1917 p XCIVXCV e CIII Aos 7 de março de 1817 instalouse o Governo Provisório constituído por cinco membros nos moldes do Diretório da Fran ça em 1795 Manuel Correia de Andrade representando a Agricultura Domingos José Martins representando o comércio José Luís de Mendonça representando a Magistratura Domingos Teotônio Jorge representando as Forças Armadas e o pa dre Miguelinho como secretário Formou se também um Conselho de Estado sendo nomeados para o mesmo o dicionarista e grande proprietário Antônio de Morais Sil va que recusou a indicação José Pereira Caldas o deão Bernardo Luís Ferreira Por tugal o grande comerciante Gervásio Pi res Ferreira e Antônio Carlos Ribeiro de Andrada ouvidor de Olinda O Governo Provisório assim constituído era heterogê neo reunia moderados como o represen tante da Magistratura a radicais como o representante do Comércio e o mulato Pedro Pedroso defensor do haitismo Mota 1972 p 52 O novo governo promulgou uma Lei Orgânica enviada a todas as câmaras das comarcas de Pernambuco que fixava a tese da soberania popular determinava o regi me republicano de governo seguia como princípios a liberdade de consciência de imprensa a tolerância das religiões ado tando porém a religião católica como a religião do Estado Quintas 1985 p 219 Mota 1972 p 54 Convocou uma Assem bléia Constituinte expressando no decre to de convocação da mesma provavelmente datado de 29 de março de 1817 e de autoria de Antônio Carlos de Andrada alguns dos REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 72 princípios básicos do liberalismo e conse qüentemente a instauração de fundamen tos e normas de poder opostos ao Antigo Regime soberania popular afirmação dos direitos individuais face ao Estado e na base de tudo a idéia de pacto social cujos sacrifícios têm por finalidade a segurança dos indivíduos Bernardes 2001 p 165 Dentre as principais medidas tomadas seja pelo seu significado simbólico seja pelo que representavam em termos de sa tisfação de interesses contrariados pelo go verno do Reino Unido podem ser destaca das a adoção dos termos patriota e vós como forma de tratamento entre os patrio tas e de uma bandeira o aumento dos sol dos dos oficiais e soldados no triplo ou no quádruplo a abolição de vários impostos a permissão aos particulares para organi zarem companhias de cavalaria a facilita ção do pagamento das dívidas junto à ex tinta Companhia de Comércio de Pernam buco e Paraíba a proclamação da invio labilidade de qualquer espécie de proprie dade inclusive de escravos a anulação dos processos civis e criminais e o seqües tro das propriedades dos negociantes que fugiram por causa da revolução Amaro Go mes Coutinho liderou a extensão das medi das revolucionárias à capitania da Paraíba que constituiu um governo provisório Tavares 1917 pp CXVIICXIX Quin tas 1985 pp 21920 Mota 1972 pp 54 6 Lima 1996 p 504 De Pernambuco foram enviados emissários ao Rio Grande do Norte Ceará e Bahia com a expectativa de conquistar seu apoio à revolução con seguindose a adesão do Rio Grande do Norte e de localidades do Ceará Bernardes 2001 p 164 Inicialmente o horizonte territorial dos revolucionários restringia se à capitania de Pernambuco incluindo se a então comarca de Alagoas porém com a adesão da Paraíba do Rio Grande do Norte e do Ceará emergiu a já frágil idéia de uma ação e governo comum a todos Bernardes 2001 p 171 A heterogeneidade do governo revelou se na divisão de seus membros e apoiadores em relação ao futuro do trabalho escravo e à participação dos cativos na luta contra os realistas Domingos José Martins represen tante do Comércio abolicionista era defen sor do uso de cativos na guerra Já Francisco de Paula aristocrata rural era contrário a essas medidas temendo a repetição do Haiti Essa cisão da camada proprietária em rela ção à questão escrava enfraqueceu a repú blica e fortaleceu os realistas contrarevo lucionários O governo provisório procu rou minimizar a cisão com uma proclama ção em defesa de uma abolição lenta regu lar e legal No entanto isso não conseguiu ao que parece conter nem os temores dos aristocratas nem as insolências dos ho mens de cor Nas ruas relatou um português em carta à sua comadre não se viam brancos e os patriotas negros e mestiços abordavam com insolência os europeus pedindolhes fumo A canalha e a ralé de todas as cores pilhavam as propriedades dos senhores de engenho Mota 1972 pp 59 85 e 98100 Lima 1996 p 501 Enfraquecido por essa divisão o gover no teve que enfrentar o bloqueio do porto do Recife e os ataques terrestres vindos do interior o que tornou a situação da cidade muito difícil Na realidade antes da chega da das forças da Bahia a república já esta va derrotada militarmente defrontandose com a luta civil travada por realistas e pa triotas Entre 19 e 20 de maio de 1817 cerca de 6000 patriotas incluindo escravos e libertos deslocaramse do Recife para Olinda carregando bagagens artilharia e cofre militar deixando Recife deserta Os revolucionários em meio às dificuldades organizaram a ditadura comandada por Domingos Teotônio Jorge o representante da Forças Armadas Lima 1996 p 512 Quintas 1985 p 221 Mota 1972 p 58 A ditadura negociou a rendição não aceita por todos os revoltosos que resistiram no interior No dia 20 de maio as bandeiras reais voltaram a ser arvoradas no Recife abandonado pelos remanescentes do exér cito patriota Bernardes 2001 p 162 Nos documentos do governo provisó rio de Pernambuco e do governo provisó rio da Paraíba bem como nos emanados das forças realistas primeiramente fica visível a tensão existente entre brasileiros REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 73 e portugueses entre os nascidos no Brasil e os nascidos em Portugal entre os ameri canos e os europeus Isso se verifica mui tas vezes pela negação da existência de animosidades O governo provisório bus cou amenizálas ou evidenciar medidas que definiam a igualdade entre os dois sujeitos mencionados Fêlo por motivos estratégi cos para garantir a sobrevivência da repú blica Assim na Paraíba o governo provi sório reconhecia que uma revolução só pelo nome é uma fatalidade funesta sempre trazendo consigo rios de sangue mas salientava que a revolução da cara Paraíba não perdeu uma só gota de sangue de seus amados filhos são seus filhos to dos brasileiros e europeus que habitam o seu solo criador DH 1953 p 31 grifo meu Portanto na revolução da Paraíba não se derramara o sangue de seus filhos sendo subentendidos nessa categoria bra sileiros e europeus que habitavam aquela província formulação que escamoteia du plamente a cisão entre brasileiros e portu gueses não só a revolução não teria exter minado os últimos nem os primeiros como esses podiam ser vistos como filhos da Paraíba O ódio ao europeu no entanto era compartilhado por proprietários e pe los cabras rebeldes elementos nãopro prietários Para os proprietários líderes revolucionários esse ódio ancoravase nos direitos de propriedade que vinham dos sucessos da restauração passada sobre os holandeses Mota 1972 p 144 confun dindose portanto com propriedade e ao mesmo tempo legitimandose por uma certa leitura da história passada Em meio à tensão entre brasileiros e portugueses novas identidades começavam a forjarse ameaçando estilhaçar a unida de da nação portuguesa A identidade bra sileira no entanto ainda não estava clara mente delineada e distinta da portuguesa Acreditavase numa filiação comum que vai dos lusos aos pernambucanos passan do pelos portugueses e brasileiros Todos esses sujeitos compunham uma mesma árvore com um tronco comum portanto dos quais seriam galhos Na Proclamação do Governo Provisório aos Habitantes de Pernambuco de 9 de março de 1817 por exemplo os revolucionários apresentavam o movimento pernambucano como uma reação a um governo tirânico e ao espírito do despotismo e do mau conselheiro que em meio ao ciúme e rivalidade entre os filhos do Brasil e da Europa tentara usar Brasilia Qua Parte Paret Belgis Amsterdam 1647 de Geogr Marggraf del e Johanes Blaeus ed REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 73 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 74 das medidas mais violentas contra pa triotas honrados e beneméritos da Pátria leiase os acusados de voltarse contra o governo O governo provisório ainda se gundo a Proclamação seria uma reação à anarquia que sucedera à partida do go vernador Caetano Pinto Montenegro ocul tandose com essa afirmação que uma re belião armada o depusera vindo a procla mar o fim da distinção entre os brasileiros e europeus A Proclamação encerrava com uma exortação A pátria é a nossa mãe comum vós sois seus filhos sois des cendentes dos valorosos lusos sois portu gueses sois americanos sois brasileiros sois pernambucanos DH 1953 pp 14 6 Se a menção ao tronco comum que unia dos lusos aos pernambucanos dos antigos habitantes da província romana da Lusitânia aos pernambucanos de inícios do século XIX procurava amenizar as difi culdades oriundas da fuga dos portugueses de nascimento de Pernambuco levando consigo cabedais eou criando dificulda des econômicas e políticas para o governo provisório tendo portanto um caráter es tratégico 23 se tal menção pelo que pro cura negar revela a existência de conflitos e discórdias a separarem pernambucanos brasileiros dos portugueseseuropeus não pode haver dúvida que demonstra a unida de dos laços ainda existentes entre eles A ruptura plena não se confirmara ainda Em prol da unidade houve insistentes apelos por parte do governo provisório o que pa rece sugerir reconheçase que as diver gências entre os povos dos dois lados do Atlântico atingiam um nível agudo O go verno do bispado de Pernambuco em pro clamação feita aos 8 de março de 1817 realizou um esforço no sentido de superar as diferenças lembrando às ovelhas Pernambucanas que uma fatal indisposi ção entre brasileiros e europeus nascia do esquecimento da Caridade o mais im portante fundamento da Santa Religião Cristã DH 1953 p 9 Afirmava ser a mesma indisposição um boato uma vez Engenho de Açúcar de Johann Moritz Rugendas 4a div pl 9 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 74 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 75 que primeiramente a espécie branca exis tente neste Bispado de Pernambuco é toda européia ou descende de europeus e em segundo lugar que os brasileiros têm muito amor aferro e respeito aos seus pro genitores acrescentando ainda que por natureza são dóceis sensíveis e extrema mente hospitaleiros sendo que estas be las qualidades não podem gerar ódios con tra os homens só pela diferença de natalí cio DH 1953 p 9 Apelavase portanto à unidade entre europeus e brasileiros uma unidade que era da espécie branca o que leva à suposição de que havia um inimigo oculto que seriam os nãobrancos Entre as próprias forças que se aliaram à contrarevolução em 1817 a palavra na ção parecia assumir uma conotação que apontava para essa unidade Segundo um informante partidário da contrarevolução a nação seriam o Reino Unido e as colô nias cujo bem ele desejava defendendo para tanto o envio dos desajustados em relação à estrutura de produção para ou tras zonas do sistema nomeadamente Mon tevidéu onde o Reino Unido participava de conflito de dimensão internacional Mota 1972 p 120 No Ceará a Câmara de Fortaleza aos 6 de abril de 1817 mani festava fidelidade a ElRei Nosso Augusto Soberano e Senhor e a toda a Augusta Casa de Bragança prometendo auxílio às for ças realistas até ser derramada a última gota de nosso sangue pela Religião pelo Rei e pela nação do Reino Unido de Por tugal e do Brasil e Algarves DH 1953 p 85 e por conseguinte identificando a Na ção ao Reino Unido e ao trono Dois dias depois ao pronunciarse contra a Revolu ção Pernambucana identificava novamen te a nação à Nação do Reino Unido aquela que compreendia as gentes dos dois lados do Atlântico sob o domínio da dinastia de Bragança DH 1953 pp 935 Patriotis mo correspondia à fidelidade a essa na ção algo que a unia O movimento de Pernambuco por sua vez era classificado como Revolução sendolhe associadas palavras negativas traição e perfídia e contrapostos termos revestidos de positividade tais como fidelidade vassalagem obediência lei reli Venda em Recife de John Moritz Rugendas 1835 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 75 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 76 gião elementos correlatos das noções de patriotismo e de nação Dãose vi vas por fim ao Rei do Reino Unido sau dação em que se vê que não se trata mais do Rei de Portugal DH 1953 p 95 e que por conseguinte explicita os parâmetros e condicionamentos do patriotismo a nação compreende sujeitos que habitando partes diferentes de um mesmo reino Europa e América Portugal e Brasil eram todos eles vassalos de igual forma da família de Bragança sem distinção ou hierarquia Havia portanto em circulação as identi dades de brasileiro português e súdito do Reino Unido para os revolucionários iden tidades que vinham de um tronco em co mum mas que se encontravam em choque para os realistas identidades sem quais quer incompatibilidades Na perspectiva dos revolucionários a soberania popular contrapunhase à tirania os revoltosos afirmaram insistentemente o princípio da soberania popular e em opo sição a ela combateram a tirania o despo tismo que gerava o direito de insurgência A soberania popular nos termos dos revo lucionários no entanto implicava como já se salientou uma cidadania restrita com partilhada por parcela da sociedade da qual se excluíam os escravos e os proletários Num documento dirigido às autoridades inglesas de 12 de março de 1817 explica se o movimento pernambucano como rea ção a um governo tirânico como derruba da do podre edifício do seu governo No documento citado afirmase com efeito que o povo pernambucano não podia já sofrer as contínuas opressões que o gover no português cada dia acumulava a dis córdia assim não se dava entre brasileiros e portugueses mas entre o povo pernambucano e o governo português Nesse sentido esclareciase que esse go verno opressor tentara desunir os portu gueses europeus e naturais de Pernam buco Logo a desunião não surgia da di vergência de interesses existentes entre portugueses europeus e portugueses de Pernambuco sendo isso sim semeada pelo governo Concluíase então com um pedido que não era senão de endosso ao movimento Millord um povo oprimido tem direito à compaixão do soberano da nação a mais respeitável do mundo DH 1953 p 21 Elevando o tom o governo da Paraíba denunciava que a causa da nossa Pátria encontravase sobretiranizada pela má ad ministração do Governo a que estava sujei ta estava ademais no maior perigo pelo desamparo desse governo DH 1953 p 24 Em documento datado de 17 de março de 1817 o governo provisório da Paraíba também investia contra a tirania contra a qual dizia terem chegado ao Tribunal Su premo da Justiça Eterna os clamores ain da que surdos dos habitantes da Paraíba DH 1953 p 30 A tirania era representa da pelo Ministério do Rio de Janeiro em razão do qual os paraibanos iam passando de vexação em vexação que não entendia as suas queixas ou que tornava tão dispendiosas as diligências para serem aten didas que era um novo diabólico canal da extinção da nossa sustância DH 1953 pp 301 Em outros documentos o gover no da Paraíba cola a tirania ao governo do Rei de Portugal sendo que em um deles se explicita o propósito de banilo da me mória de banir absolutamente das nossas idéias o império do despotismo e tirania até os seus últimos vestígios a saber in sígnias armas e decorações DH 1953 p 34 Tratavase portanto de uma medida que visava ao apagamento do passado Tirania é o termo que aparece também no documento denominado Preciso re digido por José Luís de Mendonça no ím peto de mostrarse digno da confiança dos revolucionários pernambucanos abalada por demonstração anterior de moderação ele propugnara até mesmo que se evitasse o combate ao monarca motivo pelo qual quase foi morto por Pedro Pedroso Radi cal por estratégia de seu autor o Preciso conclamava Viva a pátria vivam os Pa triotas e acabe para sempre a tirania Real Afirmava que o sistema de administração deposto cuidava de sustentar as vaidades de uma Corte insolente sobre toda a sorte de opressão de nossos legítimos direitos e ainda que o mesmo procurava caluniar REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 77 agora a nossa honra com o negro labéu de traidores aos nossos mesmos amigos pa rentes e compatriotas naturais de Portugal apud Tavares 1917 p CXI grifos meus A revolução enfim justificavase pela ti rania representada pelo governo ora con cebido como português ora como do Rio de Janeiro um governo que não atendia nem escutava as províncias um governo que classificava os revolucionários como traidores Tratavase de qualquer forma em todos os últimos documentos examina dos da colisão do povo soberano de Pernambuco e da Paraíba com a Coroa e por conseguinte com a interiorização da metrópole de que ele era representante Os pernambucanos porém tinham em mira os brasileiros Os habitantes de Per nambuco em armas no comando da revo lução pensavam nos brasileiros ao mes mo tempo em que falavam de si mesmos pernambucanos Os pernambucanos tinham em mira o Brasil sonhavam com a adesão das demais províncias à sua causa sobre tudo as províncias do Norte Na proclama ção do governo de Pernambuco ao povo com efeito aludese à difusão de algumas sementes de um malentendido ciúme e ri validade entre os filhos do Brasil e de Portugal habitantes desta Capital desde a época em que os encadeamentos dos su cessos da Europa entraram a dar ao conti nente do Brasil aquela consideração de que era digno e para o que não concorreram nem podiam concorrer os Brasileiros DH 1953 p 14 Explicase ademais que o monarca escapando às tropas inimigas que invadiam o Reino foi acolhido no Brasil e teve saciada sua fome pelos pernambucanos ainda quando se encontrava ao mar o Príncipe de Portugal sacudido da sua capi tal pelos ventos impetuosos de uma inva são inimiga saindo faminto dentre os seus Lusitanos veio achar abrigo no franco e generoso continente do Brasil e matar a fome e a sede na altura de Pernambuco pela quase Divina providência e liberalida de dos seus habitantes DH 1953 p 14 Lançase a partir disso uma interrogação e dáse uma resposta que se expõem a tensão entre filhos do Brasil e filhos de Portugal expressam igualmente a percep ção de um todo ao qual a Revolução Pernambucana se dirige o país o con tinente do Brasil Que culpa tiveram os Brasileiros de que o mesmo príncipe Re gente sensível à gratidão quisesse honrar a terra que o acolhera com a sua residência estabelecendo a sua Corte e elevála à ca tegoria de Reino Aquelas sementes de dis córdia desgraçadamente frutificaram em um país que a natureza amiga dotou de uma fertilidade ilimitada e geral DH 1953 p 14 Por mais que a interiorização da metrópole pudesse opor o Norte ao Sul a identidade do inimigo na perspectiva dos pernambucanos colavase à Coroa e a seus agentes portugueses por mais que uma e outros sejam aparentemente poupados na Proclamação Para Muniz Tavares os pernambucanos confiavam na ressonância de sua causa no Brasil Sabendo a tendên cia universal do Brasil à mesma causa per suadiamse aqueles Patriotas que era che gada a hora em que o Rei de Portugal jul garseia muito feliz em poder partir são e salvo para o seu antigo reino Tavares 1917 p CXVII Por esse motivo o gover no provisório desmobilizou as tropas vin das do interior para a defesa do Recife co metendo um erro estratégico pelo qual pa garia caro mais tarde A palavra pátria tinha um conteúdo às vezes quase abstrato ou no mínimo significados diferentes que não se contra dizem mas se somam indo do lugar do nascimento eou habitação à entidade re sultante da vontade popular reunindo ter ritório povo e organização política Po dia significar o local de nascimento eou moradia com os afetos e as redes de socia bilidade nele estabelecidos sendo um exemplo desse entendimento as palavras de Cristóvão Cavalcante revolucionário pernambucano oriundo de baixos estratos sociais homem branco e pobre que vivia sob o peso da estrutura escravocrata que o marginalizava Ele dizia que preferia viver em Maceió sua terra sua pátria onde o viver é barato porque para negociar em Pernambuco era preciso dinheiro e ele não tinha apud Mota 1972 p 87 Pátria REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 78 portanto era a terra onde ele habitava eou nascera compreendendo igualmente as relações econômicas e sociais que lhe ga rantiam a sobrevivência A pátria podia alar garse incluindo a província mormente dotada de governo soberano Foi assim que se pronunciou o governo provisório da Paraíba ao conceder ao patriota José Antô nio Vila Seca o posto de coronel avaliando essa nomeação como algo a favor da nos sa Causa Comum à Independência da nos sa Pátria termo este que parece poder ser substituído por Paraíba revolucionária juntando portanto território povo e go verno DH 1953 p 53 Pátria portanto não se restringia ao território tanto assim que em Pernambuco Afonso Honorato Bastos escreveu Agora só se trata nesta terra de servir à Pátria e nada mais DH 1953 p 101 Se a pátria como se nota não se resume à terra abrangendo o que os homens estruturam sobre a mesma o conceito des liza para a idéia de povo soberano e em seguida de governo que surge como mani festação da mesma soberania e podería mos acrescentar de Estado em construção que seria abortada povo soberano um povo imbuído de uma vontade da sobera nia que o leva a constituir um governo instaurando uma nova ordem política um novo Estado aberto a brasileiros e portu gueses desde que republicanos e antiti rânicos antimonarquistas enfim pátria confundindose com o próprio governo Estado que emanava da vontade popular A pátria como a vontade popular ultrajada sublinhese aparece na proclamação do vigáriogeral do bispado de Pernambuco Bernardo Luiz Ferreira Portugal de 11 de março de 1817 ao explicar a morte do bri gadeiro Barbosa de Castro por José de Barros Lima e do tenentecoronel Alexan dre Tomás pelo regimento de artilharia ponto de partida da eclosão do levante afirma que dois dos mais pacatos pernam bucanos deram a morte a dois infames caluniadores procurando apoio em seus irmãos segurandolhes que a pátria era atraiçoada e que o governo que protegia a injustiça e negra calúnia aterrado pelo grito de sua consciência fugiu espavorido DH 1953 pp 178 Completa a narrati va ainda dizendo que os europeus em um instante conheceram a perfídia e sem inter valo protegeram a causa da pátria e formaram uma mesma família e a sobera nia do povo se reintegrou nos seus direi tos logo sendo nomeados seus represen tantes isto é o governo provisório DH 1953 p 18 Aqui evidenciase que a pá tria é a vontade popular traída por um go verno tirânico que semeava injustiças e inverdades sendo aquela vontade popular compartilhada pelos europeus catego ria que compreende o português de nasci mento e os pernambucanosbrasileiros si nônimo de branco daquele que tem ascen dência européia ambos membros de uma mesma família na oposição ao despotis mo Esse entendimento pode ser confirma do pelo trecho subseqüente do documento em que se diz que o governo eclesiástico procurava confirmar o recíproco amor entre brasileiros e europeus Na Paraíba identificavase com todas as letras a pátria ao governo provisório emble ma de um Estado em construção por meio do uso da fórmula a pátria é o governo revolu cionário ou literalmente este governo é a vossa pátria DH 1953 p 62 No mesmo texto estabelecese uma associação entre pátriabem comum e governo provisório ao justificarse a medida pela qual se determi nou a transferência do gado para o sertão com o fim de deixar mais terras para a produ ção agrícola causa comum distinta dos inte resses particulares representados pela cria ção do gado O estado atual da guerra obrigounos imediatamente a adotar a reso lução de segurar os gados no interior do país é disto que resulta libertar a agricultura Heia patriotas entrai nos vossos verdadeiros inte resses nos interesses da Pátria em comum DH 1953 p 62 grifos meus Se a pátria é o oposto do despotismo o que se encontra sintetizado numa palavra de ordem dirigida pelo cidadão Costa ao cidadão Freire escrita em Santa Ana aos 14 de março de 1817 Viva a Pátria e morra o Despotismo DH 1953 p 25 o povo como mostra Carlos Guilherme REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 79 Mota já não era concebido como simples componente de uma sociedade de ordens isto é como Terceiro Estado Na Lei Orgâ nica o povo não mais constituía um blo co monolítico Era o povo de todas as clas ses que se convocava a 29 de março de 1817 Antônio Carlos remetia o projeto da Lei Orgânica a cada Câmara que deveria por sua vez fazer concorrer o povo quase todo pois lhe interessa conhecer o como hão de ser governados segundo o An drada Mota 1972 p 107 Isso no en tanto destaquese não eliminava a perma nência daquele ideal aristocrático mencio nado anteriormente A pátria é também aquela unidade aquele tronco comum que unia europeus e brasileiros sem que se es tabelecesse qualquer dependência entre essa unidade e o trono sendo que essas duas idéias encontramse sintetizadas nas pala vras finais da Proclamação do Governo Provisório que repito a seguir A pátria é a nossa mãe comum vós sois seus filhos sois descendentes dos valorosos lusos sois portugueses sois americanos sois brasi leiros sois pernambucanos Carlos Guilherme Mota considera que pátria e propriedade eram idéias interliga das ligada à noção de propriedade estava a noção de pátria e na Paraíba como em outras regiões nordestinas será do antago nismo básico entre portugueses e patrio tas que emergirão as novas formas de pen samento Mota 1972 p 96 Por isso nos termos do artigo 6o do decreto de 9 de abril de 1817 do governo provisório da Paraíba explicitavase que Todas as proprieda des dos vassalos do governo português que forem achados nesta província da Paraíba devem ser embargadas para segurança das propriedades dos nossos patriotas que ha jam de ser embargadas pelo governo portu guês DH 1953 p 98 Mota a partir disso conclui que as propriedades dos vassalos ficavam contrapostas às proprie dades dos patriotas Mota 1972 p 96 A associação entre a revolução e a pro priedade aparece também no documento Preciso embora assuma nesse caso um caráter coletivo público o território da província de Pernambuco como proprieda de de seus habitantes Segundo o Preci so assim o governo provisório procla mara não haver mais daqui por diante di ferença entre nós de Brasileiros a Europeus mas deverem ser tidos em uma só e a mes ma herança que é a propriedade geral de toda esta Província apud Tavares 1917 pp CXIICXIII As disputas pela proprie dade da terra tornaramse objeto de atua ção governamental o que se não demons tra uma clara associação entre pátria e pro priedade indica que o governo que se pro clamava emblema da pátria quando não o seu sinônimo tomava a questão da proprie dade no centro de suas preocupações mes mo num momento em que a ação militar necessariamente era prioritária O governo provisório da Paraíba assim aos 29 de março de 1817 voltandose contra a per turbação que causa aos proprietários de terra as imensas intermináveis disputas e questões ora judiciais ora extraju diciais determina que cada proprietário e possuidor de terras muito exatamente se contenha na posse em que estava até o dia 13 da independência de nossa Província sem passar ao terreno da posse de seu vizi nho frisando seu compromisso com a inviolável segurança da propriedade e paz dos proprietários DH 1953 p 67 No dia 1o de abril de 1817 o mesmo governo fixava punições para os que violavam o direito de propriedade DH 1953 pp 81 2 oito dias depois determinava punições específicas para aqueles que comprassem de escravo alheio algodão ou qualquer outro gênero de lavoura ainda que o tenha de sua cultura sem licença por escrito de seu senhor visto que escravos estavam a furtar seus senhores DH 1953 p 96 O patriotismo também era advogado pela contrarevolução Na Ordem do Dia de Caetano Pinto Montenegro de 4 de março de 1817 o governador demonstra va primeiramente perceber a cisão exis tente na nação portuguesa entre os que nasciam no Brasil e os que nasciam em Portugal Montenegro no entanto chama va a atenção para o fato de ambos serem Portugueses e ao mesmo tempo vassalos da mesma monarquia concidadãos do REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 80 mesmo Reino Unido com o que revelava que a unidade entre os que estavam dos dois lados do Atlântico passava pela sujei ção a um mesmo rei e pela participação de um mesmo corpo político o Reino Unido do qual os vassalos eram concidadãos A ordem reproduzia as idéias de D Rodrigo de Souza Coutinho sobre os portugueses dos quatro cantos do mundo e terminava apelando em favor da harmonia e do amor e fidelidade ao rei O Ilmo e Exmo Sr General constando lhe no dia 01 do corrente de março que nesta Villa entre os nascidos em Portugal e nascidos no Brasil há presentemente alguns partidos fomentados talvez por homens malvados com a louca esperança de tirarem alguma vantagem das desgraças alheias sem se lembrarem que todos somos Portugue ses todos vassalos do mesmo Soberano todos concidadãos do mesmo reino unido e que nesta feliz união igualando e ligando com os mesmos laços sociais os de um e outro continente só deve dividir e separar aos que fomentam tão perniciosas rivalida des Desejando S Excelência que sentimen tos e idéias tão erradas e tão fora do tempo não contaminem a tropa manda recomen dar aos Senhores oficiais e a todos que tem a honra de servir debaixo das Bandeiras de S Majestade Fidelíssima que guardando a subordinação estabelecida pelas leis milita res vivam entre si na melhor harmonia e amizade não tratem nem tenham socieda de com estes homens empestados que pre tendem enganálos com falsas sugestões e que se persuadam sem a menor hesitação que o lugar em que cada um nasce não lhe dá merecimento algum senão o amor a fi delidade ao Soberano o patriotismo e ob servância das leis o exato cumprimento do que deve a Deus a si mesmos e aos outros os talentos e conhecimentos as nobres qua lidades que distinguem os homens embora nascessem eles na Europa na América na África ou Ásia Ordena outrossim que esta se dê por cópia e seja lida nas Companhias até que fiquem todos inteirados das verda des que nela se contém apud Tavares 1917 pp LXXXVILXXXVII A Câmara de Fortaleza Ceará partidá ria da contrarevolução em documento de 6 de abril de 1817 oferece outro exemplo de associação entre pátria e monarquia fazendoo de modo mais explícito com o uso da expressão Fidelidade Amor e Pa triotismo pela Real Família de Bragança apud Mota 1972 pp 107 e 193 Patrio tismo ganhava assim entre os camarários de Fortaleza conotação bem diferente da quela observada entre os patriotas pernam bucanos era sinônimo de fidelidade à fa mília real aliás em contraposição ao pa triotismo dos revolucionários expressão da soberania popular que se antagonizava com o poder monárquico concebido como tirânico e por conseguinte se materializa va no governo provisório inaugurando a edificação de um novo Estado O termo país compreendia circuns crições geográficas diferentes Ora é o Bra sil remetendo ao mesmo tempo ao gover no do Rio de Janeiro ora é a província ora é o Reino Unido Na proclamação ao povo feita pelo governo provisório de Pernam buco assim afirmase por um lado a ir mandade de brasileiros e europeus e por outro lado que ambos habitam o mes mo país professando a mesma religião Brasileiros e europeus todos se conhe cem irmãos descendentes da mesma ori gem habitantes do mesmo País professo res da mesma Religião apud Tavares 1917 p CIX A associação entre país e o governo do Reino Unido por sua vez faz se presente no Ultimatum dado ao gover nador Caetano Pinto de Miranda pelos pa triotas de Pernambuco datado de 7 de março de 1817 e assinado por Domingos Teotônio Jorge pelo padre João Ribeiro Pessoa e por Domingos José Martins Tavares 1917 p CICII depois de enaltecerem as as qua lidades pacíficas de S Excelência os pa triotas prometem segurança ao governador e aos seus acompanhantes desde que fos sem aceitas algumas condições dentre as quais que a tropa do País que se acha na fortaleza do Brum saia com as suas armas para unirse ao corpo apud Tavares 1917 p C Em oposição às tropas do país dizse no Ultimatum que um cor REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 81 po de tropas Patriotas entrará sucessiva mente na dita fortaleza para tomar posse dela em nome da Pátria e este corpo irá encarregado da proteção da pessoa de S Excelência e seus acompanhantes apud Tavares 1917 p CI No documento já citado emanado do governo provisório da Paraíba encontrase a identificação do país à província uso este que como pudemos mostrar faziase também em Minas Ge rais O estado atual da guerra obri gounos imediatamente a adotar a resolu ção de segurar os gados no interior do país DH 1953 p 62 O emprego dos termos pátria e na ção freqüentemente envolve apelos à his tória pregressa A história é usada para cindir ou unir sendo apropriada pelos ato res políticos em estreita ligação com a idéia que apresentam de pátria e nação Os per nambucanos cindem não a pátria posto que ela é a encarnação da vontade popular confundindose nesse sentido com o go verno provisório mas a relação entre a pátria e a monarquia minando portanto o Estado português o Reino Unido E a his tória serve justamente para operar essa ci são entre Estadotrono e pátria e para si multaneamente apresentar o governo pro visório como o reencontro da pátria consi go mesma A história funciona como um espelho de duas faces idênticas numa face a pátriagoverno provisório o presente noutra o passado mais distante de glórias lutas e bravuras da pátria momento em que se fez valer sua soberania diante do invasor holandês não obstante isso se dar a servi ço de um tirano Nesse espelho de duas faces a monarquia aparece como a som bra inscrita já naquele passado da tirania apresentase portanto como antigo cati veiro que embaça a imagem da pátria Reintegrando numa mesma unidade povo e governo com a necessária eliminação do tronoEstado que a conspurca o governo provisório usa o passado para legitimarse e por sua vez diz fazer jus àquele mesmo passado recuperando a herança por ele legada de luta glória e bravura maculada pela monarquia Isso tudo se vê no docu mento que o governo provisório dirigiu aos patriotas pernambucanos aos 15 de março de 1817 conclamandoos a escutar as vozes da Pátria que fala ao vosso cora ção e a engajarse na luta para consumar a grande obra da nossa independência Salientase no documento referido que os grilhões do nosso antigo cativeiro estão quebrados nós somos já livres e metidos de posse de nossos legítimos direitos soci ais ao chamálos a participar da luta lem bralhes a guerra vitoriosa contra os holan deses no século XVII Filhos da Pátria herdeiros naturais da bravura e da glória dos Vieiras e dos Vidais dos Dias e Camarões vinde sem perda de tempo alistarvos debaixo das bandeiras da nossa liberdade Pais e mães de famílias lançai mão da ocasião que se vos oferece de aproveitar os brios de vossos filhos mandaios para o campo da honra e vós os vereis brevemente coroados pelas mãos da pátria dos mesmos louros que ganharam os heróis de Tabocas de Guararapes DH 1953 pp 278 Dirigese também aos patriotas uma advertência no sentido de que não deson rassem aquele passado de feitos dos avós malgrado essas glórias tenham sido em serviço de um tirano Mocidade de Pernambuco não dege nereis do caráter de vossos avós se eles ficaram tão famosos e honrados na me mória dos séculos pelos feitos que obra ram em serviço de um tirano quanto mais o sereis vós seguindo o seu exemplo na defesa de uma causa em que só se trata de nos dar a todos um novo ser a alta digni dade de um povo livre Correi portanto a escrever os vossos nomes no quadro dos defensores da pátria tomando cada um aquela arma que melhor se acomodar à sua inclinação DH 1953 p 28 O reencontro da pátria consigo mesma portanto era uma obra inconclusa e exigia o engajamento dos patriotas Só assim acrescenta o documento mereceriam ter lugar distinto na História do Universo sob REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 82 a observação de todas as nações DH 1953 p 28 O engajamento na luta ao lado do governo provisório enfim garantiria o futuro da pátria no curso da história e ao mesmo tempo a inscrição dos nomes dos patriotas nas páginas da História do Uni verso A mesma retórica fezse presente na Paraíba ampliandose porém o universo das imagens passadas que pelo espelho duplo da história iluminam o presente e definem o futuro da construção do devir à própria memória que se terá deles O go verno paraibano conclamava aos 22 de março de 1817 Mocidade Paraibana correi voai às Ban deiras da Liberdade do Patriotismo e do Heroísmo Alistaivos e deixai vossos no mes nas páginas das histórias futuras com o distintivo de vosso esforço Vejam as Na ções do Universo que os netos dos Vieiras dos Negreiros dos Henriques Dias e dos Camarões imitam um dia os heróis da Grécia e Roma O Novo Mundo sabe criar novos heróis DH 1953 p 49 A história mestra da vida além dos heróis do passado da América Portuguesa oferecia outros exemplos a serem segui dos os heróis da Grécia e Roma Pela ação revolucionária do presente neste Novo Mundo português ademais a his tória criaria novos heróis Esse discurso é muito similar ao presente na Revolta da Nobreza em 1710 e na Inconfidência Mi neira tendo em comum com eles uma opo sição não entre nascidos em Portugal e nascidos no Brasil mas entre povo e rei sociedade ou parte dela e Estado ou a cabeça dele Da rejeição à Coroa porém deslizavase para um campo muito próxi mo do anticolonialismo usandose uma retórica similar aos discursos de Tiradentes nos quais o alferes se apropriava de modo inventivo de um sermão do padre Antônio Vieira proferido aos 2 de julho de 1640 em homenagem ao marquês de Montalvão D Jorge Mascarenhas que então chegava à Bahia como vicerei Todo esse engenho reafirmava a situação de despotismo 24 Na mensagem que Miguel Joaquim César e o padre José Martiniano Pereira de Alencar levaram ao Ceará assim faziase referên cia às opressões que vinham sofrendo desde muito tempo por parte da Coroa portuguesa e aos bens que adviriam de não serem mais governados por ladrões que vinham chupar a nossa substância Leite 1984 p 53 A contrarevolução significativamen te apropriavase dos mesmos fatos inver tendo porém os sinais Na primeira Pro clamação aos Habitantes de Pernambuco feita aos 21 de março de 1817 o conde dos Arcos governador da Bahia afirma cons tar que o Teatro onde brilhava a fidelidade de Fernandes Vieira Camizão sic Hen rique Dias e outros cujos nomes tem es crito na mesma linha dos heróis está mu dado em covil de monstros infiéis e revoltosos considera que ao contrário dis so a divisa dos baianos é Fidelidade ao mais querido dos reis e que cada sol dado da Bahia será um Cipião ao lado dos pernambucanos assim que tiver ordem para vingar a afronta perpetrada contra o soberano DH 1953 p 40 A revolução sendo uma traição na perspectiva do con de dos Arcos nega as ações heróicas do passado conspurcao com a infidelidade sendo seu reverso o soldado baiano fiel à monarquia A fidelidade é a liga passado presente é a imagem que se encontra no espelho de duas faces enquanto a sombra encontrase na traição revolucionária A posição anticolonial ao que tudo in dica assumiu um papel secundário nos discursos dos revolucionários Embora pre sente nas mentes e nas práticas dos atores políticos o alvo principal dos discursos parecia ser o governo monárquico e por isso na perspectiva dos revoltosos o antípoda da pátria era o despotismo daí falarem em contraposição em escutar as vozes da pátria DH 1953 p 27 Há con tudo ambigüidades nos discursos nas quais se insinua o viés anticolonial do movimen to Entre os pernambucanos os trezentos anos de despotismo eram trezentos anos de monarquia tirânica em favor da qual luta ram os valorosos da pátria todavia esses REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 83 mesmos trezentos anos correspondiam ao colonialismo perspectiva essa endossada pelo Governo do Bispado de Per nambuco Com a aprovação do governo pro visório o governo diocesano em procla mação de 8 de março de 1817 por meio da qual explicava a insurgência militar afir mou nossas ovelhas habitantes do Recife conduzidas pela mão do Onipotente vie ram em socorro de seus irmãos e que em um instante e sem anteriores medidas e disposições se despedaçaram as cadeias que ha trezentos anos arrastamos DH 1953 p 10 Tirania e colonialismo ao que tudo indica confundiamse Acontece que o colonialismo acabara ao menos o estrita mente português mas a metrópole interio rizavase a hegemonia dos interesses de comerciantes e burocratas enraizados no CentroSul subordinava e espoliava as ca pitanias do Norte ainda que isso não fosse explicitado senão como domínio do rei por tuguês domiciliado na América Essa am bigüidade de não ser mais colônia propria mente de Portugal mas de parcela da me trópole interiorizada embaralhava a situa ção O governo provisório da Paraíba che gou bem perto de explicitála Se na já citada proclamação de 17 de março de 1817 dizia que a tirania não escutava os cla mores do povo da Paraíba que as queixas desse não eram atendidas no Ministério do Rio de Janeiro ou para seu atendimen to demandavam dispendiosas as diligên cias por meio da qual se tinha um novo diabólico canal da extinção da nossa subs tância DH 1953 p 31 o tenentecoro nelcomandante Estevão José Carneiro da Cunha e o coronel Amaro Gomes Coutinho por sua vez exortavam os soldados cida dãos e povo da província da Paraíba aos 13 de março de 1817 à união dos patriotas em defesa da Pátria e a um Governo Provi sório pedindolhes em nome desse últi mo vos convencerá bem depressa de ser chegado o momento em que a Providência guardava para vos tirar do jugo em que desde os vossos primeiros avós tendes ja zido e a passos largos se ia aumentando DH 1953 p 23 Vista do Largo do Palácio no dia da Aclamação de Dom João VI de J B Debret c 18181831 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 84 EPÍLOGO Derrotada a Revolução Pernambucana sufocada a República que cindia o Brasil e de resto o Império português o Estado monárquico lusitano abandonavase a en cruzilhada dos desencontros do Império lusobrasileiro temporariamente é bem verdade retomaramse os preparativos para a aclamação de Dom João VI como monar ca do Reino Unido de Portugal Brasil e Algarves realizada em 1818 Com isso ce lebravase a idéia de pátria colada à monar quia confundindose pátria e Estado elidindo uma nação no sentido de comuni dade imaginada como soberana embrio nária na pátria sonhada pelos patriotas pernambucanos reiteravase pelo contrá rio a idéia de nação como o conjunto de súditos de um mesmo rei A Revolução Liberal do Porto de 1820 entretanto traria nova turbulência para as relações do soberano com seu império americano e sobretudo para a unidade dos portugueses das quatro partes do mundo sob a sombra do Reino Unido A encruzi lhada dos desencontros seria retomada agora com novas direções A partir da Re volução do Porto as elites provinciais do Reino Unido passaram a identificar clara mente dois centros do poder o Rio de Janeiro a sede do governo absolutista e Portugal onde se encontravam as cortes que no primeiro momento apresentavam se como liberais constitucionais em oposi ção ao rei absolutista Carvalho 1998 pp 3334 As províncias uma a uma esco lheram ficar do lado das cortes e não da Coroa Para a imprensa panfletária portu guesa o Rio de Janeiro era a sede da reação e do absolutismo monárquico podendose imaginar que o mesmo se dava no Brasil Em Pernambuco o desejo por maior autonomia e até sepa ração já era antigo entre muitos letrados e liberais mais exaltados Mas isso não sig nificava aderir ao Rio de Janeiro Muito pelo contrário Veio de lá a repressão a 1817 quando as tropas fiéis à Sua Majestade fidelíssima chegaram ao cúmulo de execu tar até padres Depois de tudo entre os áulicos de Pedro continuava atuante Caetano Pinto de Miranda Montenegro o governador de posto naquela rebelião o qual seria nomea do para a pasta da Fazenda em janeiro de 1822 Carvalho 1998 pp 3334 A Revolução Liberal paulatinamente angariou a simpatia das províncias do Bra sil mas as cortes constituintes de Lisboa engendraram uma nova situação alimen taram de um lado a unidade entre as partes da América e de outro a oposição delas à exmetrópole que queria voltar a ocupar a posição metropolitana Na verdade a Revo lução do Porto como ensina Sérgio Buarque de Holanda teve duas faces foi um movi mento antiabsolutista mas ao mesmo tem po um movimento antibrasileiro o que se explicitou nas cortes constituintes de Lis boa A centralização política que as cortes propunham chamar de volta à Lisboa fruto necessário do próprio radicalismo dos vito riosos soou no Rio de Janeiro como des potismo até mesmo para os liberais Pare cialhes um retrocesso restauração do esta tuto colonial Essa nova situação levou a uma aliança entre os inimigos das cortes mal grado as divergências ideológicopolíticas existentes entre eles adeptos do absolutis mo na Europa juntamse aos secessionistas do Novo Mundo Esse processo de ruptura todavia não foi linear De um lado setores das elites coloniais que nutriam o desejo de manter uma aliança política com a metrópole po sição essa adotada por José Bonifácio e pelo grupo palaciano procuraram manter a uni dade até o último momento Por outro lado as dimensões continentais do Brasil im pediam uma imediata unidade de propósi tos das diversas lideranças locais haven do como já se salientou da parte das pro víncias do Nordeste o ressentimento seja pela situação de neocolônias seja pela re pressão de que foi vítima a República Per nambucana A unidade do Brasil contra Portugal teve que ser construída processo que comportou instabilidade ressentimen tos e rancores e não se pode esquecer o REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 85 uso das armas contra Portugal e contra o que soava como secessão Nessa constru ção de um lado pesaram os propósitos colonialistas das cortes e de outro os te mores de ameaças à ordem social que depois de 1790 ficaram estreitamente as sociadas ao republicanismo e tenderam a produzir uma maior coalizão dentro da eli te especialmente entre a dos proprietários de terra Maxwell 2000 p 189 O fan tasma da ameaça à ordem social exorci zado pelos mineiros em 1789 dado o elitismo do movimento fator de recuo das elites baianas em relação à sedição de 1798 e experiência vivenciada em Pernambuco em 1817 afloraria novamente nos idos de 1822 Embora não tenha calado a secessão ajudou a pavimentar o êxito de um projeto que representava a continuidade renovada do Império lusobrasileiro contra o qual os pernambucanos se voltaram o Império do Brasil sob a hegemonia do CentroSul O desenrolar do processo de Independência no Brasil por fim a partir de 1822 impli cou uma associação estreita entre a idéia liberal e a idéia nacional agora sim opon do brasileiros a portugueses Com isso a presença dos portugueses passou a ser malvista sendo encarada por muitos como perigo mortal para a liberdade perigo esse visto por alguns na própria pessoa do impe rador poupada e exaltada a partir de en tão enquanto reiterava a emancipação do Brasil A vinculação entre o imperador e a Independência por sua vez justificou a mudança de posições de um revolucioná rio pernambucano de 1817 Antônio Carlos de Andrada e Silva De liberal republicano e secessionista em 1817 ele se transfor mou em monarquista constitucional em 1822 afirmando Um brasileiro liberal podia crer em 1817 ser necessário aderir a republicanos e hoje adotar as instituições monárquicas Em 1817 a casa reinante enganada pelo ódio português acabrunhou o Brasil era pois óbvio lançarmonos nas formas republicanas que só então nos pro metiam emancipação Hoje graças à Provi dência S A R conhece os seus verdadeiros interesses e está convencido que a emanci pação do Brasil é o passo preliminar da sua prosperidade e da glória de seu reinado e tem desta maneira ajuntando em torno de si os verdadeiros patriotas apud Neves 2004 p 377 Fincavamse enfim as bases de um novo Estado uma nova Pátria no sentido de valores morais e políticos que confirmavam a emancipação da comunida de política do Brasil cuja consolidação envolveu a passagem por novas encruzilha das de desencontros e secessão além desses desafios o Império do Brasil enfrentou a tarefa de construir a nação brasileira apenas esboçada nos idos de 1822 25 NOTAS 1 Esse surto patriótico imperial todavia difundiuse de modo diferenciado no tempo e no espaço Se imediatamente após a chegada parecer terse difundido por toda a América passados alguns anos concentrouse nas capitanias do CentroSul Evaldo Cabral de Mello a partir de John Armitage afirma que um notável descompasso prevaleceu no período joanino e ao tempo da Independência entre as aspirações políticas do Norte e do Sul da América portuguesa Se a elevação do Brasil a reino fora suficiente para contentar o Sul não bastou para evitar a revolução republicana de 1817 Mello 2003 p 10 Sobre a utopia da criação no Brasil de um grande império português ver Lyra 1994 pp 10790 2 A expressão interiorização da metrópole é usada por Maria Odila Leite Silva Dias Segundo essa historiadora a transferência da Corte provocou o enraizamento de interesses portugueses e sobretudo o processo de interiorização da metrópole no CentroSul da Colônia Dias 1972 p 165 nessa região fixaramse novos capitais e interesses portugueses associados às classes dominantes nativas e também polarizadas em torno da luta pela afirmação de um poder executivo central que queriam fortalecer contra as manifestações de insubordinação das classes menos favorecidas muitas vezes identificadas com nativismos facciosos ou com forças regionalistas hostis umas às outras e por vezes à nova corte como seria o caso do Nordeste na revolução de 1817 e na Confederação do Equador Dias 1972 p 179 Ao dedicarse à consolidação de um império do Brasil Dias 1972 p 169 a monarquia ao mesmo tempo em que fincava raízes e articulava grupos e interesses no CentroSul do Brasil criava uma situação que gerava tensões e latentes possibilidades de insurgência no próprio Portugal e no norte da América Portuguesa Essa nova configuração política o novo império português Metrópole interiorizada no CentroSul implicava o controle e a exploração das outras colônias do continente como a Bahia e o Nordeste Dias 1972 p 173 Às capitanias parecia a mesma coisa dirigirse ao Rio de Janeiro do que a Lisboa 3 A presença do monarca português no Rio de Janeiro foi um fator diferencial no desenrolar do processo de Independência da América Portuguesa em relação às demais colônias européias do Novo Mundo Teve impactos porém distintos conforme a região e mesmo contraditórios quando se pensa nas percepções que os atores políticos construíram à época Francisco Muniz Tavares homem que se engajou na Revolução Pernambucana de 1817 REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 86 sublinha o efeito negativo para o êxito da Revolução Pernambucana de 1817 da desconsideração dessa presença diferencial do monarca Acreditava que no caso do Brasil seria preciso considerar a existência da monarquia ocupada por um Rei naturalmente bom ou seja a presença do trono mudava os parâmetros do jogo político a ser desenvolvido no Brasil existia um trono e ocupado por um Rei naturalmente bom circunstância que muito diversificava a posição respectiva Tavares 1917 p LXXXV Kenneth Maxwell defende posição semelhante pois considera que o sistema da monarquia centralizada havia estabelecido uma forte presença institucional desde 1808 e esse fator foi crítico para determinar o sucesso de D Pedro na proteção de seu novo império aos desafios republicanos Maxwell 2000 p 189 Sérgio Buarque de Holanda explicanos que a vinda da Corte para o Rio de Janeiro afagou a vaidade brasileira pondo a nu porém a debilidade de um domínio que a simples distância aureolara na colônia de formidável prestígio Holanda 1985 p 11 István Jancsó e João P Pimenta 2000 p 153 avaliam que algo muito maior que vaidade se desenvolveu na percepção das elites locais da América Portuguesa na nova situação ampliarseia a sua participação na gestão da coisa pública com a maior proximidade do centro de poder o que no plano das identidades coletivas traduziuse no reforço de sua adesão à portuguesa engendrando um surto de patriotismo imperial Ampliouse grandemente o número de personagens que formavam a sociedade política na América Portuguesa se confrontado o quadro emergente do 1808 com aquele prevalecente anteriormente a essa data Jancsó Pimenta 2000 p 149 4 Se tomarmos mercado como trocas regulares entre compradores e vendedores de uma economia determinada ou como a instituição que os coloca em contato recíproco conforme afirma Cláudia Chaves 2001 p 52 existe mercado no Brasil colonial desde o século XVI pois desde essa época existem trocas entre pequenos agricultores e os donos de engenhos a produção de alimentos para mercados coloniais era um desdobramento da produção destinada ao consumo da unidade produtiva Tratavase de mercados locais isolados e não regulamentados exceto para a comercialização em vilas e arraiais próximos para o que existiam as posturas estabelecidas pelas Câmaras Chaves 2001 p 52 Depois de 1780 observamse segundo a mesma autora importantes traços de integração mas ainda profundamente marcados pela política de fragmentação colonialista na qual se incentivava a correspondência direta das capitanias com a metrópole e não a integração delas Chaves 2001 p 77 João Luís Fragoso concebe a existência de um mercado restrito característico das economias nãocapitalistas com uma incipiente divisão do trabalho um precário índice de circulação de mercadorias e baixa liquidez em parte relacionada com o frágil índice de circulação de numerário Fragoso 1998 pp 181 e 184 Na última etapa do período colonial toda a crescente complexidade da vida econômica no continente do Brasil interligando mercados regionais crescentemente dinâmicos outrora com ligação mais rarefeita gerava possibilidades de integração novas abrangências em meio à diversidade Na esteira da rota das mercadorias em meio a transformações no lócus da realização das mercadorias coloniais o mercado africano e o mercado europeu ambos abalados pela desordem revolucionária do final do século XVIII politizavamse as identidades coletivas regionais Jancsó Pimenta 2000 pp 1423 Isso tudo conduzia à percepção por parte dos homens de outrora da perda de operacionalidade das formas consagradas de reiteração da vida social instaurando uma situação de crise definida por uma generalização da busca de alternativas para a aludida perda de operacionalidade Jancsó Pimenta 2000 pp 1423 5 Segundo Ricardo Mário Gonçalves 1994 p 505 a maçonaria é uma sociedade de pensamento convívio fraterno e filantropia de caráter internacional restrita ao sexo masculino mais discreta do que secreta fundada na Inglaterra em 1717 tomando por modelo as agremiações medievais de pedreiros Distinguiase das outras sociedades de pensamento surgidas no século XVIII por difundir um corpo doutrinário que misturava influências diversas como os Mistérios da Antigüidade Pagã o Pitagorismo a Cabala o Hermetismo etc transmitidos aos membros por ritos iniciáticos símbolos e instruções Gonçalves 1994 p 505 A maçonaria agiu como foco de veiculação de idéias do Iluminismo e Liberalismo tendo reunido elementos de diferentes estratos das elites passando por cima das diferenças donos de manufaturas homens de ciência e intelectuais locais Outram 1995 p 25 Nos países latinos pela perseguição que sofreu da Igreja Católica a partir de 1738 a maçonaria assumiu uma feição secreta anticlerical Fez se presente em Portugal desde cerca de 1740 havendo nas lojas portuguesas a presença de várias pessoas nascidas no Brasil Malgrado a existência de proibição de qualquer tipo de associação voluntária no Brasil antes da chegada da família real em 1808 Neves 2003 p 34 a primeira loja maçônica aqui estabelecida data de 1797 a Cavaleiro da Luz fundada na Bahia a que se seguiu a criação de várias lojas no Rio e na Bahia reprimidas em 1806 pelo conde dos Arcos Gonçalves 1994 p 506 Há hipóteses de que a Inconfidência Mineira de 178889 tenha sido um movimento ligado à maçonaria Leite 1991 p 22 Após 1808 a loja do Grande Oriente foi o veículo de difusão das idéias maçônicas tendo exercido junto com as sociedades secretas importante papel na Independência do Brasil Neves 2003 p 34 Segundo Francisco Muniz Tavares a Grande Oriente ou Governo Supremo da Sociedade sediavase na Bahia residência do maior número dos sócios que tinham sido iniciados e elevados aos altos graus na Europa O temor de comprometimento e a crassa ignorância restringia a aquisição de adeptos em todas as províncias fora a de Pernambuco que já em 1816 contava debaixo da direção de uma Grande Loja provincial quatro lojas regulares compostas de pessoas distintas por ciência e virtudes A tolerância de Caetano Pinto concorria para esse extraordinário progresso Tavares 1917 p LXXXV Em relação à maçonaria contudo é importante que o historiador evite cercar seu objeto de imaginários poderes e assumir a visão dos homens de Estado de outrora que viam no complô dos malvados pedreiros livres a origem da desinquietação dos povos e da perda da tradicional lealdade e submissão ao monarca Bernardes 2001 p 139 6 Núcleos secretos com fins emancipacionistas e anticolonialistas mas que não apresentavam os vínculos internacionais nem todas as características doutrinárias das organizações maçônicas e não permitiam acesso aos europeus É difícil precisar se tais núcleos não eram maçônicos devido ao caráter secreto dos mesmos Barreto 1985 pp 192200 7 Em 1798 fundouse o Areópago de Itambé por Arruda Câmara em 1802 a Academia de Suassuna depois com as Academias do Paraíso de Antônio Carlos de Andrada e Silva a Escola Secreta de Vicente Ferreira dos Guimarães Peixoto do Cabo e do Paraíso surgiram também as Lojas Patriotismo Pernambuco do Oriente e Pernambuco do Ocidente Barreto 1985 p 200 Machado 1917 pp XXIIIXXV Tavares 1917 p LXXXV Há interpretações que associam diretamente a Revolução de 1817 à maçonaria que certamente estava por trás de um movimento ocorrido no mesmo ano no Porto liderado por Gomes Freire de Andrade grãomestre maçônico 8 No Vocabulário Portuguez Latino Áulico Anatômico Architetonico de Raphael Bluteau publicado em 1716 há um verbete para Brasil Grande Região da América Meridional descoberta por Pedro Álvares Cabral Tem o Brasil o princypio de sua parte marítima da foz do Rio do Maranhão em cuja fronte que fica ao Norte tem sua mayor latitude em dous graus da Equinocial dahi se vai estreitando e dilatando com differentes giros em forma quasi triangullar por mais de mil légoas das costa até rematar quase em ponta no Cabo de S Maria boca do Rio da Prata em 45o ao meyo dia Divide se o Brasil em 14 Capitanias ou Províncias a saber Tamaraca que he a mais antiga de todas Bahia donde reside o Governador Pernambuco Para Maranhão Ciara Rio Grande Paraíba Seregipe os Ilheos Porto Seguro Espírito Santo Rio de Janeiro S Vicente No tempo da dominação de Castella reconquistarão os Portuguezes com muita gloria com grande beneficio de sua Pátria este Estado Bluteau 1716 p 186 Se nesse verbete chamam atenção as imprecisões relativas à administração e à geografia do Brasil fica visível ao mesmo tempo que nenhuma referência há a aspectos que ultrapassem a percepção de grandeza da terra Significativamente no mesmo dicionário não há verbete para o termo brasileiro A historiografia nas últimas décadas vem enfatizando o caráter impreciso quase etéreo da idéia de Brasil existente no período colonial A idéia de Brasil nunca foi única segundo Stuart Schwartz significou coisas diferentes para pessoas diferentes devendo o termo ser reinterpretado para refletir as diferenças e discrepâncias entre pessoas de extrações e posições sociais distintas como idéia o Brasil foi freqüentemente mais um projeto do que uma realidade às vezes geográfica às vezes nacional ou até social constituíramse vários projetos de Brasil projetos em disputa e distintos sobre o que o Brasil deveria ser ou representar Schwartz 2000 p 105 A idéia de Brasil colonial com a qual geralmente temos lidado originase de um setor específico da população de onde saíram os escritos que utilizamos um pequeno contingente da elite alfabetizada quase sempre homens a grande maioria deles educados em Portugal onde inclusive publicam seus trabalhos escritos que ademais foram produzidos sob a vigilância da Igreja e do Estado publicados na metrópole e para um público metropolitano obviamente passando por um filtro e portanto não podendo ser considerados representativos do desenvolvimento de uma consciência de sua própria classe e muito menos da massa dos habitantes iletrados da colônia especialmente aqueles de REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 87 origem africana indígena e mestiça Schwartz 2000 p 106 Laura de Mello e Souza ao analisar um parecer de Antonio Rodrigues da Costa letrado poliglota diplomata historiador conselheiro do Conselho Ultramarino de 1709 a 1732 quando morreu no exercício do cargo como seu presidente conclui que a unidade do Brasil foi percebida inicialmente de fora Para o conselheiro Rodrigues da Costa mais precisamente a unidade era dada pelas revoltas e considerava que se devia castigar os rebeldes da guerra dos emboabas para apagar este incêndio que poderá abrasar não só aquele largo distrito das minas e perderse o inestimável tesouro delas mas perder as capitanias do Rio de Janeiro e pôr em perigo todo o Estado do Brasil apud Souza 2001 pp 123 De meados do século XVIII aos inícios do XIX o Brasil aos olhos dos estrangeiros que o estudavam eou visitavam era de um continente designação genérica de uma realidade na qual não viam unidade e no caso de alguns sublinhavam a diversidade Ver por exemplo Raynal 1820 tomo 5 p 4 9 Segundo Ilmar Rohloff de Mattos 1999 p 18 o processo de emancipação política foi lento não linear envolvendo como condições subjetivas a distinção entre mazombos e reinóis e a constatação do antagonismo entre os interesses dos habitantes da Colônia e da Metrópole 10 Segundo Sérgio Buarque de Holanda na América Portuguesa a existência de forças centrífugas remonta às origens da colonização não tendo sido superadas com a transferência da Corte A corte lisboeta desenvolvera antes disso esforços centralizadores que apenas parcialmente foram bem sucedidos O estabelecimento do governo geral da Bahia foi embargado por um dos donatários e os governadores das capitanias ao longo do período colonial resistiram ao menos passivamente aos governadoresgerais e aos vicereis Os governadores das capitanias estabeleciam comunicações diretas com a metrópole não obstante a presença dos governos gerais Podese supor mesmo que houve um caráter proposital nessa situação o fortalecimento das administrações locais prevenia a possibilidade de tendências secessionistas que poderiam advir de uma centralização política na Bahia ou no Rio de Janeiro O título de vicerei assim possuía um caráter meramente honorífico Isso não se alterou radicalmente com a vinda da Corte nem mesmo com a elevação do Brasil à condição de Reino pois a unidade então constituída era uma espécie de federação base pouco sólida Holanda 1985 pp 9 e 157 Caio Prado Jr também analisa a descentralização administrativa que marcou o período colonial Para ele a distância de Lisboa dava grandes poderes aos governadores das capitanias aos olhos da administração metropolitana inexistiria uma idéia de unidade da colônia Prado Jr 1976 pp 3034 A unidade existia na geografia e no consenso de todos aparecia nos títulos honoríficos de vicerei do Brasil e no de príncipe do Brasil e também no chamado Estado do Brasil o qual porém reunia nominalmente apenas as capitanias meridionais em oposição ao Estado do Pará e Maranhão que juntava nominalmente estas capitanias e mais as subalternas do Piauí e São José do Rio Negro Prado Jr 1976 p 304 11 Francesco Rossolillo rejeita a concepção usual de nação como um grupo de pessoas unidas por laços naturais e eternos ou pelo menos existentes ab immemorabili e que por causa desses laços se torna a base necessária para a organização do poder sob a forma do Estado nacional Rossolillo entende que é muito difícil definir a natureza desses laços raça Pessoa coletiva composta por grupos possuidores de características comuns como língua costumes religião etc ou mesmo definida em função de uma vontade de viver juntos Na realidade há nações que são plurilingües como a Suíça lá se falam francês alemão e italiano que o monolingüismo de determinadas nações como a França ou a Itália não é algo original mas fruto da imposição do poder político os costumes de regiões próximas habitadas por nações diferentes são muitas vezes mais similares do que os de regiões distantes entre si habitadas por uma mesma nação Por essas razões Rossolillo e outros cientistas políticos defendem a idéia de que a nação é uma construção ideológica imaginária de uma certa unidade feita pelas classes dominantes e pelos Estados que lhes servem a Nação não passa de uma entidade ideológica isto é do reflexo na mente dos indivíduos de uma situação de poder surgida com a Revolução Francesa a Nação é a ideologia de um determinado tipo de Estado a que se dirige concretamente o sentimento de fidelidade que a idéia de nação suscita e mantém Unidade imaginária resultante da ação do Estado seus fundamentos variam conforme a história dos Estados e os interesses desses diferentes conforme o momento quando os franceses disputavam a região da Alsácia com os alemães região em que se falava o alemão e onde os costumes eram similares aos desse povo diziam que a nação era o grupo dos que querem viver juntos enquanto os alemães afirmavam que o fundamento da nação era a comunhão da língua e de costumes Rossolillo 1997 pp 7959 12 Sobre as Inconfidências de Minas e da Bahia ver Furtado 2002 Maxwell Silva 1986 Maxwell 1985 Maxwell 1989 Mota 1979 Jancsó 1997 pp 387437 Jancsó 2001 pp 36187 Jancsó 1996 Reis 1985 Tavares 1975 e Tavares 1959 13 Segundo tais teorias de poder embora fosse oriundo de Deus não transitava diretamente para o rei passando ao contrário pela mediação da comunidade cujo bemestar deveria ser objeto de cuidado do soberano Caso o governante se tornasse um tirano pela comunidade teria legitimidade para insurgirse ainda que em relação a isso alguns teóricos fossem bastante cautelosos descrevendo os modos apropriados de fazêlo Na Ibéria tais concepções predominaram até meados do século XVII impregnando a doutrinação política até o século XVIII constituindose como as premissas do pensamento político lusobrasileiro e hispanoamericano Skinner 1996 pp 417 e 4504 Morse 1995 pp 2829 64 72 e 923 Torgal 1981 vol 1 pp 110 e 245 Xavier 1998 Macedo 1981 pp 767 14 Com relação à Inconfidência Mineira a influência mais perceptível de Antônio Vieira foi o sermão feito na Bahia aos 2 de julho de 1640 em homenagem ao marquês de Montalvão D Jorge de Mascarenhas primeiro vicerei do Brasil Sobre esse Sermão ver Vieira 1938 pp 1568 Dos livros de história de Portugal são influências presumidas História de Portugal Restaurado de D Luís de Menezes conde da Ericeira Histoire des Révolutions de Portugal do Abbé Vertot Histoire Générale de Portugal de Nicolas de La Clède e História Genealógica da Casa Real Portuguesa de D Antônio Caetano de Souza 15 Os textos místicos encontrados pela devassa na Bahia são Aviso de Petesburgo Fevereiro de 1796 e Les Ruines ou Méditation sur les Révolutions des Empires de Volnay este último extraído do capítulo XXII intitulado Origem da Idéia de Deus Mattoso 1969 pp 1224 e 139 16 Obra publicada inicialmente em 1770 analisa a colonização européia nas duas Índias e narra a Independência das Treze Colônias Inglesas da América do Norte contém uma parte o tomo 5 inteiramente dedicada à América Portuguesa Esse tomo e a narrativa sobre a Independência dos Estados Unidos foram editados em português recentemente GuillaumeThomas François Raynal A Revolução da América trad de Regina Clara Simões Lopes Rio de Janeiro Arquivo Nacional 1993 e idem O Estabelecimento dos Portugueses no Brasil trad Mônica F Campos de Almeida e Flávia Roncari Gomes Rio de JaneiroBrasília Editora UnBArquivo Nacional 1998 17 Texto de grande êxito internacional encontrado praticamente entre todos os participantes do movimento baiano contém idéias frontalmente contrárias ao absolutismo de Luís XVI e aos abusos e privilégios de sua Corte Sobre o mesmo ver Neves 1989 pp 1215 Mattoso 1969 e Mattoso 1990 pp 34156 18 Texto elaborado pelo conde de mesmo nome tinha por objetivo desarticular a coligação formada contra a França apresentando para tanto a Rússia e a Inglaterra como as duas grandes inimigas dos países europeus secundadas pela Áustria e conclamando esses últimos a se unirem com a França cujo governo por ser plenipotenciário e nomeado pela totalidade do povo francês para fazer a paz poderia por isso mesmo assegurála de forma muito mais sólida Discurso de Boissy DAnglas in Mattoso 1969 pp 1224 e 129 19 Disso é exemplo o conde da Ericeira em sua obra História do Portugal Restaurado Referindose a um pronunciamento de elrei Dom João IV Ericeira relata que o soberano restaurador dissera que as normas de sucessão que excluíam os estrangeiros da ascensão ao trono português estabelecidas pelas Cortes de Lamego realizadas lendariamente em 1145 mostravam que se instituíam Príncipes para a República e não República para os Príncipes porque a sucessão dos Reis só devia atender à sua conservação e liberdade Ericeira 1945 vol 1 p 37 Na República portuguesa portanto não concebida como forma de governo republicana o príncipe tinha poderes limitados pelo interesse comum da conservação e liberdade dessa mesma república não podendo fazer tudo o que quisesse como defendia Maquiavel REVISTA USP São Paulo n58 p 5891 junhoagosto 2003 88 20 O cônego Vieira ao que tudo indica referese à invasão ocorrida em 1711 No dia 12 de setembro desse ano uma esquadra francesa comandada por DuguayTrouin entrou na baía de Guanabara tendo os regimentos as milícias e os moradores no dia 21 do mesmo mês abandonado a cidade do Rio de Janeiro incentivados pelo governador Castro Morais Os invasores encontraram a cidade deserta e a saquearam sem contudo achar ouro e então ameaçaram destruíla O governador para impedir que isso acontecesse negociou um resgate no valor de 610 mil cruzados em sua maior parte pagos com os quintos régios embora tenham sido feitas contribuições dos moradores mais abastados Souza Bicalho 2000 pp 526 21 Cumpre sublinhar que a expressão fazer corpo de república guarda bastante semelhança com formar república expressão usada no já citado História do Portugal Restaurado e que parece indicar forma de governo republicana Na passagem em que o conde da Ericeira narra o diálogo travado entre Antônio Pais e o duque de Bragança futuro d João IV disse Antônio Pais ao Duque que antes que passasse mais adiante se servisse o tirar de uma dúvida a qual era que se acaso os portugueses formassem República que partido havia de seguir se o de Portugal se o de Castela Respondeulhe o Duque que sempre estivera deliberado a se não apartar do comum consentimento do reino e qualquer perigo a que se arriscasse por defesa da pátria teria por muito suave Ericeira 1945 vol 1 p 110 grifo meu Sabese que no referido episódio os nobres portugueses procuraram vencer as hesitações do duque de Bragança em assumir o trono e pôrse à frente do movimento contra a Espanha usando a ameaça de reconquistar a Independência portuguesa sob a forma republicana Mello 1995 p 280 22 Evaldo Cabral de Mello considera que em Pernambuco ao contrário do que se pode imaginar a endogamia constituía uma irracionalidade em termos econômicos pois num quadro de retração e estagnação da economia açucareira que se estenderia de meados do século XVI até o último quartel do século XVIII prestavase apenas a dividir a pobreza Mello 1989 pp 2401 A endogamia seria ainda segundo o mesmo historiador no período holandês o meio pelo qual os pernambucanos exprimiram a rejeição lusobrasileira aos valores culturais dos invasores calvinistas depois a discriminação contra os reinóis de camadas subalternas preconceitos de classe e pruridos linhagísticos Mello 1989 p 240 23 Segundo Muniz Tavares a Proclamação ao Povo fora escrita pelo padre Miguel Joaquim de Almeida e Castro o qual com a mesma aborria os movimentos precipitados desejava a revolução não a provocava queria uma república mas quando fossem dispostos os elementos quando os meios de sustentar se proporcionassem à dificuldade da empresa Não se esquecia da antipatia dos Portugueses contra os Brasileiros mas refletindo a Pátria precisava de braços e que com uma violenta expulsão muito se perderia em capitais imaginando vencer a dureza com a generosidade de propósito tratou de acarinhálos Tavares 1917 pp CIXCX 24 O padre Vieira no sermão citado falava em tributos que tiravam para Portugal o que dava o Brasil e em ministrosgovernadores que de três em três anos desembarcavam na Colônia e que como nuvens chupavam a riqueza desse carreandoa para Lisboa e Madri Os ministros seriam como as nuvens sorvendo por oculto segredo da natureza grande quantidade de água indo chover depois de bem carregadas a cinqüenta léguas Os ministros que vinham ao Brasil e as partes ultramarinas ademais não faziam mais que chupar adquirir ajuntar encherse por meios ocultos mais sabidos e ao cabo de três ou quatro anos em vez de fertilizarem a nossa terra com água que era nossa iam chover a Lisboa esperdiçar a Madrid motivo pelo qual nada lhe luzia ao Brasil por mais que desse Essa água retirada do Brasil frisese não era tirada da abundância do mar mas das lágrimas do miserável Vieira 1938 pp 1567 Finalizando Vieira propunha a Restauração do Brasil desta vez se há de restaurar o Brasil em outros termos tudo o que der a Bahia para a Bahia há de ser tudo o que se tirar do Brasil com o Brasil se há de gastar Vieira 1938 p 158 Tiradentes repetia os mesmos elementos falava em governadores em período de três anos em riqueza chupada Falava ainda em restaurar Substituía apenas nuvens por esponja cujo formato aliás lembra o de uma nuvem acrescentava quadrilha e criados aos governadores e ainda pensava numa riqueza que seria natural se não houvesse a espoliação colônia juntando as críticas de Viera à administração portuguesa à censura do padre Raynal à colonização mercantilista Villalta 2000 pp 635 25 O Império nascente do Brasil teve que se defrontar com a heterogeneidade que o caracterizava José Bonifácio assim se pronunciava sobre esse desafio É da maior necessidade ir acabando tanta heterogeneidade física e civil cuidemos pois desde já em combinar sabiamente elementos discordes e contrários e em amalgamar tantos metais diversos para que saia um Todo homogêneo e compacto que se não esfarele ao pequeno toque de qualquer nova convulsão política José Bonifácio de Andrada e Silva Representação à Assembléia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil sobre a Escravatura apud Jancsó Pimenta 2000 p 173 BIBLIOGRAFIA ADIM Autos de Devassa da Inconfidência Mineira 2a ed BrasíliaBelo Horizonte Câmara dos DeputadosImprensa Oficial de Minas Gerais 1980 ALEXANDRE Valentim Os Sentidos do Império Questão Nacional e Questão Colonial na Crise do Antigo Regime Português Porto Edições Afrontamento 1993 ANDERSON Benedict Nação e Consciência Nacional São Paulo Ática 1989 BARRETO Célia de Barros Ação das Sociedades Secretas in Sérgio Buarque de Holanda org História Geral da Civilização Brasileira 7a ed São Paulo Difel 1985 Tomo 2 Vol 1 pp 191206 BERBEL Márcia Pátria e Patriotas em Pernambuco 18171822 2001 datiloscrito BERNARDES Denis Antônio de Mendonça O Patriotismo Constitucional Pernambuco 18201822 Tese de doutorado São Paulo FFLCHUSP 2001 BLUTEAU Raphael Vocabulário Portuguez Latino Áulico Anatômico Architetonico Lisboa Officina de Paschoal Silva 1716 CARVALHO Marcus J M de Cavalcantis e Cavalgados 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