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391 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Resumo No contexto de renovação da historiografia da educação no Brasil tem sido crescente o número de estudos que buscam compreender como determinados saberes se tornaram propriamente escolares Essas pesquisas têm contribuído para um melhor entendimento do papel desempenhado pela escola e por outras instâncias sociais na definição daquilo que ao longo do tempo tem sido considerado essencial na formação das novas gerações Esse campo de estudos tem sido identificado ao que se convencionou denominar História das Disciplinas Escolares uma abordagem multidisciplinar que já há algumas décadas vem sendo desenvolvida por pesquisadores de vários países do mundo O artigo que constitui um ensaio biblio gráfico busca identificar e problematizar tendências de pesquisa nessa área no interior do campo mais amplo da História da Educa ção Por fim descreve sucintamente dois estudos realizados recen temente por pesquisadores brasileiros nas áreas da Educação Física e Educação Artística que se inserem nessa linha de investigação Apesar do crescente número de pesquisas realizadas em torno do tema a maioria dos trabalhos muitas vezes dedicados a traçar cronológica e retroativamente a presença de um saber na escola é realizada de forma isolada e parte de pressupostos muitas vezes rígidos advindos das tradições da transposição didática ou da cultura escolar Acreditase que somente com a realização periódi ca de balanços é possível tornar inteligível o processo de transfor mação eou construção de saberes em saberes propriamente esco lares tanto em uma perspectiva empírica quanto do ponto de vista propriamente teórico Palavraschave Historiografia da educação Disciplinas escolares Educação física Educação artística Correspondência Marcílio Souza Junior Rua Silvino Lopes n 125804 Casa Forte 52061490 Recife PE email msouzajruolcombr Os autores agradecem a Ceres Leite Prado pela leitura crítica des te artigo História das disciplinas escolares e história da educação algumas reflexões Marcílio Souza Júnior Universidade de Pernambuco Ana Maria de Oliveira Galvão Universidade Federal de Minas Gerais 392 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Abstract In the context of a renovation of the historiography of education in Brazil there have been a growing number of studies trying to understand how certain knowledges became school knowledges proper These studies have contributed to improve our under standing about the role played by the school and by other social organizations in the definition of what has been regarded at different times as essential in the formation of the new generations This field of study has been identified to what has been called History of School Subjects a multidisciplinary approach that has been developed by researchers around the world during the last decades The article constitutes a bibliographical essay and seeks to identify and problematize research trends in this area within the wider field of the History of Education Lastly it briefly describes two studies carried out recently by Brazilian researchers in the areas of Physical Education and Artistic Education that can be included in this line of investigation Despite the rising number of studies carried out around this topic the majority of works often dedicated to outline chronologically and retrospectively the presence of a specific knowledge at school are conducted in isolation and adopt assumptions many times rigidly coming from the didactic transposition or school culture traditions We believe that it is only by conducting periodic assessments that the process of transfor mation andor construction of knowledges into school knowledges proper can be made intelligible both from an empirical perspective and from a theoretical point of view Keywords Historiography of education School subjects Physical edu cation Artistic education Contact Marcílio Souza Junior Rua Silvino Lopes n 125804 Casa Forte 52061490 Recife PE email msouzajruolcombr History of school subjects and history of education some reflections Marcílio Souza Júnior Universidade de Pernambuco Ana Maria de Oliveira Galvão Universidade Federal de Minas Gerais The authors wish to thank Ceres Leite Prado for the critical review of this article 393 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Introdução Nas últimas duas décadas no Brasil no contexto de renovação da historiografia da edu cação no país1 tem sido crescente o número de estudos que buscam compreender como deter minados saberes se tornaram propriamente es colares Em geral realizadas por professorespes quisadores interessados em conhecer a história de sua própria disciplina essas pesquisas têm contribuído de maneira significativa para um melhor entendimento do papel desempenhado pela escola e por outras instâncias sociais na de finição daquilo que ao longo do tempo tem sido considerado essencial na formação das novas gerações Esse campo de estudos tem sido identificado de modo geral no interior da his tória da educação ao que se convencionou de nominar História das Disciplinas Escolares uma abordagem multidisciplinar que já há algumas décadas vem sendo desenvolvida por pesquisa dores de vários países do mundo Certamente um dos motivos pelos quais a História das Disciplinas Escolares tem se con figurado na atualidade brasileira como uma importante área de estudos tem sido a sua potencialidade em fornecer um novo olhar para a escola do passado permitindo perceber que a história da educação vai além da história dos ideários e dos discursos pedagógicos Estudos nesse campo permitem ainda complexificar a noção de tempo na medida em que o estudo das transformações de um saber que se torna escolar não obedece a uma linearidade lógica mas resulta de uma série de injunções que assumem características específicas em cada espaço social e em cada época Nesse texto buscamos identificar e pro blematizar tendências de pesquisa nessa área no interior do campo mais amplo da História da Educação embora reconhecendo sua vinculação também com outras tradições de investigação como a Sociologia do Currículo Descrevemos ainda sucintamente dois estudos realizados re centemente por pesquisadores brasileiros que se inserem nessa linha de investigação História das disciplinas escolares História das Disciplinas Escolares Histó ria das Disciplinas Curriculares História das Matérias Escolares História dos Saberes Esco lares História dos Conteúdos Escolares são expressões que remetem a um mesmo campo de pesquisa Os estudos em História das Disciplinas Escolares aparecem segundo Bittencourt em diferentes países quase que simultaneamente possuindo em comum a preocupação em identificar a gênese e os diferentes momentos históricos em que se constituem os saberes escolares visando perceber a sua dinâmica as continuidades e descontinuidades no processo de escolarização 2003 p 15 Chervel 1990 afirma que a especificidade desse campo de estudos reside na investigação dos ensinos da idade escolar pois o seu elemento central é a história dos conteúdos Nesse campo é possível investigar a relação entre o que foi estabelecido como finalidade para os conteúdos de ensino e o que foi efetivamente ensinado aprendido Enfim não é um campo que estuda a história das idéias pedagógicas do discurso pe dagógico oficial das políticas educacionais já que tais elaborações visam mais freqüentemente em geral de forma positiva corrigir um estado de coisas modificando certas práticas do que pro priamente representar a realidade Por outro lado o campo da História das Disciplinas Escolares procura enfatizar o porquê de a escola ensinar o que ensina em vez de tentar responder o que a escola deveria ensinar Para Forquin 1992 esse campo de pes quisa possibilita obter informações acerca da se leção cultural que faz a escola identificando o que é em determinada época compreendido 1 Para um mapeamento recente do campo da História da Educação no Brasil ver entre outros Vidal e Faria Filho 2003 Carvalho 2004 Lopes e Galvão 2001 394 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas como o que deve ser ensinado É possível tam bém nesse campo captar elementos que em um conflituoso percurso de conquista de legitimidade de uma ou outra disciplina curricular mostrem a conquista de um estatuto a briga por recursos as delimitações territoriais no interior do currículo escolar os espaços nos horários etc O próprio de uma reflexão sociológica ou histórica sobre os saberes escolares é contri buir para dissolver esta percepção natural das coisas ao mostrar como os conteúdos e os modos de programação didática dos sa beres escolares se inscrevem de um lado na configuração de um campo escolar caracte rizado pela existência de imperativos funci onais específicos conflitos de interesses corporativos disputas de fronteiras entre as disciplinas lutas pela conquista da autono mia ou da hegemonia no que concerne ao controle do currículo de outro lado na configuração de um campo social caracteri zado pela coexistência de grupos sociais com interesses divergentes e com postu lações ideológicas e culturais heterogêneas para os quais a escolarização constitui um trunfo social político e simbólico Forquin 1992 p 4344 Para Goodson 1995 a História das Matérias Escolares compondo a área da Histó ria do Currículo propõese a penetrar em um campo que os historiadores se mostraram incli nados a ignorar os conteúdos escolares os métodos de ensino e os percursos de estudo buscando nos processos internos da escola cai xapreta pistas para analisar as complexas re lações entre escola e sociedade inclusive enfatizando como as escolas tanto refletem como refratam as definições da sociedade acer ca dos conhecimentos culturalmente válidos Tal área de estudo passa a estabelecer um novo paradigma para os estudos sobre a História da Educação trazendo uma agenda que aproxima os estudos educacionais dos estudos da histó ria do conhecimento Todavia o seu valor principal reside em sua capacidade de investigar a realidade interna e a autonomia relativa da escolarização A his tória curricular considera a escola algo mais do que um simples instrumento de cultura da classe dominante Goodson 1995 p 120 Nesse sentido Santos 1990 afirma que a História das Disciplinas Escolares representa uma reação aos trabalhos em que a educação é quase exclusivamente interpretada em função da estrutura econômica política e social Essa nova área de estudos no campo da so ciologia do currículo tem como objetivo ex plicar a emergência e evolução das diferentes disciplinas escolares Além disso investiga também a predominância de certas tendênci as durante um determinado período bem como mudanças na organização e estrutu ração do conteúdo e nos métodos de ensino ibid p 2122 Procurase desse modo compreender a busca por legitimidade de algumas disciplinas escolares consideradas de menor valor pedagó gico investigar a constituição do estatuto epistemológico de tais disciplinas pesquisar o movimento de transformação da cultura e mais especificamente do conhecimento científico em saber escolar e observar as modificações dos métodos e conteúdos de ensino ao longo do tempo abrangendo diferentes períodos A História das Disciplinas Escolares tende ainda a focalizar o seu olhar para as característi cas peculiares de cada nível e modalidade de en sino do elementar passando pelo secundário e indo até o superior no que se inclui inclusive segundo Bittencourt 2003 compreender as dife renças entre eles e o processo de transformação dos conhecimentos das disciplinas acadêmicas universitárias em conteúdos das disciplinasmaté rias escolares do currículo da educação básica Nesse sentido o currículo é considerado uma palavrachave segundo Goodson 1995 para melhor compreender a escola ao longo do 395 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 tempo Currículo escrito currículo como fato currículo como prática currículo como atividade são algumas entre as várias denominações e con cepções atribuídas ao termo Goodson 1995 porém conclui que a luta por definir o que é currículo termina por caracterizálo como sendo a invenção de uma tradição2 Desse modo o que chamamos por currículo e por disciplinamatéria escolar nem sempre teve a compreensão que contemporaneamente lhes atribuímos tanto nos seus sentidos mais corriquei ros quanto em uma concepção mais acadêmica Com o objetivo de rever brevemente a história da compreensão conceitual de currículo e disciplina escolar revisemos alguns conceitos atribuídos a tais termos procurando assim evitar um problema comum nas pesquisas históricas o anacronismo O termo currículo advém da palavra la tina scurrere que pode ser traduzida como cor rer referindose a curso a ser seguido mais especificamente a ser apresentado Goodson 1995 Provavelmente a compreensão mais an tiga do termo currículo foi encontrada em fon tes da Universidade de Glasgow na Escócia em 1663 que lhe atribui o significado de atestado de graduação outorgado a um mestre dessa ins tituição de ensino Goodson 1995 Saviani 1994 Segundo Nereide Saviani com o tempo o termo currículo evolui da idéia inicial de registro de vida estudantil de cada aluno para indicar o conjunto dos novos traços or denados e seqüenciais da escola do século XVI 1994 p 41 Na atualidade num sentido mais corrente o currículo passa a ser compreendido como um conjunto daquilo que se ensina e daquilo que se aprende tendo como referência alguma ordem de progressão podendo referirse para além do que está escritoprescrito oficialmente Forquin 1996 O currículo pode também ser considerado como um processo informal de interação entre aquilo que é deliberado o que é interpretado e o que é efetivado às vezes de maneira transfor mada ou até mesmo subvertida Goodson 1995 Enfim o currículo amplia o sentido de organiza ção disciplinar no sentido de regras de conduta para o sentido de organização disciplinar com preendendo objetos partes e matérias do ensino Já o termo disciplina no sentido de conteúdos de ensino segundo Chervel 1990 só aparece mais recentemente nas primeiras décadas do século XX pois até o fim do século XIX seu significado não era mais do que a vigilância dos estabelecimentos em relação às condutas prejudiciais a sua boa ordem e àquela parte da educação dos alunos que contribui para tal ordem podendo se identificar a atitu des repressivas ou ainda fazendo par com o verbo disciplinar que é sinônimo de ginástica exercício intelectual Os termos que equivale riam à disciplina durante o século XIX como conteúdos de ensino eram objetos partes ramos ou ainda matérias de ensino É após a Ia Guerra Mundial que o termo disciplina vai tornarse uma rubrica que classi fica as matérias de ensino dando um caráter aos conteúdos como sendo próprios do ambiente escolar mas não se desvinculando por comple to de seu sentido de exercitação intelectual já que é acompanhado por métodos e regras para abordar os diferentes domínios do pensamento do conhecimento e da arte Chervel 1990 O entendimento do termo disciplina está vinculado à idéia de hierarquização e estrati ficação Porém ao contrário do que se estabe lece nas escolas atuais a idade nem sempre foi critério de repartições por níveis Nossa atual estrutura de classes baseada em faixas etárias é resultante da forma mais pedagógica da or ganização das escolas do século XVIII influen ciada pela estrutura das escolas cristãs e pelo ensino mútuo pois até então a maioria delas se organizava em classe única em que a con 2 Para Hobsbawn e Ranger 1984 p 1 autores no qual Goodson se baseia o termo tradição inventada significa um conjunto de prá ticas e ritos práticas normalmente regidas por normas expressas ou tacitamente aceitas ritos ou natureza simbólica que procuram fazer circular certos valores e normas de comportamento mediante repetição que automaticamente implica em continuidade com o pas sado De fato onde é possível o que tais práticas e ritos buscam é estabelecer continuidade com um passado histórico apropriado 396 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas sideração da idade não desempenhava nenhum papel direto nas repartições escolares Chega va a existir uma variação de até doze anos numa mesma repartição Chervel 1990 Esse processo adquire uma face específica na histó ria da educação brasileira na medida em que embora o método simultâneo já fosse reco mendado pelas instâncias oficiais de educação desde meados do século XIX o ensino seriado só foi oficialmente implantado com a criação dos grupos escolares no início do período re publicano ver Faria Filho 2000 Faria Filho Vidal 2000 Souza 1998 Pinheiro 2002 Segundo Goodson 1995 as matérias disciplinas escolares passam por uma seqüên cia de estágios Elas partem de um momento de marginalidade com um status inferior no currículo passam para um estágio utilitário e finalmente alcançam uma definição como dis ciplina que se configuraria a partir de um con junto exato e rigoroso de conhecimentos O que apenas pretendemos dizer é que a aplicação explicitamente instrumental de conjuntos de conhecimentos diminui em re lação inversa à seriedade e ao êxito das ten tativas dos profissionais de melhorar as suas condições materiais Goodson 1995 p 131 Layton apud Goodson 1990 analisando a evolução da matéria disciplina Ciências no currículo escolar define três estágios No primei ro a matéria ainda intrusa conquista lugar no horário escolar e justifica sua presença por sua utilidade Nesse momento os alunos são atraídos para a matéria por ela estabelecer relações com questões do interesse deles Os professores não são especialistas da área mas entusiastas pioneiros No segundo já começam a surgir uma tradição de tra balho acadêmico e um conjunto de especialistas treinados Os alunos agora são atraídos também pelo crescente status acadêmico A seleção e a or ganização de seus conteúdos são mais influenci adas por sua lógica interna E no terceiro e últi mo os professores já constituem um quadro pro fissional com regras e valores estabelecidos Os conteúdos selecionados para a matéria advêm em grande medida dos acadêmicos da área Os alu nos começam a iniciarse em uma tradição e apro ximarse portanto da passividade Segundo Santos 1990 se o estabeleci mento de uma disciplina depende também de fatores internos tais como a emergência de grupos de liderança intelectual o surgimento de centros acadêmicos de prestígio na formação de profissionais a organização e a evolução das associações de profissionais e o avanço da polí tica editorial da área então às influências so ciais e econômicas não se podem atribuir sim ples e diretamente as conformações e transforma ções ocorridas no âmbito educacional A auto ra ainda afirma que é fundamental reconhecer que as relações entre os fatores internos e exter nos no desenvolvimento de uma disciplina não são uma constante pois o peso desses fatores dependerá de algumas condições E alerta que se devem observar o nível e o tipo de desenvolvi mento de um país principalmente seu regime político pois ele pode ter grande peso nesse pro cesso podendo tornar uma disciplina mais vul nerável aos fatores externos Enfim quanto maior é o nível de maturidade de uma disciplina e a organização dos profissionais da área maior será o peso dos fatores internos no seu desenvolvimento Santos 1990 p 26 Como pode ser visto as disciplinas es colares não se estabelecem no currículo esco lar de maneira pacífica conformandose às ori entações oficiais mas ao contrário guardam relações conflituosas com as teorizações aca dêmicas e as recomendações oficiais ora aca tandoas ora resistindo a elas ora reforman doas ou deformandoas A história da educação no Brasil e o estudo das disciplinas escolares No caso específico da história da educa ção brasileira as idéias sinteticamente expos 397 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 tas acima penetraram e foram reelaboradas no campo a partir de um movimento mais amplo de renovação dos seus objetos e fontes Nesse processo alguns conceitos eou teorizações elaborados nas áreas de educação eou de his tória foram de fundamental importância na realização das pesquisas Por muito tempo a história da educa ção no Brasil e também em outros países ver Compère 1995 ocupouse de estudar a orga nização dos sistemas de ensino e de ideário e discursos pedagógicos baseandose em fontes como leis regulamentos reformas educacionais e obras de grandes pensadores Em virtude de sua aproximação com a filosofia da educação essa história se tornou muitas vezes um estu do das recomendações A história da educação tratou muito pouco até recentemente das prá ticas escolares e do cotidiano escolar pois via de regra procurou obter de tais fontes e ob jetos como o passado educacional se projetou Nesse sentido configurouse como uma histó ria do que deveria ser a realidade e não do que a realidade efetivamente foi Lopes e Galvão 2001 Evidentemente não estamos nos referindo aqui à ilusão rankeana3 de trazer ao presente o passado tal como ele realmente aconteceu mas à tentativa de reconstruir práticas educativas e não apenas proposições educacionais Muitas vezes pautados em uma concepção de história positivista os trabalhos tradicionalmen te realizados no campo da história da educação deixaram mais evidentes a história política a his tória das intenções dos sujeitos civis pensadores e dos sujeitos políticos Estado Muitas dessas pesquisas tiveram como objetivo a descrição de fatos notáveis e a ação dos sujeitos quase iden tificados como personagens heróicos em um tempo histórico linear ordenado de maneira cro nológica e sucessiva a partir de uma lógica formal No entanto nos últimos tempos a his tória da educação passou por um verdadeiro processo de renovação No Brasil especifica mente nos últimos vinte anos esse campo de estudos aproximouse de uma nova forma de escrever a história possibilitando uma nova leitura principalmente da escola Segundo Lopes e Galvão 2001 os estudos passaram a ser mais localizados e contextualizados lidando com períodos de tempo mais curtos Ainda segundo as autoras essa área passou a se pre ocupar com a organização e o funcionamento interno das escolas com a expressão eou construção cultural no cotidiano escolar com o estabelecimento do conhecimento do currí culo das disciplinas escolares Além das fontes oficiais que têm recebido um novo olhar e um novo tratamento outras fontes passaram a ser utilizadas tais como a fotografia a literatura os manuais escolares os jornais e revistas a história oral4 etc Esse movimento de renovação e ampliação na historiografia da história da educação vai encontrar inspiração sobretudo na Escola dos Annales uma nova forma de entender e escrever a história que posteriormente se convencionou chamar de Nova História Segundo Burke 1997 as idéias diretrizes dos Annales sumária e breve mente buscam substituir a narrativa tradicional de acontecimentos por uma históriaproblema descreverreconhecer a história para além dos fatos políticos buscando os elementos de todas as atividades humanas e integrar a história com outras disciplinas das Ciências Sociais No inte rior da Nova História um campo específico de es tudos tem atraído a atenção dos historiadores da educação a História Cultural que como veremos adiante vai também influenciar a investigação sobre a História das Disciplinas Escolares No interior desse processo de renovação como já referido a História das Disciplinas tem se tornado uma área privilegiada de investiga ção Identificamos no caso da história da edu cação brasileira três conceitos nucleares eou tendências teóricas que parecem ter influenci 3 Referimonos aqui a Leopold Ranke 17951886 que na tenta tiva de dar à história um estatuto de ciência acreditava que cabia aos historiadores mediante a pesquisa em documentos oficiais es crever sobre o passado tal como ele realmente havia acontecido 4 Como advogam Amado e Ferreira 1996 a fonte oral não consti tui por si só história Assim usamos o termo entre aspas para indi car sua filiação teóricometodológica mas reconhecendo que a fala do sujeito da pesquisa é apenas uma fonte como tantas outras 398 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas ado decisivamente as pesquisas desenvolvidas no país5 Uma primeira influência advém das teo rizações e pesquisas realizadas no campo da Sociologia do Currículo ou da Nova Sociologia da Educação e tem como referência principal mente as investigações de Michael Young re alizadas na Inglaterra É importante frisar no entanto que tal perspectiva é originária fun damentalmente da inspiração dos estudos de Le Play realizados já na virada do século Nos anos 60 do século XX os estudos de Raymond Williams por sua vez fornecem um referencial para uma abordagem que reconhece a cultura como uma tradição seletiva ou seja como um processo de decantação e reinterpretação per manente da herança deixada pelas gerações anteriores Já no fim dos anos de 1960 e iní cio dos de 1970 Forquin 1996 identifica uma outra abordagem que tem como um de seus representantes Frank Musgrove Este centrali za seus estudos na natureza social das constru ções curriculares verificando como as matéri as escolares conferem a seus membros um forte sentimento de identidade Já a partir de mea dos dos anos de 1970 identifica o que se cha mou Nova Sociologia da Educação6 que asso cia os estudos acerca do currículo a um progra ma de crítica políticocultural radical procu rando evidenciar como se dava o processo de legitimação dos conteúdos curriculares e da estratificação dos saberes Podese afirmar as sim que no âmbito da sociologia educacional os estudos apesar de existirem apresentaram um desenvolvimento incipiente até o fim da década de 1950 conquistando mais fôlego a partir dos anos de 1970 quando então passam a constituir uma nova sociologia da educação tendo como objeto central de suas teorizações o currículo escolar Moreira Silva 1995 As pesquisas nesse campo têm como foco central a análise do processo de seleção e organização do conhecimento educacional e mais especificamente do saber escolar buscan do compreender como o conhecimento é ma terializado no currículo No percurso de uma reconceitualização de currículo aparecem estu dos que examinando as relações entre ele e a estrutura social cultura poder ideologia con trole social procuram focalizar como fazer o currículo trabalhar a favor dos grupos e das classes oprimidas desenvolvendo assim seu potencial libertador Forquin 1996 identifica ainda um outro grupo que teve um papel fundamental nos estu dos sociológicos sobre currículo tratase dos pes quisadores que investigam a relação entre currículo formal currículo real e currículo oculto Na Fran ça o autor evidencia que a discussão acerca do currículo acontece mais tardiamente do que na Inglaterra no início dos anos de 1980 Isso se dá porque a reflexão sobre programas de ensino foi conduzida no quadro de uma tradição enciclopé dica em que os saberes escolares eram considera dos como naturais portanto sem merecer reflexão e questionamento Já em meados da década de 1980 é possível encontrar estudos que estabele cem diferenças entre o currículo formaloficial e o currículo real entendendose este último como aquilo que é realmente ensinado nas salas de aula passível de ser conhecido por observação ou pes quisa direta com os professores e alunos Nessa mesma época é possível observar uma outra abor dagem mais precisamente em países anglófonos São os estudos que focalizam as discussões em torno do currículo oculto ou seja naquilo que está implícito invisível na organização curricular desde a estruturação do tempo e espaço escolar até a codificação O implícito pode suscitar o de senvolvimento de competências favoráveis ou mes mo ações dissimuláveis e pervertidas Uma segunda influência que pode ser detectada na realização das pesquisas sobre a História das Disciplinas Escolares no âmbito da 5 Jean Hébrard identifica ainda a influência da história das ciên cias que no caso da História da Educação brasileira parece não ter tido grande penetração Ver Oliveira 2003 6 Para o autor uma afirmação de Bernstein resume muito bem a hipótese central na Nova Sociologia da Educação o modo como uma sociedade seleciona classifica distribui transmite e avalia os saberes destinados ao ensino reflete a distribuição do poder em seu interior e a maneira pela qual aí se encontra assegurado o controle social dos com portamentos individuais Bernstein apud Forquin 1993 p 85 399 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 história da educação brasileira advém de dois conceitos que em sua origem apresentaramse como antagônicos o de transposição didática cujo principal representante é Yves Chevallard e o de cultura escolar elaborado principal mente por André Chervel Forquin 1996 iden tifica a elaboração desses conceitos no interior de uma discussão entre historiadores didaticistas e sociólogos Em uma primeira abordagem aparecem recentemente na França estudos de didaticistas que compreendem disciplina escolar como trans posição didática7 Usando tal noção os pesqui sadores passam a investigar o percurso do saber até chegar à escola ou seja a transformação do conhecimento científico exterior à escola em conhecimento escolar Apesar de recente essa abordagem se baseia no conceito de transposição didática elaborado já em 1975 a partir dos es tudos do sociólogo Michel Verret Influenciada por pesquisas de diversos estudiosos principal mente aqueles vinculados ao IREM Institute de Recherches en Education Mathématique essa abordagem dá origem à Teoria das Situações Didáticas com fundamentos em um campo de conhecimento denominado Engenharia Didática8 Numa espécie de cooperativa teórica a Teoria das Situações Didáticas tem como referência es tudos de Jean Piaget Gérard Vergnaud Guy Brousseau Yves Chevellard Regine Douady Ali ne Robert e outros Em uma outra abordagem fazendo uma crítica rigorosa à primeira encontramse os es tudos históricos que mostram que a escola não se contenta em transpor os conteúdos preexis tentes e exteriores a ela Nesses estudos inves tigase a escola como local de produção do co nhecimento com características originais ou seja a compreensão de disciplina escolar como cultura escolar9 André Chervel investiga a constituição de um corpo de conhecimentos que chama de gramática escolar construído por pedagogos para servirem de apoio às aprendi zagens das regras ortográficas Analisando o ensino de francês na França o autor discorda da abordagem da transposição didática e afir ma que as disciplinas escolares possuem uma autonomia gerando um conhecimento peda gógico próprio da escola As disciplinas esco lares apesar de seus conteúdos de ensino te rem origem na sociedade e na cultura que ro deiam a escola não se ligam diretamente às ciências de referência pois se assim fosse se ria dada à pedagogia a característica de um simples método Chervel 1990 denomina esse processo de disciplinavulgarização em que a disciplina simplifica vulgariza os saberes e ainda de pedagogialubrificante em que a pedagogia se encarrega de lubrificar e fazer girar a máquina educacional Hébrard 1999 assim resume esse deba te entre as duas abordagens hoje o principal debate desse domínio referese às relações entre saberes eruditos e saberes escolares Para certos autores mode lo da transposição didática os sistemas es colares são percebidos como dispositivos que selecionam e transformam os saberes produ zidos pelos intelectuais com a finalidade de tornálos assimiláveis pelos novos alunos Para outros modelo da história das discipli nas escolares a escola constrói seus próprios tipos de saberes ou habilidades conforme os modos de elaboração cuja lógica pode ser encontrada dentro dos próprios sistemas educativos É o caso por exemplo das gra máticas escolares que durante muito tempo 7 Por transposição didática entendese o conjunto de transfor mações que sofre o saber científico antes de ser ensinado Da esco lha do saber a ensinar à sua adaptação ao sistema didático existe todo um processo gerador de deformações de estabelecimento de coerência e até de criação de novos conhecimentos que culmina com o que se chama de saber escolar enunciado nos programas e parti cularmente observáveis nos livrostexto Chevallard 1985 8 Estudos que buscam a criação e a exploração de situações de aprendizagem sobre temas específicos de ensino e que visam à valida ção de certas construções empíricas extraídas de inovações pedagógi cas Henry 1992 9 Por cultura escolar Dominique Julia entende um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses co nhecimentos e a incorporação desses comportamentos normas e práticas coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épo cas finalidades religiosas sóciopolíticas ou simplesmente de soci alização 2001 p 10 400 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas não se beneficiaram dos avanços da filologia ou das ciências da linguagem e dificilmente aceitaram esse enxerto quando a ocasião se apresentou p 3536 É importante observar que o debate en tre de um lado as exigências de didatização do saber científico para tornarse saber escolar e de outro do papel ativo desempenhado pela escola na criação de saberes já está presente nas ins tâncias educacionais brasileiras há pelo menos mais de um século Galvão et al 2003 anali sando livros escolares e pareceres sobre livros conferidos por instâncias oficiais da província de Pernambuco no século XIX constataram por exemplo que muitos aspectos que na atualida de estão no centro da discussão sobre os pro cessos de escolarização dos saberes já estavam em pauta naquele momento e espaço social Destacamse nesse sentido as relações entre conhecimento científico saberes da tradição que circulavam fora da escola e o processo de dida tização dos saberes pela instituição escolar De acordo com as instâncias educacionais da época para um livro ter seu uso aprovado nas aulas de primeiras letras da província os conteúdos deveriam ser consistentes do ponto de vista científico Não seriam admitidos livros que trouxessem inexatidões ou desatualizações muito gritantes em relação ao conhecimento que era produzido no âmbito da ciência Esse critério não foi atendido por exemplo pela obra Compendio de Physica para Leituras de autoria de Francisco de Paula Barros destinada às es colas de instrução primária que recebeu em 1885 parecer não favorável do Conselho Lite rário para que fosse utilizada nas escolas pro vinciais Um dos principais argumentos dos pareceristas referese justamente às inexac tidões e faltas da doutrina compendiada Ao longo do parecer são apresentados os diversos erros conceituais cometidos pelo autor que pa rece não ter incorporado minimamente as diver sas descobertas que realizavam as ciências na quele vertiginoso final de século Embora reco nheçam que o conhecimento científico sofre transformações muito rápidas e que é difícil para um livro escolar acompanhar essas transforma ções os pareceristas não perdoam os diversos erros cometidos onze no total são elencados destacandose as imprecisões científicas dos conceitos utilizados e enfatizandose as contra dições apresentadas pelo próprio compêndio Como afirmam os pareceristas Os brilhantes e numerosos progressos da physica nas suas theorias e principalmente as suas portentosas descobertas na ordem prati ca teem nestes ultimos annos preocupado por tal modo a attenção publica que são por toda parte recibidos com verdadeira anciedade as publicações que tem por fim compendiar sob uma forma succinta e em linguagem dos que não são profissionaes os principios mais fundamentaes os factos mais incontestaveis e as applicações multiplices de tão importante dominio dos conhecimentos humanos Á vista do movimento universal das sciencias physicas e no meios das modificações mais ou menos profundas porem sempre progressivas que ellas vão diariamente soffrendo os trata dos elementares mesmo os mais bem accaba dos são sempre incompletos porque por mais exactos que sejão os quadros que elles apresentão dos conhecimentos actuaes poucos mezes bastão para que se tornem esses qua dros insufficientes e até infieis APEJE IP 44 1885 p 6667 Para os autores do parecer no entanto os erros apontados são graves e não convem por forma alguma que figurem em um compendio de physica sciencia hoje tão necessaria que o seu estudo faz parte de todos os programmas de ensino desde a escola primaria até os cursos superio res APEJE IP 44 1885 p 6667 Podese perceber assim que havia uma preocupação para que a escola estivesse atua lizada em relação às então recentes descober 401 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 tas científicas Nesse sentido o livro deveria funcionar como uma espécie de mediador en tre o conhecimento científico e as exigências de didatização Para que uma obra fosse considerada didática por outro lado precisava necessaria mente adequarse ao público a que se destina va as crianças das escolas primárias Nesse sentido em vários momentos os pareceristas qualificam esse público chamando a atenção para a necessidade de que o livro alcance as inteligências mais incultas ou débeis APEJE IP 19 1866 p 294 dos meninos e meninas Além disso para atender às exigências de didatização o livro escolar também deve ria ser bem organizado Para ser aprovado este deveria apresentar uma seqüência lógica não ser confuso ser clarobreve metodicamente planejado e adequado ao uso escolar Na se gunda metade dos oitocentos os manuais tam bém deveriam se basear nos preceitos do mé todo intuitivo10 suas páginas deveriam coadu narse com um espírito mais prático do que teórico e entre os recursos possíveis para que isso ocorresse recomendavase o uso de dese nhos exercícios e quadros Percebese nesse aspecto a consciência que tinham os que es tavam à frente das instâncias de instrução pú blica provinciais de que o conhecimento cien tífico era distinto do conhecimento escolar Cabia ao manual mediar essas duas instâncias se como vimos o manual deveria estar isento de imprecisões e inexatidões científicas tam bém deveria adequarse ao uso cotidiano da escola e ao público ao qual se destinava As sim a preocupação com a transposição didá tica para usar uma expressão de cem anos depois Chevallard 1985 parecia presente não apenas restrita ao manual escolar mas a toda ação da escola pelo menos no final do sécu lo quando a discussão sobre o método intui tivo e a lição de coisas tornamse cada vez mais presentes Uma terceira influência que se pode identificar nesses estudos mais recentes que se debruçam sobre os saberes e disciplinas esco lares no campo da história da educação brasi leira advém da história cultural que tem cha mado atenção principalmente por meio dos es tudos de Roger Chartier 1990 para a neces sidade de se estudarem os objetos culturais em sua materialidade restabelecendo os processos implicados em sua produção circulação con sumo práticas usos e apropriações Lopes e Galvão 2001 p 40 Segundo Jean Hébrard 1999 a histó ria cultural debruçouse também sobre os pro cessos de escolarização mas segundo uma outra perspectiva Para essa tendência um dos maiores problemas colocados pelas diferentes sociedades é a história das relações entre cul turas orais e culturas escritas Nesse sentido a escola não pode ser considerada o único nem o mais importante lugar onde se constroem e transmitem os equipamentos intelectuais de uma sociedade p 37 No entanto ela de sempenha um papel importante na definição desses equipamentos sobretudo quando enuncia as normas legítimas do seu uso p 37 favorecendo ou freando a sua divulgação em grupos sociais diferentes Nesse sentido segundo o autor a investigação sobre a Histó ria das Disciplinas Escolares ganha uma outra perspectiva a partir da pesquisa sobre certos objetos específicos como por exemplo a his tória dos cânones escolares que pode auxiliar na compreensão da difusão das práticas de leitura da elite ou a história da difusão do li vro que foi clareada pela história dos media dores culturais da escrita vivendo no contato dos dois mundos o do oral e o da escrita pa dres professores notários etc p 36 A His tória das Disciplinas Escolares pode assim aju dar a compreender qual o papel específico da escola na inserção de certos grupos em socie dades fortemente marcadas pela escrita ou pela oralidade Nas palavras de Hébrard 1999 Assim a escola forma em seu espaço pró prio sujeitos que lêem escrevem mas tam 10 Sobre o método intuitivo ver Valdemarin 2004 402 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas bém ordenam o mundo conforme as catego rias que o corpus de textos e a palavra do professor tornam quase naturais Comunida de de interpretação inaugural a escola é obrigada a produzir uma recepção comparti lhada dos textos pelo único fato de que sem a certeza do sentido não haveria nem ensino possível nem aprendizagem As aprendizagens iniciais não são portanto como se acredita saberes neutros puramente instrumentais prontos para servir a qualquer uso Que leitores que escritores tornamse os exalunos quando encontram longe da esco la as sociabilidades do trabalho da família da vizinhança Que fazem com o equipa mento mental de que a escola os dotou com menos ou mais paciência ou violência Como esquecêlo ou transformálo para desenvolver novas habilidades mais apropriadas às ne cessidades da vida social Entre as figuras do leitor cujas variantes a história cultural des creve e as figuras de escolares que nós ten tamos reconstruir aqui existem desvios e continuidades cujos mecanismos nos esca pam ainda p 77 Como afirmam Lopes e Galvão 2001 Influenciado sobretudo pelos trabalhos reali zados no âmbito da história cultural o estudo das disciplinas e dos saberes escolares tem sido considerado fundamental para melhor compreender o papel dos contextos culturais na definição daquilo que deve ser ensinado na escola e por outro lado o papel da escola na produção e na reelaboração do conhecimento principalmente através dos processos de didatização p 55 Dois estudos em História das Disciplinas Escolares Nessa parte do artigo descrevemos e dis cutimos brevemente dois trabalhos realizados recentemente por pesquisadores brasileiros no âmbito da História das Disciplinas Escolares Ambos se debruçam sobre disciplinas que na atualidade ocupam um espaço secundário no currículo escolar a Educação Física e a Educa ção Artística Além disso os dois estudos se detêm sobre dimensões da vida de homens e mulheres que não estão diretamente relaciona das àquilo a que a escola tradicionalmente se propôs a trabalhar ou seja a atividade cognitiva intelectual Lidam por outro lado com o cor po e a sensibilidade Ambos se referem a áreas da atividade humana que não constituem fora da escola a não ser muito recentemente sabe res propriamente científicos com uma tradição epistemológica de longa data11 No âmbito da historiografia em Educação Física poderíamos sinteticamente configurar quatro grandes momentosestágios dos estudos históricos dessa disciplina escolar correndo o ris co mesmo não sendo essa a intenção de sermos interpretados como reducionistas e lineares Um primeiro momento caracterizado como uma his tória dos ideários pedagógicos tem como proe minentes autor e obra Fernando Azevedo 1960 Da educação física o que é o que tem sido e o que deveria ser Nessa história da Educação Física temse muito mais a preocupação em le gitimar uma posição no presente do que se em penhar em um conhecimento do passado Pagni 1995 Outro momento configurado como uma história oficial e episódica tem em Inezil Penna Marinho seu grande representante com duas importantes obras analisadas pelos estudiosos História geral da Educação Física e Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Essa história da Educação Física faz estudos de lon gos períodos e a partir de documentos oficiais coletados principalmente em um único local os arquivos da Biblioteca Nacional Pagni 1995 Segundo Ferreira Neto 1996 representam a visão dos de cima descrita de forma objetiva e linear Em um outro momento as pesquisas se fundamentam em uma concepção de história marxista seu autor e obra de maior destaque é 11 Nesse sentido a tese da transposição didática mostra de parti da fragilidades para compreender esse tipo de disciplina 403 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Lino Castellani Filho com o trabalho Educação Física no Brasil a história que não se conta 1988 Essa historiografia da Educação Física procura reescrever a história a partir principal mente da identificação das relações socioeco nômicas objetivando oporse a uma narrativa que apenas descreve e agrupa os acontecimen tos procurando interpretar os fatos diante de um movimento de resistências Pagni 1995 A his tória nessa perspectiva acontece e é escrita como expressão das relações sociais que por sua vez são consideradas como reflexo do modo de pro dução Ferreira Neto 1996 Em um outro mo mento no qual se inclui a pesquisa de Vago 2002 os trabalhos voltamse para a perspecti va da Nova História destacandose aqui os se guintes estudiosos e obras Fernanda Paiva Ciência e poder simbólico no Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte Eustáquia de Souza Me ninos à marcha Meninas à sombra Victor Andrade de Melo Escola Nacional de Educação Física e Desportos uma possível história Essa historiografia da Educação Física reconhece que toda atividade humana tem história e assim amplia o uso de fontes procurando reconhecer a visão dos de baixo Ferreira Neto 1996 O primeiro estudo resultado de uma tese de doutorado em Educação da Universida de de São Paulo já publicado como livro teve como título Cultura escolar cultivo de corpos Educação Physica e Gymnastica como práticas constitutivas dos corpos de crianças no ensino público primário de Belo Horizonte 1906 1920 Seu autor é Tarcísio Mauro Vago 2002 professor da Universidade Federal de Minas Gerais membro do Grupo de Estudos e Pesqui sas em História da Educação da Faculdade de Educação também coordenador do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação Física Esco lar da Escola de Educação Física da mesma Universidade ProEFEEEF O objetivo do estudo de Vago 2002 que expressa proximidade com a perspectiva mais recente de tradição de pesquisas no inte rior da historiografia da Educação Física foi investigar a constituição do campo disciplinar Gymnastica nas práticas escolares do ensino primário em Belo Horizonte a partir da reforma de 1906 O autor nos mostra como nas duas primeiras décadas do século XX a Educação Física em meio às relações de conflitos e ten sões foise constituindo disciplina escolar em instituições públicas desse município dandonos referências para uma vez mais perceber que a história não acontece de maneira linear Seu problema de pesquisa partiu dos seguintes questionamentos 1 Que representa ções de ginástica foram produzidas naquele momento em que se procurava implantar uma nova ordem escolar em Belo Horizonte 2 Com base em que matrizes foram produzidas 3 Que exercícios physicos foram prescritos nas diversas reformas do ensino primário promovidas no pe ríodo 4 Que corpo se desejava construir nas e com as práticas escolares Teve como referencial teóricometodo lógico a Nova História Cultural e como catego rias conceituais as definições de representação de Roger Chartier de documento de Jacques Le Goff de estratégia e tática de Michel de Certeau e de cultura escolar de Dominique Julia Suas principais fontes foram leis progra mas escolares relatórios ofícios cartas mapas de pagamentos folhas de presença pesqui sados no acervo do Arquivo Público Mineiro de Belo Horizonte Segundo Vago 2002 a Educação Físi ca inicialmente na forma de Ginástica teve como tarefa de maneira higiênica desinfetar e limpar os corpos das crianças tornandoos belos fortes e saudáveis como também de maneira corretiva endireitar os corpos defei tuosos toscos amarelados indolentes colocandoos em posição ereta e varonil O au tor nos mostra que a partir dos anos de 1920 uma outra lógica passa a orientar a escola rização dessa disciplina reconfigurando a cor reção dos corpos de princípios republicanos em direção à eficiência dos gestos necessários à industrialização É claro que essas lógicas pauta das numa idéia de hegemonia cultural presentes nas elites intelectuais encontraram resistências na 404 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas heterogeneidade das experiências dos atores soci ais As crianças por exemplo muitas vezes respon diam a essas lógicas com fugas e infreqüência às sessões de aulas Aliás Vago 2002 apresenta não só as diferentes lógicas matrizes e concepções de corpo e educação presentes na prática da Edu cação Física no período estudado mas a confi guração da própria Educação Física como disci plina escolar a partir de uma discussão por exemplo dos próprios termos que designavam essa parte dos programas escolares que não se restringia a uma única disciplina Exercícios Physicos Exercícios Gymnasticos Exercícios Calisthenicos ou simplesmente Gymnastica jun tamente com outras disciplinas responsabiliza vamse pela Educação Physica das crianças No entanto com o passar do tempo essa educação do físico dos meninos e meninas passa a ser de responsabilidade de uma disciplina específica a Educação Physica que assumiria a tarefa do cultivo dos corpos O segundo estudo selecionado foi por sua vez resultado de uma dissertação de mestrado em educação da Universidade Federal de Pernambuco em que a autora Maria Betânia e Silva que é professora de Educação Artística na rede estadual de ensino é também pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas História da Educação em Pernambuco Esse estudo A inserção da arte no currículo escolar Pernambuco 19501980 foi por sua vez motivada por questões do presente a autora assim justifica o seu estudo Como professora de arte em escolas públicas e privadas há oito anos tenho levantado uma série de questionamentos e buscado compreender o porquê de a existência de al guns preconceitos estabelecidos com relação à arte como disciplina curricular O fato da arte ser posta sempre numa posição secundária em relação às outras disciplinas o estigma cri ado entre alunos e professores de que arte não reprova portanto não é necessário ser levada a sério como as outras disciplinas e também à freqüente presença de profissionais de outras áreas que lecionam a disciplina como comple mento de carga horária levaramme a uma inquietação e as questões passaram a se inten sificar Silva 2004 depoimento oral gravado em áudio Entre as questões colocadas pela auto ra destacamse por que a arte é relegada a um segundo plano como disciplina entre docentes e entre outros profissionais da instituição escolar por que se considera a arte apenas como complemento secundário e talvez desnecessá rio no currículo que serve apenas para deco ração do ambiente e comemoração de datas festivas ou é considerada apenas como uma atividade de lazer e ainda que a arte não é preciso ser pensada logo não tem o peso que as outras disciplinas têm porque não é preciso usar a razão por que qualquer profissional de qualquer área pode lecionar a arte fato que não ocorre em relação à grande parte das outras disciplinas do currículo porque a carga horária é tão reduzida em re lação às outras disciplinas enfim por que não existe uma estruturação do conteúdo programático a ser trabalhado e desenvolvido como nas outras disciplinas Silva 2004 de poimento oral gravado em áudio De maneira diferente do que ocorre em relação aos trabalhos sobre Educação Física são praticamente inexistentes os trabalhos no caso brasileiro que se debruçam sobre a histó ria da arte na escola como indica a autora Tal constatação já havia sido feita por Ana Mae Barbosa 1999 a partir de um levantamento realizado em 80 dissertações e teses no Brasil Silva 2003 fundamentouse teórica e metodologicamente na Nova História Cultural tendo como referências os estudos de Jacques Le Goff Jean Hébrard e Michel de Certeau Baseouse ainda na compreensão de História das Disciplinas Escolares de André Chervel Circe Bittencourt Dominique Julia e Ivor 405 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Goodson Utilizou como fontes de pesquisa legislação leis resoluções pareceres propos tas curriculares e programas de ensino jornais e revistas assim como depoimentos orais Para selecionar tais fontes pesquisou nos acervos do Arquivo Público Estadual de Pernambuco da Biblioteca do Centro de Artes e Comunicação da UFPE da Biblioteca Pública do Estado de Pernambuco do Conselho Estadual de Educa ção e da Divisão de Extensão Cultural e Artís tica DECA Silva 2004 constata que embora a Arte esteja presente no currículo escolar brasileiro desde o século XIX com outras denomina ções e em alguns casos no interior de outras disciplinas é somente durante a ditadura mi litar a partir da Lei 569271 que esta vira dis ciplina escolar obrigatória com a denomina ção de Educação Artística A autora estuda então o papel desempenhado por alguns mo vimentos e instâncias que contribuíram para a articulação dos profissionais da área que associa aos fatores internos caracterizados por Santos 1990 e o próprio processo de ela boração da lei naquele contexto histórico es pecífico busca compreender assim o papel dos fatores externos na criaçãotransformação de uma disciplina Como podemos constatar estudos como os aqui referidos podem elucidar uma série de questões que estão no centro do debate educa cional contemporâneo Acreditamos que com preender melhor como um saber se escolariza em determinados momentos da história que relações estabelecem com práticas sociais não escolares e como a escola inventa e reinventa em seu interior outros saberes e torna legítimos os seus usos certamente auxiliam a entender o papel que vem sendo desempenhado pela ins tituição escolar ao longo da história Considerações finais O processo de escolarização da cultura ou seja a transformação dos saberes em sabe res propriamente escolares existente em dife rentes períodos históricos é o elemento central nas pesquisas do campo da História das Disci plinas Escolares Essa tendência revela uma nova maneira de olhar o passado educacional das instituições de ensino oferecendo uma nova leitura das fontes fornecendo elementos para melhor perceber e compreender a constru ção cultural do cotidiano escolar Neste artigo pensamos ter sido possível fornecer alguns elementos para a reflexão em torno da História das Disciplinas Escolares a partir dos processos de renovação e ampliação observados na área de História da Educação no Brasil Apesar do crescente número de pesqui sas realizadas em torno do tema no entanto observamos que ainda há muito a ser investiga do Em relação às disciplinas Educação Física e Educação Artística por exemplo aqui citadas muitas vezes vemos estudos que se debruçam sobre a história da arte ou das práticas corpo rais como dimensões das manifestações cultu rais da humanidade como se fossem sinônimos da história desses saberes escolares No entan to essas histórias necessariamente não expres sam a história de seus saberes escolares A escolarização das artes e das práticas corporais mantém relação de fato com essas dimensões da cultura humana mas como mostra a História das Disciplinas Escolares é necessário perceber e compreender as particularidades da escolari zação desses saberes e práticas nos diferentes tempos e espaços sociais A história da arte e a história das práticas corporais não se confundem e não coincidem portanto com a história da Educação Artística e a história da Educação Fí sica Mesmo mantendo relações entre si essas histórias possuem características peculiares em cada espaço social e em cada época A constituição dos saberes escolares espe cíficos a cada disciplina do currículo é resultado de um processo complexo que envolve consen timentos conflitos diferentes tipos de mediação entre diversos sujeitos e instituições diante dos papéis que em cada época e sociedade são atri buídos à escola Na Educação Física e na Educa ção Artística contemporaneamente esse processo 406 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas parece marcado por uma busca permanente de legitimidade diante de saberes que tradicional mente parecem mais próximos ao que foi sen do identificado e naturalizado como inerente à instituição escolar saberes mais próximos da racionalidade moderna Por fim cabe ressaltar que apesar do grande número de pesquisas que vêm sendo re alizadas na área a maioria dos trabalhos mui tas vezes dedicados a traçar cronológica e retro ativamente a presença de um saber na escola é realizada de forma isolada Além disso muitos deles já partem de pressupostos mais ou me nos rígidos advindos das tradições da trans posição didática ou da cultura escolar toma das como partidos ou profissões de fé opos tos e inconciliáveis o que ao invés de auxi liar a elucidar os processos que tornam possível a existência de saberes e disciplinas propriamen te escolares torna a realidade educacional do passado ainda mais opaca Acreditamos que somente com a realização periódica de balanços ou estados da arte é possível tornar inteligível o processo de transformação eou construção de saberes em saberes propriamente escolares tan to do ponto de vista empírico quanto do pon to de vista propriamente teórico A tarefa de responder empiricamente algumas questões básicas como quando determinada discipli na passa a compor a grade curricular das esco las públicas Mesmo ausentes como disciplinas escolares esses saberespráticas estavam presen tes na escola Que agentes e fatores sociais tor naram possíveis essa inserção já é extrema mente complexa em um país com as dimensões do Brasil onde por exemplo durante o século XIX e nas primeiras décadas do XX cada provín ciaestado tinha uma legislação e uma estrutu ração curricular próprias Em uma perspectiva teórica acreditamos que esses balanços perió dicos possam elucidar questões como as relações estabelecidas entre saberespráticas escolares e não escolares entre aspectos políticos sociais e econômicos e escola entre cultura popular e cultura erudita entre transposição didática e cultura escolar em um país de escolarização tardia e profundamente marcado pelas presen ças do manuscrito e da oralidade e pelas distin ções sociais raciaisétnicas regionais geracionais e de gênero Fontes citadas manuscritas APEJE Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano Pernambuco IP 19 série Instrução Pública Directoria Geral da Instrucção Publica Pareceres do Conselho Literário 1866 Documentação Avulsa IP 44 série Instrução Pública Inspectoria Geral da Instrucção Publica Pareceres do Conselho Literário 1885 Documentação Avulsa Referências bibliográficas AZEVEDO F Da educação física Da educação física Da educação física Da educação física Da educação física o que é o que tem sido e o que deveria ser São Paulo Edições Melhoramentos 1960 AMADO J FERREIRA M de M Orgs Usos e a Usos e a Usos e a Usos e a Usos e abusos da história oral busos da história oral busos da história oral busos da história oral busos da história oral Rio de Janeiro Editora da Fundação Getúlio Vargas 1996 BARBOSA A M Org Arteeducação Arteeducação Arteeducação Arteeducação Arteeducação leitura no subsolo São Paulo Cortez 1999 BITTENCOURT C M F Disciplinas escolares história e pesquisa In OLIVEIRA M A T de RANZI S M F Orgs História das História das História das História das História das disciplinas escolares no Brasil disciplinas escolares no Brasil disciplinas escolares no Brasil disciplinas escolares no Brasil disciplinas escolares no Brasil contribuições para o debate Bragança Paulista EDUSF 2003 407 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 BURKE P A Escola dos A Escola dos A Escola dos A Escola dos A Escola dos Annales 19291989 Annales 19291989 Annales 19291989 Annales 19291989 Annales 19291989 a Revolução Francesa da historiografia São Paulo FEU 1997 CARVALHO M M C de Revisitando a historiografia educacional brasileira In MENEZES M C Org Educação Educação Educação Educação Educação memória memória memória memória memória história história história história história possibilidades leituras Campinas Mercado de Letras 2004 CASTELLANI FILHO L Educação física no Brasil Educação física no Brasil Educação física no Brasil Educação física no Brasil Educação física no Brasil a história que não se conta Campinas Papirus 1988 CHARTIER R A história cultural A história cultural A história cultural A história cultural A história cultural entre práticas e representações Lisboa DIEFEL 1990 CHERVEL A História das disciplinas escolares reflexões sobre um campo de pesquisa TTTTTeoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação Porto Alegre nº 2 p 177229 1990 CHEVALLARD Y La transposition didactique La transposition didactique La transposition didactique La transposition didactique La transposition didactique du savoir savant au savoir enseigné Grenoble La Pensée Sauvage 1985 COMPÈRE MM Lhistoire de léduca Lhistoire de léduca Lhistoire de léduca Lhistoire de léduca Lhistoire de léducation en Europe tion en Europe tion en Europe tion en Europe tion en Europe essai comparatif sur la façon dont elle sécrit Paris INRPPeter Lang 1995 FARIA FILHO L M de Dos pardieiros aos palácios Dos pardieiros aos palácios Dos pardieiros aos palácios Dos pardieiros aos palácios Dos pardieiros aos palácios cultura escolar e urbana em Belo Horizonte na Primeira República Passo Fundo Editora da Universidade de Passo Fundo 2000 FARIA FILHO L M de VIDAL D G Os tempos e os espaços escolares no processo de institucionalização da escola no Brasil Revista Brasileira de Educação Revista Brasileira de Educação Revista Brasileira de Educação Revista Brasileira de Educação Revista Brasileira de Educação Rio de Janeiro n 14 p 1934 maioago de 2000 FERREIRA NETO A Pesquisa histórica na Educação Física brasileira In Org Pesquisa histórica na Educação Física Pesquisa histórica na Educação Física Pesquisa histórica na Educação Física Pesquisa histórica na Educação Física Pesquisa histórica na Educação Física brasileira brasileira brasileira brasileira brasileira Vitória CEFDUFES 1996 p 532 FORQUIN JC Saberes escolares imperativos didáticos e dinâmicas sociais TTTTTeoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação Porto Alegre n 5 p 2849 1992 As abordagens sociológicas do currículo orientações teóricas e perspectivas de pesquisa Educação Realidade Educação Realidade Educação Realidade Educação Realidade Educação Realidade Porto Alegre n 211 p 187198 janjun 1996 GALVÃO A M de O et al Livros escolares de leitura Livros escolares de leitura Livros escolares de leitura Livros escolares de leitura Livros escolares de leitura caracterização e usos Pernambuco século XIX Relatório Final de Pesquisa apresentado ao CNPq Recife 2003 mimeo GOODSON I F Currículo Currículo Currículo Currículo Currículo teoria e história Rio de Janeiro Vozes 1995 HÉBRARD J Três figuras de jovens leitores alfabetização e escolarização do ponto de vista da história cultural In ABREU M Org Leitura história e história da leitura Leitura história e história da leitura Leitura história e história da leitura Leitura história e história da leitura Leitura história e história da leitura Campinas Mercado de Letras 1999 HENRY M Apresentação da Didática da Ma Apresentação da Didática da Ma Apresentação da Didática da Ma Apresentação da Didática da Ma Apresentação da Didática da Matemática temática temática temática temática Notas de curso sobre Didática da Matemática Trad Lícia de Souza Leão Maia São Paulo PUC 1992 mimeo HOBSBAWN E RANGER T Orgs A invenção das tradições A invenção das tradições A invenção das tradições A invenção das tradições A invenção das tradições Rio de Janeiro Paz e Terra 1984 JULIA D A cultura escolar como objeto histórico Revista Brasileira de História da Educação Revista Brasileira de História da Educação Revista Brasileira de História da Educação Revista Brasileira de História da Educação Revista Brasileira de História da Educação Campinas n 1 p 943 jan jun 2001 LE GOFF J História e memória História e memória História e memória História e memória História e memória Campinas EDUNICAMP 1994 LOPES E M T GALVÃO A M de O História da educação História da educação História da educação História da educação História da educação Rio de Janeiro DPA 2001 MARINHO I P Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Brasil colônia Brasil império Brasil república Rio de Janeiro Imprensa Nacional 1943 História geral da Educação Física História geral da Educação Física História geral da Educação Física História geral da Educação Física História geral da Educação Física São Paulo Companhia Brasil Editora 1980 MELO V A de Escola Nacional de Educação Física e Desportos Escola Nacional de Educação Física e Desportos Escola Nacional de Educação Física e Desportos Escola Nacional de Educação Física e Desportos Escola Nacional de Educação Física e Desportos uma possível história Dissertação Mestrado UNICAMP Campinas 1996 408 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas MOREIRA A F B e SILVA T T da Org Currículo Currículo Currículo Currículo Currículo cultura e sociedade cultura e sociedade cultura e sociedade cultura e sociedade cultura e sociedade São Paulo Cortez 1995 OLIVEIRA B J de Imaginário científico e a História da Educação In FONSECA T N de L VEIGA C G História e historiog História e historiog História e historiog História e historiog História e historiografia rafia rafia rafia rafia da educação no Brasil da educação no Brasil da educação no Brasil da educação no Brasil da educação no Brasil Belo Horizonte Autêntica 2003 p 101128 PAGNI P Â História da Educação Física no Brasil notas para uma avaliação In FERREIRA NETO A GOELLNER S BRACHT V Orgs As ciências do esporte no Brasil As ciências do esporte no Brasil As ciências do esporte no Brasil As ciências do esporte no Brasil As ciências do esporte no Brasil Campinas Autores Associados 1995 p 149163 PAIVA F Ciência e poder simbólico Ciência e poder simbólico Ciência e poder simbólico Ciência e poder simbólico Ciência e poder simbólico no Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte Vitória UFESCEFD 1994 PINHEIRO A C F Da era das cadeiras isoladas à era dos g Da era das cadeiras isoladas à era dos g Da era das cadeiras isoladas à era dos g Da era das cadeiras isoladas à era dos g Da era das cadeiras isoladas à era dos grupos escolares na Paraíba rupos escolares na Paraíba rupos escolares na Paraíba rupos escolares na Paraíba rupos escolares na Paraíba Campinas Autores Associados Bragança Paulista Editora da Universidade de São Francisco 2002 SANTOS L L de C P História das disciplinas escolares perspectivas de análises TTTTTeoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação Porto Alegre n 2 p 2129 1990 SAVIANI N Sa Sa Sa Sa Saber escolar ber escolar ber escolar ber escolar ber escolar currículo e didática currículo e didática currículo e didática currículo e didática currículo e didática problemas da unidade conteúdométodo no processo pedagógico Campinas Autores Associados 1994 SILVA M B e A inserção da arte no currículo escolar A inserção da arte no currículo escolar A inserção da arte no currículo escolar A inserção da arte no currículo escolar A inserção da arte no currículo escolar Pernambuco 19501980 Dissertação Mestrado UFPE Recife 2003 SOUZA E S de Meninos Meninos Meninos Meninos Meninos à marcha Meninas à marcha Meninas à marcha Meninas à marcha Meninas à marcha Meninas à sombra à sombra à sombra à sombra à sombra Tese Doutorado UNICAMP Campinas 1994 SOUZA R F de TTTTTemplos de civilização emplos de civilização emplos de civilização emplos de civilização emplos de civilização a implantação da escola primária graduada no estado de São Paulo 18901910 São Paulo UNESP 1998 VAGO T M Cultura escolar cultivo de corpos Cultura escolar cultivo de corpos Cultura escolar cultivo de corpos Cultura escolar cultivo de corpos Cultura escolar cultivo de corpos Educação Physica e Gymnastica como práticas constitutivas dos corpos de crianças no ensino público primário de Belo Horizonte 19061920 Bragança Paulista EDUSF 2002 VALDEMARIN V Estudando as lições de coisas Estudando as lições de coisas Estudando as lições de coisas Estudando as lições de coisas Estudando as lições de coisas análise dos fundamentos filosóficos do método de ensino intuitivo Campinas Autores Associados 2004 VIDAL D G FARIA FILHO L M de História da educação no Brasil a constituição histórica do campo 18801970 Revista Revista Revista Revista Revista Brasileira de História Brasileira de História Brasileira de História Brasileira de História Brasileira de História São Paulo v23 n45 p3770 2003 Recebido em 070305 Aprovado em 090605 Marcílio Souza Júnior é professor da Universidade de Pernambuco UPE membro do Grupo de Estudos Etnográficos em Educação Física e Esportes ETHNÓS do Laboratório de Estudos Pedagógicos do Centro de Estudos em Educação Física e Esportes da Escola Superior de Educação Física Doutorando em Educação membro da Linha de Pesquisa de Formação de Professores e Prática Pedagógica do Programa de PósGraduação da UFPE Ana Maria de Oliveira Galvão é professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais UFMG Doutora em Educação pela UFMG Pesquisadora do CNPq do Núcleo de Estudos e Pesquisas História da Educação em Pernambuco NEPHEPEUFPE e do Centro de Alfabetização Leitura e Escrita CEALEUFMG
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391 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Resumo No contexto de renovação da historiografia da educação no Brasil tem sido crescente o número de estudos que buscam compreender como determinados saberes se tornaram propriamente escolares Essas pesquisas têm contribuído para um melhor entendimento do papel desempenhado pela escola e por outras instâncias sociais na definição daquilo que ao longo do tempo tem sido considerado essencial na formação das novas gerações Esse campo de estudos tem sido identificado ao que se convencionou denominar História das Disciplinas Escolares uma abordagem multidisciplinar que já há algumas décadas vem sendo desenvolvida por pesquisadores de vários países do mundo O artigo que constitui um ensaio biblio gráfico busca identificar e problematizar tendências de pesquisa nessa área no interior do campo mais amplo da História da Educa ção Por fim descreve sucintamente dois estudos realizados recen temente por pesquisadores brasileiros nas áreas da Educação Física e Educação Artística que se inserem nessa linha de investigação Apesar do crescente número de pesquisas realizadas em torno do tema a maioria dos trabalhos muitas vezes dedicados a traçar cronológica e retroativamente a presença de um saber na escola é realizada de forma isolada e parte de pressupostos muitas vezes rígidos advindos das tradições da transposição didática ou da cultura escolar Acreditase que somente com a realização periódi ca de balanços é possível tornar inteligível o processo de transfor mação eou construção de saberes em saberes propriamente esco lares tanto em uma perspectiva empírica quanto do ponto de vista propriamente teórico Palavraschave Historiografia da educação Disciplinas escolares Educação física Educação artística Correspondência Marcílio Souza Junior Rua Silvino Lopes n 125804 Casa Forte 52061490 Recife PE email msouzajruolcombr Os autores agradecem a Ceres Leite Prado pela leitura crítica des te artigo História das disciplinas escolares e história da educação algumas reflexões Marcílio Souza Júnior Universidade de Pernambuco Ana Maria de Oliveira Galvão Universidade Federal de Minas Gerais 392 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Abstract In the context of a renovation of the historiography of education in Brazil there have been a growing number of studies trying to understand how certain knowledges became school knowledges proper These studies have contributed to improve our under standing about the role played by the school and by other social organizations in the definition of what has been regarded at different times as essential in the formation of the new generations This field of study has been identified to what has been called History of School Subjects a multidisciplinary approach that has been developed by researchers around the world during the last decades The article constitutes a bibliographical essay and seeks to identify and problematize research trends in this area within the wider field of the History of Education Lastly it briefly describes two studies carried out recently by Brazilian researchers in the areas of Physical Education and Artistic Education that can be included in this line of investigation Despite the rising number of studies carried out around this topic the majority of works often dedicated to outline chronologically and retrospectively the presence of a specific knowledge at school are conducted in isolation and adopt assumptions many times rigidly coming from the didactic transposition or school culture traditions We believe that it is only by conducting periodic assessments that the process of transfor mation andor construction of knowledges into school knowledges proper can be made intelligible both from an empirical perspective and from a theoretical point of view Keywords Historiography of education School subjects Physical edu cation Artistic education Contact Marcílio Souza Junior Rua Silvino Lopes n 125804 Casa Forte 52061490 Recife PE email msouzajruolcombr History of school subjects and history of education some reflections Marcílio Souza Júnior Universidade de Pernambuco Ana Maria de Oliveira Galvão Universidade Federal de Minas Gerais The authors wish to thank Ceres Leite Prado for the critical review of this article 393 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Introdução Nas últimas duas décadas no Brasil no contexto de renovação da historiografia da edu cação no país1 tem sido crescente o número de estudos que buscam compreender como deter minados saberes se tornaram propriamente es colares Em geral realizadas por professorespes quisadores interessados em conhecer a história de sua própria disciplina essas pesquisas têm contribuído de maneira significativa para um melhor entendimento do papel desempenhado pela escola e por outras instâncias sociais na de finição daquilo que ao longo do tempo tem sido considerado essencial na formação das novas gerações Esse campo de estudos tem sido identificado de modo geral no interior da his tória da educação ao que se convencionou de nominar História das Disciplinas Escolares uma abordagem multidisciplinar que já há algumas décadas vem sendo desenvolvida por pesquisa dores de vários países do mundo Certamente um dos motivos pelos quais a História das Disciplinas Escolares tem se con figurado na atualidade brasileira como uma importante área de estudos tem sido a sua potencialidade em fornecer um novo olhar para a escola do passado permitindo perceber que a história da educação vai além da história dos ideários e dos discursos pedagógicos Estudos nesse campo permitem ainda complexificar a noção de tempo na medida em que o estudo das transformações de um saber que se torna escolar não obedece a uma linearidade lógica mas resulta de uma série de injunções que assumem características específicas em cada espaço social e em cada época Nesse texto buscamos identificar e pro blematizar tendências de pesquisa nessa área no interior do campo mais amplo da História da Educação embora reconhecendo sua vinculação também com outras tradições de investigação como a Sociologia do Currículo Descrevemos ainda sucintamente dois estudos realizados re centemente por pesquisadores brasileiros que se inserem nessa linha de investigação História das disciplinas escolares História das Disciplinas Escolares Histó ria das Disciplinas Curriculares História das Matérias Escolares História dos Saberes Esco lares História dos Conteúdos Escolares são expressões que remetem a um mesmo campo de pesquisa Os estudos em História das Disciplinas Escolares aparecem segundo Bittencourt em diferentes países quase que simultaneamente possuindo em comum a preocupação em identificar a gênese e os diferentes momentos históricos em que se constituem os saberes escolares visando perceber a sua dinâmica as continuidades e descontinuidades no processo de escolarização 2003 p 15 Chervel 1990 afirma que a especificidade desse campo de estudos reside na investigação dos ensinos da idade escolar pois o seu elemento central é a história dos conteúdos Nesse campo é possível investigar a relação entre o que foi estabelecido como finalidade para os conteúdos de ensino e o que foi efetivamente ensinado aprendido Enfim não é um campo que estuda a história das idéias pedagógicas do discurso pe dagógico oficial das políticas educacionais já que tais elaborações visam mais freqüentemente em geral de forma positiva corrigir um estado de coisas modificando certas práticas do que pro priamente representar a realidade Por outro lado o campo da História das Disciplinas Escolares procura enfatizar o porquê de a escola ensinar o que ensina em vez de tentar responder o que a escola deveria ensinar Para Forquin 1992 esse campo de pes quisa possibilita obter informações acerca da se leção cultural que faz a escola identificando o que é em determinada época compreendido 1 Para um mapeamento recente do campo da História da Educação no Brasil ver entre outros Vidal e Faria Filho 2003 Carvalho 2004 Lopes e Galvão 2001 394 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas como o que deve ser ensinado É possível tam bém nesse campo captar elementos que em um conflituoso percurso de conquista de legitimidade de uma ou outra disciplina curricular mostrem a conquista de um estatuto a briga por recursos as delimitações territoriais no interior do currículo escolar os espaços nos horários etc O próprio de uma reflexão sociológica ou histórica sobre os saberes escolares é contri buir para dissolver esta percepção natural das coisas ao mostrar como os conteúdos e os modos de programação didática dos sa beres escolares se inscrevem de um lado na configuração de um campo escolar caracte rizado pela existência de imperativos funci onais específicos conflitos de interesses corporativos disputas de fronteiras entre as disciplinas lutas pela conquista da autono mia ou da hegemonia no que concerne ao controle do currículo de outro lado na configuração de um campo social caracteri zado pela coexistência de grupos sociais com interesses divergentes e com postu lações ideológicas e culturais heterogêneas para os quais a escolarização constitui um trunfo social político e simbólico Forquin 1992 p 4344 Para Goodson 1995 a História das Matérias Escolares compondo a área da Histó ria do Currículo propõese a penetrar em um campo que os historiadores se mostraram incli nados a ignorar os conteúdos escolares os métodos de ensino e os percursos de estudo buscando nos processos internos da escola cai xapreta pistas para analisar as complexas re lações entre escola e sociedade inclusive enfatizando como as escolas tanto refletem como refratam as definições da sociedade acer ca dos conhecimentos culturalmente válidos Tal área de estudo passa a estabelecer um novo paradigma para os estudos sobre a História da Educação trazendo uma agenda que aproxima os estudos educacionais dos estudos da histó ria do conhecimento Todavia o seu valor principal reside em sua capacidade de investigar a realidade interna e a autonomia relativa da escolarização A his tória curricular considera a escola algo mais do que um simples instrumento de cultura da classe dominante Goodson 1995 p 120 Nesse sentido Santos 1990 afirma que a História das Disciplinas Escolares representa uma reação aos trabalhos em que a educação é quase exclusivamente interpretada em função da estrutura econômica política e social Essa nova área de estudos no campo da so ciologia do currículo tem como objetivo ex plicar a emergência e evolução das diferentes disciplinas escolares Além disso investiga também a predominância de certas tendênci as durante um determinado período bem como mudanças na organização e estrutu ração do conteúdo e nos métodos de ensino ibid p 2122 Procurase desse modo compreender a busca por legitimidade de algumas disciplinas escolares consideradas de menor valor pedagó gico investigar a constituição do estatuto epistemológico de tais disciplinas pesquisar o movimento de transformação da cultura e mais especificamente do conhecimento científico em saber escolar e observar as modificações dos métodos e conteúdos de ensino ao longo do tempo abrangendo diferentes períodos A História das Disciplinas Escolares tende ainda a focalizar o seu olhar para as característi cas peculiares de cada nível e modalidade de en sino do elementar passando pelo secundário e indo até o superior no que se inclui inclusive segundo Bittencourt 2003 compreender as dife renças entre eles e o processo de transformação dos conhecimentos das disciplinas acadêmicas universitárias em conteúdos das disciplinasmaté rias escolares do currículo da educação básica Nesse sentido o currículo é considerado uma palavrachave segundo Goodson 1995 para melhor compreender a escola ao longo do 395 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 tempo Currículo escrito currículo como fato currículo como prática currículo como atividade são algumas entre as várias denominações e con cepções atribuídas ao termo Goodson 1995 porém conclui que a luta por definir o que é currículo termina por caracterizálo como sendo a invenção de uma tradição2 Desse modo o que chamamos por currículo e por disciplinamatéria escolar nem sempre teve a compreensão que contemporaneamente lhes atribuímos tanto nos seus sentidos mais corriquei ros quanto em uma concepção mais acadêmica Com o objetivo de rever brevemente a história da compreensão conceitual de currículo e disciplina escolar revisemos alguns conceitos atribuídos a tais termos procurando assim evitar um problema comum nas pesquisas históricas o anacronismo O termo currículo advém da palavra la tina scurrere que pode ser traduzida como cor rer referindose a curso a ser seguido mais especificamente a ser apresentado Goodson 1995 Provavelmente a compreensão mais an tiga do termo currículo foi encontrada em fon tes da Universidade de Glasgow na Escócia em 1663 que lhe atribui o significado de atestado de graduação outorgado a um mestre dessa ins tituição de ensino Goodson 1995 Saviani 1994 Segundo Nereide Saviani com o tempo o termo currículo evolui da idéia inicial de registro de vida estudantil de cada aluno para indicar o conjunto dos novos traços or denados e seqüenciais da escola do século XVI 1994 p 41 Na atualidade num sentido mais corrente o currículo passa a ser compreendido como um conjunto daquilo que se ensina e daquilo que se aprende tendo como referência alguma ordem de progressão podendo referirse para além do que está escritoprescrito oficialmente Forquin 1996 O currículo pode também ser considerado como um processo informal de interação entre aquilo que é deliberado o que é interpretado e o que é efetivado às vezes de maneira transfor mada ou até mesmo subvertida Goodson 1995 Enfim o currículo amplia o sentido de organiza ção disciplinar no sentido de regras de conduta para o sentido de organização disciplinar com preendendo objetos partes e matérias do ensino Já o termo disciplina no sentido de conteúdos de ensino segundo Chervel 1990 só aparece mais recentemente nas primeiras décadas do século XX pois até o fim do século XIX seu significado não era mais do que a vigilância dos estabelecimentos em relação às condutas prejudiciais a sua boa ordem e àquela parte da educação dos alunos que contribui para tal ordem podendo se identificar a atitu des repressivas ou ainda fazendo par com o verbo disciplinar que é sinônimo de ginástica exercício intelectual Os termos que equivale riam à disciplina durante o século XIX como conteúdos de ensino eram objetos partes ramos ou ainda matérias de ensino É após a Ia Guerra Mundial que o termo disciplina vai tornarse uma rubrica que classi fica as matérias de ensino dando um caráter aos conteúdos como sendo próprios do ambiente escolar mas não se desvinculando por comple to de seu sentido de exercitação intelectual já que é acompanhado por métodos e regras para abordar os diferentes domínios do pensamento do conhecimento e da arte Chervel 1990 O entendimento do termo disciplina está vinculado à idéia de hierarquização e estrati ficação Porém ao contrário do que se estabe lece nas escolas atuais a idade nem sempre foi critério de repartições por níveis Nossa atual estrutura de classes baseada em faixas etárias é resultante da forma mais pedagógica da or ganização das escolas do século XVIII influen ciada pela estrutura das escolas cristãs e pelo ensino mútuo pois até então a maioria delas se organizava em classe única em que a con 2 Para Hobsbawn e Ranger 1984 p 1 autores no qual Goodson se baseia o termo tradição inventada significa um conjunto de prá ticas e ritos práticas normalmente regidas por normas expressas ou tacitamente aceitas ritos ou natureza simbólica que procuram fazer circular certos valores e normas de comportamento mediante repetição que automaticamente implica em continuidade com o pas sado De fato onde é possível o que tais práticas e ritos buscam é estabelecer continuidade com um passado histórico apropriado 396 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas sideração da idade não desempenhava nenhum papel direto nas repartições escolares Chega va a existir uma variação de até doze anos numa mesma repartição Chervel 1990 Esse processo adquire uma face específica na histó ria da educação brasileira na medida em que embora o método simultâneo já fosse reco mendado pelas instâncias oficiais de educação desde meados do século XIX o ensino seriado só foi oficialmente implantado com a criação dos grupos escolares no início do período re publicano ver Faria Filho 2000 Faria Filho Vidal 2000 Souza 1998 Pinheiro 2002 Segundo Goodson 1995 as matérias disciplinas escolares passam por uma seqüên cia de estágios Elas partem de um momento de marginalidade com um status inferior no currículo passam para um estágio utilitário e finalmente alcançam uma definição como dis ciplina que se configuraria a partir de um con junto exato e rigoroso de conhecimentos O que apenas pretendemos dizer é que a aplicação explicitamente instrumental de conjuntos de conhecimentos diminui em re lação inversa à seriedade e ao êxito das ten tativas dos profissionais de melhorar as suas condições materiais Goodson 1995 p 131 Layton apud Goodson 1990 analisando a evolução da matéria disciplina Ciências no currículo escolar define três estágios No primei ro a matéria ainda intrusa conquista lugar no horário escolar e justifica sua presença por sua utilidade Nesse momento os alunos são atraídos para a matéria por ela estabelecer relações com questões do interesse deles Os professores não são especialistas da área mas entusiastas pioneiros No segundo já começam a surgir uma tradição de tra balho acadêmico e um conjunto de especialistas treinados Os alunos agora são atraídos também pelo crescente status acadêmico A seleção e a or ganização de seus conteúdos são mais influenci adas por sua lógica interna E no terceiro e últi mo os professores já constituem um quadro pro fissional com regras e valores estabelecidos Os conteúdos selecionados para a matéria advêm em grande medida dos acadêmicos da área Os alu nos começam a iniciarse em uma tradição e apro ximarse portanto da passividade Segundo Santos 1990 se o estabeleci mento de uma disciplina depende também de fatores internos tais como a emergência de grupos de liderança intelectual o surgimento de centros acadêmicos de prestígio na formação de profissionais a organização e a evolução das associações de profissionais e o avanço da polí tica editorial da área então às influências so ciais e econômicas não se podem atribuir sim ples e diretamente as conformações e transforma ções ocorridas no âmbito educacional A auto ra ainda afirma que é fundamental reconhecer que as relações entre os fatores internos e exter nos no desenvolvimento de uma disciplina não são uma constante pois o peso desses fatores dependerá de algumas condições E alerta que se devem observar o nível e o tipo de desenvolvi mento de um país principalmente seu regime político pois ele pode ter grande peso nesse pro cesso podendo tornar uma disciplina mais vul nerável aos fatores externos Enfim quanto maior é o nível de maturidade de uma disciplina e a organização dos profissionais da área maior será o peso dos fatores internos no seu desenvolvimento Santos 1990 p 26 Como pode ser visto as disciplinas es colares não se estabelecem no currículo esco lar de maneira pacífica conformandose às ori entações oficiais mas ao contrário guardam relações conflituosas com as teorizações aca dêmicas e as recomendações oficiais ora aca tandoas ora resistindo a elas ora reforman doas ou deformandoas A história da educação no Brasil e o estudo das disciplinas escolares No caso específico da história da educa ção brasileira as idéias sinteticamente expos 397 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 tas acima penetraram e foram reelaboradas no campo a partir de um movimento mais amplo de renovação dos seus objetos e fontes Nesse processo alguns conceitos eou teorizações elaborados nas áreas de educação eou de his tória foram de fundamental importância na realização das pesquisas Por muito tempo a história da educa ção no Brasil e também em outros países ver Compère 1995 ocupouse de estudar a orga nização dos sistemas de ensino e de ideário e discursos pedagógicos baseandose em fontes como leis regulamentos reformas educacionais e obras de grandes pensadores Em virtude de sua aproximação com a filosofia da educação essa história se tornou muitas vezes um estu do das recomendações A história da educação tratou muito pouco até recentemente das prá ticas escolares e do cotidiano escolar pois via de regra procurou obter de tais fontes e ob jetos como o passado educacional se projetou Nesse sentido configurouse como uma histó ria do que deveria ser a realidade e não do que a realidade efetivamente foi Lopes e Galvão 2001 Evidentemente não estamos nos referindo aqui à ilusão rankeana3 de trazer ao presente o passado tal como ele realmente aconteceu mas à tentativa de reconstruir práticas educativas e não apenas proposições educacionais Muitas vezes pautados em uma concepção de história positivista os trabalhos tradicionalmen te realizados no campo da história da educação deixaram mais evidentes a história política a his tória das intenções dos sujeitos civis pensadores e dos sujeitos políticos Estado Muitas dessas pesquisas tiveram como objetivo a descrição de fatos notáveis e a ação dos sujeitos quase iden tificados como personagens heróicos em um tempo histórico linear ordenado de maneira cro nológica e sucessiva a partir de uma lógica formal No entanto nos últimos tempos a his tória da educação passou por um verdadeiro processo de renovação No Brasil especifica mente nos últimos vinte anos esse campo de estudos aproximouse de uma nova forma de escrever a história possibilitando uma nova leitura principalmente da escola Segundo Lopes e Galvão 2001 os estudos passaram a ser mais localizados e contextualizados lidando com períodos de tempo mais curtos Ainda segundo as autoras essa área passou a se pre ocupar com a organização e o funcionamento interno das escolas com a expressão eou construção cultural no cotidiano escolar com o estabelecimento do conhecimento do currí culo das disciplinas escolares Além das fontes oficiais que têm recebido um novo olhar e um novo tratamento outras fontes passaram a ser utilizadas tais como a fotografia a literatura os manuais escolares os jornais e revistas a história oral4 etc Esse movimento de renovação e ampliação na historiografia da história da educação vai encontrar inspiração sobretudo na Escola dos Annales uma nova forma de entender e escrever a história que posteriormente se convencionou chamar de Nova História Segundo Burke 1997 as idéias diretrizes dos Annales sumária e breve mente buscam substituir a narrativa tradicional de acontecimentos por uma históriaproblema descreverreconhecer a história para além dos fatos políticos buscando os elementos de todas as atividades humanas e integrar a história com outras disciplinas das Ciências Sociais No inte rior da Nova História um campo específico de es tudos tem atraído a atenção dos historiadores da educação a História Cultural que como veremos adiante vai também influenciar a investigação sobre a História das Disciplinas Escolares No interior desse processo de renovação como já referido a História das Disciplinas tem se tornado uma área privilegiada de investiga ção Identificamos no caso da história da edu cação brasileira três conceitos nucleares eou tendências teóricas que parecem ter influenci 3 Referimonos aqui a Leopold Ranke 17951886 que na tenta tiva de dar à história um estatuto de ciência acreditava que cabia aos historiadores mediante a pesquisa em documentos oficiais es crever sobre o passado tal como ele realmente havia acontecido 4 Como advogam Amado e Ferreira 1996 a fonte oral não consti tui por si só história Assim usamos o termo entre aspas para indi car sua filiação teóricometodológica mas reconhecendo que a fala do sujeito da pesquisa é apenas uma fonte como tantas outras 398 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas ado decisivamente as pesquisas desenvolvidas no país5 Uma primeira influência advém das teo rizações e pesquisas realizadas no campo da Sociologia do Currículo ou da Nova Sociologia da Educação e tem como referência principal mente as investigações de Michael Young re alizadas na Inglaterra É importante frisar no entanto que tal perspectiva é originária fun damentalmente da inspiração dos estudos de Le Play realizados já na virada do século Nos anos 60 do século XX os estudos de Raymond Williams por sua vez fornecem um referencial para uma abordagem que reconhece a cultura como uma tradição seletiva ou seja como um processo de decantação e reinterpretação per manente da herança deixada pelas gerações anteriores Já no fim dos anos de 1960 e iní cio dos de 1970 Forquin 1996 identifica uma outra abordagem que tem como um de seus representantes Frank Musgrove Este centrali za seus estudos na natureza social das constru ções curriculares verificando como as matéri as escolares conferem a seus membros um forte sentimento de identidade Já a partir de mea dos dos anos de 1970 identifica o que se cha mou Nova Sociologia da Educação6 que asso cia os estudos acerca do currículo a um progra ma de crítica políticocultural radical procu rando evidenciar como se dava o processo de legitimação dos conteúdos curriculares e da estratificação dos saberes Podese afirmar as sim que no âmbito da sociologia educacional os estudos apesar de existirem apresentaram um desenvolvimento incipiente até o fim da década de 1950 conquistando mais fôlego a partir dos anos de 1970 quando então passam a constituir uma nova sociologia da educação tendo como objeto central de suas teorizações o currículo escolar Moreira Silva 1995 As pesquisas nesse campo têm como foco central a análise do processo de seleção e organização do conhecimento educacional e mais especificamente do saber escolar buscan do compreender como o conhecimento é ma terializado no currículo No percurso de uma reconceitualização de currículo aparecem estu dos que examinando as relações entre ele e a estrutura social cultura poder ideologia con trole social procuram focalizar como fazer o currículo trabalhar a favor dos grupos e das classes oprimidas desenvolvendo assim seu potencial libertador Forquin 1996 identifica ainda um outro grupo que teve um papel fundamental nos estu dos sociológicos sobre currículo tratase dos pes quisadores que investigam a relação entre currículo formal currículo real e currículo oculto Na Fran ça o autor evidencia que a discussão acerca do currículo acontece mais tardiamente do que na Inglaterra no início dos anos de 1980 Isso se dá porque a reflexão sobre programas de ensino foi conduzida no quadro de uma tradição enciclopé dica em que os saberes escolares eram considera dos como naturais portanto sem merecer reflexão e questionamento Já em meados da década de 1980 é possível encontrar estudos que estabele cem diferenças entre o currículo formaloficial e o currículo real entendendose este último como aquilo que é realmente ensinado nas salas de aula passível de ser conhecido por observação ou pes quisa direta com os professores e alunos Nessa mesma época é possível observar uma outra abor dagem mais precisamente em países anglófonos São os estudos que focalizam as discussões em torno do currículo oculto ou seja naquilo que está implícito invisível na organização curricular desde a estruturação do tempo e espaço escolar até a codificação O implícito pode suscitar o de senvolvimento de competências favoráveis ou mes mo ações dissimuláveis e pervertidas Uma segunda influência que pode ser detectada na realização das pesquisas sobre a História das Disciplinas Escolares no âmbito da 5 Jean Hébrard identifica ainda a influência da história das ciên cias que no caso da História da Educação brasileira parece não ter tido grande penetração Ver Oliveira 2003 6 Para o autor uma afirmação de Bernstein resume muito bem a hipótese central na Nova Sociologia da Educação o modo como uma sociedade seleciona classifica distribui transmite e avalia os saberes destinados ao ensino reflete a distribuição do poder em seu interior e a maneira pela qual aí se encontra assegurado o controle social dos com portamentos individuais Bernstein apud Forquin 1993 p 85 399 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 história da educação brasileira advém de dois conceitos que em sua origem apresentaramse como antagônicos o de transposição didática cujo principal representante é Yves Chevallard e o de cultura escolar elaborado principal mente por André Chervel Forquin 1996 iden tifica a elaboração desses conceitos no interior de uma discussão entre historiadores didaticistas e sociólogos Em uma primeira abordagem aparecem recentemente na França estudos de didaticistas que compreendem disciplina escolar como trans posição didática7 Usando tal noção os pesqui sadores passam a investigar o percurso do saber até chegar à escola ou seja a transformação do conhecimento científico exterior à escola em conhecimento escolar Apesar de recente essa abordagem se baseia no conceito de transposição didática elaborado já em 1975 a partir dos es tudos do sociólogo Michel Verret Influenciada por pesquisas de diversos estudiosos principal mente aqueles vinculados ao IREM Institute de Recherches en Education Mathématique essa abordagem dá origem à Teoria das Situações Didáticas com fundamentos em um campo de conhecimento denominado Engenharia Didática8 Numa espécie de cooperativa teórica a Teoria das Situações Didáticas tem como referência es tudos de Jean Piaget Gérard Vergnaud Guy Brousseau Yves Chevellard Regine Douady Ali ne Robert e outros Em uma outra abordagem fazendo uma crítica rigorosa à primeira encontramse os es tudos históricos que mostram que a escola não se contenta em transpor os conteúdos preexis tentes e exteriores a ela Nesses estudos inves tigase a escola como local de produção do co nhecimento com características originais ou seja a compreensão de disciplina escolar como cultura escolar9 André Chervel investiga a constituição de um corpo de conhecimentos que chama de gramática escolar construído por pedagogos para servirem de apoio às aprendi zagens das regras ortográficas Analisando o ensino de francês na França o autor discorda da abordagem da transposição didática e afir ma que as disciplinas escolares possuem uma autonomia gerando um conhecimento peda gógico próprio da escola As disciplinas esco lares apesar de seus conteúdos de ensino te rem origem na sociedade e na cultura que ro deiam a escola não se ligam diretamente às ciências de referência pois se assim fosse se ria dada à pedagogia a característica de um simples método Chervel 1990 denomina esse processo de disciplinavulgarização em que a disciplina simplifica vulgariza os saberes e ainda de pedagogialubrificante em que a pedagogia se encarrega de lubrificar e fazer girar a máquina educacional Hébrard 1999 assim resume esse deba te entre as duas abordagens hoje o principal debate desse domínio referese às relações entre saberes eruditos e saberes escolares Para certos autores mode lo da transposição didática os sistemas es colares são percebidos como dispositivos que selecionam e transformam os saberes produ zidos pelos intelectuais com a finalidade de tornálos assimiláveis pelos novos alunos Para outros modelo da história das discipli nas escolares a escola constrói seus próprios tipos de saberes ou habilidades conforme os modos de elaboração cuja lógica pode ser encontrada dentro dos próprios sistemas educativos É o caso por exemplo das gra máticas escolares que durante muito tempo 7 Por transposição didática entendese o conjunto de transfor mações que sofre o saber científico antes de ser ensinado Da esco lha do saber a ensinar à sua adaptação ao sistema didático existe todo um processo gerador de deformações de estabelecimento de coerência e até de criação de novos conhecimentos que culmina com o que se chama de saber escolar enunciado nos programas e parti cularmente observáveis nos livrostexto Chevallard 1985 8 Estudos que buscam a criação e a exploração de situações de aprendizagem sobre temas específicos de ensino e que visam à valida ção de certas construções empíricas extraídas de inovações pedagógi cas Henry 1992 9 Por cultura escolar Dominique Julia entende um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses co nhecimentos e a incorporação desses comportamentos normas e práticas coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épo cas finalidades religiosas sóciopolíticas ou simplesmente de soci alização 2001 p 10 400 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas não se beneficiaram dos avanços da filologia ou das ciências da linguagem e dificilmente aceitaram esse enxerto quando a ocasião se apresentou p 3536 É importante observar que o debate en tre de um lado as exigências de didatização do saber científico para tornarse saber escolar e de outro do papel ativo desempenhado pela escola na criação de saberes já está presente nas ins tâncias educacionais brasileiras há pelo menos mais de um século Galvão et al 2003 anali sando livros escolares e pareceres sobre livros conferidos por instâncias oficiais da província de Pernambuco no século XIX constataram por exemplo que muitos aspectos que na atualida de estão no centro da discussão sobre os pro cessos de escolarização dos saberes já estavam em pauta naquele momento e espaço social Destacamse nesse sentido as relações entre conhecimento científico saberes da tradição que circulavam fora da escola e o processo de dida tização dos saberes pela instituição escolar De acordo com as instâncias educacionais da época para um livro ter seu uso aprovado nas aulas de primeiras letras da província os conteúdos deveriam ser consistentes do ponto de vista científico Não seriam admitidos livros que trouxessem inexatidões ou desatualizações muito gritantes em relação ao conhecimento que era produzido no âmbito da ciência Esse critério não foi atendido por exemplo pela obra Compendio de Physica para Leituras de autoria de Francisco de Paula Barros destinada às es colas de instrução primária que recebeu em 1885 parecer não favorável do Conselho Lite rário para que fosse utilizada nas escolas pro vinciais Um dos principais argumentos dos pareceristas referese justamente às inexac tidões e faltas da doutrina compendiada Ao longo do parecer são apresentados os diversos erros conceituais cometidos pelo autor que pa rece não ter incorporado minimamente as diver sas descobertas que realizavam as ciências na quele vertiginoso final de século Embora reco nheçam que o conhecimento científico sofre transformações muito rápidas e que é difícil para um livro escolar acompanhar essas transforma ções os pareceristas não perdoam os diversos erros cometidos onze no total são elencados destacandose as imprecisões científicas dos conceitos utilizados e enfatizandose as contra dições apresentadas pelo próprio compêndio Como afirmam os pareceristas Os brilhantes e numerosos progressos da physica nas suas theorias e principalmente as suas portentosas descobertas na ordem prati ca teem nestes ultimos annos preocupado por tal modo a attenção publica que são por toda parte recibidos com verdadeira anciedade as publicações que tem por fim compendiar sob uma forma succinta e em linguagem dos que não são profissionaes os principios mais fundamentaes os factos mais incontestaveis e as applicações multiplices de tão importante dominio dos conhecimentos humanos Á vista do movimento universal das sciencias physicas e no meios das modificações mais ou menos profundas porem sempre progressivas que ellas vão diariamente soffrendo os trata dos elementares mesmo os mais bem accaba dos são sempre incompletos porque por mais exactos que sejão os quadros que elles apresentão dos conhecimentos actuaes poucos mezes bastão para que se tornem esses qua dros insufficientes e até infieis APEJE IP 44 1885 p 6667 Para os autores do parecer no entanto os erros apontados são graves e não convem por forma alguma que figurem em um compendio de physica sciencia hoje tão necessaria que o seu estudo faz parte de todos os programmas de ensino desde a escola primaria até os cursos superio res APEJE IP 44 1885 p 6667 Podese perceber assim que havia uma preocupação para que a escola estivesse atua lizada em relação às então recentes descober 401 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 tas científicas Nesse sentido o livro deveria funcionar como uma espécie de mediador en tre o conhecimento científico e as exigências de didatização Para que uma obra fosse considerada didática por outro lado precisava necessaria mente adequarse ao público a que se destina va as crianças das escolas primárias Nesse sentido em vários momentos os pareceristas qualificam esse público chamando a atenção para a necessidade de que o livro alcance as inteligências mais incultas ou débeis APEJE IP 19 1866 p 294 dos meninos e meninas Além disso para atender às exigências de didatização o livro escolar também deve ria ser bem organizado Para ser aprovado este deveria apresentar uma seqüência lógica não ser confuso ser clarobreve metodicamente planejado e adequado ao uso escolar Na se gunda metade dos oitocentos os manuais tam bém deveriam se basear nos preceitos do mé todo intuitivo10 suas páginas deveriam coadu narse com um espírito mais prático do que teórico e entre os recursos possíveis para que isso ocorresse recomendavase o uso de dese nhos exercícios e quadros Percebese nesse aspecto a consciência que tinham os que es tavam à frente das instâncias de instrução pú blica provinciais de que o conhecimento cien tífico era distinto do conhecimento escolar Cabia ao manual mediar essas duas instâncias se como vimos o manual deveria estar isento de imprecisões e inexatidões científicas tam bém deveria adequarse ao uso cotidiano da escola e ao público ao qual se destinava As sim a preocupação com a transposição didá tica para usar uma expressão de cem anos depois Chevallard 1985 parecia presente não apenas restrita ao manual escolar mas a toda ação da escola pelo menos no final do sécu lo quando a discussão sobre o método intui tivo e a lição de coisas tornamse cada vez mais presentes Uma terceira influência que se pode identificar nesses estudos mais recentes que se debruçam sobre os saberes e disciplinas esco lares no campo da história da educação brasi leira advém da história cultural que tem cha mado atenção principalmente por meio dos es tudos de Roger Chartier 1990 para a neces sidade de se estudarem os objetos culturais em sua materialidade restabelecendo os processos implicados em sua produção circulação con sumo práticas usos e apropriações Lopes e Galvão 2001 p 40 Segundo Jean Hébrard 1999 a histó ria cultural debruçouse também sobre os pro cessos de escolarização mas segundo uma outra perspectiva Para essa tendência um dos maiores problemas colocados pelas diferentes sociedades é a história das relações entre cul turas orais e culturas escritas Nesse sentido a escola não pode ser considerada o único nem o mais importante lugar onde se constroem e transmitem os equipamentos intelectuais de uma sociedade p 37 No entanto ela de sempenha um papel importante na definição desses equipamentos sobretudo quando enuncia as normas legítimas do seu uso p 37 favorecendo ou freando a sua divulgação em grupos sociais diferentes Nesse sentido segundo o autor a investigação sobre a Histó ria das Disciplinas Escolares ganha uma outra perspectiva a partir da pesquisa sobre certos objetos específicos como por exemplo a his tória dos cânones escolares que pode auxiliar na compreensão da difusão das práticas de leitura da elite ou a história da difusão do li vro que foi clareada pela história dos media dores culturais da escrita vivendo no contato dos dois mundos o do oral e o da escrita pa dres professores notários etc p 36 A His tória das Disciplinas Escolares pode assim aju dar a compreender qual o papel específico da escola na inserção de certos grupos em socie dades fortemente marcadas pela escrita ou pela oralidade Nas palavras de Hébrard 1999 Assim a escola forma em seu espaço pró prio sujeitos que lêem escrevem mas tam 10 Sobre o método intuitivo ver Valdemarin 2004 402 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas bém ordenam o mundo conforme as catego rias que o corpus de textos e a palavra do professor tornam quase naturais Comunida de de interpretação inaugural a escola é obrigada a produzir uma recepção comparti lhada dos textos pelo único fato de que sem a certeza do sentido não haveria nem ensino possível nem aprendizagem As aprendizagens iniciais não são portanto como se acredita saberes neutros puramente instrumentais prontos para servir a qualquer uso Que leitores que escritores tornamse os exalunos quando encontram longe da esco la as sociabilidades do trabalho da família da vizinhança Que fazem com o equipa mento mental de que a escola os dotou com menos ou mais paciência ou violência Como esquecêlo ou transformálo para desenvolver novas habilidades mais apropriadas às ne cessidades da vida social Entre as figuras do leitor cujas variantes a história cultural des creve e as figuras de escolares que nós ten tamos reconstruir aqui existem desvios e continuidades cujos mecanismos nos esca pam ainda p 77 Como afirmam Lopes e Galvão 2001 Influenciado sobretudo pelos trabalhos reali zados no âmbito da história cultural o estudo das disciplinas e dos saberes escolares tem sido considerado fundamental para melhor compreender o papel dos contextos culturais na definição daquilo que deve ser ensinado na escola e por outro lado o papel da escola na produção e na reelaboração do conhecimento principalmente através dos processos de didatização p 55 Dois estudos em História das Disciplinas Escolares Nessa parte do artigo descrevemos e dis cutimos brevemente dois trabalhos realizados recentemente por pesquisadores brasileiros no âmbito da História das Disciplinas Escolares Ambos se debruçam sobre disciplinas que na atualidade ocupam um espaço secundário no currículo escolar a Educação Física e a Educa ção Artística Além disso os dois estudos se detêm sobre dimensões da vida de homens e mulheres que não estão diretamente relaciona das àquilo a que a escola tradicionalmente se propôs a trabalhar ou seja a atividade cognitiva intelectual Lidam por outro lado com o cor po e a sensibilidade Ambos se referem a áreas da atividade humana que não constituem fora da escola a não ser muito recentemente sabe res propriamente científicos com uma tradição epistemológica de longa data11 No âmbito da historiografia em Educação Física poderíamos sinteticamente configurar quatro grandes momentosestágios dos estudos históricos dessa disciplina escolar correndo o ris co mesmo não sendo essa a intenção de sermos interpretados como reducionistas e lineares Um primeiro momento caracterizado como uma his tória dos ideários pedagógicos tem como proe minentes autor e obra Fernando Azevedo 1960 Da educação física o que é o que tem sido e o que deveria ser Nessa história da Educação Física temse muito mais a preocupação em le gitimar uma posição no presente do que se em penhar em um conhecimento do passado Pagni 1995 Outro momento configurado como uma história oficial e episódica tem em Inezil Penna Marinho seu grande representante com duas importantes obras analisadas pelos estudiosos História geral da Educação Física e Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Essa história da Educação Física faz estudos de lon gos períodos e a partir de documentos oficiais coletados principalmente em um único local os arquivos da Biblioteca Nacional Pagni 1995 Segundo Ferreira Neto 1996 representam a visão dos de cima descrita de forma objetiva e linear Em um outro momento as pesquisas se fundamentam em uma concepção de história marxista seu autor e obra de maior destaque é 11 Nesse sentido a tese da transposição didática mostra de parti da fragilidades para compreender esse tipo de disciplina 403 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Lino Castellani Filho com o trabalho Educação Física no Brasil a história que não se conta 1988 Essa historiografia da Educação Física procura reescrever a história a partir principal mente da identificação das relações socioeco nômicas objetivando oporse a uma narrativa que apenas descreve e agrupa os acontecimen tos procurando interpretar os fatos diante de um movimento de resistências Pagni 1995 A his tória nessa perspectiva acontece e é escrita como expressão das relações sociais que por sua vez são consideradas como reflexo do modo de pro dução Ferreira Neto 1996 Em um outro mo mento no qual se inclui a pesquisa de Vago 2002 os trabalhos voltamse para a perspecti va da Nova História destacandose aqui os se guintes estudiosos e obras Fernanda Paiva Ciência e poder simbólico no Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte Eustáquia de Souza Me ninos à marcha Meninas à sombra Victor Andrade de Melo Escola Nacional de Educação Física e Desportos uma possível história Essa historiografia da Educação Física reconhece que toda atividade humana tem história e assim amplia o uso de fontes procurando reconhecer a visão dos de baixo Ferreira Neto 1996 O primeiro estudo resultado de uma tese de doutorado em Educação da Universida de de São Paulo já publicado como livro teve como título Cultura escolar cultivo de corpos Educação Physica e Gymnastica como práticas constitutivas dos corpos de crianças no ensino público primário de Belo Horizonte 1906 1920 Seu autor é Tarcísio Mauro Vago 2002 professor da Universidade Federal de Minas Gerais membro do Grupo de Estudos e Pesqui sas em História da Educação da Faculdade de Educação também coordenador do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação Física Esco lar da Escola de Educação Física da mesma Universidade ProEFEEEF O objetivo do estudo de Vago 2002 que expressa proximidade com a perspectiva mais recente de tradição de pesquisas no inte rior da historiografia da Educação Física foi investigar a constituição do campo disciplinar Gymnastica nas práticas escolares do ensino primário em Belo Horizonte a partir da reforma de 1906 O autor nos mostra como nas duas primeiras décadas do século XX a Educação Física em meio às relações de conflitos e ten sões foise constituindo disciplina escolar em instituições públicas desse município dandonos referências para uma vez mais perceber que a história não acontece de maneira linear Seu problema de pesquisa partiu dos seguintes questionamentos 1 Que representa ções de ginástica foram produzidas naquele momento em que se procurava implantar uma nova ordem escolar em Belo Horizonte 2 Com base em que matrizes foram produzidas 3 Que exercícios physicos foram prescritos nas diversas reformas do ensino primário promovidas no pe ríodo 4 Que corpo se desejava construir nas e com as práticas escolares Teve como referencial teóricometodo lógico a Nova História Cultural e como catego rias conceituais as definições de representação de Roger Chartier de documento de Jacques Le Goff de estratégia e tática de Michel de Certeau e de cultura escolar de Dominique Julia Suas principais fontes foram leis progra mas escolares relatórios ofícios cartas mapas de pagamentos folhas de presença pesqui sados no acervo do Arquivo Público Mineiro de Belo Horizonte Segundo Vago 2002 a Educação Físi ca inicialmente na forma de Ginástica teve como tarefa de maneira higiênica desinfetar e limpar os corpos das crianças tornandoos belos fortes e saudáveis como também de maneira corretiva endireitar os corpos defei tuosos toscos amarelados indolentes colocandoos em posição ereta e varonil O au tor nos mostra que a partir dos anos de 1920 uma outra lógica passa a orientar a escola rização dessa disciplina reconfigurando a cor reção dos corpos de princípios republicanos em direção à eficiência dos gestos necessários à industrialização É claro que essas lógicas pauta das numa idéia de hegemonia cultural presentes nas elites intelectuais encontraram resistências na 404 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas heterogeneidade das experiências dos atores soci ais As crianças por exemplo muitas vezes respon diam a essas lógicas com fugas e infreqüência às sessões de aulas Aliás Vago 2002 apresenta não só as diferentes lógicas matrizes e concepções de corpo e educação presentes na prática da Edu cação Física no período estudado mas a confi guração da própria Educação Física como disci plina escolar a partir de uma discussão por exemplo dos próprios termos que designavam essa parte dos programas escolares que não se restringia a uma única disciplina Exercícios Physicos Exercícios Gymnasticos Exercícios Calisthenicos ou simplesmente Gymnastica jun tamente com outras disciplinas responsabiliza vamse pela Educação Physica das crianças No entanto com o passar do tempo essa educação do físico dos meninos e meninas passa a ser de responsabilidade de uma disciplina específica a Educação Physica que assumiria a tarefa do cultivo dos corpos O segundo estudo selecionado foi por sua vez resultado de uma dissertação de mestrado em educação da Universidade Federal de Pernambuco em que a autora Maria Betânia e Silva que é professora de Educação Artística na rede estadual de ensino é também pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas História da Educação em Pernambuco Esse estudo A inserção da arte no currículo escolar Pernambuco 19501980 foi por sua vez motivada por questões do presente a autora assim justifica o seu estudo Como professora de arte em escolas públicas e privadas há oito anos tenho levantado uma série de questionamentos e buscado compreender o porquê de a existência de al guns preconceitos estabelecidos com relação à arte como disciplina curricular O fato da arte ser posta sempre numa posição secundária em relação às outras disciplinas o estigma cri ado entre alunos e professores de que arte não reprova portanto não é necessário ser levada a sério como as outras disciplinas e também à freqüente presença de profissionais de outras áreas que lecionam a disciplina como comple mento de carga horária levaramme a uma inquietação e as questões passaram a se inten sificar Silva 2004 depoimento oral gravado em áudio Entre as questões colocadas pela auto ra destacamse por que a arte é relegada a um segundo plano como disciplina entre docentes e entre outros profissionais da instituição escolar por que se considera a arte apenas como complemento secundário e talvez desnecessá rio no currículo que serve apenas para deco ração do ambiente e comemoração de datas festivas ou é considerada apenas como uma atividade de lazer e ainda que a arte não é preciso ser pensada logo não tem o peso que as outras disciplinas têm porque não é preciso usar a razão por que qualquer profissional de qualquer área pode lecionar a arte fato que não ocorre em relação à grande parte das outras disciplinas do currículo porque a carga horária é tão reduzida em re lação às outras disciplinas enfim por que não existe uma estruturação do conteúdo programático a ser trabalhado e desenvolvido como nas outras disciplinas Silva 2004 de poimento oral gravado em áudio De maneira diferente do que ocorre em relação aos trabalhos sobre Educação Física são praticamente inexistentes os trabalhos no caso brasileiro que se debruçam sobre a histó ria da arte na escola como indica a autora Tal constatação já havia sido feita por Ana Mae Barbosa 1999 a partir de um levantamento realizado em 80 dissertações e teses no Brasil Silva 2003 fundamentouse teórica e metodologicamente na Nova História Cultural tendo como referências os estudos de Jacques Le Goff Jean Hébrard e Michel de Certeau Baseouse ainda na compreensão de História das Disciplinas Escolares de André Chervel Circe Bittencourt Dominique Julia e Ivor 405 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 Goodson Utilizou como fontes de pesquisa legislação leis resoluções pareceres propos tas curriculares e programas de ensino jornais e revistas assim como depoimentos orais Para selecionar tais fontes pesquisou nos acervos do Arquivo Público Estadual de Pernambuco da Biblioteca do Centro de Artes e Comunicação da UFPE da Biblioteca Pública do Estado de Pernambuco do Conselho Estadual de Educa ção e da Divisão de Extensão Cultural e Artís tica DECA Silva 2004 constata que embora a Arte esteja presente no currículo escolar brasileiro desde o século XIX com outras denomina ções e em alguns casos no interior de outras disciplinas é somente durante a ditadura mi litar a partir da Lei 569271 que esta vira dis ciplina escolar obrigatória com a denomina ção de Educação Artística A autora estuda então o papel desempenhado por alguns mo vimentos e instâncias que contribuíram para a articulação dos profissionais da área que associa aos fatores internos caracterizados por Santos 1990 e o próprio processo de ela boração da lei naquele contexto histórico es pecífico busca compreender assim o papel dos fatores externos na criaçãotransformação de uma disciplina Como podemos constatar estudos como os aqui referidos podem elucidar uma série de questões que estão no centro do debate educa cional contemporâneo Acreditamos que com preender melhor como um saber se escolariza em determinados momentos da história que relações estabelecem com práticas sociais não escolares e como a escola inventa e reinventa em seu interior outros saberes e torna legítimos os seus usos certamente auxiliam a entender o papel que vem sendo desempenhado pela ins tituição escolar ao longo da história Considerações finais O processo de escolarização da cultura ou seja a transformação dos saberes em sabe res propriamente escolares existente em dife rentes períodos históricos é o elemento central nas pesquisas do campo da História das Disci plinas Escolares Essa tendência revela uma nova maneira de olhar o passado educacional das instituições de ensino oferecendo uma nova leitura das fontes fornecendo elementos para melhor perceber e compreender a constru ção cultural do cotidiano escolar Neste artigo pensamos ter sido possível fornecer alguns elementos para a reflexão em torno da História das Disciplinas Escolares a partir dos processos de renovação e ampliação observados na área de História da Educação no Brasil Apesar do crescente número de pesqui sas realizadas em torno do tema no entanto observamos que ainda há muito a ser investiga do Em relação às disciplinas Educação Física e Educação Artística por exemplo aqui citadas muitas vezes vemos estudos que se debruçam sobre a história da arte ou das práticas corpo rais como dimensões das manifestações cultu rais da humanidade como se fossem sinônimos da história desses saberes escolares No entan to essas histórias necessariamente não expres sam a história de seus saberes escolares A escolarização das artes e das práticas corporais mantém relação de fato com essas dimensões da cultura humana mas como mostra a História das Disciplinas Escolares é necessário perceber e compreender as particularidades da escolari zação desses saberes e práticas nos diferentes tempos e espaços sociais A história da arte e a história das práticas corporais não se confundem e não coincidem portanto com a história da Educação Artística e a história da Educação Fí sica Mesmo mantendo relações entre si essas histórias possuem características peculiares em cada espaço social e em cada época A constituição dos saberes escolares espe cíficos a cada disciplina do currículo é resultado de um processo complexo que envolve consen timentos conflitos diferentes tipos de mediação entre diversos sujeitos e instituições diante dos papéis que em cada época e sociedade são atri buídos à escola Na Educação Física e na Educa ção Artística contemporaneamente esse processo 406 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas parece marcado por uma busca permanente de legitimidade diante de saberes que tradicional mente parecem mais próximos ao que foi sen do identificado e naturalizado como inerente à instituição escolar saberes mais próximos da racionalidade moderna Por fim cabe ressaltar que apesar do grande número de pesquisas que vêm sendo re alizadas na área a maioria dos trabalhos mui tas vezes dedicados a traçar cronológica e retro ativamente a presença de um saber na escola é realizada de forma isolada Além disso muitos deles já partem de pressupostos mais ou me nos rígidos advindos das tradições da trans posição didática ou da cultura escolar toma das como partidos ou profissões de fé opos tos e inconciliáveis o que ao invés de auxi liar a elucidar os processos que tornam possível a existência de saberes e disciplinas propriamen te escolares torna a realidade educacional do passado ainda mais opaca Acreditamos que somente com a realização periódica de balanços ou estados da arte é possível tornar inteligível o processo de transformação eou construção de saberes em saberes propriamente escolares tan to do ponto de vista empírico quanto do pon to de vista propriamente teórico A tarefa de responder empiricamente algumas questões básicas como quando determinada discipli na passa a compor a grade curricular das esco las públicas Mesmo ausentes como disciplinas escolares esses saberespráticas estavam presen tes na escola Que agentes e fatores sociais tor naram possíveis essa inserção já é extrema mente complexa em um país com as dimensões do Brasil onde por exemplo durante o século XIX e nas primeiras décadas do XX cada provín ciaestado tinha uma legislação e uma estrutu ração curricular próprias Em uma perspectiva teórica acreditamos que esses balanços perió dicos possam elucidar questões como as relações estabelecidas entre saberespráticas escolares e não escolares entre aspectos políticos sociais e econômicos e escola entre cultura popular e cultura erudita entre transposição didática e cultura escolar em um país de escolarização tardia e profundamente marcado pelas presen ças do manuscrito e da oralidade e pelas distin ções sociais raciaisétnicas regionais geracionais e de gênero Fontes citadas manuscritas APEJE Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano Pernambuco IP 19 série Instrução Pública Directoria Geral da Instrucção Publica Pareceres do Conselho Literário 1866 Documentação Avulsa IP 44 série Instrução Pública Inspectoria Geral da Instrucção Publica Pareceres do Conselho Literário 1885 Documentação Avulsa Referências bibliográficas AZEVEDO F Da educação física Da educação física Da educação física Da educação física Da educação física o que é o que tem sido e o que deveria ser São Paulo Edições Melhoramentos 1960 AMADO J FERREIRA M de M Orgs Usos e a Usos e a Usos e a Usos e a Usos e abusos da história oral busos da história oral busos da história oral busos da história oral busos da história oral Rio de Janeiro Editora da Fundação Getúlio Vargas 1996 BARBOSA A M Org Arteeducação Arteeducação Arteeducação Arteeducação Arteeducação leitura no subsolo São Paulo Cortez 1999 BITTENCOURT C M F Disciplinas escolares história e pesquisa In OLIVEIRA M A T de RANZI S M F Orgs História das História das História das História das História das disciplinas escolares no Brasil disciplinas escolares no Brasil disciplinas escolares no Brasil disciplinas escolares no Brasil disciplinas escolares no Brasil contribuições para o debate Bragança Paulista EDUSF 2003 407 Educação e Pesquisa São Paulo v 31 n 3 p 391408 setdez 2005 BURKE P A Escola dos A Escola dos A Escola dos A Escola dos A Escola dos Annales 19291989 Annales 19291989 Annales 19291989 Annales 19291989 Annales 19291989 a Revolução Francesa da historiografia São Paulo FEU 1997 CARVALHO M M C de Revisitando a historiografia educacional brasileira In MENEZES M C Org Educação Educação Educação Educação Educação memória memória memória memória memória história história história história história possibilidades leituras Campinas Mercado de Letras 2004 CASTELLANI FILHO L Educação física no Brasil Educação física no Brasil Educação física no Brasil Educação física no Brasil Educação física no Brasil a história que não se conta Campinas Papirus 1988 CHARTIER R A história cultural A história cultural A história cultural A história cultural A história cultural entre práticas e representações Lisboa DIEFEL 1990 CHERVEL A História das disciplinas escolares reflexões sobre um campo de pesquisa TTTTTeoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação Porto Alegre nº 2 p 177229 1990 CHEVALLARD Y La transposition didactique La transposition didactique La transposition didactique La transposition didactique La transposition didactique du savoir savant au savoir enseigné Grenoble La Pensée Sauvage 1985 COMPÈRE MM Lhistoire de léduca Lhistoire de léduca Lhistoire de léduca Lhistoire de léduca Lhistoire de léducation en Europe tion en Europe tion en Europe tion en Europe tion en Europe essai comparatif sur la façon dont elle sécrit Paris INRPPeter Lang 1995 FARIA FILHO L M de Dos pardieiros aos palácios Dos pardieiros aos palácios Dos pardieiros aos palácios Dos pardieiros aos palácios Dos pardieiros aos palácios cultura escolar e urbana em Belo Horizonte na Primeira República Passo Fundo Editora da Universidade de Passo Fundo 2000 FARIA FILHO L M de VIDAL D G Os tempos e os espaços escolares no processo de institucionalização da escola no Brasil Revista Brasileira de Educação Revista Brasileira de Educação Revista Brasileira de Educação Revista Brasileira de Educação Revista Brasileira de Educação Rio de Janeiro n 14 p 1934 maioago de 2000 FERREIRA NETO A Pesquisa histórica na Educação Física brasileira In Org Pesquisa histórica na Educação Física Pesquisa histórica na Educação Física Pesquisa histórica na Educação Física Pesquisa histórica na Educação Física Pesquisa histórica na Educação Física brasileira brasileira brasileira brasileira brasileira Vitória CEFDUFES 1996 p 532 FORQUIN JC Saberes escolares imperativos didáticos e dinâmicas sociais TTTTTeoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação Porto Alegre n 5 p 2849 1992 As abordagens sociológicas do currículo orientações teóricas e perspectivas de pesquisa Educação Realidade Educação Realidade Educação Realidade Educação Realidade Educação Realidade Porto Alegre n 211 p 187198 janjun 1996 GALVÃO A M de O et al Livros escolares de leitura Livros escolares de leitura Livros escolares de leitura Livros escolares de leitura Livros escolares de leitura caracterização e usos Pernambuco século XIX Relatório Final de Pesquisa apresentado ao CNPq Recife 2003 mimeo GOODSON I F Currículo Currículo Currículo Currículo Currículo teoria e história Rio de Janeiro Vozes 1995 HÉBRARD J Três figuras de jovens leitores alfabetização e escolarização do ponto de vista da história cultural In ABREU M Org Leitura história e história da leitura Leitura história e história da leitura Leitura história e história da leitura Leitura história e história da leitura Leitura história e história da leitura Campinas Mercado de Letras 1999 HENRY M Apresentação da Didática da Ma Apresentação da Didática da Ma Apresentação da Didática da Ma Apresentação da Didática da Ma Apresentação da Didática da Matemática temática temática temática temática Notas de curso sobre Didática da Matemática Trad Lícia de Souza Leão Maia São Paulo PUC 1992 mimeo HOBSBAWN E RANGER T Orgs A invenção das tradições A invenção das tradições A invenção das tradições A invenção das tradições A invenção das tradições Rio de Janeiro Paz e Terra 1984 JULIA D A cultura escolar como objeto histórico Revista Brasileira de História da Educação Revista Brasileira de História da Educação Revista Brasileira de História da Educação Revista Brasileira de História da Educação Revista Brasileira de História da Educação Campinas n 1 p 943 jan jun 2001 LE GOFF J História e memória História e memória História e memória História e memória História e memória Campinas EDUNICAMP 1994 LOPES E M T GALVÃO A M de O História da educação História da educação História da educação História da educação História da educação Rio de Janeiro DPA 2001 MARINHO I P Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Contribuição para a história da Educação Física no Brasil Brasil colônia Brasil império Brasil república Rio de Janeiro Imprensa Nacional 1943 História geral da Educação Física História geral da Educação Física História geral da Educação Física História geral da Educação Física História geral da Educação Física São Paulo Companhia Brasil Editora 1980 MELO V A de Escola Nacional de Educação Física e Desportos Escola Nacional de Educação Física e Desportos Escola Nacional de Educação Física e Desportos Escola Nacional de Educação Física e Desportos Escola Nacional de Educação Física e Desportos uma possível história Dissertação Mestrado UNICAMP Campinas 1996 408 Marcílio SOUZA JUNIOR e Ana M GALVÃO História das disciplinas MOREIRA A F B e SILVA T T da Org Currículo Currículo Currículo Currículo Currículo cultura e sociedade cultura e sociedade cultura e sociedade cultura e sociedade cultura e sociedade São Paulo Cortez 1995 OLIVEIRA B J de Imaginário científico e a História da Educação In FONSECA T N de L VEIGA C G História e historiog História e historiog História e historiog História e historiog História e historiografia rafia rafia rafia rafia da educação no Brasil da educação no Brasil da educação no Brasil da educação no Brasil da educação no Brasil Belo Horizonte Autêntica 2003 p 101128 PAGNI P Â História da Educação Física no Brasil notas para uma avaliação In FERREIRA NETO A GOELLNER S BRACHT V Orgs As ciências do esporte no Brasil As ciências do esporte no Brasil As ciências do esporte no Brasil As ciências do esporte no Brasil As ciências do esporte no Brasil Campinas Autores Associados 1995 p 149163 PAIVA F Ciência e poder simbólico Ciência e poder simbólico Ciência e poder simbólico Ciência e poder simbólico Ciência e poder simbólico no Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte Vitória UFESCEFD 1994 PINHEIRO A C F Da era das cadeiras isoladas à era dos g Da era das cadeiras isoladas à era dos g Da era das cadeiras isoladas à era dos g Da era das cadeiras isoladas à era dos g Da era das cadeiras isoladas à era dos grupos escolares na Paraíba rupos escolares na Paraíba rupos escolares na Paraíba rupos escolares na Paraíba rupos escolares na Paraíba Campinas Autores Associados Bragança Paulista Editora da Universidade de São Francisco 2002 SANTOS L L de C P História das disciplinas escolares perspectivas de análises TTTTTeoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação eoria e Educação Porto Alegre n 2 p 2129 1990 SAVIANI N Sa Sa Sa Sa Saber escolar ber escolar ber escolar ber escolar ber escolar currículo e didática currículo e didática currículo e didática currículo e didática currículo e didática problemas da unidade conteúdométodo no processo pedagógico Campinas Autores Associados 1994 SILVA M B e A inserção da arte no currículo escolar A inserção da arte no currículo escolar A inserção da arte no currículo escolar A inserção da arte no currículo escolar A inserção da arte no currículo escolar Pernambuco 19501980 Dissertação Mestrado UFPE Recife 2003 SOUZA E S de Meninos Meninos Meninos Meninos Meninos à marcha Meninas à marcha Meninas à marcha Meninas à marcha Meninas à marcha Meninas à sombra à sombra à sombra à sombra à sombra Tese Doutorado UNICAMP Campinas 1994 SOUZA R F de TTTTTemplos de civilização emplos de civilização emplos de civilização emplos de civilização emplos de civilização a implantação da escola primária graduada no estado de São Paulo 18901910 São Paulo UNESP 1998 VAGO T M Cultura escolar cultivo de corpos Cultura escolar cultivo de corpos Cultura escolar cultivo de corpos Cultura escolar cultivo de corpos Cultura escolar cultivo de corpos Educação Physica e Gymnastica como práticas constitutivas dos corpos de crianças no ensino público primário de Belo Horizonte 19061920 Bragança Paulista EDUSF 2002 VALDEMARIN V Estudando as lições de coisas Estudando as lições de coisas Estudando as lições de coisas Estudando as lições de coisas Estudando as lições de coisas análise dos fundamentos filosóficos do método de ensino intuitivo Campinas Autores Associados 2004 VIDAL D G FARIA FILHO L M de História da educação no Brasil a constituição histórica do campo 18801970 Revista Revista Revista Revista Revista Brasileira de História Brasileira de História Brasileira de História Brasileira de História Brasileira de História São Paulo v23 n45 p3770 2003 Recebido em 070305 Aprovado em 090605 Marcílio Souza Júnior é professor da Universidade de Pernambuco UPE membro do Grupo de Estudos Etnográficos em Educação Física e Esportes ETHNÓS do Laboratório de Estudos Pedagógicos do Centro de Estudos em Educação Física e Esportes da Escola Superior de Educação Física Doutorando em Educação membro da Linha de Pesquisa de Formação de Professores e Prática Pedagógica do Programa de PósGraduação da UFPE Ana Maria de Oliveira Galvão é professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais UFMG Doutora em Educação pela UFMG Pesquisadora do CNPq do Núcleo de Estudos e Pesquisas História da Educação em Pernambuco NEPHEPEUFPE e do Centro de Alfabetização Leitura e Escrita CEALEUFMG