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httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 Artigo Recebido em 23032017 Aceito em 26062017 AS MULHERES SEM NOME o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça RESUMO A ideia central deste trabalho é questionar o desenvolvimento de mecanismos discursivos ou a manipulação das imagens judiciais constituídas acerca de personagens subalternizados Mais especificamente optouse por trazer à tona a apropriação de uma literatura jurídica que pretendia descrever o feminino em nome de fundamentar deveres e direitos masculinos sobre as mulheres As interpretações a seguir transpassam pelas interrogativas sobre a quais grupos servia a vigência de códices específicos tendo a temática da História das mulheres como plano de fundo mas não como perspectiva principal Isso significa dizer que o foco deste artigo pode ser visualizado com a problemática das concepções de justiça e da utilização pela camada privilegiada da sociedade e em nome de seus próprios interesses de estatutos judiciais dos considerados inferiores PALAVRASCHAVE Justiça Capitania de Pernambuco Comarca das Alagoas Mulheres Nameless women the development of legal arguments based on womens statute Alagoas District Captaincy of Pernambuco 17161765 ABSTRACT The central idea of this work is to question the development of discursive mechanisms or a manipulation of the judicial images constituted on of subalternized personages More specifically it was chosen to bring to the fore the appropriation of a juridical literature that intends to describe the feminine in the name of to base masculine duties and rights on like women As interpretations they then go through the questions about which groups served the specific codices having a theme of womens history as a background but not as a main perspective This means that the focus of this article can be seen with the problematic of conceptions of justice and of the use of judicial statutes of the lower countries by the privileged layer of society and the name of their own interests KEYWORDS Justice Captaincy of Pernambuco Alagoas district Women Las mujeres sin nombre el desarrollo de los fundamentos de derecho basado en el estatuto de las mujeres Distrito de Alagoas Capitanía de Pernambuco 17161765 RESUMEN La idea central de este trabajo es cuestionar el desarrollo de mecanismos discursivos o una manipulación de las imágenes judiciales constituidas sobre de personajes subalternizados Más específicamente se optó por traer a la superficie la apropiación de una literatura jurídica que pretenda describir lo femenino en nombre de fundamentar deberes y derechos masculinos sobre como mujeres Como interpretaciones a continuación traspasan por las interrogantes sobre qué grupos servía la vigencia de códices específicos teniendo una temática de la Historia de las mujeres como fondo pero no como perspectiva principal Esto significa que el enfoque de este artículo puede ser visualizado con la problemática de las concepciones de justicia y de la utilizaciónpor la capa privilegiada de la sociedad y del nombre de sus propios intereses de estatutos judiciales de los países inferiores PALABRAS CLAVE Justicia Capitanía de Pernambuco Distrito de Alagoas mujeres Doutoranda pelo Programa de PósGraduação em História da Universidade Federal de Pernambuco Membro do Grupo de Estudos América Colonial da Universidade Federal de Alagoas Contato Universidade Federal de Pernambuco Centro de Filosofia e Ciências Humanas 10 andar Cidade Universitária CEP 50740550 Recife PE Brasil Email karollinecamposhotmailcom As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 153 Introdução O ordenamento social que via a mulher como incapaz para exercer atividades de mando era o mesmo que fundamentava a posição masculina como o receptáculo da Justiça no Antigo Regime português Era nas mãos do homem da casa que estava designada a jurisdição1 em sua forma mais natural cuidava e corrigia quando necessário todos aqueles que estavam debaixo de seu domínio incluindo seus filhos e filhas esposa ou irmã2 Baseado em questões doutrinais teológicas o estatuto social e jurídico feminino equiparava as mulheres a características uniformes inflexíveis eram boas ou más Essa estereotipação típica do Antigo Regime português e nos Trópicos alcançou as conquistas de alémmar e se fez fortemente presente nas relações de tais personagens com a Justiça3 Ao sul da Capitania de Pernambuco na Comarca das Alagoas produziuse documentação de cunho jurídicoadministrativo exemplificando formas de comunicação jogos sociais e negociação que a América portuguesa manteve com o seu rei por todo o século XVIII4 É interessante notar dentre tais fontes o aparecimento quase invisível de mulheres sendo alocadas como agentes envolvidos em situações que somavam motivos à produção de requerimentos e envio de reclames A partir de um mapeamento nas fontes advindas do Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos foi possível transformar rápidas menções a mulheres sem especificação de seus nomes ou qualquer outro tipo de identificação em problemática de trabalho É importante salientar que não são petições ou cartas protagonizados pelo feminino mas sim escritos de acusação ou defesa pedidos feitos ao monarca ou cartas administrativas que elencaram a presença de mulheres na região como um motivo ou forma de legitimar o conteúdo exposto de seus interesses Desde a escolha das passagens nas fontes até a transformação das mesmas em problemática central do trabalho utilizouse dos princípios da análise de conteúdo5 o que significa dizer que foram destrinchados detalhadamente conforme as necessidades explicativas foram surgindo texto e contexto histórico Nessa linha de raciocínio o presente artigo também pode ser questionado pelo leitor a respeito de compatibilidades com pesquisas subordinadas ao campo da Análise de Discurso Provavelmente se distancia de tal vertente num sentido mais especificamente linguístico mas transparece em alguns momentos e formas de lidar as influências de uma matriz francesa já que surgiram interpretações e críticas que consideraram os escritos discurso como acontecimentos intrinsicamente ligados a história e a materialização de ideologias6 Dessa maneira o exercício que consistiu em explanar As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 154 possibilidades de explicação das menções as mulheres devem ser visualizadas além do que a prática descritiva de fonte ou interpretação de forma neutra da mesma proporciona Tratou se de observar exaustivamente perspectivas elencando hipóteses e argumentações diante do problema histórico a ser solucionado Buscouse perceber a utilização do estatuto jurídico feminino7 ou referência a ele como um mecanismo desenvolvedor de discursos jurídicos apelativos de acusação e de defesa A importância de tal problematização põe em evidência a necessidade de compreensão profunda dos serviços prestados pelos corpus judiciais no século XVIII período antes da ascensão e transformação política elencada pelo Marquês de Pombal para as camadas consideradas superiores da sociedade responsáveis por administrar a Conquista Ultramarina portuguesa e desenvolver nela um ordenamento social transpassado do Velho mundo As interrogativas contidas aqui podem desvendar os privilégios ou vantagens sob a perspectiva das condições que impuseram aos indivíduos descritos e cerceados pela literatura judicial lusitana nesse caso as mulheres8 Podese ver ainda como a Justiça da Comarca das Alagoas enxergava o feminino e sobre como elas se relacionavam ou eram relacionadas com o direito na perspectiva dos que gozavam da autoridade da voz e desenvolviam estratégias discursivas para se fazer crer e atender9 O desenvolvimento de argumentos jurídicos baseado nas concepções do feminino As intrigas que o Ouvidor Geral da Comarca das Alagoas João Vilela do Amaral levantou por toda a região pertencente à jurisdição de seu ofício10 transpassaram a implicação de agentes masculinos Em momentos distintos foram evidenciadas as principais queixas das três vilas que estiveram sob seus cuidados jurídicos dentre os anos de 1716 e 1721 aproximadamente Em escritos enviados ao Conselho Ultramarino e ao rei agentes representativos da justiça local e régia apresentaram seus pontos em cartas ofícios e requerimentos11 A recorrência da afirmação sobre o envolvimento de mulheres naquelas pendências judiciais abre um leque de possibilidades interpretativas Dentre elas tentarseá verificar a invocação do feminino em linhas de acusação e defesa para compreender até que ponto tais menções a implicações daquelas personagens foram manipuladas ou reformuladas de forma a garantir a consecução de um discurso de acusação ou defesa deixandoo passível de ser entendido e atendido em seus objetivos estipulados As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 155 Incomodava aos homens do Senado da Vila de Porto Calvo o desrespeito do ouvidor pela jurisdição local a autuação da gente nobre da terra ou o acúmulo de dinheiro com a venda de devassas na região sobretudo em correição realizada no ano de 1717 Em um dos pontos da carta escrita em 06 de abril de 1720 inclusive apontouse o desprezo do juiz de vara branca pela reta administração da justiça uma vez que resolvia pendências jurídicas em sua residência vestindo apenas ceroulas recebendo e compartilhando sua morada com criminosos de quem era amigo Dentro daquele discurso formulado por homens de prestígio local bem estruturado e cheio de detalhes que João Vilela do Amaral precisaria responder em sua defesa foi enfatizada a existência de mulheres aliadas ao magistrado que por isso recebiam despachos viciosos em seu favor12 Do lado da acusação feita pelos moradores de Porto Calvo os contatos estabelecidos entre João Vilela do Amaral e mulheres da terra foram vistos com desconfiança e como evidência da quebra com os princípios judiciais13 Da parte do magistrado o argumento foi devidamente reutilizado em sua defesa na carta que escreveu em 15 de abril de 1720 Não é possível afirmar se o oficial de justiça já havia tido acesso ao ofício formado pela Vila de Porto Calvo 06 de abril de 1720 e consequentemente aos seus capítulos argumentativos Nos pontos escritos por Vilela ao monarca há notícias sobre as três vilas da Comarca e ao que parece o oficial régio encontrou sérias dificuldades para autuar em todas elas Os motivos de tais problemas advinham consequentemente de uma aura criminosa que em sua perspectiva circundava toda a região14 Segundo as informações contidas na carta de Vilela as mesmas pessoas que participaram de um ato de resistência à entrada do oficial em Porto Calvo no ano de 1719 eram as que continuavam agindo cruelmente em desperdício dos bens de órfãos e viúvas E o faço agora a Vossa Majestade para que mande tomar conhecimento desse caso fazendo castigar rigorosamente os culpados e cabeças destes motins pois é sem dúvida que os mesmos agora por falta de castigo vivem ainda com o mesmo ânimo de desobedientes cruéis e crimes pois não há órfão ou viúva que não chore o seu desamparo no desperdício que lhe fazem em seus bens nem pobre que se não lastima do mesmo 15 A utilização da posição de indivíduos fragilizados por seus estados e estatutos jurídicos16 foram um dos mecanismos discursivos utilizados pelo ouvidor para defenderse das acusações que lhe eram imputadas João Vilela do Amaral transpareceu preocuparse com o fato de que essas pessoas prejudiciais aos interesses das viúvas e dos órfãos também As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 156 maquinavam contra os mesmos ministros impondolhes o palco de tiranos Tal afirmação seguida da ênfase de que oficiais das câmaras vestiam uma capa de virtude demonstra a eficiente troca de lugar de um mesmo argumento discursivo baseado na moral e no jurídico levantado antes em seu prejuízo17 O final da equação do escrito levanos a questão a rigidez de sua atuação que será vista adiante poderia ser considerada como um erro ou desvio se sua finalidade era unicamente proteger aqueles que deveriam ser abraçados por sua jurisdição diante das más intenções dos poderosos e juízes rebeldes da terra Em outra carta escrita em maio do mesmo ano o magistrado reafirmou os danos causados a personagens específicos da Vila de Porto Calvo Numa entonação mais eloquente que a anterior os juízes e poderosos responsáveis pelo sofrimento de mulheres e crianças foram apontados como inimigos da paz e conspiradores contra ministros Segundo contava o ouvidor o principal objetivo das forças locais era livrar criminosos de seus castigos mesmo que para isso mulheres incapazes e pobres fossem seriamente atingidos Repetiu que eram as pessoas de dentro do aparelho jurídico local que faziam órfãos e viúvas se queixarem orarem e clamarem por justiça nos templos18 O oficial também ocupava o lugar de Provedor dos defuntos e ausentes19 o que explica o fato de seu instrumento de defesa apresentar os detalhes suspeitos sobre a execução de procedimentos judiciais envolvendo viúvas e órfãos Problemas de desvios de quantias ou bens pertencentes às viúvas e aos órfãos aconteciam na Comarca das Alagoas e pela América Portuguesa20 quase que da mesma forma que fora enumerada por Rui Gonsalves em 155721 O foco de análise nessas falas é o artifício da ênfase naquilo que foi vivenciado por mulheres e quais noções instintivas ou naturais teológicas e formais que tal artifício poderia suscitar nos leitores de tais pontos o Conselho Ultramarino e o rei É substancial compreender que esses registros incompletos ausência da indicação de seus nomes ou qualquer outro tipo de identificação de casos femininos possuem uma função para além de preenchimento de contexto de uma história contada Falar nas viúvas e em seus problemas como resultados da deficiência de uma via jurídica local implicava invocar os preceitos básicos da organização social lusitana22 Formouse um argumento discursivo fundamentado no respeito ao direito natural que enxergava um estatuto vigente da mulher como passível de proteção ou cautela diante de sua constante fragilidade e de sua inevitável dependência do sexo oposto Além dessa perspectiva o estatuto feminino também servia para dar forma à ação que se queria provar No caso de João Vilela do Amaral em suas cartas defensivas contra as As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 157 acusações da Vila de Porto Calvo podese notar uma prestação de contas a respeito de suas relações com mulheres Levantar questões tão básicas sobre a responsabilidade masculina perante a mulher girava ainda em torno de reafirmar a jurisdição de seu ofício23 e a função maior do monarca proteger aqueles que mais precisavam Naquelas curtas linhas que demonstravam e não apenas diziam a respeito dos males causados as mulheres viúvas podese perceber a utilização de palavras como chorar queixar orar e clamar em contraponto com a crueldade criminalidade desamparo e o desperdício Buscavase transpassar o que se pensava e sentia sem deixar de estar de acordo com o regimento e tradições judiciais lusitanas24 Tais mecanismos discursivos não eram caminhos utilizados como atalhos colaborativos para êxito jurídico apenas pelo ponto de vista de homens letrados reinóis A Vila de Penedo em 1722 montou um discurso que partia do ponto de vista da defesa daqueles que sem voz natural jurídica precisariam de intermediários que defendessem os seus interesses Editais haviam sido publicados nas praças das vilas sulinas de Pernambuco em nome de recolher informações sobre o ouvidor Vilela do Amaral era o processo da residência do magistrado que se iniciara O documento que chegara com atraso considerável na Vila de Penedo não deixou de ser respondido pelos oficiais locais Os membros da câmara se reuniram na casa do Juiz Ordinário João Dantas Aranha para dar conta de responder ao instrumento público informando ao Desembargador da Relação da Bahia Jozeph de Lima Castro25 acerca dos procedimentos de Vilela o oficial estava incumbido de tirar a residência do magistrado em questão26 Para validação do ofício composto após a data prevista apontouse a distância da Vila das Alagoas donde o documento deveria chegar bem como o atraso na publicação em praça pública da região como pontos que deveriam ser considerados Houve ainda a suposição de o edital ter sido transportado sob a responsabilidade de um escravo do magistrado na berlinda João Vilela do Amaral27 A motivação que nos interessa aqui observar diz respeito a situação social e financeira ao sexo e estado das pessoas que apresentavam as queixas evocadas como motivo do atraso e da necessidade em registrar reclamações mesmo assim E os queixosos serem homens pobres e mulheres viúvas graves que não podem por pobres e miseráveis irem fora desta Terra e por esta causa apresentavam a este Senado Suas queixas por escrito que logo o procurador deste Conselho e Sindico em Seu nome e do mais Povo apresentaram Requerendo ao dito Senado e Juiz Recebesse sua queixa 28 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 158 Os estados e as qualidades dos queixosos devem ser observados dentro desse escrito Foi uma forma de argumentar estabelecer e legitimar a coleta de testemunhos e o registro de acusações contra João Vilela do Amaral apesar do desembargador da Bahia responsável por tirar a residência já haver se retirado da comarca Tratavase de assuntos do bem comum e da autuação que possuía cinquenta e quatro capítulos contra o ouvidor Doze testemunhas depuseram diante do juizado local para a produção do ofício da Vila de Penedo ao rei entre os dias de 14 e 16 de março de 1722 e todos fizeram alusão a sérios problemas contra o ministro real De acordo com Antonio Caetano pela qualidade destas testemunhas conseguimos detectar que os mesmos formavam a nata daquelas vizinhanças29 Eram situações vividas por súditos e súditas É importante ressaltar Todos pelo menos é o que se pode interpretar no princípio buscavam o remédio régio para suas aflições e perturbações explicitavam seus casos à câmara local em nome de salvaguardar o equilíbrio e a paz da vila A presença de capítulos que apontavam o envolvimento de personagens femininas não ficava apenas no campo do fator indicativo de apelação pois suas más experiências ocasionadas pelos serviços do ouvidor também foram devidamente comprovadas pelas testemunhas depoentes Ao longo do ofício se tem contato com depoimentos que de fato apontavam viúvas no plural que teriam sido seriamente prejudicadas pela ação de João Vilela do Amaral Há uma afirmação em específico de que mulheres sem marido vivo e que se encaixavam num estado grave e pobre teriam sido seriamente atingidas Contudo só é possível identificar uma senhora representada juridicamente por procurador e recorrentemente denominada como de uma nobreza reconhecida naquela terra Ora a única mulher viúva apresentada como grave não parecia ser pobre ou miserável para além do que aquela invocação discursiva poderia supor30 Era Maria Vieira de Albuquerque que havia se recusado a pagar preço estipulado por devassa ao ouvidor antes quisera ela perder 04 mil cruzados31 Utilizando os cálculos de RussellWood o montante em réis seria de 192000032 o que daria para comprar vários bens de boa qualidade como escravos animais e equipamentos para casa e lavouras Essas linhas que numa visão mais cautelosa se apresentava relativamente desconexa com os fatos expostos no mesmo documento não terminam por aí No Capítulo 13 das acusações o assunto das mulheres volta ao foco e o registro afirmava pontos que permanecem em aberto Capítulo 13 Prendia em cadeia Pública mulheres casadas por concubinadas sem mais publicidade que do seu malévolo ânimo e depois de ser bem pago pondo em perigo as vidas dos sujeitos envolvendo nesta matéria aos Sacerdotes e dando As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 159 lhes sentenças injuriosas e observandolhes condenações só a fim de destruir o estado Sacerdotal pela pouca Reverência que lhe tinha e pondo sérvio ao Convento Franciscano e violando a imunidade dela e mandando prender Religiosos e atirandolhe no presídio Desacatava também nossa honradas filhas de Pais Nobres prendendoas na cadeia Pública obrigando por esta ação aos Pais a alguma Ruína e excesso33 O trecho mencionado já faz parte do ofício em si e as viúvas anteriormente mencionadas apareceram em capítulos separados ao longo do escrito No capítulo apontado acima figuravam as mulheres casadas e as moças honradas filhas de Pais Nobres que foram presas e desacatadas Assim primeiro tinhase as viúvas apresentadas no plural comprovadas no singular paradoxalmente graves e pobres demais mas que conseguiram enviar suas queixas por escrito a câmara o que em teoria requereria no mínimo auxílio jurídico de um procurador além de dinheiro para pagar os emolumentos aos responsáveis Depois eram representadas as moças donzelas no plural e não há identificação de descendentes da gente nobre da terra além de Joana Vieira filha de Maria Vieira de Albuquerque nos capítulos e testemunhos destrinchados Podese apontar assim uma fórmula comum presente no documento analisado apresentavase queixas de maneira geral utilizandose de elementos discursivos que davam a impressão de uma realidade que não necessariamente seria comprovada pelos depoimentos das testemunhas Isso pode ser compreendido como desenvolvimento de mecanismos discursivos excessivos e apelativos para se fazer sentir crer e atender Tal estratégia de escrita certamente se tratava de uma maneira de contar o que aconteceu A ideia central em problematizar essa via argumentativa no entanto é trazer esses feitios a tona como partes integrantes e essenciais no desenvolvimento e manutenção de uma linguagem jurídica própria da época34 Onde para a consecução de uma forma de realizar e enviar pedidos ao monarca o indivíduo se posicionava como súdito reconhecedor dos principais elementos constitutivos do ordenamento social lusitano e devidamente encaixado nas ideias representativas da hierarquia social e jurídica em vigência35 Se deixássemos de lado a interrogação e as confusões da exata identificação do número de personagens femininas que foram envolvidas em tais pleitos é interessante observar que a contradição do grave e pobre ainda possuiria passividade de interpretações como esta Pois adquiriria características demonstrativas de apelação da mesma maneira enfatizando que as ações incorretas do ouvidor era a causadora da desordem hierárquica a ponto de graves e pobres36 ficarem sob o mesmo patamar de uma suspeita que As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 160 desrespeitava posições sociais distintas Aí a ação do ouvidor interpretase levava todos à condição de pobreza devido a amputação de diversas formas de defesa e sobretudo a dependência que a Justiça local devia à jurisdição prejudicial de João Vilela do Amaral Os pontos invocavam diretamente a responsabilidade estratificada entre Coroa seus agentes e súditos em manter o bem comum para o desenvolvimento da monarquia Relembra se a função do rei na manutenção das jurisdições básicas e formais de um direito local e costumeiro que foi colocado em cheque por um de seus homens A Justiça real deveria ser certeira e pontual dando sentido a sua derivação do direito divino Os excessos ou contradições apelativas típicos de uma sociedade substancialmente relacionada com o visual não devem deixar de ser considerados como formadoras de uma conduta jurídica no século XVIII37 Aqui isso é concebido como um elemento que dava sentido a todo um mecanismo simbólico38 e característico da época Falase de um discurso que perpassava juízes locais e de fora procuradores e indivíduos particulares e que por isso deve ser compreendida como uma especificidade da linguagem jurídica forjada naquela época Desde momentos como estes há a possibilidade de compreender uma interligação entre linguagem comum e a judicial39 Encontravase naqueles discursos e em suas formas retóricas de levantar acusações construir defesas ou encabeçar pedidos uma eficiente ativação jurisdicional no leitor Para identificar profundamente onde esse mecanismo poderia levar e quais concepções poderiam suscitar é interessante visualizar outros casos como o pedido feito pela câmara da Vila das Alagoas em 28 de abril de 1730 Este terço dos Paulistas é Universal sossego das freguesias de Pernambuco e especial desta Comarca por ser a que padecia mais Sanguinolentas hostilidades do negro rebelde que tendo ocupado as montanhas do Continente dos Palmares Tão desumanos se faziam que não só tiravam vidas e roubavam fazendas mas ainda debaixo de armas se guardavam as honras das donzelas e casadas 40 A importância em manter o Terço dos paulistas em território alagoano foi destrinchada pelos homens do Senado da Vila das Alagoas que se sentiram obrigados a dar notícias sobre a utilidade do comando militar sobretudo diante do cargo que exerciam Os ofícios nos quais estavam servidos eram a principal argumentação que direcionava aquele requerimento mas também a necessidade da manutenção do bem comum daquela comunidade O sentimento de responsabilidade como homens e administradores locais da justiça fundamentava a indicação das personagens femininas Sua presença e vidas em perigo eram um dos elementos e concisos para reafirmar a utilidade vital do auxílio daquele terço na As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 161 região Percebese mais uma vez nesse ponto argumentativo a manipulação da presença e do estatuto social e jurídico feminino como sujeito a jurisdição de seus maridos de agentes de justiça local ou de fora e mesmo do rei que viria a resolver a questão Observese que naquele escrito era a ideia da proteção à mulher o que amparava a defesa apresentada pela câmara das Alagoas defesa esta que fundamentava uma de suas razões de existir justamente na responsabilidade sóciopolítica daqueles incumbidos em administrar a justiça41 O discurso seguia estabelecendo como uma das principais preocupações as muitas ameaças de negros levantados e bárbaros que segundo contavam andavam armados e violentos tendo sido responsáveis pela tirada de honra de moças donzelas e casadas42 O relato mostrava a consecução da reação de negros e índios na região e de uma maneira luso brasileira de enxergava o lugar da mulher e sua honra como dependente diretamente dos homens que as administravam e àquela terra Salvaguardar aquelas que eram brancas eou honradas dentro dos estratos privilegiados daquela vila A importância em manterse o Terço Paulista em solo lusopernambucano não tinha a ver apenas com a presença de mulheres naquela região E isso não significa descaracterizar a perspectiva de que o direito costumeiro deveria ser respeitado diante de mulheres e estava sendo aclamado ali Como indivíduos fragilizados e de características outras derivadas do mesmo ponto é provável que a utilização de seus exemplos e de sua ameaça constante tenha dado um sentido moral aquele discurso para justificar ou complementar os elementos administrativos e econômicos que estariam em jogo Em primeiro lugar as honras a ser protegidas estavam ligadas diretamente às dos homens com quem estivessem envolvidas Segundo mulheres certamente foram violadas ou sequestradas naqueles conflitos advindos principalmente daquela circunstância econômica religiosa e social latente Mas também havia engenhos sob alerta sendo invadidos roubados e plantações queimadas Visto esses detalhes a alçada daquele requerimento ganha proporções que certamente não diziam respeito unicamente à questão feminina tratavase do bem comum43 no geral onde o feminino dava fundamento e servia de plano de fundo legitimador da argumentação mais passível de respostas favoráveis a consecução daquelas forças armadas na Vila das Alagoas A necessidade de dialogar com essas menções e com as concepções básicas que elas proporcionavam pode ser visualizada em diferentes momentos e vilas da Comarca das Alagoas Implica ressaltar que era um mecanismo retórico presente também em petições e requerimentos por possuir características apelativas que se transformavam em uma estratégia eficiente para instigar o leitor emotiva e moralmente perante o qual fariam avaliação do que As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 162 estava sendo proposto O significado próprio para aquele momento do Antigo Regime luso brasileiro adivinha do questionamento do que seria preciso expor para fortalecer uma queixa uma defesa ou para receber a aprovação de um pedido Daí essa ideia em reafirmar a responsabilidade social e jurídica masculina ressaltandoa como um componente poderoso nos discursos que interagiram diretamente com o estatuto e a posição social da mulher A priori essa parece ter sido a circunstância que fez aparecer a mulher e família do alferes Bento Rebelo Pereira no requerimento datado por volta de 1725 E o não ser o crime daquela qualidade que necessita de semelhante cautela e castigo porque de outra sorte não só poderá passar a vida metido em hua prisão injustamente mas ficaria sua mulher e família em sumo desamparo ao que se deve atender Espera real mercê44 O oficial morador na Vila das Alagoas estava sendo acusado por um crime do qual segundo ele era inocente Ao pedir que se refizesse todo o processo de devassa Rebelo Pereira evidenciou sobretudo o desamparo a espreita de sua mulher e família caso a resposta do rei fosse negativa A resposta positiva ao seu pedido chegara através do Conselho Ultramarino em 30 de agosto de 172545 Em outro momento o sacerdote João Velho Barreto morador na mesma região pediu autorização para advogar na Comarca das Alagoas e valeu se de uma articulação argumentativa semelhante Seu discurso fundamentouse em três principais pontos o fato de seu pai ter exercido por mais de quarenta anos como advogado o pouquíssimo número de advogados naquela região e por fim a necessidade de obter o ofício para sustentar seus pais já velhos e também suas três irmãs possivelmente solteiras Sua provisão foi aprovada em 16 de janeiro de 173046 Há a possibilidade de que as manifestações sobre as mulheres aqui analisadas todas tenham se valido do estatuto jurídico daquelas personagens mais em favor de interesses e menos no sentido de representação das causas diretas ou não daquelas lusobrasileiras O que não há como negar é que aqueles agentes colonizadores foram cientes da vigência de direitos fundamentados na proteção da honra feminina bem como da vigência de um pensamento a respeito da natureza questionável daqueles mesmos indivíduos Isso é percebido não só por parte da justiça régia mas também na via da municipal Tornase palpável que houve poucas transformações nos Trópicos do que dizia a teologia e lei em Portugal sobre o ser mulher De um lado mais complexo não ficam vetadas outras opções de análises tais quais as afinidades de súditas da Comarca das Alagoas com o Direito e Justiça Partir da perspectiva da análise do conteúdo dos requerimentos e ofícios contudo permite um melhor entendimento do que As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 163 aquela sociedade compreendia por justo sobretudo quando seus interesses ou manutenção de suas posições sociais estavam em cheque As mulheres como empecilhos para a execução da Justiça na Comarca das Alagoas Esse texto foi aberto com a apresentação dos conflitos vividos por João Vilela do Amaral na Comarca das Alagoas entre os anos de 1716 e 1721 Dentre eles apontaramse as acusações das Vilas de Penedo e Porto Calvo a respeito do envolvimento do ouvidor com mulheres que possuíam pendências judiciais Observar a utilização daquele argumento como estratégia discursiva jurídica apresentase como consequência de duas qualidades opostas que podiam ser direcionadas para personagens femininas Assim o apontamento para casos vividos por aqueles indivíduos era passível de se tornar um argumento de acusação ou defesa Ficava em aberto a possibilidade de registrar dificuldades sofridas por mulheres e a de explicitar momentos em que estas teriam sido causadoras de desconfortos sociais e morais que acabavam por interferir em procedimentos jurídicos Tudo em acordo com o estatuto social e jurídico feminino Vejase o caso do padre Manoel Álvares Pereira que servia na Igreja de Nossa Senhora do Rosário desde pelo menos a década de 1750 quando foram aprovados seus mantimentos de côngrua47 Diferente de seu antecessor Caetano Dantas Passos que deixou o templo com o certificado por ter prendido um feiticeiro muito procurado48 Manoel Álvares teve acusações levantadas contra ele pela via da câmara da Vila de Penedo recorrem os oficiais da câmara da Vila do Penedo a representar os notórios vexames e grandes opressões que os moradores deste termo ou freguesia têm padecido e sofrem atualmente pelo tirano despotismo com que o Pároco dela Manoel Álvares Pereira incitado da mais inordinada sic cobiça de seus maus escandalosos costumes se faz digno de que corregendo Vossa Majestade juntos excessos ampare com o oportuno remédio os seus aflitos vassalos Tem sido este cura de Almas pelo seu exemplo mais idôneo para viver entre feras no Deserto do que pastor indigno entre o seu Rebanho da Igreja 49 A carta é datada de 22 de setembro de 1765 e nela os agentes camarários apontaram que a cura de almas estava em jogo pois o único remédio oferecido pelo padre para as chagas de suas ovelhas era o veneno mais pestífero de seu sensual proceder Há mais de 14 anos em exercício Manoel Álvares Pereira não reserva problema nem casada de que há tido filhos e com algumas longo e ilícito trato50 Diante de tais circunstâncias prostrados aos reais pés do monarca Pay os oficiais daquela câmara objetivavam o pedido de substituição As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 164 do pároco por um com mais zelo doutrina e exemplo51 que livrasse de todos os males o íntimo de suas almas52 Naquele escrito a câmara de Penedo fez questão de ressaltar o perigo moral que paradoxalmente o padre Manoel Álvares Pereira representava para os moradores da vila Isso é percebido através da visualização de escolha de palavras como vexame escândalo indigno veneno cobiça todas colocadas no sentido de formar uma acusação introdutória demonstrando a falta de compromisso ético com os princípios básicos de um pensamento político e religioso em vigência É importante refletir sobre as representações do feminino naquele discurso montado Ali as mulheres assumiram lugares que lembram características e traços negativos que as viam como vulneráveis a assuntos ligados à sexualidade e à luxuria Não se exclui a possibilidade do escrito ter servido como defesa daquelas personagens das garras do eclesiástico mas apesar dos procedimentos negativos de Manoel Pereira não é possível deixar de perceber parcela da culpa sendo desviadas para elas já que nenhum adjetivo ou outra forma de argumento foi utilizado em favor das mesmas53 Para uma mulher a honra estava diretamente ligada a ideia do que se dizia a respeito dela54 assim como também o era para os homens55 Se era de conhecimento de todos o envolvimento daquele sacerdote com as esposas de homens daquela localidade o pedido para que se enviasse outro religioso capaz de administrar as almas era mais que esperado Os oficiais pediam justiça para seu caso e entendiam as mulheres como passíveis de seus cuidados mas também de suas penalizações como se sua paz ou inferno fosse diretamente ligada a ideia de bem comum56 Compreendiam essas personagens como catalisadoras de argumentação jurídica onde suas causas ou maus procedimentos eram complementares em petições enviadas ao monarca lembrandose da importância em executar a Justiça e em garantir direitos para aqueles que se encaixavam nos principais preceitos ocidentais e católicos como súditos da Coroa portuguesa Se foram citadas para defesa ou acusação ambas as linhas interpretativas devem ser percebidas sob o prisma de um sentido jurídico O discurso demonstrava representações da mulher e habilidades de utilização de seu estatuto judicial e presença encaixandoas como alicerces para o alcance de benefícios gerais objetivando êxitos particulares Percebese esse artifício como parte de uma fórmula adotada para questionar atitudes de autoridades religiosas agentes jurídicos ou outros indivíduos E apesar de sua grande recorrência não devem ser direcionadas ao lugar de meros modelos de requerimentos e petições57 É necessário interpretálas a fundo para responder até que ponto foi inerente à manipulação de As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 165 uma linguagem jurídica típica do Antigo Regime português e em suas conquistas desenvolvidos e flexibilizados sobretudo na primeira metade século XVIII58 Para melhor acepção de tal hipótese cabe ressaltar e analisar que para além da preocupação com o envolvimento de mulheres da terra em tratos ilícitos com aquele padre havia questões outras que a Vila de Penedo deixava evidente na carta Registrouse no mesmo escrito que o eclesiástico Manoel Pereira foi acusado de ter sentenciado os fregueses da região e a probabilidade de ter se tratado de condenações por concubinato59 tornase coerente visto a que segunda acusação ao religioso foi a de simonia60 realizada através do impedimento que vinha impondo aos moradores da localidade de se casarem fora da Matriz em associação com a taxa de preços exorbitantes para prestar tais sacramentos Cientes de que o crime tão recorrente na América portuguesa61 estava salvaguardado não apenas para a jurisdição eclesiástica mas também pela civil foi dito que Manoel Álvares Pereira estaria desprezando com essa usurpação as constituições e leys de Vossa Majestade pelas quais costuma atender ao aumento e conservação dos seus leais vassalos62 O conjunto geral de tal discurso no que implica analisar aqui revela que os casos ilícitos verdadeiros ou não foram estipulados como alicerce para retirar quaisquer resquícios de moralidade que o pároco pudesse possuir Por se tratar de um homem religioso obviamente o choque que o envolvimento de mulheres casadas nesses relacionamentos ilegais exerceriam no leitor visto a consecução através do tempo a concepção de filhos sacrílegos e a implicação também no crime de adultérios não foram nem eram computados separadamente de outros argumentos de mais peso Porém o padre Manoel Álvares Pereira também foi acusado de desestabilizar os cofres da Irmandade local de deixar de administrar os sacramentos e de nunca ter ensinado a doutrina cristã aos seus fregueses mesmo quando do período da quaresma de passar maior parte de seu tempo jogando cartas de desrespeitar particulares magistrados e o Senado com descomposturas e de interferir em assuntos jurisdicionais63 A partir da contabilização de todos esses argumentos a visualização de mulheres que direta ou indiretamente desviaram os rumos da justiça serviu para dar forma final ou introdutória às informações preocupantes que enviaram a D José64 tornando plausíveis os pontos anteriores já que desde o início apontou se o descaso do padre desobediente às leis divinas e régias Esboçouse um discurso repleto de argumentos devidamente interligados de modo a apresentarnos uma maneira eficiente de levantar queixa contra alguém e mais importante de ressaltar a importância da interseção do monarca na resolução de seus conflitos As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 166 Mas aquela não era a primeira vez que a Câmara da Vila de Penedo lidava com uma situação parecida muito menos que partiria dessas estratégias discursivas de cunho jurídico Suas reclamações a respeito da administração da justiça pela via do magistrado João Vilela do Amaral contou com os mesmos tipos de artifícios quarenta e três anos antes O ouvidor foi atingindo com uma série de acusações e desdobramentos das mesmas no ofício que a vila enviou ao rei em março de 1722 Em meio a tantos choques causados pela sua atuação registrouse Capítulo 15 Tinha ajuntamento com diversas mulheres em que dava bastantemente escândalo e ruim exemplo por ser pública a Sua lascívia e aquelas que traziam pleitos no seu Juízo em Certo terem Sentenças a seu Favor contra todo o direito e justiça65 Era inerente à montagem de um texto acusativo problematizar as ações de um indivíduo ou de um grupo evidenciando aspectos negativos que comprometiam sua respeitabilidade Para tal as cartas e ofícios enviados pelas vilas da Comarca das Alagoas contaram com estas argumentações apontando defeitos de ordem econômica política jurídica mas também moral Quando se tratou de implicar moralmente João Vilela do Amaral um capítulo em separado fora destinado a tratar desse assunto Apresentaramse as complicações que sua pública lascívia oferecia aqueles povos e que estaria atingindo diretamente a execução da justiça de modo a desestabilizar a ordem e o equilíbrio das coisas bem como exorbitar uma jurisdição em contrário ao aparelho jurídico disponível a nível local Longe de querer transparecer como a câmara da salvação os oficiais da Vila de Penedo auto afirmaramse como humildes vassalos Sua humildade no entanto não desprezava suas concepções das funções jurisdicionais de suas posições do ouvidor e do rei Diante da necessidade do envio de homens de justiça pela Coroa portuguesa aqueles súditos salientaram seus desconfortos e não pouparam tinta na hora de estabelecer uma série de motivos pelos quais só o remédio régio solucionaria aquelas pendências Em outros momentos o argumento moralreligioso se tornava uma frente de ataque A impressão que fica é a de que por onde passava João Vilela do Amaral iniciava relacionamentos amorosos ilegítimos não se importando nas consequências contraditórias que aquelas atitudes levariam à execução da Justiça naquelas terras66 Isso é dito a partir da constatação de uma aproximação dos argumentos da Vila de Penedo e da Vila de Porto Calvo A semelhança argumentativa pode revelar uma sincronização proposital ou não entre as vilas que fizeram questão de apelar a respeito dos incômodos morais e jurídicos que João Vilela do Amaral causara naqueles anos de sua atuação 17161720 Não descartando tal possibilidade As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 167 enxergase a reutilização de acontecimentos de maneira que eficientemente pudesse desenhar um quadro onde um ouvidor desobedecia suas funções delegadas pelo o rei e viveria em desacordo com os princípios católicos vigentes A Carta da Vila de Porto Calvo utilizou três capítulos para apresentar suas perspectivas a respeito dos serviços de João Vilela do Amaral Capítulo 5 que tinha conta com várias mulheres assim solteira como casada que perante ele tinha requerimentos Capítulo 7 que muitas vezes se ocultava as partes por estar divertindo com as concubinas de que havia detrimento grande nas partes por cuja causa se demorou dando tempo Capítulo 12 que nesta mesma segunda correição se concubinou com umas mulheres casadas dando escândalo por cuja causa fez algumas Sem Razões como fora dar Carta de Seguro a Antônio Pinto de Mendonça sem alvará por haver fugido da prisão em que estava tendo lhe negado muitas vezes e aceitou do dito criminoso uma caixa de açúcar67 O ponto em comum com o ofício de 1722 da Vila de Penedo se dá na percepção deste discurso como intimamente relacionado com os questionamentos sobre a capacidade de administração da Justiça pelas mãos de tal magistrado O envolvimento de mulheres em tais procedimentos judiciais sublinha não só o desrespeito ao matrimônio e as derivadas regras que a Santa Igreja Católica impunha A menção a tais acontecimentos desemboca na fundamentação de uma acusação que questionava a jurisdição de João Vilela do Amaral como homem e como oficial do rei Ora é inegável que tanto na carta de Penedo quanto na de Porto Calvo o ouvidor da comarca é citado dando a entender que além de se deixar cair no pecado do concubinato se deixava dominar por esses deslizes infringindo seu regimento68 e as intenções da manutenção do desenvolvimento da monarquia viabilizadas pela Coroa Essa mesma mensagem composta num todo mesclado de ideologia política religiosa e jurídica foi utilizada em outros momentos de conflitos com agentes externos ao aparelho judicial local O sucessor de Vilela do Amaral Manoel de Almeida Matoso que colaborou intensa e intimamente para a constituição de muitas queixas contra seu antecessor elevadas ao monarca69 não ficou livre de tais deslizes segundo o desembargador da Relação da Bahia António do Rego de Sá Quintanilha70 De acordo com as notícias que Quintanilha passara para o rei a respeito da residência que havia tirado é possível identificar mais de uma vez o uso da menção do envolvimento de mulheres nos caminhos da execução da justiça Em julho de 1726 um dos capítulos é composto por Do capítulo 1 se prova por muitas testemunhas que o Sindicado Manuel de Almeida Matoso que tomou posse do lugar de Ouvidor andando de noite de corroído em algumas casas de gente honrada com o pretexto de buscar criminosos corroído As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 168 para ter mulheres Depõe também por todas as testemunhas que uma negra escrava de boas partes o Sindicado lhe induziu a dita negra e meteu em sua casa aonde teve publicamente amancebado com ela 71 Logo dentro dessa circunstância a presença feminina e seu envolvimento em tais litígios possuía a mista carga moral e jurídica tão recorrente quando o assunto era a mulher dentro dos discursos daquelas câmaras No caso em questão uma especificidade importante de se observar é a fundamentação de tais afirmações baseados em testemunhos e a produção do documento a partir de um personagem externo Nesses termos fica em aberto duas formas de enxergar a contabilização de tais feitos ambas relacionadas diretamente com os questionamentos que direcionaram os depoimentos ouvidos por Antônio Quintanilha e a principal fonte de constituição dessas mesmas perguntas Dentre as duas perspectivas não foge a ideia da concepção acerca da necessidade de implicar indivíduos em áreas morais de sua vida social A incompatibilidade com seu ofício ficou evidenciada e destrinchada a partir das constatações de que andava de noite com o objetivo de para ter mulheres Em seguida descreveuse em detalhes o amancebamento do ouvidor com uma negra escravizada o que certamente teria cargas negativas diante da colocação das falas sobre Manoel de Almeida Matoso ter induzido a mulher e a metido em sua casa72 A adaptação a respeito da menção de tais casos leva as considerações anteriormente destrinchadas Falar de mulheres que foram vítimas ou criminosas fazia parte de um argumento estratégico que reincidia nos capítulos acusativos seguintes dando a eles um sentido de ser e cargas de validade Representava uma visualização preocupante que a Comarca das Alagoas possuía da ação de seus administradores régios Por mais que em âmbito civil tais crimespecados não recorressem de maneira cem por cento eficiente preenchiase tal lacuna com explicitação dos problemas que causavam fossem em questões de imputar exemplos ruins àquela sociedade e às suas mulheres ou forjar uma Justiça parcial e em desacordo com os elementos necessários à manutenção do bem comum Quando o objetivo foi levantar queixas contra os procedimentos de agentes de justiça advindos do reino as vilas acima mencionadas foram categóricas em afirmar que em suas terras também haviam mulheres indignas que agiam de acordo com seus desejos íntimos e desrespeitava os conselhos religiosos a respeito de seu comportamento73 Esse ponto de vista não poderia deixar de constar aqui pois a coexistência dele com a descrição dos casos anteriormente analisados pela via de homens do Senado demonstra que a sociedade que se As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 169 formava ao sul da Capitania de Pernambuco inteiravase com o desenvolvimento desde Portugal de lugares que o sexo feminino poderia ocupar Eram boas ou más e não se pode afirmar com certeza até que ponto as meio termo puderam ser reconhecidas como capazes de lutar contra sua própria natureza74 Sobre a produção de argumentos jurídicos de defesa e acusação identificase as possibilidades de menção ao sexo feminino Constituídos a partir do objetivo de explicitar desvios de conduta moral de agentes responsáveis em administrar a justiça ou a doutrina cristã tais discursos colocavam em movimento uma linguagem jurídica que se camuflava com as concepções naturais sobre o que era justo No geral apontar o concubinato como a consecução de um mau costume que poderia incitar exemplos ruins demonstraria integridade do acusador em defesa dos princípios cristãos Atingiriam ainda seu fim de legitimar um campo que se fechava em si mesmo manipulando situações e acontecimentos de forma a forjar artifícios que lhes eram próprios e que possuíssem a passividade de despertar no rei ou em seu Conselho Ultramarino noções básicas sobre o feminino e sobre a fragilidade moral de determinados indivíduos Já foi mencionada a defesa do bacharel que fora ouvidor das Alagoas João Vilela do Amaral Não é muito difícil de pensar no perfil social daquelas que foram maiormente prejudicadas pelos homens leigos com ofícios jurídicos Certamente mulheres que não possuíam cabedal para a contratação de advogados mas administradoras do suficiente para chamar a atenção da Justiça Diante da falta deles em solo alagoano a situação se complica ainda mais pois por onde agiriam numa ambiente em que sua voz só se tornava audível através de um homem É provável que acusações que implicaram João Vilela do Amaral e mesmo Manuel de Almeida Matoso terem sido apenas confusões Há a possibilidade de terem quebrado o que lhe previam o regimento de seu ofício sim aconselhando partes ou tomando partido de suas causas Mas isto pode ter acontecido em nome de auxiliar mulheres desamparadas no seio da justiça local impregnada de interesses de grandes homens ou daqueles que almejavam a consecução de uma posição forjada no embaraço de outrem Para esses objetivos certamente as mulheres tão subestimadas doutrinal e juridicamente serviram como encalço quase que perfeito Sua capacidade em desenvolver relações com as pessoas certas no entanto pode ter sido essencial para quebrar essas amarras Ou por outro lado teriam que se conformar com defesas ocultas passageiras capazes de prejudicar seus ofensores mas sob a condição de reafirmar um jogos sociais que a subordinavam por todos os lados O jogo social era conhecido de todos dentro daquela comunidade As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 170 Conclusão O propósito da observação das mulheres sem nome é obter uma análise geral sobre seu estatuto jurídico e das possibilidades de flexibilização e manipulação do mesmo em discursos e objetivos que podiam lhes ser inclusive alheios Diante de tal problema foram problematizadas as menções a mulheres dentro de escritos de acusação e defesa produzidos por agentes locais de justiça que exerceram jurisdição na Comarca das Alagoas Isso para se ter acesso a percepção daquela região a respeito das personagens femininas e dos rumos jurisdicionais que poderiam acarretar Dentro das discussões propostas pode ser afirmada o comum ou corriqueiro como representantes de um aparato doutrinal e jurídico em vigência da América portuguesa Dizer isso implica realçar que as falas que a priori podem ser encaixadas unicamente no âmbito apelativo na verdade revelam conexões fortes com a ideia de direito natural local e régio Em outras palavras as investidas na criação de artifícios narrativos não dissimulam a moral ou a verdade em que se pautava Ao fazerem referência à presença da mulher mostrouse uma concepção acerca do estatuto jurídico feminino em voga Viuse que em algumas horas sua existência era associada a ativação das funções protetivas das câmaras em relação as senhoras e a população e em outras foram apontadas como causas dos desvios da justiça executada pelas mãos de magistrados régios Além dessa clara demonstração e adequação aos preceitos teológicos e doutrinais sobre o feminino aqueles discursos evidenciavam ou queria fazer evidenciar a implicação de tais indivíduos no aparelho jurídico alagoano Invocavase as principais responsabilidades masculinas em manter o equilíbrio e a paz para o bem e desenvolvimento da monarquia e salvaguardavam as funções do rei e do direito local que havia sido colocado em cheque Não é difícil contabilizar na interpretação de tais alusões as mulheres a possível influência indireta ou informal daquelas agentes sociais dentro do convívio jurídico local Apesar de serem apresentadas como argumentos para um fim também podem ser representativas de aspectos de poder que o grupo feminino pôde utilizar Nessa linha de raciocínio é preciso compreender que o arcabouço discursivo forjado em sua defesa diretamente ou não demonstrava especificidades judiciais que podiam dissimular seus pormenores uma vez colocados sob a perspectiva leiga A relatividade do poder que as mulheres poderiam alcançar naquele período se faz presente a partir daí Pois a entrada no As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 171 âmbito jurídico da Comarca das Alagoas do século XVIII implicava enquadrarse nas expectativas que seu estatuto lhes permitia Assim forjaramse meios de consecução de seus preceitos a partir da manipulação argumentativa pela via judicial que passava a impressão de possibilidades de êxito e de poder Poder este ainda subordinado submisso e somente possível de acordo com requisitos e outras sujeições Notas 1 Procurar melhor entender o termo jurisdição ver HESPANHA António Manuel Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime In Idem Poder e instituições na Europa do Antigo Regime Coletânea de textos Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1984 p 36 CARDIM Pedro Administração e governo uma reflexão sobre o vocabulário do Antigo Regime In FERLINI Vera Lúcia BICALHO Maria Fernanda Orgs Modos de Governar São Paulo Alameda 2005 5457 2 HESPANHA António M Imbecillitas As bemaventuranças da inferioridade nas sociedades de Antigo Regime São Paulo Annablume 2010 pp 101138 3 HESPANHA António Manuel O estatuto jurídico da mulher na época da expansão In A política perdida ordem e governo antes da modernidade Curitiba Juará 2010 pp 131145 ALMEIDA Suely Creusa de O Sexo Devoto normatização e resistência feminina no Império português XVIXVIII Recife Editora Universitária UFPE 2005 pp 19128 PRIORE Mary Del Ao sul do corpo condição feminina maternidades e mentalidades no Brasil Colônia 2ª Edição São Paulo Editora UNESP 2009 4 Todos os documentos utilizados nesse texto advém do Catálogo de Documentos Manuscritos Avulsos referentes à Capitania de Alagoas Existentes no Arquivo Histórico Ultramarino e podem ser consultados no Centro de Pesquisa e Documentação Histórica CPDHis da Universidade Federal de Alagoas onde encontram se em formato de CDROM digitalizados 5 As informações retiradas deste conjunto serão tratadas através do método interpretativo do paradigma indiciário e análise de conteúdo já que geralmente constarão análises realizadas a partir de pequenos rastros que possibilitam considerações para além do que oficialmente dizia respeito BARDIN Laurence Análise de Conteúdo São Paulo Edições 70 2011 pp 2052 GINZBURG Carlo Mitos emblemas sinais morfologia e história São Paulo Cia das letras 1989 pp 143180 6 Iniciada a partir de estudos do russo Mikhail Bakhtin BAKHTIN Mikhail Marxismo e Filosofia da Linguagem São Paulo Hucitec 1995 PÊCHEUZ Michel O discurso estrutura ou acontecimento Campinas Pontes 1990 Semântica e discurso uma crítica à afirmação do óbvio Campinas Editora UNICAMP 1988 7 O que significa dizer que partiuse de estudos a respeito de normas jurídicas estabelecidas para as mulheres desde pontos na literatura jurídica que buscavam compreender o feminino até os direitos privilégios estabelecidos em consideração da especificação do sexo e de um indivíduo que não era considerado capaz de autogoverno HESPANHA Op Cit 2010 pp 105136 8 Por literatura judicial lusitana referese a vigência de códices e alvarás régios que serviam de fundamento e auxílio para a concepção e aceitação de uma hierarquia HESPANHA Op Cit 2010 HESPANHA António M Cultura jurídica europeia Síntese de um milênio MiraSintra Publicações EuropaAmérica 2003 HESPANHA António M Fundamentos antropológicos da família de Antigo Regime os sentimentos familiares e A representação da sociedade e do Poder In HESPANHA António Manuel coord História de Portugal o antigo regime vol IV Dir José Mattoso Lisboa editorial estampa 1992 9 O tipo de análise que será encontrada nesse trabalho se assemelha ao que foi realizado por Natalie Zemon Davis Em seu estudo sobre documentação de tribunais franceses a pesquisadora elegeu como objeto de estudo justamente os mecanismos discursivos dos quais chamou de fiction in the archives Dentre eles a autora chegou a conclusões pertinentes no que dizia respeito a compreender uma linguagem jurídica e de convencimento presente em cartas de perdão enviadas ao rei Para mais detalhes conferir a obra na íntegra DAVIS Natalie Zemon Histórias de Perdão e seus narradores na França do século XVI São Paulo Companhia das Letras 2001 10 Mais detalhes sobre os conflitos causados pelo segundo Ouvidor da Comarca das Alagoas 17161727 ver CAETANO A Filipe P org Alagoas e o Império Colonial Português Maceió Cepal 2010 pp 81123 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 172 CAETANO A Filipe P Org Alagoas Colonial Construindo Economias tecendo redes de poder e fundando administrações Séculos XVIIXVIII Recife Editora Universitária UFPE 2012 pp 151173 11 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 CAETANO Op Cit 2010 pp 81123 CAETANO Op Cit 2012 pp 151173 12 Representação dos oficiais da câmara da Vila de Porto Calvo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral 06 de abril de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 2631 13 Segundo Stuart Schwartz por Alvará de 1610 ficava proibido o casamento de magistrados e juízes com mulheres da terra É importante ressaltar que sua afirmação se referia aos magistrados e juízes que eram enviados à Bahia Supõese que o mesmo era tido para ouvidores de forma geral a partir da menção realizada nos trabalhos de Nuno Camarinhas SCHWARTZ Stuart B Burocracia e sociedade no Brasil Colonial O Tribunal Superior da Bahia e seus desembargadores 16091751 São Paulo Companhia das Letras 2011 pp 273 CAMARINHAS Op Cit 263267 14 Carta do Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral sobre os desmandos da região que administrava 15 de abril de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 3235 15 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 33 16 Por estatuto jurídico referese a normas judiciais que buscavam descrever e colocar rédeas nos indivíduos a partir da legitimação de hierarquias deveres e direitos Para mais detalhes ver HESPANHA Op Cit 2010 pp 15104 17 Carta do Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral sobre os desmandos da região que administrava 15 de abril de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 33 18 Carta do Ouvidor João Vilela do Amaral sobre os desmandos da região que administrava 03 de maio de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 36v 19 O regimento do Provedor dos Defuntos e ausentes é longo de resumo salientase que o Provedor tinha controle e jurisdição sobre bens de raiz testamentos e arrecadação de dívidas o que causava muito alvoroço quando utilizava disso para seus interesses próprios cf SALGADO Graça coord Fiscais e Meirinhos a administração no Brasil colonial Rio de Janeiro Nova Fronteira 1985 pp 196199 Para ter uma noção do Regimento como foi escrito na época cf Regimento de que hão de usar os Provedores Tesoureiros e mais Oficiais das fazendas dos defuntos e ausentes de Guiné Mina e Brasil Ilhas dos Açores e mais partes Ultramarinas Lisboa doze de maio de mil e setecentos e doze In MENDONÇA Marcos Carneiro Raízes da Formação Administativa do Brasil Tomo II regimentos XVII a XXXIII Rio de Janeiro Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro 1972 pp 477492 20 MELO Hildete Pereira de MARQUES Tereza Cristina Novaes a partilha da riqueza na ordem patriarcal R Econ Contemp Rio de Janeiro 5 2 juldez 2001 pp 155179 MELLO Evaldo Cabral de A fronda dos mazombos Nobres contra mascates Pernambuco 16661715 São Paulo Editora 34 2012 p 239 21 GONÇALVES Rui Dos privilégios praerogativas q ho gênero feminino te por direito comu ordenações do Reyno mais que ho gênero masculino Lisboa Biblioteca Nacional 1992 22 LARA Silvia Hunould Fragmentos Setecentistas Escravidão cultura e poder na América Portuguesa São Paulo Companhia das Letras 2007 79125 23 Nuno Camarinhas chega em conclusão parecida quando avalia o envio de oficiais régios O autor afirma que a proliferação de juízes e ouvidores externos advindos de nomeação régia deveuse as incongruências e injustiças constantemente apontadas como realizadas por juízes iletrados CAMARINHAS Nuno Juízes e administração da justiça no Antigo Regime Portugal e o império colonial séculos XVII e XVIII Lousã Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação para a ciência e a tecnologia 2010 pp 3652 24 HESPANHA Op Cit 2010 HESPANHA Op Cit 2003 25 O desembargador da Relação da Bahia foi designado para tirar a residência do Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral devido aos conflitos que o mesmo teve com seu substituto sucessor o bacharel Manoel de Almeida Matoso Assim apesar do monarca ter aprovado que Manoel de Almeida Matoso tirasse a dita residência 16 de março de 1720 acabou considerando também a argumentação de João Vilela do Amaral que pedia a interferência de agente externo sob a alegação de Almeida Matoso se tratar de um inimigo Essas informações podem ser vistas na Carta em que o rei autoriza o Ouvidor Geral das Alagoas Manoel de Almeida Matoso a tirar a residência de seu antecessor João Vilela do Amaral 16 de março de 1720 e Carta do magistrado João Vilela do Amaral em que pede ao rei que mande outro agente tirar sua residência que não seja seu sucessor As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 173 Manoel de Almeida Matoso sem data Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 09 e 1818v respectivamente 26 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 27 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 fl 09v 28 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 fl 02v 29 CAETANO Op Cit 2012 pp 156157 30 BLUTEAU Rafael Vocabulário portuguez latino Volume 04 Letras FJ Lisboa Colégio das Artes da Companhia de Jesus 1713 31 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 fl 08v 32 RUSSELWOOD A J R Fidalgos e filantropos a Santa Casa da Misericórdia da Bahia 1550 1755 Tradução de Sérgio Duarte Brasília Editora Universidade de Brasília 1981 p 302 33 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 fl 05 34 Por linguagem jurídica da época não se pretende generalizar afirmações a respeito da América portuguesa ou das formas de escrita do reino mas sim partir do olhar acerca dos discursos produzidos na Comarca das Alagoas como vias capazes de abrir um leque de questionamentos maiores a respeito do que Pierre Bourdieu define como campo jurídico BOURDIEU Pierre A força do direito Elementos para uma sociologia do campo jurídico e A gênese dos conceitos de habitus e de campo In O poder simbólico Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2012 HESPANHA Op Cit 2010 THOMPSON E P Costume Lei e Direito Comum In Costumes em Comum São Paulo Companhia das Letras 1998 pp 86149 35 HESPANHA Op Cit 2003 pp 1534 HESPANHA Op Cit 2010 20100 BOURDIEU Pierre Le mort saisit le vif As relações entre a história reificada e a incorporada In Op Cit 2012 pp 8485 36 Não é desconsiderada a possibilidade de a palavra pobre poder ter sido aplicada num sentido de vulnerabilidade que não necessariamente dissesse respeito a situação financeira 37 HESPANHA Op Cit 2003 38 Sobre o poder simbólico ver BOURDIEU Op Cit 2012 39 Sobre confundir concepções leigas ou de senso comum com as concepções de um determinado campo ver BOURDIEU Op Cit 2012 pp 210235 40 Carta dos oficiais da Câmara da Vila das Alagoas sobre o estado miserável do povo 10 de dezembro de 1730 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 65 10 de dezembro de 1730 fl 01 41 Era papel das Câmaras Municipais cuidar de vários aspectos da administração das vilas cf BICALHO Maria Fernanda Baptista As câmaras ultramarinas e o governo do Império In FRAGOSO João BICALHO Maria Fernanda Baptista GOUVÊA Maria de Fátima orgs O Antigo Regime nos Trópicos a dinâmica imperial portuguesa séculos XVIXVIII Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2010 BOXER Charles O império marítimo Português 14151825 Tradução de Anna Olga de Barros Barreto São Paulo Companhia das Letras 2002 em especial o capítulo Conselheiros municipais e irmãos de caridade Nesse ínterim a proteção ao bem comum utilizando a fragilidade da mulher como reforço de argumento poderia ser uma ótima apelação discursiva para ter seus interesses satisfeitos Desenvolveuse esse argumento de que todos pelo menos no imaginário exerciam justiça no artigo cf MENDONÇA Anne Karolline Campos Juízes ordinários na região sul da Capitania de Pernambuco a justiça do rei e dos súditos portugueses séculos XVII e XVIII In CAETANO Antonio Filipe Pereira org Das partes sul à Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco ensaios sobre justiça economia poder e defesa século XVIIXVIII Maceió Viva Editora 2015 42 Idem 43 Natalie Zemon Davis encontrou casos que giraram em torno da mesma problemática quando estudou a França do século XVI e os pedidos de perdão enviados ao rei Aponta a probabilidade de resoluções jurídicas estarem subordinadas políticojudiciais maiores que diziam respeito a manutenção do ordenamento de uma sociedade DAVIS Natalie Zemon Histórias de Perdão e seus narradores na França do século XVI São Paulo Companhia das Letras 2001 pp 8283 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 174 44 Requerimento onde Bento Rebello Pereira pede que se faça nova devassa sobre seu envolvimento num crime de ferimento sem data Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 45 19 de maio de 1727 fl 17v 45 Despacho a respeito do Requerimento de Bento Rebello Pereira 30 de agosto de 1725 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 45 19 de maio de 1727 fl 18 46 Requerimento do mestre em artes e sacerdote João Velho Barreto a pedir carta para advogar ao rei sem data Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 57 12 de janeiro de 1730 fl 01 47 Requerimento do padre Manuel Álvares Pereira em que pede alvará de mantimentos para apresentação na Igreja de Nossa Senhora do Rosário Vila do Penedo aprovaçãodespacho em 25 de fevereiro de 1750 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 130 25 de Fevereiro de 1750 48 MACHADO Alex Rolim Classificação e perseguição os agentes da Inquisição os negros pardos e mulatos em sociedade escravista Alagoas Colonial 16741820 Sankofa Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana São Paulo nº XIV Ano VII Dezembro2014 49 Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 01 50 Idem 51 Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 02 52 Na íntegra pedimos que como Pay dseos vassalos nos queira mandar prover de outro Pároco que com mais Zello doutrina e exemplo nos possa edificar e não destruir e que sejamos livres de todos os males que padecemos Por cujo benefício do íntimo de nossas almas oferecemos a Deus e ficar firmes votos e que prospere a preciosa vida de Vossa Majestade por muitos e felizes anos Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 02 53 Como se fez ao longo do documento em outros momentos e em se tratando de outros personagens Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 02 54 ALMEIDA Op Cit 2005 pp 89 55 A honra se identificava com a reputação com a voz pública isto é que depende não de quem a detém mas da opinião alheia cf MELLO Evaldo Cabral de O nome e o sangue Uma parábola familiar no Pernambuco colonial 2ª edição revista Rio de Janeiro Topbooks 2000 p 27 56 Afinal a salvação se era matéria de cada um não deixava também de ser coisa de todos Nas cabeças ressoavam ameaças de expiação colectiva O seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos Bíblia Mat 25 para além de que sobretudo em épocas de grande crise pública fomes infortúnios militares ganhava força a ideia de que estas provações colectivas se relacionavam com a prática generalizada de pecados públicos São pecados públicos os que se cometem em público e que por isso podem ser objecto de um inquérito público mesmo a cargo das autoridades temporais bem como de correcção pública pois aqui tratase não apenas de admoestar o pecador para que não peque mais mas ainda de dissuadir os outros perante quem tais pecados são cometidos HESPANHA António Manuel A monarquia a legislação e os agentes In MONTEIRO Nuno Gonçalo coord História da vida privada em Portugal A idade moderna Direcção de José Mattoso Lisboa Temas e Debates Círculo de Leitores 2011 p 18 57 SILVA Maria Beatriz Nizza da Sistema de Casamento no Brasil Colonial São Paulo EDUSP 1984 58 Levandose em conta que foi naquele período que se intensificou os conflitos ou complementações de uma justiça local com a do rei representada através de seus agentes judiciários CAMARINHAS Op Cit 2010 59 Os moradores daquela localidade viviam sob constante ameaça de ser preso tudo inclusive com o aval do Reverendo Visitador Antonio Teixeira Lima acusado por isso de alienar as verdadeiras intenções do bispo daquela diocese Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 60 A vida exemplar para um homem eclesiástico pode ser visto nas Constituições da Bahia mas sobretudo em respeito ao crime de Simonia era condenado se cobrar por cobrança de sacramentos ver Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia Liv V Tít VI VII e VIII VIDE Op Cit 2010 p 466469 61 LEWKOWICZ Ida A fragilidade do celibato In LIMA Lana Lage da Gama org Mulheres adúlteros e padres História e moral na sociedade brasileira Rio de Janeiro Dois Pontos Editores 1987 TORRES LONDOÑO Fernando A outra família concubinato igreja e escândalo na colônia São Paulo Edições Loyola 1999 62 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 01 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 175 63 ROLIM Alex CURVELO Arthur MARQUES Dimas PEDROSA Lanuza Crime e justiça no domicílio ordinário dos delinquentes Comarca das Alagoas Século XVIII Revista Crítica Histórica nº 3 Ano II Julho2011 pp 5455 64 Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 02 65 Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 fl 05v 66 Ver Nota 13 67 Representação dos oficiais da câmara da Vila de Porto Calvo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral 06 de abril de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 27 e 28 68 Ordenações Filipinas Tít XX Do oficial delRey que dorme com mulher que perante ele requer ALMEIDA Op Cit 2012 4º Tomo pp 11711172 69 Para detalhes dos conflitos entre Vilela do Amaral e Almeida Matoso ver CAETANO Op Cit 2010 pp 81 123 CAETANO Op Cit 2012 pp 151173 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 14 15 16 20 21 22 25 27 31 39 40 41 42 44 45 46 63 78 129 e 143 70 Em 1727 o Ouvidor Geral das Alagoas Manoel de Almeida Matoso pede para que se refaça sua residência sob a alegação que a primeira estaria comprometida pelas amizades e interesses de seu antecessor Almeida Matoso se envolvera em sérios conflitos de jurisdição com o Ouvidor João Vilela do Amaral o que levou a ambos os magistrados terem sido residenciados especificamente por membros do tribunal da Relação da Bahia Requerimento de Manoel de Almeida Matoso ao rei sem data Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 42 16 de março 1727 71 Carta do Desembargador da Bahia Antônio do Rego e Sá Quintanilha ao rei sobre a residência que tirou do Ouvidor Geral das Alagoas Manoel de Almeida Matoso 03 de julho de 1726 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 45 19 de maio 1727 fl 07 e 13 72 Mais detalhes sobre o caso cf MENDONÇA Anne Karolline Campos A relação das mulheres com a justiça e o direito Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17121798 Dissertação de Mestrado em História Instituto de Ciências Humanas Comunicação e Artes Universidade Federal de Alagoas 2017 pp 119 151 73 Impossível não pensar nas mulheres de máfama das Minas Gerais que utilizavam do sexo para conseguir vantagens pecuniárias dos homens se adornando com joias e roupas caras Saber até que ponto isso é válido para a Comarca das Alagoas ainda é algo para se estudar e aprofundar Para as minas cf FURTADO Júnia Ferreira Chica da Silva e o contratador dos diamantes o outro lado do mito São Paulo Companhia das Letras 2003 MELLO E SOUZA Laura de Desclassificados do ouro a pobreza mineira no século XVIII Rio de Janeiro Edições Graal 4ª ed revista e ampliada 2004 74 A historiadora Suely Creusa de Almeida aponta casos de mulheres em recolhimentos que se arrependiam de seus atos e levavam uma vida religiosa ALMEIDA Op Cit 2005 Fontes Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Cx 1 Documentos 01 até 297 Código Filipino ou Ordenações e Leis do Reino de Portugal recopiladas por mandado del Rey D Filipe I Cândido Mendes de Almeida Ed Facsim Brasília Senado Federal Conselho Editorial 2012 Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia Sebastião Monteiro da Vide estudo introdutório e edição Bruno Feitler Evergton Sales Souza Istvan Jancsó Pedro Puntoni org São Paulo Editora da Universidade de São Paulo 2010 GONÇALVES Rui Dos privilégios praerogativas q ho gênero feminino te por direito comu ordenações do Reyno mais que ho gênero masculino Lisboa Biblioteca Nacional 1992 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 176 Referências Bibliográficas ALMEIDA Suely Creusa de O Sexo Devoto normatização e resistência feminina no Império português XVIXVIII Recife Editora Universitária UFPE 2005 BARDIN Laurence Análise de Conteúdo Lisboa Edições 70 2012 BOURDIEU Pierre O poder simbólico Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2012 BOXER Charles O império marítimo Português 14151825 Tradução de Anna Olga de Barros Barreto São Paulo Companhia das Letras 2002 BRAGA Isabel M R M Drumond HERNÁNDEZ Margarita Torremocha As mulheres perante os tribunais do Antigo Regime na Península Ibérica Imprensa da Universidade de Coimbra 2015 CAETANO A Filipe P Org Alagoas e o Império Colonial Português Maceió Cepal 2010 CAETANO A Filipe P Org Alagoas Colonial Construindo Economias tecendo redes de poder e fundando administrações Séculos XVIIXVIII Recife Editora Universitária UFPE 2012 CAETANO Antonio Filipe Pereira Org Das partes sul à Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco ensaios sobre justiça economia poder e defesa século XVIIXVIII Maceió Viva Editora 2015 CARDIM Pedro Administração e governo uma reflexão sobre o vocabulário do Antigo Regime In FERLINI Vera Lúcia BICALHO Maria Fernanda Orgs Modos de Governar São Paulo Alameda 2005 CAMARINHAS Nuno Juízes e administração da justiça no Antigo Regime Portugal e o império colonial séculos XVII e XVIII Lousã Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação para a ciência e a tecnologia 2010 DAVIS Natalie Zemon Histórias de Perdão e seus narradores na França do século XVI São Paulo Companhia das Letras 2001 DAVIS Natalie Zemon Nas margens três mulheres do século XVII São Paulo Companhia das Letras 1997 FERNANDES Maria de Lurdes Correia Literatura Moral e Discursos Jurídicos Em torno dos privilégios femininos no século XVI em Portugal Revista da Faculdade de Letras Línguas e Literatura Porto XVII 2000 FURTADO Júnia Ferreira Chica da Silva e o contratador dos diamantes o outro lado do mito São Paulo Companhia das Letras 2003 FRAGOSO João BICALHO Maria Fernanda Baptista GOUVÊA Maria de Fátima orgs O Antigo Regime nos Trópicos a dinâmica imperial portuguesa séculos XVIXVIII Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2010 GINZBURG Carlo Mitos emblemas sinais morfologia e história São Paulo Cia das letras 1989 GRUZINSKI Serge As quatro partes do mundo História de uma mundialização Belo Horizonte Editora UFMG São Paulo Edusp 2014 HESPANHA António M Imbecillitas As bemaventuranças da inferioridade nas sociedades de Antigo Regime São Paulo Annablume 2010 HESPANHA António M A História do Direito na História Social Lisboa Livros Horizonte 1978 HESPANHA António Manuel Org Poder e instituições na Europa do Antigo Regime Coletânea de textos Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1984 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 177 HESPANHA António Manuel Cultura jurídica europeia Síntese de um milênio Mira Sintra Publicações EuropaAmérica 2003 HESPANHA António Manuel A monarquia a legislação e os agentes In MONTEIRO Nuno Gonçalo coord História da vida privada em Portugal A idade moderna Direcção de José Mattoso Lisboa Temas e Debates Círculo de Leitores 2011 LARA Silvia Hunould Fragmentos Setecentistas Escravidão cultura e poder na América Portuguesa São Paulo Companhia das Letras 2007 MACHADO Alex Rolim Classificação e perseguição os agentes da Inquisição os negros pardos e mulatos em sociedade escravista Alagoas Colonial 16741820 Sankofa Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana Ano VII nº XIV Dezembro2014 MELO Hildete Pereira de MARQUES Tereza Cristina Novaes a partilha da riqueza na ordem patriarcal R Econ Contemp Rio de Janeiro 5 2 155179 juldez 2001 MELLO Evaldo Cabral de O nome e o sangue Uma parábola familiar no Pernambuco colonial 2ª edição revista Rio de Janeiro Topbooks 2000 MELLO Evaldo Cabral de A fronda dos mazombos Nobres contra mascates Pernambuco 16661715 São Paulo Editora 34 2012 MELLO E SOUZA Laura de Desclassificados do ouro a pobreza mineira no século XVIII Rio de Janeiro Edições Graal 4ª ed revista e ampliada 2004 MENDONÇA Anne Karolline Campos A relação das mulheres com a justiça e o direito Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17121798 Dissertação de Mestrado em História Instituto de Ciências Humanas Comunicação e Artes Universidade Federal de Alagoas 2017 PAIVA Eduardo França Escravos e libertos nas Minas Gerais do século XVIII estratégias de resistência através dos testamentos São Paulo Annablume 1995 ROLIM Alex CURVELO Arthur MARQUES Dimas PEDROSA Lanuza Crime e justiça no domicílio ordinário dos delinquentes Comarca das Alagoas Século XVIII Revista Crítica Histórica Ano II nº 3 Julho2011 pp 5455 RUSSELWOOD A J R Fidalgos e filantropos a Santa Casa da Misericórdia da Bahia 1550 1755 Tradução de Sérgio Duarte Brasília Editora Universidade de Brasília 1981 SALGADO Graça coord Fiscais e Meirinhos a administração no Brasil colonial Rio de Janeiro Nova Fronteira 1985 SANTOS Giovanna Aparecida Schittini dos Direito e Gênero Rui Gonçalves e o estatuto jurídico das mulheres em Portugal no Séc XVI 15211603 2007 Dissertação Mestrado em História Universidade Federal de Goiás Goiânia 2007
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httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 Artigo Recebido em 23032017 Aceito em 26062017 AS MULHERES SEM NOME o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça RESUMO A ideia central deste trabalho é questionar o desenvolvimento de mecanismos discursivos ou a manipulação das imagens judiciais constituídas acerca de personagens subalternizados Mais especificamente optouse por trazer à tona a apropriação de uma literatura jurídica que pretendia descrever o feminino em nome de fundamentar deveres e direitos masculinos sobre as mulheres As interpretações a seguir transpassam pelas interrogativas sobre a quais grupos servia a vigência de códices específicos tendo a temática da História das mulheres como plano de fundo mas não como perspectiva principal Isso significa dizer que o foco deste artigo pode ser visualizado com a problemática das concepções de justiça e da utilização pela camada privilegiada da sociedade e em nome de seus próprios interesses de estatutos judiciais dos considerados inferiores PALAVRASCHAVE Justiça Capitania de Pernambuco Comarca das Alagoas Mulheres Nameless women the development of legal arguments based on womens statute Alagoas District Captaincy of Pernambuco 17161765 ABSTRACT The central idea of this work is to question the development of discursive mechanisms or a manipulation of the judicial images constituted on of subalternized personages More specifically it was chosen to bring to the fore the appropriation of a juridical literature that intends to describe the feminine in the name of to base masculine duties and rights on like women As interpretations they then go through the questions about which groups served the specific codices having a theme of womens history as a background but not as a main perspective This means that the focus of this article can be seen with the problematic of conceptions of justice and of the use of judicial statutes of the lower countries by the privileged layer of society and the name of their own interests KEYWORDS Justice Captaincy of Pernambuco Alagoas district Women Las mujeres sin nombre el desarrollo de los fundamentos de derecho basado en el estatuto de las mujeres Distrito de Alagoas Capitanía de Pernambuco 17161765 RESUMEN La idea central de este trabajo es cuestionar el desarrollo de mecanismos discursivos o una manipulación de las imágenes judiciales constituidas sobre de personajes subalternizados Más específicamente se optó por traer a la superficie la apropiación de una literatura jurídica que pretenda describir lo femenino en nombre de fundamentar deberes y derechos masculinos sobre como mujeres Como interpretaciones a continuación traspasan por las interrogantes sobre qué grupos servía la vigencia de códices específicos teniendo una temática de la Historia de las mujeres como fondo pero no como perspectiva principal Esto significa que el enfoque de este artículo puede ser visualizado con la problemática de las concepciones de justicia y de la utilizaciónpor la capa privilegiada de la sociedad y del nombre de sus propios intereses de estatutos judiciales de los países inferiores PALABRAS CLAVE Justicia Capitanía de Pernambuco Distrito de Alagoas mujeres Doutoranda pelo Programa de PósGraduação em História da Universidade Federal de Pernambuco Membro do Grupo de Estudos América Colonial da Universidade Federal de Alagoas Contato Universidade Federal de Pernambuco Centro de Filosofia e Ciências Humanas 10 andar Cidade Universitária CEP 50740550 Recife PE Brasil Email karollinecamposhotmailcom As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 153 Introdução O ordenamento social que via a mulher como incapaz para exercer atividades de mando era o mesmo que fundamentava a posição masculina como o receptáculo da Justiça no Antigo Regime português Era nas mãos do homem da casa que estava designada a jurisdição1 em sua forma mais natural cuidava e corrigia quando necessário todos aqueles que estavam debaixo de seu domínio incluindo seus filhos e filhas esposa ou irmã2 Baseado em questões doutrinais teológicas o estatuto social e jurídico feminino equiparava as mulheres a características uniformes inflexíveis eram boas ou más Essa estereotipação típica do Antigo Regime português e nos Trópicos alcançou as conquistas de alémmar e se fez fortemente presente nas relações de tais personagens com a Justiça3 Ao sul da Capitania de Pernambuco na Comarca das Alagoas produziuse documentação de cunho jurídicoadministrativo exemplificando formas de comunicação jogos sociais e negociação que a América portuguesa manteve com o seu rei por todo o século XVIII4 É interessante notar dentre tais fontes o aparecimento quase invisível de mulheres sendo alocadas como agentes envolvidos em situações que somavam motivos à produção de requerimentos e envio de reclames A partir de um mapeamento nas fontes advindas do Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos foi possível transformar rápidas menções a mulheres sem especificação de seus nomes ou qualquer outro tipo de identificação em problemática de trabalho É importante salientar que não são petições ou cartas protagonizados pelo feminino mas sim escritos de acusação ou defesa pedidos feitos ao monarca ou cartas administrativas que elencaram a presença de mulheres na região como um motivo ou forma de legitimar o conteúdo exposto de seus interesses Desde a escolha das passagens nas fontes até a transformação das mesmas em problemática central do trabalho utilizouse dos princípios da análise de conteúdo5 o que significa dizer que foram destrinchados detalhadamente conforme as necessidades explicativas foram surgindo texto e contexto histórico Nessa linha de raciocínio o presente artigo também pode ser questionado pelo leitor a respeito de compatibilidades com pesquisas subordinadas ao campo da Análise de Discurso Provavelmente se distancia de tal vertente num sentido mais especificamente linguístico mas transparece em alguns momentos e formas de lidar as influências de uma matriz francesa já que surgiram interpretações e críticas que consideraram os escritos discurso como acontecimentos intrinsicamente ligados a história e a materialização de ideologias6 Dessa maneira o exercício que consistiu em explanar As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 154 possibilidades de explicação das menções as mulheres devem ser visualizadas além do que a prática descritiva de fonte ou interpretação de forma neutra da mesma proporciona Tratou se de observar exaustivamente perspectivas elencando hipóteses e argumentações diante do problema histórico a ser solucionado Buscouse perceber a utilização do estatuto jurídico feminino7 ou referência a ele como um mecanismo desenvolvedor de discursos jurídicos apelativos de acusação e de defesa A importância de tal problematização põe em evidência a necessidade de compreensão profunda dos serviços prestados pelos corpus judiciais no século XVIII período antes da ascensão e transformação política elencada pelo Marquês de Pombal para as camadas consideradas superiores da sociedade responsáveis por administrar a Conquista Ultramarina portuguesa e desenvolver nela um ordenamento social transpassado do Velho mundo As interrogativas contidas aqui podem desvendar os privilégios ou vantagens sob a perspectiva das condições que impuseram aos indivíduos descritos e cerceados pela literatura judicial lusitana nesse caso as mulheres8 Podese ver ainda como a Justiça da Comarca das Alagoas enxergava o feminino e sobre como elas se relacionavam ou eram relacionadas com o direito na perspectiva dos que gozavam da autoridade da voz e desenvolviam estratégias discursivas para se fazer crer e atender9 O desenvolvimento de argumentos jurídicos baseado nas concepções do feminino As intrigas que o Ouvidor Geral da Comarca das Alagoas João Vilela do Amaral levantou por toda a região pertencente à jurisdição de seu ofício10 transpassaram a implicação de agentes masculinos Em momentos distintos foram evidenciadas as principais queixas das três vilas que estiveram sob seus cuidados jurídicos dentre os anos de 1716 e 1721 aproximadamente Em escritos enviados ao Conselho Ultramarino e ao rei agentes representativos da justiça local e régia apresentaram seus pontos em cartas ofícios e requerimentos11 A recorrência da afirmação sobre o envolvimento de mulheres naquelas pendências judiciais abre um leque de possibilidades interpretativas Dentre elas tentarseá verificar a invocação do feminino em linhas de acusação e defesa para compreender até que ponto tais menções a implicações daquelas personagens foram manipuladas ou reformuladas de forma a garantir a consecução de um discurso de acusação ou defesa deixandoo passível de ser entendido e atendido em seus objetivos estipulados As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 155 Incomodava aos homens do Senado da Vila de Porto Calvo o desrespeito do ouvidor pela jurisdição local a autuação da gente nobre da terra ou o acúmulo de dinheiro com a venda de devassas na região sobretudo em correição realizada no ano de 1717 Em um dos pontos da carta escrita em 06 de abril de 1720 inclusive apontouse o desprezo do juiz de vara branca pela reta administração da justiça uma vez que resolvia pendências jurídicas em sua residência vestindo apenas ceroulas recebendo e compartilhando sua morada com criminosos de quem era amigo Dentro daquele discurso formulado por homens de prestígio local bem estruturado e cheio de detalhes que João Vilela do Amaral precisaria responder em sua defesa foi enfatizada a existência de mulheres aliadas ao magistrado que por isso recebiam despachos viciosos em seu favor12 Do lado da acusação feita pelos moradores de Porto Calvo os contatos estabelecidos entre João Vilela do Amaral e mulheres da terra foram vistos com desconfiança e como evidência da quebra com os princípios judiciais13 Da parte do magistrado o argumento foi devidamente reutilizado em sua defesa na carta que escreveu em 15 de abril de 1720 Não é possível afirmar se o oficial de justiça já havia tido acesso ao ofício formado pela Vila de Porto Calvo 06 de abril de 1720 e consequentemente aos seus capítulos argumentativos Nos pontos escritos por Vilela ao monarca há notícias sobre as três vilas da Comarca e ao que parece o oficial régio encontrou sérias dificuldades para autuar em todas elas Os motivos de tais problemas advinham consequentemente de uma aura criminosa que em sua perspectiva circundava toda a região14 Segundo as informações contidas na carta de Vilela as mesmas pessoas que participaram de um ato de resistência à entrada do oficial em Porto Calvo no ano de 1719 eram as que continuavam agindo cruelmente em desperdício dos bens de órfãos e viúvas E o faço agora a Vossa Majestade para que mande tomar conhecimento desse caso fazendo castigar rigorosamente os culpados e cabeças destes motins pois é sem dúvida que os mesmos agora por falta de castigo vivem ainda com o mesmo ânimo de desobedientes cruéis e crimes pois não há órfão ou viúva que não chore o seu desamparo no desperdício que lhe fazem em seus bens nem pobre que se não lastima do mesmo 15 A utilização da posição de indivíduos fragilizados por seus estados e estatutos jurídicos16 foram um dos mecanismos discursivos utilizados pelo ouvidor para defenderse das acusações que lhe eram imputadas João Vilela do Amaral transpareceu preocuparse com o fato de que essas pessoas prejudiciais aos interesses das viúvas e dos órfãos também As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 156 maquinavam contra os mesmos ministros impondolhes o palco de tiranos Tal afirmação seguida da ênfase de que oficiais das câmaras vestiam uma capa de virtude demonstra a eficiente troca de lugar de um mesmo argumento discursivo baseado na moral e no jurídico levantado antes em seu prejuízo17 O final da equação do escrito levanos a questão a rigidez de sua atuação que será vista adiante poderia ser considerada como um erro ou desvio se sua finalidade era unicamente proteger aqueles que deveriam ser abraçados por sua jurisdição diante das más intenções dos poderosos e juízes rebeldes da terra Em outra carta escrita em maio do mesmo ano o magistrado reafirmou os danos causados a personagens específicos da Vila de Porto Calvo Numa entonação mais eloquente que a anterior os juízes e poderosos responsáveis pelo sofrimento de mulheres e crianças foram apontados como inimigos da paz e conspiradores contra ministros Segundo contava o ouvidor o principal objetivo das forças locais era livrar criminosos de seus castigos mesmo que para isso mulheres incapazes e pobres fossem seriamente atingidos Repetiu que eram as pessoas de dentro do aparelho jurídico local que faziam órfãos e viúvas se queixarem orarem e clamarem por justiça nos templos18 O oficial também ocupava o lugar de Provedor dos defuntos e ausentes19 o que explica o fato de seu instrumento de defesa apresentar os detalhes suspeitos sobre a execução de procedimentos judiciais envolvendo viúvas e órfãos Problemas de desvios de quantias ou bens pertencentes às viúvas e aos órfãos aconteciam na Comarca das Alagoas e pela América Portuguesa20 quase que da mesma forma que fora enumerada por Rui Gonsalves em 155721 O foco de análise nessas falas é o artifício da ênfase naquilo que foi vivenciado por mulheres e quais noções instintivas ou naturais teológicas e formais que tal artifício poderia suscitar nos leitores de tais pontos o Conselho Ultramarino e o rei É substancial compreender que esses registros incompletos ausência da indicação de seus nomes ou qualquer outro tipo de identificação de casos femininos possuem uma função para além de preenchimento de contexto de uma história contada Falar nas viúvas e em seus problemas como resultados da deficiência de uma via jurídica local implicava invocar os preceitos básicos da organização social lusitana22 Formouse um argumento discursivo fundamentado no respeito ao direito natural que enxergava um estatuto vigente da mulher como passível de proteção ou cautela diante de sua constante fragilidade e de sua inevitável dependência do sexo oposto Além dessa perspectiva o estatuto feminino também servia para dar forma à ação que se queria provar No caso de João Vilela do Amaral em suas cartas defensivas contra as As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 157 acusações da Vila de Porto Calvo podese notar uma prestação de contas a respeito de suas relações com mulheres Levantar questões tão básicas sobre a responsabilidade masculina perante a mulher girava ainda em torno de reafirmar a jurisdição de seu ofício23 e a função maior do monarca proteger aqueles que mais precisavam Naquelas curtas linhas que demonstravam e não apenas diziam a respeito dos males causados as mulheres viúvas podese perceber a utilização de palavras como chorar queixar orar e clamar em contraponto com a crueldade criminalidade desamparo e o desperdício Buscavase transpassar o que se pensava e sentia sem deixar de estar de acordo com o regimento e tradições judiciais lusitanas24 Tais mecanismos discursivos não eram caminhos utilizados como atalhos colaborativos para êxito jurídico apenas pelo ponto de vista de homens letrados reinóis A Vila de Penedo em 1722 montou um discurso que partia do ponto de vista da defesa daqueles que sem voz natural jurídica precisariam de intermediários que defendessem os seus interesses Editais haviam sido publicados nas praças das vilas sulinas de Pernambuco em nome de recolher informações sobre o ouvidor Vilela do Amaral era o processo da residência do magistrado que se iniciara O documento que chegara com atraso considerável na Vila de Penedo não deixou de ser respondido pelos oficiais locais Os membros da câmara se reuniram na casa do Juiz Ordinário João Dantas Aranha para dar conta de responder ao instrumento público informando ao Desembargador da Relação da Bahia Jozeph de Lima Castro25 acerca dos procedimentos de Vilela o oficial estava incumbido de tirar a residência do magistrado em questão26 Para validação do ofício composto após a data prevista apontouse a distância da Vila das Alagoas donde o documento deveria chegar bem como o atraso na publicação em praça pública da região como pontos que deveriam ser considerados Houve ainda a suposição de o edital ter sido transportado sob a responsabilidade de um escravo do magistrado na berlinda João Vilela do Amaral27 A motivação que nos interessa aqui observar diz respeito a situação social e financeira ao sexo e estado das pessoas que apresentavam as queixas evocadas como motivo do atraso e da necessidade em registrar reclamações mesmo assim E os queixosos serem homens pobres e mulheres viúvas graves que não podem por pobres e miseráveis irem fora desta Terra e por esta causa apresentavam a este Senado Suas queixas por escrito que logo o procurador deste Conselho e Sindico em Seu nome e do mais Povo apresentaram Requerendo ao dito Senado e Juiz Recebesse sua queixa 28 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 158 Os estados e as qualidades dos queixosos devem ser observados dentro desse escrito Foi uma forma de argumentar estabelecer e legitimar a coleta de testemunhos e o registro de acusações contra João Vilela do Amaral apesar do desembargador da Bahia responsável por tirar a residência já haver se retirado da comarca Tratavase de assuntos do bem comum e da autuação que possuía cinquenta e quatro capítulos contra o ouvidor Doze testemunhas depuseram diante do juizado local para a produção do ofício da Vila de Penedo ao rei entre os dias de 14 e 16 de março de 1722 e todos fizeram alusão a sérios problemas contra o ministro real De acordo com Antonio Caetano pela qualidade destas testemunhas conseguimos detectar que os mesmos formavam a nata daquelas vizinhanças29 Eram situações vividas por súditos e súditas É importante ressaltar Todos pelo menos é o que se pode interpretar no princípio buscavam o remédio régio para suas aflições e perturbações explicitavam seus casos à câmara local em nome de salvaguardar o equilíbrio e a paz da vila A presença de capítulos que apontavam o envolvimento de personagens femininas não ficava apenas no campo do fator indicativo de apelação pois suas más experiências ocasionadas pelos serviços do ouvidor também foram devidamente comprovadas pelas testemunhas depoentes Ao longo do ofício se tem contato com depoimentos que de fato apontavam viúvas no plural que teriam sido seriamente prejudicadas pela ação de João Vilela do Amaral Há uma afirmação em específico de que mulheres sem marido vivo e que se encaixavam num estado grave e pobre teriam sido seriamente atingidas Contudo só é possível identificar uma senhora representada juridicamente por procurador e recorrentemente denominada como de uma nobreza reconhecida naquela terra Ora a única mulher viúva apresentada como grave não parecia ser pobre ou miserável para além do que aquela invocação discursiva poderia supor30 Era Maria Vieira de Albuquerque que havia se recusado a pagar preço estipulado por devassa ao ouvidor antes quisera ela perder 04 mil cruzados31 Utilizando os cálculos de RussellWood o montante em réis seria de 192000032 o que daria para comprar vários bens de boa qualidade como escravos animais e equipamentos para casa e lavouras Essas linhas que numa visão mais cautelosa se apresentava relativamente desconexa com os fatos expostos no mesmo documento não terminam por aí No Capítulo 13 das acusações o assunto das mulheres volta ao foco e o registro afirmava pontos que permanecem em aberto Capítulo 13 Prendia em cadeia Pública mulheres casadas por concubinadas sem mais publicidade que do seu malévolo ânimo e depois de ser bem pago pondo em perigo as vidas dos sujeitos envolvendo nesta matéria aos Sacerdotes e dando As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 159 lhes sentenças injuriosas e observandolhes condenações só a fim de destruir o estado Sacerdotal pela pouca Reverência que lhe tinha e pondo sérvio ao Convento Franciscano e violando a imunidade dela e mandando prender Religiosos e atirandolhe no presídio Desacatava também nossa honradas filhas de Pais Nobres prendendoas na cadeia Pública obrigando por esta ação aos Pais a alguma Ruína e excesso33 O trecho mencionado já faz parte do ofício em si e as viúvas anteriormente mencionadas apareceram em capítulos separados ao longo do escrito No capítulo apontado acima figuravam as mulheres casadas e as moças honradas filhas de Pais Nobres que foram presas e desacatadas Assim primeiro tinhase as viúvas apresentadas no plural comprovadas no singular paradoxalmente graves e pobres demais mas que conseguiram enviar suas queixas por escrito a câmara o que em teoria requereria no mínimo auxílio jurídico de um procurador além de dinheiro para pagar os emolumentos aos responsáveis Depois eram representadas as moças donzelas no plural e não há identificação de descendentes da gente nobre da terra além de Joana Vieira filha de Maria Vieira de Albuquerque nos capítulos e testemunhos destrinchados Podese apontar assim uma fórmula comum presente no documento analisado apresentavase queixas de maneira geral utilizandose de elementos discursivos que davam a impressão de uma realidade que não necessariamente seria comprovada pelos depoimentos das testemunhas Isso pode ser compreendido como desenvolvimento de mecanismos discursivos excessivos e apelativos para se fazer sentir crer e atender Tal estratégia de escrita certamente se tratava de uma maneira de contar o que aconteceu A ideia central em problematizar essa via argumentativa no entanto é trazer esses feitios a tona como partes integrantes e essenciais no desenvolvimento e manutenção de uma linguagem jurídica própria da época34 Onde para a consecução de uma forma de realizar e enviar pedidos ao monarca o indivíduo se posicionava como súdito reconhecedor dos principais elementos constitutivos do ordenamento social lusitano e devidamente encaixado nas ideias representativas da hierarquia social e jurídica em vigência35 Se deixássemos de lado a interrogação e as confusões da exata identificação do número de personagens femininas que foram envolvidas em tais pleitos é interessante observar que a contradição do grave e pobre ainda possuiria passividade de interpretações como esta Pois adquiriria características demonstrativas de apelação da mesma maneira enfatizando que as ações incorretas do ouvidor era a causadora da desordem hierárquica a ponto de graves e pobres36 ficarem sob o mesmo patamar de uma suspeita que As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 160 desrespeitava posições sociais distintas Aí a ação do ouvidor interpretase levava todos à condição de pobreza devido a amputação de diversas formas de defesa e sobretudo a dependência que a Justiça local devia à jurisdição prejudicial de João Vilela do Amaral Os pontos invocavam diretamente a responsabilidade estratificada entre Coroa seus agentes e súditos em manter o bem comum para o desenvolvimento da monarquia Relembra se a função do rei na manutenção das jurisdições básicas e formais de um direito local e costumeiro que foi colocado em cheque por um de seus homens A Justiça real deveria ser certeira e pontual dando sentido a sua derivação do direito divino Os excessos ou contradições apelativas típicos de uma sociedade substancialmente relacionada com o visual não devem deixar de ser considerados como formadoras de uma conduta jurídica no século XVIII37 Aqui isso é concebido como um elemento que dava sentido a todo um mecanismo simbólico38 e característico da época Falase de um discurso que perpassava juízes locais e de fora procuradores e indivíduos particulares e que por isso deve ser compreendida como uma especificidade da linguagem jurídica forjada naquela época Desde momentos como estes há a possibilidade de compreender uma interligação entre linguagem comum e a judicial39 Encontravase naqueles discursos e em suas formas retóricas de levantar acusações construir defesas ou encabeçar pedidos uma eficiente ativação jurisdicional no leitor Para identificar profundamente onde esse mecanismo poderia levar e quais concepções poderiam suscitar é interessante visualizar outros casos como o pedido feito pela câmara da Vila das Alagoas em 28 de abril de 1730 Este terço dos Paulistas é Universal sossego das freguesias de Pernambuco e especial desta Comarca por ser a que padecia mais Sanguinolentas hostilidades do negro rebelde que tendo ocupado as montanhas do Continente dos Palmares Tão desumanos se faziam que não só tiravam vidas e roubavam fazendas mas ainda debaixo de armas se guardavam as honras das donzelas e casadas 40 A importância em manter o Terço dos paulistas em território alagoano foi destrinchada pelos homens do Senado da Vila das Alagoas que se sentiram obrigados a dar notícias sobre a utilidade do comando militar sobretudo diante do cargo que exerciam Os ofícios nos quais estavam servidos eram a principal argumentação que direcionava aquele requerimento mas também a necessidade da manutenção do bem comum daquela comunidade O sentimento de responsabilidade como homens e administradores locais da justiça fundamentava a indicação das personagens femininas Sua presença e vidas em perigo eram um dos elementos e concisos para reafirmar a utilidade vital do auxílio daquele terço na As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 161 região Percebese mais uma vez nesse ponto argumentativo a manipulação da presença e do estatuto social e jurídico feminino como sujeito a jurisdição de seus maridos de agentes de justiça local ou de fora e mesmo do rei que viria a resolver a questão Observese que naquele escrito era a ideia da proteção à mulher o que amparava a defesa apresentada pela câmara das Alagoas defesa esta que fundamentava uma de suas razões de existir justamente na responsabilidade sóciopolítica daqueles incumbidos em administrar a justiça41 O discurso seguia estabelecendo como uma das principais preocupações as muitas ameaças de negros levantados e bárbaros que segundo contavam andavam armados e violentos tendo sido responsáveis pela tirada de honra de moças donzelas e casadas42 O relato mostrava a consecução da reação de negros e índios na região e de uma maneira luso brasileira de enxergava o lugar da mulher e sua honra como dependente diretamente dos homens que as administravam e àquela terra Salvaguardar aquelas que eram brancas eou honradas dentro dos estratos privilegiados daquela vila A importância em manterse o Terço Paulista em solo lusopernambucano não tinha a ver apenas com a presença de mulheres naquela região E isso não significa descaracterizar a perspectiva de que o direito costumeiro deveria ser respeitado diante de mulheres e estava sendo aclamado ali Como indivíduos fragilizados e de características outras derivadas do mesmo ponto é provável que a utilização de seus exemplos e de sua ameaça constante tenha dado um sentido moral aquele discurso para justificar ou complementar os elementos administrativos e econômicos que estariam em jogo Em primeiro lugar as honras a ser protegidas estavam ligadas diretamente às dos homens com quem estivessem envolvidas Segundo mulheres certamente foram violadas ou sequestradas naqueles conflitos advindos principalmente daquela circunstância econômica religiosa e social latente Mas também havia engenhos sob alerta sendo invadidos roubados e plantações queimadas Visto esses detalhes a alçada daquele requerimento ganha proporções que certamente não diziam respeito unicamente à questão feminina tratavase do bem comum43 no geral onde o feminino dava fundamento e servia de plano de fundo legitimador da argumentação mais passível de respostas favoráveis a consecução daquelas forças armadas na Vila das Alagoas A necessidade de dialogar com essas menções e com as concepções básicas que elas proporcionavam pode ser visualizada em diferentes momentos e vilas da Comarca das Alagoas Implica ressaltar que era um mecanismo retórico presente também em petições e requerimentos por possuir características apelativas que se transformavam em uma estratégia eficiente para instigar o leitor emotiva e moralmente perante o qual fariam avaliação do que As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 162 estava sendo proposto O significado próprio para aquele momento do Antigo Regime luso brasileiro adivinha do questionamento do que seria preciso expor para fortalecer uma queixa uma defesa ou para receber a aprovação de um pedido Daí essa ideia em reafirmar a responsabilidade social e jurídica masculina ressaltandoa como um componente poderoso nos discursos que interagiram diretamente com o estatuto e a posição social da mulher A priori essa parece ter sido a circunstância que fez aparecer a mulher e família do alferes Bento Rebelo Pereira no requerimento datado por volta de 1725 E o não ser o crime daquela qualidade que necessita de semelhante cautela e castigo porque de outra sorte não só poderá passar a vida metido em hua prisão injustamente mas ficaria sua mulher e família em sumo desamparo ao que se deve atender Espera real mercê44 O oficial morador na Vila das Alagoas estava sendo acusado por um crime do qual segundo ele era inocente Ao pedir que se refizesse todo o processo de devassa Rebelo Pereira evidenciou sobretudo o desamparo a espreita de sua mulher e família caso a resposta do rei fosse negativa A resposta positiva ao seu pedido chegara através do Conselho Ultramarino em 30 de agosto de 172545 Em outro momento o sacerdote João Velho Barreto morador na mesma região pediu autorização para advogar na Comarca das Alagoas e valeu se de uma articulação argumentativa semelhante Seu discurso fundamentouse em três principais pontos o fato de seu pai ter exercido por mais de quarenta anos como advogado o pouquíssimo número de advogados naquela região e por fim a necessidade de obter o ofício para sustentar seus pais já velhos e também suas três irmãs possivelmente solteiras Sua provisão foi aprovada em 16 de janeiro de 173046 Há a possibilidade de que as manifestações sobre as mulheres aqui analisadas todas tenham se valido do estatuto jurídico daquelas personagens mais em favor de interesses e menos no sentido de representação das causas diretas ou não daquelas lusobrasileiras O que não há como negar é que aqueles agentes colonizadores foram cientes da vigência de direitos fundamentados na proteção da honra feminina bem como da vigência de um pensamento a respeito da natureza questionável daqueles mesmos indivíduos Isso é percebido não só por parte da justiça régia mas também na via da municipal Tornase palpável que houve poucas transformações nos Trópicos do que dizia a teologia e lei em Portugal sobre o ser mulher De um lado mais complexo não ficam vetadas outras opções de análises tais quais as afinidades de súditas da Comarca das Alagoas com o Direito e Justiça Partir da perspectiva da análise do conteúdo dos requerimentos e ofícios contudo permite um melhor entendimento do que As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 163 aquela sociedade compreendia por justo sobretudo quando seus interesses ou manutenção de suas posições sociais estavam em cheque As mulheres como empecilhos para a execução da Justiça na Comarca das Alagoas Esse texto foi aberto com a apresentação dos conflitos vividos por João Vilela do Amaral na Comarca das Alagoas entre os anos de 1716 e 1721 Dentre eles apontaramse as acusações das Vilas de Penedo e Porto Calvo a respeito do envolvimento do ouvidor com mulheres que possuíam pendências judiciais Observar a utilização daquele argumento como estratégia discursiva jurídica apresentase como consequência de duas qualidades opostas que podiam ser direcionadas para personagens femininas Assim o apontamento para casos vividos por aqueles indivíduos era passível de se tornar um argumento de acusação ou defesa Ficava em aberto a possibilidade de registrar dificuldades sofridas por mulheres e a de explicitar momentos em que estas teriam sido causadoras de desconfortos sociais e morais que acabavam por interferir em procedimentos jurídicos Tudo em acordo com o estatuto social e jurídico feminino Vejase o caso do padre Manoel Álvares Pereira que servia na Igreja de Nossa Senhora do Rosário desde pelo menos a década de 1750 quando foram aprovados seus mantimentos de côngrua47 Diferente de seu antecessor Caetano Dantas Passos que deixou o templo com o certificado por ter prendido um feiticeiro muito procurado48 Manoel Álvares teve acusações levantadas contra ele pela via da câmara da Vila de Penedo recorrem os oficiais da câmara da Vila do Penedo a representar os notórios vexames e grandes opressões que os moradores deste termo ou freguesia têm padecido e sofrem atualmente pelo tirano despotismo com que o Pároco dela Manoel Álvares Pereira incitado da mais inordinada sic cobiça de seus maus escandalosos costumes se faz digno de que corregendo Vossa Majestade juntos excessos ampare com o oportuno remédio os seus aflitos vassalos Tem sido este cura de Almas pelo seu exemplo mais idôneo para viver entre feras no Deserto do que pastor indigno entre o seu Rebanho da Igreja 49 A carta é datada de 22 de setembro de 1765 e nela os agentes camarários apontaram que a cura de almas estava em jogo pois o único remédio oferecido pelo padre para as chagas de suas ovelhas era o veneno mais pestífero de seu sensual proceder Há mais de 14 anos em exercício Manoel Álvares Pereira não reserva problema nem casada de que há tido filhos e com algumas longo e ilícito trato50 Diante de tais circunstâncias prostrados aos reais pés do monarca Pay os oficiais daquela câmara objetivavam o pedido de substituição As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 164 do pároco por um com mais zelo doutrina e exemplo51 que livrasse de todos os males o íntimo de suas almas52 Naquele escrito a câmara de Penedo fez questão de ressaltar o perigo moral que paradoxalmente o padre Manoel Álvares Pereira representava para os moradores da vila Isso é percebido através da visualização de escolha de palavras como vexame escândalo indigno veneno cobiça todas colocadas no sentido de formar uma acusação introdutória demonstrando a falta de compromisso ético com os princípios básicos de um pensamento político e religioso em vigência É importante refletir sobre as representações do feminino naquele discurso montado Ali as mulheres assumiram lugares que lembram características e traços negativos que as viam como vulneráveis a assuntos ligados à sexualidade e à luxuria Não se exclui a possibilidade do escrito ter servido como defesa daquelas personagens das garras do eclesiástico mas apesar dos procedimentos negativos de Manoel Pereira não é possível deixar de perceber parcela da culpa sendo desviadas para elas já que nenhum adjetivo ou outra forma de argumento foi utilizado em favor das mesmas53 Para uma mulher a honra estava diretamente ligada a ideia do que se dizia a respeito dela54 assim como também o era para os homens55 Se era de conhecimento de todos o envolvimento daquele sacerdote com as esposas de homens daquela localidade o pedido para que se enviasse outro religioso capaz de administrar as almas era mais que esperado Os oficiais pediam justiça para seu caso e entendiam as mulheres como passíveis de seus cuidados mas também de suas penalizações como se sua paz ou inferno fosse diretamente ligada a ideia de bem comum56 Compreendiam essas personagens como catalisadoras de argumentação jurídica onde suas causas ou maus procedimentos eram complementares em petições enviadas ao monarca lembrandose da importância em executar a Justiça e em garantir direitos para aqueles que se encaixavam nos principais preceitos ocidentais e católicos como súditos da Coroa portuguesa Se foram citadas para defesa ou acusação ambas as linhas interpretativas devem ser percebidas sob o prisma de um sentido jurídico O discurso demonstrava representações da mulher e habilidades de utilização de seu estatuto judicial e presença encaixandoas como alicerces para o alcance de benefícios gerais objetivando êxitos particulares Percebese esse artifício como parte de uma fórmula adotada para questionar atitudes de autoridades religiosas agentes jurídicos ou outros indivíduos E apesar de sua grande recorrência não devem ser direcionadas ao lugar de meros modelos de requerimentos e petições57 É necessário interpretálas a fundo para responder até que ponto foi inerente à manipulação de As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 165 uma linguagem jurídica típica do Antigo Regime português e em suas conquistas desenvolvidos e flexibilizados sobretudo na primeira metade século XVIII58 Para melhor acepção de tal hipótese cabe ressaltar e analisar que para além da preocupação com o envolvimento de mulheres da terra em tratos ilícitos com aquele padre havia questões outras que a Vila de Penedo deixava evidente na carta Registrouse no mesmo escrito que o eclesiástico Manoel Pereira foi acusado de ter sentenciado os fregueses da região e a probabilidade de ter se tratado de condenações por concubinato59 tornase coerente visto a que segunda acusação ao religioso foi a de simonia60 realizada através do impedimento que vinha impondo aos moradores da localidade de se casarem fora da Matriz em associação com a taxa de preços exorbitantes para prestar tais sacramentos Cientes de que o crime tão recorrente na América portuguesa61 estava salvaguardado não apenas para a jurisdição eclesiástica mas também pela civil foi dito que Manoel Álvares Pereira estaria desprezando com essa usurpação as constituições e leys de Vossa Majestade pelas quais costuma atender ao aumento e conservação dos seus leais vassalos62 O conjunto geral de tal discurso no que implica analisar aqui revela que os casos ilícitos verdadeiros ou não foram estipulados como alicerce para retirar quaisquer resquícios de moralidade que o pároco pudesse possuir Por se tratar de um homem religioso obviamente o choque que o envolvimento de mulheres casadas nesses relacionamentos ilegais exerceriam no leitor visto a consecução através do tempo a concepção de filhos sacrílegos e a implicação também no crime de adultérios não foram nem eram computados separadamente de outros argumentos de mais peso Porém o padre Manoel Álvares Pereira também foi acusado de desestabilizar os cofres da Irmandade local de deixar de administrar os sacramentos e de nunca ter ensinado a doutrina cristã aos seus fregueses mesmo quando do período da quaresma de passar maior parte de seu tempo jogando cartas de desrespeitar particulares magistrados e o Senado com descomposturas e de interferir em assuntos jurisdicionais63 A partir da contabilização de todos esses argumentos a visualização de mulheres que direta ou indiretamente desviaram os rumos da justiça serviu para dar forma final ou introdutória às informações preocupantes que enviaram a D José64 tornando plausíveis os pontos anteriores já que desde o início apontou se o descaso do padre desobediente às leis divinas e régias Esboçouse um discurso repleto de argumentos devidamente interligados de modo a apresentarnos uma maneira eficiente de levantar queixa contra alguém e mais importante de ressaltar a importância da interseção do monarca na resolução de seus conflitos As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 166 Mas aquela não era a primeira vez que a Câmara da Vila de Penedo lidava com uma situação parecida muito menos que partiria dessas estratégias discursivas de cunho jurídico Suas reclamações a respeito da administração da justiça pela via do magistrado João Vilela do Amaral contou com os mesmos tipos de artifícios quarenta e três anos antes O ouvidor foi atingindo com uma série de acusações e desdobramentos das mesmas no ofício que a vila enviou ao rei em março de 1722 Em meio a tantos choques causados pela sua atuação registrouse Capítulo 15 Tinha ajuntamento com diversas mulheres em que dava bastantemente escândalo e ruim exemplo por ser pública a Sua lascívia e aquelas que traziam pleitos no seu Juízo em Certo terem Sentenças a seu Favor contra todo o direito e justiça65 Era inerente à montagem de um texto acusativo problematizar as ações de um indivíduo ou de um grupo evidenciando aspectos negativos que comprometiam sua respeitabilidade Para tal as cartas e ofícios enviados pelas vilas da Comarca das Alagoas contaram com estas argumentações apontando defeitos de ordem econômica política jurídica mas também moral Quando se tratou de implicar moralmente João Vilela do Amaral um capítulo em separado fora destinado a tratar desse assunto Apresentaramse as complicações que sua pública lascívia oferecia aqueles povos e que estaria atingindo diretamente a execução da justiça de modo a desestabilizar a ordem e o equilíbrio das coisas bem como exorbitar uma jurisdição em contrário ao aparelho jurídico disponível a nível local Longe de querer transparecer como a câmara da salvação os oficiais da Vila de Penedo auto afirmaramse como humildes vassalos Sua humildade no entanto não desprezava suas concepções das funções jurisdicionais de suas posições do ouvidor e do rei Diante da necessidade do envio de homens de justiça pela Coroa portuguesa aqueles súditos salientaram seus desconfortos e não pouparam tinta na hora de estabelecer uma série de motivos pelos quais só o remédio régio solucionaria aquelas pendências Em outros momentos o argumento moralreligioso se tornava uma frente de ataque A impressão que fica é a de que por onde passava João Vilela do Amaral iniciava relacionamentos amorosos ilegítimos não se importando nas consequências contraditórias que aquelas atitudes levariam à execução da Justiça naquelas terras66 Isso é dito a partir da constatação de uma aproximação dos argumentos da Vila de Penedo e da Vila de Porto Calvo A semelhança argumentativa pode revelar uma sincronização proposital ou não entre as vilas que fizeram questão de apelar a respeito dos incômodos morais e jurídicos que João Vilela do Amaral causara naqueles anos de sua atuação 17161720 Não descartando tal possibilidade As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 167 enxergase a reutilização de acontecimentos de maneira que eficientemente pudesse desenhar um quadro onde um ouvidor desobedecia suas funções delegadas pelo o rei e viveria em desacordo com os princípios católicos vigentes A Carta da Vila de Porto Calvo utilizou três capítulos para apresentar suas perspectivas a respeito dos serviços de João Vilela do Amaral Capítulo 5 que tinha conta com várias mulheres assim solteira como casada que perante ele tinha requerimentos Capítulo 7 que muitas vezes se ocultava as partes por estar divertindo com as concubinas de que havia detrimento grande nas partes por cuja causa se demorou dando tempo Capítulo 12 que nesta mesma segunda correição se concubinou com umas mulheres casadas dando escândalo por cuja causa fez algumas Sem Razões como fora dar Carta de Seguro a Antônio Pinto de Mendonça sem alvará por haver fugido da prisão em que estava tendo lhe negado muitas vezes e aceitou do dito criminoso uma caixa de açúcar67 O ponto em comum com o ofício de 1722 da Vila de Penedo se dá na percepção deste discurso como intimamente relacionado com os questionamentos sobre a capacidade de administração da Justiça pelas mãos de tal magistrado O envolvimento de mulheres em tais procedimentos judiciais sublinha não só o desrespeito ao matrimônio e as derivadas regras que a Santa Igreja Católica impunha A menção a tais acontecimentos desemboca na fundamentação de uma acusação que questionava a jurisdição de João Vilela do Amaral como homem e como oficial do rei Ora é inegável que tanto na carta de Penedo quanto na de Porto Calvo o ouvidor da comarca é citado dando a entender que além de se deixar cair no pecado do concubinato se deixava dominar por esses deslizes infringindo seu regimento68 e as intenções da manutenção do desenvolvimento da monarquia viabilizadas pela Coroa Essa mesma mensagem composta num todo mesclado de ideologia política religiosa e jurídica foi utilizada em outros momentos de conflitos com agentes externos ao aparelho judicial local O sucessor de Vilela do Amaral Manoel de Almeida Matoso que colaborou intensa e intimamente para a constituição de muitas queixas contra seu antecessor elevadas ao monarca69 não ficou livre de tais deslizes segundo o desembargador da Relação da Bahia António do Rego de Sá Quintanilha70 De acordo com as notícias que Quintanilha passara para o rei a respeito da residência que havia tirado é possível identificar mais de uma vez o uso da menção do envolvimento de mulheres nos caminhos da execução da justiça Em julho de 1726 um dos capítulos é composto por Do capítulo 1 se prova por muitas testemunhas que o Sindicado Manuel de Almeida Matoso que tomou posse do lugar de Ouvidor andando de noite de corroído em algumas casas de gente honrada com o pretexto de buscar criminosos corroído As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 168 para ter mulheres Depõe também por todas as testemunhas que uma negra escrava de boas partes o Sindicado lhe induziu a dita negra e meteu em sua casa aonde teve publicamente amancebado com ela 71 Logo dentro dessa circunstância a presença feminina e seu envolvimento em tais litígios possuía a mista carga moral e jurídica tão recorrente quando o assunto era a mulher dentro dos discursos daquelas câmaras No caso em questão uma especificidade importante de se observar é a fundamentação de tais afirmações baseados em testemunhos e a produção do documento a partir de um personagem externo Nesses termos fica em aberto duas formas de enxergar a contabilização de tais feitos ambas relacionadas diretamente com os questionamentos que direcionaram os depoimentos ouvidos por Antônio Quintanilha e a principal fonte de constituição dessas mesmas perguntas Dentre as duas perspectivas não foge a ideia da concepção acerca da necessidade de implicar indivíduos em áreas morais de sua vida social A incompatibilidade com seu ofício ficou evidenciada e destrinchada a partir das constatações de que andava de noite com o objetivo de para ter mulheres Em seguida descreveuse em detalhes o amancebamento do ouvidor com uma negra escravizada o que certamente teria cargas negativas diante da colocação das falas sobre Manoel de Almeida Matoso ter induzido a mulher e a metido em sua casa72 A adaptação a respeito da menção de tais casos leva as considerações anteriormente destrinchadas Falar de mulheres que foram vítimas ou criminosas fazia parte de um argumento estratégico que reincidia nos capítulos acusativos seguintes dando a eles um sentido de ser e cargas de validade Representava uma visualização preocupante que a Comarca das Alagoas possuía da ação de seus administradores régios Por mais que em âmbito civil tais crimespecados não recorressem de maneira cem por cento eficiente preenchiase tal lacuna com explicitação dos problemas que causavam fossem em questões de imputar exemplos ruins àquela sociedade e às suas mulheres ou forjar uma Justiça parcial e em desacordo com os elementos necessários à manutenção do bem comum Quando o objetivo foi levantar queixas contra os procedimentos de agentes de justiça advindos do reino as vilas acima mencionadas foram categóricas em afirmar que em suas terras também haviam mulheres indignas que agiam de acordo com seus desejos íntimos e desrespeitava os conselhos religiosos a respeito de seu comportamento73 Esse ponto de vista não poderia deixar de constar aqui pois a coexistência dele com a descrição dos casos anteriormente analisados pela via de homens do Senado demonstra que a sociedade que se As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 169 formava ao sul da Capitania de Pernambuco inteiravase com o desenvolvimento desde Portugal de lugares que o sexo feminino poderia ocupar Eram boas ou más e não se pode afirmar com certeza até que ponto as meio termo puderam ser reconhecidas como capazes de lutar contra sua própria natureza74 Sobre a produção de argumentos jurídicos de defesa e acusação identificase as possibilidades de menção ao sexo feminino Constituídos a partir do objetivo de explicitar desvios de conduta moral de agentes responsáveis em administrar a justiça ou a doutrina cristã tais discursos colocavam em movimento uma linguagem jurídica que se camuflava com as concepções naturais sobre o que era justo No geral apontar o concubinato como a consecução de um mau costume que poderia incitar exemplos ruins demonstraria integridade do acusador em defesa dos princípios cristãos Atingiriam ainda seu fim de legitimar um campo que se fechava em si mesmo manipulando situações e acontecimentos de forma a forjar artifícios que lhes eram próprios e que possuíssem a passividade de despertar no rei ou em seu Conselho Ultramarino noções básicas sobre o feminino e sobre a fragilidade moral de determinados indivíduos Já foi mencionada a defesa do bacharel que fora ouvidor das Alagoas João Vilela do Amaral Não é muito difícil de pensar no perfil social daquelas que foram maiormente prejudicadas pelos homens leigos com ofícios jurídicos Certamente mulheres que não possuíam cabedal para a contratação de advogados mas administradoras do suficiente para chamar a atenção da Justiça Diante da falta deles em solo alagoano a situação se complica ainda mais pois por onde agiriam numa ambiente em que sua voz só se tornava audível através de um homem É provável que acusações que implicaram João Vilela do Amaral e mesmo Manuel de Almeida Matoso terem sido apenas confusões Há a possibilidade de terem quebrado o que lhe previam o regimento de seu ofício sim aconselhando partes ou tomando partido de suas causas Mas isto pode ter acontecido em nome de auxiliar mulheres desamparadas no seio da justiça local impregnada de interesses de grandes homens ou daqueles que almejavam a consecução de uma posição forjada no embaraço de outrem Para esses objetivos certamente as mulheres tão subestimadas doutrinal e juridicamente serviram como encalço quase que perfeito Sua capacidade em desenvolver relações com as pessoas certas no entanto pode ter sido essencial para quebrar essas amarras Ou por outro lado teriam que se conformar com defesas ocultas passageiras capazes de prejudicar seus ofensores mas sob a condição de reafirmar um jogos sociais que a subordinavam por todos os lados O jogo social era conhecido de todos dentro daquela comunidade As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 170 Conclusão O propósito da observação das mulheres sem nome é obter uma análise geral sobre seu estatuto jurídico e das possibilidades de flexibilização e manipulação do mesmo em discursos e objetivos que podiam lhes ser inclusive alheios Diante de tal problema foram problematizadas as menções a mulheres dentro de escritos de acusação e defesa produzidos por agentes locais de justiça que exerceram jurisdição na Comarca das Alagoas Isso para se ter acesso a percepção daquela região a respeito das personagens femininas e dos rumos jurisdicionais que poderiam acarretar Dentro das discussões propostas pode ser afirmada o comum ou corriqueiro como representantes de um aparato doutrinal e jurídico em vigência da América portuguesa Dizer isso implica realçar que as falas que a priori podem ser encaixadas unicamente no âmbito apelativo na verdade revelam conexões fortes com a ideia de direito natural local e régio Em outras palavras as investidas na criação de artifícios narrativos não dissimulam a moral ou a verdade em que se pautava Ao fazerem referência à presença da mulher mostrouse uma concepção acerca do estatuto jurídico feminino em voga Viuse que em algumas horas sua existência era associada a ativação das funções protetivas das câmaras em relação as senhoras e a população e em outras foram apontadas como causas dos desvios da justiça executada pelas mãos de magistrados régios Além dessa clara demonstração e adequação aos preceitos teológicos e doutrinais sobre o feminino aqueles discursos evidenciavam ou queria fazer evidenciar a implicação de tais indivíduos no aparelho jurídico alagoano Invocavase as principais responsabilidades masculinas em manter o equilíbrio e a paz para o bem e desenvolvimento da monarquia e salvaguardavam as funções do rei e do direito local que havia sido colocado em cheque Não é difícil contabilizar na interpretação de tais alusões as mulheres a possível influência indireta ou informal daquelas agentes sociais dentro do convívio jurídico local Apesar de serem apresentadas como argumentos para um fim também podem ser representativas de aspectos de poder que o grupo feminino pôde utilizar Nessa linha de raciocínio é preciso compreender que o arcabouço discursivo forjado em sua defesa diretamente ou não demonstrava especificidades judiciais que podiam dissimular seus pormenores uma vez colocados sob a perspectiva leiga A relatividade do poder que as mulheres poderiam alcançar naquele período se faz presente a partir daí Pois a entrada no As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 171 âmbito jurídico da Comarca das Alagoas do século XVIII implicava enquadrarse nas expectativas que seu estatuto lhes permitia Assim forjaramse meios de consecução de seus preceitos a partir da manipulação argumentativa pela via judicial que passava a impressão de possibilidades de êxito e de poder Poder este ainda subordinado submisso e somente possível de acordo com requisitos e outras sujeições Notas 1 Procurar melhor entender o termo jurisdição ver HESPANHA António Manuel Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime In Idem Poder e instituições na Europa do Antigo Regime Coletânea de textos Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1984 p 36 CARDIM Pedro Administração e governo uma reflexão sobre o vocabulário do Antigo Regime In FERLINI Vera Lúcia BICALHO Maria Fernanda Orgs Modos de Governar São Paulo Alameda 2005 5457 2 HESPANHA António M Imbecillitas As bemaventuranças da inferioridade nas sociedades de Antigo Regime São Paulo Annablume 2010 pp 101138 3 HESPANHA António Manuel O estatuto jurídico da mulher na época da expansão In A política perdida ordem e governo antes da modernidade Curitiba Juará 2010 pp 131145 ALMEIDA Suely Creusa de O Sexo Devoto normatização e resistência feminina no Império português XVIXVIII Recife Editora Universitária UFPE 2005 pp 19128 PRIORE Mary Del Ao sul do corpo condição feminina maternidades e mentalidades no Brasil Colônia 2ª Edição São Paulo Editora UNESP 2009 4 Todos os documentos utilizados nesse texto advém do Catálogo de Documentos Manuscritos Avulsos referentes à Capitania de Alagoas Existentes no Arquivo Histórico Ultramarino e podem ser consultados no Centro de Pesquisa e Documentação Histórica CPDHis da Universidade Federal de Alagoas onde encontram se em formato de CDROM digitalizados 5 As informações retiradas deste conjunto serão tratadas através do método interpretativo do paradigma indiciário e análise de conteúdo já que geralmente constarão análises realizadas a partir de pequenos rastros que possibilitam considerações para além do que oficialmente dizia respeito BARDIN Laurence Análise de Conteúdo São Paulo Edições 70 2011 pp 2052 GINZBURG Carlo Mitos emblemas sinais morfologia e história São Paulo Cia das letras 1989 pp 143180 6 Iniciada a partir de estudos do russo Mikhail Bakhtin BAKHTIN Mikhail Marxismo e Filosofia da Linguagem São Paulo Hucitec 1995 PÊCHEUZ Michel O discurso estrutura ou acontecimento Campinas Pontes 1990 Semântica e discurso uma crítica à afirmação do óbvio Campinas Editora UNICAMP 1988 7 O que significa dizer que partiuse de estudos a respeito de normas jurídicas estabelecidas para as mulheres desde pontos na literatura jurídica que buscavam compreender o feminino até os direitos privilégios estabelecidos em consideração da especificação do sexo e de um indivíduo que não era considerado capaz de autogoverno HESPANHA Op Cit 2010 pp 105136 8 Por literatura judicial lusitana referese a vigência de códices e alvarás régios que serviam de fundamento e auxílio para a concepção e aceitação de uma hierarquia HESPANHA Op Cit 2010 HESPANHA António M Cultura jurídica europeia Síntese de um milênio MiraSintra Publicações EuropaAmérica 2003 HESPANHA António M Fundamentos antropológicos da família de Antigo Regime os sentimentos familiares e A representação da sociedade e do Poder In HESPANHA António Manuel coord História de Portugal o antigo regime vol IV Dir José Mattoso Lisboa editorial estampa 1992 9 O tipo de análise que será encontrada nesse trabalho se assemelha ao que foi realizado por Natalie Zemon Davis Em seu estudo sobre documentação de tribunais franceses a pesquisadora elegeu como objeto de estudo justamente os mecanismos discursivos dos quais chamou de fiction in the archives Dentre eles a autora chegou a conclusões pertinentes no que dizia respeito a compreender uma linguagem jurídica e de convencimento presente em cartas de perdão enviadas ao rei Para mais detalhes conferir a obra na íntegra DAVIS Natalie Zemon Histórias de Perdão e seus narradores na França do século XVI São Paulo Companhia das Letras 2001 10 Mais detalhes sobre os conflitos causados pelo segundo Ouvidor da Comarca das Alagoas 17161727 ver CAETANO A Filipe P org Alagoas e o Império Colonial Português Maceió Cepal 2010 pp 81123 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 172 CAETANO A Filipe P Org Alagoas Colonial Construindo Economias tecendo redes de poder e fundando administrações Séculos XVIIXVIII Recife Editora Universitária UFPE 2012 pp 151173 11 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 CAETANO Op Cit 2010 pp 81123 CAETANO Op Cit 2012 pp 151173 12 Representação dos oficiais da câmara da Vila de Porto Calvo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral 06 de abril de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 2631 13 Segundo Stuart Schwartz por Alvará de 1610 ficava proibido o casamento de magistrados e juízes com mulheres da terra É importante ressaltar que sua afirmação se referia aos magistrados e juízes que eram enviados à Bahia Supõese que o mesmo era tido para ouvidores de forma geral a partir da menção realizada nos trabalhos de Nuno Camarinhas SCHWARTZ Stuart B Burocracia e sociedade no Brasil Colonial O Tribunal Superior da Bahia e seus desembargadores 16091751 São Paulo Companhia das Letras 2011 pp 273 CAMARINHAS Op Cit 263267 14 Carta do Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral sobre os desmandos da região que administrava 15 de abril de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 3235 15 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 33 16 Por estatuto jurídico referese a normas judiciais que buscavam descrever e colocar rédeas nos indivíduos a partir da legitimação de hierarquias deveres e direitos Para mais detalhes ver HESPANHA Op Cit 2010 pp 15104 17 Carta do Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral sobre os desmandos da região que administrava 15 de abril de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 33 18 Carta do Ouvidor João Vilela do Amaral sobre os desmandos da região que administrava 03 de maio de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 36v 19 O regimento do Provedor dos Defuntos e ausentes é longo de resumo salientase que o Provedor tinha controle e jurisdição sobre bens de raiz testamentos e arrecadação de dívidas o que causava muito alvoroço quando utilizava disso para seus interesses próprios cf SALGADO Graça coord Fiscais e Meirinhos a administração no Brasil colonial Rio de Janeiro Nova Fronteira 1985 pp 196199 Para ter uma noção do Regimento como foi escrito na época cf Regimento de que hão de usar os Provedores Tesoureiros e mais Oficiais das fazendas dos defuntos e ausentes de Guiné Mina e Brasil Ilhas dos Açores e mais partes Ultramarinas Lisboa doze de maio de mil e setecentos e doze In MENDONÇA Marcos Carneiro Raízes da Formação Administativa do Brasil Tomo II regimentos XVII a XXXIII Rio de Janeiro Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro 1972 pp 477492 20 MELO Hildete Pereira de MARQUES Tereza Cristina Novaes a partilha da riqueza na ordem patriarcal R Econ Contemp Rio de Janeiro 5 2 juldez 2001 pp 155179 MELLO Evaldo Cabral de A fronda dos mazombos Nobres contra mascates Pernambuco 16661715 São Paulo Editora 34 2012 p 239 21 GONÇALVES Rui Dos privilégios praerogativas q ho gênero feminino te por direito comu ordenações do Reyno mais que ho gênero masculino Lisboa Biblioteca Nacional 1992 22 LARA Silvia Hunould Fragmentos Setecentistas Escravidão cultura e poder na América Portuguesa São Paulo Companhia das Letras 2007 79125 23 Nuno Camarinhas chega em conclusão parecida quando avalia o envio de oficiais régios O autor afirma que a proliferação de juízes e ouvidores externos advindos de nomeação régia deveuse as incongruências e injustiças constantemente apontadas como realizadas por juízes iletrados CAMARINHAS Nuno Juízes e administração da justiça no Antigo Regime Portugal e o império colonial séculos XVII e XVIII Lousã Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação para a ciência e a tecnologia 2010 pp 3652 24 HESPANHA Op Cit 2010 HESPANHA Op Cit 2003 25 O desembargador da Relação da Bahia foi designado para tirar a residência do Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral devido aos conflitos que o mesmo teve com seu substituto sucessor o bacharel Manoel de Almeida Matoso Assim apesar do monarca ter aprovado que Manoel de Almeida Matoso tirasse a dita residência 16 de março de 1720 acabou considerando também a argumentação de João Vilela do Amaral que pedia a interferência de agente externo sob a alegação de Almeida Matoso se tratar de um inimigo Essas informações podem ser vistas na Carta em que o rei autoriza o Ouvidor Geral das Alagoas Manoel de Almeida Matoso a tirar a residência de seu antecessor João Vilela do Amaral 16 de março de 1720 e Carta do magistrado João Vilela do Amaral em que pede ao rei que mande outro agente tirar sua residência que não seja seu sucessor As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 173 Manoel de Almeida Matoso sem data Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 09 e 1818v respectivamente 26 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 27 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 fl 09v 28 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 fl 02v 29 CAETANO Op Cit 2012 pp 156157 30 BLUTEAU Rafael Vocabulário portuguez latino Volume 04 Letras FJ Lisboa Colégio das Artes da Companhia de Jesus 1713 31 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 fl 08v 32 RUSSELWOOD A J R Fidalgos e filantropos a Santa Casa da Misericórdia da Bahia 1550 1755 Tradução de Sérgio Duarte Brasília Editora Universidade de Brasília 1981 p 302 33 Representação dos oficiais e povo da Vila de Penedo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral março de 1722 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 fl 05 34 Por linguagem jurídica da época não se pretende generalizar afirmações a respeito da América portuguesa ou das formas de escrita do reino mas sim partir do olhar acerca dos discursos produzidos na Comarca das Alagoas como vias capazes de abrir um leque de questionamentos maiores a respeito do que Pierre Bourdieu define como campo jurídico BOURDIEU Pierre A força do direito Elementos para uma sociologia do campo jurídico e A gênese dos conceitos de habitus e de campo In O poder simbólico Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2012 HESPANHA Op Cit 2010 THOMPSON E P Costume Lei e Direito Comum In Costumes em Comum São Paulo Companhia das Letras 1998 pp 86149 35 HESPANHA Op Cit 2003 pp 1534 HESPANHA Op Cit 2010 20100 BOURDIEU Pierre Le mort saisit le vif As relações entre a história reificada e a incorporada In Op Cit 2012 pp 8485 36 Não é desconsiderada a possibilidade de a palavra pobre poder ter sido aplicada num sentido de vulnerabilidade que não necessariamente dissesse respeito a situação financeira 37 HESPANHA Op Cit 2003 38 Sobre o poder simbólico ver BOURDIEU Op Cit 2012 39 Sobre confundir concepções leigas ou de senso comum com as concepções de um determinado campo ver BOURDIEU Op Cit 2012 pp 210235 40 Carta dos oficiais da Câmara da Vila das Alagoas sobre o estado miserável do povo 10 de dezembro de 1730 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 65 10 de dezembro de 1730 fl 01 41 Era papel das Câmaras Municipais cuidar de vários aspectos da administração das vilas cf BICALHO Maria Fernanda Baptista As câmaras ultramarinas e o governo do Império In FRAGOSO João BICALHO Maria Fernanda Baptista GOUVÊA Maria de Fátima orgs O Antigo Regime nos Trópicos a dinâmica imperial portuguesa séculos XVIXVIII Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2010 BOXER Charles O império marítimo Português 14151825 Tradução de Anna Olga de Barros Barreto São Paulo Companhia das Letras 2002 em especial o capítulo Conselheiros municipais e irmãos de caridade Nesse ínterim a proteção ao bem comum utilizando a fragilidade da mulher como reforço de argumento poderia ser uma ótima apelação discursiva para ter seus interesses satisfeitos Desenvolveuse esse argumento de que todos pelo menos no imaginário exerciam justiça no artigo cf MENDONÇA Anne Karolline Campos Juízes ordinários na região sul da Capitania de Pernambuco a justiça do rei e dos súditos portugueses séculos XVII e XVIII In CAETANO Antonio Filipe Pereira org Das partes sul à Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco ensaios sobre justiça economia poder e defesa século XVIIXVIII Maceió Viva Editora 2015 42 Idem 43 Natalie Zemon Davis encontrou casos que giraram em torno da mesma problemática quando estudou a França do século XVI e os pedidos de perdão enviados ao rei Aponta a probabilidade de resoluções jurídicas estarem subordinadas políticojudiciais maiores que diziam respeito a manutenção do ordenamento de uma sociedade DAVIS Natalie Zemon Histórias de Perdão e seus narradores na França do século XVI São Paulo Companhia das Letras 2001 pp 8283 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 174 44 Requerimento onde Bento Rebello Pereira pede que se faça nova devassa sobre seu envolvimento num crime de ferimento sem data Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 45 19 de maio de 1727 fl 17v 45 Despacho a respeito do Requerimento de Bento Rebello Pereira 30 de agosto de 1725 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 45 19 de maio de 1727 fl 18 46 Requerimento do mestre em artes e sacerdote João Velho Barreto a pedir carta para advogar ao rei sem data Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 57 12 de janeiro de 1730 fl 01 47 Requerimento do padre Manuel Álvares Pereira em que pede alvará de mantimentos para apresentação na Igreja de Nossa Senhora do Rosário Vila do Penedo aprovaçãodespacho em 25 de fevereiro de 1750 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 130 25 de Fevereiro de 1750 48 MACHADO Alex Rolim Classificação e perseguição os agentes da Inquisição os negros pardos e mulatos em sociedade escravista Alagoas Colonial 16741820 Sankofa Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana São Paulo nº XIV Ano VII Dezembro2014 49 Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 01 50 Idem 51 Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 02 52 Na íntegra pedimos que como Pay dseos vassalos nos queira mandar prover de outro Pároco que com mais Zello doutrina e exemplo nos possa edificar e não destruir e que sejamos livres de todos os males que padecemos Por cujo benefício do íntimo de nossas almas oferecemos a Deus e ficar firmes votos e que prospere a preciosa vida de Vossa Majestade por muitos e felizes anos Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 02 53 Como se fez ao longo do documento em outros momentos e em se tratando de outros personagens Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 02 54 ALMEIDA Op Cit 2005 pp 89 55 A honra se identificava com a reputação com a voz pública isto é que depende não de quem a detém mas da opinião alheia cf MELLO Evaldo Cabral de O nome e o sangue Uma parábola familiar no Pernambuco colonial 2ª edição revista Rio de Janeiro Topbooks 2000 p 27 56 Afinal a salvação se era matéria de cada um não deixava também de ser coisa de todos Nas cabeças ressoavam ameaças de expiação colectiva O seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos Bíblia Mat 25 para além de que sobretudo em épocas de grande crise pública fomes infortúnios militares ganhava força a ideia de que estas provações colectivas se relacionavam com a prática generalizada de pecados públicos São pecados públicos os que se cometem em público e que por isso podem ser objecto de um inquérito público mesmo a cargo das autoridades temporais bem como de correcção pública pois aqui tratase não apenas de admoestar o pecador para que não peque mais mas ainda de dissuadir os outros perante quem tais pecados são cometidos HESPANHA António Manuel A monarquia a legislação e os agentes In MONTEIRO Nuno Gonçalo coord História da vida privada em Portugal A idade moderna Direcção de José Mattoso Lisboa Temas e Debates Círculo de Leitores 2011 p 18 57 SILVA Maria Beatriz Nizza da Sistema de Casamento no Brasil Colonial São Paulo EDUSP 1984 58 Levandose em conta que foi naquele período que se intensificou os conflitos ou complementações de uma justiça local com a do rei representada através de seus agentes judiciários CAMARINHAS Op Cit 2010 59 Os moradores daquela localidade viviam sob constante ameaça de ser preso tudo inclusive com o aval do Reverendo Visitador Antonio Teixeira Lima acusado por isso de alienar as verdadeiras intenções do bispo daquela diocese Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 14 de março de 1722 14 de março de 1722 60 A vida exemplar para um homem eclesiástico pode ser visto nas Constituições da Bahia mas sobretudo em respeito ao crime de Simonia era condenado se cobrar por cobrança de sacramentos ver Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia Liv V Tít VI VII e VIII VIDE Op Cit 2010 p 466469 61 LEWKOWICZ Ida A fragilidade do celibato In LIMA Lana Lage da Gama org Mulheres adúlteros e padres História e moral na sociedade brasileira Rio de Janeiro Dois Pontos Editores 1987 TORRES LONDOÑO Fernando A outra família concubinato igreja e escândalo na colônia São Paulo Edições Loyola 1999 62 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 01 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 175 63 ROLIM Alex CURVELO Arthur MARQUES Dimas PEDROSA Lanuza Crime e justiça no domicílio ordinário dos delinquentes Comarca das Alagoas Século XVIII Revista Crítica Histórica nº 3 Ano II Julho2011 pp 5455 64 Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 182 22 de setembro de 1765 fl 02 65 Carta dos oficiais da Vila do Penedo sobre os procedimentos do pároco Manuel Álvares Pereira 22 de setembro de 1765 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 22 fl 05v 66 Ver Nota 13 67 Representação dos oficiais da câmara da Vila de Porto Calvo ao rei contra o Ouvidor Geral das Alagoas João Vilela do Amaral 06 de abril de 1720 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 21 17 de outubro de 1721 fl 27 e 28 68 Ordenações Filipinas Tít XX Do oficial delRey que dorme com mulher que perante ele requer ALMEIDA Op Cit 2012 4º Tomo pp 11711172 69 Para detalhes dos conflitos entre Vilela do Amaral e Almeida Matoso ver CAETANO Op Cit 2010 pp 81 123 CAETANO Op Cit 2012 pp 151173 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 14 15 16 20 21 22 25 27 31 39 40 41 42 44 45 46 63 78 129 e 143 70 Em 1727 o Ouvidor Geral das Alagoas Manoel de Almeida Matoso pede para que se refaça sua residência sob a alegação que a primeira estaria comprometida pelas amizades e interesses de seu antecessor Almeida Matoso se envolvera em sérios conflitos de jurisdição com o Ouvidor João Vilela do Amaral o que levou a ambos os magistrados terem sido residenciados especificamente por membros do tribunal da Relação da Bahia Requerimento de Manoel de Almeida Matoso ao rei sem data Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 42 16 de março 1727 71 Carta do Desembargador da Bahia Antônio do Rego e Sá Quintanilha ao rei sobre a residência que tirou do Ouvidor Geral das Alagoas Manoel de Almeida Matoso 03 de julho de 1726 Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Documento 45 19 de maio 1727 fl 07 e 13 72 Mais detalhes sobre o caso cf MENDONÇA Anne Karolline Campos A relação das mulheres com a justiça e o direito Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17121798 Dissertação de Mestrado em História Instituto de Ciências Humanas Comunicação e Artes Universidade Federal de Alagoas 2017 pp 119 151 73 Impossível não pensar nas mulheres de máfama das Minas Gerais que utilizavam do sexo para conseguir vantagens pecuniárias dos homens se adornando com joias e roupas caras Saber até que ponto isso é válido para a Comarca das Alagoas ainda é algo para se estudar e aprofundar Para as minas cf FURTADO Júnia Ferreira Chica da Silva e o contratador dos diamantes o outro lado do mito São Paulo Companhia das Letras 2003 MELLO E SOUZA Laura de Desclassificados do ouro a pobreza mineira no século XVIII Rio de Janeiro Edições Graal 4ª ed revista e ampliada 2004 74 A historiadora Suely Creusa de Almeida aponta casos de mulheres em recolhimentos que se arrependiam de seus atos e levavam uma vida religiosa ALMEIDA Op Cit 2005 Fontes Arquivo Histórico Ultramarino Alagoas Avulsos Cx 1 Documentos 01 até 297 Código Filipino ou Ordenações e Leis do Reino de Portugal recopiladas por mandado del Rey D Filipe I Cândido Mendes de Almeida Ed Facsim Brasília Senado Federal Conselho Editorial 2012 Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia Sebastião Monteiro da Vide estudo introdutório e edição Bruno Feitler Evergton Sales Souza Istvan Jancsó Pedro Puntoni org São Paulo Editora da Universidade de São Paulo 2010 GONÇALVES Rui Dos privilégios praerogativas q ho gênero feminino te por direito comu ordenações do Reyno mais que ho gênero masculino Lisboa Biblioteca Nacional 1992 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 176 Referências Bibliográficas ALMEIDA Suely Creusa de O Sexo Devoto normatização e resistência feminina no Império português XVIXVIII Recife Editora Universitária UFPE 2005 BARDIN Laurence Análise de Conteúdo Lisboa Edições 70 2012 BOURDIEU Pierre O poder simbólico Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2012 BOXER Charles O império marítimo Português 14151825 Tradução de Anna Olga de Barros Barreto São Paulo Companhia das Letras 2002 BRAGA Isabel M R M Drumond HERNÁNDEZ Margarita Torremocha As mulheres perante os tribunais do Antigo Regime na Península Ibérica Imprensa da Universidade de Coimbra 2015 CAETANO A Filipe P Org Alagoas e o Império Colonial Português Maceió Cepal 2010 CAETANO A Filipe P Org Alagoas Colonial Construindo Economias tecendo redes de poder e fundando administrações Séculos XVIIXVIII Recife Editora Universitária UFPE 2012 CAETANO Antonio Filipe Pereira Org Das partes sul à Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco ensaios sobre justiça economia poder e defesa século XVIIXVIII Maceió Viva Editora 2015 CARDIM Pedro Administração e governo uma reflexão sobre o vocabulário do Antigo Regime In FERLINI Vera Lúcia BICALHO Maria Fernanda Orgs Modos de Governar São Paulo Alameda 2005 CAMARINHAS Nuno Juízes e administração da justiça no Antigo Regime Portugal e o império colonial séculos XVII e XVIII Lousã Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação para a ciência e a tecnologia 2010 DAVIS Natalie Zemon Histórias de Perdão e seus narradores na França do século XVI São Paulo Companhia das Letras 2001 DAVIS Natalie Zemon Nas margens três mulheres do século XVII São Paulo Companhia das Letras 1997 FERNANDES Maria de Lurdes Correia Literatura Moral e Discursos Jurídicos Em torno dos privilégios femininos no século XVI em Portugal Revista da Faculdade de Letras Línguas e Literatura Porto XVII 2000 FURTADO Júnia Ferreira Chica da Silva e o contratador dos diamantes o outro lado do mito São Paulo Companhia das Letras 2003 FRAGOSO João BICALHO Maria Fernanda Baptista GOUVÊA Maria de Fátima orgs O Antigo Regime nos Trópicos a dinâmica imperial portuguesa séculos XVIXVIII Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2010 GINZBURG Carlo Mitos emblemas sinais morfologia e história São Paulo Cia das letras 1989 GRUZINSKI Serge As quatro partes do mundo História de uma mundialização Belo Horizonte Editora UFMG São Paulo Edusp 2014 HESPANHA António M Imbecillitas As bemaventuranças da inferioridade nas sociedades de Antigo Regime São Paulo Annablume 2010 HESPANHA António M A História do Direito na História Social Lisboa Livros Horizonte 1978 HESPANHA António Manuel Org Poder e instituições na Europa do Antigo Regime Coletânea de textos Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1984 As mulheres sem nome o desenvolvimento de argumentos jurídicos baseados no estatuto feminino Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17161765 Anne Karolline Campos Mendonça CLIO Revista de Pesquisa Histórica CLIO Recife ISSN 25255649 n 35 p 152177 JulDez 2017 httpdxdoiorg1022264clioissn252556492017352al01 177 HESPANHA António Manuel Cultura jurídica europeia Síntese de um milênio Mira Sintra Publicações EuropaAmérica 2003 HESPANHA António Manuel A monarquia a legislação e os agentes In MONTEIRO Nuno Gonçalo coord História da vida privada em Portugal A idade moderna Direcção de José Mattoso Lisboa Temas e Debates Círculo de Leitores 2011 LARA Silvia Hunould Fragmentos Setecentistas Escravidão cultura e poder na América Portuguesa São Paulo Companhia das Letras 2007 MACHADO Alex Rolim Classificação e perseguição os agentes da Inquisição os negros pardos e mulatos em sociedade escravista Alagoas Colonial 16741820 Sankofa Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana Ano VII nº XIV Dezembro2014 MELO Hildete Pereira de MARQUES Tereza Cristina Novaes a partilha da riqueza na ordem patriarcal R Econ Contemp Rio de Janeiro 5 2 155179 juldez 2001 MELLO Evaldo Cabral de O nome e o sangue Uma parábola familiar no Pernambuco colonial 2ª edição revista Rio de Janeiro Topbooks 2000 MELLO Evaldo Cabral de A fronda dos mazombos Nobres contra mascates Pernambuco 16661715 São Paulo Editora 34 2012 MELLO E SOUZA Laura de Desclassificados do ouro a pobreza mineira no século XVIII Rio de Janeiro Edições Graal 4ª ed revista e ampliada 2004 MENDONÇA Anne Karolline Campos A relação das mulheres com a justiça e o direito Comarca das Alagoas Capitania de Pernambuco 17121798 Dissertação de Mestrado em História Instituto de Ciências Humanas Comunicação e Artes Universidade Federal de Alagoas 2017 PAIVA Eduardo França Escravos e libertos nas Minas Gerais do século XVIII estratégias de resistência através dos testamentos São Paulo Annablume 1995 ROLIM Alex CURVELO Arthur MARQUES Dimas PEDROSA Lanuza Crime e justiça no domicílio ordinário dos delinquentes Comarca das Alagoas Século XVIII Revista Crítica Histórica Ano II nº 3 Julho2011 pp 5455 RUSSELWOOD A J R Fidalgos e filantropos a Santa Casa da Misericórdia da Bahia 1550 1755 Tradução de Sérgio Duarte Brasília Editora Universidade de Brasília 1981 SALGADO Graça coord Fiscais e Meirinhos a administração no Brasil colonial Rio de Janeiro Nova Fronteira 1985 SANTOS Giovanna Aparecida Schittini dos Direito e Gênero Rui Gonçalves e o estatuto jurídico das mulheres em Portugal no Séc XVI 15211603 2007 Dissertação Mestrado em História Universidade Federal de Goiás Goiânia 2007