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BNCC e Ensino de História horizontes possíveis BNCC and History Teaching possible horizons Adriana Soares Ralejo Rafaela Albergaria Mello Mariana de Oliveira Amorim RESUMO A Base Nacional Comum Curricular BNCC tem suscitado importantes debates sobre a constituição de um currículo escolar Neste artigo desenvolvemos uma reflexão sobre como essa proposta curricular tem mobilizado discussões sobre as possibilidades de constituição e de desenvolvimento do ensino de História Enquanto dispositivo regulador da educação que tipo de poder esse documento exerce sobre aquilo que é praticado nas escolas Para além dos constrangimentos e amarras que o currículo gera no ensino poderíamos também enxergar potencialidades para um ensino de História que dialogue com as realidades vividas por nossos alunos e alunas e compartilhadas no espaço escolar A partir dessas questões norteadoras desenvolvemos este artigo em três partes em um primeiro momento apresentamos a trajetória de publicação da BNCC e os embates em torno do ensino de História bem como os conceitos de currículo e de Ensino de História com os quais trabalhamos Em um segundo momento apresentamos como a comunidade disciplinar GOODSON 1997 tem debatido sobre os sentidos de História presentes na BNCC a partir de um levantamento de artigos científicos que têm apresentado este currículo como tema de pesquisa E em um terceiro momento apresentamos algumas chaves de leitura do documento a partir dos conceitos de competências gerais e DOI httpdxdoiorg1015900104406077056 DOSSIÊ Bases Nacionais e o Ensino de História embates desafios e possibilidades naentre a Educação Básica e a formação de professores Universidade Federal do Rio de janeiro Rio de Janeiro Rio de Janeiro Brasil Email drikaralejohotmailcom httpsorcidorg0000000317254675 Email molamorimgmail com httpsorcidorg000000153363428 Email rafaelalbergariagmailcom httpsorcid org0000000217524690 Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 1 da atitude historiadora Por fim teremos condição de responder à questão que possibilidades a BNCC pode proporcionar para um ensino significativo no ensino de História Palavraschave BNCC Ensino de História Currículo Atitude historiadora ABSTRACT The Base Nacional Comum Curricular BNCC National Common Core Curriculum has raised significant debates about the constitution of a school curriculum In this article we develop a reflection on how this curricular proposal has mobilized discussions about the possibilities of constituting and developing History teaching As a regulatory device of education what kind of power does this document have over what is practiced in schools In addition to the constraints and moorings that the curriculum generates in teaching could we also see the potential for teaching History that dialogs with the realities experienced by our students and shared in the school space Based on these guiding questions we have developed this article in three parts first we present the publication path of BNCC and the clashes surrounding the teaching of History as well as the concepts of curriculum and History teaching with which we work In a second step we present how the disciplinary community GOODSON 1997 debated the History meanings present at the BNCC based on a survey of scientific articles that presented this curriculum as a research theme And in a third moment we exhibit some keys for reading the document based on the concepts of general competencies and Historian attitude Finally we can answer the question what possibilities can the BNCC provide for meaningful teaching in History teaching Keywords BNCC History Teaching Curriculum Historian attitude BNCC e Ensino de História apontamentos iniciais A Base Nacional Comum Curricular BNCC BRASIL 2017b é um documento curricular desenvolvido pelo Ministério da Educação para toda a Educação Básica Previsto no artigo 210 da Constituição Federal de 1988 BRASIL 1988 e no artigo 26 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 BRASIL 1996 esse documento começou a ser desenvolvido a partir do Plano Nacional da Educação PNE em 2014 BRASIL 2014 sendo apresentado ao público pela primeira vez em setembro de 2015 gerando um imenso debate sobre a necessidade ou não de um currículo nacional para o país RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 2 A primeira versão da BNCC para a disciplina escolar de História apresentada em 2015 proporcionou um intenso debate na comunidade disciplinar1 GOODSON 1997 e epistêmica2 BALL 2001 da História sobre quais conhecimentos deveriam ser selecionados e publicados no currículo Essa primeira versão produziu alguns rompimentos com a chamada História tradicional e trouxe para a arena da comunidade disciplinar de História a proposta de um currículo crítico ao eurocentrismo Porém com o desdobramento dos intensos debates gerados na primeira versão da BNCC o Ministério da Educação MEC dissolveu a equipe dos doze profissionais que desenvolveram sua primeira versão para a disciplina de História convidando então uma nova comissão integrada por membros predominantemente de uma única instituição superior Essa foi apresentada ao público em maio de 2016 com uma seleção de conteúdos abrangentes dando forma a um currículo mais conteudista que o anterior e apresentando o desenvolvimento de história do Brasil a partir de um viés eurocêntrico Já a terceira versão da BNCC para a disciplina escolar de História foi apresentada em abril de 2017 e homologada em dezembro do mesmo ano contendo poucas alterações Essa versão lançou mão do conceito de competências que fazia parte dos movimentos reformistas da década de 1990 e internalizado nos Parâmetros Curriculares Nacionais PCNs para o Ensino Médio A BNCC é um documento curricular oficial e deve embasar os currículos dos diversos municípios e estados do Brasil Assim diante sua adequação em todo o Ensino Fundamental até o ano de 2020 BRASIL 2017a como pensar em possibilidades para o Ensino de História nas escolas Será que a BNCC enquanto um dispositivo regulador da Educação somente regula amarra e constrange a História que deve ser ensinada nas escolas Ou será que a BNCC também deixa em aberto espaços onde o ensino de História pode se tornar potente e tocar as realidades vividas e experimentadas nas escolas Bill Green 2017 afirma que as questões relacionadas ao conhecimento no currículo estão sempre ligadas com questões de poder O autor afirma que o currículo nacional australiano entrou em vigor em 2011 e que houve um grande questionamento sobre quais conhecimentos deveriam ser validados por um currículo nacional Assim entendemos com Green que currículo é sempre político Como prática de representação e de poder o componente curricular de História na BNCC representa a legitimação de determinados conhecimentos 1 O conceito de comunidade disciplinar remete a um grupo heterogêneo composto de subgrupos internos que vivem em antagonismo mas apesar das possibilidades agonísticas a comunidade disciplinar coexiste com o objetivo de manter a estabilidade 2 O conceito de comunidade epistêmica remete à competição por determinadas concepções de conhecimento de uma comunidade disciplinar e são associadas por Ball as tensões inerentes à constituição da própria comunidade RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 3 Essa relação entre conhecimento histórico escolar currículo e poder é trabalhada também por Gabriel e Costa 2011 ao defenderem que o currículo pressupõe processos de constituição de hegemonias que ocorrem no âmbito da produção distribuição e consumo do conhecimento histórico escolar em meio a um sistema de diferenças no qual são travadas diversas disputas pelo estabelecimento da verdade e pelo estabelecimento daquilo que deve ser ensinado nas escolas Segundo Gabriel 2019 o currículo de História tende a significar o conjunto de conteúdos que compõem a grade curricular dessa disciplina nos diferentes níveis de Ensino De acordo com a autora em geral esses conteúdos são percebidos como prescrições como naturalizações não sendo indicadas suas imbricações com as relações assimétricas de poder Há assim uma visão instrumental do currículo e do ensino de História que legitima o status quo reforçando o silenciamento ou o apagamento de narrativas de minorias culturais sociais étnicas e de gênero historicamente excluídas das práticas curriculares de História Importa também pontuarmos que entendemos o ensino de História como um lugar de fronteira MONTEIRO 2007 Nessa perspectiva ensinar História na escola remete às relações entre as concepções de currículo de conhecimento histórico escolar de produção e distribuição desse conhecimento e dos saberes docentes e discentes De acordo com Monteiro 2007 e Monteiro e Penna 2011 A proposta de pensar a pesquisa sobre o Ensino de História como um lugar de fronteira utiliza uma analogia com um elemento da geopolítica a questão das fronteiras que podem ser entendidas no sentido norte americano de frontier terra além da qual se estende um vazio uma terra de ninguém ou de border lugar de marcação de diferenças mas que também permite o encontro as trocas SANTOS 1994 apud MONTEIRO 2007 p 76 grifo da autora A fronteira é lugar onde são demarcadas diferenças mas onde também é possível produzir aproximações diálogos ou distanciamento entre culturas que entram em contato MONTEIRO PENNA 2011 p 194 Tanto o currículo quanto o ensino de História são pensados como espaços tempos fronteiriços irredutíveis a apenas um campo de saber ou seja são produzidos e funcionam na relação entre campos distintos entre saberes e entre poderes múltiplos O currículo de História pode ser pensado então como um mapa como um rizoma como uma cartografia de saberes e de poderes como RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 4 uma territorialização provisória como um terreno estriado que se constitui por linhas de saberes e poderes que são móveis e dinâmicos objetivando conteúdos e subjetivando professores e alunos Essa concepção de ensino de História nos indica que há possibilidades de criar brechas e apostar nas diferenças na diversidade sociocultural e étnica promover a inclusão discursiva de sujeitos e identidades silenciados e negados ao longo do processo de escolarização Ora não estamos fadados a uma narrativa tradicional Diante do que foi exposto questionamos como estudos e pesquisas têm analisado essa relação entre a BNCC e o Ensino de História Essa é uma pergunta que seguimos na segunda parte desse texto E que possibilidades teóricopráticas podem ser desenvolvidas e sugeridas como caminhos para ensinar e aprender História nas escolas Essas sugestões tomam forma na parte terceira deste artigo Embates em torno da significação da BNCC de História Nessa segunda parte do texto procuramos entender como pesquisadores do campo da História compreendem a BNCC Realizamos então uma busca pela palavrachave BNCC sigla e nome por extenso no Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CAPES e selecionamos os artigos que se referiam à disciplina de História3 A partir da leitura desses artigos identificamos algumas questões que permeiam esses textos Desse modo apresentaremos um breve resumo dessas trazendo as suas principais contribuições para o campo e posteriormente iremos realizar um diálogo comentre eles produzindo uma análise sobre quais sentidos de ensino de História estão sendo expressos nesses textos o que destacam como positivo e como negativo E como tem sido o posicionamento desses pesquisadores quanto ao uso produtivo desse documento normativo O artigo desenvolvido por Igor Salomão Teixeira e Nilton Mullet Pereira 2016 aborda a temática da Idade Média na primeira e segunda versão do documento da BNCC analisando também a comunidade de medievalistas no 3 A busca no Portal de Periódicos da CAPES ocorreu no dia 7 de julho de 2020 e foram encontrados 16 artigos referentes à BNCC de História Desses 16 artigos selecionamos cinco que mencionaram nas palavraschave o termo BNCC Acrescentamos para essa análise o artigo de Silva Santos e Fernandes 2019 por ser um artigo publicado numa revista de Educação se diferenciando dos demais e pela pertinência em trabalhar na metodologia com professores de História RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 5 Brasil Os autores consideram que a primeira versão trouxe questões importantes com o rompimento da linearidade e do eurocentrismo nos conteúdos trazendo luzes necessárias a abordagens antes muito marginais no ensino de História TEIXEIRA PEREIRA 2016 p 17 porém foram retirados conteúdos relacionados aos períodos da Antiguidade e da Idade Média Os autores destacam que a Associação Brasileira de Estudos Medievais ABREM defendeu a volta do estudo da Europa medieval mas sem ter uma posição conservadora em relação ao Ensino de História Como Teixeira e Pereira 2016 afirmam que o não privilégio dado à história europeia é justamente o ponto alto da versão preliminar do texto da BNCC pois tal posição reflete um longo período de disputas no campo do ensino de História que se estendeu desde os anos 80 CABRINI 1994 e que contempla uma forte crítica ao que se chamou de eurocentrismo TEIXEIRA PEREIRA 2016 p 21 Assim os autores consideram que o caminho tomado pelo grupo da primeira versão foi um caminho importante para a construção do pensamento histórico mas que ao retirarem o conteúdo da Idade Média eliminaram a possibilidade de pensar o passado com o estranhamento que um conhecimento gera Os autores consideram que a segunda versão voltou ao conteúdo de privilégio europeu com o caráter estereotipado em relação à Idade Média com preconceitos e desatualização historiográfica TEIXEIRA PEREIRA 2016 Assim Teixeira e Pereira 2016 afirmam algumas possibilidades de entrada da Idade Média no currículo de História para a construção de um ensino para a alteridade como a questão do Islamismo nos diferentes acontecimentos contemporâneos em relação ao Oriente Médio a questão de gênero no extremo oriente e as residualidades do mundo ibérico como canções e festas a Folia de Reis e o Natal Os autores defendem que o ensino da Idade Média permite pensar historicamente para estudar o diferente Já o artigo produzido por Dennison de Oliveira 2017 apresentou conteúdos relacionados às diferentes temáticas dos centenários de 1917 a Primeira Guerra Mundial a Revolução Russa a declaração de guerra do Brasil à Alemanha e a Greve Geral Para o autor há uma continuidade no componente da disciplina de História para o Ensino Fundamental na BNCC em relação ao componente de História nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio PCNEM só se notando diferenças de forma e não de conteúdo OLIVEIRA 2017 p 100 RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 6 Oliveira 2017 elogia as nove competências para a disciplina de História no Ensino Fundamental presentes no documento que já tinham sido postas para o Ensino Médio desde o ano de 2000 mas questiona sobre o grau de comprometimento do poder público para a efetivação dessa proposta O que percebemos é que aparentemente essas competências foram ignoradas pelo poder público no Ensino Médio e que o autor não possui esperanças com a presença destas no Ensino Fundamental O artigo de Marcos Silva 2018 afirma que a primeira versão da BNCC foi mal interpretada pela comunidade acadêmica que ao enfatizar a história do Brasil no ensino de História não ignorou o mundo e que o texto documental foi ético ao trazer as matrizes africanas a partir dos dados que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE apresenta sobre a população brasileira O autor afirma que a organização do quadripartismo significa a dominação política secular do continente europeu Posteriormente o autor analisa a versão oficial da BNCC e ressalta que não há marcas de pluralidade no documento assim como torna abstrata a categoria do conhecimento histórico negligenciando critérios de preservação de memória Em relação às Leis 106392003 BRASIL 2003 e nº 116452008 BRASIL 2008 Silva 2018 p 1010 afirma que há a presença de alteridade cultural mas sem quase mencionar dominações e explorações O autor afirma que apesar de trazer novos protagonismos o documento é conservador Já Nilton Mullet Pereira e Mara Rodrigues 2018 apresentam as diferenças entre os três documentos da BNCC de História Os autores a partir das questões teóricas e temáticas sobre identidade e temporalidade realizaram uma análise de como esses documentos abordaram essas temáticas Para os autores as disputas na produção curricular da BNCC foram sobretudo no campo da legitimidade do legado e de outra formação histórica para a constituição identitária brasileira isto é a ênfase justamente nas continuidades supostamente estabelecidas entre o passado europeu africano ou indígena e o laço social na atualidade PEREIRA RODRIGUES 2018 Desse modo os autores consideram que a primeira versão produziu uma inversão centro geográfica com menos destaque à Europa e mais à América Latina e ao continente africano Os autores consideraram que a segunda versão apresenta o passado histórico como continuidade e repetição sem problematização e que a terceira versão trabalha pouco a questão das identidades Para os autores há um esvaziamento da aula de História da falta do potencial crítico sem estimulação da empatia com minorias Os autores consideram que há uma concepção asséptica universal e despolitizada na versão efetivada pelo governo Os autores concluem sobre a necessidade de uma História militante por novas identidades e temporalidades sendo necessário romper com séculos de pensamentos colonizados RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 7 Francisco José Balduino da Silva Jean Santos e Márcia Fernandes 2019 trazem uma discussão sobre a BNCC e a tentativa de normatização do currículo de História para o Ensino Médio Numa análise a partir do referencial teórico de Stephen Ball os autores apresentaram discursos em defesa da BNCC a partir do governo de institutos e de fundações Posteriormente os autores apresentam dados levantados por um questionário respondido por professores de História do Ensino Médio no qual afirmaram que não se sentiam contemplados com a BNCC assim como consideravam que a BNCC não privilegia uma perspectiva reflexiva para os estudantes Dessa forma os autores consideram que o discurso da BNCC está longe da realidade dos docentes Já o texto de Douglas Lima 2019 analisa como o período da Idade Média foi inserido ao longo das versões da BNCC e conclui refletindo sobre as possibilidades de pensar a História Medieval no ensino de História Sobre a inserção da Idade Média na BNCC diz o autor Buscando uma comparação entre as versões da Base observase que os conteúdos de Idade Média conheceram uma variação marcante Inicialmente inserida de forma lacunar em poucos itens a História Medieval passou a ocupar espaço de destaque nos conhecimentos históricos esperados para o 6º ano demarcandose por uma abordagem conservadora e conteudista ao passo que na terceira e última versão passase a eixos amplos que estruturam o 6º ano do Ensino Fundamental em torno da Antiguidade Clássica e de uma Idade Média mediterrânea pensada por uma abordagem sociocultural LIMA 2019 p 12 A partir das leituras dos artigos apresentados acima percebemos algumas questões suscitadas por autores do campo do Ensino de História Esses autores expressaram suas análises críticas à versão oficial do documento e como trouxeram à tona a questão do embate na comunidade disciplinar GOODSON 2018 de História na construção da Base Percebemos que esses textos expressam diferentes formas de análise da BNCC e que defenderam suas posições na comunidade disciplinar de História discordando e adjetivando de diferentes maneiras o documento oficial Assim tendo em vista os variados discursos críticos sobre a BNCC consideramos com base em Goodson 2018 que os diferentes autores comungam sobre a importância e a promoção da disciplina escolar de História Goodson 2018 considera RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 8 Uma comunidade disciplinar também pode ser um grupo heterogêneo composto de subgrupos internos que vivem em antagonismo mas apesar das possibilidades agonísticas a comunidade disciplinar coexiste com o objetivo de manter a estabilidade e promover o ensino da disciplina GOODSON 2018 p 20 Compreendemos com a leitura desses textos que o processo de ensino e aprendizagem deem História é amplo e remete a várias discussões assim como a produção de saberes históricos tenciona a comunidade disciplinar e epistemológica sobre quais saberes devem ser legitimados no documento oficial Há uma luta pela legitimação de seu território disciplinar e essa é uma luta política Como Goodson 2018 afirma as matérias escolares estão constituídas por grupos de elementos de identidade valores e interesses diferentes Verificamos assim que as prescrições curriculares presentes do componente de História para o Ensino Fundamental apresentados na versão homologada da BNCC como unidades temáticas objetos de conhecimento e habilidades pouco se diferenciam dos conteúdos curriculares presentes nos livros didáticos até então configurando movimentos de permanência na política curricular Porém podemos projetar também mudanças apresentadas no documento Não no sentido de apresentar propostas revolucionárias e inéditas no campo do ensino de História mas ao assumir posicionamentos que valorizem a especificidade do componente em questão por meio da definição de competências específicas em diálogo com as competências gerais e do conceito de atitude historiadora dos quais desenvolveremos na próxima etapa do texto Competências gerais e atitude historiadora Não buscamos neste artigo estabelecer algum tipo de juízo de valor que avalie a BNCC como algo bom ou ruim certo ou errado Nosso olhar a partir das análises das leituras dos artigos levantados foi buscar compreender como pesquisadores e professores se posicionam frente a um documento curricular de tão grande impacto sobre a educação A partir do momento em que este documento ganha um caráter prescritivo o quanto podemos estabelecer um olhar crítico e produtivo Quando apontamos que a BNCC pode ganhar um caráter produtivo nos referimos que um currículo que é produzido por uma comunidade epistêmica também produz sentidos Assim baseados em Ball 2001 compreendemos RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 9 que um ciclo de políticas explicita a existência de uma natureza complexa das políticas curriculares composta por processos micropolíticos e por ações de profissionais de diferentes níveis MAINARDES 2006 Entre o público e o privado Ball aponta que as políticas educacionais mobilizam e são mobilizadas em diferentes contextos influência produção e prática É esse último contexto que gostaríamos de ressaltar e estabelecer relações quanto aos usos da BNCC quem estabelece os sentidos a serem ensinados Destacamos dentre os diversos sujeitos envolvidos no processo de ensino aprendizagem o papel dos professores É nas mãos deles que o documento também irá ser interpretado e materializado no formato de aulas Assim reconhecemos que esses sujeitos possuem uma relação de poder nesse processo como aqueles que produzem sentidos sobre os conteúdos a serem ensinados e não somente como reprodutores de prescrições anteriores Tendo reconhecido essas relações de poder envolvidas no processo educacional analisaremos nessa última parte potencialidades que a BNCC pode proporcionar para as práticas docentes Nosso olhar se volta para os sentidos de ensino de História expressos no documento e sobre a forma que esses se relacionam com as perspectivas teóricas de uma história crítica defendida por autores desse campo de estudo Qual o objetivo ao se proporcionar o ensino de História na Educação Básica Este questionamento apesar de propiciar diversas respostas possíveis se faz como uma questão necessária tanto para nossos alunos por que eu preciso aprender isso quanto para nós professores por que estou ensinando isso Se nós lutamos por um ensino que seja significativo e de qualidade para nossos alunos o questionamento do porquê também vem acompanhado de o que e como Aqui estamos problematizando nossos processos de escolhas que por muitas vezes podem ser naturalizados Um professor ao planejar sua prática normalmente recorre a meios como o livro didático o planejamento escolar e suas experiências como docente e discente para compor aquilo que constituirá sua aula Mas todos esses recursos impostos ou não são produzidos respeitando normativas políticas e curriculares Durante a formação docente normalmente nos deparamos com esses tipos de documentos e tomamos consciência da complexidade do processo envolvido que mobiliza a Constituição Federal de 1988 BRASIL 1988 a Lei de Diretrizes e Bases da educação Básica Lei 9394 de 1996 os Parâmetros Curriculares Nacionais as Diretrizes Curriculares Nacionais DCN o Estatuto da Criança e do Adolescente e os currículos estaduais e municipais A produção da BNCC iniciada em 2015 e concluída em 2017 Educação Infantil e Ensino Fundamental e 2018 Ensino Médio traz à tona novamente a importância da participação da comunidade epistêmica BALL 2001 Como foi RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 10 exposto na primeira parte deste artigo o processo de produção desse documento gerou debates no campo da História colocando em questão a tradição curricular Goodson 2012 diz que não é possível negar essa tradição mas precisamos buscar caminhos de revitalizar reconstruir e ampliar para tornar o currículo diversamente acessível e agradável tornando o ambiente escolar um lugar rico e propício de significados São esses novos caminhos para o ensino de História que buscamos visualizar em meio às disputas de poder e representatividade que a BNCC envolve Não cabe neste artigo abrir uma discussão sobre a validade ou não do que ficou estabelecido em sua versão final e sobre o que ficou no lugar do silenciamento e do esquecimento Tampouco se trata de um posicionamento a favor ou contra o documento Compreendemos que em um movimento de idas e vindas disputas de diferentes níveis e instâncias de poder aquilo que consideramos como currículo nunca é algo 100 unilateral Há ali marcas e rastros de diferentes discursos que dialogam negociam e até mesmo se contrapõem A BNCC é um produto desses discursos que ora de maneira mais explícita ora de forma mais tímida é um resultado que traz consigo vitórias de lutas por representatividade e diversidade expressos pelas leis nº 106392003 BRASIL 2003 e nº 116452008 BRASIL 2008 e pelas DCN mas também onde há marcas da tradicionalidade escolar com uma grande lista de habilidades a serem desenvolvidas Queremos utilizar esse espaço para provocar um outro olhar quais potencialidades e mudanças a BNCC pode gerar em nossas práticas docentes Um primeiro aspecto do documento que nos chama a atenção é a definição de dez competências4 gerais sob o argumento de que é preciso garantir os direitos de aprendizagem e desenvolvimento a todos os estudantes do país BRASIL 2017b São elas conhecimento pensamento científico crítico e criativo repertório cultural comunicação cultura digital trabalho e projeto de vida argumentação autoconhecimento e autocuidado empatia e cooperação responsabilidade e cidadania Mesmo compreendendo que os objetivos com a educação brasileira extrapolam essa numeração de dez itens observamos uma mensagem que vale a pena ser destacada a escola não é um lugar que trata somente de conteúdos e conhecimentos As outras nove competências apontam que dentro desse espaço 4 O conceito de competência não é algo novo Este passou a ser amplamente discutido no campo educacional ao ser relacionado nos estudos de Perrenoud 1999 a uma noção de capacitação e aquisição de ferramentas para solução de problemas cotidianos Porém na BNCC esse conceito é definido como mobilização de conhecimentos conceitos e procedimentos habilidades práticas cognitivas e socioemocionais atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho BRASIL 2017b p 8 RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 11 em todos os níveis de ensino e em todos os componentes curriculares não só podem como devem ser trabalhados aspectos que promovam uma formação e desenvolvimento de autonomia dentro de um contexto de diversidade e diferença5 O conhecimento continua a ter importância na constituição da educação mas não se reduz a ele Novamente reforçamos que esse tipo de pensamento sobre a educação não se trata de uma inovação do documento mas resultado de debates e lutas por um ensino de qualidade crítico e significativo tal como defendido por Paulo Freire Relacionando esse aspecto ao ensino de História essa mensagem das dez competências gerais nos ajuda a combater a ideia de uma História tradicionalmente relacionada aos eventos datas e nomes que carregam consigo uma única versão que vinha se caracterizando pelo seu teor eurocêntrico e patriarcal Ao explorar em nossas práticas docentes por exemplo a competência de número 2 pensamento científico crítico e criativo somos levados a considerar os diferentes conhecimentos formular hipóteses analisar outras versões e interpretálas de forma crítica o que é reforçado pela competência de número 7 argumentação que possibilita a formulação negociação e defesa de diferentes ideias As chamadas competências socioemocionais também são destacadas no documento principalmente referentes aos itens 8 autoconhecimento e autocuidado 9 empatia e cooperação e 10 responsabilidade e cidadania que trazem consigo as ideias do cuidado e conhecimento de si do outro e do coletivo Esses fatores impulsionam o trabalho com perspectivas do ensino de História que valorizam a exploração de diferentes narrativas e a diversidade cultural permitindo a percepção do sujeito em seu tempo e espaço e proporcionando ações para com a sociedade em que vive Compreendemos que esses apontamentos mais gerais não fazem jus a todos movimentos sociais que apresentam longa trajetória nas lutas por representatividade ao não trazer especificamente questões que devem ser pautas de defesa de toda a escola como questões étnicoraciais e de gênero E também alertamos que essas defesas por diversidade e multiculturalismo já se faziam presentes em documentos anteriores talvez até mais explicitamente Assim ao propor a pensar nas potencialidades da BNCC que podemos nos apropriar e trazer reflexões para nossas práticas entendemos também que o documento não fecha essas portas 5 Lembramos que essa perspectiva sobre os objetivos da educação não emerge com a BNCC sendo explorada em outros documentos curriculares como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 12 Em um levantamento geral por palavras presentes na BNCC identificamos por exemplo que os significantes negro africano e correlatos estão presentes 65 vezes a maioria deles 25 no componente de História mas que também estão presentes em Língua Portuguesa Educação Física Arte Ciências Geografia e Religião Já o significante indígena e correlatos são citados 77 vezes também com maioria no componente de História Por outro lado o significante gênero e correlatos estão presentes 269 vezes mas todos fazem referência ao campo textual da Língua Portuguesa Assim numa busca mais precisa utilizamos o significante mulher que apareceu 4 vezes 3 delas em História e homossexuais apareceu somente uma vez Podemos concluir brevemente pois não é intuito neste artigo realizar uma análise detalhada sobre essa questão que há alguns avanços e reconhecimentos dessas lutas na BNCC mas há ainda muito a avançar principalmente na questão de gênero Em relação à proposta específica para o componente de História o documento explora o conceito de atitude historiadora definindo como um papel de ação que docentes e discentes podem desempenhar no processo de ensino e aprendizagem por meio da utilização de diferentes fontes Nessa dimensão o objeto histórico transformase em exercício em laboratório da memória voltado para a produção de um saber próprio da história BRASIL 2017b p 396 Considerando o conhecimento história como um saber necessário que se origina no tempo presente e com ele dialoga o documento aponta para a necessidade de compreender o processo histórico como uma produção narrativa A relação passadopresente não se processa de forma automática pois exige o conhecimento de referências teóricas capazes de trazer inteligibilidade aos objetos históricos selecionados Um objeto só se torna documento quando apropriado por um narrador que a ele confere sentido tornandoo capaz de expressar a dinâmica da vida das sociedades Portanto o que nos interessa no conhecimento histórico é perceber a forma como os indivíduos construíram com diferentes linguagens suas narrações sobre o mundo em que viveram e vivem suas instituições e organizações sociais Nesse sentido O historiador não faz o documento falar é o historiador quem fala e a explicitação de seus critérios e procedimentos é fundamental para definir o alcance de sua fala Toda operação com documentos portanto é de natureza retórica BRASIL 2017b p 395 grifo nosso RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 13 Assim percebemos no trecho destacado a valorização da leitura das fontes históricas que se manifestam por meio de diferentes linguagens Em nenhum momento no texto introdutório do componente de História são destacadas linhas de abordagem específicas da historiografia O que se traz à tona para o professor e os outros sujeitos que irão utilizar esse documento em suas práticas é a problematização sobre o conhecimento histórico Dessa forma é a atitude historiadora que é destacada como prática para aqueles que estão envolvidos no ensino de História Ana Maria Mauad 2018 em artigo que aborda sobre os usos do passado também explora esse conceito da atitude historiadora definindo como Noção que nos desafia a nos colocarmos diante do tempo num movimento em que o tempo passado se calibra em relação ao presente tanto pela continuidade das práticas compartilhadas entre os grupos sociais quanto pelas lentes da distância diferença e descontinuidade que nos fazem olhar o passado com olhos de madeira Atitude que nos insere no fluxo temporal como agentes comprometidos com uma história que se faz a cada dia por cada um tecendo um amanhã coletivo MAUAD 2018 p 29 É esse olhar atento para as fontes históricas que o documento destaca E se trata mais do que um olhar metodológico sobre as fontes é um olhar de mundo proporcionado pelo componente de História Como práticas educativas a atitude historiadora deve obedecer a processos de a identificação b comparação c contextualização d interpretação e e análise BRASIL 2017b O processo de a identificação consiste na descrição do objeto estudado proporcionar diferentes formas de percepção e interação relacionadas ao seu tempo espaço e relações sociais b a comparação proporciona um olhar para o outro e leitura das semelhanças e diferenças em diferentes linguagens c a contextualização instiga o aluno a localizar momentos e lugares específicos do objeto estudado para atribuir sentidos condizentes com sua época e sociedade d a interpretação estimula a formação do pensamento crítico indo além das informações que o objeto em si proporciona relacionando valores sobre a importância do objeto histórico e por fim e a análise aparece como a etapa final desse processo e proporciona a autonomia e protagonismo do aluno ao problematizar e ir além do conhecimento apresentado É no exercício da atitude historiadora que são fomentadas práticas de fala leitura e escrita não somente de conhecimentos específicos do campo da historiografia mas também de práticas de letramento que formam e significam RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 14 o mundo da vida AZEVEDO MONTEIRO 2013 Assim acreditamos na potencialidade do sentido que a atitude historiadora proporciona Não se trata de formar historiadores mas de dotar diferentes sujeitos de autonomia para a tomada da palavra e de posição em sua vida social a partir de possibilidades de usos do passado Em diferentes instâncias da vida social é possível assumir uma atitude historiadora De que se trata tal atitude De indagar o passado como uma das dimensões do terreno poroso do presente onde residem as tradições os comportamentos residuais mas de onde quando problematizado emerge um conhecimento crítico que nos impele à ação MAUAD 2018 p 40 Proporcionar o exercício da atitude historiadora é combater a história única porque passamos a compreender que a ação do historiador é uma construção discursiva baseada na interpretação de uma realidade Essa prática do conhecimento como uma produção também se estende para o cenário da sala de aula que deve pautarse na reconstrução dos processos que levam à produção do conhecimento escolar permitindo ao estudante aprender a leitura da história que poderá ser aplicada em diversas situações da sua vida cotidiana SILVA MORAIS 2017 Assim os conhecimentos do componente de História poderão ser melhor sistematizados fundamentados e analisados ao trabalharmos a partir da atitude historiadora contribuindo com possibilidades de construção de leituras de mundo Considerações finais Estabelecendo uma linha de raciocínio entre aquilo que foi exposto na segunda parte deste artigo que buscou compreender os sentidos em disputa pelo ensino de História ao longo da constituição da BNCC e aquilo que podemos observar do que ficou estabelecido na sua versão final identificamos como o currículo se constitui como um campo de disputas com idas e vindas pela definição sobre o que ensinar A BNCC não é um documento inovador ou pioneiro Tratase de um movimento de continuidades iniciado na Constituição de 1988 perpassando a LDB os PCNs e as DCN nas lutas pela definição sobre Educação e neste caso específico sobre o ensino de História Como o próprio documento da RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 15 BNCC aponta é resultado de prescrições curriculares anteriores a ele As leis nº 106392003 BRASIL 2003 e nº 116452008 BRASIL 2008 são exemplos de como movimentos anteriores foram inseridos na produção do novo documento Há avanços na BNCC em relação aos objetivos da Educação Sim mas não podemos considerálo um documento revolucionário ou inovador Há muitas permanências também Junto com a perspectiva do outro da diferença e da alteridade muitas marcas do eurocentrismo são encontradas na proposta para o componente de História de acordo com os artigos que aqui analisamos Consideramos que a atitude historiadora é um importante conceito no qual a BNCC se ampara proporcionando muitas oportunidades para o desenvolvimento do conhecimento histórico escolar A atitude historiadora traz à tona a importância do olhar sobre as diferentes fontes e os documentos É a partir das fontes que se faz História e assim podemos visualizar possibilidades de combater o negacionismo histórico tema que tem emergido com força mediante discursos de ordem autoritária e conservadora Pretendemos neste artigo refletir sobre os sentidos produzidos na comunidade de história a partir da BNCC e explorar como professores de História poderão e podem se apropriar desse documento curricular Consideramos que ainda há muitas questões em aberto nas quais os profissionais do campo poderão se debruçar para incrementar e amplificar as discussões relativas à relação entre o ensino de História e a BNCC RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 16 REFERÊNCIAS AZEVEDO Patrícia Bastos de MONTEIRO Ana Maria Ferreira da Costa A sala de aula e a produção de sentido em práticas de letramento na história ensinada Práxis Educativa Ponta Grossa v 8 n 2 p 559580 juldez 2013 BALL Stephen J Diretrizes políticas globais e relações políticas locais em educação Currículo sem Fronteiras s l v 1 n 2 p 99116 2001 BRASIL Constituição 1988 Constituição da República Federativa do Brasil Brasília DF Presidência da República 2016 Disponível em httpwwwplanaltogov brccivil03constituicaoconstituicaocompiladohtm Acesso em 30 set 2020 BRASIL Presidência da República Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional Brasília DF Presidência da República 20 dez 1996 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leisL9394htm Acesso em 23 mar 2020 BRASIL Lei nº 10639 de 9 de janeiro de 2003 Altera a Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e dá outras providências Diário Oficial da União seção 1 Brasília p 1 10 jan 2003 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leis2003l10639 htm Acesso 10 set 2020 BRASIL Lei nº 11645 de 10 de março de 2008 Altera a Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 modificada pela Lei nº 10639 de 9 de janeiro de 2003 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e Indígena Diário Oficial da União seção 1 Brasília p 1 11 mar 2008 Disponível em httpwww2 camaralegbrleginfedlei2008lei1164510marco2008572787publicacaooriginal 96087plhtml Acesso em 10 abr 2020 BRASIL Presidência da República Lei nº 13005 de 25 de junho de 2014 Aprova o Plano Nacional de Educação PNE e dá outras providências Brasília DF Presidência da República 25 jun 2014 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ato2011 20142014leil13005htm Acesso em 24 mar 2021 BRASIL Conselho Nacional de Educação CNE Conselho Pleno CP Resolução nº 2 de 22 de dezembro de 2017 Institui e orienta a implantação da Base Nacional Comum Curricular a ser respeitada obrigatoriamente ao longo das etapas e respectivas modalidades no âmbito da Educação Básica Diário Oficial da União seção 1 Brasília DF p 4144 22 dez 2017a BRASIL Base Nacional Comum Curricular BNCC Educação é a Base Brasília DF MEC CONSED UNDIME 2017b RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 17 DELEUZE Gilles GUATTARI Félix Mil platôs capitalismo e esquizofrenia 2 ed São Paulo Editora 34 2011 v 1 GABRIEL Carmen Teresa COSTA Warley da Currículo de História Políticas da Diferença e Hegemonia diálogos possíveis Educação e Realidade Porto Alegre v 36 n 1 p 127146 janabr 2011 GABRIEL Carmen Teresa Currículo de História In FERREIRA Marieta de Moraes OLIVEIRA Margarida Maria Dias de org Dicionário de Ensino de História Rio de Janeiro FGV 2019 v 1 p 7278 GOODSON Ivor A construção social do currículo Lisboa Educa 1997 GOODSON Ivor Currículo teoria e história 12 ed Petrópolis RJ Vozes 2012 GOODSON Ivor Currículo teoria e história 15 ed atual e ampl Petrópolis RJ Vozes 2018 GREEN Bill Currículo Política e a PósModernidade além da questão do conhecimento na pesquisa em currículo Currículo sem fronteiras s l v 17 n 3 p 501514 set dez 2017 LIMA Douglas Uma História Contestada A História Medieval na Base Nacional Comum Curricular 20152017 Anos 90 Porto Alegre v 26 e2019101 2019 MAINARDES Jefferson Abordagem do ciclo de políticas uma contribuição para a análise de políticas educacionais Educação e Sociedade Campinas v 27 n 94 p 4769 janabr 2006 MAUAD Ana Maria Usos do passado e história pública a trajetória do Laboratório de História Oral e Imagem da Universidade Federal Fluminense 19822017 História Crítica Bogotá n 68 p 2745 abrjun 2018 MONTEIRO Ana Maria Ferreira da Costa Ensino de História lugar de fronteira In ARIAS NETO José Miguel org História guerra e paz XXIII Simpósio Nacional de História Londrina ANPUH Finep 2007 v 1 p 7197 MONTEIRO Ana Maria Ferreira da Costa PENNA Fernando de Araújo Ensino de História saberes em lugar de fronteira Educação e Realidade Porto Alegre v 36 n 1 p 191211 janabr 2011 OLIVEIRA Dennison de Uso de periódicos para o ensino de História na Educação Básica projeto 1917 mídia guerra greve e revolução Revista Intersaberes sl v 12 n 25 p 98105 janabr 2017 PEREIRA Nilton Mullet RODRIGUES Mara Cristina de Matos BNCC e o passado prático temporalidades e produção de identidades no ensino de História Arquivos analíticos de políticas educativas sl v 26 n 107 p 122 set 2018 PERRENOUD Philippe Construir as competências desde a escola Porto Alegre Artmed 1999 RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 18 SILVA Marcos Tudo Que Você Consegue Ser Triste BNCCHistória A versão final Ensino em ReVista Uberlândia MG v 25 n Especial p 10041015 2018 SILVA Marco Antônio MORAIS Suelena Maria de Atitude historiadora na leitura dos nãolugares Ehum Belo Horizonte v 10 n 2 juldez 2017 SILVA Francisco José Balduino da SANTOS Jean Mac Cole Tavares FERNANDES Márcia Frota BNCC e o currículo de História interpretações docentes no contexto da prática Currículo sem Fronteiras s l v 19 n 3 p 10111025 setdez 2019 TEIXEIRA Igor Salomão PEREIRA Nilton Mullet A Idade Média nos currículos escolares as controvérsias nos debates sobre a BNCC Diálogos Maringá v 20 n 3 p 1629 setdez 2016 Texto recebido em 03102020 Texto aprovado em 28122020 Este é um artigo de acesso aberto distribuído nos termos de licença Creative Commons RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 19
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BNCC e Ensino de História horizontes possíveis BNCC and History Teaching possible horizons Adriana Soares Ralejo Rafaela Albergaria Mello Mariana de Oliveira Amorim RESUMO A Base Nacional Comum Curricular BNCC tem suscitado importantes debates sobre a constituição de um currículo escolar Neste artigo desenvolvemos uma reflexão sobre como essa proposta curricular tem mobilizado discussões sobre as possibilidades de constituição e de desenvolvimento do ensino de História Enquanto dispositivo regulador da educação que tipo de poder esse documento exerce sobre aquilo que é praticado nas escolas Para além dos constrangimentos e amarras que o currículo gera no ensino poderíamos também enxergar potencialidades para um ensino de História que dialogue com as realidades vividas por nossos alunos e alunas e compartilhadas no espaço escolar A partir dessas questões norteadoras desenvolvemos este artigo em três partes em um primeiro momento apresentamos a trajetória de publicação da BNCC e os embates em torno do ensino de História bem como os conceitos de currículo e de Ensino de História com os quais trabalhamos Em um segundo momento apresentamos como a comunidade disciplinar GOODSON 1997 tem debatido sobre os sentidos de História presentes na BNCC a partir de um levantamento de artigos científicos que têm apresentado este currículo como tema de pesquisa E em um terceiro momento apresentamos algumas chaves de leitura do documento a partir dos conceitos de competências gerais e DOI httpdxdoiorg1015900104406077056 DOSSIÊ Bases Nacionais e o Ensino de História embates desafios e possibilidades naentre a Educação Básica e a formação de professores Universidade Federal do Rio de janeiro Rio de Janeiro Rio de Janeiro Brasil Email drikaralejohotmailcom httpsorcidorg0000000317254675 Email molamorimgmail com httpsorcidorg000000153363428 Email rafaelalbergariagmailcom httpsorcid org0000000217524690 Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 1 da atitude historiadora Por fim teremos condição de responder à questão que possibilidades a BNCC pode proporcionar para um ensino significativo no ensino de História Palavraschave BNCC Ensino de História Currículo Atitude historiadora ABSTRACT The Base Nacional Comum Curricular BNCC National Common Core Curriculum has raised significant debates about the constitution of a school curriculum In this article we develop a reflection on how this curricular proposal has mobilized discussions about the possibilities of constituting and developing History teaching As a regulatory device of education what kind of power does this document have over what is practiced in schools In addition to the constraints and moorings that the curriculum generates in teaching could we also see the potential for teaching History that dialogs with the realities experienced by our students and shared in the school space Based on these guiding questions we have developed this article in three parts first we present the publication path of BNCC and the clashes surrounding the teaching of History as well as the concepts of curriculum and History teaching with which we work In a second step we present how the disciplinary community GOODSON 1997 debated the History meanings present at the BNCC based on a survey of scientific articles that presented this curriculum as a research theme And in a third moment we exhibit some keys for reading the document based on the concepts of general competencies and Historian attitude Finally we can answer the question what possibilities can the BNCC provide for meaningful teaching in History teaching Keywords BNCC History Teaching Curriculum Historian attitude BNCC e Ensino de História apontamentos iniciais A Base Nacional Comum Curricular BNCC BRASIL 2017b é um documento curricular desenvolvido pelo Ministério da Educação para toda a Educação Básica Previsto no artigo 210 da Constituição Federal de 1988 BRASIL 1988 e no artigo 26 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 BRASIL 1996 esse documento começou a ser desenvolvido a partir do Plano Nacional da Educação PNE em 2014 BRASIL 2014 sendo apresentado ao público pela primeira vez em setembro de 2015 gerando um imenso debate sobre a necessidade ou não de um currículo nacional para o país RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 2 A primeira versão da BNCC para a disciplina escolar de História apresentada em 2015 proporcionou um intenso debate na comunidade disciplinar1 GOODSON 1997 e epistêmica2 BALL 2001 da História sobre quais conhecimentos deveriam ser selecionados e publicados no currículo Essa primeira versão produziu alguns rompimentos com a chamada História tradicional e trouxe para a arena da comunidade disciplinar de História a proposta de um currículo crítico ao eurocentrismo Porém com o desdobramento dos intensos debates gerados na primeira versão da BNCC o Ministério da Educação MEC dissolveu a equipe dos doze profissionais que desenvolveram sua primeira versão para a disciplina de História convidando então uma nova comissão integrada por membros predominantemente de uma única instituição superior Essa foi apresentada ao público em maio de 2016 com uma seleção de conteúdos abrangentes dando forma a um currículo mais conteudista que o anterior e apresentando o desenvolvimento de história do Brasil a partir de um viés eurocêntrico Já a terceira versão da BNCC para a disciplina escolar de História foi apresentada em abril de 2017 e homologada em dezembro do mesmo ano contendo poucas alterações Essa versão lançou mão do conceito de competências que fazia parte dos movimentos reformistas da década de 1990 e internalizado nos Parâmetros Curriculares Nacionais PCNs para o Ensino Médio A BNCC é um documento curricular oficial e deve embasar os currículos dos diversos municípios e estados do Brasil Assim diante sua adequação em todo o Ensino Fundamental até o ano de 2020 BRASIL 2017a como pensar em possibilidades para o Ensino de História nas escolas Será que a BNCC enquanto um dispositivo regulador da Educação somente regula amarra e constrange a História que deve ser ensinada nas escolas Ou será que a BNCC também deixa em aberto espaços onde o ensino de História pode se tornar potente e tocar as realidades vividas e experimentadas nas escolas Bill Green 2017 afirma que as questões relacionadas ao conhecimento no currículo estão sempre ligadas com questões de poder O autor afirma que o currículo nacional australiano entrou em vigor em 2011 e que houve um grande questionamento sobre quais conhecimentos deveriam ser validados por um currículo nacional Assim entendemos com Green que currículo é sempre político Como prática de representação e de poder o componente curricular de História na BNCC representa a legitimação de determinados conhecimentos 1 O conceito de comunidade disciplinar remete a um grupo heterogêneo composto de subgrupos internos que vivem em antagonismo mas apesar das possibilidades agonísticas a comunidade disciplinar coexiste com o objetivo de manter a estabilidade 2 O conceito de comunidade epistêmica remete à competição por determinadas concepções de conhecimento de uma comunidade disciplinar e são associadas por Ball as tensões inerentes à constituição da própria comunidade RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 3 Essa relação entre conhecimento histórico escolar currículo e poder é trabalhada também por Gabriel e Costa 2011 ao defenderem que o currículo pressupõe processos de constituição de hegemonias que ocorrem no âmbito da produção distribuição e consumo do conhecimento histórico escolar em meio a um sistema de diferenças no qual são travadas diversas disputas pelo estabelecimento da verdade e pelo estabelecimento daquilo que deve ser ensinado nas escolas Segundo Gabriel 2019 o currículo de História tende a significar o conjunto de conteúdos que compõem a grade curricular dessa disciplina nos diferentes níveis de Ensino De acordo com a autora em geral esses conteúdos são percebidos como prescrições como naturalizações não sendo indicadas suas imbricações com as relações assimétricas de poder Há assim uma visão instrumental do currículo e do ensino de História que legitima o status quo reforçando o silenciamento ou o apagamento de narrativas de minorias culturais sociais étnicas e de gênero historicamente excluídas das práticas curriculares de História Importa também pontuarmos que entendemos o ensino de História como um lugar de fronteira MONTEIRO 2007 Nessa perspectiva ensinar História na escola remete às relações entre as concepções de currículo de conhecimento histórico escolar de produção e distribuição desse conhecimento e dos saberes docentes e discentes De acordo com Monteiro 2007 e Monteiro e Penna 2011 A proposta de pensar a pesquisa sobre o Ensino de História como um lugar de fronteira utiliza uma analogia com um elemento da geopolítica a questão das fronteiras que podem ser entendidas no sentido norte americano de frontier terra além da qual se estende um vazio uma terra de ninguém ou de border lugar de marcação de diferenças mas que também permite o encontro as trocas SANTOS 1994 apud MONTEIRO 2007 p 76 grifo da autora A fronteira é lugar onde são demarcadas diferenças mas onde também é possível produzir aproximações diálogos ou distanciamento entre culturas que entram em contato MONTEIRO PENNA 2011 p 194 Tanto o currículo quanto o ensino de História são pensados como espaços tempos fronteiriços irredutíveis a apenas um campo de saber ou seja são produzidos e funcionam na relação entre campos distintos entre saberes e entre poderes múltiplos O currículo de História pode ser pensado então como um mapa como um rizoma como uma cartografia de saberes e de poderes como RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 4 uma territorialização provisória como um terreno estriado que se constitui por linhas de saberes e poderes que são móveis e dinâmicos objetivando conteúdos e subjetivando professores e alunos Essa concepção de ensino de História nos indica que há possibilidades de criar brechas e apostar nas diferenças na diversidade sociocultural e étnica promover a inclusão discursiva de sujeitos e identidades silenciados e negados ao longo do processo de escolarização Ora não estamos fadados a uma narrativa tradicional Diante do que foi exposto questionamos como estudos e pesquisas têm analisado essa relação entre a BNCC e o Ensino de História Essa é uma pergunta que seguimos na segunda parte desse texto E que possibilidades teóricopráticas podem ser desenvolvidas e sugeridas como caminhos para ensinar e aprender História nas escolas Essas sugestões tomam forma na parte terceira deste artigo Embates em torno da significação da BNCC de História Nessa segunda parte do texto procuramos entender como pesquisadores do campo da História compreendem a BNCC Realizamos então uma busca pela palavrachave BNCC sigla e nome por extenso no Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CAPES e selecionamos os artigos que se referiam à disciplina de História3 A partir da leitura desses artigos identificamos algumas questões que permeiam esses textos Desse modo apresentaremos um breve resumo dessas trazendo as suas principais contribuições para o campo e posteriormente iremos realizar um diálogo comentre eles produzindo uma análise sobre quais sentidos de ensino de História estão sendo expressos nesses textos o que destacam como positivo e como negativo E como tem sido o posicionamento desses pesquisadores quanto ao uso produtivo desse documento normativo O artigo desenvolvido por Igor Salomão Teixeira e Nilton Mullet Pereira 2016 aborda a temática da Idade Média na primeira e segunda versão do documento da BNCC analisando também a comunidade de medievalistas no 3 A busca no Portal de Periódicos da CAPES ocorreu no dia 7 de julho de 2020 e foram encontrados 16 artigos referentes à BNCC de História Desses 16 artigos selecionamos cinco que mencionaram nas palavraschave o termo BNCC Acrescentamos para essa análise o artigo de Silva Santos e Fernandes 2019 por ser um artigo publicado numa revista de Educação se diferenciando dos demais e pela pertinência em trabalhar na metodologia com professores de História RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 5 Brasil Os autores consideram que a primeira versão trouxe questões importantes com o rompimento da linearidade e do eurocentrismo nos conteúdos trazendo luzes necessárias a abordagens antes muito marginais no ensino de História TEIXEIRA PEREIRA 2016 p 17 porém foram retirados conteúdos relacionados aos períodos da Antiguidade e da Idade Média Os autores destacam que a Associação Brasileira de Estudos Medievais ABREM defendeu a volta do estudo da Europa medieval mas sem ter uma posição conservadora em relação ao Ensino de História Como Teixeira e Pereira 2016 afirmam que o não privilégio dado à história europeia é justamente o ponto alto da versão preliminar do texto da BNCC pois tal posição reflete um longo período de disputas no campo do ensino de História que se estendeu desde os anos 80 CABRINI 1994 e que contempla uma forte crítica ao que se chamou de eurocentrismo TEIXEIRA PEREIRA 2016 p 21 Assim os autores consideram que o caminho tomado pelo grupo da primeira versão foi um caminho importante para a construção do pensamento histórico mas que ao retirarem o conteúdo da Idade Média eliminaram a possibilidade de pensar o passado com o estranhamento que um conhecimento gera Os autores consideram que a segunda versão voltou ao conteúdo de privilégio europeu com o caráter estereotipado em relação à Idade Média com preconceitos e desatualização historiográfica TEIXEIRA PEREIRA 2016 Assim Teixeira e Pereira 2016 afirmam algumas possibilidades de entrada da Idade Média no currículo de História para a construção de um ensino para a alteridade como a questão do Islamismo nos diferentes acontecimentos contemporâneos em relação ao Oriente Médio a questão de gênero no extremo oriente e as residualidades do mundo ibérico como canções e festas a Folia de Reis e o Natal Os autores defendem que o ensino da Idade Média permite pensar historicamente para estudar o diferente Já o artigo produzido por Dennison de Oliveira 2017 apresentou conteúdos relacionados às diferentes temáticas dos centenários de 1917 a Primeira Guerra Mundial a Revolução Russa a declaração de guerra do Brasil à Alemanha e a Greve Geral Para o autor há uma continuidade no componente da disciplina de História para o Ensino Fundamental na BNCC em relação ao componente de História nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio PCNEM só se notando diferenças de forma e não de conteúdo OLIVEIRA 2017 p 100 RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 6 Oliveira 2017 elogia as nove competências para a disciplina de História no Ensino Fundamental presentes no documento que já tinham sido postas para o Ensino Médio desde o ano de 2000 mas questiona sobre o grau de comprometimento do poder público para a efetivação dessa proposta O que percebemos é que aparentemente essas competências foram ignoradas pelo poder público no Ensino Médio e que o autor não possui esperanças com a presença destas no Ensino Fundamental O artigo de Marcos Silva 2018 afirma que a primeira versão da BNCC foi mal interpretada pela comunidade acadêmica que ao enfatizar a história do Brasil no ensino de História não ignorou o mundo e que o texto documental foi ético ao trazer as matrizes africanas a partir dos dados que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE apresenta sobre a população brasileira O autor afirma que a organização do quadripartismo significa a dominação política secular do continente europeu Posteriormente o autor analisa a versão oficial da BNCC e ressalta que não há marcas de pluralidade no documento assim como torna abstrata a categoria do conhecimento histórico negligenciando critérios de preservação de memória Em relação às Leis 106392003 BRASIL 2003 e nº 116452008 BRASIL 2008 Silva 2018 p 1010 afirma que há a presença de alteridade cultural mas sem quase mencionar dominações e explorações O autor afirma que apesar de trazer novos protagonismos o documento é conservador Já Nilton Mullet Pereira e Mara Rodrigues 2018 apresentam as diferenças entre os três documentos da BNCC de História Os autores a partir das questões teóricas e temáticas sobre identidade e temporalidade realizaram uma análise de como esses documentos abordaram essas temáticas Para os autores as disputas na produção curricular da BNCC foram sobretudo no campo da legitimidade do legado e de outra formação histórica para a constituição identitária brasileira isto é a ênfase justamente nas continuidades supostamente estabelecidas entre o passado europeu africano ou indígena e o laço social na atualidade PEREIRA RODRIGUES 2018 Desse modo os autores consideram que a primeira versão produziu uma inversão centro geográfica com menos destaque à Europa e mais à América Latina e ao continente africano Os autores consideraram que a segunda versão apresenta o passado histórico como continuidade e repetição sem problematização e que a terceira versão trabalha pouco a questão das identidades Para os autores há um esvaziamento da aula de História da falta do potencial crítico sem estimulação da empatia com minorias Os autores consideram que há uma concepção asséptica universal e despolitizada na versão efetivada pelo governo Os autores concluem sobre a necessidade de uma História militante por novas identidades e temporalidades sendo necessário romper com séculos de pensamentos colonizados RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 7 Francisco José Balduino da Silva Jean Santos e Márcia Fernandes 2019 trazem uma discussão sobre a BNCC e a tentativa de normatização do currículo de História para o Ensino Médio Numa análise a partir do referencial teórico de Stephen Ball os autores apresentaram discursos em defesa da BNCC a partir do governo de institutos e de fundações Posteriormente os autores apresentam dados levantados por um questionário respondido por professores de História do Ensino Médio no qual afirmaram que não se sentiam contemplados com a BNCC assim como consideravam que a BNCC não privilegia uma perspectiva reflexiva para os estudantes Dessa forma os autores consideram que o discurso da BNCC está longe da realidade dos docentes Já o texto de Douglas Lima 2019 analisa como o período da Idade Média foi inserido ao longo das versões da BNCC e conclui refletindo sobre as possibilidades de pensar a História Medieval no ensino de História Sobre a inserção da Idade Média na BNCC diz o autor Buscando uma comparação entre as versões da Base observase que os conteúdos de Idade Média conheceram uma variação marcante Inicialmente inserida de forma lacunar em poucos itens a História Medieval passou a ocupar espaço de destaque nos conhecimentos históricos esperados para o 6º ano demarcandose por uma abordagem conservadora e conteudista ao passo que na terceira e última versão passase a eixos amplos que estruturam o 6º ano do Ensino Fundamental em torno da Antiguidade Clássica e de uma Idade Média mediterrânea pensada por uma abordagem sociocultural LIMA 2019 p 12 A partir das leituras dos artigos apresentados acima percebemos algumas questões suscitadas por autores do campo do Ensino de História Esses autores expressaram suas análises críticas à versão oficial do documento e como trouxeram à tona a questão do embate na comunidade disciplinar GOODSON 2018 de História na construção da Base Percebemos que esses textos expressam diferentes formas de análise da BNCC e que defenderam suas posições na comunidade disciplinar de História discordando e adjetivando de diferentes maneiras o documento oficial Assim tendo em vista os variados discursos críticos sobre a BNCC consideramos com base em Goodson 2018 que os diferentes autores comungam sobre a importância e a promoção da disciplina escolar de História Goodson 2018 considera RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 8 Uma comunidade disciplinar também pode ser um grupo heterogêneo composto de subgrupos internos que vivem em antagonismo mas apesar das possibilidades agonísticas a comunidade disciplinar coexiste com o objetivo de manter a estabilidade e promover o ensino da disciplina GOODSON 2018 p 20 Compreendemos com a leitura desses textos que o processo de ensino e aprendizagem deem História é amplo e remete a várias discussões assim como a produção de saberes históricos tenciona a comunidade disciplinar e epistemológica sobre quais saberes devem ser legitimados no documento oficial Há uma luta pela legitimação de seu território disciplinar e essa é uma luta política Como Goodson 2018 afirma as matérias escolares estão constituídas por grupos de elementos de identidade valores e interesses diferentes Verificamos assim que as prescrições curriculares presentes do componente de História para o Ensino Fundamental apresentados na versão homologada da BNCC como unidades temáticas objetos de conhecimento e habilidades pouco se diferenciam dos conteúdos curriculares presentes nos livros didáticos até então configurando movimentos de permanência na política curricular Porém podemos projetar também mudanças apresentadas no documento Não no sentido de apresentar propostas revolucionárias e inéditas no campo do ensino de História mas ao assumir posicionamentos que valorizem a especificidade do componente em questão por meio da definição de competências específicas em diálogo com as competências gerais e do conceito de atitude historiadora dos quais desenvolveremos na próxima etapa do texto Competências gerais e atitude historiadora Não buscamos neste artigo estabelecer algum tipo de juízo de valor que avalie a BNCC como algo bom ou ruim certo ou errado Nosso olhar a partir das análises das leituras dos artigos levantados foi buscar compreender como pesquisadores e professores se posicionam frente a um documento curricular de tão grande impacto sobre a educação A partir do momento em que este documento ganha um caráter prescritivo o quanto podemos estabelecer um olhar crítico e produtivo Quando apontamos que a BNCC pode ganhar um caráter produtivo nos referimos que um currículo que é produzido por uma comunidade epistêmica também produz sentidos Assim baseados em Ball 2001 compreendemos RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 9 que um ciclo de políticas explicita a existência de uma natureza complexa das políticas curriculares composta por processos micropolíticos e por ações de profissionais de diferentes níveis MAINARDES 2006 Entre o público e o privado Ball aponta que as políticas educacionais mobilizam e são mobilizadas em diferentes contextos influência produção e prática É esse último contexto que gostaríamos de ressaltar e estabelecer relações quanto aos usos da BNCC quem estabelece os sentidos a serem ensinados Destacamos dentre os diversos sujeitos envolvidos no processo de ensino aprendizagem o papel dos professores É nas mãos deles que o documento também irá ser interpretado e materializado no formato de aulas Assim reconhecemos que esses sujeitos possuem uma relação de poder nesse processo como aqueles que produzem sentidos sobre os conteúdos a serem ensinados e não somente como reprodutores de prescrições anteriores Tendo reconhecido essas relações de poder envolvidas no processo educacional analisaremos nessa última parte potencialidades que a BNCC pode proporcionar para as práticas docentes Nosso olhar se volta para os sentidos de ensino de História expressos no documento e sobre a forma que esses se relacionam com as perspectivas teóricas de uma história crítica defendida por autores desse campo de estudo Qual o objetivo ao se proporcionar o ensino de História na Educação Básica Este questionamento apesar de propiciar diversas respostas possíveis se faz como uma questão necessária tanto para nossos alunos por que eu preciso aprender isso quanto para nós professores por que estou ensinando isso Se nós lutamos por um ensino que seja significativo e de qualidade para nossos alunos o questionamento do porquê também vem acompanhado de o que e como Aqui estamos problematizando nossos processos de escolhas que por muitas vezes podem ser naturalizados Um professor ao planejar sua prática normalmente recorre a meios como o livro didático o planejamento escolar e suas experiências como docente e discente para compor aquilo que constituirá sua aula Mas todos esses recursos impostos ou não são produzidos respeitando normativas políticas e curriculares Durante a formação docente normalmente nos deparamos com esses tipos de documentos e tomamos consciência da complexidade do processo envolvido que mobiliza a Constituição Federal de 1988 BRASIL 1988 a Lei de Diretrizes e Bases da educação Básica Lei 9394 de 1996 os Parâmetros Curriculares Nacionais as Diretrizes Curriculares Nacionais DCN o Estatuto da Criança e do Adolescente e os currículos estaduais e municipais A produção da BNCC iniciada em 2015 e concluída em 2017 Educação Infantil e Ensino Fundamental e 2018 Ensino Médio traz à tona novamente a importância da participação da comunidade epistêmica BALL 2001 Como foi RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 10 exposto na primeira parte deste artigo o processo de produção desse documento gerou debates no campo da História colocando em questão a tradição curricular Goodson 2012 diz que não é possível negar essa tradição mas precisamos buscar caminhos de revitalizar reconstruir e ampliar para tornar o currículo diversamente acessível e agradável tornando o ambiente escolar um lugar rico e propício de significados São esses novos caminhos para o ensino de História que buscamos visualizar em meio às disputas de poder e representatividade que a BNCC envolve Não cabe neste artigo abrir uma discussão sobre a validade ou não do que ficou estabelecido em sua versão final e sobre o que ficou no lugar do silenciamento e do esquecimento Tampouco se trata de um posicionamento a favor ou contra o documento Compreendemos que em um movimento de idas e vindas disputas de diferentes níveis e instâncias de poder aquilo que consideramos como currículo nunca é algo 100 unilateral Há ali marcas e rastros de diferentes discursos que dialogam negociam e até mesmo se contrapõem A BNCC é um produto desses discursos que ora de maneira mais explícita ora de forma mais tímida é um resultado que traz consigo vitórias de lutas por representatividade e diversidade expressos pelas leis nº 106392003 BRASIL 2003 e nº 116452008 BRASIL 2008 e pelas DCN mas também onde há marcas da tradicionalidade escolar com uma grande lista de habilidades a serem desenvolvidas Queremos utilizar esse espaço para provocar um outro olhar quais potencialidades e mudanças a BNCC pode gerar em nossas práticas docentes Um primeiro aspecto do documento que nos chama a atenção é a definição de dez competências4 gerais sob o argumento de que é preciso garantir os direitos de aprendizagem e desenvolvimento a todos os estudantes do país BRASIL 2017b São elas conhecimento pensamento científico crítico e criativo repertório cultural comunicação cultura digital trabalho e projeto de vida argumentação autoconhecimento e autocuidado empatia e cooperação responsabilidade e cidadania Mesmo compreendendo que os objetivos com a educação brasileira extrapolam essa numeração de dez itens observamos uma mensagem que vale a pena ser destacada a escola não é um lugar que trata somente de conteúdos e conhecimentos As outras nove competências apontam que dentro desse espaço 4 O conceito de competência não é algo novo Este passou a ser amplamente discutido no campo educacional ao ser relacionado nos estudos de Perrenoud 1999 a uma noção de capacitação e aquisição de ferramentas para solução de problemas cotidianos Porém na BNCC esse conceito é definido como mobilização de conhecimentos conceitos e procedimentos habilidades práticas cognitivas e socioemocionais atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho BRASIL 2017b p 8 RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 11 em todos os níveis de ensino e em todos os componentes curriculares não só podem como devem ser trabalhados aspectos que promovam uma formação e desenvolvimento de autonomia dentro de um contexto de diversidade e diferença5 O conhecimento continua a ter importância na constituição da educação mas não se reduz a ele Novamente reforçamos que esse tipo de pensamento sobre a educação não se trata de uma inovação do documento mas resultado de debates e lutas por um ensino de qualidade crítico e significativo tal como defendido por Paulo Freire Relacionando esse aspecto ao ensino de História essa mensagem das dez competências gerais nos ajuda a combater a ideia de uma História tradicionalmente relacionada aos eventos datas e nomes que carregam consigo uma única versão que vinha se caracterizando pelo seu teor eurocêntrico e patriarcal Ao explorar em nossas práticas docentes por exemplo a competência de número 2 pensamento científico crítico e criativo somos levados a considerar os diferentes conhecimentos formular hipóteses analisar outras versões e interpretálas de forma crítica o que é reforçado pela competência de número 7 argumentação que possibilita a formulação negociação e defesa de diferentes ideias As chamadas competências socioemocionais também são destacadas no documento principalmente referentes aos itens 8 autoconhecimento e autocuidado 9 empatia e cooperação e 10 responsabilidade e cidadania que trazem consigo as ideias do cuidado e conhecimento de si do outro e do coletivo Esses fatores impulsionam o trabalho com perspectivas do ensino de História que valorizam a exploração de diferentes narrativas e a diversidade cultural permitindo a percepção do sujeito em seu tempo e espaço e proporcionando ações para com a sociedade em que vive Compreendemos que esses apontamentos mais gerais não fazem jus a todos movimentos sociais que apresentam longa trajetória nas lutas por representatividade ao não trazer especificamente questões que devem ser pautas de defesa de toda a escola como questões étnicoraciais e de gênero E também alertamos que essas defesas por diversidade e multiculturalismo já se faziam presentes em documentos anteriores talvez até mais explicitamente Assim ao propor a pensar nas potencialidades da BNCC que podemos nos apropriar e trazer reflexões para nossas práticas entendemos também que o documento não fecha essas portas 5 Lembramos que essa perspectiva sobre os objetivos da educação não emerge com a BNCC sendo explorada em outros documentos curriculares como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 12 Em um levantamento geral por palavras presentes na BNCC identificamos por exemplo que os significantes negro africano e correlatos estão presentes 65 vezes a maioria deles 25 no componente de História mas que também estão presentes em Língua Portuguesa Educação Física Arte Ciências Geografia e Religião Já o significante indígena e correlatos são citados 77 vezes também com maioria no componente de História Por outro lado o significante gênero e correlatos estão presentes 269 vezes mas todos fazem referência ao campo textual da Língua Portuguesa Assim numa busca mais precisa utilizamos o significante mulher que apareceu 4 vezes 3 delas em História e homossexuais apareceu somente uma vez Podemos concluir brevemente pois não é intuito neste artigo realizar uma análise detalhada sobre essa questão que há alguns avanços e reconhecimentos dessas lutas na BNCC mas há ainda muito a avançar principalmente na questão de gênero Em relação à proposta específica para o componente de História o documento explora o conceito de atitude historiadora definindo como um papel de ação que docentes e discentes podem desempenhar no processo de ensino e aprendizagem por meio da utilização de diferentes fontes Nessa dimensão o objeto histórico transformase em exercício em laboratório da memória voltado para a produção de um saber próprio da história BRASIL 2017b p 396 Considerando o conhecimento história como um saber necessário que se origina no tempo presente e com ele dialoga o documento aponta para a necessidade de compreender o processo histórico como uma produção narrativa A relação passadopresente não se processa de forma automática pois exige o conhecimento de referências teóricas capazes de trazer inteligibilidade aos objetos históricos selecionados Um objeto só se torna documento quando apropriado por um narrador que a ele confere sentido tornandoo capaz de expressar a dinâmica da vida das sociedades Portanto o que nos interessa no conhecimento histórico é perceber a forma como os indivíduos construíram com diferentes linguagens suas narrações sobre o mundo em que viveram e vivem suas instituições e organizações sociais Nesse sentido O historiador não faz o documento falar é o historiador quem fala e a explicitação de seus critérios e procedimentos é fundamental para definir o alcance de sua fala Toda operação com documentos portanto é de natureza retórica BRASIL 2017b p 395 grifo nosso RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 13 Assim percebemos no trecho destacado a valorização da leitura das fontes históricas que se manifestam por meio de diferentes linguagens Em nenhum momento no texto introdutório do componente de História são destacadas linhas de abordagem específicas da historiografia O que se traz à tona para o professor e os outros sujeitos que irão utilizar esse documento em suas práticas é a problematização sobre o conhecimento histórico Dessa forma é a atitude historiadora que é destacada como prática para aqueles que estão envolvidos no ensino de História Ana Maria Mauad 2018 em artigo que aborda sobre os usos do passado também explora esse conceito da atitude historiadora definindo como Noção que nos desafia a nos colocarmos diante do tempo num movimento em que o tempo passado se calibra em relação ao presente tanto pela continuidade das práticas compartilhadas entre os grupos sociais quanto pelas lentes da distância diferença e descontinuidade que nos fazem olhar o passado com olhos de madeira Atitude que nos insere no fluxo temporal como agentes comprometidos com uma história que se faz a cada dia por cada um tecendo um amanhã coletivo MAUAD 2018 p 29 É esse olhar atento para as fontes históricas que o documento destaca E se trata mais do que um olhar metodológico sobre as fontes é um olhar de mundo proporcionado pelo componente de História Como práticas educativas a atitude historiadora deve obedecer a processos de a identificação b comparação c contextualização d interpretação e e análise BRASIL 2017b O processo de a identificação consiste na descrição do objeto estudado proporcionar diferentes formas de percepção e interação relacionadas ao seu tempo espaço e relações sociais b a comparação proporciona um olhar para o outro e leitura das semelhanças e diferenças em diferentes linguagens c a contextualização instiga o aluno a localizar momentos e lugares específicos do objeto estudado para atribuir sentidos condizentes com sua época e sociedade d a interpretação estimula a formação do pensamento crítico indo além das informações que o objeto em si proporciona relacionando valores sobre a importância do objeto histórico e por fim e a análise aparece como a etapa final desse processo e proporciona a autonomia e protagonismo do aluno ao problematizar e ir além do conhecimento apresentado É no exercício da atitude historiadora que são fomentadas práticas de fala leitura e escrita não somente de conhecimentos específicos do campo da historiografia mas também de práticas de letramento que formam e significam RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 14 o mundo da vida AZEVEDO MONTEIRO 2013 Assim acreditamos na potencialidade do sentido que a atitude historiadora proporciona Não se trata de formar historiadores mas de dotar diferentes sujeitos de autonomia para a tomada da palavra e de posição em sua vida social a partir de possibilidades de usos do passado Em diferentes instâncias da vida social é possível assumir uma atitude historiadora De que se trata tal atitude De indagar o passado como uma das dimensões do terreno poroso do presente onde residem as tradições os comportamentos residuais mas de onde quando problematizado emerge um conhecimento crítico que nos impele à ação MAUAD 2018 p 40 Proporcionar o exercício da atitude historiadora é combater a história única porque passamos a compreender que a ação do historiador é uma construção discursiva baseada na interpretação de uma realidade Essa prática do conhecimento como uma produção também se estende para o cenário da sala de aula que deve pautarse na reconstrução dos processos que levam à produção do conhecimento escolar permitindo ao estudante aprender a leitura da história que poderá ser aplicada em diversas situações da sua vida cotidiana SILVA MORAIS 2017 Assim os conhecimentos do componente de História poderão ser melhor sistematizados fundamentados e analisados ao trabalharmos a partir da atitude historiadora contribuindo com possibilidades de construção de leituras de mundo Considerações finais Estabelecendo uma linha de raciocínio entre aquilo que foi exposto na segunda parte deste artigo que buscou compreender os sentidos em disputa pelo ensino de História ao longo da constituição da BNCC e aquilo que podemos observar do que ficou estabelecido na sua versão final identificamos como o currículo se constitui como um campo de disputas com idas e vindas pela definição sobre o que ensinar A BNCC não é um documento inovador ou pioneiro Tratase de um movimento de continuidades iniciado na Constituição de 1988 perpassando a LDB os PCNs e as DCN nas lutas pela definição sobre Educação e neste caso específico sobre o ensino de História Como o próprio documento da RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 15 BNCC aponta é resultado de prescrições curriculares anteriores a ele As leis nº 106392003 BRASIL 2003 e nº 116452008 BRASIL 2008 são exemplos de como movimentos anteriores foram inseridos na produção do novo documento Há avanços na BNCC em relação aos objetivos da Educação Sim mas não podemos considerálo um documento revolucionário ou inovador Há muitas permanências também Junto com a perspectiva do outro da diferença e da alteridade muitas marcas do eurocentrismo são encontradas na proposta para o componente de História de acordo com os artigos que aqui analisamos Consideramos que a atitude historiadora é um importante conceito no qual a BNCC se ampara proporcionando muitas oportunidades para o desenvolvimento do conhecimento histórico escolar A atitude historiadora traz à tona a importância do olhar sobre as diferentes fontes e os documentos É a partir das fontes que se faz História e assim podemos visualizar possibilidades de combater o negacionismo histórico tema que tem emergido com força mediante discursos de ordem autoritária e conservadora Pretendemos neste artigo refletir sobre os sentidos produzidos na comunidade de história a partir da BNCC e explorar como professores de História poderão e podem se apropriar desse documento curricular Consideramos que ainda há muitas questões em aberto nas quais os profissionais do campo poderão se debruçar para incrementar e amplificar as discussões relativas à relação entre o ensino de História e a BNCC RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 16 REFERÊNCIAS AZEVEDO Patrícia Bastos de MONTEIRO Ana Maria Ferreira da Costa A sala de aula e a produção de sentido em práticas de letramento na história ensinada Práxis Educativa Ponta Grossa v 8 n 2 p 559580 juldez 2013 BALL Stephen J Diretrizes políticas globais e relações políticas locais em educação Currículo sem Fronteiras s l v 1 n 2 p 99116 2001 BRASIL Constituição 1988 Constituição da República Federativa do Brasil Brasília DF Presidência da República 2016 Disponível em httpwwwplanaltogov brccivil03constituicaoconstituicaocompiladohtm Acesso em 30 set 2020 BRASIL Presidência da República Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional Brasília DF Presidência da República 20 dez 1996 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leisL9394htm Acesso em 23 mar 2020 BRASIL Lei nº 10639 de 9 de janeiro de 2003 Altera a Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e dá outras providências Diário Oficial da União seção 1 Brasília p 1 10 jan 2003 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leis2003l10639 htm Acesso 10 set 2020 BRASIL Lei nº 11645 de 10 de março de 2008 Altera a Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 modificada pela Lei nº 10639 de 9 de janeiro de 2003 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e Indígena Diário Oficial da União seção 1 Brasília p 1 11 mar 2008 Disponível em httpwww2 camaralegbrleginfedlei2008lei1164510marco2008572787publicacaooriginal 96087plhtml Acesso em 10 abr 2020 BRASIL Presidência da República Lei nº 13005 de 25 de junho de 2014 Aprova o Plano Nacional de Educação PNE e dá outras providências Brasília DF Presidência da República 25 jun 2014 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ato2011 20142014leil13005htm Acesso em 24 mar 2021 BRASIL Conselho Nacional de Educação CNE Conselho Pleno CP Resolução nº 2 de 22 de dezembro de 2017 Institui e orienta a implantação da Base Nacional Comum Curricular a ser respeitada obrigatoriamente ao longo das etapas e respectivas modalidades no âmbito da Educação Básica Diário Oficial da União seção 1 Brasília DF p 4144 22 dez 2017a BRASIL Base Nacional Comum Curricular BNCC Educação é a Base Brasília DF MEC CONSED UNDIME 2017b RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 17 DELEUZE Gilles GUATTARI Félix Mil platôs capitalismo e esquizofrenia 2 ed São Paulo Editora 34 2011 v 1 GABRIEL Carmen Teresa COSTA Warley da Currículo de História Políticas da Diferença e Hegemonia diálogos possíveis Educação e Realidade Porto Alegre v 36 n 1 p 127146 janabr 2011 GABRIEL Carmen Teresa Currículo de História In FERREIRA Marieta de Moraes OLIVEIRA Margarida Maria Dias de org Dicionário de Ensino de História Rio de Janeiro FGV 2019 v 1 p 7278 GOODSON Ivor A construção social do currículo Lisboa Educa 1997 GOODSON Ivor Currículo teoria e história 12 ed Petrópolis RJ Vozes 2012 GOODSON Ivor Currículo teoria e história 15 ed atual e ampl Petrópolis RJ Vozes 2018 GREEN Bill Currículo Política e a PósModernidade além da questão do conhecimento na pesquisa em currículo Currículo sem fronteiras s l v 17 n 3 p 501514 set dez 2017 LIMA Douglas Uma História Contestada A História Medieval na Base Nacional Comum Curricular 20152017 Anos 90 Porto Alegre v 26 e2019101 2019 MAINARDES Jefferson Abordagem do ciclo de políticas uma contribuição para a análise de políticas educacionais Educação e Sociedade Campinas v 27 n 94 p 4769 janabr 2006 MAUAD Ana Maria Usos do passado e história pública a trajetória do Laboratório de História Oral e Imagem da Universidade Federal Fluminense 19822017 História Crítica Bogotá n 68 p 2745 abrjun 2018 MONTEIRO Ana Maria Ferreira da Costa Ensino de História lugar de fronteira In ARIAS NETO José Miguel org História guerra e paz XXIII Simpósio Nacional de História Londrina ANPUH Finep 2007 v 1 p 7197 MONTEIRO Ana Maria Ferreira da Costa PENNA Fernando de Araújo Ensino de História saberes em lugar de fronteira Educação e Realidade Porto Alegre v 36 n 1 p 191211 janabr 2011 OLIVEIRA Dennison de Uso de periódicos para o ensino de História na Educação Básica projeto 1917 mídia guerra greve e revolução Revista Intersaberes sl v 12 n 25 p 98105 janabr 2017 PEREIRA Nilton Mullet RODRIGUES Mara Cristina de Matos BNCC e o passado prático temporalidades e produção de identidades no ensino de História Arquivos analíticos de políticas educativas sl v 26 n 107 p 122 set 2018 PERRENOUD Philippe Construir as competências desde a escola Porto Alegre Artmed 1999 RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 18 SILVA Marcos Tudo Que Você Consegue Ser Triste BNCCHistória A versão final Ensino em ReVista Uberlândia MG v 25 n Especial p 10041015 2018 SILVA Marco Antônio MORAIS Suelena Maria de Atitude historiadora na leitura dos nãolugares Ehum Belo Horizonte v 10 n 2 juldez 2017 SILVA Francisco José Balduino da SANTOS Jean Mac Cole Tavares FERNANDES Márcia Frota BNCC e o currículo de História interpretações docentes no contexto da prática Currículo sem Fronteiras s l v 19 n 3 p 10111025 setdez 2019 TEIXEIRA Igor Salomão PEREIRA Nilton Mullet A Idade Média nos currículos escolares as controvérsias nos debates sobre a BNCC Diálogos Maringá v 20 n 3 p 1629 setdez 2016 Texto recebido em 03102020 Texto aprovado em 28122020 Este é um artigo de acesso aberto distribuído nos termos de licença Creative Commons RALEJO A S MELLO R A AMORIM M de O BNCC e Ensino de História horizontes possíveis Educar em Revista Curitiba v 37 e77056 2021 19